Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
1 2 Sinopse Kian e Ivy retornam para a última parte da série Awake. 3 4 5 Capítulo Um Ivy — Kian. – Meu coração dispara e para ao mesmo tempo, por que ele está em meu apartamento? Estou paralisada e os meus pés não se movem. Quando ele se levanta e diz meu nome novamente, o medo me paralisa, e o vejo cair no chão, com o seu grande corpo caindo como um peso morto, atingindo o tapete com um baque pesado. Minha mão cobre minha boca sufocando o grito que escapa sem permissão. — Kian! – grito, ainda incapaz de me mover. Minha mente diz que ele está com problemas, que devo ajudá-lo, mas a minha próxima respiração diz que eu estou com problemas e que devo correr. Não consigo encontrar os meus movimentos ou minha reações, apenas fico lá com lágrimas caindo no meu rosto, encarando a pilha de um homem no meu chão. A falta de sua voz soa como um sino de igreja nos meus ouvidos, reverberando 6 através do meu corpo como um tremor secundário. Quando olho em volta, vejo tudo. A mesa posta para dois, a comida queimando no forno e a taça de vinho na mesinha onde ele estava sentado. Sinto o cheiro de loção pós-barba e xampu. Ele está aqui há um tempo. Está ficando cada vez mais difícil respirar, e eu estendo a mão para me apoiar contra a parede. Fechando os olhos, bloqueando tudo, forço ar nos meus pulmões. Quando abro os olhos e Kian ainda está inconsciente no chão da minha sala de estar, pego na minha bolsa meu celular e ligo para o 911. — Ele tem um pulso, senhora? — Eu não sei. Eu não o toquei. — Você pode colocar dois dedos no pescoço dele, como você vê na TV, e me dizer se consegue sentir o coração dele batendo? – A atendente diz, mas ainda estou paralisada na entrada do meu apartamento. — Acho que não posso. — Senhora, você está ferida? — Não, eu simplesmente não consigo me aproximar dele. – eu estou lutando para respirar novamente, e respirações irregulares pesadas ecoam no celular. — Eu preciso da sua ajuda, senhora. Por favor, você pode ver se ele tem um pulso? — Ivy! Meu nome é Ivy, e não quero chegar perto dele, eu estou com medo! – grito com ela agora. — Apenas envie uma 7 ambulância, por favor. Por favor. – eu digo o último apelo através de ranho e lágrimas, me abraçando firmemente com um braço e segurando o celular no ouvido com uma mão trêmula. — Eles estão quase aí, Ivy. – diz ela, com seu tom muito mais suave agora. — Ivy, você está bem? Está machucada? Aconteceu alguma coisa? — Estou grávida, com medo e sozinha. – eu soluço. — E ele está aqui no meu apartamento, e ele não deveria estar. Ele caiu, eu não fiz nada. Apenas aconteceu. — Ok, Ivy. Apenas fique na linha comigo até a ambulância chegar aí. Você conhece o homem que está inconsciente? Você pode me dizer algo sobre ele? — Kian, ele está - ele está doente. Ele não consegue dormir. Posso ouvir sirenes. Eles estão quase aqui. - ele não deveria estar aqui, ele não deveria. — Qual é o sobrenome dele, querida, para que eu possa enviar seu prontuário médico aos paramédicos, se encontrar algum. — Stanton, Kian Stanton. – eu gaguejo quando os socorristas entram pela minha porta ainda aberta. — Eles estão aqui. – eu deixei o celular cair no chão e deslizei pela parede que estava me apoiando. Há barulho e um monte de pessoas, o som de máquinas e bipes. — Ivy. — Ivy. 8 — Ivy, senhora! Você pode me ouvir? Você está bem? Você está machucada? – eu saio do meu torpor. Há uma chama furiosa dentro do forno e o apartamento está cheio de fumaça. Há um paramédico ajoelhado na minha frente e eles estão amarrando Kian em uma maca. — Você precisa ir ao hospital? Acho que você deveria vir conosco, provavelmente está em choque - isso não é bom para você ou para o bebê. Não estou ouvindo, estou ouvindo as palavras, mas elas não estão afundando. Olho para todos os pequenos detalhes na mesa de jantar. O mundo se inclina no seu eixo, e eu sussurro: — Não o deixe morrer, por favor. Não o deixe morrer. Eu o amo. — Ele está em boas mãos. Você acha que pode caminhar comigo e segui-los até a ambulância? Há um som estridente quando eles apagam o fogo do jantar, e eu aceno. A fumaça está ardendo meus olhos e grudando no fundo da minha garganta. — Apenas me segure. – diz ele, enquanto eu fico com as pernas trêmulas. Existe um tipo diferente de medo que passa por mim enquanto me sento na maca no pronto-socorro, se eu me deitar, não consigo ver o que está acontecendo ao meu redor. Estou desesperada para ouvir algo sobre Kian, esforçando-me para ouvir todas as enfermeiras, médicos e rapazes, caso digam algo - qualquer coisa - 9 sobre como ele está. Não sei por que me importo, não deveria me importar se está vivo ou morto. Ele estava em meu apartamento, o invadiu - eu deveria me sentir violada, não confortada. Mas de alguma forma, agora que eu processei um pouco, eu estou estranhamente à vontade com o fato de que ele voltou para mim e que estava lá esperando por mim. Nunca tivemos uma resolução, não houve um final definitivo para nós. Acabei indo e nunca olhei para trás. Não considerei por um segundo que pudéssemos ficar juntos. Minha raiva e medo dominaram o amor que ainda permanece até agora. Eu sei que ele me amava e que eu inegavelmente o amava até os meus ossos. Fomos deixados em aberto, essa coisa inacabada que ficou comigo. Eu nunca parei de amá-lo, simplesmente não conseguia parar de odiar o que ele havia feito. O ódio pode dominar o amor dez vezes, se você deixar, e quando ele nunca estendeu a mão ou me contatou, eu presumi que não era mais o que ele queria. Se ele não podia me observar, me perseguir ou invadir minha vida, então eu não era boa para ele. Eu me permiti acreditar que já não satisfazia as suas necessidades doentias. Passei meses me convencendo de que Kian não me queria mais, quando fui eu quem me afastou. Fui eu quem foi embora e agora, aqui sozinha no hospital com um bebê na minha barriga, me pergunto se cometi um erro. Quantas noites eu sonhei com ele enquanto estava deitada ao lado de Will? Quantos dias comparei silenciosamente os dois na minha cabeça? Kian nunca me deixou, ele correu atrás de mim naquela noite e eu nem lhe dei a chance de dizer o que ele queria dizer. 10 Eu era uma covarde. Eu fui cruel. — Ivy, eu quero fazer um ultra-som apenas para garantir que seu bebê esteja bem. – A doce obstetra de plantão fala comigo, sua voz é tranquilizante e suave. — Existe alguém que possamos ligar para você? O pai do bebê, talvez? — Não, não, está tudo bem. – eu balanço minha cabeça, tentando dissipar a névoa, não apenas a fumaça. — Você tem certeza? Não é bom estar sozinha neste lugar. — Ele já está aqui. – digo e engulo o caroço do tamanho de uma bola de golfe na minha garganta. — Ele estava na ambulância comigo. — Ah, querida, você deve estar preocupada e doente. Deixe- me dar uma olhada em você, então vou te atualizar sobre seu marido. – ela diz enquanto a gel frio atinge minha barriga, me fazendo ofegar. — Ele não é meu marido. – eu a corrijo. — Ah, desculpe. – diz ela, com as bochechas coradas, envergonhada por seu erro. — Eu apenas supus. — Está tudo bem. – digo. Quando as machas em preto e branco no monitor se movem, posso distinguir os bracinhos e pernas do meu bebê. Eu conto os dedos e os pés. — Doutora... – eu começo a perguntar, porque agora estou me perguntando. — Se o pai do bebê tem uma doença hereditária, existe uma maneira de testar o bebê antes de ele nascer? 11 — Isso depende da doença e se vale a pena arriscar uma amniocentese1 para descobrir. — Insônia familiar fatal. – eu gaguejo as palavras, porque passei muitas horas nos últimos seis meses lendo todas as informações que pude encontrardela. — Nunca ouvi falar disso, mas deixe-me descobrir para você. – diz ela, parecendo desconfortável e fora de profundidade. — É isso que está errado com ele? Com o pai do bebê, é isso? – eu aceno com a cabeça e abaixo minha camisa de volta para o meu ventre. — Você e seu filho parecem estar perfeitamente bem, mas gostaria de mantê-la aqui por algumas horas para ter certeza. Então, deixe-me ter uma atualização e voltarei. Qual o nome dele? — Kian Stanton. — Já volto. – ela puxa a cortina em volta de mim novamente e me deixa lá cercada pelo caos. Observo as pessoas se movendo como formigas operárias, nenhuma delas parando para ver o que está acontecendo ao seu redor. Tudo focado apenas no trabalho em questão. Observo o pai de Kian entrar correndo pelas portas de vidro, empurrando as pessoas para fora do caminho. Ele está no posto de enfermagem, seu rosto está pesaroso e suas mãos agitam com o que ele está dizendo. Quando a enfermeira sai da mesa para ir buscar as respostas, não tenho dúvida de que ele está exigindo, ele se vira e nossos olhos se encontram. Posso ver a cor drenando de seu rosto, e as linhas de preocupação em sua testa se 1 amniocentese é um método de diagnóstico pré-natal que consiste na aspiração transabdominal de uma pequena quantidade de fluido amniótico da bolsa amniótica, que envolve o feto. É tipicamente aconselhada aos pais perante a probabilidade de deformações genéticas durante a gravidez. 12 aprofundarem. Depois de alguns segundos paralisados, ele olha para a minha barriga e lentamente começa a andar em minha direção. Eu não deveria ter medo, mas o meu coração dispara e minhas mãos suam - eu mantive esse bebê em segredo. Estava errado, e eu sei disso. Eu estava sendo egoísta, deixei minha raiva dirigir minhas ações. — Ivy. – Sua voz sai como um sussurro quase silencioso. — Dr. Stanton. – eu o cumprimento. Meu lábio treme com a ameaça de lágrimas de medo que estão prestes a escorrer dos meus olhos. — Sinto muito. – eu deixo escapar sem pensar. — Esse é... esse é o bebê de Kian? – eu concordo com a cabeça em resposta à sua pergunta gaguejada. — Eu não poderia contar a ele. Eu estava com medo, me desculpe. Você tem que entender, o que ele fez, não estava certo. – eu tento justificar minhas ações desprezíveis. — Entendo. Você o viu? – ele me pergunta cautelosamente. — Ele estava em meu apartamento casa hoje à noite. – digo, com meu peito apertando com a ansiedade que o pensamento evoca. — Ele caiu, eu não pude ajudá-lo. Eu entrei em pânico. Sinto muito... – eu começo a soluçar. Choros ofegantes pesados escapam de mim e o monitor conectado à minha barriga começa a soar e emitir um sinal sonoro. — Sinto muito, Ivy, isso não é culpa sua. Você não precisava se desculpar. Acalme-se, querida. Não fique chateada, vai ficar tudo bem. Não importa o que, tudo ficará bem, eu vou garantir que você e meu neto sejam cuidados. Você não precisa se preocupar. 13 Ele cautelosamente coloca a mão no meu ombro, me olhando nos olhos, sua preocupação genuína é clara como o dia. Eu sei que ele não está mentindo para mim, que ele garantirá que não faltará nada para esse bebê — Estou preocupado com ele. – sussurro. — Eu também, eu também, Ivy. Eu preciso ir até ele. Concordo, engolindo meu choro. — Eu sei. 14 Capítulo Dois Kian Dormir/Dor-mir/substantivo. Uma condição do corpo e da mente que normalmente se repete por várias horas todas as noites, na qual o sistema nervoso está inativo, os olhos fechados, os músculos posturais relaxados e a consciência praticamente suspensa. Insônia/In-sô-ni-a/substantivo. Insônia habitual; incapacidade de dormir. Duas palavras que controlaram muito da minha realidade, oscilando entre dois extremos em que eu vivi por tanto tempo. Ciente de que estava pressionando os limites do que minha mente e o meu corpo podiam suportar, eu ainda não conseguia dormir - estou permanentemente acordado. Incapaz de sonhar. Uma 15 benção e uma maldição. A cura para minha dor de cabeça, mas a doença que roubaria minha felicidade. O sono é uma faca de dois gumes e que finalmente veio e me derrubou. Pelo menos ela foi a última coisa que vi. Se esse é o meu fim prematuro, pelo menos Ivy foi a última coisa que pus os olhos. Porque, mesmo agora, eu posso vê-la. Eu gostaria que fosse um sorriso que vi, mas não foi. Havia medo, um horror profundo em seus olhos, onde antes havia amor. Dizem que a sua vida irá aparecer diante de você quando você morrer - mas não há flash. Não estou pronto para ir, até que eu conte a ela. Preciso que ela saiba que fiz isso porque a amei no momento em que a vi. Eu não posso ficar longe; o universo continua me colocando de volta em seu caminho. Ela é a razão de eu não ir, é a razão de eu estar sempre acordado. Isso é tudo para que eu possa vê-la. Talvez ela seja a razão de eu estar dormindo agora. Pela primeira vez, eu quero reagir mais do que tudo, dessa maldição, desse demônio em minha mente que me impede de descansar. Quero cavar no meu DNA e removê-la da minha essência. Eu preciso viver - eu tenho que permanecer vivo por ela, por eles. Pelo o meu filho. Porque se pudessem me consertar, isso significaria que pode ser desfeito que eu amaldiçoe o meu filho. — Filho. – eu posso ouvir meu pai. Ele está aqui. Claro que ele está. — Estou aqui, estamos fazendo tudo o que podemos. Mas você tem que reagir. Não é como nas outras vezes, você tem que reagir mesmo, meu filho. – A voz dele é dolorosa de ouvir. Como se estivesse ferida e 16 hesitante. Ele não acredita em suas próprias palavras, desta vez ele acha que eu vou morrer. — Ivy está aqui, no hospital. É difícil respirar, ela está bem? Ela se machucou? É o meu bebê? É minha culpa? Meu monitor cardíaco está emitindo um bipe incontrolavelmente, e posso sentir meu peito apertando. Eu mereço morrer se os machuquei. — Ela está bem. – diz ele, colocando a mão na minha. Eu posso sentir, mas ainda não consigo acordar. Eu desejei dormir por tanto tempo, e agora eu mataria apenas para abrir meus olhos. — É o seu bebê, você será pai. Eu vou ser avô. Filho, você precisa reagir. – Há um momento longo, silencioso e tranquilo, acho que ele silenciou as máquinas de bip. — Por favor, filho. – ele está negociando, ele já está me entristecendo e nem sequer morri. Meu pai está sofrendo com a perda do filho há muito tempo. Pela primeira vez, entendo o que ele sente, porque sinto essa conexão com meu filho e ele ainda nem nasceu. 17 Capítulo Três Ivy Ele está naquela cama, com os lençóis brancos puxados até o pescoço e os olhos fechados, para que eu não possa ver o que ele está pensando. Não que já soubesse o que Kian estava pensando. Não consegui sair do hospital mesmo estando perfeitamente bem. Eu estou presa aqui por um fio invisível com ele. Minha cabeça quer odiá-lo, quer temer o monstro e fugir, mas meu coração está preso com o dele e não posso libertá-lo. Eu me pergunto como é, como deve ser a sensação de nunca encontrar descanso? Não é à toa que ele é louco. Ainda tento justificar as coisas que ele fez, porque não quero que ele seja um monstro, eu ainda o amo. — Você ainda está aqui? – Seu pai pergunta, chegando atrás de mim. 18 — De alguma forma, eu não posso ir embora. – eu respondo, virando-me para ver o seu rosto exausto. Os pés de galinha nos olhos dele são mais profundos do que eram quando eu o vi pela última vez, e as profundas olheiras embaixo deles carregam a bagagem de um filho doente. — Quero que eles façam aquela coisa amniótica e testem o bebê, receio que fique doente como ele. Ele está ao meu lado na porta, com os ombros um pouco curvados. — Acho bom saber. Eu teria gostado de saber antes de termos Kian. Eu poderia estar preparado,se soubesse. Perdi minha esposa e agora tenho que ver o mesmo destino levar meu filho. – sua voz treme. — Faria qualquer coisa para salvá-lo, para impedir que isso consumisse sua mente. Você deve saber, deve saber para poder saborear o tempo antes que a maldição os reivindique. — Ele irá morrer? — Eventualmente, sim. – ele me olha nos olhos agora. — Espero que não seja agora, eu estou negociando com Deus e o diabo para mantê-lo vivo e ver seu filho. Se você deixar, é claro. – ele diz: — Eu entenderia se você não quiser deixá-lo perto de você ou do bebê. — Ele invadiu meu apartamento, isso me assusta. – É a minha vez de lutar contra uma voz trêmula. — No entanto, quando olho para ele, não consigo desligar o amor que sinto por ele. Isso me cega para o perigo. — Eu não sei o que dizer para você, Ivy. Ele é meu filho, e até eu tenho medo dele às vezes. Eu sei que ele te ama, que em algum nível você o tornou melhor, por um tempo curto. Se ele acordar, acho que ele não vai deixar você ir, ele não vai parar. Então, se 19 seu medo é mais profundo que o seu amor, você precisa ir enquanto ele dorme. Vá muito longe e torne impossível para ele encontrar você, porque ele tentará. — Você acha que se eu o deixasse entrar, ele iria parar, que isso o consertaria? Se eu me abrisse para ele e o deixasse entrar na minha vida, ele ficaria feliz e não teria que temê-lo? — Ele ainda não conseguiria dormir, Ivy, ele nunca dormirá. — Não quis dizer isso, eu quis dizer que ele iria parar de invadir, perseguir e me assustar? — Sinceramente, não sei porque não sabemos quem acordará, se ele acordar. Não há como saber quanto do cérebro dele foi afetado. — Se o mesmo Kian que fechou os olhos, os abrir, então eu quero tentar. — Ele vai morrer jovem, Ivy, você está preparada para isso? – A dor de suas palavras é fisicamente dolorosa. — Não estou preparada para ter um filho que nunca sinta o amor do pai. Se for por um dia, uma semana ou um ano. – Meu terapeuta disse que enfrentar um medo pode curá-lo - bem, é hora de enfrentar o Kian. — Vamos ver se ele acorda, então você pode decidir se é isso que você quer. – ele coloca a mão no meu ombro e olha para o filho adormecido. — Mas faça o teste, é melhor você saber, Ivy. – O pai de Kian toca minha barriga suavemente antes de entrar no quarto, me deixando parada na porta sozinha. Ele se senta na cadeira desconfortável de visitante ao lado da cama de Kian e 20 abaixa a cabeça. Parece que ele está rezando, mas não há palavras saindo da boca dele. Eu vejo o homem conversando com as coisas que não podemos ver. — Você vem comigo? – pergunto a ele, e ele olha para mim. — Tenho medo de fazer isso sozinha. Eu fico com medo no minuto em que vejo a agulha. – ele parece trazido de volta, e desconfortável. — Não importa, esqueça o que pedi. No entanto, vou lhe dizer como foi. — Eu vou com você, Ivy. Você não deveria estar sozinha. — Obrigada. Vou marcar a consulta e avisá-lo quando será. – ele acena com a cabeça antes de olhar para o filho, dormindo profundamente nos lençóis brancos da cama do hospital. Engolindo o nó na garganta, eu me viro e o deixo, vagando pelos corredores até encontrar a obstetra que me ajudou no pronto- socorro. Ela está correndo e parece perturbada, mas para quando me vê. — Ivy, você está bem? — Não. – balanço a minha cabeça. — Eu quero fazer aquele teste. A coisa amniótica. – ela pega minhas mãos e me puxa para o lado, para não bloquear o corredor. — Vá para a sala 559, encontrarei você assim que terminar com meu paciente. Podemos conversar mais sobre isso. Você está bem para chegar até lá? — Acho que sim. 21 Depois de um ultrassom e agendando a consulta, eu me encontro de volta à porta do quarto de Kian. É tão estranho vê-lo assim – impotente e dormindo. É como se as coisas sobre ele que me assustassem estivessem mortas, e apenas as partes que eu amo estivessem lá, agarradas à vida. Lembro-me de dançar com ele, do jeito que ele se abriu sobre sua tristeza. — Sinto muito. – sussurro para ele do pé de sua cama. O bipe constante da máquina ao seu lado muda e eu vejo os tracinhos aumentarem. Ele pode me ouvir. — Eu deveria ter lhe contado. Eu deveria ter lhe dado uma chance de me explicar, mas você me assustou, Kian, você me aterroriza, mesmo agora. Mas você me ama, e foda-se tudo, eu também te amo. – Os traços ficam loucos e os bipes são enlouquecedores agora, uma enfermeira passa correndo por mim para ver como ele está. — Eu te amo, Kian. – digo, saindo do quarto antes que me peçam para sair. Sento-me na cadeira no corredor e espero o Dr. Stanton chegar, porque sei que ele virá. Ele ama seu filho, e nada o impediria de tentar salvar Kian. O caos aumenta ao meu redor, há uma enxurrada de enfermeiras, médicos e barulho. O sinal sonoro. É como se estivesse dentro da minha cabeça e não consigo parar. Tampando os ouvidos e fechando os olhos, bloqueio tudo o que está acontecendo e lembro-me de respirar, porque mesmo isso é difícil. 22 Quando o bipe para e o corredor fica quieto novamente, abro os olhos e olho pela porta aberta para o quarto dele. O Dr. Stanton está ao lado da cama, com a cabeça inclinada, os lábios se movendo enquanto as lágrimas caem livremente pelo rosto. Eu sei que ele está negociando, oferecendo sua vida e alma para salvar seu filho. Não consigo ouvir suas orações, mas posso senti-las pela maneira que meu bebê chuta e se move. Quando ele abre os olhos, ele olha para mim, com desespero delineado em seu meio sorriso. Ele me lembra tanto Kian que é difícil não chorar. Levanto da cadeira e entro no quarto. — Sinto muito. – digo, engolindo minha culpa. — Foi minha culpa. Falei com ele e acho que ele me ouviu. Tudo ficou louco. — Não é sua culpa, Ivy. Kian está apenas cansado. O corpo dele está cansado, e não sei por quanto tempo podemos continuar. Eu esperava, mas agora parece impossível. — Eu agendei o aminoácido, você ainda vem comigo? – digo, desesperada para evitar a bomba da verdade que ele está tentando lançar sobre mim. — A médica pode fazer isso ainda hoje, ela disse que isso não deve demorar muito. — Claro, eu vou com você Ivy. – ele pega minha mão na dele e nós apenas vemos Kian dormir em silêncio por um tempo. 23 Capítulo Quatro Kian “Ele irá morrer?” “Eventualmente, sim.” ele me encara agora. “Espero que não seja agora, eu estou negociando com Deus e o diabo para mantê- lo vivo e ver seu filho. Se você deixar, é claro.” ele diz: “Eu entenderia se você não quiser deixá-lo perto de você ou do bebê.” Vou morrer, mas não quero morrer. Quero segurar meu bebê nos braços, eu quero dançar com Ivy novamente. Quero vê-la adormecer com o nosso filho nos braços. Eu posso me sentir indo cada vez mais longe. Não a sinto mais e isso dói. Meu pai está tentando se controlar, tanto para ele quanto para ela - mas eu sei que ele está desmoronando. O fato de ouvi-lo rezar a um Deus que sei que ele não acredita me diz tudo o que preciso saber. Isso é demais, eles estão sofrendo, não posso ser salvo, devo deixar ir. 24 Se morresse, eles ficariam felizes - não haveria preocupação ou dor, haveria paz para eles. "Sinto muito." Seus sussurros são como um bom vinho, tão suave e quente. Sinto muito também, Ivy. “Eu deveria ter lhe contado. Eu deveria ter lhe dado uma chance de me explicar, mas você me assustou, Kian, você me aterroriza, mesmo agora. Mas você me ama, e foda-se tudo, eu também te amo.” Eu te amo, eu te amo até o ponto da loucura, Ivy. "Eu amo você, Kian." Eu não posso ir - ainda não. Mas, estou indo embora, finalmente o sono me encontrou e é tão bom que não quero que pare. A maneira como a escuridão me envolve e me segura, é um abraço reconfortante. Esse sono sem sonhos é uma benção. Não posso voltar - ainda não - mas também nãoposso ir. Estou dormindo profundamente - mas meu coração finalmente está bem acordado. 25 Capítulo Cinco Ivy — Você não acha que um cordocentese2 daria melhores resultados? As células-tronco do cordão umbilical podem ser uma opção melhor neste caso. – Dr. Stanton pergunta a obstetra ao montar uma bandeja ao lado da cama. — Daria resultados mais conclusivos, não é? – ele parece nervoso, como se quisesse mais respostas do que ela está dando a ele. — Tínhamos planejado um amniocentese, Dr. Stanton. – diz ela, fazendo uma pausa para considerar o que ele acabou de sugerir. — São testes especializados que precisamos solicitar. Eu acho que teríamos uma amostra melhor do cordão. De fato, devemos extrair as duas amostras. – eles falam como se eu não estivesse deitada ali na cama, com medo. Essa agulha é muito longa. Tipo, 2 Cordocentese: também chamada de Amostragem Percutânea de Sangue de Cordão Umbilical (PUBS), é um teste de diagnóstico que examina o sangue do feto para detectar anormalidades fetais. 26 eu sinto-me desmaiar só de olhar por muito tempo. Minhas mãos estão suadas, e eu tenho formigamentos no meu rosto, a ideia de ser furada em minha pele é aterrorizante. — Parem! – finalmente disse, eu só quero que isso seja feito. — Apenas façam, faça as duas coisas, o que me der as respostas que eu preciso. — Sinto muito, Ivy. – diz Stanton, pegando minha mão. As mãos dele parecem as de Kian, só que mais velhas, e eu me pergunto se meu bebê terá as mesmas mãos. Eu me pergunto se essa pequena pessoa segurará minha mão e se eu sentirei o mesmo conforto que sinto agora que seu avô segura a minha. — Nós podemos fazer as duas coisas, Dr. Stanton tem razão. – diz a obstetra quando uma enfermeira entra na pequena sala esterilizada. Percebo os brincos dela, eles são um garfo e uma colher. Parece uma coisa tão bizarra pendurar isso nos seus ouvidos, a sombra azul brilhante deles brilham sob as luzes brilhantes. Ela é uma distração bem-vinda das agulhas, testes intermináveis e conversas médicas. — Não foi tão ruim, parecia uma dor de menstruação. – digo a Misha por telefone. Ela está em pânico e quer voltar para casa. Ela está presa cuidando da mãe. — Não faça nada, apenas vá para casa e descanse. 27 — Eu tenho um emprego, Misha, e estou grávida, não morta. — Ainda não está morta, o papai louco dele entrou em coma antes que ele pudesse te matar e fazer um abajur em sua pele. – ela está surtando, estar perto de sua mãe não é bom para ela. — Ele não ia me matar, ele fez o jantar e pintou o quarto do bebê. Eu não acho que me matar estava na agenda. – eu sei que ele não estava lá para me matar. — O homem é louco e nunca dorme, duvido que ele tivesse uma agenda de verdade, Ivy! – ela está ficando exaltada. — Misha, eu preciso te contar uma coisa. – ela fica em silêncio, e é como se ela soubesse. — Eu o amo, e se ele acordar, eu vou dizer isso a ele. — Agora você perdeu a sua mente sempre esperta! – ela está gritando agora. — E Will? — Vou dizer a Will que acabou. Ele está em turnê e vivendo seu sonho. É melhor assim... para todos. — Não, não, não é. Um garoto com guitarra é melhor que um louco! — Misha, eu não amo Will. Eu amo Kian. — Eu não ligo! – Sua voz está gritando mais alto. — Eu não gosto do Kian, ele é louco. — Não, ele está doente e ele vai morrer. Ele merece conhecer seu filho antes disso. — Por que você é uma pessoa tão legal, Ivy? Por que você não pode ser uma cadela apenas uma vez? 28 — Eu o amo, Misha, eu realmente o amo. – Lágrimas escorrem pelas as minhas bochechas enquanto estou na porta do seu quarto e olho para ele dormindo. — Eu sei que você o ama. Sua idiota. — Eu preciso ir. Conversamos em breve, diga um oi para sua mãe. — Foda-se, você odeia minha mãe e eu a odeio. – eu ri dela, porque é verdade. — Tchau, Ivy. Cuide do meu afilhado até eu chegar em casa. — Tchau, Misha, eu te amo. – eu desligo e sento ao lado de Kian. Eu não falo dessa vez. Tenho medo de dizer qualquer coisa, caso algo dê errado como antes. Em vez disso, apenas seguro sua mão fria e mole e olho para ele. Olho realmente. Eu capto todos os detalhes minúsculos de seu rosto. Eu gostaria de poder enterrar minha cabeça em seu peito e cheirá-lo, mas tudo o que posso cheirar é hospital. A ardência clínica do desinfetante desentope o meu nariz, e não há vestígios dele, apenas seu corpo quebrado deitado aqui. Eu me pergunto se isso é tudo culpa minha, se eu me virasse e lhe desse uma chance naquela noite no evento de caridade. Se eu tivesse contado a ele sobre o bebê, ele estaria assim agora? Eu poderia ter impedido que isso acontecesse? — Não é sua culpa, Ivy. – Seu pai entra no quarto, lendo minha mente. — Você está bem? Gostaria de uma carona para casa? Você deveria descansar. — Isso seria ótimo, obrigada. – eu só não quero ficar sozinha com meus próprios pensamentos. — Você precisa cuidar de si e do bebê. Você parece cansada hoje, Ivy. 29 — Estou cansada. – eu respondo honestamente enquanto caminhamos pelo corredor, longe do quarto de Kian. — Estou exausta. — Você está fazendo muito. — Estou fazendo o que preciso. — Você não precisa trabalhar, Ivy. Nós cuidaremos de você. Por mais bonito que pareça, tenho medo de ser grata a Kian de qualquer forma. Se fizermos isso, precisará ser em pé de igualdade. — Obrigada, mas eu gosto do meu trabalho, Dr. Stanton. — Apenas saiba que a oferta existe e fica de pé a qualquer momento. Não importa o que aconteça. – Não importa o que aconteça? — Obrigada. – eu murmuro enquanto saímos do hospital e entramos em um carro para a cidade. Dr. Stanton trabalha em seu telefone e laptop o tempo todo e, quando o motorista para no meu prédio, ele olha para cima e diz rapidamente: — Tchau, Ivy. – antes dele continuar trabalhando. Lá se vai a minha companhia. 30 Preciso ligar para Will, eu sei que tenho que fazer isso. Sento- me no sofá, calculando os fusos horários, verificando o horário que ele me enviou, tentando descobrir se ele está por perto para atender uma ligação. Gostaria de poder beber uma taça de vinho antes de fazer isso. Disco o número dele e conto os toques antes que ele atenda. Estou quase pronta para desistir quando ele atende, com a sua voz grogue e grossa. Eu o acordei. — Will. — Ivy, ah, oi. – então, eu ouço os sussurros abafados e uma garota rindo. Eu deveria estar com raiva, desligar, ou gritar, mas estou secretamente aliviada. — Você estava dormindo? Eu te acordei? – pergunto a ele. — Não, não, está tudo bem. Eu estava apenas tirando uma soneca. Como você está? E o bebê? — Estou bem, na verdade... não, não estou bem. — O que há de errado? Aconteceu alguma coisa com o bebê? – ele instantaneamente parece sóbrio. — O bebê está bem, mas Kian veio me ver. — Eu vou matá-lo, Ivy! Você está bem? — Will, me escute. Este é o filho dele, e devo isso a ele por pelo menos tentar. — O que você está dizendo? 31 — Eu vou ficar com Kian, é o que estou dizendo. – eu fungo as lágrimas, porque não quero machucá-lo, mesmo que ele esteja na cama transando com outra pessoa agora. — Mas, Ivy. Porra. – eu posso ouvi-lo se afastando das vozes agora. — Will, vá perseguir seu sonho. Não estou te dando um fora, estou te libertando. — Ivy, não. — Will, eu preciso. — Por favor, Ivy. — Adeus, Will. Obrigada por tudo. — Ivy! Por favor... Porra. Eu sinto muito. — Não precisa se desculpar, Will, você não fez nada de errado. Não consigo mais falar, minha garganta está entupida com os soluços que eu estou segurando, meu rosto está molhado pelas lágrimas enquanto desligo o celular e olho as marcas de fumaça nas paredes da cozinha. Um lembrete de que Kian esteve aqui - sentado nesta cadeira. Pego o travesseiro e enterro minha cabeçanele, esperando que cheire um pouco como ele. 32 Capítulo Seis Kian Estou sozinho. Ninguém está aqui agora. As vozes se foram, seus dedos macios não estão mais entrelaçados nos meus. Está muito quieto, na minha cabeça eu estou gritando. Ninguém pode me ouvir enquanto eu grito, continuo indo até ficar sem fôlego e meus pulmões ardem. Minha garganta está seca e lágrimas caem na minha fronha, mas ainda não há ninguém aqui. Todos se foram - me deixando sozinho. Eu não quero dormir sozinho. Eu não quero dormir sozinho. Eu quero acordar. Eu nunca quero dormir de novo. 33 Capítulo Sete Ivy É impossível me concentrar no trabalho hoje, aguardar esses resultados do teste está me matando. É como se eu estivesse segurando uma bomba, apenas esperando ela explodir. Realmente quero saber se meu bebê não conseguirá dormir, perder ou não sua mente, enlouquecer e morrer? Eu preciso saber disso? Sim, sim, mas não quero. Continuo checando meu celular para garantir que não perdi uma ligação. Eles disseram três semanas até sabermos sobre a Insônia Familiar, já faz três semanas e um dia. Movo meu celular para o local da minha mesa, onde sei que tem a melhor recepção, mas as únicas chamadas foram de Will. Há três semanas, ele não para de me ligar. Prometi a mim mesma que bloquearia o número dele se ele ligasse novamente, mas não consigo. E se Kian morrer? E se eu precisar de Will então - eu sei que isso parece doentio. Ele é como essa proteção que não quero desistir, só por precaução. 34 Eu não posso mais fazer isso. — Bev, posso ir? Hoje não estou me sentindo bem. – minto. Eu me sinto bem. exceto pela minha mente estúpida que eu perdi. Ela olha para o relógio antes de me dar um aceno de cabeça e um olhar de decepção. Estou perdendo tantas bolas que deveria estar fazendo malabarismo agora, eu odeio falhar. No saguão, pego meu celular e ligo para o número de Misha, já que ela deveria estar em casa hoje. Eu preciso que ela esteja em casa. A solidão está me deixando louca. Não posso enfrentar outra visita sozinha ao hospital, só preciso que ela me abrace e tenha uma conversa fiada por tempo suficiente para que eu me sinta humana novamente. — Ivy. – ela atende, parecendo um pouco sem fôlego. — Você voltou? Diga-me que voltou, por favor. — Você está bem? Voltei, literalmente acabei de passar pela minha porta da frente. — Posso passar aí? Estou saindo do trabalho agora. — Claro que você pode. Vou deixar a chave embaixo do tapete, preciso muito de um banho. — Te vejo em breve. — Mal posso esperar. Senti falta da sua fofura e gravidez. Eu rio, já mais leve, sabendo que ela voltou. Eu nunca precisei de uma amiga mais do que agora. Eu chamo um Uber porque estou cansada, e agora um trem deixaria minha ansiedade além do limite. Felizmente, o motorista é quieto e nada tagarela. Passo a viagem inteira olhando para a tela do meu celular desejando que ele toque. Misha deixou a chave embaixo do tapete, como ela 35 disse que faria para que eu pudesse entrar. Suas malas ainda estão no hall de entrada e seus sapatos estão onde ela os tirou no caminho para o quarto. O apartamento cheira a ela e velas da Yankee Candle3 de limão e baunilha. — Estou aqui. – grito enquanto entro no quarto dela. — Ah, oii. – ela murmura com uma escova de dente na boca, saindo do banheiro privativo. — Espere. – ela levanta um dedo para eu esperar e volta a escovar os dentes. Quando ela termina, ela entra no quarto e me envolve em um abraço, seu corpo absorve minha ansiedade, amortecendo a dor implícita que carrego comigo há semanas. — Deus, eu senti sua falta. – digo. — Também senti sua falta. Minha mãe me deixou louca. – ela diz, me puxando para sentar com ela na cama. — Diga-me tudo o que eu perdi. Como está meu afilhado? – ela esfrega as mãos na minha barriga, e o bebê chuta como um louco. — Ah, veja, ele já me ama. Eu serei a tia legal que permite que faça todas as coisas legais. Estou lhe dizendo. Eu sei que ela não está errada, ela será a melhor tia do mundo. — Ainda estou esperando os resultados do teste. Não tenho certeza se quero saber. — E Kian? 3 Yankee Candle: é uma fabricante e varejista americana de velas perfumadas, castiçais, acessórios e louça. Seus produtos são vendidos por milhares de lojas de presentes em todo o país, por meio de catálogos e on- line, e em quase 50 países ao redor do mundo. 36 — Ainda o mesmo, ele está tecnicamente em coma. Eles estão começando a desistir de acordá-lo, ouvi o médico dele dizendo ao pai que é hora de começar a tomar decisões. Dr. Stanton ficou louco com ele, não foi uma conversa agradável. — Você quer que ele acorde? – ela me pergunta, ainda tocando minha barriga. — Mais do que nada. Mesmo que seja apenas por um momento em que este bebê nasça, apenas um minuto para ver seu filho. Eu só quero um momento. Preciso que ele saiba que o amo, mesmo que tenha medo dele. – eu não posso mentir para ela. Vê- lo desaparecer me cortou profundamente. Eu estou tão zangada comigo mesma pelos seis meses que perdi com medo e raiva. — Então você continua esperando por esse momento. – diz ela com um sorriso reconfortante. — Conte-me sobre sua casa? – pergunto a ela, mudando de assunto. — E todos os homens que foram abandonados por causa do quadril quebrado de sua mãe. Ela ri e abraça um travesseiro no peito. — Havia apenas um, um homem solteiro, o tempo todo. — Você está mentindo! — Sem mentiras, apenas um. – ela está sorrindo como o gato que recebeu leite. — Quem é você e onde está minha amiga promíscua? Ela balança a cabeça. — Ele é um treinador de tênis, um treinador profissional de tênis. – Suas bochechas coram e há um brilho estranho nela. — Ele tem a melhor bunda que você já viu 37 em sua vida! Por que eu nunca assisti tênis? Você já viu as bundas deles? Eu ri dela agora, ela nunca assistia esporte por qualquer outro motivo. Antes que ela possa me dizer mais, meu celular toca no bolso. Eu tenho que me deitar para tirá-lo, porque minha barriga de gravidez está no caminho de tudo. — Alô, Ivy falando. – digo, sem reconhecer o número. — Oi Ivy, a médica tem os resultados dos seus testes. Você poderia vir hoje à tarde para vê-la? — Sim, sim eu posso. Que horas? — Você pode chegar aqui em uma hora? – eu olho para o meu relógio. Vai ser uma corrida daqui, mas não fico mais esperando. — Eu posso. — Perfeito, nós nos veremos em uma hora. – eu me levanto da cama e vou em direção à porta antes mesmo de desligar. Misha me segue instintivamente. — Eu preciso que você me leve ao hospital, em menos de uma hora. — Eu não sou Mika Häkkinen4, você sabe. – ela diz. — Mas farei o possível para violar todas as leis de trânsito para você. Esses são os resultados do teste? Concordo, pegando a minha bolsa enquanto ela coloca seus sapatos descartados. 4 Mika Häkkinen: é um ex-automobilista finlandês. Conquistou dois títulos mundiais na Fórmula 1, onde teve grande rivalidade com Michael Schumacher. 38 Chegamos aqui com alguns minutos de sobra. Liguei para o Dr. Stanton no caminho, ele já estava aqui com Kian. A sala de espera está cheia de casais e posso sentir lágrimas de nervoso começando a aparecer nos meus olhos. Eu não quero fazer isso sozinha. A médica me chama no consultório e o pai de Kian vem comigo. Deixo Misha na sala cheia de mulheres grávidas e ela está pirando um pouco. Os dois médicos na sala trocam um monte de conversas médicas antes de ela se dirigir a mim. — Ivy, sua filhinha não tem o gene para insônia familiar fatal. Ela vai ficar bem. — Uma menina? Eu estou tendo uma menina? — Ah, me desculpe, você não sabia? – ela tapa a boca, visivelmente pedindo desculpas por estragar a surpresa que eu tentava tanto manter. Não consigo parar de chorar - meu bebênão está doente, mas o pai dela vai morrer. Eu estou tendo uma menininha, uma filha. Ah, Deus, por favor, não a deixe ser um desastre como eu. Por favor, deixe-a ser tão forte quanto seu pai e tão sã quanto seu avô. — Sinto muito, Ivy, eu não sabia. — Tudo bem. – eu fungo, olhando-a nos olhos. — Ela está bem? Não há nada de errado com o meu bebê? — Não, não há nada errado, você tem trinta e duas semanas e tudo está perfeito. Estou feliz por termos feito esse teste. Você pode relaxar agora. 39 Minha mente nunca está relaxada. Minha mente está quebrada, e meu coração também. 40 Capítulo Oito Kian Há longas horas de silêncio. Não sei ao certo quanto tempo passa antes de senti-la entrar no meu quarto novamente. Só sei que quando ela não está lá, sinto falta dela. Ela não fala muito, mas sei que ela está aqui - eu posso sentir o cheiro dela. Sinto-a. Ela é minha Ivy, eu sempre soube que ela seria minha. Mesmo agora ela não pode me deixar - eu sabia que ela nunca iria. Jen me visita também, ela vem quando está quieto. Ela diz que posso ir com ela, posso deixar tudo o que me machuca, posso ficar dormindo e ficar com ela para sempre. Ela me deixa abraçá- la, e é tão bom. Eu a amo, sempre a amarei. Mas, toda vez que volto, Ivy está perto. Ivy está aqui agora, ela está ao meu lado. Sinto o cheiro das lágrimas dela, ela está chorando. Os sons suaves de fungadas que ela está tentando esconder fazem meu peito apertar. Eu posso sentir sua mão macia na minha enquanto ela a levanta. Ela é tão quente que seu toque é como a luz do sol entrando pela janela em 41 uma manhã de outono. Ela coloca minha mão na barriga. Eu gostaria de poder movê-la, que eu pudesse senti-la do jeito que costumava. "Estamos tendo uma menininha", ela sussurra, e uma lágrima fria cai na minha pele, que queima como água fervente. "Você pode senti-la?" Ela me pergunta, com sua voz trêmula rachando de dor. "Ela está bem. Ela não está doente - sem maldição. Ela vai dormir profundamente.” - A voz dela é tão baixa. Tanta dor e alívio em sua voz. Sinto a vibração do meu bebê se movendo dentro dela e uma lágrima escorre pela minha bochecha. Não sei se ela pode ver, mas espero que sim, espero que ela saiba que posso ouvi-la. "Por favor, não morra, Kian. Por favor, acorde novamente. Você pode vê-la dormir, eu vou a ver com você. "Ivy". É a voz do meu pai que rouba nosso momento. Ele parece cansado e velho. Posso imaginar que o cabelo dele é mais grisalho e as rugas dos olhos são mais profundas. A gravata estará solta e o botão superior estará aberto. "Podemos conversar?" "Claro." Ela coloca minha mão de volta ao meu lado, com a conexão com a minha família arrancada muito cedo. "Existe uma maneira de salvar Kian." Não posso ser salvo, pai, pare - deixe-me ir. "O que você quer dizer?" Eu posso ouvir a outra cadeira se mover, ele está sentado ao lado dela, como eles fizeram tantas vezes. "Seu bebê não está doente." "Não, a médica disse que ela está bem." 42 “Exatamente, seu bebê tem células-tronco, as que eles tiraram para fazer o teste. É experimental, mas acredito, e alguns outros médicos da Europa, que a terapia com células-tronco poderia salvar Kian. Essas células podem reprogramar seu corpo.” Ele está gaguejando, as palavras são confusas. Há um "mas" lá dentro. "Mas estamos preocupados que ele esteja ficando sem tempo e precisamos colher células do cordão umbilical agora. É arriscado, mas você tem trinta e duas semanas, o bebê é viável." “Eu não tenho certeza do que você está me pedindo?” “Quero que você doe células-tronco de sua filha para salvar Kian. Eu quero fazer uma coletagem de células-tronco assim que pudermos.” "Não podemos fazer isso quando ela nascer?" Espere, o que? Não faça nada para machucar meu bebê. "Poderíamos, mas o tempo não está do nosso lado, Ivy." "Quais são os riscos?" "O mesmo que com o teste de amniocentese, parto prematuro, aborto." "Não", ela diz suavemente. "Eu já fiz uma vez, sei que ela está bem. Eu não vou fazer isso de novo. Não estou arriscando perder ela e ele.” "Por favor, Ivy." "Você tem que esperar até ela nascer." "Ivy, por favor." Ouça ela, pai. Não quero isso se isso significa arriscar minha filha. Eu gostaria de poder gritar. Eu quero gritar com ele para ouvi-la. 43 Capítulo Nove Ivy Eu não consigo. Ela está bem. Não posso arriscar machucá- la. Não por algo que pode nem funcionar. É muito cedo, ela é muito pequena. Tenho medo do que acontecerá quando ele acordar, se acordar. — Eu não posso fazer isso. Sinto muito. – digo e o deixo lá no quarto com Kian. Misha me disse que esperaria na cafeteria por mim. Eu preciso sair daqui, isso é demais. 44 Dr. Stanton me pediu para parar de trabalhar, para eu me cuidar melhor. Ele colocou dinheiro na minha conta bancária - nem sei como ele conseguiu os detalhes da minha conta. Quando eu não parei de trabalhar, ele obviamente usou sua influência na indústria porque eu fui demitida. Ele se pergunta de onde Kian consegue suas maneiras loucas de controle - um palpite, do seu pai. Tento visitar Kian quando sei que ele não estará lá. Usei o dinheiro dele para comprar tudo rosa que a loja de bebês tinha, então sentei no chão no mar de cores pastel e chorei por uma hora. Nada disso é o que eu esperava, nada me preparou para tudo o que estou sentindo. Hormônios, sentimentos, seja o que for, não estou pronta para nada disso. Kian está piorando. Seu pai está ficando mais desesperado todos os dias. Estou quase com medo de que ele me sequestre apenas pela pequena chance de que essa célula-tronco possa funcionar. A madrasta dele está me dando um chá de bebê hoje. Isso parece estranho, eu não quero ir. É como se eles achassem que esse bebê pode preencher a lacuna que Kian vai deixar, que eu vou fazer parte da vida deles - eu nem os conheço. Não acho que sobrou nenhuma parte de Kian, ele está se afastando e todos nós estamos guardando uma lembrança. — Sente-se quieta. – diz Misha enquanto enrola meu cabelo ao redor do babyliss. — Deixe-me fazer você parecer bonita hoje. Hoje é um dia feliz - você acha que pode tentar sorrir? — Não, não realmente. – digo, abanando meu rosto tentando não deixar minhas lágrimas ardentes caírem e estragar a minha maquiagem. Sinto-me como uma baleia encalhada e perdi completamente o controle da bexiga e das emoções. 45 — Anime-se, docinho. Estarei lá com você. Vamos aproveitar todos os presentes e o bolo de pessoas ricas. Então vamos para casa e você pode chorar no meu colo. — Ok. – digo, respirando fundo. É só um dia. Eu posso fazer isso. — Podemos parar e visitar Kian depois? — É claro que podemos. – ela tira o babyliss e me abraça, seu rosto sorridente no espelho me faz sorrir também. Não posso deixar de me sentir um pouco triste, ela vai embora amanhã para visitar seu playboy do tênis. Eu vou ficar sozinha - de novo. A festa é rosa, muito rosa. Com cupcakes e doces rosa. Todas as nuances, do magenta ao salmão, não há nada que não seja rosa. Sou rodeada de parabéns de estranhos e recebo presentes caros que não cabem no meu pequeno apartamento. Eu sorrio e digo obrigada até as minhas bochechas doerem, há mil 'ahhs' e 'fofos' murmurados. Todos bebem champanhe rose e morro um pouco por dentro, desejando poder tomar uma garrafa inteira apenas para me entorpecer a tristeza que me domina. Quando a festa finalmente termina, meus pés estão inchados e meus olhos estão pesados - eu só quero ir para casa. Eu digo a Misha para não ir ao hospital. Estou muito cansada e ela me leva para casa com o máximo de presentes que poderíamos colocar no carro dela. O restante será entregue e não terei espaço para morar em minha casa. 46 Misha saiu cedo esta manhã, medeixando sozinha com uma montanha de coisas de bebê e meus próprios pensamentos de companhia. Quando isso se torna esmagador, pego um táxi para o hospital. Ninguém está lá com Kian, então me sento ao lado dele, coloco a mão na minha barriga e esvazio todos meus pensamentos para ele. Falo sobre todas as coisas cor-de-rosa que estão tomando conta do meu apartamento, e sobre o bolo, e o quanto queria beber o champanhe rose. Eu falo com ele como se ele pudesse me ouvir. Eu não sei se ele pode, as máquinas de bip não ficam loucas quando falo mais. Gostaria de saber se ele ainda está lá. Ele está dormindo há tanto tempo que é difícil imaginá-lo abrindo os olhos. Faz cinco semanas desde que seu pai me pediu para arriscar a vida de minha filha para salvar a de Kian - e ainda não consigo. Todo dia eu a amo mais, e ele se afasta ainda mais de nós. Seu cérebro está morrendo - ele está morrendo, e o meu coração está morrendo com ele. Movendo-me na cadeira desconfortável para que sua mão descanse onde o bebê chuta, minhas costas doem. Fecho os olhos e apenas descanso, o conforto de seu toque é a pequena coisa que me faz sentir bem no oceano de loucura ao meu redor. — Eu te amo, Kian, mas a amo mais. Sinto muito. – sussurro com os olhos fechados. Eu cochilo, sonhando com outra vida em que fizemos escolhas diferentes. Onde eu nunca fui embora - onde ele não estava doente. Permitindo-me imaginar um futuro juntos, como uma família. Isso me faz sentir quente, com uma sensação de calor irradiando da mão dele para o meu núcleo. 47 O calor é dominado pela dor que me faz chorar e me sentar acordada. A dor volta e eu me curvo e choro. As máquinas do bipe estão ficando loucas de novo, as linhas onduladas são planas e quando me levanto, uma corrente de líquido quente escorre pela minha perna, encharcando minhas leggings. — Por favor, se afaste, Ivy. – diz a enfermeira, tentando chegar a Kian. — Eu não posso. Acho que minha bolsa acabou de estourar. Ela olha para a poça em que estou antes de começar a gritar ordens para a outra enfermeira do quarto. Eu me sinto engraçada, confusa da minha cabeça. O quarto está movendo como se eu estivesse de ressaca e não consigo parar de fechar os olhos. Eu vou cair. Eu alcanço a parede atrás de mim e a perco. Caindo de joelhos, o grito que me escapa pode quebrar o vidro - os sinais da linha plana na tela são mais altos. Eles gritam com a minha alma. Eu esperei muito, é tarde demais. Ele vai morrer. 48 Capítulo Dez Kian "Kian, Kian, vamos lá", Jen chama por cima do ombro. Ela está puxando minha mão e caminhando em direção ao lago onde demos nosso primeiro beijo. Sinto o cheiro do filtro solar em sua pele e seu cabelo está soprando com o vento forte da tarde. A água brilha com o brilho do sol e a luz dança na superfície irregular. Há um feliz entusiasmo que faz minha pele suar. Estamos correndo em direção à água agora, e o som de sua risada me faz sorrir. Quando a água fria bate nos meus pés, paro. Eu não posso ir com Jen. "Vamos lá", diz ela de brincadeira. "Ainda não." 49 "Kian, já é hora", ela sussurra, com sua mão segurando meu rosto enquanto ela me olha nos olhos. "Você não pode ficar dormindo para sempre." "Eu não quero deixá-los, ainda não." "Eles são melhores sem você, Kian, você não foi feito para o mundo deles. Estou esperando há tanto tempo por você." "Jen, espere." Ela está me puxando agora para a água, mais fundo do que eu quero ir. Está frio - tão frio. Não sinto mais Ivy, não sinto o cheiro dela. Eu sinto falta dela. Eu a quero de volta. "Não." Eu posso ouvi-la gritando enquanto saio da água, deixando Jen para trás em um rastro de devastação. Algo está errado. Alguém precisa ajudá-la. Mas, por mais que eu tente, não consigo sair da água, não consigo escapar do frio. Eu quero acordar. Eu preciso vê-la novamente. Meus pulmões ardem quando deslizo para baixo da superfície e tudo o que estava preso se foi. 50 Capítulo Onze Ivy — Como você está se sentindo? – Dr. Stanton pergunta do lado da minha cama. — Como se eu tivesse apenas uma cesariana de emergência. Eu me machuco, fico triste e feliz ao mesmo tempo. – Quando olho nos olhos dele, vejo palavras não ditas. — Eles conseguiram o que precisavam para ajudar Kian? – ele assente, e eu vejo seus olhos cheios de lágrimas. — Eles conseguiram, mas é um tiro no escuro agora. Kian está desaparecendo mais rápido do que isso pode salvá-lo. — Sinto muito, sinto muito. – eu choro, incapaz de controlar minhas emoções. Meus soluços acordam a criança pequena no berço ao meu lado. — Está tudo bem, Ivy. Eu entendo. Eu entendo. – ele me dá um lenço para enxugar meus olhos. — Ela é perfeita. Tão perfeita. – ela é tudo, é o universo inteiro e muito mais. Há uma sensação 51 avassaladora de calma que me atinge no momento em que a seguro contra mim. — Eu vim para perguntar se eu poderia levar vocês duas para vê-lo. Pode ser a única chance que temos. – eu não sei o que dizer, o que ele quer dizer? — Amanhã, Kian será transferido para uma clínica onde poderão administrar a terapia com as células-tronco. E se não der certo, então... – ele não precisa terminar sua frase. Eu aceno com a cabeça, segurando o pequeno pacote rosa mais perto de mim ainda. — Vamos ver seu pai, pequenina. – sussurro para a minha filha ainda sem nome. — Vou pegar uma cadeira de rodas, eles não vão deixar você sair daqui, receio. Ainda não, de qualquer forma. – ele se levanta e há um leve sorriso no rosto quando vê o bebê. Kian está murchando. Seu corpo parece frágil e magro na cama e sua pele é acinzentada. Seus lábios estão rachados e ele tem um tubo de respiração agora. Há um sinal sonoro constante do monitor ao lado dele e, quando a enfermeira nos vê entrar, ela abaixa o volume e nos deixa sozinhos com ele. — Eu vou deixar você ter alguns momentos, Ivy. Eu estarei lá fora. – diz o pai dele. Ainda não consigo parar de chorar porque meu coração sabe que isso é um adeus e que a culpa é minha. Quando ele se foi, eu me movo para poder tocar sua mão. Fecho os olhos e tento me lembrar do sorriso dele, dos olhos dele, de tudo e rezo para que os veja em nossa filha. — Sinto muito. – eu sussurro enquanto choro. — Você tem uma filha, ela é nossa. Ela é tão perfeita. Eu gostaria que você pudesse vê-la, cheirá-la, sentir sua mãozinha envolver em torno de seu dedo. Eu gostaria de poder lhe dar tudo isso. – Minhas mãos estão tremendo enquanto eu a seguro. Eu posso sentir como meus olhos estão inchados, e tudo se mistura através das lágrimas. 52 Levantando-me com as pernas trêmulas, puxo o lençol branco que o cobre e coloco o pequeno embrulho no peito exposto entre todos os fios e monitores. Com a mão na bunda dela, deixei meu bebê sentir o batimento cardíaco do pai porque talvez não houvesse outra chance. Quero que eles conheçam o coração um do outro. Mordo o interior da minha boca para silenciar meus gritos enquanto a vejo descansar a cabecinha contra ele. Eu gostaria que ele abrisse os olhos e olhasse para ela. Rezo para que ele possa senti-la, que seu cheiro esteja gravado em sua mente quebrada, que ele saiba que ela o ama, como eu. Naqueles minutos preciosos, meu coração se despede dele. Eu sei que Kian se foi e eu e nossa filhinha teremos que continuar sem ele. Não há bala de prata ou varinha mágica que possa consertá-lo agora. Inclinando-me, beijo sua bochecha e abraço minha família por alguns momentos. — Eu amo você, Kian, e prometo que vou cuidar dela. – O monitor começa a gritar, e o som deve me fazer afastar, devo pedir ajuda. Mas não posso abandoná-lo. Eu apenas seguro esse minuto precioso pelo tempo que posso. Quando a porta se abre e a equipe entra, gritando para eu sair, sou empurrada para a cadeirade rodas e saio do quarto, seguida por uma enfermeira segurando meu bebê chorando. Sei que foi um adeus e peço para ser levada de volta para o andar de cima. Não posso sentar aqui e ouvi-lo morrer. Meu coração não pode partir mais do que já está quebrado. 53 — Você está bem? – Misha pergunta enquanto olho pela janela para o apartamento que agora sei que era dele. Não ouvi uma palavra de sua família desde o dia em que fui levada para fora de seu quarto quando ele morreu. Eu acho que eles me culpam. E eles deveriam - eu poderia ter ajudado, mas protegi egoisticamente minha filha e deixei o seu filho morrer. — Eu estou bem. – minto. Há essa manta de tristeza ao meu redor, não há nada que possa passar por ela. Estou falhando como mãe. Graças a Deus Misha está por perto para ajudá-la, porque não sei o que estou fazendo. — Eu acho que você precisa falar com alguém, Ivy. Eu acho que você tem depressão pós-parto, depressão ou algo assim. Estou preocupada com você. — Estou bem. – eu continuo mentindo, na esperança de que ela fique em silêncio, e me distraio com o bebê que não para de chorar. — Você não está e sua filha precisa de você. Então, estou lhe dizendo para ir tomar banho e marcar uma consulta com seu psiquiatra, hoje. É hora de ser forte, Sunshine. Não posso ficar por perto a cada minuto do dia, em algum momento você precisará fazer isso. Suas palavras duras são como uma bomba explodindo – um choque de realidade que eu não sabia que precisava. 54 — Ok. – eu gaguejo, virando-me para encará-la agora. Ela está segurando Kassia nos braços, e seus olhos estão pesados com a mesma tristeza que sinto até os ossos. — Você precisa de ajuda, Ivy. Não posso ajudá-la, você precisa de mais do que posso lhe dar. 55 Capítulo Doze Kian Você é tão linda quando dorme, eu não consigo parar de observá-la. Naquela noite, a luz ainda está acesa no canto, e há uma mamadeira na mesa de centro onde costumava estar sua taça de vinho. Eu posso sentir o leve cheiro do seu perfume pairando no ar. A música toca suavemente, com uma canção de ninar de notas suaves e vozes roucas cantando para você dormir todas as noites. Você está fazendo um trabalho incrível de mãe, e eu posso sentir o quanto você ama Kassia, apenas observando você com ela. Eu silenciosamente arrumo os brinquedos no chão da sala e os coloco na cesta ao lado do sofá. Então eu coloco a mamadeira na pia para ser lavada antes de entrar no quarto dela e ficar de pé sobre o berço. Ela está dormindo profundamente, o barulho suave do monitor do bebê ao lado da cama me impedindo de pegá-la. Mas apoio minha mão em seu pequeno peito e apenas a sinto respirar por um tempo antes de dizer um suave boa noite. 56 Ajoelho-me ao lado da sua cama antes de sair e dou um beijo de boa noite, mas você nunca saberá que eu estive aqui. Você está dormindo profundamente. Fim
Compartilhar