Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Ética, Cidadania e Sustentabilidade Aula 02 Ética e direitos humanos Objetivos Específicos • Compreender os direitos humanos. Temas Introdução 1 Os conceitos de ética e direitos humanos 2 A fundamentação ética 3 A questão histórica 4 A diferenciação social Considerações finais Referências José Antônio Fracalossi Meister Professor Autor Senac São Paulo - Todos os Direitos Reservados Ética, Cidadania e Sustentabilidade 2 Introdução Nesta aula, buscaremos um entendimento da ética e seus elementos constituintes, analisando a sua relação com os direitos humanos e o que eles podem oferecer de fonte inspiradora para a ética. A Declaração Universal dos Direitos Humanos é um tratado sobre os direitos fundamentais, que orienta pessoas e nações e, nesse sentido, inspira a ética, oferecendo um caminho melhor a seguir. Quando nos questionamos sobre alguma atitude ou reconhecemos que não foi uma ação correta, de uma forma ou de outra, sentimo-nos insatisfeitos com nós mesmo. Ao contrário, cada vez que fomos capazes de deitar a cabeça o travesseiro e dizer, cada um a si mesmo, com absoluta convicção de estar sendo sincero, agi bem, fiz o certo, experimentamos alegria (Introdução – para começo de conversa: o que é ética? (LACERDA; PESSOA, 2018, p. 10). Podemos compreender os direitos humanos de dois modos. Como um conjunto de princípios elaborados e estabelecidos pela Organização das Nações Unidas (ONU), que visa à garantia de direitos considerados fundamentais e essenciais para um bom convívio social, e, segundo Mondaini (2009, p. 12), como um: […] conjunto articulado e interdependente dos direitos civis, políticos, sociais econômicos e culturais, fundados, para além da ideia de universalidade, no princípio da indivisibilidade e no horizonte da internacionalização, condição indispensável para a luta pela construção de uma cidadania global. Um modo representa o conjunto fixado pela Declaração Universal dos Direitos Humanos e que nos é acessível. Já o segundo, pelo fato de ter um caráter mais jurídico, está expresso em muitas leis e, em especial, no caso brasileiro, na Constituição da República Federativa do Brasil. As duas concepções não se contradizem, mas têm um caráter diferencial. A declaração da ONU é uma recomendação aos países membros para que preservem os direitos fundamentais, já a Constituição, pelo seu caráter jurídico é impositiva. A título de exemplificação, o artigo 5º da Constituição Federal afirma: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros, e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e a propriedade, nos termos seguintes: [...] XXII – é garantido o direito de propriedade; XXIII – a propriedade atenderá sua função social; […] (BRASIL, 1988). A Declaração Universal dos Direitos Humanos, em seu artigo XVII, recomenda: 1. Todo ser humano tem direito à propriedade, só ou em sociedade com outros. Senac São Paulo - Todos os Direitos Reservados Ética, Cidadania e Sustentabilidade 3 2. Ninguém será arbitrariamente privado de sua propriedade (ONU, 1948, p. 10). Comparando as duas redações, podemos observar que tratam do mesmo assunto – propriedade privada –, de forma diferente, mas não divergente. Para a Declaração, a propriedade é um direito; já para a Constituição, ela é uma garantia. E assim se poderia fazer em relação a outros aspectos. O Brasil, como um país signatário da ONU, acolhe o que diz a Declaração e a transforma em lei, a fim de cumprir essa recomendação importante para o desenvolvimento do ser humano. 1 Os conceitos de ética e direitos humanos A ética surge na história como uma forma de auxílio na resolução dos problemas diários. Isso nos mostra que a humanidade, desde os primeiros agrupamentos, precisou de elementos para agir com correção e justiça. Não devemos esquecer que o ser humano precisa dos outros para se desenvolver, ou seja, a convivência é fundamental. Por outro lado, apesar de fundamental, a convivência pode ser também problemática, pois nas relações estabelecidas surgem os conflitos. A sociedade ideal é, e sempre foi, o sonho da humanidade. Como exemplo, podemos pensar na história do paraíso descrita na bíblia. Lá, temos a realidade perfeita, em que tudo ocorre em harmonia e paz, até o momento em que a harmonia é desafiada pelo ser humano. Este, ao usar sua liberdade, destrói a harmonia. O desafio presente é encontrar formas para fazer com que os seres humanos venham a agir bem e possam conviver harmoniosamente, já que a convivência é uma necessidade humana. A ética é protetiva e auxilia no convívio social. Ela não surgiu como um ato impositivo, mas como uma necessidade humana. Muitas vezes, encaramos a ética como imposição de um grupo sobre outro, porém, é preciso ir além desta concepção e pensá-la como uma necessidade humana para viver bem e se desenvolver plenamente. Tanto os direitos humanos como a ética são constituídos historicamente a partir das situações vivenciadas pela humanidade. Delas, surgem as questões a serem pensadas e respondidas. Direitos humanos e ética buscam oferecer respostas às diversas situações vividas pelas pessoas em sua individualidade e pela humanidade, como um todo, por isso é importante que as relações humanas sejam aceitas e executadas por todos, sem exceção. O pensamento ético e os direitos humanos surgem para proteger o que nos é mais significativo, como a vida, os bens que se dispõem e os direitos fundamentais para que se Senac São Paulo - Todos os Direitos Reservados Ética, Cidadania e Sustentabilidade 4 possa viver dignamente. As normas éticas podem ou não constar de leis ou códigos. Mas o juízo ético é, essencialmente, um juízo moral. Uma ação pode ser legal e não ser ética. E, em certos casos, pode ser ilegal e considerada moralmente ética. Em resumo, a palavra ética se aplica à conduta humana. A ética aprova u desaprova os atos de um ser humano, qualificando-os como certos ou errados, do ponto de vista moral (LACERDA; PESSOA, 2018, p. 10-11). Os direitos humanos são ditos como fundamentais, pois não se pode abrir mão deles. O mesmo se dá com a ética. Algumas pessoas podem não agir eticamente, mas não se pode afirmar que a ética é desnecessária. Temos que manter presente que ética e direitos humanos existem para justificar o nosso convívio social. Direitos devem ser realizados e, por isso, cabe a cada um fazer com que seus direitos se cumpram. Saúde, educação e previdência, entre outros, são direitos fundamentais para que as pessoas possam viver bem. As pessoas, ao se organizarem em sociedade, entendem que juntas tendem a realizar o que está na vontade de cada um e, ao mesmo tempo, faz parte da vontade de todos. Em resumo, todos desejam viver bem, conforme aquilo que reconhecem ser fundamental para si e também para os outros. 2 A fundamentação ética A pergunta sobre como justificar eticamente as ações expressas na Declaração Universal dos Direitos Humanos leva os teóricos a muitas discussões. Surgem questões, como: onde justificar a afirmação que somos todos iguais em dignidade e direitos? É preciso considerar que nascemos diferentes, somos diferentes e precisamos dessas diferenças para que possamos nos desenvolver como humanidade. A discussão aprofunda-se quando nos referimos aos direitos humanos, que envolve duas situações: o direito à vida, ou seja, ao existir, e os direitos aos quais não se pode abrir mão (como liberdade, igualdade etc.). Uma pessoa tem uma dívida para com outra e não tem como pagá-la. Então, resolve trabalhar para o credor de graça até que a dívida seja paga. Você concordaria com isso? Se disser que sim, como essa pessoa se sustentaria? Qual é a diferença entre este trabalho e a escravidão? Como se estabeleceria o tempo que o devedor precisaria trabalhar para pagar essa conta? Quem determinaria esse tempo? Como nós podemos negociar uma dívida? Geralmente,aquele que detém o poder impõe sua vontade sobre o mais frágil; dessa forma, é mais difícil estabelecer uma relação de igualdade Senac São Paulo - Todos os Direitos Reservados Ética, Cidadania e Sustentabilidade 5 A justificação para os direitos humanos é necessária, pois vivemos em uma sociedade em que tudo deve ser justificado e fundamentado. Dentro dessa lógica, o que não for assimilado não se torna defensável. A tarefa de justificação é difícil, mas, ao mesmo tempo, necessária. O que mais se aproxima de uma justificativa para este caso é o fato de dizer que os direitos humanos são elementares, ou seja, são essenciais para todas as pessoas viverem bem. Não basta para o ser humano apenas viver. É preciso que ele viva bem! Tal característica é uma qualidade humana, ao contrário de outros animais para os quais sua condição natural é estar bem. O ser humano, pelo fato de se formar, se tornar humano, precisa de diversos fatores que garantam seu modo de melhor viver. Conforme Mondaini (2009), historicamente, o que se viu foi que os direitos foram aos pouco sendo reconhecidos: as liberdades individuais (direitos civis), a igualdade política (os direitos políticos) e a igualdade social (os direitos sociais). No Brasil, primeiro foram reconhecidos os direitos sociais, já os direitos civis e políticos não eram garantidos. A busca pela efetivação dos direitos humanos é eterna, assim como foi necessário estabelecer seus princípios. Deve-se sempre zelar para que jamais sejam desrespeitados e que os direitos não sejam reconhecidos como tal apenas para alguns. Por isso, vale afirmar os direitos humanos e sua defesa é uma necessidade. Mas as pessoas precisam estar convictas de que lutar por seus direitos é fundamental e, se alguns se apropriarem de direitos que são de todos e excluírem grupos ou alguns dessa obrigação, será ruim para todos. 2.1 Construção social É importante percebermos que os direitos, assim como a ética, são resultantes de uma construção social. As pessoas devem se esforçar para garantir uma ética capaz de concretizar os direitos. Admitir que nos direitos humanos há uma inspiração ética é admitir que em seus fundamentos existe uma concepção de pessoa, de bem e de mal e que os direitos valem para todos, independentemente da orientação religiosa, política ou filosófica individual. Na Declaração Universal dos Direitos Humanos se afirma que todos os cidadãos devem ter direitos garantidos, dentre os quais destacam-se os direitos à: liberdade, propriedade, segurança e resistência à opressão. Cada pessoa tem como limite os mesmos direitos que os outros, um direito não deve se sobrepor ao outro. É preciso pensar “o que não desejo para mim, não desejo para os outros também”, ou seja, é assegurado aos demais membros Senac São Paulo - Todos os Direitos Reservados Ética, Cidadania e Sustentabilidade 6 da sociedade o desfrutar de direitos que proclamo para mim. Portanto, a Declaração vê a lei como uma expressão da vontade geral. Com isso, busca-se promover a igualdade de direitos e a proibição do que é prejudicial para a sociedade. 2.2 Justificativas para a Declaração Observando o preâmbulo da Declaração, compreendemos o motivo pelo qual esse tratado composto por 30 artigos deve ser seguido por todos: [...] O reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo (ONU, 2009, p. 2). Todas as constituições do mundo democrático são muito maiores do que esses 30 artigos, mas são imprescindíveis para a coexistência, especialmente em um mundo globalizado, quando os problemas já não são mais pensados localmente. No site da ONU, encontramos justificativas que fundamentam um agir conforme a Declaração Universal dos Direitos Humanos e estes nos demostram ou se justificam por serem éticos. • Os direitos humanos são fundados sobre o respeito pela dignidade e o valor de cada pessoa; • Os direitos humanos são universais, o que quer dizer que são aplicados de forma igual e sem discriminação a todas as pessoas; • Os direitos humanos são inalienáveis, e ninguém pode ser privado de seus direitos humanos; eles podem ser limitados em situações específicas. Por exemplo, o direito à liberdade pode ser restringido se uma pessoa é considerada culpada de um crime diante de um tribunal e com o devido processo legal; • Os direitos humanos são indivisíveis, inter-relacionados e interdependentes, já que é insuficiente respeitar alguns direitos humanos e outros não. Na prática, a violação de um direito vai afetar o respeito por muitos outros; • Todos os direitos humanos devem, portanto, ser vistos como de igual importância, sendo igualmente essencial respeitar a dignidade e o valor de cada pessoa (ONU, 2015). Para mais informações sobre as características da Declaração Universal dos Direitos Humanos, acesse a Midiateca. Senac São Paulo - Todos os Direitos Reservados Ética, Cidadania e Sustentabilidade 7 Embora dessa forma tenhamos a justificativa, muitos conceitos precisam ser trabalhados para que se entenda bem o que significam. Um erro comum é acreditar que um termo tem o mesmo significado/valor para todas as pessoas, por exemplo: O que se entende por dignidade humana? Entende-se uma dignidade que inere ao homem, que lhe é concedida independentemente de outro qualificativo, seja biológico, social ou moral. [...] Ela se difere das diversas formas de dignidade contingente. Fala-se [...] de dignidade social em relação aos portadores de cargos políticos ou clericais, de dignidade expressiva, quando a aura de um homem sábio infunde reverência (KAUFMANN, 2013, p. 55, grifo nosso). Mesmo assim, deve-se questionar: será que o que eu entendo é o mesmo que meu amigo, vizinho ou colega entende? Por isso, mesmo tendo uma fundamentação, uma justificativa para a Declaração e para os direitos humanos, deve-se ter claro que a compreensão humana é múltipla e envolve a história, as experiências e os entendimentos individuais e que, por isso, é preciso esclarecer e buscar sempre maiores consensos para que todos possam viver e entender a mesma coisa. A dignidade humana [...] consiste num conceito normativo, que deve proteger todo homem de ser tratado por outro homem como meio, isto é, como um simples objetivo para consecução de seus fins. Isso implica que todos sejam tratados como possuidores de certo grau de dignidade contingente, que é uma tentativa de proteger os homens de humilhações (KAUFMANN, 2013, p. 55). O quão importante é sabermos o que se entende por dignidade? Embora não se possa dizer tudo o que o conceito abrange, é fundamental entendermos que é a dignidade é inerente ao ser humano, isto é, não pode lhe ser tirada por nada e nem por ninguém. Além disso, não deve ser confundida com outras formas de dignidade, como a social e a expressiva, conforme citação anterior. Além disso, deve-se entendê-la como um conceito normativo, ou seja, uma forma de determinar a conduta humana, assim como a ética e a lógica que levam as pessoas a agirem porque entendem ser o melhor meio para se atingir o bom convívio social. 3 A questão histórica A história da humanidade nos mostra que tivemos que passar por um longo período para percebermos que o direito realmente é parte integrante do nosso ser, assim como o é nossa pele, nossos olhos e cada parte de nosso corpo. A ética e os direitos humanos também são nossos constituintes. Só podemos dizer que somos verdadeiramente humanos se somos reconhecidos e nos reconhecemos como tal. Poderíamos buscar a justificativa para os direitos humanos na história, desde os primeiros códigos constituídos, mas vamos partir de nossa realidade mais recente, fundamentalmente, o período em que a questão dos direitos do homem foi mais pensada e buscada. Não que Senac São Paulo - Todos os Direitos Reservados Ética, Cidadania e Sustentabilidade 8 em outras épocas isso tambémnão tenha sido estudado e aparecesse em códigos jurídicos ou mesmo nas tradições religiosas, mas é a partir do período moderno (final do século XVIII) que encontramos os passos decisivos para que os direitos humanos, tal qual conhecemos hoje, tomassem forma. As primeiras afirmações sobre os direitos humanos surgem na Declaração da Independência dos Estados Unidos, de 4 de julho de 1776. Nela, podemos encontrar vários motivos para que a independência americana se efetive, pois estava pautada no interesse de vários grupos, desde escravocratas, religiosos, até mesmo libertários. A Declaração da Independência afirma solenemente, ao denunciar os motivos da separação promovida pelo segundo congresso Continental da Filadélfia, que o rei da Grã-Bretanha estaria violando os direitos mais básicos da liberdade. [...] Os documentos fundadores na nova nação são amplos e generosos. A Declaração de Independência afirma que todos os homens foram criados iguais e dotados pelo Criador de direitos inalienáveis, como vida, liberdade, busca da felicidade (KARNAL, 2015, p. 139). Filosoficamente, a Declaração acentuou dois temas: os direitos individuais e o direito de revolução. Duas condições fundamentais para justificar os atos que deveriam tomar, pois, se não afirmassem os direitos individuais, como poderiam dizer que fariam o desligamento do Reino Unido, deixando de ser uma colônia? E se também não declarassem o direito de revolução, também não poderiam desmembrar-se. Assim, a primeira declaração do mundo moderno afirma algo fundamental para a ética: as garantias individuais e a possibilidade de revoltar-se contra o que não se concorda. No caso dos Estados Unidos, já não se concordava em ser colônia. Um segundo momento histórico importante é a Revolução Francesa. Ela nasce sobre o lema: “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”. O marco fundamental dessa revolução é a Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, em que estão expressos os anseios e a busca do seu grande ideal de liberdade e igualdade. As declarações americanas e francesas foram a fonte de inspiração para a libertação de muitas nações e inspiraram as pessoas a encontrar sua razão de ser e pensar como cidadãos de um mundo onde as amarras e as prisões devem ser pensadas não como uma forma de interesse de alguns, mas que, em primeiro lugar, as pessoas tenham a possibilidade de se expressarem, de se enxergaram como iguais e de construírem um mundo mais fraterno e melhor para se viver. A partir da Revolução Francesa se intensificam grandes movimentos de mudanças no mundo, pois seus três princípios (liberdade, igualdade e fraternidade) são fundamentais para que o ser humano desenvolva-se plenamente. Lembremos que, durante o período ou século XVII, especialmente na Europa, existiam dinastias que impunham formas de trabalho e de controle rígidos, próximos da escravidão. O Estado intervinha nas relações comerciais Senac São Paulo - Todos os Direitos Reservados Ética, Cidadania e Sustentabilidade 9 – de servidão e cobrança de altos impostos –, e um pequeno grupo, a elite, podia desfrutar. Mesmo assim, não foram os mais pobres que promoveram a revolução, mas sim um grupo burguês, isto é, um determinado grupo que também pensava em acumular para manter sua posição social. O século XVII foi um período profícuo, no sentido de se estabelecer situações favoráveis para o pensamento sobre a condição humana. O contexto da reflexão sobre as liberdades buscadas leva à construção da libertação das terras americanas e à própria revolução francesa, e também ao período em que surge a primeira Revolução Industrial. Tem-se, portanto, um mundo “em ebulição”, que levara os governos, as pessoas e os pensadores desse período a sérios questionamentos sobre o ser humano e seus direitos. Assim, a partir dos momentos históricos que deram origem a essa reflexão, a humanidade não mais deixara de lado os questionamentos sobre sua importância. Esses momentos fundantes levaram a filosofia política, a ética e tudo o que se refere à condição humana e, nesse sentido, também a religião a se questionar sobre o humano e a humanidade. A culminância de tudo isso se dará mais de um século depois com a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948. Nesse período, as regalias, as benesses sociais eram direcionadas apenas para um grupo. Apenas os mais próximos do poder ou que tinham dinheiro podiam desfrutar do que se oferecia na época. Embora muitos possam dizer que hoje também é assim, podemos, por outro lado, afirmar que esses direitos são garantidos a todos. Para nós brasileiros, um marco importante na garantia desses direitos é a Constituição Brasileira de 1988, que ainda não fez frutificar tudo o que ali está expresso. Caberia à sociedade fazer valer esse direito, cobrando das autoridades o que lhes é devido, assim como também fazendo a sua parte de forma a minorar as diferenças. 4 A diferenciação social A sociedade é uma forma essencial para que todos nós possamos existir e sobreviver. Hoje já não é possível desejar retroceder a um estágio natural. Temos necessidades emocionais, afetivas, psicológicas etc. Nada pode substituir a necessidade da convivência, assim como as demais, as quais podem ser consideradas da natureza humana. Para que as relações aconteçam, é necessário que a sociedade se organize, conheça os direitos de cada um e de todos, e inclua todos em uma perspectiva humanitária, ética e de direito. Seria possível pensar em uma sociedade “perfeita”? Esta seria formada apenas pelos mais capazes e melhores? Esse tipo de pensamento seria excludente e anti-humano; não cabe em nossa reflexão acerca da sociedade de direitos a qual tratamos até o momento. Senac São Paulo - Todos os Direitos Reservados Ética, Cidadania e Sustentabilidade 10 Posições como essas já foram defendidas em Esparta, cidade guerreira em que, quem não fosse capaz de entrar em guerra deveria ser morto ao nascer. Porém, não precisamos ir muito longe. Vejamos o exemplo nazista. Por que judeus, doentes e outros grupos foram assassinados inicialmente na Alemanha e, posteriormente, foram perseguidos por toda a Europa? Porque se defendia uma ideia de supremacia de um grupo de uma determinada parte da sociedade sobre outros. Hoje, felizmente, a defesa de direitos e a possibilidade de inclusão das pessoas permitem o entendimento de que ações desse tipo são inadequadas. Pode-se dizer que, ao nascermos, todos somos iguais, o que nos diferencia é o lugar onde nos inserimos após o nascimento. Por outro lado, as discriminações criadas socialmente fazem com que sejam vividos e expressados preconceitos de raça, cor, sexo etc. Procurar então uma forma de igualdade é buscar a garantia do direito de oportunidades sociais e para que ninguém seja tratado como superior ou inferior. São direitos fundamentais de qualquer pessoa: ter uma família, educação, alimentação, serviços de saúde, trabalho digno, acesso a bens e serviços, participar da vida pública e ter o respeito dos semelhantes, entre outros. É nesse sentido que se inserem os direitos humanos como uma forma complementar e fundamental, ou seja: [...] os direitos humanos devem ser observados como conjunto articulado e interdependente dos direitos civis, políticos, sociais, econômicos e culturais, fundados, para além da ideia de universalidade, no princípio da indivisibilidade e no horizonte da internacionalização, condição indispensável para a luta pela construção de uma cidadania global (MONDAINI, 2009, p. 12). A participação na sociedade não é como muitos pensam, ou seja, apenas de se ter o direito de ir e vir, de votar e ser votado, é muito mais do que isso. Participar é entender que se possui direitos e lutar para que eles se efetivem socialmente. Um exemplo de boa forma de participação social é o orçamento participativo. Essa prática se tornou conhecida quando a cidade de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, passou a adotá-la e, hoje, já é umarealidade de muitas cidades e estados brasileiros. O orçamento participativo é uma forma efetiva de a população ter voz para que seus direitos sejam ouvidos, discutidos e principalmente respeitados. Considerações finais Nesta aula, compreendemos a formação histórica dos direitos humanos e da ética. Aprendemos que tal surgimento se deu a partir das relações que a humanidade estabeleceu no Senac São Paulo - Todos os Direitos Reservados Ética, Cidadania e Sustentabilidade 11 decorrer da história, e que os direitos humanos foram sendo elaborados durante séculos, em especial, no período moderno a partir da Independência dos Estados Unidos e da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789. Passamos a entender que não basta termos direitos, é preciso mais do que isso, é necessário buscar a sua concretização, por meio da participação social sempre que possível. O ser humano tem muitos direitos, e o fato de muitos serem descumpridos levou à necessidade de se construir uma declaração. Muitas vezes, vivemos e não nos damos conta que temos direitos – à liberdade, propriedade, segurança, à vida etc. –, mas, quando eles são suprimidos, logo percebemos a sua importância e, por isso, devem ser garantidos. Busquemos viver bem em sociedade e talvez assim não seja preciso exigir tanto os direitos, muito embora, como afirmam Pinsky e Pinsky (2015, p. 9): A ideia de que o poder público deve garantir um mínimo de renda a todos os cidadãos e o acesso a bens coletivos como saúde, educação e previdência deixa ainda muita gente arrepiada, pois se confunde facilmente o simples assistencialismo com dever do Estado. A ética e a Declaração dos Direitos Humanos nos propõem desafios. E cada pessoa, ao entender esses desafios, tem diante de si a possibilidade de assumir-se cada vez mais como cidadão e membro de uma grande sociedade. Entender-se como um ser que não pertence somente a um país, mas a uma grande nação que nos possibilita viver esse momento histórico, nos torna comprometidos com o “destino” de cada um e ao mesmo tempo de todos. Referências BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 5 out. 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em: 23 nov. 2016. KAUFMANN, Matthias. Em defesa dos direitos humanos: considerações históricas e de princípios. São Leopoldo: UNISINOS, 2013. KARNAL, Leandro. Estados Unidos, liberdade e cidadania. In: PINSKY, Jaime, PINSKY, Carla Bassanezi (Orgs.). História da Cidadania. 6. ed. São Paulo: Contexto, 2015, p.134-157. LACERDA, Gabriela; PESSOA, M. Agir bem é bom: ética ontem, hoje e amanhã. São Paulo: Editora Senac: São Paulo, 2018. MONDAINI, Marco. Direitos humanos no Brasil. São Paulo: Contexto, 2009. ONU. Declaração Universal dos Direitos Humanos. Disponível em: <http://www.dudh.org.br/ wp-content/uploads/2014/12/dudh.pdf>. Acesso em: 23 nov. 2016. PINSKY, Jaime; PINSKY, Carla Bassanezi (Orgs.). História da cidadania. São Paulo: Contexto, 2015. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm Introdução 1 Os conceitos de ética e direitos humanos 2 A fundamentação ética 3 A questão histórica 4 A diferenciação social Considerações finais Referências
Compartilhar