Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
BIOMECÂNICA DO ESPORTE E EXERCÍCIO AULA 1 Profª Renata Wolf 2 CONVERSA INICIAL A biomecânica está presente no cotidiano de todas as pessoas, desde a postura e a ergonomia, até os movimentos realizados dentro de uma academia, a performance de um atleta de alto nível e as possíveis lesões relacionadas a esta. Assim, é de extrema importância que os conceitos que envolvem a biomecânica e a análise dos movimentos corporais sejam claros. Portanto, nesta aula discutiremos o que é biomecânica, a biomecânica dos ossos, dos músculos esqueléticos e as análises cinemáticas e cinéticas do movimento do corpo humano, com o objetivo de apresentar os fundamentos da biomecânica que respaldarão a escolha de exercícios e equipamentos de acordo com as características corporais de cada indivíduo. TEMA 1 – O QUE É BIOMECÂNICA? A biomecânica é uma disciplina que descreve, analisa e avalia os movimentos do corpo humano (Winter, 2009). Esses movimentos podem ser da marcha, de um trabalhador levantando uma caixa até um atleta de alta performance. Os princípios físicos e biológicos são os mesmos em todos esses movimentos, mudando apenas as tarefas específicas e o nível de detalhe da performance de cada caso. 1.1 Definição de biomecânica Biomecânica é a junção de duas palavras: “bio”, que significa vida, e “mecânica”, que é o estudo da ação das forças (Hall, 2016). Quando as forças agem em organismos vivos elas podem criar o movimento, ser um estímulo saudável para o crescimento e o desenvolvimento, ou, em um tecido sobrecarregado, provocar uma lesão. No caso da biomecânica do esporte e exercício, são estudadas as ações das forças internas produzidas pelos músculos e forças externas que agem sobre o corpo humano durante um movimento. O termo biomecânica começou a ser utilizado pela comunidade internacional de cientistas apenas no ano de 1970. A disciplina de biomecânica foi, então, considerada uma subdisciplina da cinesiologia, uma vez que esta consiste no estudo do movimento e a biomecânica é o estudo das forças internas e externas que ocorrem durante o movimento. 3 Para estudar as forças relacionadas ao movimento do corpo humano, a biomecânica utiliza ferramentas da mecânica, uma área da física. Os primeiros conceitos a serem entendidos são a estática e a dinâmica. A estática está relacionada a um sistema em estado constante de movimento, ou seja, em velocidade constante ou totalmente parado. A dinâmica, por sua vez, está relacionada a um sistema no qual há aceleração. As avaliações desses sistemas podem ser realizadas por outros dois ramos da biomecânica: a cinemática e a cinética. A cinemática refere-se à descrição do movimento em relação ao tempo e ao espaço, por exemplo, a velocidade da marcha de um idoso. Já a cinética refere-se as forças que agem sobre o movimento, como a força de reação do solo. Esses conceitos serão aprofundados e discutidos ao longo desta aula. 1.2 Por que estudar biomecânica? A disciplina de biomecânica nos traz informações-chave sobre os padrões de movimento mais efetivos e seguros, além dos equipamentos e dos exercícios relevantes que melhoram o movimento humano. Ou seja, os focos principais de um profissional de educação física em relação à biomecânica do esporte e do exercício são a melhora da performance e a prevenção de lesões (Knudson, 2007). A melhora da performance pode estar relacionada desde um movimento simples, como melhorar a marcha de um idoso para evitar o risco de queda, ou a marcha de uma pessoa com hemiplegia (paralisia completa de um lado do corpo), assim como melhorar o movimento do agachamento de aluno de personal da academia, para que mais sobrecarga possa ser utilizada e, consequentemente, haja maior ganho de força, até a melhora do salto em distância, que pode levar o atleta ao pódio olímpico. A prevenção de lesões também está relacionada desde uma pessoa comum, como um trabalhador que precisa carregar cargas pesadas no seu dia a dia, podendo levar a uma lesão na coluna, como hérnia de disco. Ou então um adolescente que faz parte de uma equipe de treinamento de basquete e precisa aprender a aterrissar após um salto para melhorar a distribuição das forças geradas pelo impacto nas articulações. Ainda, um atleta de alto nível de futebol que tem recorrentes lesões devido ao errado padrão de movimento do chute. 4 A biomecânica é a ciência mais útil na melhora da performance nos esportes ou nos exercícios que demandam maior técnica do que estrutura física ou capacidade fisiológica, assim como na prevenção de lesões devido à mudança no padrão de movimento (Knudson, 2007). 1.3 Abordagens para análise da performance e na prevenção de lesões Como falamos no tópico anterior sobre a melhora da performance devido ao aperfeiçoamento da técnica e a prevenção das lesões pela mudança no padrão de movimento, devemos entender como essas análises podem ser realizadas. Há duas abordagens possíveis: a abordagem qualitativa e a abordagem quantitativa. A qualitativa refere-se à descrição de um movimento e sua qualidade, sem abordagem numérica. Um exemplo é a descrição de uma pessoa enquanto ela corre. O movimento pode ser avaliado como bom, muito bom ou ruim visualmente, assim como pode ser descrito mais detalhadamente, que o tronco do corredor está muito inclinado para frente, que o joelho flexiona pouco no momento que o pé sai do chão e que no momento de aterrissagem o peso do corpo está totalmente apoiado no calcanhar, o que pode aumentar o impacto nas articulações. A abordagem quantitativa implica que números estão envolvidos, ou seja, poderá ser realizada uma análise sobre a velocidade do corredor, o tamanho da passada, quantos graus de flexão o joelho está fazendo e qual a força de reação do solo quando o corredor aterrissa após a fase de voo da corrida. As duas abordagens são importantes na biomecânica, levando em consideração que a descrição qualitativa é mais utilizada em academias, escolas e centros de treinamento infantojuvenis, enquanto a descrição quantitativa é mais utilizada em laboratórios de biomecânica. Portanto, a análise biomecânica pode ser empregada em todos os locais de trabalho do profissional de educação física, com diferentes abordagens para a melhora da performance e para a prevenção de lesões de seus clientes, alunos e atletas. TEMA 2 – BIOMECÂNICA DOS OSSOS Para a análise do movimento do corpo humano e como as forças internas e externas agem durante o movimento, faz-se necessário o conhecimento da 5 estrutura dos ossos. Os ossos são tecidos vivos, que são modelados e remodelados durante a vida, devido à ação das forças internas e externas que agem no corpo humano. Suas funções principais estão relacionadas à estrutura esquelética rígida para sustentar e proteger outros tecidos corporais e formar um sistema de alavancas que podem ser movidas pela força gerada pelos músculos que estão inseridos nos ossos. 2.1 Composição e estruturas do tecido ósseo Os ossos são formados, principalmente, por carbonato de cálcio, fosfato de cálcio, colágeno e água. Sessenta a setenta por cento do peso do osso é composto de carbonato e fosfato de cálcio. As altas concentrações dessas duas substâncias dão rigidez ao osso, o que é determinante para a resistências às forças de compressão que os ossos sofrem. Por sua vez, o colágeno dá flexibilidade ao osso, o que é determinante para a resistência às forças de tração. A água é importante para a força óssea, além de seu fluxo ser importante para a levar nutrientes e retirar produtos metabólicos das células ósseas. O tecido ósseo tem duas categorias, mais poroso e outro menos poroso. O tecido ósseo menos poroso com concentração de 5% a 30% de tecido não mineralizado, é chamado de tecido cortical, enquanto o tecido ósseo maisporoso com concentração de 30% a 90% de tecido não mineralizado é chamado de tecido trabecular. O osso cortical é mais rígido, devido à menor porosidade, assim, é capaz de suportar cargas maiores. Porém, por ser mais rígido, tem menor deformação relativa. Isso quer dizer que o osso trabecular, por ser mais poroso, pode deformar mais antes de fraturar, por exemplo. Essa estrutura pode variar dependendo da função de cada osso. Ossos longos geram alavancas, por isso precisam ser mais fortes. Assim, têm maior concentração de osso cortical. Por sua vez, as vértebras têm maior concentração de osso trabecular, pois sua função principal é absorver impacto. 2.2 Tipos de ossos O corpo humano é formado por 206 ossos, que são divididos em esqueleto axial e esqueleto apendicular. O esqueleto axial é formado pelos ossos que formam o eixo do corpo: o crânio, as vértebras, as costelas e o esterno. O 6 esqueleto apendicular é formado pelos ossos que formam os membros superiores e inferiores do corpo humano. As funções dos ossos também estão relacionadas aos seus formatos, gerando quatro categorias. Os ossos curtos, os ossos planos, os ossos irregulares e os ossos longos: 1. Ossos curtos: têm usualmente formato cúbico e incluem, apenas, os ossos do carpo e do tarso. Permitem pequenos movimentos de deslizamento e têm a função de absorver impacto. 2. Ossos planos: têm a função de proteger órgãos e tecidos moles, além de fornecerem uma grande área para inserção dos músculos e dos ligamentos. São ossos planos: escápula, esterno, costelas, patelas e alguns ossos do crânio. 3. Ossos irregulares: seus formatos são diferentes uns dos outros, pois têm funções especiais no corpo humano. As vértebras são exemplos claros desse tipo de osso. Formam um túnel para a passagem da medula, além de terem vários processos para fixação muscular e ligamentar. Outros ossos irregulares são: o sacro, o cóccix e a mandíbula. 4. Ossos longos: são ossos que se aproximam do formato cilíndrico e suas hastes são longas. Essa haste é chamada de corpo ou diáfise. As extremidades desses ossos são protuberantes e conhecidas como côndilos, tubérculos ou tuberosidades. Essas extremidades são protegidas por cartilagem articular, para prevenir o desgaste devido aos movimentos que suas articulações fazem. Alguns ossos longos são mais pesados e maiores, como o fêmur e a tíbia, para sustentar o peso do corpo. O rádio e a ulna não menores e mais leves para facilitar o movimento. Outros exemplos de ossos longos são: clavícula, fíbula, metatarsos, metacarpos e falanges. 2.3 Crescimento e desenvolvimento ósseo Os ossos podem crescer em relação ao seu comprimento e ao seu diâmetro. A partir da formação do feto, os ossos começam a crescer e se desenvolver. O crescimento longitudinal dos ossos ocorre desde a infância até a idade de 18 anos, aproximadamente. Esse crescimento se dá na epífise nos ossos longos. Logo após a adolescência, a epífise fecha. 7 Já o crescimento em diâmetro ocorre durante toda a vida, no periósteo dos ossos longos. A camada interna do periósteo cria novas camadas de tecido ósseo por cima das já existentes. No entanto, com o passar dos anos, há a diminuição progressiva de colágeno, o que aumenta a fragilidade do osso. A densidade óssea também diminui com o aumento da idade, diminuindo a resistência e aumentando a porosidade. A diminuição da densidade óssea pode levar à osteoporose, principalmente nas mulheres após a menopausa. 2.4 Respostas ósseas ao estresse Os ossos passam por processos de modelagem e remodelagem. A modelagem óssea só ocorre em ossos imaturos. A remodelagem óssea ocorre durante toda a vida devido à ação de forças. Esse estímulo mecânico dinâmico deforma o osso e o sobrecarrega. Essas deformações fazem com que o osso fique mais forte e que mude seu formato. A remodelagem ocorre pela reabsorção do osso danificado pelo estímulo mecânico e a formação subsequente do osso novo. Os estímulos mecânicos são forças que agem sobre os ossos. Três forças agem sobre os ossos. A compressão é quando uma força externa tende a espremer as moléculas de um material. A tensão é quando a força age para estender ou separar as moléculas do material. O cisalhamento é uma força em ângulo reto que atua em direções opostas. Quando essas forças agem combinadas nos ossos, elas geram forças de torção e de flexão. A força primária que mais atua nos ossos é a compressão. As respostas mecânicas dos ossos às forças de compressão, tração, cisalhamento, torção e flexão dependem da qualidade óssea, ou seja, da sua densidade. É importante afirmar que a densidade óssea está diretamente relacionada aos hábitos saudáveis, aos hormônios e aos níveis de atividade física. Exercícios de impacto, que geram forças de compressão principalmente, estimulam o aumento da densidade óssea. Assim, para a manutenção da densidade óssea em crianças, adolescentes e adultos, atividades com sustentação de carga, como caminhada e saltos, são interessantes. No entanto, em adultos ou idosos que apresentam osteoporose, a musculação é uma boa alternativa, uma vez que nesse tipo de atividade também há a sustentação de carga. 8 Apesar disso, quando uma força aplicada sobre o osso é muito forte, tem uma longa duração, ou tem uma direção na qual o osso é mais fraco, podem ocorrer fraturas. Um exemplo é uma fratura em espiral em ossos longos, quando um osso longo recebe uma força excessiva de flexão ou torção. A força de flexão faz com que o osso sofra, de um lado, força de tensão e, do lado oposto, força de compressão. Ossos longos têm maior resistência à compressão do que à tensão. Assim, o lado que sofre tensão fraturará primeiro. Outro tipo de lesão ocasionado por fracos estímulos repetitivos é a fratura por estresse. Esse tipo de fratura é muito comum em corredores. O aumento da magnitude ou da frequência de estímulos pode gerar microlesões ósseas. Quando não há tempo suficiente para que haja a remodelagem óssea nessa microlesão, ela vai se agravando, podendo levar, em casos mais sérios, a uma fratura completa. TEMA 3 – BIOMECÂNICA DO MÚSCULO ESQUELÉTICO O músculo é o único tecido capaz de gerar tensão ativamente. Assim, os músculos têm importantes funções no corpo humano, como manter a postura ereta, movimentar o esqueleto apendicular e absorver impactos. Em relação ao esporte e ao exercício, os músculos são essências para realizarem os movimentos. Por isso, precisamos entender os fatores que afetam a produção de força muscular. 3.1 Estrutura do músculo esquelético Para o melhor entendimento da biomecânica do músculo esquelético, vamos relembrar a estrutura do músculo esquelético. O músculo esquelético é envolto por um tecido conjuntivo externo chamado de epimísio, que o mantém unido. Abaixo do epimísio, há pequenos feixes de fibras, os fascículos, que são envoltos por uma bainha chamada de perimísio. No fascículo, há várias fibras musculares individuais, envoltas pelo endomísio. Cada fibra muscular tem várias miofibrilas. As miofribrilas aparecem como longas faixas estriadas, ou seja, apresentam faixas escuras e claras. Essas pequenas seções claras de uma miofibrila entre duas linhas Z (faixa escura) são chamadas sarcômeros. Estes são as estruturas contráteis básicas do músculo. 9 A tensão ativa dos músculos como um todo ocorre pela interação de duas proteínas contráteis nos sarcômeros: actina e miosina. A actina é um filamento fino de proteínas nos sarcômeros de uma miofibrila, enquanto a miosina é o filamento mais espesso de proteínas de uma miofibrila. As pontes cruzadas entre miosina e actina são fixadas com a energia química armazenada de trifosfato de adenosina (ATP). A direção das fibras musculares pode fazer com que o músculo seja capaz de gerar mais ou menos força. Músculos com fibras em paralelo,alinhadas paralelamente ao eixo longitudinal do músculo, como o reto abdominal, o sartório e o bíceps braquial, favorecem a amplitude de movimento sobre o desenvolvimento da força. Músculos com fibras penadas, alinhadas em um pequeno ângulo (geralmente inferior a 15º), podem gerar maior tensão, mas com menor amplitude de movimento. O tibial posterior e o semimembranoso são exemplos de músculos principalmente unipenados, enquanto o reto femoral e o gastrocnêmio são bipenados. Um exemplo de músculo multipenado é o deltoide. 3.2 Ações musculares Agora que relembramos sobre a estrutura do músculo esquelético, vamos estudar sobre as ações musculares. Essencialmente, o músculo é capaz de realizar três tipos de ação muscular: isométrica, concêntrica e excêntrica. 1. Isométrica: quando ocorre tensão muscular, porém não há mudança no comprimento do músculo. 2. Concêntrica: quando ocorre tensão muscular, com o encurtamento das fibras musculares. 3. Excêntrica: quando ocorre tensão muscular, com o alongamento das fibras musculares. Quando a tensão muscular é gerada, os músculos que passam pela articulação que realizará o movimento são ativados e apresentam papéis diferentes, dependendo do movimento realizado. O músculo que contrai e produz o movimento do segmento é chamado de agonista, pois está promovendo a ação muscular. Mais de um músculo pode ser agonista do movimento, por isso podem ser chamados de agonistas primários e agonistas assistentes. Um exemplo é a flexão do cotovelo, na qual os músculos braquial e bíceps braquial são os agonistas primários, enquanto os músculos 10 braquiorradial, pronador redondo e extensor radial longo do carpo agem como agonistas assistentes. O músculo que age opostamente ao agonista é chamado de antagonista. Esses músculos realizam ação excêntrica ao mesmo tempo que os agonistas realizam ação concêntrica e atuam desacelerando ou interrompendo o movimento. Portanto, os agonistas e os antagonistas estão posicionados em lados opostos da articulação. Voltando ao exemplo da flexão de cotovelo, enquanto os músculos braquial e bíceps braquial são os agonistas, o músculo tríceps braquial age como antagonista, realizando uma tensão resistiva ao movimento. Os músculos também podem realizar a estabilização de um movimento. Nesse caso, são chamados de estabilizadores. Estes podem estabilizar uma parte do corpo contra uma força interna ou uma força externa. Um exemplo é o movimento de abdução do ombro, em que o músculo supraespinhoso realiza a ação estabilizadora da cabeça do úmero. Por fim, os músculos podem exercer ação neutralizadora. Os neutralizadores previnem ações indesejadas quando o agonista realiza o movimento. Quando o músculo braquial realiza ação agonista para a flexão do cotovelo, ele produz tanto a flexão do cotovelo quanto a supinação do antebraço. No entanto, apenas a flexão de cotovelo é desejada, assim o músculo pronador redondo age como neutralizador para não haver a supinação do antebraço. 3.3 Relação entre força e velocidade A relação entre força e velocidade explica como a força do músculo ativado maximamente varia com a velocidade. Assim, essa relação não se aplica às ações musculares das atividades da vida diária. A força ou a tensão que um músculo pode gerar é muito diferente em cada ação muscular e nas muitas velocidades de movimento. A curva da relação entre força e velocidade afirma essencialmente que a força do músculo diminui com o aumento da velocidade de encurtamento (ações concêntricas), enquanto a força do músculo para resistir o movimento aumenta com o aumento da velocidade de alongamento (ações excêntricas). Isso mostra que não é possível os músculos produzirem grande quantidade de força com alta velocidade de encurtamento. Ainda, a relação inversa entre produção de força e velocidade de encurtamento está relacionada 11 ao treinamento de potência muscular. Quanto maior a carga do treinamento, menor a velocidade de encurtamento. Assim, treinamentos de potência usualmente têm uma carga menor, comparada ao treinamento para ganho de força, para que o atleta consiga realizar o movimento com alta velocidade. 3.4 Relação entre comprimento e tensão O comprimento muscular também afeta a capacidade do músculo em gerar força. A relação entre comprimento e tensão diz respeito a como a tensão muscular isométrica varia com diferentes comprimentos do músculo (Smith; Weiss; Lehmkuhlet, 1997). O músculo só consegue realizar força isométrica máxima quando o músculo está em seu comprimento de repouso, ou seja, nem encurtado nem estendido. Assim, pode-se afirmar que para contração isométrica máxima será reduzida se o músculo não estiver em sua posição de repouso. 3.5 Ciclo alongamento-encurtamento O músculo consegue gerar maior tensão quando ele é alongado logo antes do encurtamento. Ou seja, conseguimos gerar mais força quando há uma ação excêntrica imediatamente antes da ação concêntrica. Os mecanismos para que isso aconteça não são completamente entendidos, porém sabe-se que a capacidade elástica do músculo tem relação com o ciclo alongamento-encurtamento. O efeito do recuo elástico do músculo alongado ativamente (ação excêntrica) aumenta a produção de força. Assim, o treinamento excêntrico aumenta a capacidade muscular de armazenar e retornar mais energia elástica (Reich et al., 2000). Um exemplo de treinamento com ciclo alongamento-encurtamento é o treino pliométrico. Quando as relações entre força e velocidade, comprimento e tensão e ciclo encurtamento-alongamento não são respeitadas, ou seja, utiliza-se maior carga para a ação muscular desejada, ou então uma velocidade de movimento muito maior, podem haver lesões. As lesões mais comuns são rupturas musculares, quando há estiramento excessivo da musculatura; contusões, causadas por forças compressivas prolongadas durante impactos, que levam a hematomas musculares; e síndrome compartimental, uma hemorragia ou edema 12 de um compartimento muscular, devido a uma lesão ou esforço muscular excessivo (Hall, 2016). 3.6 Método de medição de atividade muscular Quando os músculos geram tensão, produzem uma corrente ou voltagem que pode ser detectada. O método que consegue mensurar a atividade muscular é a eletromiografia. Esta é utilizada para estudar a função neuromuscular, qual musculatura gera tensão em um movimento, se há cocontração muscular (agonista e antagonista), a intensidade da contração muscular, a duração da contração muscular, podendo, assim, indicar ocorrência de fadiga muscular. TEMA 4 – ANÁLISE CINEMÁTICA Agora que aprendemos sobre o que é biomecânica e a biomecânica dos ossos e dos músculos esqueléticos, que são responsáveis por realizar os movimentos, vamos discutir sobre como avaliar e analisar um movimento, levando em consideração o tempo e o espaço. 4.1 O que é cinemática? A cinemática refere-se à descrição dos movimentos, independentemente das forças que agem sobre o corpo humano. É uma avaliação quantitativa do movimento, que leva em consideração deslocamentos lineares, angulares, de velocidade e de aceleração. Ou seja, podemos obter as variáveis de posição, velocidade linear, aceleração linear, o ângulo de um segmento, velocidade angular e aceleração angular. Essa avaliação pode ser realizada em um plano cartesiano de duas dimensões (2D) ou de três dimensões (3D). 4.2 Métodos de medição da cinemática A cinemetria é associada a procedimentos de natureza ótica, ou seja, a partir de imagens obtidas por meio de fotografias, filmes, películas, ou, então, a partir de métodos mais modernos, como imagens digitais, obtidas com câmeras conectadas a computadores. Para utilizar a cinemetria, alguns passos devem ser seguidos. Os pontos anatômicos relacionados ao movimento a ser realizado devem ser marcados, para que apareçam nas imagens. Logoapós, precisamos calibrar o espaço onde será realizado o movimento, isto é, definir um plano 2D 13 ou 3D. Para isso, definimos um ponto 0 e a distância e altura que vamos filmar. O sistema de vídeo fornecerá, então, os parâmetros cinemáticos necessários para a avaliação do movimento em relação ao tempo e ao espaço. Esse método pode ser utilizado em escolas, academias, centros de treinamento e em laboratórios de biomecânica. A antropometria é o método de medição do corpo e dos membros, em relação a sua massa, comprimento, diâmetro. Para qualquer avaliação cinemática, é necessário que as medidas antropométricas sejam de qualidade para obter acurácia nos resultados da análise cinemática. A avaliação cinemática, se realizada adequadamente, pode nos fornecer muitos parâmetros para melhorar a performance de um atleta ou para melhorar a caminhada de um idoso, para diminuir seu risco de quedas. Um exemplo da avaliação cinemática no esporte é o ângulo da inclinação anterior do tronco na saída do bloco de corredores de 100 metros. O ideal é manter a inclinação do ângulo de partida e aos poucos elevar a inclinação do tronco, alcançando a posição de corrida somente após os 20 ou 30 metros, dependendo da capacidade de aceleração do corredor. Se o corredor não consegue manter a inclinação do tronco até 30 metros, a análise consegue detectar e direcionar o treinamento para a melhora da performance. O mesmo tipo de análise pode ser feito dentro de uma academia para analisar se os movimentos realizados estão corretos, podendo diminuir, assim, o grau de lesão dos praticantes. TEMA 5 – ANÁLISE CINÉTICA Por fim, discutiremos sobre a avaliação das forças que agem sobre o corpo humano durante a realização de um movimento. 5.1 O que é cinética? A cinética refere-se ao estudo das forças que agem sobre o corpo humano durante a realização do movimento. É uma avaliação quantitativa das forças, que leva em consideração a força (linear) e o torque (angular). A cinética leva em conta os princípios das três leis de Newton, a Lei da Inércia, a Lei da Aceleração e a Lei da Ação e Reação. Tanto forças internas quanto forças externas agem sobre o corpo humano durante o movimento. As forças externas incluem a força da gravidade, que age 14 de cima para baixo sobre o nosso centro de massa; a força de reação do solo e deslocamento do centro de pressão, que estão distribuídas abaixo da área dos pés. As forças internas incluem as próprias forças musculares, que geram tensão dos tendões, movimentando as alavancas, e as forças dentro da articulação, causada principalmente pelos ligamentos. Essas forças geram torques nas articulações, chamados de momentos articulares. 5.2 Métodos de medição da cinética A dinamometria é o método utilizado para mensurar forças. Para poder mensurar a força, é necessário um dinamômetro. Existem vários tipos de dinamômetros. Para avaliar a força de preensão manual, é utilizado um dinamômetro de mão hidráulico. Um dinamômetro dorsal hidráulico é utilizado para avaliar a força da coluna lombar. Também pode ser utilizada uma célula de carga, que consegue mensurar a força realizada em volts. Outro equipamento, muito utilizado por atletas de futebol, é o dinamômetro isocinético. Com ele pode ser mensurada a ação concêntrica, excêntrica e isométrica, a potência, o trabalho, a razão de força entre o músculo agonista e antagonista, de maneira rápida e segura. Quando está sendo avaliada uma ação concêntrica ou excêntrica, o dinamômetro isocinético controla a velocidade angular do movimento. Quanto menor a velocidade angular, mais forte e mais lento é o movimento. Quanto maior a velocidade angular, mais fraco e rápido é o movimento. Outro equipamento é a plataforma de força. Com ela, pode ser mensurada a força de reação do solo, tanto em saltos quanto em uma caminhada, a pressão plantar e o deslocamento do centro de pressão, variável importante que avalia o equilíbrio postural. A força de reação do solo, que pode ser mensurada pela plataforma de força, é importante porque contém informações quantitativas das características da marcha, as quais refletem os efeitos das forças internas e externas durante a caminhada. Alterações no padrão de movimento podem ser identificadas. Essas alterações podem ter relação com lesões nos ligamentos dos joelhos, presença de doenças osteoarticulares, hemiplegia, entre outros. A partir da identificação dessas alterações, treinamentos podem ser prescritos para melhorar o padrão de movimento. 15 NA PRÁTICA Um homem de 42 anos, que realiza exercício físico de musculação três vezes por semana, contrata você, um personal trainer, para melhorar seu rendimento na academia e relata que sente dor na região da coluna lombar após realizar os exercícios de agachamento livre com barra. Qual(ais) avaliação(ões) você realizaria com esse aluno? Por quê? FINALIZANDO A biomecânica é uma disciplina importante para a descrição, a avaliação e a análise do movimento humano. Foi visto que o entendimento sobre a biomecânica dos ossos e dos músculos esqueléticos são essenciais para a realização de um movimento, além de entender como avaliar e analisar esse movimento. Na educação física as análises de movimento podem identificar padrões de movimentos deficientes, que podem levar a lesões ósseas e musculares, além das forças internas e externas que agem sobre o movimento. Essas alterações identificadas pela cinemática e pela cinética são parâmetros que podem e devem ser melhorados com o treinamento e o exercício físico, tanto em atletas, para melhorar a performance, quanto em praticantes de exercício, para evitar lesões ou tratar lesões já existentes, além de melhorar os padrões de movimento, para obter melhores resultados com o exercício. 16 REFERÊNCIAS WINTER, D. A. Biomechanics and motor control of human movement. 4. ed. New Jersey: Wiley, 2009. HALL, S. J. Biomecânica básica. 7. ed. Rio de Janiero: Guanabara Koogan, 2016. KNUDSON, D. Fundamentals of biomechanics. 2. ed. New York: Springer, 2007. REICH, T. E. et al. Is the spring quality of muscle plastic? Am J Physiol., v. 278, n. 6, p. 1661-1666, 2000. SMITH, L. R.; WEISS, E. L.; LEHMKUHL, L. D. Cinesiologia clínica de brunnstrom. Barueri, SP: Manole, 1997.
Compartilhar