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Ubirajara, de José de Alencar Análise Análise Ubirajara é um livro importante no conjunto das obras indianistas de José de Alencar e fundamental no conjunto, completando sua intenção de fazer uma obra panorâmica, que mapeasse o país tanto geográfica quanto cronologicamente. Assim, a história do "senhor da lança" mostra uma terra selvagem, com sua pureza ainda não profanada pela presença do branco invasor. É um Brasil pré-cabralino, ao passo que O Guarani e Iracema já revelam o contato com a cultura branca europeia (D. Antônio, Ceci, Martim) e suas consequências. Os primeiros cronistas, entre eles Pero Vaz de Caminha, mostram preconceituosamente um índio sem fé, nem lei, como se não tivesse cultura, somente porque não possui a cultura cristã europeia. Essa desvalorização da cultura do habitante primitivo desta nossa terra é questionada por Alencar no prólogo intitulado Advertência. “Este livro é irmão de Iracema. Encontre a faculdade certa pra você Chamei-lhe lenda como ao outro. Nenhum título responde melhor pela propriedade, como pela modéstia, às tradições da pátria indígena. Quem por desfastio percorrer estas páginas, se não tiver estudado com alma brasileira o berço de nossa nacionalidade, há de estranhar entre outras coisas a magnanimidade que ressumbra no drama selvagem a formar-lhe o vigoroso relevo. Como admitir que bárbaros, quais nos pintaram os indígenas, brutos e canibais, antes feras que homens, fossem suscetíveis desses brios nativos que realçam a dignidade do rei da criação? Os historiadores, cronistas e viajantes da primeira época, senão de todo o período colonial, devem ser lidos à luz de uma crítica severa. E indispensável sobretudo escoimar os fatos comprovados, das fábulas a que serviam de mote, e das apreciações a que os sujeitavam espíritos acanhados, por demais imbuídos de uma intolerância ríspida.” Sabiamente, Alencar assim complementa sua critica aos preconceituosos cronistas do passado: “Homens cultos, filhos de uma sociedade velha e curtida por longo trato de séculos, queriam esses forasteiros achar nos indígenas de um mundo novo e segregado da civilização universal uma perfeita conformidade de ideias e costumes. Não se lembravam, ou não sabiam, que eles mesmos provinham de bárbaros ainda mais ferozes e grosseiros do que os selvagens americanos.” Enredo O jovem caçador Araguaia, Jaguaré, procura em terras alheias um inimigo para desafiar e combater. Levando um prisioneiro para sua taba ele conseguirá seu título de guerreiro. Ao contrário do que esperava, encontra uma índia tocantim, filha do chefe, de nome Araci. Ela diz que em sua nação há cem guerreiros que vão disputar seu amor. Jaguaré é convidado a alistar-se entre eles, mas prefere dizer à virgem que mande todos seus pretendentes para combatê-lo. Após a partida de Araci, aparece um índio tocantim, Pojuca, que aceita o desafio de Jaguaré. O índio Araguaia vence e aprisiona o guerreiro tocantim com sua lança, intitulando-se a partir de então, Ubirajara, o senhor da lança. Ubirajara deixa o prisioneiro em sua taba, dando-lhe como esposa do túmulo a jovem Jandira, que até aquele instante era sua noiva. Em seguida, parte o guerreiro para a nação dos Tocantins. Jandira não aceita ser esposa de outro que não Ubirajara e foge para a floresta. Ubirajara chega à taba de Araci e, como a lei da hospitalidade permite, não se identifica, adotando o nome de Jurandir, o que veio trazido pela luz. Compete com os demais e ganha o direito de casar-se com Araci, mas antes da noite nupcial é obrigado a identificar-se. Cria-se uma situação constrangedora, pois seu prisioneiro é irmão de Araci. Declara-se a guerra. Ubirajara liberta Pojuca para que possa lutar ao lado de seu povo. Quando os Araguaia vão atacar, surgem os tapuias que, por justiça, têm o direito de guerrear antes dos paraguaias, que devem esperar. O chefe dos Tocantins, Itaqui, vence o chefe tapuia, mas fica cego, não podendo liderar seu povo. Para sucedê-lo, os guerreiros devem dobrar seu arco e atirar como ele. Como os guerreiros de seu próprio povo não conseguem, convidam Ubirajara a fazê-lo. O guerreiro Araguaia, genro de Itaqui, consegue com tal destreza e força que emociona o velho Itaqui. Assim, Ubirajara une os dois arcos e as duas nações, Araguaia e tocantim, dando origem à grande nação Ubirajara. Como prêmio, ganha também duas esposas: Araci e Jandira. Estrutura da obra Foco narrativo - A narrativa é feita em terceira pessoa. O narrador é, na maior parte da história, um observador; há momentos em que se apresenta como onisciente, tudo sabe e tudo vê. Tempo O tempo cronológico, remonta a ação ao século XV, o que pode ser determinado pela ausência do homem branco. O romance organiza-se, em seus nove capítulos, de forma linear, cronológica, em tempo anterior a 1500, na região do Tocantins. Espaço A narrativa apresenta a natureza selvagem como espaço privilegiado, com a maior parte das ações desenvolvendo- se na região interior e selvagem de um Brasil primitivo e edênico. A natureza é o único componente espacial deste pequeno romance. Selvagem, hostil ou acolhedora, ela representa o espaço ainda inalcançado pelo homem branco, por se tratar de romance pré-cabralino. Há, ainda, o espaço das aldeias, povoado por criaturas selvagens, porém cheia de princípios éticos. Ação Predomina a ação externa, revelando domínio seguro da efabulação, apesar da estrutura simples da obra. O tom épico faz-se presente nos feitos guerreiros, nas caçadas, mas o lírico aparece sempre, tanto na linguagem poética, quanto nos diálogos e nos cantos de amor. A conversa entre Ubirajara e Araci logo depois do combate nupcial é de grande beleza e o canto de tristeza de Jandira quando desprezada é de comovente sentimentalismo. Temática A temática amorosa revela tanta importância quanto a temática da honra. Durante todo o relato, o amor sobrepuja as maiores dificuldades. O tema da honra, simultaneamente, aparece a todo instante: Pojuca teme ser mantido prisioneiro em vez de ser sacrificado, porque isso o desonraria; Itaqui não ataca nem deixa ninguém atacar Ubirajara ao saber que aprisionara Pojuca, pois estaria desrespeitando a lei da hospitalidade; Ubirajara não permite que Araci o acompanhe, pois estaria desonrando Itaqui que o respeitara, e assim por diante. Todos procuram se manter honrados dentro dos princípios e da tradição de seu povo. Assim como em O Guarani em Iracema encontramos também na obra em estudo a idealização do índio. O mito do bom selvagem tem suas bases na teoria de Rousseau de que o homem é naturalmente bom, a sociedade é que o corrompe. Então, o índio integrado à vida natural é símbolo de autenticidade e pureza.
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