Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Narrativas Midiáticas Aula 7: A publicidade como narrativa do consumo Apresentação Nesta aula, conversaremos sobre a linguagem publicitária. Entenderemos como ela se transformou com a chegada da internet, das redes sociais, como ela se torna cinematográ�ca e passa a mediar a interação entre as marcas e os consumidores. Obviamente, as características mais gerais da linguagem publicitária permanecem, pois o objetivo ainda é persuadir o público, mas agora há uma tecnologia que garante essa persuasão de modo mais imediato, em tempo real e em escala global. Objetivos Avaliar a linguagem publicitária; Detectar a relação entre linguagem verbal e não verbal na publicidade; Reconhecer as narrativas de consumo na web. A linguagem publicitária Leia os textos a seguir e compare-os, observando a linguagem e os objetivos destes textos: Texto 01 Veja, illustre passageiro, O bello typo faceiro Que o senhor tem a seu lado... E, no entanto, acredite: Quase morreu de bronchite. Salvou-o o RHUM CREOSOTADO! (Texto veiculado em um bonde a partir de 1918) Texto 02 Amizades são incertas Ao fazê-las, descon�a: esta mão que agora apertas bem pode espancar-te um dia. (Texto publicado em livro, 1959) Embora os dois textos tenham sido produzidos pelo poeta brasileiro Bastos Tigre, percebe-se que são gêneros textuais diferentes. Vejamos: No texto 1, há um destinatário especí�co (illustre passageiro) a quem se dirige o texto, que propõe duas ações (ação 1: Veja o bello typo faceiro / Que o senhor tem a seu lado; ação 2: acredite). Para indicar as ações ao destinatário (do gênero masculino – o senhor), o texto �exiona os verbos no modo imperativo para impor essas ações (Veja / Acredite). Vê-se o cuidado com a beleza da linguagem, há uso de rimas ricas e perfeitas (passageiro/ faceiro; lado/ creosotado; acredite/ bronchite), sendo as duas primeiras emparelhadas (passageiro/ faceiro) e as quatro últimas intercaladas (lado/ creosotado; acredite/ bronchite). O objetivo era divulgar um produto e convencer o interlocutor a consumi-lo (em Salvou-o o RHUM CREOSOTADO!, o verbo salvar garante uma qualidade positiva ao xarope). No texto 2, , também há um destinatário a quem o texto se remete, mas não sabemos exatamente quem, pois não há pistas sobre o per�l deste interlocutor; apenas foram usados verbos no modo imperativo (descon�a) e um pronome de segunda pessoa (te). O tom usado é de conselho (Ao fazê-las, descon�a/ esta mão bem pode espancar-te); vê-se também no texto 2 o cuidado com a beleza da linguagem. Há rimas ricas e perfeitas, intercaladas (incertas/ apertas; descon�a/ dia). O objetivo do texto é alertar o leitor sobre o perigo das amizades, que podem ser falsas e, por isso, machucar o leitor (esta mão que agora apertas/ bem pode espancar-te um dia). http://portaldoaluno.webaula.com.br/cursos_graduacao/go0237/aula7.html Sendo assim, classi�camos o texto 1 como anúncio publicitário e o 2 como uma quadrinha (poemeto com quatro versos). Apesar de ambos os textos se caracterizarem pelo cuidado com a linguagem, seus objetivos diferem, ou seja, suas funções comunicativas não são as mesmas, embora os dois textos tenham sido escritos pelo mesmo autor. Além disso, em ambos se veri�ca a tentativa de provocar o estranhamento no leitor, principalmente pelo uso de metáforas e linguagem �gurada (Veja o belo tipo faceiro/ esta mão bem pode espancar-te um dia), fazendo que este se interesse pelo texto. Podemos a�rmar, então, que a linguagem publicitária em muito se assemelha à literária, pois utiliza-se da função estética (ou poética), que a linguagem pode assumir para garantir os efeitos de sentido desejados, dentre eles, ativar as sensações do leitor, persuadindo-o, não apenas convencendo-o sobre algo. Atenção! Aqui existe uma videoaula, acesso pelo conteúdo online Comentário Essa linguagem publicitária, diferente da literária, deseja levar o leitor a agir, por isso lança mão de outra função da linguagem: a função conativa (ou apelativa). Ao usar vocábulos que solicitam ações (modo imperativo dos verbos), que se dirigem ao leitor (pronomes de segunda pessoa), que quali�cam os referentes (adjetivos e advérbios), que marcam a interação (interjeições, cacoetes de comunicação), que sensibilizam o interlocutor (fórmulas mágicas ou encantatórias que garantem a cooperação do interlocutor). Isso também se consegue ao usar construções sintáticas, como topicalização, paralelismos, tautologias, simplicidade estrutural, frases feitas, desvios da norma culta formal; a linguagem publicitária garante sua função comunicativa. Assim, a linguagem publicitária alia a função conativa e a função poética à competência criativa daqueles que produzem gêneros textuais publicitários: anúncios impressos, VTs, cartazes, banners, outdoors, faixas, entre tantos outros. Saiba mais Vamos lembrar uma propaganda muito boa da Honda. Ela foi veiculada pela TV em 1994. O vídeo tem um roteiro aparentemente simples, assim como o cenário e o �gurino, tudo parecendo meio bobo. Quando paramos, porém, para re�etir sobre a ideia (roteiro, texto, imagem, música, fotogra�a e iluminação), entendemos que houve um planejamento muito bem elaborado, principalmente porque o efeito de sentido provocado foi bem positivo à época: estabelecer a relação entre ter uma Honda e sair da rotina. Este comercial fez muito sucesso. Pergunte a alguém que tenha visto o VT naquele ano. Relação entre texto e imagem na publicidade A publicidade se caracteriza por uma linguagem híbrida, ou seja, por uma linguagem cuja matriz se constituiu da imbricação de outras: a matriz verbal e a visual — se pensarmos em textos publicitários impressos — mais a matriz sonora — se pensarmos em VTs para televisão, por exemplo. Isso obriga os gêneros publicitários a combinarem texto, som e imagem, constituindo um todo signi�cativo. Vejamos o anúncio de uma página de revista do �lme Olga, quando foi lançado em agosto de 2004: javascript:void(0); Atenção! Aqui existe uma videoaula, acesso pelo conteúdo online Imagem: cartaz o filme Olga | "Muitas paixões numa só vida. Um filme de Jayme Monjardim" O anúncio é constituído de texto mais imagem. Tem-se a palavra Olga escrita quatro vezes e, na parte inferior do anúncio, temos a frase “Muitas paixões numa só vida”. Ao lermos o anúncio, de início pode parecer sem sentido repetir mais de uma vez um vocábulo (Olga/ Olga/ Olga/ Olga), mas, ao lermos a frase �nal, estabelecemos relação entre o vocábulo Olga, quem ele representa (desde que tenhamos conhecimento enciclopédico su�ciente) e a ideia de muitas paixões em uma só pessoa. Essa ideia é reforçada por quatro signos visuais, usados no lugar da letra O do nome Olga: a foice e o martelo, representando o comunismo; a estrela de Davi, representando o povo judeu; o espelho de Vênus, que representa o feminino, a mulher; e o coração, signo que representa o amor, a paixão. Ou seja, Olga viveu todas essas vidas: foi uma mulher judia, comunista, que também amou. Há ainda as cores usadas no anúncio, predominantemente o vermelho e o laranja, que, neste contexto, podem representar o partido comunista, a perseguição aos judeus (o sangue do povo judeu), a mulher (porque sangra), o amor, a paixão e a vivacidade da personagem Olga. Além dessas cores, o branco também foi usado (ao escrever a palavra vida), sugerindo a ideia de probidade, de pureza de sentimento, atraindo o olhar do leitor para esse vocábulo iluminado. Claro que existe também o fator legibilidade, pois essas cores contrastam e garantem a leitura, permitem que o leitor veja e distinga cada elemento grá�co, proporcionando um ótimo grau de pregnância. Portanto, veri�ca-se o cuidado que se teve em construir um todo signi�cativo, coerente, em que texto e imagem se complementam e reforçam os sentidos que se constroem durante a interação entre texto e leitor. E se esta coerência entre verbo e imagem não for contemplada em um texto publicitário? Ou, pior, se esta relação for usada de má-fé pelo anunciante? Vamos ver um exemplo desse mau usodo texto e da linguagem visual. Em 2017, um supermercado foi noti�cado por utilizar um cartaz que induzia o consumidor ao erro. Observe: Deu para perceber por que as pessoas se sentiram enganadas? O anúncio levou o consumidor a estabelecer uma conexão entre o texto AMACIANTE FOFO – 5LTS e o valor R$ 3,98. Isso aconteceu porque o nome do produto estava em letras maiúsculas pretas, assim como o valor em reais — compreendemos o nome Amaciante Fofo - 5lts como se fosse um título ao qual atribuímos um subtítulo R$3,98. Embora abaixo do nome AMACIANTE esteja a informação R$19,90 e, a seguir, NESTA EMBALAGEM 1 LITRO SAI POR, o leitor tende a não ler, porque a fonte está bem menor que a utilizada nas outras informações. Logo, o consumidor compreende que é uma informação sem importância. Além disso, ao observar outras placas de oferta no supermercado, o consumidor percebe um padrão textual (há somente o nome do produto e o preço conforme a embalagem) e segue este padrão sempre que se depara com uma placa de preço, mesmo promocional. Então, mais um motivo para seguir com o engano. Nosso cérebro busca coerência entre os estímulos físicos que recebe, por isso tende a relacionar estímulos que se pareçam e que estejam próximos — o supermercado, ao criar uma sinalização, utiliza-se desta característica nossa para garantir que a informação seja compreendida adequadamente ou, no caso aqui exempli�cado, para ludibriar o consumidor. Nos gêneros publicitários, texto e imagem se complementam para gerar efeitos de sentido; o que o texto deixa de informar será dito pela imagem e vice-versa. Publicidade na web: narrativas de consumo Se antes a publicidade estava inserida em �lmes, agora podemos dizer que o cinema está dentro dela. Atenção! Aqui existe uma videoaula, acesso pelo conteúdo online Saiba mais Que tal assistirmos a uma boa história antes de seguirmos com nossos estudos? Veja este comercial. Gostou? Viu o total de visualizações? 27.499.371 até o dia 21 de agosto de 2019. Este vídeo da Renault foi trend em postagens e compartilhamentos na internet, e os internautas �caram eufóricos. Dá só uma lida em alguns comentários no YouTube: Com a web, as mídias tendem a convergir para as plataformas digitais. A Renault, além de veicular seu comercial na televisão, exibiu seu VT no YouTube, o que, aliás, permitiu à marca um feedback imediato. Assistimos a uma narrativa reconhecidamente para �ns de venda, uma narrativa que normalmente é descartada pelo público porque se sabe que o objetivo é persuadir a comprar algo, mas que, desta vez, conseguiu manter a atenção da audiência, e mais, conseguiu que essa audiência recomendasse o vídeo e ainda assistisse mais de uma vez. Este exemplo da Renault nos faz observar que a publicidade tem inovado e acompanhado as mudanças sociais. É claro que não é só essa marca; outras grandes marcas têm investido em produções de pequenos �lmes para divulgarem seus produtos. A Honda produziu webséries com fotogra�a e roteiro semelhante às séries a que assistimos em provedores de �lmes via streaming. Assim como o vídeo da Renault, as webséries da Honda também garantiram �delidade do público, que esperou por cada episódio e interagiu com a série, fazendo comentários, sugerindo temas para os episódios. Saiba mais A Honda produziu webséries com fotogra�a e roteiro semelhante às séries a que assistimos em provedores de �lmes via streaming. Assim como o vídeo da Renault, as webséries da Honda também garantiram �delidade do público, que esperou por cada episódio e interagiu com a série, fazendo comentários, sugerindo temas para os episódios. Claro que essa interação com o público tem acontecido a partir de outras estratégias. O Net�ix, um provedor de �lmes via streaming, compreendeu a necessidade que seus consumidores têm de ser reconhecidos, de conectarem-se com as marcas de modo mais próximo, de serem respondidos individualmente, de modo rápido e, se possível, em tempo real. No Twitter, o Net�ix publica tweets conforme os assuntos mais comentados por seu público, os rending topics. Comentário javascript:void(0); javascript:void(0); Em 13 de janeiro de 2019, Samuel Rosa, vocalista da banda Skank, publicou, em sua conta no Instagram, seu posicionamento sobre a votação a favor da criminalização da homofobia no STF (Supremo Tribunal Federal): “Passou da hora, né? Chega!”. Um internauta respondeu ao comentário: “Pra mim isso tudo é frescura. O Skank tem uma música por nome chamado macaco cidadão”. Veja a publicação: Se você observou, o internauta escreveu errado o nome da música Pacato cidadão. Essa postagem gerou um outro gênero da internet, um meme: No dia seguinte às postagens, o Net�ix publicou seu meme, e o Cartoon Network respondeu: Assim, o Net�ix e o Cartoon Network se posicionam diante de seus consumidores como quem participa do mesmo contexto que ele, como alguém que compartilha do cotidiano de modo simpático, assumindo o papel de mediador entre consumidor e os produtos que as marcas oferecem. Além de publicar conteúdos como esses, o Net�ix interage com seu público, respondendo às postagens. Veja: Ao interagir, as marcas assumem características humanas e passam a ser percebidas pelo público como pessoas, e assim vão fortalecendo seu espaço no mercado, porque essa aproximação faz que haja uma �delização e, em momentos de crise, é possível contornar a situação de modo mais e�ciente e rápido. Essas, no entanto, não são as únicas estratégias usadas na web. Há ainda storytellings, sobre os quais conversaremos em nossa próxima aula. Atividade 1. Leia o anúncio do carro Bora, da Volkswagen: A partir deste anúncio, podemos a�rmar que a linguagem publicitária se caracteriza por: a) Ser uma linguagem puramente verbal, que descarta outras matrizes da linguagem, como a matriz visual. b) Ter a função conativa como predominante, pois os textos publicitários têm por objetivo persuadir a audiência, sem qualquer preocupação estética. c) Fazer uso de recursos linguísticos próprios da literatura, como metáforas e rimas, para provocar o estranhamento no interlocutor. d) Ser uma linguagem denotativa por excelência, pois os textos publicitários propõem um discurso da verdade, assim como o jornalismo. e) Ser uma linguagem que evita o uso de figuras de linguagem, pois é preciso garantir a objetividade e ausência de expressividade nos textos publicitários. 2. Observe o anúncio publicitário abaixo, no qual se percebe a utilização da linguagem verbal e não verbal. Ao analisar o anúncio, podemos dizer que: Fundação SOS Mata Atlântica | Quer continuar a respirar? Comece a preservar. a) A relação entre o texto verbal e a imagem contribui para a transmissão das ideias. b) O objetivo do anúncio deixa de ser atingido por conta desse misto de linguagens. c) O texto verbal destoa da imagem, dificultando a compreensão da mensagem. d) A mensagem transmitida através do texto verbal é, propositadamente, oposta ao que a imagem representa. e) A escolha pela linguagem verbal e pela linguagem não verbal é imprópria a uma campanha como a apresentada. 3. Leia a seguinte a�rmação: quando o objetivo da mensagem é persuadir o destinatário, in�uenciando seu comportamento, diz- se que a função predominante no texto é a conativa ou apelativa. Com base nela, qual dos textos abaixo tem como função predominante a conativa ou apelativa? a) b) c) d) e) 4. Avalie as a�rmações abaixo sobre a linguagem publicitária: I. A linguagem publicitária pode ser considerada híbrida. II. A função da linguagem que predomina em textos publicitários é a referencial. III. As �guras de linguagem podem ser encontradas em diversos textos publicitários. IV. Nos materiais publicitários, é preciso haver coerência entre os textos e as imagens que os compõem. É correto apenas o que se a�rma em: a) I e II. b) II e IIII. c) I e IV. d) I, III e IV . e) I, II e IV. 5. O que podemos inferir sobre a narrativa publicitária na web quando lemos: “Se antes a publicidade estava inserida em �lmes, agora podemos dizerque o cinema está na publicidade”? a) A narrativa publicitária não precisa acompanhar as mudanças sociais, pois o objetivo é vender produtos. b) Com a tecnologia da internet, a narrativa publicitária assemelha-se à cinematográfica. c) A narrativa publicitária tem se afastado das narrativas do cinema para ganhar sua própria identidade. d) A publicidade na web existe apenas para divulgar os filmes que são lançados nos cinemas. e) A tecnologia da internet proporcionou à narrativa publicitária a oportunidade de garantir interação mais distanciada do público. Notas RHUM CREOSOTADO1 Rhum creosotado é um xarope (remédio). Título modal 1 Lorem Ipsum é simplesmente uma simulação de texto da indústria tipográ�ca e de impressos. Lorem Ipsum é simplesmente uma simulação de texto da indústria tipográ�ca e de impressos. Lorem Ipsum é simplesmente uma simulação de texto da indústria tipográ�ca e de impressos.Referências BARBOSA, Ivan Santo (org.). Os sentidos da publicidade: estudos interdisciplinares. São Paulo: Thomson, 2005. CARRASCOZA, João Anzanello. Redação Publicitária: estudos sobre a retórica do consumo. 2. ed. São Paulo: Futura, 2003. CHIACHIRI, Roberto. O poder sugestivo da publicidade: uma análise semiótica. São Paulo: Cengage Learning, 2010. FIGUEIREDO, Mário Sérgio. Divirta-se com a nova websérie da honda. In: Motonline. 28 jul. 2016. Disponível em: https://www.motonline.com.br/noticia/divirta-se-com-a-nova-webserie-da-honda/. Acesso em: 21 ago. 2019. HONDA. Comercial da Honda – na cama com pijama. 1994. Disponível em: https://www.youtube.com/watch? v=WWf6NSImzvE. Acesso em: 21 ago. 2019. RENAULT BRASIL. Renault – KWID Outsider – Caverna do Dragão. 23 maio 2019. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=kC9-bfsNne8. Acesso em: 21 ago. 2019. ROCHA, Everardo; AMARAL, Maria. Narrativa Publicitária, Consumo e Entretenimento. In: XVI encontro da Compós. Curitiba: UTP, 2007. Disponível em: //www.compos.org.br/data/biblioteca_264.pdf. Acesso em: 21 ago. 2019. Próxima aula Técnicas de produção de conteúdo com storytelling digital; Tecnologias e as mudanças de formatos das histórias; As estruturas-chave do storytelling transmídia. Explore mais 10 vídeos publicitários que arrasaram no Cannes Lions. javascript:void(0);
Compartilhar