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AULA 14 - CONTROLE JUDICIAL - Profa Márcia Medeiros

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AULA 14 - CONTROLE JUDICIAL - Profa Márcia Medeiros
CONTROLE JUDICIAL
Controle judicial é o poder de fiscalização que os órgãos do Poder Judiciário exercem sobre os atos administrativos do Executivo, do Legislativo e do próprio Judiciário.
A origem do controle é o Poder Judiciário. 
No sistema de equilíbrio de Poderes, o Judiciário assume a relevante missão de examinar a legalidade e a constitucionalidade de atos e leis. É o Poder jurídico por excelência, sempre distanciado dos interesses políticos que figuram frequentemente no Executivo e no Legislativo.
A importância do controle judicial, convém que se diga, é mais destacada se levarmos em conta os direitos e garantias fundamentais, estatuídos na Constituição. O Judiciário, por ser um Poder equidistante do interesse das pessoas públicas e privadas, assegura sempre um julgamento em que o único fator de motivação é a lei ou a Constituição. Assim, quando o Legislativo e o Executivo se desprendem de seus parâmetros e ofendem tais direitos do indivíduo ou da coletividade, é o controle judicial que vai restaurar a situação de legitimidade, sem que o mais humilde indivíduo se veja prejudicado pelo todo-poderoso Estado.
O controle judicial incide especificamente sobre a atividade administrativa do Estado, seja qual for o Poder onde esteja sendo desempenhada. Alcança os atos administrativos do Executivo, basicamente, mas também examina os atos do Legislativo e do próprio Judiciário, nos quais, como já vimos, se desempenha a atividade administrativa em larga escala.
Com a EC no 45/2004, que acrescentou o inciso LXXVIII ao art. 5o, da CF (que relaciona os direitos e garantias fundamentais), o controle judicial deve sujeitar-se ao princípio da eficiência, sendo assegurado a todos a duração aceitável e tramitação célere dos processos, porque somente assim será resguardado o princípio do acesso à justiça, contemplado no art. 5o, XXXV, da Carta vigente.
· SÚMULAS VINCULANTES – Depois de promulgada a EC no 45/2004 (reforma do Judiciário), na qual foi previsto o sistema de súmulas vinculantes, com o objetivo de reduzir o número de processos judiciais e acelerar sua solução, foi editada a Lei no 11.417, de 19.12.2006, para regulamentar o aludido sistema. 
O objetivo fundamental de tais súmulas é a vinculação de seu preceito, ou seja, seus enunciados terão força vinculante em relação aos demais órgãos do Judiciário e à Administração Pública, seja direta ou indireta, abrangendo todas as esferas federativas. O Poder Legislativo, entretanto, não sofre essa vinculação, quando no exercício de sua produção normativa. Assim, nada impede que disponha em novo ato sobre matéria contida em lei anteriormente declarada inconstitucional, ainda que em controle concentrado. Se tal ocorrer, não haverá ofensa à autoridade do STF, nem será a reclamação (art. 102, I, l, CF) a via idônea de impugnação.
O funcionamento desse regime, no que toca às súmulas, alcança três modalidades de providência:
1. a edição,
2. a revisão 
3. o cancelamento. 
A edição é a providência pela qual é instituído o enunciado da súmula vinculante, denunciando a orientação que o Supremo Tribunal Federal deseja dispensar a determinada matéria.
A revisão, a seu turno, espelha a alteração a ser introduzida em súmula vinculante já editada e nela se denota a mudança da posição anteriormente firmada na súmula revista. 
Por fim, o cancelamento aponta para a supressão da súmula, exprimindo que a nova posição da Corte não mais se coaduna com a orientação anterior.
O fundamento das súmulas vinculantes reside na necessidade de definir a posição do STF quanto a controvérsias que coloquem em grave risco a segurança jurídica e que possam gerar expressiva quantidade de processos tendo por alvo a mesma discussão, fato que prejudica inegavelmente o funcionamento do Judiciário. No que tange ao objeto, tem-se que as súmulas visam a indicar a orientação do STF sobre a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas (art. 2o, § 1o).
A legitimidade para propor a edição, a revisão ou o cancelamento de enunciado de súmula vinculante é concorrente, assemelhando-se a relação dos legitimados àquela voltada para ações de inconstitucionalidade. 
São partes legítimas:
(a) O Presidente da República; 
(b) a Mesa do Senado; 
(c) a Mesa da Câmara dos Deputados; 
(d) o Procurador-Geral da República; 
(e) o Conselho Federal da OAB; 
(f) o Defensor Público-Geral da União; 
(g) partido político com representação no Congresso; 
(h) confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional; 
(i) Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do DF; 
(j) o Governador de Estado ou do Distrito Federal; 
(k) os Tribunais Superiores, os Tribunais de Justiça de Estados ou do DF e Territórios, os Tribunais Regionais Federais, os Tribunais Regionais do Trabalho, os Tribunais Regionais Eleitorais e os Tribunais Militares. 
· Para que seja editada súmula vinculante, a decisão deve ser tomada por 2/3 (dois terços) dos membros do STF. 
Além do mais, sempre será ouvido o Procurador-Geral da República, quando ele mesmo não tiver sido o autor da proposta atinente à súmula. Como regra, a eficácia da súmula vinculante é imediata. Entretanto, decisão tomada por 2/3 (dois terços) dos membros do STF pode restringir os efeitos vinculantes ou decidir que a eficácia tenha início a partir de outro momento, sendo pressuposto de tal exceção a existência de motivos de segurança jurídica ou de excepcional interesse público (art. 4o). Não se suspenderá o curso de processos nos quais a controvérsia tenha relação com o conteúdo de enunciado de súmula ao momento da proposta de sua edição, revisão ou cancelamento. 
Assim, a incidência dos efeitos da súmula nos processos em tramitação só se inicia a partir de sua decisão e da respectiva publicação no Diário Oficial da União (art. 6o). No caso de revogação ou modificação da lei que serviu de fundamento para a edição da súmula, o STF deverá providenciar a revisão ou o cancelamento do enunciado, atuando nesse caso de ofício ou por provocação do legitimado.
Na hipótese de haver contrariedade, negativa de vigência ou aplicação indevida de enunciado de súmula vinculante por decisão judicial ou por ato administrativo, caberá reclamação ao STF, sem prejuízo de recursos ou outros meios de impugnação. 
Acolhida a reclamação, a decisão judicial será objeto de cassação e o ato administrativo, de anulação (art. 7o, caput, e § 2o). Esta decorre da própria decisão do STF, mas, no caso de decisão judicial, a Corte ordenará que outra seja proferida, aplicando, ou não, o julgador, conforme o caso, o enunciado da súmula.
É cabível a reclamação contra atos administrativos ou condutas omissivas da Administração que contrariem enunciado de súmula, lhe neguem vigência ou o apliquem de forma indevida (art. 7o, § 1o). De qualquer modo, a reclamação só será admitida depois de esgotadas as vias administrativas, devendo-se entender aqui, como já vimos, o efetivo percurso pelos níveis hierárquicos recursais do órgão ou da pessoa administrativa.
Observa-se, portanto, que no sistema das súmulas vinculantes se incluem aspectos ligados ao controle judicial sobre a Administração Pública.
O art. 102, § 3º, da CF, incluído pela EC nº 45/2004, passou a exigir que, no recurso extraordinário, o recorrente demonstre a repercussão geral das questões discutidas no caso, sendo aquela considerada a existência, ou não, de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, que ultrapassem os interesses subjetivos das partes no processo.
SISTEMAS DE CONTROLE
Sistemas de controle é o conjunto de instrumentos contemplados no ordenamento jurídico que têm por fim fiscalizar a legalidade dos atos da Administração.
Cada ordenamento jurídico apresenta mecanismos próprios para esse controle. Esses mecanismos buscam, na verdade, evitar que a atividade administrativa, seja no âmbito interno, seja a que se estende aos administrados, fique desprovida de controle da legalidade. 
Sistema do ContenciosoAdministrativo
A expressão contencioso administrativo tem dois sentidos. Um deles é a denominação dada ao sistema da dualidade de jurisdição. O outro significa qualquer tipo de conflito que tramite na via administrativa. Ou seja, mesmo nos países que não adotam o sistema em foco, existe o contencioso administrativo neste último sentido, porque em todos os lugares é permitido que o indivíduo reclame da Administração junto a seus próprios órgãos. Os recursos de reclamação e de representação, por exemplo, formam um contencioso administrativo, porque tramita na via administrativa.
O sistema do contencioso administrativo, também denominado de sistema da dualidade de jurisdição ou sistema francês, se caracteriza pelo fato de que, ao lado da Justiça do Poder Judiciário, o ordenamento contempla uma Justiça Administrativa. Esse sistema, adotado pela França e pela Itália, entre outros países sobretudo europeus, apresenta juízes e tribunais pertencentes a Poderes diversos do Estado. 
A Justiça Administrativa tem jurisdição e competência sobre alguns litígios específicos. Nunca serão, todavia, litígios somente entre particulares; nos conflitos, uma das partes é necessariamente o Poder Público. Compete-lhe julgar causas que visem à invalidação e à interpretação de atos administrativos e aquelas em que o interessado requer a restauração da legalidade quando teve direito seu ofendido por conduta administrativa. 
Sistema da Unidade de Jurisdição
Por essa modalidade de sistema, todos os litígios, administrativos ou de caráter privado, são sujeitos à apreciação e à decisão da Justiça comum, vale dizer, a que é composta de juízes e tribunais do Poder Judiciário. Adotam o sistema da unidade de jurisdição os Estados Unidos, o México e alguns outros países, entre eles o Brasil.
No sistema da unidade de jurisdição, apenas os órgãos do Judiciário exercem a função jurisdicional e proferem decisões com o caráter da definitividade. 
O fundamento da adoção do sistema da unidade de jurisdição pelo Brasil está sufragado pelos termos do art. 5o, XXXV, da vigente Constituição: “A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. O preceito é claro: nenhuma decisão de qualquer outro Poder que ofenda direito, ou ameace ofendê-lo, pode ser excluída do reexame, com foros de definitividade, por órgãos jurisdicionais. A Administração Pública em nenhum momento exerce função jurisdicional, de forma que seus atos sempre poderão ser reapreciados no Judiciário.
NATUREZA
O controle judicial sobre atos da Administração é exclusivamente de legalidade. Significa dizer que o Judiciário tem o poder de confrontar qualquer ato administrativo com a lei ou com a Constituição e verificar se há ou não compatibilidade normativa. Se o ato for contrário à lei ou à Constituição, o Judiciário declarará a sua invalidação de modo a não permitir que continue produzindo efeitos ilícitos. É bom salientar que o controle abrange tanto os atos vinculados como os discricionários, já que todos têm que obedecer aos requisitos de validade. Um vício de competência, por exemplo, tanto pode estar num ato vinculado como discricionário. O mesmo ocorre com vícios na finalidade, no motivo etc.
· O que é vedado ao Judiciário, como corretamente têm decidido os Tribunais, é apreciar o que se denomina normalmente de mérito administrativo, vale dizer, a ele é interditado o poder de reavaliar critérios de conveniência e oportunidade dos atos, que são privativos do administrador público. 
OPORTUNIDADE
A regra geral é a de que o controle judicial é posterior (a posteriori). Depois que os atos administrativos são produzidos e ingressam no mundo jurídico é que o Judiciário atua para, a pedido dos interessados, examinar a legalidade, ou não, dos atos. Estes, como sabemos, têm a seu favor a prerrogativa da presunção de legitimidade e da autoexecutoriedade, de modo que a Administração, como regra, os pratica sem que precise de qualquer autorização.
Se o ato estiver contaminado de vício de legalidade, o controle judicial é que vai permitir que seja invalidado, restaurando-se a situação de legalidade anteriormente existente.
Há, entretanto, algumas situações especiais que admitem um controle prévio do Judiciário (a priori). Esse controle, porém, não deve ser entendido como uma forma de o Judiciário fazer averiguação prévia de tudo o que está a cargo da Administração, mas sim como o meio de evitar que direitos individuais ou coletivos sejam irreversivelmente ofendidos, vale dizer, sem que haja a possibilidade de o ofendido ver restaurada inteiramente a legalidade. O fundamento desse controle se encontra no próprio art. 5o, XXXV, da CF, que garante o indivíduo contra lesão ou ameaça de lesão a direito.
Para esse fim, as leis processuais preveem a tutela preventiva, ensejando a possibilidade de o juiz sustar os efeitos de atos administrativos através de medidas preventivas liminares, quando presentes os pressupostos da plausibilidade do direito (fumus boni iuris) e o risco de haver lesão irreparável pelo decurso do tempo (periculum in mora). 
· Tais medidas, além de contempladas no estatuto processual comum, têm previsão em leis especiais, como a que regula o mandado de segurança (Lei no 12.016/2009); a ação popular (Lei no 4.717/1965); e ação civil pública (Lei no 7.347/1985).
ATOS SOB CONTROLE ESPECIAL
Atos Políticos
Trata-se daqueles atos produzidos por certos agentes da cúpula diretiva do país, no uso de sua competência constitucional. Esses atos não são propriamente administrativos, mas atos de governo.
Seu fundamento se encontra na Constituição, e por tal motivo não têm parâmetros prévios de controle. Por outro lado, são esses os atos que permitem a condução das políticas, das diretrizes e das estratégias do Governo. Ausentes quaisquer standards predeterminados para limitá-los, os atos políticos comportam maior discricionariedade para os governantes, facultando-lhes a todo o tempo um leque aberto de possibilidades de ação, sendo todas legítimas. 
Como exemplo desses atos, temos o ato de indulto, da competência do Presidente da República (art. 84, XII, CF); o ato de permissão da mesma autoridade, para que forças estrangeiras transitem pelo território nacional (art. 84, XXII, CF). Em relação ao Congresso Nacional, exemplificamos com o ato pelo qual é concedida autorização ao Presidente da República para se ausentar do país (art. 49, III, CF). Todos esses são considerados atos políticos, porque seus motivos residem na esfera exclusiva da autoridade competente para praticá-los.
A especificidade do controle reside na circunstância de que o Judiciário não pode exercer seu controle sobre os critérios governamentais que conduzem à edição dos atos políticos. A vedação ao controle limita-se apenas à valoração dos motivos dos atos por situar-se na esfera privativa do agente governamental.
Atos Legislativos Típicos
São aqueles que dispõem de conteúdo normativo, abstrato e geral, também chamados de leis em tese. Não se trata, é óbvio, das leis que, conforme já verificamos, só são assim caracterizadas sob o aspecto formal, embora sob o aspecto material sejam meros atos administrativos – caso da lei de efeitos concretos.
O controle desse tipo de ato é idêntico ao que o Judiciário exerce sobre os atos administrativos em geral.
No entanto, os atos legislativos típicos são os que se originam do Poder Legislativo no regular exercício de sua função constitucional, qual seja, a de criação do sistema normativo. Incluem-se na categoria desses atos os demais constantes do art. 59 da CF, entre eles as leis complementares, as leis delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos etc.
O controle judicial desses atos é especial na medida em que não podem ser questionados pelas ações comuns. O controle judicial cinge-se aos parâmetros fixados na Constituição e, como é evidente, não pode excedêlos. Por outro lado, esse controle não é propriamente de legalidade, mas sim de constitucionalidade, porque cabe ao Judiciário confrontar o ato legislativo típicocom a Constituição.
Lembremo-nos de que o Judiciário exerce duas formas de controle da constitucionalidade das leis: o controle difuso e o controle concentrado. O controle difuso não chega a ser especial, porque a matéria de constitucionalidade, ou não, da lei é discutida como prejudicial numa ação judicial comum. O controle concentrado – aquele que se destina a impugnar diretamente a lei ou o ato normativo, ou seja, aquele em que a apreciação da constitucionalidade ou não constitui a questão principal do processo – é que representa um modelo especial processado através de mecanismos previstos na Constituição. Tais mecanismos são a ação direta de inconstitucionalidade por ação ou omissão (ADI e ADO: arts. 102, I, “a” e “p”; art. 103 e §§ 1º a 3º; e art. 125, § 2º, CF), a ação declaratória de constitucionalidade (ADC: art. 102, I, “a”; art. 102, § 2º, e art. 103, § 4º, CF) – reguladas pela Lei nº 9.868, de 10.11.1999 – e a arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF: art. 102, § 1º, CF), regulada pela Lei nº 9.882, de 3.12.1999. 
Atos Interna Corporis
Atos interna corporis são aqueles praticados dentro da competência interna e exclusiva dos órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário. Esses atos emanam dos referidos Poderes, porque têm eles prerrogativas que lhes são próprias no regular exercício de suas funções. Vejamos um exemplo no caso do Legislativo: as votações e a elaboração de seus regimentos internos (arts. 47, 51, III, e 52, XII, CF). Os Tribunais também têm autonomia para elaborar seus regimentos (art. 96, I, “a”, CF).
O controle judicial não pode ser exercido sobre as razões que levam os órgãos diretivos desses Poderes a manifestarem a sua vontade e a produzirem seus atos, porque estes são internos e exclusivos dos mesmos Poderes. O fundamento da vedação aqui se assemelha em muito ao que embasa o controle especial sobre os atos políticos. A síntese reside em que o Judiciário, na função jurisdicional, não pode substituir os critérios internos e exclusivos outorgados aos Poderes pela Constituição.
Em suma: o Judiciário não pode invadir os aspectos que representam competência interna e exclusiva do Legislativo e do próprio Judiciário; por essa razão, inexiste controle nesses aspectos. Mas se os atos estiverem eivados de vício de legalidade ou de constitucionalidade e ofenderem direitos individuais, podem os prejudicados instaurar normalmente suas demandas no Judiciário, requerendo a apreciação e a invalidação de tais atos. Essa é a razão por que também é especial esse tipo de controle.
INSTRUMENTOS DE CONTROLE
MANDADO DE SEGURANÇA
Mandado de segurança é a ação de fundamento constitucional pela qual se torna possível proteger o direito líquido e certo do interessado contra ato do Poder Público ou de agente de pessoa privada no exercício de função delegada.
Sem qualquer dúvida, o mandado de segurança representa o mais poderoso instrumento de proteção aos direitos dos indivíduos e agora também aos direitos de grupos de pessoas tomados de forma global.
Trata-se de garantia fundamental, como assinala a Constituição ao inserir esse mecanismo entre os instrumentos de cidadania e de tutela aos direitos em geral. Inegavelmente constitui expressivo pilar de enfrentamento relativamente aos atos estatais, de qualquer natureza, assim considerados de forma genérica aqueles provenientes de órgãos e pessoas do próprio Estado, bem como aqueles oriundos de pessoas privadas no desempenho da função pública por delegação. Portanto, nada mais justo que o examinemos desde logo como sendo a arma mais eficaz de controle da Administração Pública.
Espécies e Fontes Normativas
De um lado, temos o mandado de segurança individual, modalidade clássica da ação, adotado para a defesa do direito próprio do impetrante. Sua base constitucional é o art. 5o, LXIX, da Constituição.
De outro, encontramos o mandado de segurança coletivo, cuja impetração é atribuída a pessoas jurídicas para a defesa do interesse de seus membros ou associados. É o caso, por exemplo, de uma entidade de classe ou uma associação quando se insurge contra ato do Poder Público ofensivo a direito de seus membros ou associados. A fonte constitucional dessa categoria está no art. 5o, LXX, da CF, que – diga-se de passagem – foi também o mandamento instituidor dessa espécie.
Atualmente, o diploma básico regulador de ambas as espécies é a Lei no 12.016, de 7.8.2009 (LMS – Lei do Mandado de Segurança), que revogou a antiga Lei no 1.533/1951 e várias outras leis posteriores que alteraram a disciplina do writ. 
A Tutela
Constitui objeto da tutela de ambas as espécies de mandado de segurança o direito líquido e certo. Domina, porém, o entendimento de que direito líquido e certo é aquele que pode ser comprovado de plano, ou seja, aquela situação que permite ao autor da ação exibir desde logo os elementos de prova que conduzam à certeza e à liquidez dos fatos que amparam o direito. Se o impetrante não tem esses elementos logo no início do mandado de segurança, não pode valer-se do instrumento, mas sim das ações comuns. 
Tem-se, então, que o mandado de segurança serve para a tutela de todas as categorias de direito líquido e certo, à exceção dos que são protegidos pelos referidos remédios específicos. Essa exclusão, aliás, já é definida no texto constitucional.
Impetrante
No mandado de segurança individual, impetrante é aquele que sofre ou que tem justo receio de sofrer violação em seu direito por parte da autoridade (art. 1º, LMS). Quer dizer: ou a ofensa já ocorre ou existe a ameaça de ocorrer. 
Afinal, pessoas jurídicas também são titulares de direitos líquidos e certos, de modo que, se o forem, podem socorrer-se do mandamus para a sua tutela.
Impetrado
Impetrado é o agente público, ou o agente de pessoa privada com funções delegadas, que pratica o ato violador sujeito à impugnação através do mandado de segurança, individual ou coletivo. Pode qualificar-se também como autoridade o agente do qual se origina a ordem para a prática do ato (art. 6o, § 3o, LMS).
A autoridade coatora é aquela que tenha “poder de decisão”, não se configurando como tal nem os subalternos, meramente executores da ordem (porteiros, entregadores de notificações etc.), nem os situados nos degraus superiores de hierarquia, que, como regra, se limitam a estabelecer as políticas públicas a cargo do órgão ou da entidade.
A legitimidade, pois, é da autoridade de onde emana a ordem, e não do mero cumpridor. A lei refere-se a “autoridade” (art. 1o), mas o termo não tem aquela precisão que conduza à imediata identificação do autor do ato. 
Quando se tratar de atos produzidos no âmbito da gestão interna da empresa, de natureza privada, a impugnação não pode ser oferecida por mandado de segurança, mas sim pelas ações comuns. Por exemplo: um ato de dirigente de empresa concessionária de energia elétrica pode ser, ou não, praticado no exercício da função delegada. 
Formas de Tutela
O mandado de segurança admite duas formas de tutela e, por isso, são duas as espécies do instrumento sob esse ângulo: o mandado de segurança repressivo e o mandado de segurança preventivo.
Através do mandado de segurança repressivo, o impetrante defende seu direito contra ato do Poder Público já vigente e eficaz. Como esses elementos tornam o ato operante, o mandamus visa a corrigir a conduta administrativa adotada. Reprime-se, pois, a atuação do administrador. 
O mandado de segurança preventivo tem por fim evitar a lesão ao direito líquido e certo do titular. No caso, o ato já foi praticado, mas ainda está despido de eficácia, sendo inoperante; ou não foi praticado, mas já há elementos idôneos que sugerem que o será. O interessado, de qualquer modo, sente-se ameaçado pelos efeitos que lhe advirão. Presentes tais pressupostos, cabe o mandado de segurança preventivo.
Descabimento
O mandado de segurança não é remédio para todos os males, razão por que existem hipóteses em que a ação não é cabível. Algumas das hipóteses de descabimento formaram-se na jurisprudência, ao passo que outras seencontram estampadas de forma expressa na lei.
Em primeiro lugar, descabe o mandado de segurança contra a lei em tese, expressão que, como já comentamos, indica o ato legislativo com efeito geral, abstrato e impessoal, sendo mais comum a lei, embora outros atos, como decretos, regulamentos, decretos legislativos, medidas provisórias etc. também possam ter tais características. Esses atos, por serem gerais, não ofendem diretamente direitos individuais. Além disso, o ordenamento jurídico aponta mecanismos específicos de impugnação, entre os quais não figura o mandado de segurança. Advirta-se, entretanto, que cabe o MS contra a lei de efeitos concretos, que tem “corpo de lei e alma de ato administrativo”. Como tais atos podem atingir a esfera jurídica do interessado, cabível será valer-se do mandado de segurança para a defesa de seu direito líquido e certo.
Não cabe, da mesma forma, o writ contra a coisa julgada. Esta traduz instituto fundamental para a observância do princípio da estabilidade das relações jurídicas, indicativa de que determinada controvérsia se reveste do caráter de imutabilidade. A se admitir o cabimento, instalar-se-ia perigosa perspectiva de instabilidade, o que vai de encontro aos modernos postulados jurídicos. A jurisprudência, aliás, já havia consagrado esse entendimento. A nova lei, diferentemente da anterior, que era silente a respeito, deixou expressa essa hipótese de descabimento, não se concedendo o MS quando se tratar de “decisão judicial transitada em julgado” (art. 5o, III). Não obstante, considera-se, por exceção, cabível a ação quando o impetrante não foi parte na relação processual.
Os atos interna corporis não ensejam o cabimento do mandado de segurança. São atos específicos produzidos no âmbito da competência reservada a determinados órgãos do Estado e decorrem de valoração de conveniência e de oportunidade marcada pela discricionariedade. Assim, são inidôneos para ofender direitos individuais ou transindividuais. É o caso das normas de regimentos de Tribunais e de Casas Legislativas. 
A nova lei estabelece não ser viável a concessão do mandado de segurança no caso “de ato do qual caiba recurso administrativo com efeito suspensivo, independentemente de caução” (art. 5o, I), praticamente reproduzindo o texto anterior. Por tal motivo, continua a impropriedade do conteúdo normativo, parecendo ser exigido o exaurimento da via administrativa como condição para o writ. Sempre assinalamos que não é o fato em si de caber o recurso com efeito suspensivo que impede a ação; é, sim, o fato de caber esse tipo de recurso e o interessado tê-lo efetivamente interposto, tornando o ato inoperante até que o recurso seja decidido. 
Descabe também o mandado de segurança contra “decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspensivo” (art. 5o, II). A lei nova fez duas alterações relativamente ao texto anterior: primeiro, suprimiu o termo “despacho”, ato do qual sequer cabe recurso; depois, suprimiu a referência à vetusta “correição”, já praticamente banida do sistema processual e que tanta polêmica causou sobre a sua natureza jurídica – se recurso ou reclamação fundada no direito de petição.279 A ratio legis é clara: se o ato judicial pode ser discutido por recurso processual próprio, com efeito suspensivo, fica afastada a possibilidade de impugnação pelo mandamus, porque, a não ser assim, ou teríamos dois meios de ataque para o mesmo objetivo, ou o mandado de segurança estaria substituindo recurso previsto na lei processual, o que refugiria a sua finalidade.
Medida Liminar
Há certas situações que rendem ensejo à tutela de urgência: para evitar um dano irreparável, cumpre paralisar os efeitos do ato violador do direito líquido e certo.
A Lei no 12.016/2009 manteve o sistema da lei anterior e permite que o juiz, ao despachar a inicial, suspenda o ato impugnado quando houver fundamento relevante e desse mesmo ato possa resultar a ineficácia da segurança, caso seja deferida ao final (art. 7º, III). Esses elementos legais valem como condições para a concessão da medida liminar, uma indicando que o pedido tem plausibilidade jurídica, ou seja, fundamento razoável e presumidamente verídico (fumus boni iuris), e a outra destacando que a demora na solução final pode não assegurar o direito do impetrante, ou seja, mesmo que o impetrante vença a demanda, de nada terá adiantado promovê-la (periculum in mora), o que viola o princípio da efetividade do processo. Se for deferida a liminar, o processo terá prioridade para
julgamento (art. 7º, § 4º, LMS).
Essa providência judicial, que tem a natureza de medida cautelar e se reveste de caráter preventivo, pode ser concedida inaudita altera parte, ou seja, de modo imediato, liminar, sem manifestação da parte contrária. Em determinadas situações, o juiz, antes de decidir sobre a liminar, poderá aguardar as informações do impetrado. A cautela nesse caso decorre de alguma situação de risco quanto à concessão imediata, gerando o que a doutrina denomina de “periculum in mora in rem verso”, ou seja, a probabilidade de que a concessão imediata possa trazer efeitos extremamente danosos para o Poder Público. Seja como for, o objeto da liminar deve coincidir, total ou parcialmente, com o objeto da impetração.
A concessão da medida liminar encontra restrições na lei, reproduzindo
alguns casos contemplados pela legislação anterior extravagante. 
São cinco os casos de vedação à liminar: 
(a) compensação de créditos tributários; 
(b) entrega de mercadorias e bens oriundos do exterior; 
(c) reclassificação ou equiparação de servidores; 
(d) concessão de aumento;
 e) extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza (art. 7o, § 2o).
A medida liminar pode ser objeto de cassação ou de revogação diante de elementos supervenientes ocorridos no processo (art. 7º, § 3º). A revogação ocorre quando o juiz forma nova convicção em virtude de dados posteriores vindos ao processo, passando a entender ausente algum dos pressupostos que o mobilizaram à concessão da medida. Por outro lado, a cassação decorre de ato produzido por diverso órgão jurisdicional, que, por convencimento antagônico ao do juiz, julga indevido o deferimento da liminar.
Competência
Conquanto se caracterize como ação, o mandado de segurança constitui remédio especial e garantia fundamental com amparo na Constituição.
Na esfera federal, têm competência para processar e julgar mandado de segurança: o STF, quando se tratar de ato do Presidente da República, das Mesas da Câmara e do Senado, do Tribunal de Contas da União, do Procurador-Geral da República e do próprio STF (art. 102, I, “d”, CF); não lhe compete, porém, conhecer originariamente de mandado de segurança contra atos de outros Tribunais;287 o mesmo se passa com atos de Turmas Recursais; o STJ, quando se tratar de ato de Ministro de Estado ou do próprio STJ (art. 105, I, “b”, CF); não é competente o STJ no caso de atos de outros Tribunais; se o ato é de Ministro de Estado como presidente de órgão colegiado, como, v. g., um Conselho administrativo, competente é a Justiça Federal de 1ª instância290 (o mesmo se aplica a autoridades estaduais ou municipais com foro especial); os Tribunais Regionais Federais, no caso de atos dos próprios Tribunais ou de juiz federal (art. 108, I, “c”, CF); os juízes federais, quando se cuida de atos de outras autoridades federais (art. 109, VIII, CF); idêntica é a competência quando se trata de atos estaduais praticados por delegação da União; é da Justiça Federal, e não da Estadual, a competência para mandado de segurança impetrado por autarquia federal, mesmo sendo coatora autoridade estadual ou municipal: aplica-se no caso o art. 109, I, CF.
Prazo
O prazo para a impetração do mandado de segurança é de 120 dias contados da data em que o interessado tomou ciência do ato impugnado, conforme averba o art. 23 da LMS.
Conquanto haja algumas divergências sobre o tema, domina o entendimento de que o referido prazo é de decadência, e não de prescrição, e, por isso, não se suspende nem se interrompe. O fundamentoconsiste em que o prazo atinge a relação processual, e não a pretensão de direito material. 
Sentença e Coisa Julgada
A sentença que julga o mandado de segurança pode decidir a causa em três sentidos. Primeiramente, a sentença pode julgar no sentido da procedência do pedido: o juiz concede a segurança. 
Nesse caso, o juiz reconhece a lesão ao direito líquido e certo e pode tomar uma de duas decisões: 
(a) anulação do ato lesivo; 
(b) determinação à autoridade coatora para que faça, deixe de fazer ou tolere alguma coisa (facere, non facere ou pati). Neste caso, se a autoridade não cumpre a ordem, comete crime de desobediência (art. 26, LMS).
A sentença pode decidir pela improcedência do pedido: nessa hipótese, o juiz denega a segurança. O julgamento decide o próprio mérito da controvérsia, reconhecendo que o impetrante não tem o direito subjetivo de que supõe ser titular. A sentença, então, é declaratória negativa. Por fim, a sentença pode extinguir o processo sem resolução do mérito. O art. 6o, § 5o, da LMS, faz remissão ao art. 267 do CPC/1973, correspondente ao art. 485, do Código em vigor, que relaciona os casos de julgamento sem resolução do mérito, sendo tais casos, portanto, aplicáveis ao mandado de segurança. Ocorre que a nova lei, ao fazer a remissão, usa a expressão “Denega-se o mandado de segurança...”, que, a nosso ver, é adequada à decisão com exame de mérito.
Semelhante situação sucede com a sentença que conclui não haver certeza e liquidez do direito, pressuposto inafastável do mandado de segurança. Discrepam os estudiosos sobre o tema. 
A sentença que decidir a demanda com resolução do mérito, concedendo ou denegando a segurança, faz coisa julgada material e, em consequência, não mais poderá ser reapreciada a lide em outro juízo (art. 505, CPC). Se o julgamento se der sem resolução haverá coisa julgada formal, tendo o interessado a oportunidade de promover outra ação (art. 19, LMS) ou, como visto, impetrar novo MS, nesse caso desde que, obviamente, dentro do prazo decadencial (art. 6o, § 6o, LMS). Inocorrendo direito líquido e certo, o interessado também terá o direito de renovar o pedido na via comum (art. 19, LMS).

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