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A GRIPE ESPANHOLA E SUAS CONSEQUÊNCIAS SOCIAIS NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO EM 1918


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A GRIPE ESPANHOLA E SUAS CONSEQUÊNCIAS SOCIAIS NA
CIDADE DO RIO DE JANEIRO EM 1918: COMO A CIDADE DO RIO
DE JANEIRO REAGIU À EPIDEMIA DA GRIPE ESPANHOLA?
RESUMO
Igor Rosa da Cruz1
A Gripe Espanhola foi uma grave pandemia, cuja origem geográfica, até os dias
atuais é desconhecida, que atingiu todo o mundo no início do século XX, dizimando
milhões de pessoas. A pesquisa ora desenvolvida para a conclusão do curso de
Licenciatura em História, aborda em um primeiro momento questões gerais
envolvendo a gripe espanhola, percebendo como essa pandemia afetou o mundo,
de modo a contextualizar o cenário da epidemia, até que a mesma chegasse ao
território nacional. Em seguida, serão então apresentadas as repercussões
nacionais da pandemia, mostrando como ela chegou e se espalhou pelos estados
da federação. As especificidades da pandemia, trazendo para o debate o que
aconteceu quando a mesma chegou na cidade do Rio de Janeiro fará parte do
terceiro tópico da pesquisa, evidenciando aspectos sociais relacionados à pandemia
e as conseqüências geradas na sociedade da época. A pesquisa realizada fora de
caráter bibliográfico, havendo consultas em materiais diversos, para que a mesma
pudesse ser desenvolvida. Objetiva-se então com o presente texto expor pontos
relevantes acerca dessa pandemia, evidenciando como ela impactou a vida da
população mundial, possuindo como foco seus impactos na cidade do Rio de
Janeiro em 1918.
Palavras-chave: Gripe Espanhola. Pandemia. Rio de Janeiro.
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho de conclusão de curso tem como temática “A Gripe
Espanhola e suas Consequências Sociais na Cidade do Rio de Janeiro em 1918”,
trazendo em seu corpo diversos conceitos e fatos históricos, apontando como
pandemia chegou ao Brasil e como ela se instalou, mais especificamente, na cidade
do Rio de Janeiro, como a mesma se encerrou e quais as consequências de cunho
social que foram sentidas no período.
Para tanto a pesquisa está estruturada em três tópicos de fundamentação
teórica. O primeiro revela informações importantes acerca da Gripe Espanhola, a fim
1 Aluno Concludente do Curso de Licenciatura em História
de compreender a respeito da origem da doença e como ela conseguiu alcançar o
mundo, causando milhões de mortes, conseguindo, inclusive, superar os números
de mortos da própria Primeira Guerra Mundial.
O segundo tópico versa, de maneira sucinta, acerca da chegada dessa
doença em solo brasileiro, evidenciando como ela chegou e como ela conseguiu
alcançar diversas unidades da federação, trazendo contaminação e mortes para um
número significativo de brasileiros.
No terceiro tópico será apresentado todo o panorama da cidade do Rio de
Janeiro no ano de 1918, quando a Gripe se instalou na cidade, apontando como ela
se alastrou e como a sociedade foi afetada com a pandemia, indicando por fim como
se deu o súbito controle.
Com base nos conhecimentos que serão expressos no próprio tópico, e
com esse apanhado histórico da doença, será então o momento de compreender
quais os impactos sociais que essa pandemia conseguiu gerar na cidade do Rio de
Janeiro entre os anos de 1918 e 1919, demonstrando como a população teve que
lidar com a doença.
Para alcançar tais resultados, a pesquisa é de caráter bibliográfico, onde
diversas fontes foram pesquisadas, a metodologia desta atividade teve início com
pesquisa em livros, artigos, revistas, jornais e internet, nos quais se detectou os
fatos mais importantes citados no decorrer da formulação da parte de revisão
literária do tema deste trabalho, buscando consciência real para as informações
oferecidas.
2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
2.1 A GRIPE ESPANHOLA
A gripe espanhola foi uma pandemia extremamente violenta que afetou
todo o mundo entre 1918 e 1919, ocasionando milhões de mortes, possuindo como
maiores vítimas a população jovem da época. A gripe espanhola é tida como a mais
severa pandemia de toda a história da humanidade, sendo que a sua causa está
ligada à “[...] virulência incomum de uma estirpe do vírus Influenza A, do subtipo
H1N1” (LAMARÃO, URBINATI, 2010, p. 1).
Existe uma estimativa de que na época, um terço da população em todo o
mundo tenha sido afetada pela doença. De acordo com Neufeld (2010) a população
mundial na época da gripe espanhola era inferior aos 2 bilhões de habitantes, e
desses, aproximadamente 500 milhões foram infectados. Os números de óbitos não
são precisos, mas existe uma estimativa de que entre 40 e 100 milhões de
indivíduos faleceram por conta da doença nas mais diversas partes de todo o
mundo.
Em nível apenas de comparação, a Primeira Guerra Mundial, que
aconteceu basicamente no mesmo período (entre 1914 e 1918), deixou entre 10 e
20 milhões de mortos. Números muito inferiores aos encontrados no decorrer da
pandemia.
A pandemia recebeu esse nome de “Gripe Espanhola” não por ter se
iniciado na Espanha, mas por conta de toda a publicidade que imprensa espanhola
deu para a mesma, por se tratar de um país neutro dentro dos conflitos existentes,
sua imprensa podia trabalhar sem as censuras existentes em outras nações. Silva
(2021, p. 1) aponta que:
Na época em que a doença se espalhou, o mundo passava pela Primeira
Guerra Mundial, e as grandes potências ocidentais estavam envolvidas no
conflito havia anos. Por essa razão, a imprensa desses países sofria forte
censura – isso porque divulgar as notícias de que a gripe espanhola tinha
afetado suas tropas poderia ser muito ruim para o moral dos soldados e
poderia espalhar pânico na população. Assim, esses locais passaram a
censurar as notícias relacionadas com a doença. Como a Espanha não
estava envolvida com a guerra, não havia necessidade de censurar a
imprensa e, assim, as notícias sobre a enfermidade espalharam-se a partir
do que a imprensa espanhola noticiava. Foi por essa razão que a pandemia
recebeu o nome de gripe espanhola.
Pelas razões expostas acima, quando a gripe atingia alguma localidade,
como frisam Lamarão e Urbinati (2010, p. 1) “[...] assim que a gripe chegava a algum
país, era logo chamada de espanhola”.
A real origem da gripe espanhola é desconhecida até os dias de hoje,
havendo algumas suposições, como é afirmado por Silva (2021, p. 1)
Infelizmente, os historiadores e os cientistas não possuem informações
suficientes que lhes permitam apontar o local exato do surgimento dessa
doença. Ainda assim, existem algumas teorias a respeito dos prováveis
locais nos quais a gripe espanhola possa ter
surgido: Estados Unidos, China e Reino Unido.
O primeiro caso relatado da gripe espanhola, conforme cita Alves (2020,
p. 1) foi nos Estados Unidos, em 4 de março do ano de 1918, segundo aponta a
autora “[...] o cozinheiro Albert Gitchell deu entrada na enfermaria de uma unidade
do exército, no estado do Kansas, com queixas de dores na garganta, febre, dor de
cabeça”.
Depois disso a doença foi se alastrando por todo o mundo. Essa linha do
tempo é apresentada por Lamarão e Urbinati (2010) que indicam que no mês de
Abril a doença atingiu os exércitos aliados franceses, britânicos e norte-americanos.
Em Maio atingiu Grécia, Espanha e Portugal. No mês de junho os atingidos foram
Dinamarca e Noruega. Em agosto, mês em que a primeira onda se encerrou, a
Holanda e a Suécia foram atingidas. Essa primeira onda foi tida como a mais
amena, uma vez que foi a menos letal dentre as três ondas existentes nessa
pandemia. 
No próprio mês de agosto, conforme aponta Lamarão e Urbinati (2010), a
segunda onda teve início, atingido o ápice no decorrer dos meses de setembro até
novembro. Foi uma fase muito bruta da pandemia, que além de afetar a Europa e os
Estados Unidos, também atingiu a Índia, o Sudeste da Ásia, o Japão, a China, a
África e as Américas Central e do Sul. Essa onda elevou de maneira drástica o
número de mortos da pandemia.A terceira fase da Gripe Espanhola iniciou já em 1919, no mês de
fevereiro, chegando ao fim em maio do mesmo ano. Segundo os autores, estima-se
que ao menos metade da população mundial foi afetada de maneira direta ou
indireta pela pandemia. E como fora citado, a doença dizimou mais pessoas que a
própria guerra, sendo “[...] qualificada como o mais grave conflito epidêmico de todos
os tempos” (LAMARÃO; URBINATI, 2010, p. 1).
2.2 A GRIPE ESPANHOLA CHEGA AO BRASIL
Logo que a pandemia começou a se espalhar pelo mundo, o Brasil
apenas acompanhava o andamento da mesma através dos jornais. Logo de início, a
imprensa nacional não deu grande relevância para o que vinha acontecendo em
outras partes do mundo. No entanto, com o avanço da pandemia pelo globo
terrestre, a repercussão começou a aparecer, também no território brasileiro.
No início da pandemia, conforme aponta Lamarão e Urbinati (2010), o
povo brasileiro não demonstrou preocupação com a gripe espanhola, considerando,
inclusive, que a mesma sequer chegaria ao Brasil, por conta do país estar distante
da Europa.
Figura 1 – A Gripe Espanhola vira notícia no Brasil
Fonte: Correio 24 horas
Ledo engano, ao contrário do que se achou a princípio, a Gripe
Espanhola adentrou às fronteiras do Brasil, com seus primeiros relatos no mês de
setembro de 1918. Uma divisão naval havia sido enviada na época pelo Brasil para
Dacar, com o intuito de participar do patrulhamento do Atlântico Sul, sendo uma
parte dos esforços relacionados à guerra do país juntamente com os aliados,
quando essa divisão retornou ao território nacional, a gripe conseguiu chegar ao
Brasil.
À priori, mais de cem marinheiros foram a óbito por conta do vírus, os
números de mortos pela gripe e pela própria guerra já eram correspondentes,
apenas nesse momento inicial.
O cômputo geral foi de 156 mortos, sem que os oitenta médicos que
compunham a missão pudessem fazer alguma coisa pelos oficiais e
soldados que iam tombando sucessivamente, vencidos pelo inimigo
desconhecido. As primeiras notícias das mortes entre os componentes da
Missão Médica chegaram por cabograma, enviado pelo chefe da missão,
Nabuco Gouvêa, no dia 22 de setembro, sem que isso despertasse as
autoridades da cidade para a premência de montarem estratégias de
combate à doença que os ameaçava. (GOULART, 2005, p. 1)
A dispersão do vírus no território brasileiro pode estar relacionada aos
navios que chegaram em estados da região Nordeste, a exemplo do navio
Demerara, que no mês de setembro de 1918 atracou tanto Pernambuco, quanto na
Bahia. 
Tanto em Salvador, quanto em Recife, Bernardo (2020) salienta que os
governantes locais negaram qualquer existência da Gripe Espanhola, pois os
mesmos temiam terem que fechar os seus portos, “Para não comprometer a
economia local, preferiram deixar o Demerara partir, como se nada estivesse
acontecendo” (BERNARDO, 2020, p. 1). 
Além desses dois portos, localizados em capitais de estados da região
nordeste do Brasil, o navio ainda seguiu para o sudeste, onde atracou na cidade do
Rio de Janeiro e em Santos, respectivamente nos estados do Rio de Janeiro e São
Paulo, para depois partir rumo à Montevidéu.
Figura 2 – Navio Demerara
Fonte: BBC News Brasil, 2020.
O atracamento dessa embarcação esteve no centro de diversas queixas,
críticas e polêmicas, especialmente na cidade do Rio de Janeiro. Como podemos
ver no exposto por Goulart (2005, p. 1), afirmando que
O Serviço de Profilaxia do Porto foi a primeira Seção da Diretoria de Saúde
Pública a ser alvo das críticas da opinião pública. A referida seção não tinha
como realizar a desinfecção de todos os navios que aportavam na capital
federal. A aplicação de quarentenas em embarcações era considerada
antinatural, pois acarretava problemas políticos, econômicos e sociais. No
calor da hora, o inspetor sanitário do porto do Rio de Janeiro, Jayme
Silvado, foi acusado de favorecer a entrada da epidemia, pois consentiu na
atracação do Demerara, pois, sendo "positivista, não acredita em
micróbios".
No caso do Rio de Janeiro, à priori, 
O então diretor de Saúde Pública, Carlos Seidl manifestou sua preocupação
pela possibilidade da doença alcançar a cidade, porém procurou-se atribuir
aos casos que surgiam um caráter de benignidade, conceito que aos
poucos foi se desfazendo (SCHATZMAYR; CABRAL, 2012, p. 59). 
Em pouquíssimo tempo inúmeras cidades nordestinas já estavam com o
vírus em circulação. No final do mês de outubro, do mesmo ano, quase todas as
principais cidades brasileiras já estavam acometidas pela doença, a exemplo de São
Paulo e do Rio de Janeiro. Em novembro a Amazônia já apresentava relatos da
presença do vírus. A doença possuía um público mais jovem como vítimas, assim
salienta Neufeld (2020, p. 1)
A despeito de a alta taxa de mortalidade, deve-se ressaltar que 95% dos
casos de Gripe Espanhola não tiveram grande relevância clínica (cerca de
6% de pneumonias e 1% de hospitalizações) e que os casos graves e os
óbitos concentravam-se nos adultos jovens e saudáveis com idade entre 20
e 40 anos. De maneira pouco típica, inclusive, a faixa etária entre 25 e 29
anos foi especialmente acometida. 
A doença se espalhou pelo país, por conta da falta de medicamentos
específicos para o seu tratamento, como salienta Silva (2021). Além disso, deve ser
lembrado o cenário do país no início do século passado, que também foi fator
preponderante para a rápida disseminação do vírus. Conforme cita Barreira (2020),
[...] o cenário da gripe espanhola no Brasil era o de um país sem
saneamento básico e água encanada para a maioria da população, de
casas sem geladeira para conservar alimentos, de hospitais pouco
aparelhados para atender doentes com insuficiência respiratória.
(BARREIRA, 2020, p. 1)
De acordo com o autor as cidades que mais foram afetadas com a Gripe
Espanhola foram São Paulo e Rio de Janeiro. As medidas tomadas pelos
profissionais da saúde na época eram mais paliativas, como indica Silva (2021):
Como não existia nenhuma forma de curar a doença – os médicos
passavam alguns medicamentos para amenizar os sintomas e esperavam o
corpo do paciente reagir –, as recomendações das autoridades eram no
sentido de que as pessoas evitassem aglomerações, lavassem suas mãos
com freqüência e evitassem contato físico.
A Gripe espanhola impactou de maneira muito abrupta toda a rotina da
população brasileira, nos diversos cantos do país, ocasionando inúmeros óbitos. De
acordo com Silva (2021) estima-se que aproximadamente 350 mil pessoas tenham
sido contaminadas apenas na cidade de São Paulo, o que corresponderia a mais da
metade da população local na época, dessas pessoas, mais de 5.300 evoluíram
para o óbito.
A capital do Brasil na época, que era a cidade do Rio de Janeiro,
apresentou mais de 12.700 mortes, como frisa Silva (2021), o que representou
aproximadamente 1/3 de todos os óbitos registrados no país no decorrer da
epidemia. Nesse período, não existia o SUS, e o sistema existente na época, que
era privado, não conseguiu dar conta da alta demanda exigida de medicamentos,
leitos e profissionais da área da saúde, para o atendimento adequado para a
população.
Para se evitar a disseminação do vírus, medidas restritivas foram postas
em prática, fechando diversos tipos de estabelecimentos, além de serem proibidas
as aglomerações. 
O serviço público deixou de funcionar nas grandes cidades, o comércio
fechou e as lojas que se mantiveram abertas logo ficaram sem mercadorias.
Igrejas cancelaram missas, jornais não circulavam por falta de funcionários,
assim como os serviços de transporte coletivo (BARREIRA, 2020, p. 1). 
A doença vitimou, em sua grande maioria,pessoas das camadas mais
populares da sociedade, no entanto, as barreiras sociais foram ultrapassadas,
afetando, inclusive Francisco de Paula Rodrigues Alves, presidente eleito em 1918,
que não pôde tomar posse por conta da doença, falecendo em janeiro do ano
seguinte. 
A estimativa, de acordo com Silva (2021), é de que aproximadamente 35
mil brasileiros foram vítimas da Gripe Espanhola no território brasileiro. Pela
população da época, tais números foram elevadíssimos.
2.3 A GRIPE ESPANHOLA NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO
A seguir temos a capa do jornal Gazeta de Notícias, evidenciando a
situação da gripe espanhola na cidade do Rio de Janeiro. O estudo mostrará os
caminhos percorridos durante a grave crise de saúde pública instaurada na cidade
do Rio de Janeiro, e seus impactos na vida da população.
Figura 3 – Retratos da gravidade da pandemia no Rio de Janeiro
Fonte: História Mirim
Na época da entrada gripe espanhola na cidade do Rio de Janeiro, no
mês de setembro de 1918, o município contava com uma população de
aproximadamente 910 mil habitantes. Goulart (2005) aponta que “Nesse período,
apenas 48 pessoas morreram de gripe. No decorrer da epidemia, a cifra elevou-se a
níveis nunca vistos, sendo que apenas no dia 22 de outubro de 1918 foram
computados 930 óbitos de gripe em um total de 1073 óbitos” (GOULART, 2005, p.
1).
Os números dessa pandemia não são exatos, especialmente quando se
busca dados de localidades mais interioranas, mas Goulart (2005, p. 1) estima que a
Gripe Espanhola “[...] fez fenecer no Rio de Janeiro algo em torno de 15 mil
pessoas, levando para o leito, segundo as fontes, seiscentos mil cariocas – ou seja,
cerca de 66% da população local”.
Segundo Schatzmayr e Cabral (2012) no início de outubro foram
diagnosticados casos em Niterói e em militares que estiveram em Dacar e que
chegaram ao Brasil por intermédio do navio Demerara, em meados do mesmo mês
a capital já alçava a marca das 20 mil pessoas infectadas, com os primeiros óbitos
sendo apresentados.
Um ponto ressaltado por Fontenelle (1919, apud GOULART, 2005) foi
com relação à censura instalada pelos militares, o que gerou diversos contratempos
no que tange o combate à gripe espanhola, além disso, a própria incompreensão
populacional perante a situação também foi fator desestabilizador na pandemia.
Também é frisado que “Somou-se a esse fator o total desaparelhamento das
instituições sanitárias federais” (GOULART, 2005, p. 1).
Até que a pandemia já estivesse instalada, nenhum mecanismo
preventivo, ou de antecipação havia sido montado para prestar o devido socorro à
população, aparentemente, a mesma não estava sendo levada à sério, e a sua
gravidade estava sendo subestimada. “A falta de condições das instituições de
saúde para socorrer a população foi o primeiro dos muitos problemas explicitados
durante a epidemia” (GOULART, 2005, p. 1).
Como salienta Goulart, a situação em que o estado do Rio de Janeiro se
encontrava com a pandemia era lamentável, hospitais e repartições públicas na
capital funcionavam com condições de precariedade. Cabendo ressaltar ainda que
quando havia uma boa estrutura de atendimento, por vezes o que faltava eram os
profissionais capacitados.
À medida que os casos aumentavam em número e gravidade, o pânico
começou a tomar conta da cidade, a qual se transformou em uma cidade
fantasma, com os serviços públicos parando paulatinamente, como escolas
e repartições públicas. Restaram os serviços públicos da área da saúde,
totalmente caóticos e sem condições de prestar auxílio aos que os
procuravam, pois sequer a etiologia real da epidemia era conhecida.
(SCHATZMAYR; CABRAL, 2012, p. 59)
De maneira muito abrupta a cidade estava diante de um colapso na
saúde, mas também nos aspectos sociais, faltando mantimentos e suprimentos
básicos para a sobrevivência, além da falta de medicamentos, profissionais da
saúde de unidades hospitalares que pudessem internar doentes que se
encontrassem em estados mais graves. 
Cabe ressaltar ainda que os medicamentos e alimentos que estavam
disponíveis para a aquisição da população apresentavam preços superfaturados,
havendo assim um “[...] aumento geral do custo de vida em conseqüência da súbita
escassez de produtos” (BRITO, 1997, p. 22).
Aos poucos, como enfatiza Goulart (2005) as ruas da cidade do Rio de
Janeiro foram se transformando em “[...] um mar de insepultos, pela falta de coveiros
para enterrar os corpos e de caixões onde sepultá-los” (p. 1). A violência com que a
doença avançava pela capital era impressionante, e nunca vista até aquele
momento.
Figura 4 – Faltam leitos para atender a tantos doentes
Fonte: BBC News Brasil, 2020.
Na geografia da gripe, termo utilizado por Brito (1997), os subúrbios do
Rio de Janeiro foram os locais mais afetados pela pandemia e também pelas
questões sociais, pois como a autora denota, boa parte das políticas públicas e as
ações sanitárias eram voltadas para áreas centrais da cidade. 
 A situação criada pela epidemia ainda não se modificou, continuando a
cidade com a sua vida alterada e a população presa da mesma comoção.
Se a epidemia parece ter declinado no centro da cidade, aumentou nos
subúrbios onde há falta de postos de socorros e impera a fome. A situação
pode-se, portanto, dizer ser quase a mesma dos dias anteriores, a cidade
com pouco movimento, falta de transportes e os estabelecimentos
comerciais com os negócios paralisados (MARQUES DA COSTA, 2020, p.
1).
A gripe espanhola conseguiu instaurar no Rio de Janeiro um quadro geral
de desordem pública, considerando que naquele momento nem o povo e nem os
serviços públicos possuiam condições de lidar com tamanha violência ocasionada
pela pandemia da La Dansarina:
Isso porque não se tinha uma resposta positiva para dar à nova peste que
recaía sobre a cidade. Tal fato possibilitou o surgimento de um quadro de
tensões sociais, criando uma atmosfera de medo, incompreensão e colapso
social que se instaurou pela capital federal (GOULART, 2005, p. 1).
Como deixa claro Brito (1997), a cidade foi entrando em um estado de
paralisia de maneira progressiva, até que um ar sepulcral fosse visualizado. Os
serviços públicos funcionavam de maneira parcial e precária, pela falta de
servidores. Todos os dias os jornais da época noticiavam a suspensão das
atividades de empresas e repartições públicas, tais como
[...] o Ministério da Agricultura, os bondes da Light, a Central do Brasil, o
Tesouro Nacional, a Biblioteca Nacional, a Prefeitura, a Câmara, o Senado,
os quartéis da Brigada Policial, os funcionários e médicos da Diretoria de
Saúde, a Limpeza Pública (que deixou de recolher o lixo), o serviço de
telefones, lojas, bancos, escolas, faculdades, teatros, cinemas etc. (BRITO,
1997, p. 24)
Com toda a situação vivida na cidade do Rio de Janeiro, o caos social
instaurado, o mesmo passou a ser explorado de maneira bem ampla, tanto pelas
mídias, como por diversos grupos políticos que faziam oposição ao atual governo de
Wenceslau Braz. 
A insatisfação das diferentes camadas da sociedade se tornou cada dia
mais latente por conta da “[...] morosidade no estabelecimento de medidas
profiláticas e às limitações estruturais das instituições sanitárias que se encontravam
totalmente despreparadas e desaparelhadas para dar combate à doença”
(GOULART, 2005, p. 1).
O dinheiro público também estava bastante escasso na época, o que se
tornava um empecilho enorme para implementar, aparelhar e manter instituições
voltadas para a saúde pública, desse modo os atendimentos prestados no decorrer
da epidemia para os doentes eram limitados. Muitas pessoas passaram a depender,
principalmente, de escolas, igrejas, clubes, associaçõese da Cruz Vermelha
Brasileira.
Foi em outubro de 1918 que o governo realmente cedeu ao estado
calamitoso vivenciado pela capital federal, decretando um feriado durante três dias.
Nesse momento a capital já possuía aproximadamente metade de sua população
infectada. Como enfoca Goulart (2005, p. 1) “A realidade impôs-se aos olhos de
todos: "o Rio transformara-se numa necrópole"”.
A crise humanitária instalada na cidade do Rio de Janeiro mostrou uma
face aterrorizante para todos, os cadáveres estavam em exposição pública, muitas
foram as reclamações populares, que julgavam tal situação como um apavorante
espetáculo profano. 
O Cemitério São Francisco Xavier, que em boa parte se utilizava de
detentos para a realização dos sepultamentos durante a pandemia da Gripe
Espanhola, chegou a utilizar caminhões para a remoção dos corpos. Nesses
caminhões eram amontoados cadáveres e caixões, que ficavam completamente à
vista da população, em alguns casos o falecido aparecia basicamente despido. Cabe
citar que no Rio de Janeiro, a polícia podia requisitar quem encontrasse pela cidade,
que estava quase deserta, para fazer esse trabalho de remoção, de acordo com
Barreira (2020).
Figura 5 – Detentos realizando sepultamentos no cemitério São Francisco Xavier,
vigiados por soldado – outubro de 1918
Fonte: Marques da Costa, 2020.
De acordo com Barreira (2020) que trouxe um apanhado de entrevistas e
matérias jornalísticas da época da pandemia, evidenciando a brutalidade com que a
mesma atingiu o Rio de Janeiro,
A contagem de sepultamentos nos cemitérios cariocas, realizada pela
polícia após o dia 12 de outubro de 1918, e publicada diariamente no
diário Correio da Manhã até o dia 16 de novembro, indicava 14.449 mortos
em 37 dias, uma média de 391 mortos por dia. Cabe ressaltar que entre 21
e 28 de outubro, auge da epidemia, foram sepultadas cerca de 6.400
pessoas na Capital (1.060 apenas no dia 25/10!), com uma média diária de
800 mortes por dia. Obviamente uma parcela desses óbitos não era devida
à pandemia, mas por outro lado, centenas, talvez milhares de pessoas não
foram contabilizadas nessas listas seja pela desorganização das
administrações dos cemitérios; a impossibilidade de contar todos os
sepultados nas valas comuns; uma eventual censura das autoridades
policiais e governamentais em relação ao enorme número de mortos e,
provavelmente, as dezenas ou, quem sabe, centenas de corpos em
decomposição que foram sepultados “clandestinamente” pelas famílias e
vizinhos nas favelas e nos subúrbios abandonados pelas autoridades.
(BARREIRA, 2020, p. 1)
De acordo com Goulart (2005) o real reconhecimento do grave estado
epidêmico só foi concretizado após números elevados de pessoas enfermas e de
óbitos confirmados. De um modo geral, conforme frisa a autora, a doença que é
contagiosa se torna um evento social, e delimitando para a gripe espanhola, a
mesma conseguiu desencadear toda uma mobilização social, não apenas no Rio de
Janeiro de 1918, como em todo o mundo, tendo em vista que os diferentes lugares
estavam em busca de suas próprias respostas para o mal que vinha assolando a
população.
Nesse cenário de epidemia alastrada, a desorganização da capital do
Brasil na época foi perceptível, sendo este um local de privilegiada representação
política, e suas falhas em se mostrar como nação soberana, “[...] passou a ser
encarada como motivo de vergonha” (GOULART, 2005, p. 1), a autora ainda
complementa que 
O nível de desorganização a que chegou a cidade do Rio de Janeiro foi
visto como fruto da incompetência e da falta de estratégias de Wenceslau
Braz para contornar o caos político, econômico e social instaurado pela
espanhola, ou qualquer outro evento incomum. (GOULART, 2005, p. 1)
Contudo, o nome que mais se destacou, como sinônimo de
incompetência no decorrer da pior etapa da gripe espanhola foi de Seidl, que fora
substituído em outubro de 1918 por Theóphilo Torres que assumiu o posto de
diretor-geral de Saúde Pública. Na ocasião, Torres, convidou o médico e
pesquisador Carlos Chagas para compor sua equipe e liderar as ações de combate
à gripe espanhola. 
Desse modo, no final de outubro de 1918, Carlos Chagas passou a
intensificar as medidas de prevenção à gripe espanhola, ordenando a criação de
hospitais de campanha e postos de atendimento para a população, espalhados
pelos diversos pontos da cidade do Rio de Janeiro.
Tão subitamente como foi para se espalhar pela capital federal, nesse
momento, a pandemia começava a desacelerar na cidade, tornando a situação
estável novamente, Carlos Chagas acaba por ficar com certa fama, aparentando que
ele milagrosamente conseguiu colocar um fim na pandemia que dizimou tantos
cariocas.
Com as quedas substânciais nos números de óbitos e de infectados, com
boa parte da população tendo adquirido a imunidade de rebanho, no ano de 1919, a
cidade do Rio de Janeiro promoveu um carnaval que fez história, com desfiles, e em
muitos blocos e agremiações o tema da gripe espanhola fora utilizado.
Pessoa (2020, p. 1) falando desse período e trazendo um trecho de uma
música cantada nos desfiles carnavalescos coloca que “As músicas daquele ano
tratavam a gripe com escárnio. “Quem não morreu da espanhola/quem dela pôde
escapar/não dá mais tratos à bola/toca a rir, toca a brincar”.” 
A espanhola foi uma pandemia avassaladora no Brasil, e mais
especificamente na cidade do Rio de Janeiro, afetando a saúde pública, bem como
toda a estrutura política e social da capital brasileira da época. Assim como surgiu
de maneira repentina, seu desaparecimento assim também o fez.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A realização da pesquisa foi de grande enriquecimento na formação
profissional como um todo, trazendo momentos de reflexão e aprendizagem. 
A temática abordada no presente trabalho de conclusão de curso foi a
Gripe Espanhola, delimitando o tema para os seus impactos na sociedade do Rio de
Janeiro de 1918. Ano em que a pandemia atingiu seu pico não apenas na
localidade, mas em todo o país.
A pandemia conseguiu dizimar mais pessoas que a própria guerra,
ocorrida no mesmo período, com grande letalidade.
A pandemia afetou todas as camadas da sociedade, independente de
idade, gênero ou classe social, tida como democrática, nesse sentido, ainda que as
regiões mais suburbanas tenham sentido com maior voracidade os seus impactos.
Foi um momento em que todas as mazelas, descasos e infraestruturas
deficientes existentes na capital federal ficaram à mostra, uma vez que oferta e
demanda não conseguiam ser atendidas satisfatoriamente.
Em um curto prazo de tempo a pandemia dizimou grande parcela da
população, e assim como chegou rápida e abruptamente no Brasil, também foi
embora de tal maneira, pois a imunidade já havia sido conquistada por boa parte da
população.
No ano seguinte, um carnaval que marcaria gerações aconteceu em solo
carioca, após o choro e a tristeza, os brasileiros puderam celebrar a vitória contra a
pandemia e a própria vida.
REFERÊNCIAS
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	Para alcançar tais resultados, a pesquisa é de caráter bibliográfico, onde diversas fontes foram pesquisadas, a metodologia desta atividade teve início com pesquisa em livros, artigos, revistas, jornais e internet, nos quais se detectou os fatos mais importantes citados no decorrer da formulação da parte de revisão literária do tema deste trabalho, buscando consciência real para as informações oferecidas.

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