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2 5 - O MÉTODO DAS CIÊNCIAS HUMANAS - Filosofando

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O artista norte-americano Calder inventou a escultura em 
movimento, chamada rnóbile. O conjunto de materiais e cores 
se agita de acordo com a intensidade do vento, mudando 
constantemente suas formas. Pela irnprevisibilidade, a escultura de 
Calder tem corno objetivo proporcionar surpresa e prazer. Por isso 
deve ser apreciada no seu todo, e não em partes. 
Também em relação à natureza é necessário esforço para 
conhecê-la e para captá-la em seu movimento. É o que nos fez ver 
Hegel, Marx e cientistas corno Darwin. 
Nas ciências humanas, a disposição de avaliar o todo e a 
atenção para com a irnprevisibilidade dos comportamentos são 
fundamentais para que o método adotado tenha em vista não 
apenas explicar, mas compreender. 
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D Explicar e compreender 
Embora a discussão a respeito da natureza 
humana tenha sido constante nas reflexões dos 
filósofos, apenas no século XIX as ciências huma-
nas começaram a se desligar da filosofia, bus-
cando seu próprio método. Surgiu, então, um 
problema: como abordar essas questões com 
objetividade? Testando hipóteses pela experi-
mentação? Generalizando observações até des-
cobrir leis gerais? Não é necessário muito esforço 
para perceber quais seriam as dificuldades diante 
da especificidade desse novo objeto das ciên-
cias: o ser humano. Estudar esse "objeto", na sua 
complexa individualidade, liberdade e consciên-
cia moral, não é o mesmo que investigar o que é 
uma "coisa". 
Diante disso, o filósofo alemão Wilhelm Dilthey 
(1833-1911) aprofundou o debate sobre o que cha-
mava de "ciências do espírito", afirmando que 
explicamos a natureza, mas compreendemos a vida 
psíquica. 
A explicação é, em grande parte causal, isto é, 
explica-se um fato indicando sua causa, ou seja, 
estabelecendo a lei ou as leis causais. Foi assim que 
Galileu chegou à lei da queda dos corpos e Newton 
à teoria da gravitação universal. 
A compreensão depende de interpretação, encon-
tra-se vinculada com a intencionalidade dos atos 
humanos, sempre voltados para motivações diver-
sas, valores e finalidades, já que o ser humano é 
consciente de si. 
Na mesma direção afirma o filósofo finlandês 
Von Wright: 
Compreendem-se os objetivos e propósitos 
de um agente, o significado de um signo ou de um 
símbolo, o sentido de uma instituição social ou 
de um ritual religioso. Esta dimensão intencional 
ou , como também seguramente se poderia 
dizer, esta dimensão semâptica da compreensão 
chegou a exercer um papel relevante na discussão 
metodológica mais recente. 1 
No entanto, nem todos pensam como Dilthey, 
e essas duas tendências marcaram as orientações 
assumidas pelos cientistas das ciências humanas, 
como veremos adiante. Antes, porém, levantare-
mos alguns aspectos relevantes da especificidade 
do conhecimento sobre o ser humano. 
fJ Düiculdades metodológicas 
das ciências humanas 
Enquanto as ciências da natureza têm como 
objeto algo que se encontra fora do sujeito que 
conhece, as ciências humanas têm como objeto o 
próprio sujeito cognoscente. Podemos, portanto, 
imaginar as dificuldades da economia, da sociolo-
gia, da psicologia, da geografia humana, da história 
para estudar com isenção aquilo que diz respeito ao 
próprio sujeito tão diretamente. 
Vejamos quais são as dificuldades enfrentadas 
pelas ciências humanas ao buscarem estabelecer 
seu método. 
O ser humano não é uma coisa que sej a explicada na 
sua generalidade. Mesmo um clone constituiria outro 
indivíduo, singular, com uma história personalíss ima. 
a) Complexidade 
A complexidade dos fenômenos humanos, sejam 
psíquicos, sociais ou econômicos, resiste às tenta-
tivas de simplificação. Em física, por exemplo, ao 
estudar as condições de pressão, volume e tempe-
ratura, é possível simplificar o fenômeno tornando 
constante um desses fatores. O comportamento 
humano, entretanto, resulta de múltiplas influên-
cias, como hereditariedade, meio, impulsos, dese-
jos, memória, bem como da ação da consciência e 
da vontade, o que o torna extremamente complexo. 
Já pensou o que significa avaliar a motivação do voto 
dos cidadãos numa eleição? Ou explicar o fenômeno 
do linchamento ou da vaia? Ou examinar as causas 
que determinam a escolha da profissão? 
> Semântico. Relativo à significação. 
1 WRIGHT, Georg Henrik von. Explicación y comprensión. Madrid: Alianza, 1980. p. 24. 
O método das ciências humanas Capítulo 32 
b) Experimentação 
A experimentação é possível para determinadas 
ciências humanas, mas é sempre difícil identifi-
car e controlar os diversos aspectos que influen-
ciam os atos humanos. Além disso, a natureza 
artificial dos experimentos controlados pode fal -
sear os resultados. A motivação dos sujeitos tam-
bém é variável, e as instruções do experimentador 
podem ser interpretadas de maneiras diferentes. 
Do mesmo modo, a repetição do fenômeno altera 
os efeitos, já que o indivíduo, como ser afetivo e 
consciente, nunca vive uma segunda situação de 
maneira idêntica à anterior. 
Certos experimentos oferecem restrições de cará-
ter moral, por não ser lícito submeter o ser humano 
a situações que ponham em risco sua integridade 
física, psíquica ou moral. Por exemplo: as reações 
de pânico num grupo de pessoas presas numa sala 
em chamas só podem ser objeto de apreciação even-
tual no caso de ocorrer o acidente. Jamais a situação 
poderia ser provocada para o estudo. 
u PARA REFLETIR 
O psicólogo John Calhoun fez uma experiência colo-
cando ratos em uma gaiola e deixando-os procriar 
até que se criasse uma superpopulação. Observou, 
então, que eles se tornavam agressivos, atacavam-se 
sexualmente, matavam-se e até se canibalizavam. 
Seria possível transpor por analogia essa experiên-
cia para os seres humanos? Que características pro-
priamente humanas poderiam ser contrapostas a 
uma vida puramente animal? 
Também é preciso saber de que constatações 
está se partindo: se da observação do comporta-
mento exterior do indivíduo ou de seu relato sobre o 
que sentiu, a chamada técnica de introspeccão. Esse 
procedimento é descartado por aqueles que julgam 
que esses dados não são confiáveis, pois podem ser 
falseados por mentiras ou involuntariamente. 
lY ETIMOLOGIA 
Introspecção. Do latim intro, "para dentro", e spec-
tare, "olhar": olhar para dentro. 
c) Matematização 
Se a passagem da física aristotélica para a física 
clássica de Galileu deu-se pela transformação das 
qualidades em quantidades, poder-se-ia concluir 
que a ciência será tão rigorosa quanto mais ela for 
matematizável. Ora, esse ideal é problemático com 
relação às ciências humanas, cujos fenômenos são 
Filosofia das ciências 
essencialmente qualitativos. Por isso, quando é pos-
sível aplicar a matemática, são utilizadas técnicas 
estatísticas, com resultados sempre aproximativos 
e sujeitos a interpretação. 
Composição com vermelho, amarelo e azul, 1939-1942. 
Piet Mondrian. Nesse quadro do pintor holandês Mondrian, 
vemos a matematização do espaço. O pintor buscou as 
formas mutáveis e puras da natureza e transformou-as 
em formas geométricas permanentes. 
d) Subjetividade 
As ciências da natureza aspiram à objetividade, 
que consiste na descentração do sujeito no pro-
cesso de conhecer, na capacidade de lançar hipó-
teses testáveis por todos, mediante instrumentos 
de controle, e na descentração das emoções e da 
própria subjetividade do cientista. Mas, se o sujeito 
que conhece é o objeto que se quer conhecer, parece 
ser difícil contornar a subjetividade, porque o ser 
humano não é estranho para outro ser humano. 
Imagine como interpretar fatos históricos enquanto 
estão sendo vivenciados ou analisar uma família 
quando se faz parte dela. 
e) Liberdade 
Se algumas leis das ciências da natureza supõem 
o determinismo - ou seja, na natureza tudo o que 
existe tem uma causa - , como fica a questão da liber-
dade humana? As regularidades na natureza tornam 
possível estabelecer leis e por meio delas prever a 
incidência de um fenômeno. Como issoseria possí-
vel, se admitirmos a liberdade humana? Mesmo se 
concordamos que o ser humano sofre condiciona-
mentos, estes seriam da mesma natureza e intensi-
dade dos que ocorrem com os seres inertes? 
Li~ PARA SABER MAIS 
Sobre a liberdade, consultar capítulo 19, "Podemos 
ser livres?". 
Essas dificuldades não foram levantadas para 
provar a inviabilidade de as disciplinas humanas se 
constituírem em ciências, pois elas aí estão, encon-
trando seu espaço. Apenas pontuamos as diferenças 
entre as ciências da natureza e as ciências humanas 
e como o modo de enfrentar essas dificuldades tem 
determinado o tipo de metodologia que cada uma 
delas adota. Ou seja, o método utilizado depende, 
de certa maneira, dos pressupostos filosóficos que 
embasam a visão de mundo do cientista. 
IJ O nascimento das ciências 
humanas 
Diferentemente das c1encias da natureza, as 
ciências humanas demoraram mais tempo para se 
tornarem autônomas, o que começou a ocorrer no 
final do século XIX. 
A questão que se colocou para os primeiros estu-
diosos foi o fundamento epistemológico: o que é este 
objeto que se pretende conhecer? E em seguida: que 
método usar para alcançar esse objetivo? 
Retomando a questão proposta por Dilthey, ao 
distinguir explicação e compreensão, destacam-se 
duas tendências, a positivista e a hermenêutica, 
que também poderíamos chamar de naturalista e 
humanista. 
m ETIMOLOGIA 
Hermenêutica. Do grego hermeneutiké, "arte de 
interpretar". 
A tendência positivista remonta a Augusto 
Com te e a Stuart Mill (séc. XIX) e influenciou o sur-
gimento das primeiras ciências humanas, cujos 
procedimentos pretendiam ser semelhantes aos 
das ciências da natureza. Além disso, a física mate-
mática, considerada por Comte o exemplo da ciên-
cia positiva, impõe-se como um ideal metodológico. 
Por fim, a tradição positivista tem como princípio a 
explicação causal. Sob esse aspecto, são recusadas 
as explicações teleológicas (finalistas), descartadas 
como não científicas. 
A tendência hermenêutica procede à interpre-
tação do que pensamos conhecer, a fim de decifrar 
o sentido oculto no sentido aparente, o que signi-
fica compreender as peculiaridades únicas de seus 
objetos. Não se trata, porém, de uma tendência 
homogênea, por abrigar pensadores de diferentes 
linhas, mas que procura estabelecer uma metodolo-
gia distinta daquela das ciências da natureza, tendo 
em vista a especificidade do ser humano. 
Li~ PARA SABER MAIS 
Já vimos sobre o pos itivismo no capítulo 15,"A crítica 
à metafísica", e sobre a hermenêut ica, no capítulo 
10, "Ideologias". 
Vejamos como se opõem essas duas tendências 
que marcaram a busca do método, começando pela 
orientação positivista, mas examinando as ideias 
que a ela se ctmtrapõem. 
• A psicologia 
O início da psicologia como ciência foi marcado 
pela tendência positivista, que surgiu na Alemanha, 
no século XIX, com o trabalho de diversos médicos 
que se empenharam em questões relativas à percep-
ção. Tratava-se propriamente de umapsicofisica, em 
que o método visava a quantificar e generalizar a 
relação entre as mudanças do estímulo e os efeitos 
sensoriais correspondentes. 
Dentre esses pesquisadores, destaca-se Wilhelm 
Wundt (1852-1920), que fundou em Leipzig, em 
1879, o primeiro laboratório de psicologia, para rea-
lizar processos de controle experimental. No livro 
Elementos de psicologia fisiológica expõe o conceito 
de método, pelo qual a psicologia imita claramente 
a fisiologia. Por isso Wundt não se aventura a estu-
dar os processos mais complexos do pensamento, 
por considerá-los inacessíveis ao controle experi-
mental. Volta-se para a observação da percepção 
sensorial, principalmente a visão, estabelecendo as 
relações entre os fenômenos psíquicos e seu subs-
trato orgânico, sobretudo cerebral. 
Quanto ao esforço dos primeiros estudiosos 
da psicologia de se restringirem aos fenômenos 
psíquicos - como a percepção visual - , por 
poderem ser quantificados, os filósofos da cor-
rente humanista, sobretudo da fenomenologia, 
respondem que não hájatos com a objetividade 
pretendida, pois não percebemos o mundo como 
um dado bruto, desprovido de significados. Ao 
contrário, o que percebo é um mundo para mim, 
daí a importância do sentido, da rede de signi-
ficações que envolvem os objetos percebidos: a 
consciência "vive" imediatamente como doadora 
de sentido. 
O método das ciências humanas Capítulo 32 
~PARA SABER MAIS 
Para a fenomenologia, toda consciência é intencio-
nal, o que significa que não há pura consciência, 
separada do mundo, pois toda consciência visa ao 
mundo. Do mesmo modo, não há objeto em si, inde-
pendente da consciência que o percebe. Portanto, 
o objeto é um fenômeno (etimologicamente, "algo 
que aparece") para uma consciência. Sobre isso,con-
su lta r o capítulo 16, "A crise da razão". 
A seguir, usaremos a psicologia para exemplifi-
car essas duas tendências metodológicas. Veremos 
a escola comportamentalista norte-americana, fun-
damentada na tendência positivista e, em contrapo-
sição, a psicologia da forma (ou Gestalt) e a psicaná-
lise, que se orientam numa perspectiva humanista. 
9 A psicologia 
comportamentalista 
A psicologia comportamentalista ou behaviorismo 
desenvolveu-se principalmente nos Estados Unidos e 
até hoje é uma das tendências importantes da inves-
tigação científica. Para melhor compreender essa 
corrente, comecemos com o trabalho de Pavlov. 
@ETIMOLOGIA 
Behaviorismo. Do inglês behaviour, "conduta". 
Portanto, estudo do comportamento. 
• Pavlov: o reflexo condicionado 
O médico russo Ivan Pavlov (1849-1936) encon-
trava-se inicialmente interessado no funciona-
mento dos fenômenos da digestão e salivação, mas 
as experiências com cães levaram-no à explica-
ção da aprendizagem pelo reflexo condicionado. 
Observe o esquema: 
Segundo o esquema, observamos que os estí-
mulos não condicionados - no caso, o alimento e 
o som - produzem, respectivamente, um reflexo 
simples imediato, não aprendido. Ou seja, diante do 
alimento, o cão saliva automaticamente; ao ouvir a 
campainha, fica com as orelhas em pé. 
Se associarmos os dois eventos, isto é, sempre 
que apresentar o alimento fazer soar a campainha, 
depois de um tempo, apenas o som provocará sali-
vação, sem a presença do alimento. Isso significa 
que o som, antes um estímulo neutro para a saliva-
ção, passou a ser um estímulo eficaz: criou-se um 
reflexo condicionado, houve aprendizagem. 
O estímulo alimento é chamado reforço positivo, 
pois é ele que torna a reação mais frequente, garan-
tindo a manutenção da resposta. Se o reforço não 
for mais apresentado, a tendência é a extinção da 
resposta, isto é, desfaz-se o reflexo condicionado, e 
o cão não mais salivará ao som da campainha. 
As conclusões de Pavlov impulsionaram estudos 
mais complexos levados a efeito pela psicologia 
comportamentalista. 
• Skinner: o condicionamento operante 
Todos nós sabemos que desde a infância estamos 
submetidos a diversos condicionamentos: aprende-
mos desde o controle da micção, passando pelo con-
trole de reações emocionais como medo e raiva, até 
hábitos como dirigir um carro. Daí ser importante 
conhecer que estímulos são determinantes para a 
aquisição de comportamentos desejados ou para 
a extinção dos indesejados. 
A utilização de animais nessas experiências era um 
recurso frequente porque, por viverem menos, os efei-
tos de certos testes nas diversas fases da vida deles 
podiam ser mais bem observados, assim como a veri-
ficação de eventuais sequelas nas gerações seguintes. 
Além disso, havia possibilidade de lesar órgãos a fim de 
conhecer suas funções. É claro que, depois, as conclu-
sões seriam extrapoladas para a psicologia humana. 
Com isso o behaviorismo pretende atingir o 
ideal positivista pelo qual a psicologia, para se tor-
nar ciência, precisaria seguir o exemplo das ciências 
naturais, tornando-se materialista, mecanicista, 
determinista e objetiva. 
ESTÍMULO 
Alimento 
Reflexo simples- não condicionado 
RESPOSTASaliva 
Som 
Unidade 6 
Reflexo simples- não condicionado 
Filosofia das ciências 
"Aprumar" 
as orelhas 
O ps icó logo Burrhur Skinner fazendo experiência 
com rato na "cai xa de Ski nner", 1964. 
Na "caixa de Skinner" é colocado um 
animal faminto: depois de, casualmente, 
esbarrar diversas vezes em uma alavanca, 
percebe que o alimento aparece sempre que 
a aciona; assim, realiza a associação entre 
alavanca e alimento. Apertar a alavanca é 
a resposta, dada antes do estimulo, que é o 
alimento. Skinner criou inúmeras variantes 
dessas caixas, inclusive aquelas em que o 
animal age visando a evitar uma punição, 
corno saltar para outro local depois de 
"avisado" por um sinal luminoso ou sonoro, 
antes que um choque elétrico seja acionado. 
São abandonadas todas as discussões a respeito 
da consciência, conceito filosófico considerado 
impróprio para uso científico. A introspecção é 
rejeitada, e o único objeto digno de estudo é o com-
portamento, em toda sua exterioridade. Os com-
portamentalistas costumam se referir à consciên-
cia como uma "caixa-preta'', inacessível ao conheci-
mento científico. 
O primeiro representante da psicologia compor-
tamentalista foi o norte-americano John B. Watson 
(1878-1938), que lhe deu o nome de behaviorismo. 
Após Watson, o behaviorismo alcançou novo 
impulso com Burrhur Frederic Skinner (1904-1990), 
que, a partir de experiências com ratos e pombos, 
estabeleceu as leis de um tipo de condicionamento 
mais complexo do que o clássico ou pavloviano. 
Trata-se do condicionamento instrumental, também 
chamado operante ou skinneriano. 
O reflexo condicionado pavloviano - também 
chamado respondente - é determinado pela asso-
ciação entre um estímulo externo ao qual se segue 
uma resposta, aprendida por meio de contiguidade, 
expresso por E-R (estímulo-resposta). No exemplo 
dado, o som, associado à comida, provoca a sali-
vação. Trata-se de um comportamento reflexo ou 
involuntário. 
O condicionamento operante é determinado por 
suas consequências - e não por um estímulo que o 
precede. Por exemplo, um bebê esbarra casualmente 
em um brinquedo que emite sons; após perceber 
outras vezes o mesmo efeito, passa a tocá-lo inten-
cionalmente, para ouvir o som. Nesse caso, a criança 
aprendeu um novo comportamento, por meio de 
um reforço: sempre que tocava no brinquedo, tinha 
o prazer de ouvir o som. 
Campos de aplicação 
As descobertas de Skinner foram amplamente 
utilizadas nos Estados Unidos em diversos campos 
da atividade humana. Por exemplo, a instrução pro-
gramada: o aluno recebe um texto com uma série 
de espaços em branco para serem preenchidos em 
nível crescente de dificuldade. Partindo do princípio 
de que o reforço deve ser dado a cada passo do pro-
cesso e imediatamente após o ato, a cada momento 
o aluno pode conferir o erro ou acerto de sua res-
posta. O processo foi aperfeiçoado na "máquina de 
ensinar", que substitui o professor em várias etapas 
da aprendizagem. 
ltil PARA SABER MAIS 
A chamada educação tecnicista, implantada no 
Brasil durante a ditadura militar, tinha or ientação 
positivista e baseava-se nos ideais de organização, 
objetividade, eficiência e produtividade. O plane-
jamento deveria definir objetivos instruciona is e 
operacionais rigorosamente esmiuçados, estabe-
lecendo o ordenamento sequencial das metas a 
serem atingidas. 
O processo de condicionamento também é uti-
lizado nas empresas, com o intuito de estimular o 
aumento da produção. A cada meta atingida, atri-
buem-se pontos, que são acumulados e transforma-
dos em benefícios para os considerados melhores. 
As técnicas skinnerianas usadas na educa-
ção familiar visam a criar bons hábitos e corrigir 
O método das ciências humanas Capítulo 32 
comportamentos, como reeducar uma criança 
manhosa, descondicionando a resposta manha para 
substituí-la por outro comportamento socialmente 
desejado. 
No tratamento psicológico de certos comporta-
mentos, a terapia comportamental ou reflexologia 
visa a descondicionar os maus hábitos, levando, por 
exemplo, um alcoólatra a deixar de ingerir bebida 
alcoólica. 
No filme Laranja mecânica, de 1971, o diretor Stanley 
Kubrick critica o behaviorismo, ao mostrar o processo 
de descondicionamento de um indivíduo violento: ele é 
induzido quimicamente a ter náuseas enquanto assiste 
a cenas de violência. Os terapeutas comporta mentais 
discordam desse método, explicando que ele, além 
de ser baseado no pouco eficiente condicionamento 
pavloviano, não costuma ser usado por questões éticas. 
Uma obra de ficção 
Além de obras científicas, como Ciência e compor-
tamento humano, Skinner escreveu o romance Walden 
!!, uma utopia em que todos os atos humanos seriam 
cientificamente planejados e controlados. Nesse 
mundo ideal, as pessoas são felizes, porque orientadas 
por técnicos e cientistas que cuidam para que todos 
queiram fazer precisamente o que é melhor para si 
mesmos e para a comunidade. Nos diálogos travados 
entre os visitantes e o personagem que representa um 
dos idealizadores do sistema (chamado Frazier, o E 
~&1. de Skinner), as indagações sobre determinismo e 
liberdade são criticadas como pseudo-questões de ori-
gem linguística. Assim diz Frazier: 
Planejei Walden li- não como um arquiteto planeja 
uma construção, mas como um cientista planeja um 
experimento de longa duração, incerto das condições 
que irá encontrar, mas sabendo como lidar com elas, 
quando as encontrar. Num certo sentido, Walden li 
é predeterminada, mas não como é determinado 
o comportamento de uma colmeia. A inteligência, 
não importa quanto seja modelada e ampliada por 
nosso sistema educacional , ainda funcionará como 
inteligência. Será usada para descobrir soluções para 
problemas, aos quais uma colmeia rap idamente 
sucumbiria. O que o plano faz é manter a inteligência 
no caminho certo, antes para o bem da sociedade do 
que para o indivíduo inteligente. 
Mais adiante, afirma: 
Eu nego que liberdade sequer exista. Devo 
negá-lo, ou meu programa seria absurdo. Não se 
pode ter uma ciência sobre um assunto que sa lte 
caprichosamente. Talvez não possamos nunca provar 
que o homem não é livre; é uma suposição. Mas o 
sucesso crescente de uma ciência do comportamento 
torna isto cada vez mais plausível.2 
D A psicologia da forma 
Os teóricos da psicologia da forma, ou Gestalt, 
sofreram explicitamente a influência da fenomeno-
logia e, nesse sentido, opõem-se às psicologias de 
tendência positivista. Seus principais representan-
tes foram os alemães Wolfgang Kê:ihler (1887-1967) 
e Kurt Koffka (1886-1941). 
• A percepção 
A psicologia derivada da tendência empirista 
reduzia a percepção a uma análise rigorosa, até 
encontrar o "átomo'' psíquico fundamental. O mundo 
percebido seria inicialmente uma grande confusão 
de sensações, cujos fragmentos se organizariam tra-
balhosamente pelo processo de associação, da qual 
resultam por fim as percepções e depois as ideias. 
Os gestaltistas, em oposição, afirmam que não há 
excitação sensorial isolada, mas complexos em que 
o parcial é função do conjunto. Isso significa que o 
objeto não é percebido em suas partes, para depois ser 
organizado mentalmente, mas se apresenta primeiro 
na totalidade (na sua forma, na sua configuração), e 
só depois o indivíduo atentará para os detalhes. 
O conjunto é mais que a soma das partes, e cada 
elemento depende da estrutura a que pertence. 
Quando ouvimos uma melodia, não percebemos 
inicialmente as notas de que ela se compõe: por isso 
podemos reconhecê-la mesmo se a ouvimos com 
todas as notas diferentes, se transposta para outro 
tom. No entanto, se uma só nota é alterada, altera-se 
2 SKINNER, Burrhus. Walden 11: uma sociedade do futuro. São Paulo: EPU, 1975. p. 252 e 255. 
Unidade 6 Filosofia das ciências 
o todo. Na transposição para outro tom, a estrutura 
da melodia permanece a mesma, mas se mudamos 
uma nota há alteração estrutural. 
No dia a dia encontramos inúmeros exemplos 
da tendência à configuração: sempre identificamosformas nas nuvens (rosto, cachorro, dragão ... ); as 
constelações representam a cruz, o escorpião; reco-
nhecemos um rosto familiar, mas longe dele mui-
tas vezes não nos lembramos bem dos detalhes. Já 
pensaram como é difícil descrever alguém para um 
retrato falado? Isso porque percebemos o rosto no 
seu conjunto, e não nos detalhes. 
A tendência para organizar aquilo que é perce-
bido significa a impossibilidade de apreender o fato 
bruto, pois o objeto é elaborado e nunca aparece 
na percepção como algo em si. O sujeito estrutura 
organicamente o que está apenas justaposto ou leva 
à perfeição formas apenas esboçadas. 
• O comportamento 
Tudo o que dissemos sobre a percepção vale para 
o comportamento dos animais e das pessoas: há que 
partir da admissão de um campo total em que o orga-
nismo e o meio entram como dois polos correlativos 
que constituem o verdadeiro ambiente da ação. Assim, 
um mesmo espaço se estrutura de forma diferente se o 
percorro como faminto, fugitivo ou artista. 
Kõhler fez diversas experiências com chimpanzés. 
Numa jaula, o problema de alcançar uma banana ina-
cessível é resolvido pelo chimpanzé quando ele sobe 
em um caixote para pegar a fruta ou quando usa um 
bambu para derrubá-la. Segundo Kõhler, para solu-
cionar o problema, o chimpanzé deve perceber como 
um todo o campo onde se situa, ou seja, ele só tem o 
insight quando estabelece a relação fruta-caixote ou 
fruta-bambu. Dá-se então o "fechamento'', ou seja, a pre-
dominância de uma determinada forma sobre outras. 
" \7 
v 
Na percepção, a Gestalt estuda as figuras ambíguas 
em que, dependendo da função que damos às linhas, 
alteramos a relação entre figura e fundo. No primeiro 
desenho, vemos ora uma taça, ora dois perfis. O segundo 
exemplificao princípio do fechamento, quando se percebe 
um tr iângulo branco sobressaindo, apesar de apenas 
sugerido pelas falhas das outras figuras. 
• A Gestalt terapia 
A Gestaltterapiafoi desenvolvida pelo psicanalista 
alemão Friederich Perls ( 1893-1970 ), mais conhecido 
como Fritz Perls. Adaptou sua formação de origem à 
psicologia da Gestalt e nesse sentido entendia a ação 
humana como uma totalidade, em que ações men-
tais e físicas estão entrelaçadas, assim como o orga-
nismo e o ambiente que o circunda. O ser humano 
é, portanto, um ser de relação. 
Por exemplo, ao observarmos uma sala cheia de 
gente, percebemos o local como uma unidade, nas 
quais alguns aspectos sobressaem enquanto outros 
ficam em segundo plano (conceito de figura e fundo). 
Essa perspectiva pode ser alterada se outros aspectos 
passarem a ser w_gnantes, situação em que a forma 
do ambiente se altera. O que importa é que a cena 
muda, mas é sempre organizada de modo significa-
tivo, dependendo do interesse que desperta em nós. 
Preocupado em privilegiar o que acontece "aqui e 
agora'', Fritz Perls não faz, como Freud, um retorno 
à história passada, mas prefere focar na experiên-
cia de viver no presente. Ciente de que o neurótico 
não se sente como uma pessoa total, a terapia visa a 
recuperar seu sentido de totalidade, já que o equilí-
brio psíquico foi quebrado pela neurose, impedindo 
que o indivíduo se relacione com o meio e se autor-
regule. O tratamento gestáltico consiste em resta-
belecer a capacidade do neurótico de discriminar, 
encaminhando-o para a integração: ao facilitar que 
gestalts inacabadas emerjam à consciência, elas 
poderão ser completadas. 
No Brasil, um dos importantes representantes 
da Gestalt terapia foi o psiquiatra e escritor Roberto 
Freire (1927-2008). 
l'fJ Freud e o inconsciente 
Já examinamos o pensamento de Sigmund Freud, 
fundador da psicanálise, no capítulo 7, "Em busca da 
felicidade". Retomaremos aqui alguns de seus princi-
pais conceitos para examinar os fundamentos epis-
temológicos dessa ciência. 
O conceito psicanálise possui três sentidos: é um 
método interpretativo (hermenêutica), um trata-
mento psicológico (psicoterapia) e uma teoria, ou 
seja, um conhecimento que o método produz. 
A/ter ego. Do latim a/ter, "outro", e ego, "eu": um 
segundo eu; ou seja, o personagem Frazier canaliza o 
pensamento de Skinner. 
Gestalt. Em alemão, "forma", "configuração". 
Pregnância. No contexto, a figura que se destaca. 
O método das ciências humanas Capítulo 32 
QUEM É? 
Sigmund Freud (1856-1939) nas-
ceu em Freilberg, na Morávia, 
região que pertencia ao Império 
Austro-Húngaro. Fez medi-
cina em Viena e trabalhou um 
tempo com o neurologista fran-
Sigmund Freud, 
cês Jean-Martin Charcot, que 1931 _ 
tratava mulheres histéricas por 
meio de hipnose. Escreveu com Joseph Breuer 
Estudo sobre histeria. Abandonou a hipnose pela 
técnica da associação livre e desenvolveu a teo-
ria psicanalítica. Em 1899, publicou A interpretação 
dos sonhos. Escreveu ainda : Psicopatologia da vida 
cotidiana, O chiste e sua relação com o inconsciente, 
Cinco lições de psicanálise, O futuro de uma ilusão, 
Mal-estar na civilização. 
A principal novidade dessa teoria encontra-se 
na hipótese do inconsciente e na compreensão da 
natureza sexual da conduta. A hipótese do incons-
ciente tornou-se fecunda ao permitir compreen-
der uma série de acontecimentos da vida psíquica. 
Para a psicanálise, todos os nossos atos têm uma 
realidade exterior representada na nossa conduta, 
bem como significados ocultos que podem ser 
interpretados. Usando de uma metáfora, podería-
mos dizer que a vida consciente é apenas a ponta 
de um iceberg, cuja montanha submersa simboliza 
o inconsciente. 
A histeria foi uma doença tipica 
do final do século XIX, caracterizada 
por sintomas fisicos, sem causa 
aparente. Pela hipnose, Charcot 
amenizava os sintomas histéricos. 
Freud, que acompanhou suas aulas, 
usou a hipnose por um tempo, até 
resolver que seria melhor manter 
o paciente em estado normal, 
para que ele lhe contasse o que 
"nem ele mesmo sabia", devido à 
repressão de um desejo violento, 
considerado inconciliável com a moral. 
Desenvolveu, então, a teoria de que "os 
histéricos sofrem de reminiscências" 
A energia que preside os atos humanos é de natureza 
pulsional, e Freud põe em relevo a energia de natu-
reza sexual chamada libido. Mas a sexualidade não deve 
ser identificada à genitalidade (ou aos atos que se referem 
explicitamente à atividade sexual propriamente dita); 
seu significado é muito mais amplo, abrangendo toda e 
qualquer forma de gratificação ou busca do prazer. 
IJ As três instâncias 
do aparelho psiquico 
Ao descrever o aparelho psíquico, Freud deli-
mita três instâncias diferenciadas: o id, o ego e o 
superego. 
• O id (do latim, "isto'') constitui o polo pulsio-
nal da personalidade, o reservatório primitivo 
da energia psíquica; seus conteúdos são incons-
cientes, alguns inatos e outros recalcados. 
• O ego (do latim, "eu'') é a instância que age como 
intermediária entre o id e o mundo externo; em 
contraste com o id, que contém as paixões, o 
ego enfrenta conflitos para adequá-las pela 
razão às circunstâncias. Por isso o ego é tam-
bém a sede do superego. 
• O superego (ou supereu) é o que resulta da 
internalização das proibições impostas pela 
educação, de acordo com os padrões da socie-
dade em que vivemos. 
decorrentes do ocultamento de recordações conflituosas e traumáticas. 
Por meio da livre associação, era trazida à tona a memória sepultada. 
Charcot ensinando 
em Salpetriere, Paris. 
Pint ura de P. A. A. 
Brouillet, 1887. 
Independentemente de concordar ou não com a psicanálise, 
comente a importância do autoconhecirnento para uma melhor 
experiência de vida. 
Unidade 6 Filosofia das ciências 
A relação entre essas três instâncias é dinâmica. O 
id orienta-se pelo princípio do prazer e, nesse sentido, 
o curso dos processos mentais é regulado para bus-
car o prazer e evitar a dor. Porém, em contato com as 
normas sociais forma-se o superego, que interioriza 
as forças inibidoras do mundo exterior. O conflito 
entre as duas forças antagônicas- a busca do pra-
zer e a exigência dos deveres - é resolvido pelo ego a 
partirdo princípio de realidade. Ao levar em conta as 
condições impostas pelo mundo exterior, aprende a 
lidar com o desejo, decidindo sobre a conveniência de 
realizá-lo, proibir sua satisfação ou apenas adiá-la. 
Quando o conflito é muito grande e o ego não 
suporta a consciência do desejo, este é rejeitado, o que 
determina o processo chamado repressão. No entanto, 
o que foi reprimido não permanece no inconsciente, 
pois, sendo energia, precisa ser expandido. Reaparece, 
então, sob a forma de sintoma, ou representante do 
reprimido, como substituição para a gratificação ins-
tintiva não atingida. Os sintomas devem ser decifra-
dos na sua linguagem simbólica, já que o simbolismo 
é o modo de representação indireta e figurada de uma 
ideia, conflito ou desejo inconsciente. 
Enquanto os sintomas permanecem obscure-
cidos pelo desconhecimento das causas, tem-se 
como consequência as neuroses ou até desordens 
mais graves. 
• A associacão livre 
' 
Há várias maneiras de sondagem do incons-
ciente, mas, para Freud, os sonhos são a "via régia'', 
o caminho real e privilegiado. O que recordamos 
de um sonho é o seu conteúdo manifesto, mas sob 
esse emedo, que às vezes nos parece incoerente e 
absurdo, há um conteúdo latente, a ser descoberto 
pela decifração do seu simbolismo. Para tanto, Freud 
propõe a técnica da associação livre, pela qual o pró-
prio indivíduo, seguindo o fluxo espontâneo das 
ideias, dá as pistas para descobrir o sentido oculto. 
U' PARA REFLETIR 
Algumas pessoas procuram significados fixos para 
os sonhos, como se houvesse símbolos universais; 
outras têm a expectativa de que cabe ao terapeuta 
interpretar o sonho, quando, na verdade, tudo se ini-
cia das associações feitas pelo próprio sonhador. 
Além dos sonhos, há outros fenômenos psíqui-
cos privilegiados por Freud, como os atos falhos e 
os chistes. 
Freud (sentado, à esquerda), em 1909, na Cla rk University 
(EUA), onde, a convite de Stanley H ali (no centro), 
pronunciou a conferência que marcou o primeiro 
reconhecimento oficial da psicanál ise e se transformaria 
no livro Cinco lições de psicanálise. Sentado, à direita, seu 
discípulo Jung, com quem rompeu posteriormente, e outros 
seguidores: Abraham Brill, Ernest Jones e Sandor Ferenczi. 
Os atos falhos são pequenos deslizes, como 
esquecimentos, troca de nomes ou lapsos de lin-
guagem aparentemente involuntários, mas que 
podem ser interpretados porque "traem" algum 
segredo. Por exemplo: em uma fila para dar pêsa-
mes a alguém, confundir-se com um embaraçoso 
"parabéns". O chiste consiste em gracejos feitos sem 
aparente intenção de ofender ou seduzir, mas que 
revelam forças agressivas ou eróticas reprimidas. 
• Psicanálise e cultura 
Em Mal-estar na civilização, escrito em 1930, 
Freud reflete sobre o efeito da repressão dos instin-
tos agressivos e sexuais e seus resultados na civili-
zação. Pelo conceito de sublimação, Freud já expli-
cara como muito da energia instintiva é desviada de 
maneira produtiva para o trabalho e as artes, tor-
nando possível a civilização - não sem que se impe-
disse a eclosão de um perigoso estado de frustração, 
infelicidade e neurose que acomete o ser humano. 
Conclui com pessimismo que é alto o preço pago 
pelo indivíduo para se tornar civilizado. Assim diz: 
A civilização consegue dominar o perigoso desejo 
de agressão do indivíduo, enfraquecendo-o, 
desarmando-o e estabelecendo no seu interior um 
agente para cuidar dele, como uma guarnição numa 
cidade conquistada 3 
3 FREUD, Sigmund. O mal-estar na civilização. Rio de janeiro: Imago, 1997. p. 83. 
O método das ciências humanas Capítulo 32 
Os homens da cidade. Fernand Léger, 1919. 
O pintor francês Léger foi um dos mais 
proeminentes artistas da primeira metade do 
século XX. Destaca em suas obras a integração 
homem-máquina e frequentemente utiliza 
elementos como circules, elipses, curvas, 
diagonais e retângulos, que aparecem ao 
lado de figuras humanas. Teria sido o avanço 
da ci.vi.lização tecnológica proporcional à 
capacidade humana de ser feliz? 
: Retomando a controvérsia 
Para os fenomenólogos que criticam o uso da 
terapia reflexológica na reeducação de uma criança 
manhosa, a manha não é, ela significa, ou seja, é pela 
emoção que a criança se exprime na totalidade do 
seu ser. Ela diz coisas com o choro, e esse choro pre-
cisa ser interpretado. Do mesmo modo, a resposta 
dada a certos estímulos externos supõe que os pró-
prios estímulos nunca sejam idênticos para todas 
as pessoas, mas que exercem influência de maneira 
singular. À relação mecânica estímulo-resposta, 
estabelecida pelo comportamentalismo, a fenome-
nologia contrapõe o sinal e o símbolo. Enquanto o 
sinal faz parte do mundo físico do ser, o símbolo é 
parte do mundo humano do sentido. 
Os teóricos e terapeutas do comportamentalismo 
contra-argumentam, afirmando que geralmente 
não é usado o condicionamento respondente E-R, 
mas o operante, cuja base experimental permite a 
verificabilidade e a falseabilidade - conforme exi-
gência das concepções empiristas. Nesse sentido, 
dizem preferir soluções pragmáticas e de resulta-
dos a curto prazo e criticam as teorias hermenêu-
ticas por se enredarem em conceitos metafísicos e 
teorias abstratas. 
No caminho percorrido pelas ciências huma-
nas na busca de seu método, vimos que o empenho 
inicial era de conformá-lo aos procedimentos das 
ciências da natureza. Posteriormente, outros estu-
diosos deles divergiram, para garantir a especifici-
dade do objeto investigado e a exigência de métodos 
diferenciados. 
Como resultado, constatamos uma imensa diver-
sidade entre os caminhos adotados pelos cientistas 
sociais e do comportamento, o que os distingue da 
comunidade dos cientistas da natureza. Entre estes 
últimos, embora coexistam teorias diferentes, elas 
são aceitas na medida em que se aplicam a aspec-
tos diferentes dos mesmos fenômenos (como a teo-
ria gravitacional e o eletromagnetismo). O mesmo 
não acontece no âmbito das ciências humanas, em 
que as divergências são mais fundamentais, como 
vimos com relação às tendências positivistas e as 
hermenêuticas. 
Supomos que a distinção feita entre "explicar" 
e "compreender" nos fornece pistas para discutir a 
tentativa de definir os métodos das ciências huma-
nas, diante da especificidade desta última. Como 
diz Gilles-Gaston Granger: 
É limitado o campo em que a visão científica de 
conhecimento pode legitimamente se exercer? 
Devemos traçar fronteiras à ciência? A resposta é 
não, no sentido de que nenhuma razão derivada 
da natureza da ciência obrigue a se del imitar seu 
campo de investigação. No entanto, nem toda 
espécie de fenômeno lhe é igualmente acessível. 
O obstáculo único, mas radical , me parece ser a 
realidade individual dos acontecimentos e dos seres. 
O conhecimento científico exerce-se plenamente 
quando pode neutralizar essa individuação, sem 
alterar gravemente seu objeto, como acontece em 
geral nas ciências da natureza. No caso dos fatos 
humanos, ela [a ciência] se empenha por envolver 
cada vez mais estreitamente o individual em redes 
de conceitos, sem esperar um dia poder atingi-lo.4 
4 GRANGER, Gilles-Gaston. A ciência e as ciências. São Paulo: Hucitec/ Editora Unesp, 1994. p. 113. 
Unidade 6 Filosofia das ciências 
o 
"' ~ 
() 
o 
" ~ 
? Revendo o capitulo 
IJ Faça um quadro comparativo entre "explicação" e 
"compreensão". 
IJ Faça um esquema sobre as di.fi.culdades metodo-
lógi.cas das ci.ênci.as humanas. 
IJ Qual é a di.ferença entre o reflexo condicionado 
respondente e o operante? 
IJ Destaque as pri.nci.pai.s li.nhas da psicanálise. 
? Aplicando os conceitos 
ll A partir da frase de Di.lthey, identifique sua posi-
ção no embate entre as duas orientações meto-
dológi.cas das ci.ênci.as humanas e justi.fi.que sua 
resposta: "Expli.camos a natureza, mas compreen-
demos o homem". 
IJ No texto a segui.r, identifique a orientação de Comte 
e expli.que qual é a consequênci.a dessa afirmacão 
para a escolha do método na psi.cologi.a: "o espi.ri.tohumano pode observar di.retamente todos os fenô-
menos, exceto os seus próprios. Poi.s quem fari.a a 
observação? [. .. ] Ai.nda que cada um tivesse a oca-
sião de fazer sobre si. tai.s observações, estas, evi.-
dentemente, nunca poderiam ter grande i.mportãn-
ci.a ci.entifica. Constitui. o melhor mei.o de conhecer 
as pai.xões sempre observá-las de fora. Portanto 
todo estado de pai.xão mui.to pronunciado, a saber, 
precisamente aquele que será mai.s essencial exa-
mi.nar, necessariamente é i.ncompativel com o 
estado de observação". (Augusto Com te. Curso de 
filosofia positiva. São Paulo: Abri.l Cultural, 1973. 
p. 19-20. Coleção Os Pensadores.) 
IJ A segui.r, transcrevemos doi.s trechos com pressu-
postos antagônicos de psi.cologi.a. Identifique cada 
tendência e critique-as com base nos fundamen-
tos metodológi.cos da orientação oposta. Ou seja, 
à i.denti.fi.cada como posi.ti.vi.sta, faça uma criti.ca 
baseada na fenomenologi.a e vi.ce-versa. 
a) "Trei.nar um soldado é em parte condicionar 
respostas emoci.onai.s. Se retratos do i.ni.mi.go, 
sua bandei.ra etc. forem associados a histó-
rias ou fotografias de atrocidades, uma reação 
agressiva semelhante provavelmente ocorrerá 
quando o i.ni.mi.go for encontrado. As razões 
favoráveis são obti.das em geral da mesma 
maneira. Respostas a ali.mentos apetecíveis 
são facilmente transferidas para outros obje-
tos. [...] O vendedor bem-sucedido é aquele 
que paga bebidas ao seu cliente ou convida-o 
para jantar. O vendedor não está apenas inte-
ressado nas reações gástricas, mas si.m na pre-
disposição favorável do cliente a seu respeito e 
com relação ao seu produto." (Burrhus Ski.nner. 
Ciência e comportamento humano. São Paulo: 
Martins Fontes, 1985. p. 62.) 
b) "Quaisquer que tenham si.do as declarações 
de principio de Freud, as investigações psi-
canaliti.cas resultam de fato não em expli.-
car o homem pela infraestrutura sexual, mas 
em reencontrar na sexuali.dade as relações e 
as atitudes que anteriormente passavam por 
relações e ati.tudes de consciência, e a signifi-
cação da psi.canáli.se não é tanto a de tornar 
biológica a psicologia quanto a de descobrir 
um movimento dialéti.co em funções que se 
acreditavam 'puramente corporais', e reinte-
grar a sexuali.dade no ser humano." (Maurice 
Merleau-Ponty. Fenomenologia da percepção. 
São Paulo: Marti.ns Fontes, 1999. p. 218.) 
? Dissertação 
IJ Elabore uma dissertação a partir do tema: "As feri-
das narcisicas". Freud chamou de "feridas nar-
cisicas" os acontecimentos que desde a moder-
nidade golpearam a autoesti.ma da humanidade: 
com Copérni.co (heli.ocentri.smo) o homem dei.xou 
de estar no centro do Universo; com Darwi.n (evo-
lucionismo), deixou de ser o centro do rei.no ani-
mal; com o próprio Freud (inconsciente), deixou 
de ser o centro de si mesmo. A esses três, pode-se 
acrescentar Marx (luta de classes), com o qual o 
ser humano deixou de ser o centro da história. 
? Seminário 
IJ Em grupo, façam um levantamento das diversas 
ciências humanas e investiguem as características 
de seus métodos. 
Atividades Capítulo 32

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