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Aula 06 - Noções de Discurso, Texto e Textualidade

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Comunicação e Expressão I
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Comunicação e Expressão I
SEXTO MOMENTO
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Comunicação e Expressão I
Anotações Noções de Discurso,
Texto e Textualidade
POR QUE APRENDER
Você entende facilmente qualquer texto com o qual tem con-
tato? Talvez sua resposta seja: “Depende do texto”. E quanto à produ-
ção? Você encontra mais dificuldade em se expressar por meio da fala 
ou da escrita? Pode ser que sua resposta seja: “Se for pra falar, tudo 
bem, mas não me peça para escrever”. Ou o contrário: “Não gosto 
muito de falar, principalmente se for em público, pois sou um bocado 
tímido. Prefiro a escrita”.
Em geral, somos levados a imaginar que a facilidade ou a di-
ficuldade de leitura é uma propriedade do texto. Assim, dificilmente 
admitiríamos que isso depende de nossa capacidade, isto é, do de-
senvolvimento de uma competência que nos permita assimilar ade-
quadamente os sentidos dos textos com os quais nos defrontamos. 
Do mesmo modo, também acreditamos que é mais fácil produzir um 
texto falado do que um escrito, ou vice-versa, ou, ainda, que depende 
da situação em que estivermos.
Neste Momento, portanto, vamos (re)ver algumas questões 
acerca das noções de discurso, texto e textualidade. Com isso, pre-
tendemos que você adquira um conhecimento mais aprofundado sobre 
a produção do discurso através do texto e sobre como os fatores de 
textualidade contribuem para a manifestação discursiva, com vistas à 
melhoria de sua qualidade de leitura e de produção textual.
O QUE APRENDER
NOÇÃO DE DISCURSO
Todas as nossas interações comunicativas relacionam-se sempre 
a uma esfera de atividade social em que estamos engajados no dia-a-
dia (compra/venda, ensino/aprendizagem, consulta/orientação médica, 
namoro etc.). Em outras palavras, são interlocuções que se realizam 
dentro de um conjunto de práticas sociais, situadas não apenas num 
dado ambiente institucional imediato, mas também num contexto so-
ciocultural e histórico mais amplo.
Essas práticas sociais do cotidiano, tais como as descritas no pará-
grafo anterior, surgem de necessidades comuns e atendem a certos objeti-
vos. Daí serem responsáveis pela formação dos discursos que as orientam 
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Anotações
e lhes dão sentido, impondo tanto o que deve ou não ser comunicado, 
bem como o modo e os meios apropriados de sua realização.
O discurso, então, deve ser entendido aqui como a circulação 
negociada de determinados efeitos de sentidos que se realiza através da 
linguagem, dentro de uma situação sociocomunicativa historicamen-
te localizada, entre indivíduos que ocupam posições sociais definidas, 
envolvidos numa certa atividade cultural (TRAVAGLIA, �00�). Com-
preendido assim, o discurso apresenta um conjunto de características, 
as quais você verá a seguir, relativamente de acordo com o que se expõe 
em Bronckart (�999) e em Maingueneau (�00�):
COMO SE CARACTERIZA O DISCURSO
O discurso se estabelece no interior de uma atividade social, 
daí ele ser constitutivamente interativo e dialógico. As pessoas estão 
cotidianamente envolvidas numa série de ações conjuntas, em razão de 
necessidades e interesses mútuos. No curso dessas ações, realizam troca 
de sentidos, os quais interpretam e orientam suas experiências. Assim, 
o discurso constrói-se nas práticas sociais e é, ao mesmo tempo, o fio 
condutor de seus significados.
Tome-se como exemplo a ida ao cinema para assistir a um filme. 
No trajeto, para essa localidade, o(a) interessado(a) realiza um conjunto 
de atividades sociais necessárias para chegar ao seu destino, todas elas 
envolvendo interações discursivas: se for de ônibus, precisará identificar 
aquele que o(a) levará ao lugar desejado; durante a viagem, poderá ler 
alguma coisa para passar o tempo, conversar com um (des)conhecido, 
ou simplesmente, por alguma curiosidade, ver as diversas propagandas 
comerciais nos outdoors. Se for de carro, inevitavelmente se deparará 
com placas e sinais de trânsito, os quais servem de orientação de como 
se locomover na cidade. No cinema, terá que adquirir o bilhete que lhe 
permitirá o acesso à sala de exibição e, finalmente, o contato com o fil-
me e a construção dos significados que esse encontro lhe possibilitará.
Conforme já dito no item anterior, o discurso se constitui na 
e por meio da interatividade dialógica. Significa que, em sua produ-
ção, este não se estabelece unilateralmente nem de forma monológica. 
Lembrando aquele modelo circular de comunicação, visto no �º Mo-
mento, reiteramos aqui o caráter interativo e dialógico do discurso. Isto 
não apenas porque requer, necessariamente, a co-participação atuante 
de sujeitos de linguagem (aqueles que são os sujeitos responsáveis pela 
encenação do discurso, isto é, os interlocutores que assumem (ou não) 
o que é dito na interação). Mas também por instituir a intersecção com 
outros discursos antecedentes e sucessores.
Como um exemplo disso, podemos citar este Momento. Se 
você observar bem, verá que, nele, estamos envolvidos numa situação 
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co-produtiva de discursos. Isto por alguns motivos: nesta produção dis-
cursiva, estamos contando com sua cooperação no estabelecimento dos 
significados que, conjuntamente, estamos construindo; além disso, os 
conteúdos colocados, neste estudo, são uma apropriação parcial de ou-
tros discursos já socialmente partilhados (por exemplo, as fontes biblio-
gráficas nas quais fundamentamos os conteúdos aqui apresentados) e, 
ao mesmo tempo, estamos preparando o caminho para o surgimento 
de novos discursos.
Queremos alertar, todavia, que a dialogicidade entre os discur-
sos nem sempre se dá de modo consensual. Ela pode também se confi-
gurar de maneira tensa e confrontativa, na qual se contrapõem diferen-
tes visões de mundo.
O discurso envolve sujeitos investidos de papéis e posições 
sociais. Significa que, ao interagirem discursivamente, os parceiros de-
sempenham determinados papéis socialmente definidos. Por exemplo, o 
discurso entre pai e filho, entre empresa e cliente(s), entre colegas de clas-
se, ou, ainda, entre desconhecidos numa fila de banco etc. Em todos eles, 
os participantes co-atuam dentro de limites culturalmente estabelecidos, 
de acordo com as relações de poder existentes entre eles. Nesse sentido, 
essas relações revelam igualdade ou desigualdade social entre os sujeitos, 
bem como aproximação ou distanciamento. Um outro fator importante 
diz respeito às posições discursivas assumidas pelos interlocutores. Es-
clarecendo melhor: na produção do discurso, os enunciadores encenam 
visões de mundo das instituições sociais que representam. Assim, eles 
orientam seu discurso numa determinada perspectiva ideológica.
Vamos supor uma interação entre pai e filho: o sujeito que exer-
ce o papel social de pai pode assumir a posição do discurso tradicional 
autoritário ou se posicionar discursivamente alinhado com a visão pro-
gressista mais liberal. O mesmo pode se dar quanto à interação patrão-
empregado, que pode ser marcada pelo discurso capitalista ameaçador 
ou pelo discurso também capitalista, mas conquistador.
O discurso possui uma historicidade e é marcado por ela. 
Entenda-se por historicidade não apenas o fato de o discurso ser um 
acontecimento histórico, no sentido de transcorrer num dado mo-
mento cronologicamente situado na história de vida dos interlocuto-
res, mas, sobretudo, por pertencer a um determinado contexto socio-
cultural historicamente identificável. Nesse sentido, o discurso revela 
traços específicos da forma de organização, da produção cultural, das 
atividades sociais e das diferentes visões de mundo da comunidade 
em que é produzido.
Para ilustrar isso, basta-se pensar no discurso da globalização, 
que ronda e assombra as relações sociais no atual mercado de trabalho. 
As idéias sobre economia, nacionalidade, mão-de-obra, entre outras, 
veiculadas por esse discurso, são uma característica marcante do novo 
modo de produçãomaterial e desta era dominada pela informática e 
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Anotações
pela internet, os quais alteraram significativamente a visão de mundo 
da sociedade contemporânea. Tal visão era praticamente impensável no 
início do século XX.
Essas características anteriores atribuídas ao discurso nos levam 
a uma outra delas decorrentes: a de que o discurso obedece a deter-
minadas normas de conduta sociocultural. Isso quer dizer que, na 
constituição do discurso segue-se uma espécie de “ritual”, ancorado nas 
especificidades das práticas sociais, que determina não apenas o que deve 
ou não ser comunicado, mas também o modo como deve ser expresso.
Para exemplificar, lembre-se de como se aborda um desconheci-
do na rua para lhe pedir alguma informação. Em geral, as regras do bom 
convívio social ensinam que, numa situação assim, em que o provável in-
formante, além de ser um estranho, está em posição superior em relação 
ao solicitante, deve-se agir com polidez, utilizando-se expressões como 
“Por favor, o(a) senhor(a) poderia me dizer... ?”. Por outro lado, o inter-
locutor (informante) deverá limitar-se a fornecer a informação o mais di-
reta e objetivamente possível, mantendo o distanciamento afetivo-social 
em relação ao outro. Isto é assim em virtude de haver um acordo comu-
nitário, ideologicamente estabelecido, que regula a interação social num 
contexto dessa natureza. O mesmo se dá, respectivamente, em relação a 
outras esferas das ações intercomunicativas do cotidiano social.
NOÇÃO DE TEXTO
Por ser uma entidade abstrata, o discurso realiza-se através de 
um objeto que o constitui. Isto porque, como o discurso envolve in-
teração, comunicação, troca de sentidos e uso da linguagem, necessita 
expressar-se objetivamente por meio de um conjunto de formas que lhe 
dêem organização e materialidade. Esse conjunto de formas (ou objeto 
de comunicação) de que estamos falando é o texto.
A noção de texto adotada, neste estudo, aproxima-se parcial-
mente da que pode ser encontrada em autores como Meurer (�997), 
Koch (�00�) e Travaglia (�00�). Trata-se de uma produção intersubjeti-
va (ou seja, entre interlocutores), realizada através da linguagem (verbal 
e/ou não-verbal), em um dado evento enunciativo (quer dizer, num 
SEXTO MOMENTO
 
 Desafio
Descreva uma situação de interação relacionada a 
alguma área das atividades sociais que você realiza 
no seu dia-a-dia. Depois explicite de que modo 
estão presentes nela as características do discurso 
vistas até agora.
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Anotações
contexto de interatividade social), na qual se mobiliza um conjunto 
de operações cognitivas (conjunto de representações mentais ativado 
racionalmente para a formação do conhecimento.) para a circulação 
de efeitos de sentido (isto é, de discursos) sociocultural e historica-
mente orientados (apud BARROS, �00�). Nesse sentido, o texto deve 
ser entendido como um objeto empírico (algo concreto, que pode ser 
apreendido pelos sentidos e objetivamente observável), construído na 
interação entre sujeitos sociais engajados em alguma prática da vida co-
tidiana, por meio do qual se concretiza o discurso, a partir de interesses 
comuns, visando à consecução de determinado(s) objetivo(s).
Veja os exemplos a seguir:
Fonte: Veja. s.d
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Anotações
Inserido numa atividade sociointerativa, o texto materializa o 
discurso mediante um gênero de discurso (que, provisoriamente, vamos 
deixar em aberto sua definição, uma vez que esse tema será alvo de um 
estudo à parte no nono Momento). Este se configura em um conteúdo 
temático, uma forma de organização estrutural, uma ou mais modali-
dades de linguagem e traços estilísticos próprios, compondo um todo 
significativo.
Deve-se observar, contudo, que o sentido de um texto não é uma 
propriedade intrínseca ao próprio texto. Não é dado a priori (ou seja, não 
é pré-existente à interação). Isso quer dizer que uma produção lingüística 
em si e por si só não garante a textualidade de um discurso. Esta é, na 
verdade, resultante da negociação entre os interlocutores, os quais mo-
bilizam um conjunto de estratégias que levarão ao cálculo dos sentidos 
(isto é, a interpretação dos significados) ativados na produção textual.
Nesse sentido, devem ser levados em consideração determina-
dos fatores necessários ao estabelecimento da coerência textual (isto 
é, à constituição da textualidade).
Vejamos alguns deles:
FATORES DE COERÊNCIA TEXTUAL
Articulação superficial (Coesividade)
Esse fator diz respeito às conexões entre os elementos lingü-
ísticos (mecanismos de coesão, que serão estudados mais detalhada-
mente no sétimo Momento) e não-lingüísticos da superfície textual, 
os quais assinalam as relações de sentido. Um texto em que o locutor 
não respeita os critérios de interligação entre os componentes textuais 
pode comprometer o cálculo de sentido das informações. Observe, por 
exemplo, os fragmentos textuais que se seguem:
SEXTO MOMENTO
 
 Reflexão
 • Observou que esse segundo exemplo, mesmo não 
possuindo uma só palavra, comunica plenamente a 
intenção do locutor: satirizar a troca do ministro da 
Economia no governo FHC?
• Percebeu também que essa pequena amostra, 
portanto, evidencia que o discurso, em determinados 
contextos de interação, pode processar-se, muitas 
vezes, por meio de um texto não-verbal (uma 
imagem, um gesto, um recurso sonoro etc.), com 
resultado bem mais eficiente e satisfatório do que 
através do uso de palavras?
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Anotações
1.	 “...	como	aconteceu	com	o	jogador	Serginho,	onde	a	am-
bulância	estava	trancada.”
2.	 “...	brasileiros	que	somos,	só	atenta	para	isso	[a	saúde],	
quando	algo	nos	acontece.	Não	que	sendo	assídua,	não	
venha	 acontecer,	 pois	 estamos	 cansada	 de	 ver	 nos	 jor-
nais...”
3.	 “Esperamos	 que	 atitudes	 coniventes	 aos	 cargos	 obtidos	
pelos	órgãos	competentes...	diante	de	situações	que	po-
deremos	estar	acometidos.”
(UnP Natal/RN. Vestibular 2005.1)
Distribuição informacional (Informatividade)
Outro aspecto importante para o estabelecimento da coerência 
textual tem a ver com o plano (ou o controle) informativo do texto 
(informação nova / informação velha, referência a elementos e dados do 
contexto comunicativo, uso de implícitos etc.). O locutor monitora a 
quantidade das informações, explicitando ou não determinados conte-
údos. Para isso, conta com o conhecimento de mundo, o conhecimento 
partilhado e a capacidade inferencial do(s) seu(s) interlocutor(es). Isto 
é, ele procede assim porque possui uma relativa noção quanto ao grau 
de domínio que seu público-alvo tem acerca do tópico (ou assunto) 
que está sendo comunicado. Assim, quanto menos conhecimento o in-
terlocutor tiver, maior é a demanda de informação, e vice-versa. Caso 
contrário, a comunicação ficará prejudicada.
É por isso, só para citar um exemplo, que, numa aula expositiva 
em que um determinado tema está sendo apresentado pela primeira 
vez, o(a) professor(a) tende a se alongar em suas explicações. Exatamen-
te porque ele(a) parte do pressuposto de que seus alunos têm pouca ou 
nenhuma noção sobre esse novo assunto. Isso seria diferente caso sou-
besse que a turma já possui um razoável conhecimento acerca do que 
seria tratado. É bem provável que o custo com certos esclarecimentos 
fosse menor, ou estes poderiam até mesmo ser dispensáveis.
SEXTO MOMENTO
 
 Desafio
Percebeu que o simples encadeamento das formas 
lingüísticas não garante os nexos significativos do 
texto e que o seu resultado não passa de um mero 
ajuntamento de palavras sem sentido?
Portanto, como sugestão de atividade, tente justificar 
porque o reconhecimento do conteúdo textual 
depende, em boa medida, do modo como foram feitas 
as combinações entre seus componentes lingüísticos 
(palavras, expressões e frases).
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Anotações
Focalização intencional (Intencionalidade)Todo discurso é produzido com uma intenção. Assim, cons-
trói-se o texto visando à consecução de certos objetivos. Daí, outro 
fator responsável pela coerência textual refere-se à perspectiva assu-
mida pelo locutor, a partir da qual constitui o conjunto dos sig-
nificados textuais para um determinado fim (ou propósito). Nesse 
caso, fornece algumas “instruções” (ou pistas) ao interlocutor, condu-
zindo-o em direção ao cálculo de sentido do texto e à finalidade pre-
tendida. Um exemplo disso é quando o locutor possui uma visão po-
sitiva em relação a alguém ou a alguma coisa. A tendência, nesse caso, 
é o texto vir marcado por palavras e expressões valorizadoras. Caso a 
intenção seja contrária, isto é, se a perspectiva é negativa/ pessimista, 
então o normal é o texto conter marcas lingüísticas de depreciação.
Outro aspecto quanto a isso refere-se ao fato de o enunciador 
expor, omitir ou realçar determinadas informações. Com essa estraté-
gia, a “realidade” é apresentada sob um determinado enfoque, recor-
tada de acordo com o ponto de vista e os interesses do produtor do 
texto
Ainda uma outra observação é que, às vezes, o locutor “disfar-
ça” sua intenção, orientando seu(s) parceiro(s) de interação para um 
desfecho inesperado. Nesse caso, um dos objetivos é surpreender o ou-
vinte/leitor e causar-lhe certo impacto, ocorrendo, assim, uma quebra 
de expectativa.
Para esclarecer melhor isso, vejamos o texto a seguir:
Conto Erótico Nº 1
	
Assim?
É	assim.
Mais	depressa?
Não.	Assim	está	bem.	Um	pouco	mais	par...
Assim?
Não,	espere.
Você	disse	que...
Para	o	lado.	Para	o	lado!
Querido...
(...)
Pronto.
Não!	Continue.
Puxa,	mas	você...
Deixa	ver...
Não,	não.	Mais	para	cima.
Aqui?
Mais.	Agora	para	o	lado.
Assim?
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Anotações
Para	a	esquerda.	O	lado	esquerdo!
Aqui?
Isso!	Agora	coça.
(VERÍSSIMO, �97�. p. ��-��)
Observou que, já a partir do título do texto (“Conto erótico 
nº �”), o autor orienta a atenção do interlocutor para um determinado 
tema: o sexo? Isso se reforça através do cenário apresentado no texto, 
o qual, pela estrutura dialogal, leva-nos a crer que se refere a um casal 
em seu momento de intimidade. No entanto, essa focalização dada 
não se confirma, uma vez que, no fim do texto, percebemos tratar-se 
de outra coisa: na verdade, é uma mulher tentando orientar seu com-
panheiro a lhe coçar em algum lugar do corpo – as costas, provavel-
mente. Desse modo, a expectativa criada no início e ao longo do texto 
é subitamente desviada no final para uma outra direção, resultando 
num efeito humorístico.
Isso só é possível por se tratar de um texto literário, no qual 
esse tipo de liberdade informativa é perfeitamente normal. Entretanto, 
tal procedimento seria bastante desaconselhável no caso de uma notí-
cia jornalística ou de um comunicado acadêmico, por exemplo.
Relação contextual (Situacionalidade)
A coerência textual tem a ver também com a ancoragem e 
ajuste do texto à situação interacional em que é produzido e ao 
propósito a que se destina. Significa que todo texto mantém uma 
relação de dependência com o contexto (tanto imediato como históri-
co-cultural) em que é circulado. Por isso é comum serem encontradas 
no texto referências a elementos da situação comunicativa, tais como 
locutor e interlocutor(es), localizações espaciais e temporais, seres e 
objetos que estão em volta dos participantes da interação etc. 
Nesse sentido, todo evento discursivo é ímpar, jamais repetido. 
Assim, um mesmo texto produz diferentes efeitos de sentido e possui 
objetivos variados, dependendo da situação, uma vez que as experiên-
cias intercomunicativas são únicas. Por exemplo: um texto poético é 
apreendido de modo diferenciado se for lido solitariamente por uma 
pessoa, ou se for declamado em uma apresentação teatral, ou se for 
estudado como uma peça de literatura em uma escola, ou se for anali-
sado por algum crítico literário, e assim por diante.
Um outro aspecto a se considerar quanto à dependência texto-
contexto é a importância que os conhecimentos partilhados entre locu-
tor e interlocutor(es), o conhecimento de mundo deste(s), e sua capa-
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Anotações
cidade inferencial exercem na compreensão do texto. O ouvinte/leitor 
que não dispõe de informações suficientes sobre os vínculos existentes 
entre o texto e suas condições de produção poderá ter dificuldade em 
estabelecer determinadas relações de sentido ou, simplesmente conside-
rá-lo “incoerente”.
Conexão intertextual (Intertextualidade)
Esse fator de coerência textual refere-se à apropriação de con-
teúdo, estrutura e/ou estilo de outro(s) texto(s). Na verdade, todo 
texto possui alguma relação com outro(s) texto(s) que o antecederam 
e, ao mesmo tempo, serve como fio condutor para os que virão. Desse 
modo, mantém-se uma cadeia ininterrupta dos discursos que circulam 
socialmente, num movimento constante de retomadas e projeções das 
diferentes visões de mundo assumidas pelos interlocutores.
RELEMBRANDO
Discurso: é o conjunto de sentidos manifestos no texto através 
da linguagem, os quais expressam valores socioculturais e his-
tóricos, num dado contexto de interação.
Texto: é o objeto de linguagem, construído intersubjetivamen-
te e composto de um todo significativo, no qual se realiza o 
discurso.
Fatores de textualidade (coerência textual)
Articulação superficial (Coesividade);
Distribuição informacional (Informatividade);
Focalização intencional (Intecionalidade);
Relação contextual (Situacionalidade);
Conexão intertextual (Intertextualidade).
O QUE FAZER
Para espantar a preguiça, vamos ler, atenciosamente, um texto 
sobre ela?
Discurso da elite
A	preguiça	baiana	foi	um	perfil	construído	historicamente	e	
reforçado	pela	mídia,	que	reproduz	os	interesses	da	elite.	Des-
de	 o	 século	 XVI,	 a	 elite	 local	 depreciava	 os	 negros	 escravos,	
descritos	como	desorganizados	e	sujos,	depois	como	analfa-
betos	e	sem	conhecimento,	e,	finalmente,	como	preguiçosos.	A	
•
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Anotações
famosa	Ladeira	da	Preguiça,	em	Salvador,	ganhou	esse	nome	
por	ter	sido	a	via	de	acesso	de	mercadorias	vindas	o	porto	para	
a	cidade,	 levadas	em	carretões	puxados	a	boi	e	empurrados	
por	escravos.	Do	alto	de	seus	casarões,	ao	verem	os	escravos	
tomando	fôlego	para	subir	com	sacos	de	60	quilos	nas	costas,	
as	elites	gritavam:	“Sobe,	preguiça!	Sobe,	preguiça!”.	Essa	foi	
uma	forma	de	 interiorização	da	dominação,	no	período	da	
escravidão.	Depois,	a	depreciação	assumiu	a	forma	da	exclu-
são.	O	mesmo	aconteceu	com	índios	e	imigrantes	nordestinos,	
nas	regiões	Sul	e	Sudeste,	quando,	a	partir	da	década	de	1950,	
intensificou-se	 a	 imigração.	 A	 imagem	 de	 preguiçoso	 espa-
lhou-se.	Chamados	genericamente	de	“baianos”	os	imigrantes	
eram,	em	sua	maioria,	mestiços,	afrodescendentes,	oriundos	
de	fazendas	afetadas	pela	seca	e	sem	qualificação	profissio-
nal.	O	nordestino	foi	responsabilizado	por	todo	o	caos	urbano	
sem,	ao	mesmo	tempo,	ser	lembrado	em	nenhum	projeto	de	
inclusão	social.
(MENEZES, �00�, p.�0)
Agora, vamos pensar sobre o texto lido?
�. Nesse texto confrontam-se, pelo menos, duas visões de mun-
do (isto é, dois discursos) sobre o povo baiano. Esclareça quais 
são elas.
�. Podemos afirmar que esse texto é um objeto empírico? 
Por quê?
�. Relembrando a noção de texto adotada neste estudo, reflita:
Pensando o texto “Discurso da elite” como uma pro-
dução intersubjetiva, identifique seus interlocutores. 
Que tipo de linguagem está sendo utilizado? 
Identifique o evento enunciativo em que o texto 
está inserido.
�. Pensando em todos os conceitos discutidos sobre a textuali-
dade, durante este e outros Momentos, produza um texto em 
que você se posicione contra ou favor da afirmação de que o 
baiano é preguiçoso.
�.
�.
�.
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Comunicação e Expressão I
Anotações
PARA SABER MAIS
BRONCKART, Jean-Paul. Atividade de linguagem, textos e discur-
sos: por um interacionismosócio-discursivo. Trad. A. R. Machado e P. 
Cunha. São Paulo: EDUC, �999.
KOCH, I. G. V. Desvendando os segredos do texto. �. ed. São Paulo: 
Cortez, �00�.
Ambos abordam questões relativas ao discurso e ao texto, com 
ênfase nos mecanismos do processamento textual.
Ver também estudos sobre o texto, inclusive com exemplos e 
comentários, em:
BENTES, A. C. Lingüística textual. In: MUSSALIM, F.; BENTES, 
A. C. (orgs.). Introdução à lingüística �: domínios e fronteiras. �. ed. 
São Paulo: Cortez, �00�. p. ���-�7.
ONDE ENCONTRAR
BARROS, D. L. P. de. Estudos do discurso. In: FIORIN, J. L. (org.). 
Introdução à lingüística II: princípios de análise. São Paulo: Contexto, 
�00�. p. ��7-��9.
KOCH, I. G. V. O texto e a construção dos sentidos. �. ed. São Pau-
lo: Contexto, �00�. (Col. Caminhos da Lingüística).
MAINGUENEAU, D. Análise de textos de comunicação. Trad. C. P. 
de Souza-e-Silva e D. Rocha. São Paulo: Cortez, �00�.
MENEZES, A. Notícias do Brasil. In: Ciência e Cultura: temas e ten-
dências. s.l. SBPC, �00�
MEURER, J. L. Esboço de um modelo de produção de textos. In: __
______.; MOTTA-ROTH, D. (orgs.). Parâmetros de textualização. 
Santa Maria, RS: EDUFSM, �997, p. ��-��.
TRAVAGLIA, L. C. Gramática e interação: uma proposta para o en-
sino de �º e �º graus. �. ed. São Paulo: Cortez, �00�.
VERÍSSIMO, L. F. O rei do rock. Porto Alegre: RBS/Globo, �97�
SEXTO MOMENTO
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