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APONTAMENTOS DE 
ANTROPOLOGIA 
SOCIOCULTURAL 
 
 
 
 
Autor: Xerardo Pereiro (antropólogo) 
Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) 
DESG (Departamento de Economia, Sociologia e Gestão) 
CETRAD (Centro de Estudos Transdisciplinares para o 
Desenvolvimento) 
UTAD - Pólo de Chaves, Quinta dos Montalvões s/n, Outeiro Seco, 
Apartado 61, 5401-909-Chaves-Portugal 
Correio electrónico: xperez@utad.pt 
Web pessoal: www.utad.pt/~xperez/ 
 
 
 
 
 
 
 
ÍNDICE 
 
TEMAS Páginas 
TEMA 1: QUE É A ANTROPOLOGIA? 
1.1. O que é a antropologia? 
-A origem etimológica 
-A antropologia hoje 
-O objecto de estudo da antropologia 
-A crise do objecto de estudo da antropologia 
-O que fazem os antropólogos 
-A antropologia: ciência ou arte? 
-A antropologia como espelho da humanidade 
1.2. A antropologia e os seus campos de conhecimento. 
1.3. Etnografia, Etnologia e Antropologia. 
1.4. Os enfoques sectoriais. 
Bibliografia 
Sítios em Internet 
 
1-12 
TEMA 2: CULTURA E SOCIEDADE 
2.1. Cultura e Sociedade 
2.2. A noção antropológica de cultura 
2.2.1. A cultura é aprendida 
2.2.2. A cultura é simbólica 
2.2.3. A cultura liga-se com a natureza 
2.2.4. A cultura é geral e específica 
2.2.5. A cultura inclui todo 
2.2.6. A cultura é compartida 
2.2.7. A cultura está pautada 
2.2.8. A gente utiliza criativamente a cultura 
2.2.9. A cultura está em todas partes 
2.3. Cultura material e imaterial 
2.4. A noção sociológica e a noção estética do conceito de cultura 
2.5. Os conteúdos do conceito antropológico de cultura 
2.6. Os universais da cultura 
2.7. A mudança cultural 
2.8. A mudança social 
Bibliografia 
Sítios em Internet 
 
13-42 
TEMA 3: ANTROPOLOGIA, FOLCLORE E CIÊNCIAS SOCIAIS 
3.1. A antropologia e outras ciências humanas e sociais. 
-O estatuto epistemológico das ciências humanas e sociais. 
-A antropologia e a psicologia. 
-A antropologia e a sociologia. 
-A antropologia e o direito. 
-A antropologia e a geografia. 
-A antropologia e a história. 
-A antropologia e a filosofia. 
3.2. Antropologia, folclore e cultura popular. 
-Antropologia e folclore 
43-65 
-A cultura popular 
3.3. A invenção da tradição 
3.4. A antropologia portuguesa. 
-O desenvolvimento histórico da antropologia portuguesa. 
-Os usos do popular na antropologia portuguesa. 
Bibliografia 
Sítios em Internet 
 
TEMA 4: BREVE HISTÓRIA DAS TEORIAS ANTROPOLÓGICAS 
4.1. Apresentação 
4.2. Os primórdios da antropologia 
4.3. O evolucionismo. 
4.4. O difusionismo 
4.5. O particularismo histórico 
4.6. A escola de cultura e personalidade 
4.7. O funcionalismo 
4.8. O neoevolucionismo, a ecologia cultural e o materialismo 
histórico 
4.9. O estruturalismo 
4.10. A antropologia simbólica, a antropologia cognitiva e a 
antropologia semântica 
4.11. A antropologia pós-moderna 
Bibliografia 
Sítios em Internet 
Anexo I: A antropologia moderna e pós-moderna 
Anexo II: Correntes da antropologia pós-moderna 
Anexo III: Antigos e novos paradigmas em antropologia 
Anexo IV: Quadro de síntese da história das teorias da cultura 
 
66-103 
TEMA 5: METODOLOGIA DA INVESTIGAÇÃO ANTROPOLÓGICA 
5.1. Enfoques da investigação antropológica. 
5.2 A investigação antropológica enquanto projecto e processo. 
5.3. O trabalho de campo antropológico. 
5.4. Técnicas de investigação antropológica. 
5.5. A observação etnográfica. 
5.6. A entrevista oral. 
5.7. A história de vida. 
5.8. O antropólogo em contextos urbanos 
5.9. A ética do trabalho de campo. 
5.10. A escrita antropológica. 
Bibliografia 
Sítios em Internet 
 
104-137 
TEMA 6: A LÍNGUA E A COMUNICAÇÃO 
6.1. Que é a antropologia linguística? 
6.2. Qual é que é a estrutura da linguagem? 
6.3. A gramática de transformação e generativa: Noam Chomsky. 
6.4. Linguagem, pensamento e cultura: Edward Sapir e Benjamin L. 
Whorf. 
6.5. A teoria do discurso. 
138-153 
6.6. Etnolinguística e Sociolinguística. 
6.7. Metáfora e metonímia. 
6.8. A Polisemia 
6.9. O Ciberespaço. 
 6.10. A comunicação não verbal. 
6.11. A construção social do idioma. 
6.12. A língua como património cultural. 
Bibliografia 
Sítios em Internet 
 
TEMA 7: A PRODUÇÃO ECONÓMICA 
7.1. Antropologia económica 
7.2. A reciprocidade 
7.3. A redistribuição 
7.4. O intercâmbio de mercado 
7.5. Modos de produção 
7.6. Caça, pesca e recolecção 
7.7. Pastorícia 
7.8. Cultivos agrícolas: horticultura e agricultura 
7.9. A sociedade industrial 
7.10. A sociedade pós-industrial 
Bibliografia 
Anexo I: Alguns modos de produção 
Anexo II: Das sociedades pré-industriais às sociedades pós-
industriais 
 
154-182 
TEMA 8: A ESTRATIFICAÇÃO SOCIAL 
8.1. Introdução 
-Sociedade 
-Estrutura social 
-Comunidade 
-Colectivo 
-Grupo 
-Grupo primário 
-Grupo secundário 
8.2. A estratificação social 
-Estratificação social 
a) Escravatura 
b) Castas 
c) Sistema feudal 
d) Sociedade de classes 
-Mobilidade social 
8.3. Dicotomias sociais clássicas 
-Status/ contrato: Henry J. S. Maine (1861) 
-Societas/ civitas: L.H. Morgan (1877) 
-Comunidade/sociedade: F. Tönnies (1887) 
-Solidariedade mecânica/ solidariedade orgânica: E. Durkheim (1893) 
-Solidariedade positiva/ solidariedade negativa: E. Durkheim (1893) 
-Relações comunais/ relações de associação: R.M. Maciver (1917) 
-Folk/ Urbano: R. Redfield (1941) 
183-199 
8.4. Críticas às dicotomias sociais clássicas 
-Oscar Lewis (1953) 
-Anthony Cohen (1989) 
Bibliografia 
Anexo I: Ficha de leitura sobre a imagem da comunidade 
Anexo II: Mudanças na estrutura social do Nordeste Transmontano 
 
TEMA 9: O PARENTESCO 
9.1. Introdução: Que é o parentesco? 
9.2. Grupos de parentesco 
9.3. Tipos de família 
9.4. O matrimónio 
9.5. Os sistemas de descendência e herança 
Bibliografia 
Sítios em Internet 
 
200-208 
TEMA 10: AS IDENTIDADES COLECTIVAS E AS ETNICIDADES 
10.1. Identidade e alteridade: Paradigmas 
10.2. A identidade como constructo relacional 
10.3. A noção de raça e a ideologia racial 
10.4. Grupos étnicos e etnicidade 
10.5. A percepção cultural dos grupos étnicos 
10.6. Modelos de convivência intercultural 
10.7. O conflito identitário 
10.8. Os nacionalismos 
Bibliografia 
Sítios em Internet 
Anexo: Classificação de Linneo 
 
209-230 
TEMA 11: A POLÍTICA 
11.1. Introdução: política, poder e autoridade 
11.2. Os sistemas políticos nos bandos de caçadores e recolectores 
11.3. Os sistemas políticos nos sistemas tribais 
11.4. Os sistemas políticos nas chefaturas 
11.5. Os sistemas políticos nos estados 
11.6. Rituais, tradições e ordem social 
11.7. O clientelismo 
Bibliografia 
Anexo: Formas de organização política e características sociais 
 
231-244 
TEMA 12: A RELIGIÃO E OS SISTEMAS DE CRENÇAS 
12.1. Introdução. 
12.2. Expressões da religião: 
- Animismo. 
- Maná e tabu. 
- Magia e religião. 
- Ritos de transição ou de passagem. 
- O Totemismo. 
- Os mitos 
12.3. Religião e Cultura. 
245-254 
12.4. Religião e Mudança Cultural. 
Bibliografia 
 
TEMA 13: AS IDENTIDADES DE GÉNERO 
13.1. O biológico 
13.2. O cultural 
13.3. A divisão do trabalho segundo o género 
13.4. A socialização no género 
13.5. As identidades de género 
13.6. Género e antropologia do mediterrâneo 
Bibliografia 
Sítios em Internet 
 
255-269 
TEMA 14: OS URBANISMOS 
14.1. Introdução: antecedentes da antropologia urbana. 
14.2. Antropologia Urbana: Do estudo dos primitivos ao estudo das 
cidades e do urbanismo. 
14.3. Os modelos de crescimento urbano: A Escola de Chicago. 
14.4. Os modelos de expansão da cidade. 
14.5. Os modelos de desterritorialização do urbano. 
Bibliografia 
Sítios em Internet 
 
270-279 
TEMA 15: ANTROPOLOGIA: MODO DE USAR. A APLICAÇÃO DA 
ANTROPOLOGIA 
15.1. Introdução: Breve história da antropologia aplicada 
15.2. A antropologia aplicada como campo próprio 
15.3. A aplicação da antropologia 
15.4. A antropologia aplicada como posição política 
15.5. Áreas de aplicação 
15.6. Ética da antropologia aplicada 
15.7. Trabalhar em antropologia: A situação dos antropólogos em 
Portugal 
Bibliografia 
Sítios em Internet 
 
280-298 
 
APRESENTAÇÃO 
A história destes apontamentosnasceu no ano 1998, data em que ganhei um 
concurso par uma vaga de antropologia no pólo da UTAD em Miranda do 
Douro. Desde essa data, e algo insatisfeito com os manuais de antropologia 
em língua portuguesa, tenho-me dedicado a construir e organizar notas e 
reflexões para consulta dos nossos estudantes de antropologia. E ainda que 
não pretenderam ser, nem são, um manual de antropologia sociocultural, estes 
apontamentos oferecem um caminho e um percurso orientado para quem se 
inicie em antropologia sociocultural, representando um ritual de leitura iniciática 
para aqueles que procuram na antropologia um olhar holístico sobre os 
problemas humanos. 
Enquanto introdução à antropologia sociocultural, este conjunto de 
apontamentos representa também um diálogo da antropologia com outras 
ciências sociais, contextualizando neste jogo de espelhos a antropologia, os 
seus objectos tradicionais, as suas correntes de pensamento e os seus 
métodos de investigação. Apresentado de uma forma didáctica e não tanto 
erudita, não pretende esgotar os temas e os problemas abordados pela 
antropologia, porém discutir aquelas questões consideradas mais centrais à 
disciplina. A sua leitura não exime os alunos da consulta e leitura de manuais e 
outros textos complementares referenciados na bibliografia geral da unidade 
curricular “Antropologia Sociocultural”, leccionada por mim na licenciatura em 
Animação Sociocultural do pólo da UTAD em Chaves. 
 A estrutura destes apontamentos, que servem de auxílio ao programa de 
antropologia sociocultural, é a divisão em quatro partes. Uma primeira que é a 
apresentação e fundamentação da antropologia enquanto ciência social e uma 
das humanidades, a reflexão sobre dois dos objectos centrais na disciplina (o 
cultural e o social), e também a relação com outras ciências sociais e com o 
folclore. Na segunda parte abordamos uma breve história das correntes 
teóricas e de pensamento em antropologia, e também a metodologia 
etnográfica. Na terceira parte aproximamo-nos de algumas problemáticas 
centrais na investigação antropológica, isto é, a comunicação, a produção 
económica, a estratificação social, o parentesco e a etnicidade. Na quarta parte 
apresentamos as abordagens antropológicas do poder, da religião, do género, 
dos urbanismos e concluímos com uma reflexão sobre a aplicação e utilidade 
da antropologia. 
 Todos os temas abordados apresentam um estilo expositivo, com 
definição de objectivos, índice, apontamentos, tabelas – resumes, bibliografia e 
Webs de interesse para consulta complementar. A bibliografia de apoio citada 
apresenta-se, na sua maioria, em língua portuguesa, inglesa e espanhola, 
tendo em conta as possibilidades dos estudantes e também a formação 
transcultural do docente (na Galiza, em Espanha, no Reino Unido e em 
Portugal, especialmente nos seguintes departamentos: Departamento de 
Filosofia e Antropologia Social da Universidade de Santiago de Compostela, 
Departamento de Antropologia da Universidade Complutense de Madrid, 
Departamento de Antropologia da Universidade de Edimburgo, Departamento 
de Sociologia da Universidade de Milão, Departamento de Antropologia do 
ISCTE (Lisboa). 
 O fio condutor destas anotações é o estudo do ser humano enquanto ser 
social e cultural desde a antropologia sociocultural, não limitando-se este 
estudo aos exotismos tradicionais da antropologia e aplicando esta ao estudo e 
intervenção nas sociedades complexas e globalizadas de hoje. Tendo em conta 
isto, ao longo destes apontamentos apelamos a um olhar holístico dos 
problemas humanos, tão característico da antropologia. 
Queria agradecer o contributo dos alunos da UTAD das licenciaturas em 
antropologia aplicada, trabalho social, turismo e animação sociocultural para a 
escrita destes apontamentos; os seus questionamentos e comentários serviram 
de desafio para melhor organizar e classificar reflexões dispersas e construídas 
ao longo da minha carreira profissional. Quero também agradecer aos colegas 
docentes do ex-pólo da UTAD em Miranda do Douro, aos colegas do CETRAD, 
do DESG e do pólo de Chaves que estimularam de uma ou outra forma a 
construção destes apontamentos. 
 
 
 
 
TEMA	1:	QUE	É	A	ANTROPOLOGIA?	
 
 
1 
© APONTAMENTOS DE ANTROPOLOGIA SOCIOCULTURAL 2011-2012- Prof. Dr. Xerardo 
Pereiro – Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) - antropólogo- Correio 
electrónico: xperez@utad.pt Web: www.utad.pt/~xperez/ 
 
TEMA 1: QUE É A ANTROPOLOGIA? 
 
Objectivos 
-Familiarizar o leitor com termos e conceitos básicos da antropologia. 
-Contextualizar a antropologia nos campos do saber. 
-Sensibilizar o discente para uma perspectiva antropológica. 
 
Índice 
1.1. O que é a antropologia? 
-A origem etimológica 
-A antropologia hoje 
-O objecto de estudo da antropologia 
-A crise do objecto de estudo da antropologia 
-O que fazem os antropólogos 
-A antropologia: ciência ou arte? 
-A antropologia como espelho da humanidade 
1.2. A antropologia e os seus campos de conhecimento. 
1.3. Etnografia, Etnologia e Antropologia. 
1.4. Os enfoques sectoriais. 
Bibliografia 
Sítios em Internet 
 
 
1.1. QUE É A ANTROPOLOGIA? 
 
“Fomos os primeiros a insistir sobre uma série de coisas: que o mundo não 
está dividido entre o religioso e o supersticioso; que existem esculturas em 
florestas e pinturas em desertos; que é possível a ordem política sem o poder 
centralizado, e a justiça normalizada sem regras codificadas; que as normas da 
razão não foram fixadas na Grécia nem a evolução da moralidade consumada 
na Inglaterra. E o que é mais importante: fomos os primeiros a insistir em que 
vemos as vidas dos outros através de lentes por nós lapidadas, e que os outros 
vêem as nossas vidas através de suas próprias lentes, cuja lapidação foi feita 
por eles” (Geertz, 1984: 278) (tradução ao português de André Villalobos, em 
http://www.anpocs.org.br/portal/publicacoes/rbcs_00_08/rbcs08_01.htm 
consultado o 11-02-2010). 
 
A origem etimológica 
A palavra “antropologia” deriva das palavras gregas “logos” (estudo) e 
“anthropos” (humanidade) e significa, literalmente, “estudo da humanidade”. 
Porém, a antropologia, na época antiga, não era exactamente o que é 
actualmente. Para os gregos e romanos, a “antropologia” era uma “ciência 
dedutiva”, isto é, uma discussão baseada em deduções abstractas sobre a 
natureza dos seres humanos e o significado da existência humana. O seu 
método de verificação do conhecimento era o método dedutivo, que consistia 
TEMA	1:	QUE	É	A	ANTROPOLOGIA?	
 
 
2 
em chegar a uma conclusão particular, partindo de premissas universais. 
Tratava-se, portanto, de um caminho que ai do geral ao particular. A verdade 
radicava no facto do particular ser uma parte mais do geral. Partia-se de uma 
teoria geral para testar hipóteses (propostas de relações entre variáveis – 
dados que variam caso a caso) derivadas dessa teoria. 
 
A antropologia hoje 
Podemos afirmar que a antropologia é hoje: 
1. O estudo dos seres humanos enquanto seres biológicos, sociais e 
culturais. 
2. Uma forma de olhar a diversidade, uma atitude ética de sensibilidade e 
empatia face os outros. 
3. Uma profissão na qual se aplicam conhecimentos, métodos, técnicas, 
sensibilidades e olhares para melhor compreender e lidar com o mundo. 
Na profissão de antropólogo um dos seus exercícios fundamentais é a 
tradução intercultural e entre sistemas sociais. 
 
Em primeiro lugar, a antropologia é uma ciência que formula conclusões 
e abstracções sobre a natureza humana, tendo como base um conhecimento 
derivado da observação sistemática da diversidade cultural humana. Este 
conhecimento serve, assim, para a construção de teorias que interpretam os 
fenómenos socioculturais. Estes conhecimentos, tal como os métodos e as 
teorias da antropologia, servem para ser aplicados na melhoria das condições 
de vida das populações estudadas. Poderíamos afirmar que a antropologia é 
uma viviciência, como costuma denominar o antropólogo Miguel Vale de 
Almeida.Em segundo lugar, a antropologia actual é uma forma de 
olhar/perspectivar o “outro”, estudar as diferentes racionalidades (Gondar e 
outros, 1980), explorar e respeitar a diversidade sociocultural. Essa forma de 
olhar/perspectivar implica pensar a convivência intercultural e lutar contra a 
exclusão, a desconexão e a discriminação social. A antropologia desmascara e 
desconstrói a realidade para olhar desde o outro lado do espelho. A 
antropologia é falar dos outros a outros depois de percorrer a distância que nos 
separa deles, percebe-los, conhece-los, compreende-los, pôr-se no seu lugar e 
respeita-los. A antropologia é uma forma de conhecer-nos a nós próprios 
através dos outros (Bestard e Contreras, 1987: 5). 
 Em terceiro lugar o antropólogo é um profissional “...que estuda as 
culturas das diversas populações em todas as suas manifestações (tecnologia, 
sistemas de valores e crenças, organização social) e as estruturas e modelos 
culturais em geral, com um método interdisciplinar...” (De la Fuente, 1998). 
Desde este ponto de vista a antropologia é uma profissão, com um corpus 
teórico-metodológico, uma ética deontológica e um conjunto de profissionais 
que a exercem enquanto profissão (De Pina Cabral, 1998). 
 
O objecto de estudo da antropologia 
Os modos de vida de outras partes do mundo costumam fascinar, estranhar ou 
gerar uma visão exótica. A antropologia oferece um conhecimento humano e 
comparativo do mundo e da sua diversidade cultural. Podemos estabelecer, 
TEMA	1:	QUE	É	A	ANTROPOLOGIA?	
 
 
3 
relativamente ao seu objecto de estudo, os seguintes tipos de definições – a 
antropologia: 
 
1. Estuda os seres humanos em geral, e estabelece leis válidas para o 
conjunto da humanidade. 
2. Estuda os produtos e as acções dos seres humanos: comportamento 
social, costumes, cultura, rituais, parentesco, vida quotidiana, cultura 
material, tecnologia, relações sociais, etc. 
3. Estuda grupos humanos ou culturas de todas as épocas e partes do 
mundo. 
4. Estuda alguns tipos de sociedades: “primitivas”, pré-industriais, simples, 
“complexas”, “tradicionais”, industriais, pós-industriais, não ocidentais, 
ocidentais... 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A crise do objecto de estudo da antropologia 
Anteriormente, a antropologia era pensada como o estudo das sociedades sem 
escrita, etiquetadas, sob uma perspectiva evolucionista, como “sociedades 
primitivas”. Nesta perspectiva, essas sociedades coincidiam basicamente com 
as sociedades não ocidentais. O termo de “primitivo” foi, no entanto, 
abandonado devido à sua notação pejorativa e ao falso binómio selvagem / 
civilizado. A partir de então, a antropologia foi pensada como o estudo de 
pequenas comunidades camponesas, nas quais as relações interpessoais e a 
falta de especialização económica eram muito importantes, assim como a sua 
homogeneidade e o seu equilíbrio internos. A antropologia virou-se assim para 
Ocidente. Posteriormente, a antropologia dos “primitivos” e dos camponeses 
passou a ser uma antropologia “no” e “do” espaço urbano e do urbanismo. 
Desta forma, a antropologia passou a ser uma ciência que estuda qualquer 
problema sociocultural, em qualquer parte do mundo. 
Em síntese, actualmente, podemos pensar a antropologia como uma 
disciplina que: 
 
 Estuda a cultura inserida num contexto social. 
 Estuda a conduta humana e o seu pensamento, no seu contexto social e 
cultural. 
 Estuda as semelhanças e as diferenças entre as culturas: o que nos faz 
iguais e o que nos faz diferentes, relativamente “ao (s) outro (s)”. 
SUJEITO: 
HUMANO 
OBJECTO: 
HUMANOS 
TEMA	1:	QUE	É	A	ANTROPOLOGIA?	
 
 
4 
 Estuda as formas de pensar, perceber e lidar com os múltiplos “outros”. 
 
Exemplo etnográfico: Existe um mito cherokee que descreve, da seguinte 
forma, a origem dos seres humanos: O criador pegou num pedaço de barro, fez 
uma figura e meteu-a no forno. Pouco tempo depois, tirou-a do forno. Uma vez 
que a figura tinha assado pouco tempo, saiu um ser humano branco com a face 
pálida –“os rostos pálidos”. De seguida, o criador fez outra figura e meteu-a, 
igualmente, no forno, deixando-a aí muito tempo. Dessa figura saiu um ser 
humano preto. Finalmente, voltou a fazer outra figura e meteu-a no forno o 
tempo justo, criando, assim, os cherokee. 
 
O que fazem os antropólogos? 
Além de comer, dormir, defecar e outras actividades humanas os antropólogos 
fazem: 
 
 Trabalho de campo: Recolhem dados sobre a cultura e descrevem 
fenómenos socioculturais. O trabalho de campo é uma metodologia, 
inventada por antropólogos, que tem como base a integração no grupo 
humano estudado e como objectivo a compreensão das suas pautas 
culturais. Neste contexto, a observação participante emerge como a 
técnica de investigação fundamental, mas também como a atitude a 
adoptar. A antropologia não é uma ciência do exótico, praticada por 
académicos fechados numa torre de marfim: o antropólogo partilha 
muito tempo com as pessoas, a falar, ouvir, observar, gravar, participar, 
escrever, anotar, perguntar, etc. O antropólogo convive e partilha 
experiências humanas com as pessoas estudadas, como o objectivo de 
traduzir a sua experiência. Ler sobre a batalha de Normandia não é o 
mesmo do que ter participado nela. 
 Comparam culturas: Comparam culturas com outras culturas, 
descrevendo as suas semelhanças e diferenças. 
 Interpretam as culturas: Interpretam a realidade humana, descobrem os 
seus sentidos e significados e criam teorias socioculturais. Exemplos: a 
garrafa está meio cheia ou meio vazia?; o movimento do olho, é um tic 
ou um piscar de olhos a alguma pessoa?. Severo Ochoa distinguiu-se 
como um médico, chegando a ser “Prémio Nobel de Medicina”. Durante 
a sua vida académica, reprovou a algumas disciplinas. O que é que isto 
pode significar? a) que um mau aluno chegou a ser prémio Nobel; b) que 
um bom aluno pode reprovar... 
 Aplicam a antropologia: Aplicam teorias, métodos e conhecimentos 
antropológicos, para melhorar as condições de vida das populações 
(aplicação e aplicabilidade da antropologia). A primeira aplicação da 
antropologia é no campo da educação. Ensinar antropologia é uma 
forma de aplicação da mesma. 
 
Portanto em antropologia faz-se investigação e também intervenção social. 
 
 
O que se pensa que fazem os 
antropólogos 
Coisas que fazem os antropólogos 
 Os antropólogos desenterram  Estudam cultura e culturas. 
TEMA	1:	QUE	É	A	ANTROPOLOGIA?	
 
 
5 
ossos. 
 Os antropólogos medem crânios. 
 Os antropólogos estudam povos 
estranhos. 
 Os antropólogos são românticos, 
sonhadores e idealistas, mas não 
servem para nada. 
 Fazem trabalho de campo. 
 Desenham políticas públicas (ex.: 
agricultura, urbanismo...) 
 Organizam os recursos humanos 
de muitas empresas. 
 Os seus trabalhos diminuem o 
etnocentrismo e o racismo. 
 Contribuem para a tolerância e 
para a convivência pacífica. 
 Ajudam a minorar problemas como 
o SIDA, a toxicodependência, etc. 
 
 
 
A antropologia: ciência ou arte? 
A antropologia é, para alguns, uma ciência social que enfatiza a objectividade, 
a observação sistemática e a explicação. De acordo com esta perspectiva, a 
ciência é entendida como um modo de conhecer e de gerar afirmações sobre o 
mundo, mas também como uma forma de contrastar as afirmações sobre a 
verdade do mundo. A ciência não é, porém, o único modo de produzir 
conhecimento sobre o mundo. Conhecer é um modo de presença e de 
representar o mundo, é um modo de relação entre um sujeito e um objecto 
através de uma mediação (Hessen, 1961). Segundo Wallace (1980) os modos 
de produção de conhecimento podem ser classificados da seguinte forma: 
 
A) Modo autoritário: Conhecimento por referência aos produtores, socialmente 
qualificados. Exemplo: velhos, bispos e professores. 
 
B) Modo místico: Conhecimento que se baseia na referência a um ser natural 
ou sobrenatural. Exemplo: profetas, médiuns, deuses... Este tipo de 
conhecimento é alcançável através de rituais comoo transe. 
 
C) Modo lógico - racional: Neste caso, a produção de conhecimento 
fundamenta-se em regras da lógica formal; i.e.: premissa A, premissa B, 
portanto, conclusão C. É a aplicação do senso comum. 
 
D) Modo científico: É um processo que implica testar os enunciados, através da 
observação e dos dados produzidos, para alcançar generalizações empíricas e 
formular teorias. 
 
E se, para alguns, a antropologia é uma ciência social, para outros a 
antropologia é uma das Humanidades. Nesta perspectiva, a antropologia 
enfatiza a subjectividade, o relativismo cultural, a compreensão dos 
participantes e o significado que as acções socioculturais têm para as pessoas. 
O antropólogo faz parte da etnografia que observa: é uma pessoa que estuda 
outras pessoas, é um sujeito que estuda outros sujeitos humanos (objecto de 
estudo), o que implica uma inter-subjectividade na forma de produzir o 
conhecimento. Sob este ponto de vista, a antropologia pode ser considerada 
uma forma de arte. As leis da antropologia são diferentes das Ciências 
Naturais, aproximam-se mais do “certum” do que do “verum”. A antropologia 
TEMA	1:	QUE	É	A	ANTROPOLOGIA?	
 
 
6 
pode atingir a objectividade? Podemos ser objectivos quando o sujeito de 
investigação é a humanidade e o que esta tem de humano? 
As ciências sociais e as ciências em geral não estão isentas de valores e 
de subjectividades. Assim, por exemplo, um químico pode aplicar a química 
para construir uma bomba atómica ou para curar o cancro. Portanto, não pode 
existir ciência sem consciência e sem uma ética moralmente humanista. Outro 
exemplo é o do construtor de “futuro” Bill Gates: “A tradução por computador só 
é possível a um nível muito elementar. O imprescindível exercício de 
interpretação fica reservado aos humanos” (Gates 1999). 
No caso das ciências sociais, estas não podem chegar a ser puramente 
e absolutamente objectivas. Todas elas podem utilizar ferramentas, 
mecanismos e instrumentos que objectivam a intersubjectividade e a produção 
de conhecimento sobre a realidade humana. Portanto, podemos afirmar que a 
antropologia é uma ciência social que, às vezes, actua metodologicamente 
como se fosse uma arte. 
A antropologia enquanto espelho para a humanidade 
A antropologia é um espelho para a humanidade, isto é uma “ciência das 
semelhanças e das diferenças humanas” (Kluckhon 1944: 9), que da resposta 
ao dilema da convivência intercultural entre pessoas com modos de vida 
diferentes. Esta preocupação pela diversidade humana é uma das chaves da 
antropologia, pois ao observarmos os outros podemos ver-nos, mais 
claramente, a nos próprios. 
 A antropologia tenta ver o mundo num grau da areia e também do outro 
lado do espelho, para de forma empática compreender melhor o ser humano. 
 
1.2. A ANTROPOLOGIA E OS SEUS CAMPOS DE CONHECIMENTO 
 
CAMPOS DA ANTROPOLOGIA 
As diferenças entre os vários campos da antropologia baseiam-se, 
essencialmente, nos objectos de estudo e problemáticas de análise, mas 
também no que concerne às teorias, métodos de estudo e tradições 
académicas concretas. 
A. Antropologia Filosófica. O seu objecto de estudo é a pessoa humana 
como ser genérico; aquilo que as pessoas têm em comum. Estuda 
generalidades e utiliza conceitos muito abstractos. O seu método é geralmente 
introspectivo: dedica-se ao interior da pessoa humana e trabalha sobre “o 
conceito do conceito”. 
B. Antropologia Física. Estuda a evolução biológica humana, isto é, a relação 
entre a evolução biológica e a cultural; utiliza métodos como a 
paleoantropologia (estudo dos antepassados humanos; é uma tentativa de 
desvelar a evolução biológica dos humanos, desde o primeiro momento do 
aparecimento dos primatas até aos nossos dias), a antropometria (medições 
anatómicas), a anatomia comparativa (estudo comparativo de fósseis 
humanos) ou a raciologia (classificação das raças humanas). Actualmente, 
utilizam métodos próprios da genética molecular para distinguir aos primates 
dos humanos. Nos E.U.A., e relativamente a este uso da genética molecular, 
os antropólogos físicos preferem ser chamados “antropólogos biológicos”. 
C. Antropologia Sociocultural. Estuda as diferenças entre humanos e
animais (os humanos criam e têm culturas). 
TEMA	1:	QUE	É	A	ANTROPOLOGIA?	
 
 
7 
 
C.1. Antropologia Cultural. É uma terminologia norte-americana. O seu 
fundador Franz Boas, um alemão emigrado aos E.U.A. que converteu a 
museística (etapa prévia à antropologia cultural) norte-americana em ciência. 
Boas formou-se numa escola neokantista e o seu esquema teórico de 
referência é o da Ilustração. A Ilustração da Alemanha reage, teoricamente, ao 
mundo medieval (teocentrismo: Deus centro de todo), e propõe como 
alternativa o antropocentrismo (o humano como centro do mundo). O objectivo 
era ultrapassar os esquemas das crenças para chegar aos esquemas da razão. 
É preciso converter o ser humano num ser científico. Para a Ilustração alemã o 
ser humano é duplo: 
 a) Por um lado, comparte características biológicas com o resto dos 
seres vivos. É necessário, portanto, uma ciência que estude os humanos como 
um animal, a antropologia física. 
 b) Por outro lado, os humanos são capazes de elaborar coisas que os 
animais não podem criar: a linguagem, a tecnologia, símbolos, etc. Este 
conjunto de coisas que os humanos produzem e aprendem, enquanto 
membros de uma sociedade, é aquilo que os alemães chamam “KULTUR” 
(cultivar: algo que só podem fazer os humanos). O estudo da “kultur” é a 
antropologia cultural. 
 
Quando Franz Boas chegou aos E.U.A., empenhou-se em divulgar estas 
ideias, definindo a antropologia cultural, no sentido de obras materiais e 
espirituais especificamente humanas. 
 
 
C.2. Antropologia Social. É um termo que nasce no Reino Unido, depois de 
superar, igualmente, uma fase museológica. Para os britânicos, a referencia 
não foi a Ilustração, mas o francês Emile DURKHEIM que elaborou um modelo 
de pensamento de reacção á Ilustração. Segundo Durkheim, se queremos 
estudar os seres humanos, não podemos basearmos, exclusivamente, nos 
seus produtos, porque os produtos são determinados pela sociedade em que 
esses produtos são criados. Nada garante que os produtos culturais continuam 
a ter a mesma significação que tinham aquando da sua elaboração e utilização. 
Portanto, não é possível estudar os produtos humanos sem estudar a 
sociedade que os gera. Caso contrário, não teríamos garantias de conhecer o 
sentido e significado desses objectos ou produtos culturais. A antropologia 
social britânica defendeu que era necessário estudar, primeiramente, a 
sociedade, para depois fazer uma análise dos produtos humanos (“kultur”). 
Esta perspectiva sublinha mais alguns conceitos como os de: estrutura social, 
instituição familiar, formas de organização política e económica, controlo social, 
etc. 
 
 
Na actualidade, a diferença não existe na prática, pois os antropólogos 
estudam tanto as relações sociais, como os produtos culturais. A única 
diferença que pode surgir relaciona-se com uma questão de ordem. Estamos 
perante o que denominamos por antropologia sociocultural. 
 
D. Antropologia Aplicada. A contribuição da antropologia, para as culturas 
TEMA	1:	QUE	É	A	ANTROPOLOGIA?	
 
 
8 
que estuda, tem sido muito importante. O reconhecimento do seu serviço 
público motivou a origem de uma outra subdisciplina, a antropologia aplicada 
que trata da aplicação de dados, teorias, perspectivas e métodos 
antropológicos para identificar, avaliar e resolver problemas sociais 
contemporâneos. Algumas das suas áreas são: a saúde e a enfermagem; a 
planificação familiar; o desenvolvimento económico; a animação sociocultural; 
o turismo, os museus, a planificação urbana, etc.. Neste sentido, a antropologia 
aplicada estuda a cultura, para depois elaborar projectos de acção, intervenção 
e mudança cultural, dentro de um sistema de referência concreto. Além disso, a 
antropologia também pratica a investigação-acção partipada e a co-
investigação.A ANTROPOLOGIA NOS EUA 
Nos E.U.A., a Antropologia inclui 5 subdisciplinas: 
-Antropologia sociocultural ou cultural. 
-Antropologia arqueológica (estudo das culturas do passado, através das suas 
permanências materiais). Divide-se em pré-história (sociedades sem registos 
escritos) e arqueologia histórica (sociedades com registos escritos, sobre a sua 
história). 
-Antropologia biológica. 
-Antropologia linguística. 
-Antropologia aplicada. 
 
Todas elas se incluem nos departamentos de antropologia. A antropologia 
norte-americana nasceu do interesse pela história e pelas culturas das 
populações nativas (“os índios norte-americanos” -Mito cherokee da criação 
dos humanos:...), permanecendo certa unidade entre as 4 subdisciplinas. 
 
 
A ANTROPOLOGIA NA EUROPA 
 
 “Antropologia Social” (Reino Unido) 
 “Etnologia” (França) 
 “Etnografia” (Rússia) 
 
Na Europa, não foi desenvolvida uma antropologia tão unificada. As 
anteriormente chamadas subdisciplinas existem de uma forma independente. 
Ainda que as paisagens mudam algo de país a país, penso que podemos 
afirmar que a arqueologia está mais próxima da História, a antropologia física 
mais próxima da biologia e da medicina e a antropologia sociocultural mais 
próxima da sociologia e de outras ciências humanas e sociais. 
 
 
A ANTROPOLOGIA NO REINO UNIDO (Fonte: Lienhardt, 1982) 
 
 1837: Buxton e Hdogkin fundaram a Sociedade Protectora dos 
Aborígines. 
 1840: Fundou-se a Sociedade Etnológica de Londres, que elaborou um 
questionário de costumes tribais para viageiros e militares. Também 
TEMA	1:	QUE	É	A	ANTROPOLOGIA?	
 
 
9 
criou um diário tipo para descrever as outras culturas visitadas. 
 Entre 1863 e 1865 a Sociedade Antropológica de Londres passou de 11 
a 500 associados. 
 No ano 1908, James Frazer, autor de “O Ramo Dourado”, chegou a ser 
o primeiro catedrático de antropologia social do Reino Unido, na 
Universidade de Liverpool. 
 
 
 
A ANTROPOLOGIA NA FRANÇA 
 
1. Denominada, inicialmente, “Etnologia”. 
2. Desenvolvida, como disciplina de ensino, a partir de 1927, no “Institut 
d´Ethnologie del Musée de l´Homme” (Paris). 
 Antropologia física. 
 Tecnologia. 
 Pré-História. 
 Linguística. 
 Etnologia. 
3. O “Musée de l´Homme” dependia do Museu de História Natural, porque se 
pensava que a antropologia era uma subdisciplina da história natural. 
Havia um determinismo biológico de acordo com o qual se considerava 
que as diferenças culturais eram fruto das diferenças biológicas entre os 
humanos. 
4. O “Centre d´Ethnologie Française” (CEF) é uma secção do CNRS (algo 
parecido com CSIC espanhol ou com o ICS português) que está associado 
ao Museu Nacional de Artes e Tradições Populares (Paris). O CEF é, 
actualmente, dirigido por Martine Segalen, especialista em antropologia da 
família europeia. O CEF publica a revista “Ethnologie Française”. 
5. Mision du Patrimoin Ethnologique (1979 - ). Possibilitou a emergência de 
etnólogos regionais, sob os auspícios do Ministério de Cultura. 
 
 
 
1. 3. ETNOGRAFIA, ETNOLOGIA, ANTROPOLOGIA 
De acordo com o antropólgo Claude Lévi Strauss (1992) há três níveis de 
interpretação das culturas: 
 
1º. Etnografia: simples descrição e narração da cultura. 
-Etno: cultura, costumes,... 
-Grafia: escrever, descrever, etc. 
 Exige investigação de terreno com observação directa. 
 A etnografia é uma retórica que constrói a realidade, a partir de uma 
reflexividade dialógica entre o antropólogo e os humanos estudados. 
 
 
2º. Etnologia: Nível da procura de razões e comparações de costumes e 
culturas. Não se relega à mera descrição dos factos. 
-Etno: Costumes... 
TEMA	1:	QUE	É	A	ANTROPOLOGIA?	
 
 
10 
-Logia: razão, tratado de... 
 Classifica povos, de acordo com as suas características culturais, e explica 
a distribuição de traços culturais. 
 Coimpara culturas, grupos humanos, traços culturais, territórios, regiões, 
áreas culturais. 
 Compara o passado e o presente de um grupo humano, numa perspectiva 
etnohistórica. 
 
 
3º. Antropologia: Nível de interpretação global e holística (a totalidade da 
experiência humana: biologia, cultura, história, economia...) dos fenómenos 
culturais. 
 Estuda o comportamento sociocultural (ex.: através de instituições como a 
família, os sistemas de parentesco, a organização política, os rituais 
religiosos, etc.) de grupos humanos passados e presentes. 
 Estuda as regularidades e regras culturais da vida em sociedade. 
 
Na realidade, estes três níveis convergem e interagem. Mas, no que concerne 
ao processo de investigação, ensina-se os alunos que este se deve iniciar com 
a etnografia, seguindo-se a etnologia e, depois, a antropologia. Na França, o 
termo “Etnologia” e o termo “Antropologia” são sinónimos, embora esta 
acepção não esteja isenta de controvérsia: o antropólogo Claude Lévi-Strauss 
defendeu que estes conceitos não eram sinónimos, afirmando que a etnologia 
procurava estudar os sentidos de uma cultura de uma área particular e que a 
antropologia procurava os sentidos dos comportamentos culturais comuns a 
toda a humanidade. 
 
Exemplo etnográfico: 
 
 
ETNOGRAFIA 
` Os índios guayakis (Paraguai) abandonam os seus velhos, pintam os seus 
corpos com linhas oblíquas e rectângulos curvos, praticam a poliandria, comem 
os seus mortos e batem às meninas que têm a primeira menstruação com 
pénis de tapir...” (Pierre Clastres: Chronique des indiens Guayaki). 
ETNOLOGIA 
Guayakis Portugueses 
- Abandonam os mais idosos quando 
estes não conseguem valer-se a si 
próprios. 
- Cuidam dos mais idosos até estes 
falecerem. 
ANTROPOLOGIA 
- Redução da distância entre as gerações de netos e avós, no interior do 
grupo doméstico da mãe. 
- Obrigação sociocultural de prestar cuidados aos pais: relação com a 
herança post-mortem e com a segurança da conservação do património. 
 
TEMA	1:	QUE	É	A	ANTROPOLOGIA?	
 
 
11 
 
 
1.4. OS ENFOQUES SECTORIAIS 
Dentro da antropologia sociocultural, há uma série de enfoques de abordagem 
ou subdisciplinas. Estes procuram estudar, em profundidade, algumas 
dimensões do comportamento humano: 
 Os humanos vivem em meios ecológicos diferentes que afectam aos 
comportamentos culturais. A subdisciplina que trata das relações entre 
os humanos e o meio ambiente é a “Antropologia Ecológica”. 
 Além disso, os humanos necessitam produzir uma série de bens para a 
sua subsistência e consumo: esta é a perspectiva da “Antropologia 
Económica”. 
 Os humanos necessitam de regras e formas de organização para viver: 
as regras e organizações políticas são estudadas pela “Antropologia 
Política”. 
 O mundo simbólico e cognitivo é estudado pela “Antropologia Cognitiva 
e Simbólica”. 
Poderíamos continuar a enumerar uma série de subdisciplinas, com um campo 
especializado de estudo, com perspectivas e teorias próprias, mas todas se 
baseiam e constroem, simultaneamente, a antropologia, como disciplina 
académica. 
 
BIBLIOGRAFIA 
-BERNARDI, B. (1974): Introdução aos estudos etno-antropológicos. Lisboa: 
Edições 70. 
-BESTARD, J. E CONTRERAS, J. (1987): Bárbaros, paganos, salvajes y 
primitivos. Una introducción a la Antropología. Barcelona: Barcanova. 
-DE LA FUENTE GÓMEZ, C. (1998): Todos los estudios y carreras. Barcelona: 
Planeta. 
-DE PINA CABRAL, J. (1998): “A antropologia e a questão disciplinar”, em 
Análise Social vol. XXXIII (149), pp. 1081-1092. 
-GATES, B. (1999): “El maestro y el ordenador”, em http://www.el-
mundo.es/navegante/99/octubre/03/entrevista.gates.html 
-GEERTZ, C. (1984): “Distinguished Lecture. Anti anti-relativism”, em 
American Anthropologist n.º 86(2), pp. 263-278. 
-GEERTZ, C. (1989, or. 1983): El antropólogo como autor. Barcelona: Paidós. 
-GONDAR, M. e outros (1980): Antropología y Racionalidad. Santiago de 
Compostela: Sálvora. 
-GONZÁLEZ ECHEVARRÍA, A. (1987): La construcción teórica en 
Antropología. Barcelona: Anthropos. 
-HARRIS, M. (1995, or. 1983): Antropología Cultural. Madrid: Alianza. 
-HESSEN, J. (1961): Teoríadel conocimiento. Madrid: Espasa-Calpe. 
-KLUCKHOLN, C. (1949, or. 1944): Mirrror for man. New York: MacGraw 
House. 
-KOTTAK, C.PH.(1997, or. 1996): Antropología cultural. Espejo para la 
humanidad. Madrid: MCGraw-Hill. 
-LÉVI-STRAUSS, C., 1992, “El lugar de la antropología entre las ciencias 
sociales y problemas planteados por su enseñanza”, em Antropología 
Estructural. Barcelona: Paidós, pp. 359-391. 
-LIENHARDT, G. (1982, or. 1964): Antropología Social. México: FCE. 
TEMA	1:	QUE	É	A	ANTROPOLOGIA?	
 
 
12 
-LINTON, R. (1942, or. 1936): Estudio del hombre. México: FCE. 
-LOMBARD, J. (1997, or. 1994): Introducción a la Etnología. Madrid: Alianza. 
-MAIR, L. (1973, or. 1965): Introducción a la Antropología Social. Madrid: 
Alianza. 
-MAGAZINE NOTÍCIAS(Ed.)(2000): “O fascínio pela diferença. Entrevista a 
Paulo Mendes”. Porto: Jornal De Notícias n.º 412, 16-4-2000, pp. 8-12. 
-NADEL, S.F. (1974, or. 1951): Fundamentos de Antropología Social. Madrid: 
FCE. 
-OMOHUNDRO, J.T. (1998) Career advice for undergraduates. General 
Anthropology n.º 4(2), pp. 1-6. 
-ROSSI, I. E O´HIGGINS, E. (1981, or. 1980): Teorías de la cultura y métodos 
antropológicos. Barcelona: Anagrama. 
-SCHERURMAUN, E. (Comp.)(1996, or. 1975): Los Papalagi. Discurso de 
Tuiavii de Tiavea. Barcelona: Integral. 
-TUAVII (1997, or. 1929): Papalagui: Discursos de Tuiavii, chefe da tribo de 
Tiavea nos Mares do Sul. Lisboa: Brochado. 
-WALLACE, W. L. (1980): La lógica de la ciencia de la sociología. Madrid: 
Alianza. 
 
SÍTIOS EM INTERNET 
http://www.antropologi.info/links/Main/Journals (Revistas de antropologia de 
acceso livre) 
http://www.aaanet.org/publications/anthrosource/ (Revistas de antropologia 
certificadas pela American Anthropological Association) 
http://www.easaonline.org (Associação de Antropologos Europeus) 
http://www.fflch.usp.br/da/vagner/antropo.html (Web do Prof. Dr. Vagner 
Gonçalves da Silva, Universidade de São Paulo) 
http://www.louisville.edu/a-s/anthro/whatis.htm (Departamento de Antropologia 
da Universidade de Louisville) 
http://www.ub.es/antropo/estrada/ASEstudiants.html (Departamento de 
Antropologia da Universidade de Barcelona) 
 
 
TEMA	2:	CULTURA	E	SOCIEDADE	
 
 
13 
© APONTAMENTOS DE ANTROPOLOGIA SOCIOCULTURAL 2011-2012- Prof. Dr. Xerardo 
Pereiro – Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) - antropólogo- Correio 
electrónico: xperez@utad.pt Web: www.utad.pt/~xperez/ 
 
TEMA 2: CULTURA E SOCIEDADE 
 
Objectivos: 
-Que o aluno compreenda a noção de cultura e a sua interligação com o social. 
-Que o aluno se familiarize com os conteúdos conceituais e as dinâmicas das 
culturas. 
-Dialogar com a turma e colocar a questão nas suas mentes. 
-Problematizar os conceitos com exemplos etnográficos. 
-Debates sobre as definições de cultura 
 
Guião: 
2.1. Cultura e Sociedade 
2.2. A noção antropológica de cultura 
2.2.1. A cultura é aprendida 
2.2.2. A cultura é simbólica 
2.2.3. A cultura liga-se com a natureza 
2.2.4. A cultura é geral e específica 
2.2.5. A cultura inclui tudo 
2.2.6. A cultura é compartida 
2.2.7. A cultura está pautada 
2.2.8. A gente utiliza criativamente a cultura 
2.2.9. A cultura está em todas partes 
2.3. Cultura material e imaterial 
2.4. A noção sociológica e a noção estética do conceito de cultura 
2.5. Os conteúdos do conceito antropológico de cultura 
2.6. Os universais da cultura 
2.7. A mudança cultural 
2.8. A mudança social 
Bibliografia 
Sítios em Internet 
 
 
2.1. CULTURA E SOCIEDADE 
 
“As pessoas querem cultura, delimitada, reificada, essencializada e atemporal, 
algo que hoje em dia as Ciências Sociais rejeitam em geral” (Sahlins, 1999: 
399). 
 
A antropologia, enquanto ciência social e humana que é, estuda o ser humano 
como um animal social e cultural. Cultura e Sociedade são palavras sinónimas 
na fala: “Pertencemos à sociedade portuguesa”, “vivemos dentro da cultura 
portuguesa”. Mas os científicos sociais tentam definir de uma maneira mais 
exacta, porque é preciso ter conceitos afinados para analisar correctamente os 
fenómenos sociais e culturais. Em realidade não são sinónimos, pois dentro de 
uma sociedade podem coexistir diversas culturas. Portanto podem entrar em 
conflito sociedade e cultura. 
TEMA	2:	CULTURA	E	SOCIEDADE	
 
 
14 
 
SOCIEDADE 
Há um consenso á hora de considerar a sociedade como “um grupo de 
pessoas”, “que interligam entre si” e “que estão organizados e integrados numa 
totalidade” para atingir algum objectivo comum. No interior de uma sociedade 
podem coexistir e existem varias culturas e subculturas. A diversidade cultural 
é cada vez mais inerente a todas as sociedades devido ao aumento dos 
contactos interculturais. Sócrates (in Carrithiers, 1995: 13) já se perguntava 
cómo devemos viver e a antropologia faz uma pergunta semelhante: como 
viver juntos?. De aí que o conhecimento da diversidade cultural seja um bem 
por ele próprio. A Sociedade está organizada através de um sistema. 
 
RELAÇÕES SOCIAIS 
As relações sociais são tipos de acção pautada, e os antropólogos sociais 
estão interessados nas pautas de interacção social que existem no interior dos 
grupos, pelos papéis sociais (expectativas de conduta dos indivíduos que 
realizam alguma tarefa) e a estrutura social (a ordenação dos componentes ou 
grupos de cada sociedade). As pessoas fazem coisas com, para e em relação 
com outras pessoas. A estrutura social é um quadro para a acção (Firth, 1964: 
35). 
 
CULTURA → Modo de vida (Linton, 1945: 30): pensar, dizer, fazer, fabricar 
Cultura é um dos conceitos mais difíciles de definir no vocabulário 
antropológico. Em 1871, o antropólogo E.B. Tylor (1975) definiu a cultura como: 
“esse todo complexo que incluí conhecimentos, crenças, arte, moral, lei, 
costumes e toda a série de capacidades e hábitos que o Homem adquire 
enquanto que membro de uma sociedade dada”. Esta definição, criada no 
século XIX e à qual sempre olhamos como referência, trata das qualidades que 
temos os humanos enquanto membros de uma sociedade: 
 -Cultura não material (“Ideofacto”): crenças, normas e valores. São os 
princípios acordados de convivência. 
 -Cultura material (“Artefacto”): tecnologia. São as técnicas de 
sobrevivência. 
Mas estas qualidades não são inatas (biológicamente herdadas), porém são 
adquiridas como parte do crescimento e desenvolvimento de uma determinada 
cultura. 
 
HOLISMO 
Na actualidade é próprio dos antropólogos tentar explicar cada elemento da 
cultura concreta pela sua relação com os outros. É esta perspectiva 
denominada “holística”, pois intenta ligar os aspectos culturais e os aspectos 
sociais, uns são incompletos sem os outros e ao revés. Acontece que os 
antropólogos socioculturais podem salientar alguns aspectos mais do que os 
outros, porém na realidade os valores e as crenças são inseparáveis da 
estrutura social e a organização social. Marcel Mauss (1988: 200) chamava a 
isto “facto social total” ou “geral”, porque põe em movimento a totalidade da 
sociedade e das suas instituições. Estes fenómenos são, a um tempo, 
jurídicos, económicos, religiosos, estéticos, morfológicos, sociais, etc. 
 
TEMA	2:	CULTURA	E	SOCIEDADE	
 
 
15 
Exemplo: Um operário de uma fábrica de Verim, no fim do seu trabalho saia 
dela em bicicleta, caminho de Chaves era parado e inspeccionado por um 
guarda em Feces, mas como não levava outra coisa nela, deixavam-no passar, 
assim durante várias semanas, até que se descobriu que o que roubava eram 
bicicletas. O guarda só olhava uma parte, não o todo. 
 
 
 
↔ Parentesco ↔ ↔ Economia ↔ ↔ Organização social ↔
 
↨ 
 
ANTROPOLOGIA 
 
 
↨ 
↔ Política ↔ ↔ Identidades ↔ ↔ Meio ambiente ↔ 
 
 
 
2.2. A NOÇÃO ANTROPOLÓGICA DE CULTURA 
Numa obra dos antropólos Alfred Kroeber e C. Kluckhohn (1963) foram 
reunidas 164 definições do conceito de cultura. Mais recentemente o 
antropólogo brasileiro Roque de Barros Laraia (2009) e o antropólogo espanhol 
Ángel Díaz de Rada (2010) realizaram reflexões profundas sobre este conceito 
tão complexo.Apresentamos neste ponto o que têm em comum estas definições e as 
características da noção antropológica de cultura. Vamos analisar agora 
algumas definições que representam a diversidade e a complexidade deste 
conceito e que nos podem ajudar a entender melhor as características da 
noção antropológica de cultura: 
 
E.B. TYLOR (1975, or. 1871) 
“A cultura ou civilização, num sentido etnográfico alargado, é aquele tudo complexo 
que inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, a lei, os costumes e qualquer 
outros hábitos e capacidades adquiridos pelo homem em quanto que membro da 
sociedade” (Tylor, 1975: 29). 
 
F. BOAS (1930) 
"La cultura incluye todas las manifestaciones de los hábitos sociales de una 
comunidad, las reacciones del individuo en la medida en que se ven afectadas por las 
costumbres del grupo en que vive, y los productos de las actividades humanas en la 
medida en que se ven determinadas por dichas costumbres” (Boas, 1930:74; citada 
por Kahn, 1975:14). 
 
B. MALINOWSKI (1931) 
"Esta herencia social es el concepto clave de la antropología cultural, la otra rama del 
estudio comparativo del hombre. Normalmente se la denomina cultura en la moderna 
antropología y en las ciencias sociales. (...) La cultura incluye los artefactos, bienes, 
procedimientos técnicos, ideas, hábitos y valores heredados. La organización social no 
puede comprenderse verdaderamente excepto como una parte de la cultura" 
(Malinowski, citada por Kahn, 1975:85). 
 
W.H. GOODENOUGH (1957) 
TEMA	2:	CULTURA	E	SOCIEDADE	
 
 
16 
“La cultura de una sociedad consiste en todo aquello que conoce o cree con el fin de 
operar de una manera aceptable sobre sus miembros. La cultura no es un fenómeno 
material: no consiste en cosas, gente, conducta o emociones. Es más bien una 
organización de todo eso. Es la forma de las cosas que la gente tiene en su mente, 
sus modelos de percibirlas, de relacionarlas o de interpretarlas” (Goodenough, 
1957:167; citada por Keesing, 1995: 56). 
 
C. GEERTZ (1966) 
"La cultura se comprende mejor no como complejos de esquemas concretos de 
conducta —costumbres, usanzas, tradiciones, conjuntos de hábitos—, como ha 
ocurrido en general hasta ahora, sino como una serie de mecanismos de control —
planes, recetas, fórmulas, reglas, instrucciones (lo que los ingenieros de computación 
llaman "programas")— que gobiernan la conducta" (Geertz, 1987: 51). 
 
L.R. BINFORD, L.R. (1968) 
“Cultura é todo aquele modelo, com formas que não estão baixo o controlo genético 
directo... que serve para ajustar aos indivíduos e os grupos nas suas comunidades 
ecológicas”, (Binford, 1968: 323; citada por Keesing, 1995: 54). 
 
R. CRESSWELL, R. (1975) 
"[A cultura é] a configuração particular que adopta cada sociedade humana não só 
para regular as relações entre os factos tecno –económicos, a organização social e as 
ideologias, porém também para transmitir os seus conhecimentos de geração em 
geração (Cresswell, 1975: 32). 
 
M. HARRIS (1981) 
"La cultura alude al cuerpo de tradiciones socialmente adquiridas que aparecen 
de forma rudimentaria entre los mamíferos, especialmente entre los primates. 
Cuando los antropólogos hablan de una cultura humana normalmente se 
refieren al estilo de vida total, socialmente adquirido, de un grupo de personas, 
que incluye los modos pautados y recurrentes de pensar, sentir y actuar" 
(Harris, 1982:123). 
 
A. GIDDENS (1989) 
"Cultura se refiere a los valores que comparten los miembros de un grupo dado, a las 
normas que pactan y a los bienes materiales que producen. Los valores son ideales 
abstractos, mientras que las normas son principios definidos o reglas que las personas 
deben cumplir" (Giddens, 1991:65). 
 
P. WILLIS (2003) 
“... es un sistema relativamente coherente de acciones materiales y de sistemas 
simbólicos engranados que, con respecto a cada área, tienen sus propias prácticas y 
objetivos; y que estas prácticas y objetivos constituyen el medio ordinario de la vida 
social” (Willis, 2003: 448). 
 
N. GARCÍA CANCLINI (2004) 
`Cultura como o conjunto de processos sociais de significação, de produção, 
circulação e consumo da significação na vida social´ (García Canclini, 2004: 34). 
 
 
ANGEL DÍAZ DE RADA 
TEMA	2:	CULTURA	E	SOCIEDADE	
 
 
17 
`A cultura é a forma de vida social, o conjunto de regras das relações sociais, o 
conjunto de regras da acção social, a descrição dessas regras, as regras para 
relacionar-nos em cada situação concreta, um discurso ´(Díaz de Rada, 2010: 19). 
 
 
Características da noção antropológica de cultura 
 
2.2.1. A Cultura é aprendida 
A definição de Tylor incide nesta ideia fundamental, a cultura não é adquirida 
através da herança biológica, porém é adquirida pela aprendizagem 
(consciente e inconsciente) numa sociedade concreta com uma tradição 
cultural específica. O processo através do qual as crianças aprendem a sua 
cultura é denominado inculturação. Ainda que as crianças não são uma 
página em branco na qual escrever, a inculturação é um processo de 
interiorização dos costumes do grupo, até o ponto de fazer estes como 
próprios. Este processo é fundamental para a sobrevivência dos grupos 
humanos, assim por exemplo os esquimos tem de aprender a proteger-se do 
frio. O processo de inculturação produz-se fisicamente (gestos, formas de 
estar, de comer...), afectiva e sentimentalmente (por causa da acção de reforço 
ou repressão da nossa cultura) e também intelectualmente (esquemas mentais 
de percepção do mundo). Os agentes de inculturação são a família, as 
amizades, a escola, os media, os grupos de associação, etc.. Eles têm como 
missão introduzir o indivíduo na sua sociedade através da aprendizagem da 
cultura. A cultura organiza-se em cosmologias, isto é, em teorias sobre a ordem 
do mundo como um todo; a cosmologia é uma forma de classificar o mundo e 
definir os seus princípios. 
Segundo Margaret Mead (2001), os tipos de aprendizagem das culturas 
podem classificar-se em: 
 
a) Culturas pós-figurativas: Aquelas nas quais os filhos aprendem com os 
pais e o futuro dos filhos é o passado dos pais. 
b) Culturas pré-figurativas: Aquelas nas quais os adultos aprendem com os 
filhos e os mais novos. 
c) Culturas co-figurativas: Aquelas nas quais todos aprendem com todos. 
 
Alguns animais (i.e.: primates) também têm alguma capacidade de 
aprendizagem, incluso para distinguir plantas, mas a diferença dos humanos, 
os animais não podem transmitir culturalmente a informação cultural 
acumulada, nem podem registar (ex.: escritura,...) codificadamente a 
informação cultural. 
 
Exemplo etnográfico: Os macacos de Kosima (Japão): 
 
Em 1953 biólogos japoneses realizaram uma experimentação com macacos 
na praia de Kosima. Enviaram por mar batatas-doces para a praia. Ao chegar 
as batatas eram comidas pelos macacos, mas apanhavam salitre e um 
macaco começou a lavar e limpar de salitre as batatas. Cinco anos depois 
todo o grupo tinha aprendido o comportamento de limpar a batata antes de 
comer. Criou-se assim o conceito de “cultura animal”. 
 
TEMA	2:	CULTURA	E	SOCIEDADE	
 
 
18 
A cultura é informação herdada através da aprendizagem social, portanto 
diferente da “natura” (herdada geneticamente) e com uma especificidade 
baseada no cérebro que é a linguagem. A linguagem permite aos humanos 
articular, transmitir e acumular informação aprendida como nenhuma outra 
espécie pode fazer. 
Em relação com esta característica da noção de cultura, o antropólogo 
Clifford Geertz (1987) define a cultura como ideias baseadas na aprendizagem 
cultural de símbolos. A gente converte em seu um sistema previamente 
estabelecido de significados e de símbolos que utilizam para definir o seu 
mundo, expressar os seus sentimentos e fazer os seus juízos. Este sistema 
guia o seu comportamento e as suas percepções ao longo da sua vida. A 
cultura transmite-se através da observação, da imitação, da escuta, etc.; nesse 
processo de aprendizagem fazemos consciência do que a nossa culturadefine 
como bom e mau (princípios morais). Mas a cultura também se aprende de 
maneira inconsciente, é o caso das noções culturais a manter com as pessoas 
quando falam entre si, a distância da conversa e a linguagem não verbal. Por 
exemplo, os latinos mantêm menos distância nas conversas pela sua tradição 
cultural. Neste sentido, para Clifford Geertz (1987) a cultura é: 
 
 Uma fonte ou programa extrasomático de informação. 
 Um mecanismo de controlo extragenético. 
 Um sistema de significados. 
 Um “ethos”. 
 Um conjunto de símbolos que veiculam a cultura. 
 Um conjunto de textos que dizem algo sobre algo (interpretações de 
interpretações). 
 
No sentido gertziano a cultura é um conjunto de “modelos de” representação do 
mundo e da realidade, mas também um conjunto de “modelos para” actuar no 
mundo (padrões, guias para a acção, o que está bem e o que está mau). 
Clifford Geertz é muito ontológico e pouco fenomenológico, esquece que as 
formas culturais não são só pautas de significado, senão que estão inseridas 
em relações de poder e conflitos. 
Segundo o antropólogo Carmelo Lisón Tolosana (1974: 11), podemos 
entender o ethos (Weltanschauung) como os sistemas de valores e normas 
morais, aquilo que a gente pensa que deve ser, os estilos e modos de vida 
aprovados em um grupo humano, os hábitos emotivos, as atitudes, tendências, 
preferências e fins que conferem unidade e sentido à vida, os aspectos morais, 
religiosos e estéticos do grupo. O ethos era definido por Gregory Bateson como 
os comportamentos específicos que expressavam um sistema padrão de 
atitudes emotivas (Bateson, 1990: 286). 
Face ao ethos, o pathos representaria as emoções e as paixões, os 
sentimentos que se expressam nas acções humanas. A estes dois conceitos, 
seguindo o esquema aristoteliano do livro segundo da “Arte Retórica”, haveria 
que acrescentar o logos, isto é, a razão e argumentação que o ser humano 
utiliza. 
 
2.2.2. A Cultura é simbólica 
O pensamento simbólico é exclusivamente humano. A capacidade para criar 
símbolos é só humana. Que é um símbolo? Um símbolo é aquilo que 
TEMA	2:	CULTURA	E	SOCIEDADE	
 
 
19 
representa uma coisa, está em lugar de algo, e esta conexão pode ser 
simbolizada de maneira diferente segundo as culturas: 
 
Português Francês Inglês Swahili Espanhol 
Cão Chien dog Mbwa Perro 
 
Por tanto de alguma maneira esta associação é arbitrária e convencional, 
socialmente aceite e compartida. O símbolo serve para veicular uma ideia ou 
um significado que tem um significado social (sentido atribuído e intencionado 
compartido socialmente). 
 A diferença do resto dos seres vivos, que se comunicam de forma 
diádica (estímulo-resposta), os humanos estabelecem comunicação de forma 
triádica por meio de signos e símbolos que são abertos, arbitrários, 
convencionais e que requerem descodificação (emisor-mensagem-receptor) e 
tradução. 
 
2.2.3. A Cultura liga-se com a natureza 
O debate sobre o binómio natureza-cultura é histórico. Não podemos negar a 
importância da cultura em todos os aspectos da vida humana, mas hoje a 
ciência tem demonstrado que existem mecanismos inatos complexos que 
permitem a inculturação, portanto cultura e natureza não se excluem (Gómez 
Pin, 2005). E ainda que a natureza tenha as suas regras próprias, os seres 
humanos, enquanto seres culturais, regulamentamos e pautamos o seu uso. 
Observemos um exemplo para compreender estas características: 
 
“Quando eu cheguei a umas colónias de verão á beira do mar eram as 13:30 
horas, e tinha desejos de tomar um banho nele, mas o regulamento das 
colónias não permitia tomar banho nessa hora; o mar é parte da natureza, mas 
estava submetido a uma ordenação cultural, os mares naturais não fecham ás 
13:30 horas, mas sim os mares culturais”. 
 
As pessoas têm que comer, sem embargo a cultura ensina-nos que, como e 
quando. A gente tem que defecar, mas não todos o fazem da mesma maneira 
(i.e.: Bolívia /Europa). A cultura, entendida como sistema de signos, é 
contraposta à natureza (Lévi-Strauss, 1982), ao biológico e ao inato. O ser 
humano é um ser biológico, mas o que o faz completamente humano é a 
cultura, especificamente humana e constitutiva do humano. A biologia é uma 
condição absolutamente necessária para a Cultura, mas insuficiente, incapaz 
de explicar as propriedades culturais do comportamento humano e as suas 
variações de um grupo a outro (Sahlins, 1990), de aí que possamos falar em 
certa autonomia, mas também em interdependência entre cultura e natureza. 
 
CULTURA NATUREZA 
 Andar de bicicleta. 
 Fazer somas, ler, cultivar 
tomates, fritar ovos, etc. 
 Informação transmitida por 
aprendizagem social. 
 Respiração. 
 Circulação do sangue, etc. 
 Informação transmitida 
geneticamente. 
 
 
2.2.4. A Cultura é geral e específica (Cultura –Culturas) 
TEMA	2:	CULTURA	E	SOCIEDADE	
 
 
20 
Num sentido geral todos os humanos temos “Cultura” (“universal humano”), 
mas num sentido particular a “cultura” descreve um conjunto de diferenças de 
um grupo humano específico com outros. 
 A humanidade partilha a capacidade para a Cultura (todo o criado pelos 
seres humanos), é este um carácter inclusivo; porém a gente vive em culturas 
particulares (modos de vida específicos e diferentes) com certa 
homogeneidade, uniformidade e harmonia internas, mas também com 
condicionantes ecológicos e socio-históricos particulares. 
 
2.2.5. A cultura inclui todo 
Para os antropólogos ter cultura não é a mesma coisa que ter formação 
académica (cultivo intelectual), refinamento, sofisticação e apreciação das 
belas artes... Todo o mundo tem cultura no sentido antropológico do termo. É 
assim como a antropologia tem uma perspectiva holística que presta atenção a 
todas as manifestações e expressões culturais. 
 
2.2.6. A cultura é partilhada 
A cultura é partilhada pelas pessoas enquanto membros de grupos. A cultura é 
aprendida socialmente, une às pessoas, está expressada em normas e valores, 
e também é intermediária no sistema da personalidade pelos actores sociais. 
Assim, a cultura converte-se num sinal de identidade grupal. No interior duma 
cultura a distribuição dos bens imateriais pode ser tão assimétrica e desigual 
como a dos bens materiais. 
 
2.2.7. A cultura está pautada 
A cultura é aprendida normativamente. Quer dizer que está formada por umas 
regras ou normas integradas. Dispõe de um conjunto de valores centrais, 
chaves ou básicos organizados num sistema. A conduta humana governa-se 
por padrões culturais, mais do que por respostas inatas. Podemos afirmar que 
as pessoas temos um “piloto” (a cultura) que nos orienta nas nossas vidas. 
 
` A cultura é uma pauta ou um conjunto de padrões coerentes de pensamento 
e acção, uma organização coerente da conduta que inclui a totalidade duma 
sociedade. A cultura é hereditária e aprendida, não genética; tende à 
integração e à coerência, constitui configurações articuladas, é plástica e 
realiza a função de atar e unir aos seres humanos ´. 
(Benedict, 1971). 
 
2.2.8. A gente utiliza criativamente a cultura 
As regras culturais afirmam que fazer e como, as pessoas interiorizam essas 
regras ou normas, mas não sempre seguimos o seu ditado. As pessoas podem 
manipular e interpretar a mesma regra de maneiras diferentes, utilizando 
criativamente a sua cultura, em vez de segui-la cegamente (Ex.: Transgressão 
dos limites de velocidade). 
 Neste ponto podemos distinguir entre o nível ideal da cultura (o que a 
gente deveria fazer e o que diz que faz) e o nível real da cultura (o que fazem 
realmente no seu comportamento observável). Mas não por isso o nível ideal 
deixa de pertencer à realidade. 
 Desde este ponto de vista podemos falar da cultura como produtora de 
mudança e conflito, mas também como “caixote de ferramentas” (“tool kit”) de 
TEMA	2:	CULTURA	E	SOCIEDADE	
 
 
21 
valor estratégico para a acção social (Swidler, 1986). Portanto, a cultura 
podemos pensa-la como algo externo que condiciona as nossas vidasou como 
algo que como sujeitos (pessoas) criamos em colectividades, isto é como um 
processo e um conjunto de estratégias. 
 Nesta linha podemos afirmar como a cultura é uma invenção social, isto 
é, uma construção histórica constante (Wagner, 1975), portanto não é uma 
essência ou uma coisa. 
 
2.2.9. A cultura está em todas as partes 
 
“Comprei um tapete persa made in Taiwan numa loja de chineses da Suíça” 
 
A globalização faz questão sobre a relação entre cultura e território, criando 
uma nova cartografia cultural. Cai por si própria a ideia tradicional de cultura 
como comunidade fechada, de acordo com a qual cada indivíduo só pode 
pertencer a uma cultura. Hoje em dia o entre – cruzamento de culturas é uma 
realidade. A ficção duma cultura uniformemente partilhada pelos membros de 
um grupo é pouco útil em muitos casos. O conceito de cultura deve incluir 
heterogeneidade, mudança rápida, empréstimos culturais e circulações 
interculturais. O conceito de cultura acaba por fazer referência a 2 tipos de 
cultura: 
 
1. Ao conjunto de especificidades duma comunidade territorialmente 
delimitada. 
2. Aos processos de aprendizagem translocais. 
 
Hoje dissolvem-se muitas fronteiras entre culturas antes territorialmente 
delimitadas. É por isso que as culturas volvem-se mais porosas. Vivemos numa 
economia-mundo (Wallerstein, 1974) e a “a cultura está en todas partes” 
(Hannerz, 1998: 55). É o indivíduo quem escolhe o seu repertório cultural. Na 
actualidade podemos falar em sobremodernidade dos mundos 
contemporâneos (Augé, 1992) que se caracterizaria pelo seguinte: 
 
a) Uma transformação mundial que alterou os conceitos de espaço, alteridade, 
identidade, etc. que a antropologia vinha utilizando. 
b) Excesso de Tempo (aceleração do tempo e encolhimento do espaço). 
c) Excesso de Espaço (acessibilidade total, deslocalização do social, não 
lugares). 
d) Excesso de Indivíduo (tendência à individualização e perca das narrativas 
colectivas). 
 
Hoje, o local intensifica a sua inter - conexão com o global a partir do marco do 
Mercado, do Estado, dos movimentos e das formas de vida (Hannerz, 1998). 
Robertson (1995) chega a falar em glocal como a síntese relacional entre o 
local e o global, ultrapassando assim esta dicotomia. Esta forma de caracterizar 
a noção de cultura leva a alguns antropólogos a estudar as dinâmicas de 
viagem e não só as de residência, e de ai que se sublinhem as “zonas de 
contacto” (Clifford, 1999). Outros falam em culturas híbridas (García Canclini, 
1989), interligando assim estrutura e processo, mas também salientando o 
papel do agente social na dinâmica entre estrutura e acção. Assistimos hoje a 
TEMA	2:	CULTURA	E	SOCIEDADE	
 
 
22 
uma mudança da afirmação de identidades culturais diferenciadas para a 
afirmação da interculturalidade. Hoje, corremos o risco de que o conceito de 
cultura seja utilizado como uma forma de racismo (Benn Michaels, 1998), já 
que substitui muitas vezes a biologia como argumento base da distinção entre 
os grupos humanos, mas não é menos essencialista por isso. Podemos afirmar 
o seguinte: 
 
“O indivíduo é um prisioneiro da sua cultura, mas não precisa de ser a sua 
vítima” (Ferguson, 1987: 12) 
 
Em síntese podemos afirmar o seguinte da noção antropológica de cultura: 
 
 O conceito antropológico de cultura afirma a dignidade equivalente de 
todas as culturas. 
 O conceito antropológico de cultura tenta diminuir o etnocentrismo e o 
elitismo do ocidentalismo. 
 O respeito às diferenças culturais deve ser a base para uma sociedade 
justa (Kuper, 2001: 14). 
 O conceito antropológico de cultura defende o carácter local do 
conhecimento. 
 Muda a maneira de olhar a realidade (uma diversidade criativa). 
 O significado antropológico de cultura como modo de vida global nega a 
simples redução da cultura à actividades ligadas às belas artes. 
 O significado antropológico de cultura é como o açúcar diluído em água. 
 
2.3. A CULTURA MATERIAL E IMATERIAL 
 
“Para explicarnos a nosotros mismos nuestras ideas, necesitamos fijarlas en 
las cosas materiales que las simbolizan” (Durkheim, 1993: 375) 
 
A cultura é uma característica especificamente humana que tem duas 
componentes: 
1. Uma componente mental: produtos da actividade psíquica ora nos seus 
aspectos cognitivos ora nos afectivos, significados, valores e normas. 
2. Uma componente material: artefactos e tecnologia. 
 
Porém, esta divisão tem motivado alguns debates que se podem resumir na 
seguinte questão: Devem os artefactos e a tecnologia ser considerados como 
parte da cultura?. Alguns antropólogos como Robert Redfield, Ralph Linton, 
Murdock e outros têm identificado a cultura só com os aspectos cognitivos e 
mentais: ideias, visão do mundo, códigos culturais. Estes antropólogos 
consideraram a cultura material como um produto da cultura e não cultura em 
si mesma. 
Esta postura é difícil de defender porque a cultura material (exemplo: os 
avances tecnológicos) exercem uma influência muito grande nos aspectos 
cognitivos e mentais, ao mesmo tempo que geram novos valores e crenças. A 
tecnologia permite que os humanos se adaptem ao nosso contorno, do mesmo 
modo que os valores e as ideias. As catedrais medievais e as pirâmides 
egípcias reflectem determinados interesses, fins e ideias da cultura na qual 
nasceram. São a manifestação de ideias religiosas, políticas e científicas. Os 
TEMA	2:	CULTURA	E	SOCIEDADE	
 
 
23 
dois aspectos (materiais e não materiais) devem ser considerados como partes 
integrantes da cultura, os dois estão estreitamente ligados. Maurice Godelier 
(1982) chegou a afirmar que todo o material da cultura se simboliza e que todo 
o simbólico da cultura se pode materializar. 
Marshall Sahlins (1988) destaca como o carácter constitutivo da cultura 
invalida a distinção clássica entre cultura material e imaterial, plano económico 
e cultural. Ele integra os dois pólos, pois os seres humanos organizam a 
produção material da sua existência física como um processo significativo que 
é o seu modo de vida. Todo o que os humanos fazem está cheio de sentido e 
de significado. Por exemplo, cortar uma árvore (para lenha, para construir uma 
canoa, para criar uma escultura, para fazer pasta de papel) pode significar 
modos culturais específicos. O valor de uso não é menos simbólico ou menos 
arbitrário que o valor da mercadoria. Assim o sublinha Sahlins: 
 
“As calças são produzidas para os homens e as saias para as mulheres em 
virtude das suas correlações num sistema simbólico, antes que pela natureza 
do objecto per se, ou pela sua capacidade de satisfazer uma necessidade 
material...” (Sahlins, 1988 ). 
 
Exemplo etnográfico: Os bosquimanos do deserto do Kalahari, cazadores-
recolectores, mostram um carácter integrador na caça de animais, pois as 
técnicas e estratégias de caça estão unidas aos rituais religiosos. Dançavam e 
entravam em trance para superar as ansiedades da sua pobre tecnologia. É 
assim como os elementos materiais e não materiais apoiam-se como 
elementos inseparáveis da adaptação dos bosquimanos ao seu meio. Todos 
eles contribuem á sobrevivência material do grupo humano. 
 
2.4. A NOÇÃO SOCIOLÓGICA E A NOÇÃO ESTÉTICA DO CONCEITO DE 
CULTURA 
 
“No sé cuantas veces he deseado no haber oído nunca la maldita palabra” 
(Raymond Willians, citado em Díaz de Rada, 2010: 17). 
 
Raymond Willians (1976) distingue três maneiras de entender e utilizar o 
conceito de cultura: 
 
a) Antropológica. 
b) Sociológica. 
c) Estética. 
 
Se a perspectiva antropológica de cultura entende a cultura como impregnada 
em tudo, o sociológico entende a cultura como um campo de acção específico 
juntamente com outros –economia, política-, que estão estratificados de acordo 
com determinados critérios. Se a perspectiva antropológica de cultura entende 
a cultura como o açúcar diluído, o conceito sociológico de cultura é o pacote de 
açúcar sem dissolver. O conceito sociológico de cultura entende esta como um 
campo deconhecimento dos grupos humanos. A noção sociológica de cultura 
fala da cultura como produção e consumo de actividades culturais, daí a sua 
ligação com as políticas da cultura. Deste ponto de vista a cultura passa a ser 
entendida como espectáculo, como política de cheque, como produção e 
TEMA	2:	CULTURA	E	SOCIEDADE	
 
 
24 
consumo. Para a noção antropológica a cultura é um processo resultante da 
participação e da criação colectiva, não é um assunto de artistas e intelectuais, 
mas para a noção sociológica a cultura é uma “indústria cultural”. Os primeiros 
a utilizar este conceito foram Adorno e Horkheimer (1979) em 1947. Segundo 
estes teóricos da Escola de Frankfurt, os produtos culturais passaram a ser 
produzidos da mesma maneira que outros bens de consumo e também 
consumidos pelas massas. Nesta linha, Gilles Lipovetsky (2004) ao analisar o 
passo das sociedades modernas às hipermodernas afirma que nos anos 1980 
as sociedades desenvolvidas eram sociedades vazias e hiperconsumistas, pois 
à diferença da cultura clássica, que tinha como fim elevar o ser humano, as 
indústrias culturais hiperconsumistas tentam distrair este. 
Já o uso estético do conceito de cultura descreve actividades intelectuais 
e artísticas como por exemplo a música, a literatura, o teatro, o cinema, a 
pintura, a escultura e a arquitectura. Este conceito define a criação artística 
como forma de cultivo humano do espírito. É sinónimo de “Belas Artes” e exige 
niveis de instrução educativa formal. Por extensão pensa-se que uma pessoa 
que conhece e pratica estas manifestações artísticas tem que ser diferente da 
gente comum, atribuindo-lhe a categoria de culto, em oposição ao “inculto” ou 
de “pouca cultura”. Portanto, a noção estética de cultura entende-se como “alta 
cultura” (ex.: ir à ópera), a produção cultural de uma minoria para uma elite 
letrada de iniciados. Esta perspectiva elitista, promovida na Europa refinada do 
século XIX, é criticada pela noção antropológica de cultura, pois confunde 
niveis de instrução com conhecimento e capacidade criativa, refinamento com 
habilidades culturais para dar resposta aos problemas quotidianos. 
 Contudo é certo, que hoje quebram-se as distinções entre “alta cultura” e 
“baixa cultura”, cultura de elite e cultura de massas, cultura culta e cultura 
popular, ficando os limites muito ambíguos. Isto não significa que não devamos 
programar alternativas de produção cultural críticas e moralmente defendíveis. 
Por outro lado, importa destacar que a cultura lixo (Bouza, 2001), muitas vezes 
promovida pelos “mass média”, já não é popular (do povo), mas para o povo 
(de massas, mediática), o que é muito criticável pela sua falta de ética e pela 
falta de humanismo. Verifica-se hoje um processo de mercantilização e 
politização da cultura que deve ser explorado e reflectido na sua complexidade. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
2.5. OS CONTEÚDOS DO CONCEITO ANTROPOLÓGICO DE CULTURA 
NOÇÃO DE
CULTURA
SOCIOLÓGICA 
ANTROPOLÓGICA ESTÉTICA 
TEMA	2:	CULTURA	E	SOCIEDADE	
 
 
25 
Alguns elementos integrantes da noção de cultura são: as crenças, as ideias, 
os valores, as normas e os signos culturais. Pela sua grande importância 
debrucemo-nos um momento sobre deles. 
 
As crenças e as ideias 
Em primeiro lugar, qual é a diferença entre uma crença e uma ideia? As 
crenças são definições sociais sobre o mundo e a vida. Assim o afirmou o 
filósofo Ortega y Gasset: 
 
“En efecto, en la creencia se está, y la ocurrencia se tiene y se sostiene. Pero 
la creencia es quien nos tiene y sostiene a nosotros” (Ortega y Gasset, 1968: 
17). 
 
Portanto, as ideias têm-se, nas crenças estamos. As crenças não podem 
ser submetidas á proba de verificação com os factos, pois é uma verdade 
indiscutível e sem dúvidas para quem a defende. No momento em que uma 
crença é considerada susceptível de confrontar com os factos passa a 
converter-se numa ideia. 
As ideias são formas de sabedoria susceptíveis de contrastar-se 
empiricamente com os factos observáveis, podemos comprovar a sua verdade 
ou falsidade. 
Tanto as ideias como as crenças são modos cognitivos de apreender a 
realidade, de conhece-la. Nos processos de mudança há ideias e crenças que 
perdem terreno em benefício de outras. As ideias podem converter-se em 
crenças por repetição ou por convencimento da ideia, cristalizando e 
internando-se na mente das pessoas. Por exemplo, na auto-estrada não vai 
circular nenhum carro em sentido contrário pela nossa via. 
Dentro de cada cultura as crenças tendem a formar um sistema 
relativamente coerente, com reforços mútuos, isto não quer dizer que não haja 
contradições internas e rupturas, só que há uma tendência à coerência interna. 
 As ideias são cada vez mais reconhecidas como elemento fundamental 
da cultura, assim temos como grupos humanos como os ianomami do 
Amazonas reivindicam direitos culturais sobre as terras, as células e o seu 
ADN mas também sobre a propriedade intelectual das ideias. Igualmente uma 
parte dos membros do Congresso Geral da Cultura Kuna (Panamá) rejeita a 
ideia de que a sua cultura possa ser candidatada a património da humanidade, 
pois pensa-se que a sua cultura é deles e não de toda a humanidade. 
 
Os valores 
Para a antropologia, os valores são juízos de desejabilidade e aceitabilidade, 
isto é, aquilo que as pessoas estimam como mais importante. Os valores são 
princípios morais incutidos na vida das pessoas. Os valores partilhados geram 
identidades comuns e orientam a vida social (Sanmartín, 1999). 
Do mesmo modo também existem contravalores correlativos, assim por 
exemplo: 
 
Igualdade Desigualdade 
Solidariedade Individualismo 
Liberdade Dependência 
 
TEMA	2:	CULTURA	E	SOCIEDADE	
 
 
26 
Os juízos de rejeitamento e oposição expressam também valores de uma 
maneira não explícita. Eles são princípios ou critérios que definem o que é bom 
e mau para um determinado grupo. A partir destes princípios básicos ou 
valores geram-se um conjunto ideativo e normativo pelo qual se guia, orienta e 
controla a conduta dos indivíduos. Mas igualmente, os valores também são 
criadores de possibilidades e de novas realidades. 
 Os valores não são qualidades das coisas, porém são relacionais, são 
valores para alguém. São um critério de selecção da acção. Os valores que 
mantêm um grupo social tendem a formar um sistema coerente. Este é um 
sistema de preferências (Sanmartín, 1999: 4). Há uma axiologia ou hierarquia 
de valores dentro da conexão entre os mesmos. Exemplo: Individualismo na 
cultura norte-americana, conectado com o esforço e o êxito. 
 
As normas culturais 
As normas são regras para comportar-se de um modo determinado, e indicam 
o que especificamente devem ou não devem fazer as pessoas em situações 
sociais. Estas normas sociais são diferentes das leis jurídicas, ainda que as leis 
são parte também destas normas sociais. As normas sociais estão inspiradas 
em valores. Não estão formalizadas juridicamente mas ainda assim mantêm 
um poder coercitivo. Na sua base estão um conjunto de valores articulados 
socialmente, que orientam e guiam a acção humana. 
 
Os símbolos 
A cultura, entendida como comunicação, conforma-se através da criação e 
utilização de símbolos culturais. Estes incluem sinais, signos e símbolos. Os 
sinais (sinais de trânsito) são símbolos que incitam, convidam ou obrigam a 
uma acção (STOP). Os indicadores (exemplo: o fume, que indica a existência 
de lume) não obrigam a uma resposta imediata como os sinais. Os signos são 
aqueles símbolos com um significante que representa um significado por uma 
associação ou analogia consciente e arbitrária (exemplo: cadeira=cadeira). Os 
símbolos apresentam uma relação metafórica ou metonímica entre o 
significante e o significado. Um símbolo é uma coisa que está em lugar de 
outra ou uma coisa que evoca e substitui a outra (exemplo: Vieira: 
Peregrinação a Santiago de Compostela) (O Pintor holandês O Bosco pintava 
conchas de mexilhões, ameixas, etc. junto comdesenhos de burros, galos ou 
cervos. As primeiras simbolizavam o sexo feminino, os segundos a sexualidade 
masculina. Tratava o pintor de expressar a través de símbolos a fornicação). 
 
Portanto, um símbolo requer de 3 coisas: 
1ª. Um significante. 
2ª. Um significado. 
3ª. A significação: Relação entre o significante e o significado. Esta relação é 
definida por um código, que deve ser conhecido e aprendido pelos sujeitos. 
 
Precisa também de 3 elementos: 
EMISSOR (Com um código de emissão baseado em símbolos)MENSAGEM 
(Com um código de descodificação)DESTINATÁRIO (Ser humano) 
 
Exemplo: O vestido. 
-Significados (mais além do evidente, banal ou superficial): 
TEMA	2:	CULTURA	E	SOCIEDADE	
 
 
27 
1. Protecção do clima. 
2. Hábito, adaptação ás normas e costumes pautadas num grupo humano 
(ex.: vestido de um homem, vestido de uma mulher, vestido de drag-queen). 
3. Adorno, sentido decorativo ou posta em cena da aparência ou imagem do 
eu. 
 
Pode haver uma pluralidade de significados ao descodificar a mensagem. Qual 
é que será o significado mais importante? A resposta é conforme os casos 
específicos e o contexto cultural. 
 
Outros conceitos básicos para melhor compreender a noção antropológica de 
cultura, desde uma perspectiva de produção histórica das relações sociais, são 
os seguintes: 
 
a) Ideologia (Williams, 1977). A ideologia é uma visão da realidade 
composta de ideias e valores organizados num sistema que trata de 
essa realidade e que tenta reproduzir ou transformar esta. Esta tentativa 
de reprodução ou de mudança não está isenta de lutas ideológicas e de 
conflitos. 
b) Outro conceito associado ao anterior é o de legitimação, que é uma 
proposição normativa utilizada no controlo social: 
 
“Por legitimação entende-se um conhecimento socialmente objectivado, que 
serve para justificar e explicar a ordem social. De outro modo, as 
legitimações são as respostas a qualquer pergunta sobre o por quê de cada 
solução institucional diferente... As legitimações não só lhe dizem à gente o 
que deve ser. Às vezes limitam-se a propor o que é.” (Berger, 1999: 52). 
 
c) Habitus (Bourdieu, 1980 ; 1988). O habitus é para Bourdieu (1980 : 88) 
o seguinte: 
 
“Sistemas de disposições duradouras e transponíveis, estruturas 
estruturadas predispostas a funcionar como estruturas estruturantes, quer 
dizer, enquanto princípios geradores e organizadores de práticas e de 
representações”. 
 
Assim o habitus é o que caracteriza uma classe ou um grupo social, 
materializa a memória colectiva e incorpora uma moral e uma visão do 
mundo naturalizada socialmente. É desde este ponto de vista um dispositivo 
para a acção, um conjunto de esquemas geradores de práticas e 
percepções que se expressam nos gostos, hábitos de consumo e nas 
representações da realidade. 
 
d) Capital simbólico (Bourdieu, 1999: 172). O capital simbólico é uma 
propriedade dos indivíduos, uma força, uma riqueza e um valor 
percebido, conhecido e reconhecido. Este capital detenta uma eficácia 
simbólica (Lévi-Strauss, 1969), uma espécie de força mágica que 
responde a umas expectativas colectivas e que geralmente não se 
questiona. Este capital, junto com outros como o económico, é 
necessário para a reprodução social. 
TEMA	2:	CULTURA	E	SOCIEDADE	
 
 
28 
e) Capital cultural (Bourdieu, 1999). O capital cultural é a capacidade para 
interpretar e compreender os códigos culturais. Esta capacidade está 
desigualmente distribuída entre as classes e os grupos sociais. Estes 
grupos lutam por obter poder cultural através do exercício dos “gostos” e 
procurando dividendos que afirmem o “correcto” e o “legítimo”. Através 
do capital cultural tenta-se justificar certa dominação. Assim o parque de 
“Asterix”, na França, nasce para combater o domínio da banda 
desenhada dos EUA e também de Eurodisney. 
 
2.6. OS UNIVERSAIS DA CULTURA 
Entre a diversidade de culturas é possível achar alguns traços comuns. Neste 
ponto, a antropologia não só estuda as diferenças como também as 
semelhanças entre os seres humanos. Não podemos ver as diferenças 
culturais como barreiras enfranqueáveis, porém como expressões da 
diversidade cultural humana em acção que se podem comunicar, traduzir e 
articular. Face ao relativismo mais absoluto que defende a incomunicabilidade 
entre culturas, adoptamos um certo universalismo que promove a compreensão 
do outro, um inventário do transcultural, do mestiço e do parentesco entre 
culturas (Balandier, 1993). 
 Neste sentido, alguns traços culturais existem em todas ou em quase 
todas as sociedades e denominam-se universais culturais, que são aqueles 
que distinguem os humanos das outras espécies: 
 
1. A unidade psíquica dos humanos. No sentido de que todos os humanos têm 
a mesma capacidade para a cultura. 
 
2. A linguagem. 
 
3. Viver em grupos sociais como a família e compartir alimentos. 
 
4. A exogamia e o tabu do incesto, regra que proíbe as relações sexuais e o 
casamento entre parentes próximos. 
 
Excepções ao tabu do incesto: 
 
Irmão com irmã nos casos da realeza de Egipto, Havaí e os Incas. Nestes 
casos o casamento exigia-se entre seres da linhagem porque casar com 
mortais era uma corrupção da divindade. Era também um meio de conservar a 
propriedade dentro da família. Cleopatra mandou matar o seu irmão de 12 
anos, logo de casar com ele, para depois casar com Júlio César e Marco 
António. 
 
-Middleton, R. (1962): “Brother-Sister and Father Daughter Marriage in Ancient 
Greece”, em American Sociological Review, vol. 27, pp. 603-611. Citado em 
Adamson Hoebel, A e Frost, E. L. (1984, or. 1976): Antropologia Cultural e 
Social. São Paulo: Cultrix, p. 179. 
 
 
5. O matrimónio, entendido como relação social estável e duradoura entre 
pessoas. 
TEMA	2:	CULTURA	E	SOCIEDADE	
 
 
29 
 
6. A divisão sexual do trabalho. 
 
7. A família. Esto não implica que seja igual em todas partes. 
 
8. O etnocentrismo cultural. O conceito de etnocentrismo foi criado pelo 
sociólogo William Graham Sumner, quem viveu entre 1840 e 1910 (Shone, 
2004). O etnocentrismo é uma tendência a aplicar os próprios valores culturais 
para julgar o comportamento e as crenças de pessoas doutras culturas. A 
gente pensa que os seus costumes são os únicos, correctos, apropriados e 
morais. As visões etnocénctricas entendem o comportamento diferente como 
estranho e “selvagem”, mas também como inferior. As pessoas pensam que as 
suas normas representam a forma “natural” de comportar-se e os outros são 
julgados como negativos. 
 O etnocentrismo é uma visão das coisas de acordo com a qual o próprio 
grupo é o centro de todo, e todos os outros se medem por referência a ele. 
Cada grupo alimenta o seu próprio orgulho e a sua vaidade, proclama a sua 
superioridade, exalta as suas próprias divindades e mira com desprezo aos 
outros. O etnocentrismo pode manifestar-se em diferentes níveis: tribo, aldeia, 
minoria étnica, área cultural, classe, pessoa, indivíduo... O problema do 
etnocentrismo é a intolerância cultural face à diversidade e o fechar as portas à 
curiosidade pelo conhecimento. O etnocentrismo cultural é uma atitude que 
pode derivar numa ideologia com práticas racistas. 
 Em relação com este conceito temos o de “tempocentrismo” 
(Brian O´Neill, conferencia no ISCCSSPP, Lisboa, 4-06-2007) segundo o qual o 
nosso tempo e a forma de entender este seriam destacados como os melhores 
e os mais apropriados com relação aos outros. 
Aqui temos que fazer uma chamada de atenção. A noção de cultura 
pode, politicamente e etnocentricamente, ser utilizada para separar grupos 
humanos, mas desde um ponto de vista humanístico deveria servir para 
melhorar a convivência e construír uma sociedade democrática justa. É o que 
se denomina “novo etnocentrismo” (Sánchez Durá, 1996), isto é, pensar o 
mundo como um conjunto de identidades impenetráveis que afirmam sempre a 
sua particularidade face a outras. 
O oposto ao etnocentrismo é o relativismo cultural, uma das ideias 
chave da antropologia.O relativismo cultural afirma que uma cultura deve ser 
estudada e compreendida em termos dos seus próprios significados e valores, 
e que nenhuma crença ou prática cultural pode ser entendida separada do seu 
sistema ou contexto cultural. O comportamento numa cultura particular não 
deve ser julgado com os padrões de outra. O relativismo cultural não só é uma 
teoria antropológica como uma atitude, um olhar e uma prática antropológica, e 
também uma forma de lidar com os outros em respeito pela diversidade. Esta 
atitude implica que os nossos preconceitos não distorçam o conhecimento de 
outras culturas, mas também uma atitude de diálogo aberto. 
Podemos entender o relativismo cultural de duas maneiras, uma como 
algo aberto e que defende a equivalência entre culturas seguindo uma 
tolerância pela pluralidade das sociedades humanas; outra como algo fechado 
e que defende a singularidade intransponível das culturas (Gandra, in Cuche, 
1999: 13). 
TEMA	2:	CULTURA	E	SOCIEDADE	
 
 
30 
 No Ocidente consideramos o infanticídio um crime, mas na cultura 
chinesa tradicional as bebés eram às vezes estranguladas porque 
consideravam-se uma carga para a família. Os judeus não comem porco, os 
hindus não comem vaca. Em Ocidente beijar-se em público pode ser 
considerado algo normal mas noutras culturas é desconhecido ou pensado 
como desagradável. 
Tem limites o relativismo cultural? A Alemanha nazi deve ser valorada 
igual de neutro que a Grécia clássica? Desde o ponto de vista do relativismo 
cultural estremo sim, porque defende que não há uma moralidade superior, 
internacional ou universal, que as regras éticas e morais de todas as culturas 
merecem igual respeito. Esta perspectiva pode levar a um niilismo. 
Porém, desde o ponto de vista desde o relativismo cultural ético há e 
deve haver limites válidos para toda a humanidade. Não podemos tolerar todo, 
pois a tolerância sem limites equivale à supressão de toda regulamentação do 
comportamento humano. Não toda diversidade cultural significa enriquecimento 
moral para a humanidade e algumas vezes a sua idolatria pode servir para 
discriminar os outros (Garzón Valdés, 1997). 
Como deveria utilizar o antropólogo o relativismo cultural? Um uso 
dogmático e absoluto do relativismo cultural pode levar a entender os outros 
como entidades absolutamente diferentes, intraduzíveis e sem os mesmos 
direitos que nós. O antropólogo deve apresentar informes e interpretações dos 
fenómenos culturais, para entender estes na sua complexidade, porém o 
antropólogo não tem que aprovar costumes como o infanticídio, o canibalismo 
e a tortura. Exigem portanto uma condena moral e uns valores internacionais e 
humanos de justiça e moralidade que nos fazem mais humanos. 
O relativismo cultural mais estremo equivale à eliminação de toda 
regulamentação do comportamento humano e pode cair no risco de justificar 
e/ou permitir a violência. Declarações de princípios como a dos direitos 
humanos (http://www.unhchr.ch/udhr/lang/por.htm) podem servir como 
orientação e guia, ainda que com compreensão das moralidades e as suas 
diversidades. O antigo questionamento e até rejeição antropológica deles pelo 
seu privilégio dos direitos individuais sobre os direitos culturais dos grupos, 
tornou-se hoje em apoio explícito ao seu reconhecimento alargando estes ao 
meio ambiente, a emancipação das mulheres e outros. 
E face às críticas do relativismo (subjectivismo, niilismo, incoerência, 
maquiavelismo, cegueira estética, inexistência de universalismos), o 
antropólogo Clifford Geertz (1984) escreve um texto intitulado “anti-
antirelativismo”, no que critica o medo do relativismo cultural. Sem pretender 
defender o relativismo, sim que combate os seus críticos por não entender bem 
o esforço antropológico pela compreensão da diversidade cultural. Segundo 
Geertz esta noção não irá desaparecer a menos que desapareça a 
antropologia. 
Em síntese, de um relativismo clássico mais extremo que predicava a 
tolerância como relativismo cultural (ex. a perspectiva de Herskovits) contra o 
racismo, passamos a partir da década de 1970 a defender um estatuto 
transcultural de racionalidade que colocava limites à tolerância e os direitos 
humanos mais alargados (Brown, 2008). 
 
 
2.7. A MUDANÇA CULTURAL 
TEMA	2:	CULTURA	E	SOCIEDADE	
 
 
31 
A mudança cultural é o aspecto dinâmico da cultura, o “panta rei” (todo se 
move, todo muda) dos gregos. É inquestionável que nenhuma cultura é 
totalmente estática e de que a cultura construi-se através de processos sociais. 
 As culturas podem intercambiar traços mediante o empréstimo ou a 
difusão. A difusão é um mecanismo de câmbio cultural acontecido durante 
toda a história da humanidade, porque as culturas nunca estiveram isoladas. 
Os contactos culturais sempre existiram. Ex.: o vidro das janelas ocidentais foi 
inventado pelos egípcios, a porcelana procede da China, a tortilha espanhola é 
feita com batata procedente de América, o tabaco é fruto do contacto europeu 
com as culturas pré-colombinas da América Latina. 
 A aculturação é outro mecanismo de mudança que consiste no contacto 
e intercâmbio entre duas ou mais culturas. O conceito foi criado em 1880 pelo 
antropólogo norte-americano J. W. Powell (in Cuche, 1999: 92) para designar a 
transformação dos modos de viver e pensar dos imigrantes nos EUA. Um 
exemplo são os pidgins (mistura de inglês com línguas nativas de diversas 
zonas do mundo). Este contacto intercultural pode provocar três efeitos (Panoff 
e Perrin, 1973): 
 
a) Assimilação da cultura dominada pela dominante. É um processo de 
desculturação ou perca a través do qual um grupo culturalmente 
dominado incorpora-se a uma cultura dominante. 
b) Integração ou combinação de culturas, tendo como resultado novas 
culturas num certo plano de equidade. 
c) Subculturas ou coexistência de culturas dominantes com dominadas. 
 
A invenção independente é um modo criativo de resolver problemas culturais. 
Ex.: A invenção independente da agricultura no México e no Oriente Meio. 
 A globalização é outro motivo de mudança, pois vincula a pessoas de 
todas as partes do mundo através dos meios de comunicação: 
 
“A globalização está na boca de todos; a palavra da moda transforma-se 
rapidamente num fetiche, um conjuro mágico, uma chave com o destino de 
abrir as portas a todos os mistérios presentes e futuros. Alguns consideram que 
a “globalização” é indispensável para a felicidade; outros que é causa de 
infelicidade. Todos entendem que é o destino irredutível do mundo, um 
processo irreversível que afecta da mesma forma e igual medida à totalidade 
das pessoas” (Bauman, 1999:7) 
 
A globalização pode parecer um fenómeno novo, mas, para alguns 
teóricos, como Wallerstein (1974) ou Ortiz (1998), a sua origem não é recente. 
De acordo com Wallerstein (1974), a “economia-mundo” forjou-se no final da 
Idade Média e definiu centros, semi-periferiais e periferias. Este é, portanto, um 
fenómeno histórico, que atinge alguns períodos de auge no século XIX, de 
intensa globalização e face a qual se produziram reacções de localização (ex.: 
nacionalismos), ou seja, forças centrífugas que se confrontam com forças 
sociais centrípetas. Neste sentido, o trabalho do antropólogo Jonathan 
Friedman (1994) demonstra como a homogeneização é inerente ao processo 
de globalização, mas também a fragmentação, a segmentação, a diversidade 
cultural e a reorganização das identidades locais como reacção face ao 
TEMA	2:	CULTURA	E	SOCIEDADE	
 
 
32 
processo de globalização. Para Friedman (1994), a globalização representa 
uma fase mais da dinâmica do sistema capitalista. 
Desde outra perspectiva, a globalização é, na actualidade, um processo 
complexo que provoca mudanças socioculturais, pois vincula pessoas de todas 
as partes do mundo, através dos meios de comunicação, do turismo, do 
comércio, da Internet e dos fluxos. A globalização intensifica interrelações e 
interdependências entre os grupos humanos, comprimindoo espaço e o tempo. 
O teórico Ulrich Beck (1988) distingue dois aspectos deste processo: a) o 
globalismo, que define como a ideologia que tenta substituir a Política pelo 
domínio do Mercado e que significa combater a diversidade cultural e criar uma 
homogeneização cultural (algo que, segundo o autor, não é desejável para este 
autor); b) a globalidade, que significa mais intercâmbios culturais, mestizagem 
cultural e trabalhar por um mundo mais justo e solidário. Sintetizamos esta 
diferença na tabela a seguir: 
 
GLOBALISMO GLOBALIDADE GLOBALIZAÇÃO 
É a ideologia que tenta 
substituir a política pelo 
mercado. Significa ir 
contra a diversidade 
cultural e também a 
homogeneização das 
culturas. Não desejável. 
Não há nenhum país, 
povo, localidade, etc. que 
possa viver isolado dos 
demais. Significa mais 
intercâmbios culturais, 
mestiçagem cultural e 
trabalhar por um mundo 
mais justo e solidário. 
Processos de inter-
relação e 
interdependência entre 
as nações. 
Na linha do conceito de globalidade de Beck, o antropólogo Arjur Appadurai 
(2007: 9) fala da globalização das bases, isto é, da globalização desde abaixo 
protagonizada por movimentos sociais e organizações não governamentais de 
activistas a prol dos direitos humanos, o feminismo, a luta contra a pobreza, o 
meio ambiente e a saúde. Appadurai (2007: 10) propõe colocar a globalização 
ao serviço dos mais necessitados e dos pobres, tendo ele esperança na 
globalização e na globalização da esperança. 
 No seguimento desta linha, o antropólogo Isidoro Moreno (2005) 
diferencia entre mundialização e globalização. O primeiro conceito define como 
os seres humanos se encontram mais próximos, em espaço e tempo, mas 
também como se cria a interculturalidade e se estabelecem os diálogos entre 
culturas. O segundo define a extensão de uma lógica única e absoluta que 
encerra diversos fundamentalismos: a) a religião, entendida como verdade 
única revelada que deve expandir-se a toda a humanidade; b) o estado-nação, 
como única forma de organização sociopolítica desejavel; c) o socialismo, 
como única alternativa ao capitalismo liberal; d) o mercado, com base na 
racionalidade capitalista e apresentado como absoluto sacral. 
A globalização não tem os mesmos efeitos sobre diferentes contextos 
culturais, daí que não possamos pensá-la como uma força exclusivamente 
vertical e linear. Boaventura de Sousa Santos (1997) diferenciou quatro 
elementos fundamentais nos processos de globalização: a) o localismo 
globalizado, isto é, a globalização com sucesso de um fenómeno local; b) o 
globalismo localizado, quando se produzem práticas transnacionais com 
sucesso em condições e contextos locais; c) o cosmopolitismo, quando se cria 
uma organização transnacional na defesa de interesses comuns; d) o 
TEMA	2:	CULTURA	E	SOCIEDADE	
 
 
33 
património comum da humanidade, que responsabiliza todos os seres 
humanos pela tutela de determinados bens. 
 Desde esta perspectiva das relações local-global, o conceito 
antropológico de cultura recebe um novo repto. Hoje, o local intensifica a sua 
interconexão com o global, a partir do marco do Mercado, do Estado, dos 
movimentos e das formas de vida, e de ai que possamos falar em 
transnacionalismo (Hannerz, 1998). O antropólogo Arjun Appadurai sublinha a 
importância do estudo dos fluxos de pessoas, informação, produtos e capital –
ethnoscapes, technoscapes, finanscapes, mediascapes, ideoscapes- 
(Appadurai, 1990; 2004). Robert Robertson (1995) pensa a globalização como 
um tipo de difusão cultural e chega a falar em “glocal”, isto é, a síntese 
relacional entre o local e o global. Esta forma de caracterizar a noção de cultura 
conduz alguns antropólogos a estudar as dinâmicas de viagem e de movimento 
e não apenas as de residência e localidade, as rotas e não só as raízes, os 
processos de produção do global e não só os de produção do local, daí que se 
sublinhem as “zonas de contacto” (Clifford, 1999). Outros falam em culturas 
híbridas (García Canclini, 1989), interligando assim estrutura e processo, mas 
salientando também o papel dos agentes sociais nas dinâmicas entre estrutura 
e acção. 
De facto, a globalização é um processo que se associa à uniformização 
cultural, assimetrias, imperialismos, desigualdades e desconexões, mas isso 
não significa que estas sejam sempre as suas consequências, nem que estas 
sejam as mesmas em todos os contextos. Face à globalização produziu-se 
também uma emergência do que Manuel Castells (2000: 30) denomina 
identidades de resistência (ex.: movimentos sociais anti-globalização, 
ambientalistas, etc.) e identidades projecto (ex.: regionalismos, nacionalismos, 
etc...). Estas identidades estão protagonizadas por actores sociais que, em 
muitos casos, lutam em prol da diversidade cultural e da interculturalidade, do 
respeito pelo meio ambiente e do combate à pobreza e extrema desigualdade 
social. Assim vista, a globalização converte-se num desafio planetário e numa 
oportunidade para resolver problemas globais. O global nem sempre substitui o 
local e o modo neoliberal de globalização não é o único possível. 
Na mesma linha, Renato Ortiz (1998: XXII-XXIV) afirma que a 
globalização da economia não significa homogeneização da cultura e da 
conduta humana, pelo contrário, produz-se um renascimento das 
reivindicações locais, o mundo também se fragmenta em mosaicos e 
particularismos. Particularismos e globalização não são dicotómicos, pois 
diversidade e semelhança caminham juntos. 
Um aspecto importante da mudança cultural é a mestizagem, os 
sincretismos e hibridismos. Estes podem produzir-se entre diferentes partes, 
mas também entre o velho e o novo, entre o actual, o de antes e o de 
antigamente. 
Para entender melhor estes processos de contacto e mudança cultural é 
preciso ter em conta vários níveis da cultura: 
 
 
 
 
 
 
TEMA	2:	CULTURA	E	SOCIEDADE	
 
 
34 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Na cultura internacional as tradições culturais estendem-se mais além dos 
limites nacionais. Nas culturas nacionais os seus traços são partilhados pelos 
nacionais e nas subculturas os padrões culturais estão associados a subgrupos 
específicos dentro de uma sociedade. 
 
2.8. A MUDANÇA SOCIAL 
 
“Quando vos digam que é impossível mudar nada, perguntar-vos quem o diz e 
por quê o diz” (Ulrich Beck, La Voz de Galicia, 1-04-2006, p. 2, Culturas). 
 
 
A preocupação pela mudança sociocultural é muito antiga. Já na Grécia 
clássica face à ideia de Parménides, quem afirmava que o mundo é estático e 
organizado, Heráclito defendeu a ideia de que o mundo está em permanente 
mudança, que todo flui e nada fica. A partir do século XIX, esta preocupação 
pela mudança social acentua-se nas ciências sociais. Depois de ter vivido uma 
época de revoluções, os cientistas tentaram explicar as mudanças e as suas 
leis racionais dentro da nova organização da sociedade. Uma parte dos 
teóricos sublinharam os aspectos estáticos (ex. Comte, Durkheim), e outros os 
seus aspectos dinâmicos, os conflitos e as transformações (ex. Marx). 
 
Qual o peso da estrutura e qual o da acção social na mudança? 
Comte respondeu a esta pergunta com a distinção entre “estática” e “dinâmica”, 
o que se relaciona com a diferença entre mudanças graduais e a de mudanças 
radicais. 
Radcliffe-Brown (1957) distinguiu entre “desajustes” (mudanças que não 
modificam a estrutura social) e “mudanças de tipo” (que mudam de uma 
estrutura a outra). 
As teorias sociológicas clássicas defendem a crença da evolução para 
uma sociedade humana melhor, por meio da sucessão de etapas, em termos 
SUBCULTURAS 
CULTURAS 
NACIONAIS
CULTURA INTERNACIONAL
TEMA	2:	CULTURA	E	SOCIEDADE	
 
 
35 
de progresso pensado como necessário, natural e numa única direcção. Ex.: A 
passagem da solidariedade mecânica à orgânica defendida por Durkheim. Isto 
foi posto em causa logo da segunda guerra mundial, contexto no qual se 
questionou que o progresso tecnológico não fosse acompanhado de ummaior 
humanismo e fraternidade entre as culturas e povos do planeta, que 
fomentasse uma cultura de paz. 
Sobre este problema da mudança social, o materialismo histórico 
descreve a evolução social como uma sucessão de modos de produção: 
produção primitiva, escravatura, feudalismo e capitalismo. Cada modo de 
produção corresponderia a um grau de desenvolvimento. Quando as relações 
de produção já não são válidas para o crescimento das forças produtivas, 
acontece um período de conflito social crescente que acaba numa revolução 
social e no nascimento de um novo modo de produção e umas novas relações 
de produção. Assim a revolução burguesa produziu-se quando as relações de 
produção feudais converteram-se num obstáculo para a expansão económica, 
abrindo passo ao capitalismo. A fase mais avançada da evolução social seria o 
comunismo, na qual o máximo desenvolvimento das forças produtivas 
permitiria uma abundância material e o dar a cada pessoa de acordo com as 
suas necessidades. Nessa fase comunista, as relações de produção seriam 
igualitárias e não existiria propriedade privada dos meios de produção. As 
relações de produção expressam-se na realidade social como lutas de classes 
(ex.: camponeses e senhores feudais, proletários e capitalistas). A mudança 
social, política e cultural é explicada pela mudança do sistema produtivo. 
Uma crítica que se lhe pode fazer à interpretação marxista da mudança 
social é que o marxismo não considerou a existência de limites ecológicos à 
expansão material da civilização, portanto não pensou seriamente nos limites 
ao intercâmbio entre a cultura e a natureza. 
 Noutra linha algo diferente, a sociologia compreensiva de Max Weber 
(1969) analisa a realidade social por meio da construção de tipos ideais 
(aqueles que descrevem como teria acontecido uma acção se os meios 
utilizados fossem racionais para alcançar o fim proposto). Weber argumentou a 
influência central dos valores religiosos, em especial os da ética protestante de 
inspiração calvinista, para o desenvolvimento e a evolução do capitalismo em 
Europa. A mudança social é para Weber resultado de duas coisas: 
1) O progressivo desenvolvimento de uma nova estrutura social, a partir do 
esgotamento das formas de dominação e da sua legitimidade carismática, 
procedendo à substituição por umas novas formas de dominação e 
legitimidade. 
2) O crescente processo de racionalização do sistema de crenças da cultura 
ocidental (ex.: a passagem da magia para a ciência). 
 
Contributos de Weber foram as seguintes ideias: 
1. Face aos factores estruturais, especialmente de base económica no 
materialismo histórico, Weber introduz os factores socioculturais no centro 
mesmo dos processos de mudança sociocultural, demonstrando a 
importância dos valores religiosos como factores da origem do capitalismo. 
Por que o capitalismo originou-se em Europa e não em China (mais 
tecnologia que em Europa)? Pela atitude face a riqueza (poupança do 
puritanismo calvinista). 
TEMA	2:	CULTURA	E	SOCIEDADE	
 
 
36 
2. Os factores económicos, políticos ou culturais não exercem uma acção 
exclusiva, porém operam interligadamente nas transformações sociais. 
3. A importância relativa dos factores da mudança variam de acordo com as 
circunstâncias históricas. 
 
Uma outra visão é a do estrutural-funcionalismo, que tem como antecedente 
fundamental, Émile Durkheim, quem estava muito preocupado como o 
equilíbrio e a estabilidade da estrutura social. Para Durkheim, a causa da 
mudança sociocultural na época moderna era a divisão do trabalho. Para o 
estructural-funcionalismo de W.E. Moore (1974) e S.N. Eisenstadt (1972), a 
mudança é produto da modernização, é dizer, da passagem de uma sociedade 
tradicional para uma moderna. A modernização é para eles um processo de 
passagem de um estado a outro, de uma forma de organização social 
tradicional para uma forma de organização social moderna (família nuclear, 
poucos filhos por família, autoridade política legalista, mobilidade vertical alta, 
...). O modelo define-se como linear, e portanto, pretende homogeneizar de 
acordo com um único modelo de modernidade. 
 
CARACTERÍSTICAS DA MODERNIDADE 
1) Desenvolvimento das comunicações. 
2) Hedonismo, consumismo, secularização, individualismo. 
3) Preponderância dos grupos associativos (escola, sindicato, partido, etc. ) face 
aos comunitários. 
4) Autoridade legalista e racionalidade burocrática. Consolidação do Estado. 
5) Industrialização e urbanização. 
6) Institucionalização do conflito e das mudanças na estrutura. 
 
Críticas ao estrutural-funcionalismo seriam: 
1. A dificuldade para aplicar todos os atributos da modernidade e o seu 
etnocentrismo (traços próprios da sociedade europeia e norte-americana). 
2. A arbitrariedade das classificações: tradicional, em transição, moderno. 
Classificações sem teorias interpretativas ou explicativas. 
3. A dificuldade de escolher factores determinantes da mudança. 
4. A impossibilidade de estender por todo o mundo os modelos de consumo 
ocidental, em relação com as desigualdades, a pobreza, a limitação dos 
recursos naturais, etc. 
 
A mudança social também está interligada com a permanência e a sua 
importância para a sobrevivência e adaptação humanas. Na sua relação com a 
permanência a mudança pode ser de três tipos (Gondar, 1981): 
 
1. Substituições. Quando os objectivos que se tratam de satisfazer e a forma 
permanecem inalterados. Ex.: Substituir o carro usado. Construir uma casa 
nova. Este tipo de mudanças motiva poucos problemas, mudam o 
conteúdo ou as formas, mas as categorias onde repousa o sentido não 
mudam drasticamente. 
2. Crescimento. O funcionário que sobe no quadro, o camponês que 
incrementa o capital com uma aliança matrimonial ou uma boa venda, etc. 
Aqui a situação não é especialmente desequilibradora, pois o crescimento é 
quantitativo e amplia as estratégias a utilizar. 
TEMA	2:	CULTURA	E	SOCIEDADE	
 
 
37 
3. Ruptura com o anterior. A mulher à qual lhe morre o esposo 
(derrubamento do apoio económico, do apoio na educação dos filhos, das 
anteriores relações com vizinhos, amigos e parentes). O emigrante que 
migra a outro país muito diferente do seu (novo sistema normativo, 
simbólico e de comportamento). Se nos dois tipos anteriores as pessoas 
podem perfeitamente valer-se em tais situações, neste último caso o 
comportamento é totalmente diferente: incompreensão, desconcerto, 
agressividade, etc. Estas mudanças costumam ser problemáticas e nalguns 
casos traumáticas. 
 
Nalguns casos as mudanças sociais producen-se de forma muito rápida, pelo 
que as pessoas e os grupos humanos reagem de diferentes formas. No caso 
da Galiza, estudado pelo antropólogo Marcial Gondar (1981), este afirma que 
quando se produz o “boom” da emigração nos anos 1960 transformam-se os 
valores, as pautas sociais e as formas de vida (tanto as dos camponeses que 
permanecem como as dos que emigram). Relacionando cultura e 
personalidade, as formas de reagir face a essa situação podem resumir-se em 
quatro tipos: 
 
1. Afogados: A esta categoria pertencem todos os que não compreendem a 
nova situação - a maioria velhos -. São pessoas que dizem: "Este mundo 
não há quem o entenda!". "Tudo anda do revés". "Não sei onde imos parar". 
A consequência estrema desta situação é o suicídio. A Galiza ocupa uma 
das mais altas taxas de suicídio em Espanha. 
2. Avestruzes: São gente quase sempre velha, geralmente com muito 
carácter, que se resiste a aceitar a mais mínima mudança que altere o 
modelo "tradicional" (tendente a permanecer) no qual foram socializados. 
Ex.: O pai que se opunha à compra de um tractor pelo filho (mecanização), 
argumentando que nem os seus pais nem os seus avôs necessitaram de tal 
coisa e que "nunca faltaram batatas nem milho". É como na cena de Dom 
Quixote lutando contra os moinhos de vento pensando que eram gigantes. 
É ir contra a potência da sociedade tecnológica moderna. 
3. Novos ricos: Aqueles, geralmente novos,que quando se confrontam com 
modelos urbanos de comportamento fazem um esforço por apagar ao 
máximo as suas origens (os velhos esquemas camponeses nos quais foram 
socializados), interiorizando os novos esquemas urbanos o mais apresa 
possível. Ex.: Galegos urbanizados que falam castelhano com “gheada” e 
sotaque rural. Neste último caso a divisão está dentro do próprio sujeito. As 
pautas nas quais um indivíduo foi educado desde a sua infância é algo que 
não pode ser apagado da noite para o dia como se fosse um quadro escrito. 
A tensão que vive o novo rico passa por tentar constantemente apagar as 
formas da sua socialização primeira, que eles consideram de inferior 
categoria. Mas a tensão radica em que não conseguem apagar essas 
formas primeiras, e só podem ocultar as mesmas. Isto provoca um 
comportamento traumático de uma pessoa que é alienígena de si próprio e 
que se reconhece como tal. 
4. Camaleões. São os que afirmam coisas do tipo "Alemanha è boa para 
ganhar dinheiro, mas não é boa para levar aos filhos". Desdobra assim o 
emigrante os aspectos económicos, considerados positivos, dos aspectos 
sociais e afectivos, considerados como negativos. Os cemitérios galegos 
TEMA	2:	CULTURA	E	SOCIEDADE	
 
 
38 
das aldeias estão cheios de panteões que medram ao mesmo tempo que se 
abandonam as aldeias. Esto é densamente significativo do sistema de 
valores em jogo. É uma "cultura para a morte", o panteão é símbolo resumo 
do mundo no qual o emigrante foi socializado de criança. O panteão é 
símbolo da "casa", não do indivíduo, é por isso que no mundo rural a 
pergunta chave é: de que casa es?, e não qual é o teu nome? ou como te 
chamas? Na actualidade a pergunta que se faz aponta ao futuro: que 
queres ser quando sejas grande? À hora de fazer fronte à mudança, estes 
emigrantes camaleões praticam uma integração entre passado e presente, 
a diferença dos outros tipos, não esgaçam o passado e o presente. Aceitam 
o presente sem esquecer o significado do passado. A identidade mantém-
se desta maneira mais saudável socialmente. 
 
No meu ponto de vista, a estes quatro tipos haveria que acrescentar o dos 
“bravú”, que são aqueles, fundamentalmente jovens, que estão orgulhosos 
das suas origens rurais e das suas práticas culturais actuais, qualificadas como 
rurbanas. Podem viver na aldeia, ainda que não propriamente da agricultura, e 
sentem-se identificados com determinados elementos da tradição (passado 
que tende a permanecer) que revitalizam com força (ex.: língua, música, etc.). 
O nível de integração entre o passado e o presente procura uma interpretação 
do sentido e da racionalidade que tem um mundo em processo de mudança, 
são conscientes dos sentidos e das potencialidades dos elementos da sua 
cultura de origem. Compreendem a importância do local e os seus valores, 
junto com a interligação com um mundo global, face o qual matizam novos 
sentidos e novos estilos de vida, resistindo-se à uniformização cultural e à 
hegemonia de certos valores dominantes. 
 
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TEMA	3:	ANTROPOLOGIA,	FOLCLORE	E	CIÊNCIAS	SOCIAIS	
 
 
43 
© APONTAMENTOS DE ANTROPOLOGIA SOCIOCULTURAL 2011-2012 – Prof. Dr. Xerardo 
Pereiro – Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) – antropólogo – Correio 
electrónico: xperez@utad.pt Web: www.utad.pt/~xperez/ 
 
TEMA 3: ANTROPOLOGIA, FOLCLORE E 
CIÊNCIAS SOCIAIS 
 
Objectivos: 
-Compreender a identidade da antropologia sociocultural, em relação a outras 
ciências humanas e sociais. 
-Esclarecer a relação entre a antropologia e folclore. 
-Apresentar o desenvolvimento histórico da antropologia em Portugal em 
dialéctica com outras disciplinas. 
 
Guião: 
3.1. A antropologia e outras ciências humanas e sociais. 
-O estatuto epistemológico das ciências humanas e sociais. 
-A antropologia e a psicologia. 
-A antropologia e a sociologia. 
-A antropologia e o direito. 
-A antropologia e a geografia. 
-A antropologia e a história. 
-A antropologia e a filosofia. 
3.2. Antropologia, folclore e cultura popular. 
-Antropologia e folclore 
-A cultura popular 
3.3. A invenção da tradição 
3.4. A antropologia portuguesa. 
-O desenvolvimento histórico da antropologia portuguesa. 
-Os usos do popular na antropologia portuguesa. 
Bibliografia 
Sítios em Internet 
 
3.1. A ANTROPOLOGIA E OUTRAS CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS 
 
O estatuto epistemológico das ciências humanas e sociais 
Seguindo o pensamento do antropólogo Adolfo Yañez Casal (1996), podemos 
afirmar que as Ciências Sociais aparecem, enquanto exercício profissional, no 
século XIX. Este aparecimento não se dá por acaso, uma vez que é nessa 
altura que se consolida a sociedade burguesa e a modernidade e que 
aparecem novos problemas na relação entre o indivíduo e o grupo. 
As Ciências Sociais e Humanas têm em comum a relação entre sujeito 
(humano) e objecto (humanos) de estudo, o que implica falar de um estatuto 
epistemológico próprio, diferente do das ciências naturais. Esta postura não se 
encontra, porém, isenta de um forte debate científico que remonta à origem das 
ciências humanas e sociais. Durkheim (1995) considerava que as ciências 
humanas e sociais deveriam imitar as ciências naturais e considerar os 
fenómenos sociais como naturais. Esta perspectiva resume-se na expressão 
durkheimiana: “os factos sociais como coisas” (Durkheim, 1995). Autores como 
Dilthey (1839-1911), Max Weber (1864-1920) e Peter Winch defenderam, 
TEMA	3:	ANTROPOLOGIA,	FOLCLOREE	CIÊNCIAS	SOCIAIS	
 
 
44 
contrariamente, que as ciências sociais deveriam ter um estatuto 
epistemológico próprio, porque a acção humana é radicalmente subjectiva. 
Para estes autores, situados numa linha “compreensiva”, as ciências sociais 
devem compreender os fenómenos sociais, a partir das atitudes mentais e do 
sentido que os agentes conferem às suas acções. Esta perspectiva defende a 
ideia de que devamos utilizar métodos diferentes das ciências naturais, 
basicamente qualitativos e indutivos, que nos levem a explicar e/ou 
compreender a realidade sociocultural. Um exemplo disto é o seguinte (Schütz 
e Luckman, 1977): Se vemos a uma pessoa abrir a porta de uma vivenda, 
podemos interpretar que está entrando na sua casa, mas pode ser que nos 
enganemos e talvez seja o cerralheiro, é por isso que é melhor perguntar aos 
participantes e ir mais além do senso comum. Portanto, o auto-conhecimento e 
o conhecimento intersubjectivos caracterizariam as ciências humanas e sociais, 
desde o ponto de vista epistemológico. Dilthey (1992) chegou a afirmar que as 
ciências sociais devem centrar-se não nas causas dos fenómenos sociais, mas 
nas representações, sentimentos e interpretações dos mesmos. 
Karl Popper (1986) foi um participante importante neste debate: afirmou 
a inexistência de oposição entre as ciências naturais e as ciências humanas e 
sociais. Para ele, a verdadeira oposição existe entre ciências empíricas e os 
sistemas metafísicos. Ao contrário da metafísica, a ciência caracterizar-se-ia 
por submeter as suas proposições e teorias à falsidade (refutação). Embora 
esteja consciente de que a ciência é sempre provisória, Popper reconhece o 
direito da mesma a procurar leis gerais. Esta validade limitada significaria 
pensar o conhecimento científico não como uma verdade irrefutável e absoluta, 
mas como um conhecimento –“certum” - validade limitada. 
 Thomas Kuhn (2000), em oposição a Popper, distinguirá as ciências 
paradigmáticas (ciências naturais) das ciências pré-paradigmáticas (as ciências 
sociais). Porquê? Segundo este autor, não existe um paradigma sobre a 
natureza humana que seja aceite por toda a comunidade científica. Isto 
significa uma clara diferença relativamente às ciências humanas e sociais pois, 
se bem que paradigmas como os de Newton ou os de Einstein (relativismo) 
tenham sido aceites por todas as ciências naturais, em ciências humanas, a 
diversidade de teorias e princípios sobre a natureza humana é tão ampla que 
não nos permite falar de paradigma. Paradigma é entendido como o conjunto 
de teorias e princípios sobre a estrutura e a natureza das coisas; conjunto 
aceite, por unanimidade, por toda a comunidade científica. Sem entrar a fundo 
nesta discussão sobre pre-paradigmas e paradigmas (não é este o objectivo 
desde tema), é, porém, importante situar as ciências humanas e sociais, 
nomeadamente a antropologia na organização da produção social do saber. 
De acordo com Kuhn (2000) a história da ciência não é um processo 
cumulativo de conhecimento (talvez isto seja certo em Medicina), porém um 
processo construído a saltos, revoluções, mudanças radicais no paradigma 
cientifico de explicação. Um paradigma é um conjunto de ideias que uma 
comunidade científica partilha sobre metodologias e teorias. 
Mais tarde a hermenêutica filosófica recupera o significado, a 
interpretação e a compreensão humana do social (Gadamer, 1992). A 
compreensão está interligada com os preconceitos, a pre-compreensão do 
intérprete. 
Outra influência importante foi o pós-estruturalismo de Derrida e 
Foucault. Derrida (1975), através da sua estratégia de desconstrução do saber, 
TEMA	3:	ANTROPOLOGIA,	FOLCLORE	E	CIÊNCIAS	SOCIAIS	
 
 
45 
questionará a autoridade do investigador social, afirmando que os 
investigadores constroem o conhecimento através da subjectividade da 
linguagem e de estratégias retóricas. Mais do que factos externos ao texto, o 
conhecimento é uma construção textual do investigador. Negam assim o 
realismo, defendendo a ideia que a investigação é um fenómeno sócio-histórico 
que é parte do processo de vigiar e controlar, é portanto um exercício de poder. 
Michael Foucault (2003) afirmará que todo saber está intimamente ligado 
ao poder, e como toda produção de saber é uma forma de exercer poder. 
Desde uma perspectiva antropológica humanista, mais ligada ao 
conhecimento compreensivo, as características da produção do conhecimento 
são as seguintes: 
 
1. Temos que reconhecer que existem outras formas de conhecimento – 
arte, poesia, literatura, fotografia... – com legitimidades diferentes. 
2. A realidade constrói-se socialmente através de processos históricos. 
3. Os humanos são seres significantes, que dotam de sentido tudo o que 
fazem, pensam e dizem. Os objectos são conhecidos, através da 
meditação do sujeito e da sua linguagem. 
4. A verdade absoluta não existe, apenas existem algumas certezas – 
certum. Isto não significa que se pode controlar, cientificamente, a 
subjectividade característica das ciências humanas. 
5. Todo conhecimento científico está exposto a princípios éticos e valores. 
Os resultados de uma investigação científica deveriam responder a duas 
questões: para quem servem? Para quê? Não têm igual valor ético o 
químico que trabalha na criação de uma bomba atómica e o que 
trabalha para descobrir uma medicina que cure o cancro. 
6. É impossível publicar um livro de ciências sociais que não influa, 
dalguma maneira, na sociedade. 
7. Qualquer realidade social não pode ser entendida apenas através da 
quantificação matemática. Questões como a felicidade, a tristeza, a dor, 
os sentimentos, os afectos não podem ser reduzidos a uma 
quantificação. 
 
O que distingue as ciências humanas e sociais é, portanto, o seu estatuto 
epistemológico próprio. No entanto, a relação intersubjectiva com o objecto de 
estudo também pode determinar algumas diferenças. Braudel (1976) afirma: “O 
que muda é o observatório, a paisagem é sempre a mesma”. 
Qual é o papel e o estatuto da antropologia em relação às outras 
ciências sociais e humanas? 
 
Anedota: 
-Qual é a diferença entre um antropólogo, um sociólogo e um jornalista? 
-Resposta: O antropólogo anda a pé ou de bicicleta, o sociólogo sempre de 
carro e o jornalista de avião. 
 
A anedota anterior pode representar, metaforicamente, as várias abordagens 
metodológicas que as diferentes ciências humanas e sociais apresentam, em 
relação ao seu objecto de estudo. Mas, na prática, produz-se um 
entrecruzamento de métodos e empréstimos teórico-conceptuais. Muitas 
subdisciplinas comunicam intensamente entre si. 
TEMA	3:	ANTROPOLOGIA,	FOLCLORE	E	CIÊNCIAS	SOCIAIS	
 
 
46 
 
A Antropologia e a Psicologia 
No seguinte quadro, podemos observar, detalhadamente, a relação entre a 
antropologia e a psicologia: 
 
 Indivíduo Sociedade Cultura 
Indivíduo Psicologia Psicologia Social Antropologia 
Psicológica 
Sociedade Antropologia 
Social e 
Sociologia 
Sociologia e 
Antropologia 
Social 
Antropologia 
Sociocultural e 
Sociologia 
Cultura Antropologia 
Cultural 
 
 
Antropologia » « Psicologia 
 A realidade social assenta numa 
realidade psicológica e biológica 
–bioquímica-. 
 O humano não se reduz só ao 
psicológico (ex.: atracção 
sexual entre duas pessoas). 
 Experiencialismo. 
 Estuda como o cultural e o 
social modelam o psicológico e 
vice-versa. 
 “Facto social total” (Marcel 
Mauss). A antropologia pratica 
uma integridade na análise 
sociocultural. O biológico é um 
aspecto humano com sentido, 
que actua, através da cultura na 
sociedade. 
 “Shock cultural”. 
-Identifica os traços psicológicos do 
indivíduo e explica os processos e 
mecanismos psíquicos intraorgânicos. 
-Conceitos: impulso, repressão, 
reflexos, condicionamentos, ego, 
personalidade, motivação... 
-Método: experiências de laboratório, 
testes psicométricos,... 
-A psicologia experimental tenta 
determinar as bases psicológicas da 
conduta individual. 
-Tenta descobrirum humano abstracto 
existente em todas as culturas. 
-PSICOLOGIA SOCIAL: estuda como 
o psicológico modela o social. 
 
 
A Antropologia e a Sociologia 
 
Anedota: 
Um antropólogo é capturado por uma tribo de canibais que o colocam numa 
panela gigante juntamente com batatas, sal, legumes... Pouco depois, o 
antropólogo grita: “Mais batatas, mais legumes...” (O antropólogo tinha 
começado a comer tudo) 
 
Antropologia » « Sociologia 
 Nasceu como uma espécie de 
“sociologia dos outros” e dos 
“primitivos”. 
 Inicialmente pensada como uma 
-Sociologia de “nós” e do nosso. 
 
-Os factos sociais explicam-se em 
função de outros factos sociais 
TEMA	3:	ANTROPOLOGIA,	FOLCLORE	E	CIÊNCIAS	SOCIAIS	
 
 
47 
microsociologia e uma 
sociologia comparada 
(Radcliffe-Brown). 
 Tem uma epistemologia própria.
 Os “outros” foram incorporados 
no “nós” e o objecto de estudo 
entrou em crise, diversificando-
se. 
 A antropologia não é uma parte 
da sociologia: pensar desta 
forma seria uma ingenuidade. 
Os factos, estudados pelos 
antropólogos, não podem ser 
exclusivamente considerados 
sob uma perspectiva social. Ex.: 
a religião não cumpre, apenas, 
funções sociais: o problema não 
se esgota aí. 
 Objecto de estudo: 
1. Estuda a cultura humana e a 
forma como esta é vivenciada, 
em sociedade. 
2. Estuda culturas e etnias, dentro 
da sociedade. 
3. Estuda culturas diferentes. 
 Métodos: observação 
participante; entrevistas em 
profundidade; comparação –
histórica e diversidade cultural; 
compreensão holística, para 
desvendar aspectos essenciais 
da vida humana muitas vezes 
inconscientes. Estudos mais 
micro. 
 Teorias e conceitos diferentes. 
Ex.: relativismo cultural, 
etnocentrismo,... 
 Conhecimento dos outros e de 
nós mesmos. Finalidade: 
descobrir a natureza humana. 
 Mais histórica. 
 Deixa falar as pessoas, escuta-
as e dá-lhes voz. 
 Implica um modo de estar com 
as pessoas. 
 Tem em conta as teorias 
nativas. 
(Durkheim). 
 
-Objecto de estudo: 
1. O comportamento social de um 
grupo humano, de acordo com 
as variáveis: idade, sexo, 
profissão, classe, prestígio, 
papel, mudança,... 
2. A sociedade em si mesma. 
3. A sociedade em geral e as suas 
leis gerais. 
4. A sua própria sociedade. 
 
-Conceitos: estrutura social, relações 
sociais... 
 
-Métodos: inquéritos, entrevistas… 
(recorre mais aos métodos 
quantitativos do que a antropologia) 
(utiliza com maior frequência a 
observação exterior e os estudos 
macro). 
 
-Mais ahistórica e presentista. 
 
-Muitos empréstimos conceptuais e 
teóricos à antropologia e vice-versa. 
 
 Fala das pessoas em seu 
nome. 
 
 
 
TEMA	3:	ANTROPOLOGIA,	FOLCLORE	E	CIÊNCIAS	SOCIAIS	
 
 
48 
ANTROPOLOGIA SOCIOLOGIA 
Interesse pelo Qualitativo Mais interesse pela medição 
quantitativa. 
Observação participante de práticas 
declaradas e práticas efectivas 
Método típico do inquérito estatístico, 
por questionário fechado. Técnica da 
objectividade oficial, comprovativa da 
separação entre sujeito e objecto. 
(TEIXEIRA LOPES, J. (1997): “Antropologia e Sociologia: Duas disciplinas em 
diálogo”, em Iturra, R. e Oliveira Jorge, V. (coords.): Recuperar o espanto. O 
olhar da antropologia. Porto: Afrontamento, pp. 39-44. 
 
A Antropologia e o Direito 
 
Antropologia e Direito 
 Os primeiros antropólogos eram advogados. 
 B. Malinowski: Crime e Costume na Sociedade Selvagem. Esta obra é 
dedicada à lei. 
 Paul Bohanan: Tiv (Nigéria). É outra obra sobre a criação de leis na 
cultura tivs. 
 
A Antropologia e a Geografia 
 
Antropologia e Geografia 
 As semelhanças entre estas duas disciplinas foram evidentes, desde 
Franz Boas, nomeadamente desde a publicação da sua teoria do 
“determinismo geográfico” (inspirada em Ratzel) e do determinismo 
geográfico-climático. Boas aplicou esta teoria nos seus estudos sobre os 
esquimós do Canadá. 
 As semelhanças destas duas ciências passam também pelo uso e 
criação de mapas, como representação do espaço e do território. Os 
mapas e os relatórios geográficos são apoios logísticos fundamentais na 
investigação antropológica. 
 Conceptualmente, são importantes os paralelismos entre “área cultural” 
(Cf. Brown: 2001) e o conceito geográfico de “região”, mas também o de 
“fronteira”. Este último conceito foi utilizado, pela primeira vez em 
antropologia, por Clark Wissler, em 1918, no seu estudo sobre a 
fronteira entre os colonos e os indígenas dos EUA. 
 Em termos teóricos, as influências entre estas disciplinas foram mútuas, 
desde há muito tempo. Por exemplo, a teoria do lugar central do 
geógrafo Walter Christaller influenciou a antropologia. Em antropologia, 
a preocupação por uma análise do espaço está bem representada pelo 
antropólogo E.T. Hall que estudou a forma como as pessoas utilizam 
culturalmente o espaço. As geografias pós-modernas, como por 
exemplo os trabalhos de Eduardo Soja, incidem muito na antropologia 
urbana. 
 Apesar das semelhanças, também existem diferenças conceptuais, 
teóricas e metodológicas. O trabalho de campo antropológico é 
específico da antropologia. A geografia tende a realizar, sobre o terreno, 
uma observação mais exterior dos fenómenos sociais. 
 
TEMA	3:	ANTROPOLOGIA,	FOLCLORE	E	CIÊNCIAS	SOCIAIS	
 
 
49 
A Antropologia e a História 
 
Antropologia e História 
 Os antropólogos evolucionistas e difusionistas (século XIX) fizeram uma 
história especulativa e conjectural. 
 Os antropólogos funcionalistas tenderam a excluir a história e 
aproximaram-se da sociologia. 
 A antropologia marxista recuperou a história. 
 Metodologicamente, há muitas aproximações: trabalho de campo 
antropológico e história oral. Actualmente, os antropólogos também 
trabalham com documentação escrita. 
 A Antropologia histórica trabalha com documentos e memórias orais. A 
História tende a dar maior importância aos documentos escritos. 
 A antropologia tenta compreender as relações entre passado, presente e 
futuro, que podem convergir metaforicamente no presente. A história 
tende a reconstruir, eventualmente, o passado. 
 A antropologia interpreta as representações do passado, as amnésias e 
os esquecimentos. 
 
 
 
 
ANTROPOLOGIA (Sec. XVI-XIX) HISTÓRIA (Sec. XVI-XIX) 
Nasce do encontro do Ocidente com 
sociedades não ocidentais, 
“selvagens”, “bárbaras”. 
Sociedades sem escrita, dominadas 
pela oralidade. 
Sociedades “civilizadas” 
 
 
 
ANTROPOLOGIA (Sec. 
XIX) 
HISTÓRIA (Sec. XIX) SOCIOLOGIA (Sec. XIX)
Práticas culturais não 
ocidentais. 
“Sobrevivência” das 
instituições que teriam 
existido na Europa, há 
séculos. (a Europa teria 
evoluído para a 
Civilização). A 
antropologia estudava o 
exotismo da Índia, do 
Japão e da China. 
Estudava a “civilização” 
europeia ocidental (com 
modos de vida baseados 
no Estado e na escrita). 
Sociedades urbanas e 
industriais ocidentais. 
Também estudaria 
alguns aspectos das 
sociedades não 
ocidentais (urbanismo, 
indústrias, poder). 
Em Godelier, M.,1996,”Antropología social e historia local”, em Sociológica n.º 
1, pp. 9-30. 
 
Segundo o antropólogo Maurice Godelier (1996: 13), as pontes entre 
antropólogos e historiadores foram feitas em trabalhos de “etnohistória” e 
TEMA	3:	ANTROPOLOGIA,	FOLCLORE	E	CIÊNCIAS	SOCIAIS	
 
 
50 
“antropologia histórica”. Qual o trabalho do antropólogo, relativamente à 
história? Godelier (1996: 22) responde a esta questão: 
 
“... de vuelta a la práctica del antropólogo, cuya tarea consiste en reconstruir 
las genealogías, y a través de las genealogías las historias de clanes y familias, 
y las historias de vida, ya sea de individuos ilustres o de hombres y mujeres 
ordinarios de los que há permanecido la memoria. Recordemos que, en función 
de cual sea la sociedad de la que tratemos, la memoria genealógica puede 
variar entre un mínimo de tres generaciones más allá de nuestro informante (es 
decir la generación de sus abuelos y la de sus bisabuelos) hasta un máximo de 
quince. Pues bien, tres generacionescorresponden a cien años, lo que significa 
que cuando un antropólogo desarrolla una investigación no solamente se 
enfrenta a los acontecimientos contemporáneos, sino que se sumerge en una 
duración de más de un siglo...” 
 
Há que considerar que, hoje, existe uma certa convergência metodológica, mas 
também uma necessária interdisciplinariedade. Segundo o antropólogo Ulf 
Hannerz (1979: 3-4), “as fronteiras disciplinares não se devem tornar vacas 
sagradas”. 
Persistem, no entanto, algumas diferenças, muitas vezes mais ligadas a 
identidades corporativas de organização académica e profissional do saber, 
utilizadas para uma conquista dos mercados de emprego. 
 
A Antropologia e a Filosofia 
Para alguns autores, a origem da antropologia encontra-se na filosofia grega. 
Os contributos da filosofia foram e são muito importantes para a antropologia. A 
filosofia contribuiu para a reflexão sobre as condições de produção do 
conhecimento antropológico, enquanto problema epistemológico. A filosofia 
deu azo à análise antropológica (por exemplo, a filosofia hermeneútica de 
Gadamer - 1992). A filosofia também chamou a atenção da antropologia para a 
forma como os seres humanos pensam e apreendem. A filosofia deu um 
grande contributo para o pós-modernismo. Sobre esta questão, recomendamos 
a magnífica obra do antropólogo Adolfo Yañez Casal (1996). 
 A diferença entre antropologia e filosofia e antropologia é também 
metodológica, assim a filosofia tende a ser mais dedutiva e a antropologia mais 
indutiva e com base empírica. 
 
 
3.2. ANTROPOLOGIA, FOLCLORE E CULTURA POPULAR 
 
Folclore, Folclorismo e folclorização 
Por folclorismo entendemos um conjunto de ideias, atitudes e valores que 
enaltecem a cultura popular e as suas manifestações. Por folclorização 
entendemos o processo de construção e institucionalização de práticas 
performativas da cultura “popular” (Castelo Branco e Freitas Branco, 2003: 1). 
 O folclore pode ser considerado um campo social, no sentido 
bourdieuano, uma cultura expressiva e performativa difundida intensamente 
desde o século XIX e com inspiração no mundo rural. O seu paradoxo vai ser 
que o seu conteúdo ruralista cria-se a partir de um quadro urbano e ele leva 
TEMA	3:	ANTROPOLOGIA,	FOLCLORE	E	CIÊNCIAS	SOCIAIS	
 
 
51 
associado, historicamente, políticas culturais e certificações científicas da sua 
pretendida autenticidade (Castelo Branco e Freitas Branco, 2003). 
 Os processos de folclorização levam consigo associados processos de 
objectivação da cultura que recompõem a relação entre tradição e 
modernidade, criam novas modalidades de celebração do património cultural, 
elaboram novos catálogos emblemáticos identitários e põem em circulação 
mercantil algumas expressões culturais (Raposo, 2004: 137). 
 O folclore tem sido utilizado com fins políticos de dominação (ex.: Estado 
Novo, Estado franquista em Espanha), como com fins emancipatórios. No 
primeiro caso o que se pretendia era perpetuar uma tradição inventada 
(Hobsbawn e Ranger, 1983) politicamente e no segundo de diferenciar-se face 
a uma hegemonia. Seja como for, o folclore, enquanto produção cultural, tem 
sido utilizado politicamente para integrar as populações rurais na nação 
(Kirshenblatt-Gimblett, 1998) e com a queda das ditaduras e ascensão das 
democracias o seu revivalismo adquire novas formas e significados. 
Recentemente este tem-se convertido numa mercadoria cultural mais 
(Kirshenblatt-Gimblett, 1998; 2001; Raposo, 2004) cada vez mais urbana 
enquanto a grupos e implantação geográfica. 
 
O folclore e as críticas da antropologia 
A fins do século XVIII e primeiros do século XIX o “povo” ou “folk” começou a 
ser estudado pelos intelectuais europeus, num momento de desaparição da 
cultura popular –por causa da revolução industrial-. Os camponeses foram 
surpreendidos nas suas casas pelas classes médias urbanas que lhes pediam 
para cantar e contar contos (Burke, 1996: 35). O interesse pela literatura oral 
tradicional fez parte de um movimento geral de “descobrimento do povo” e que 
incluía também a religião popular, a festa popular, a música popular, costumes, 
etc. (Burke, 1996: 40). 
Ainda que a antropologia, enquanto semiótica da cultura, tenha 
incorporado os estudos do folclore e dos costumes, o processo histórico de 
relacionamento entre antropologia e folclore foi desigual, ao longo da história. 
O termo folclore foi criado por W. J. Thoms em 1846 (González Reboredo, 
1999) na revista Athenaeum, substituindo ao anterior de “antiguidades 
populares”, e na mesma época a antropologia começa a organizar-se como 
disciplina académica. 
 Desde uma óptica ibérica e de acordo com Honorio Velasco (1988: 13), 
a antropologia esteve, durante a sua história em Espanha, muito ligada ao 
Folclore (estudo da cultura popular). Porém, o folclore experimentou uma 
desqualificação como disciplina científica académica. O interesse social pela 
“cultura popular” aumentou no sec. XIX. Na época, assistia-se ao auge do 
Nacionalismo, que procurava traços culturais diferenciais para justificar a 
existência e a identidade das novas nações. Nesse contexto político, 
apareceram as “sociedades de folclore”, já, na altura, conhecedoras dos textos 
de antropólogos evolucionistas como Morgan e Tylor. O trabalho das 
sociedades de folclore foi, em muitos casos, muito importante, sobretudo pela 
grande recolha de dados, através de questionários sobre o folclore. Assim o 
expressava a escritora Emilia Pardo Bazán no discurso da sessão de abertura 
da Sociedade “El Folklore Gallego” em 1884: 
 
TEMA	3:	ANTROPOLOGIA,	FOLCLORE	E	CIÊNCIAS	SOCIAIS	
 
 
52 
“El Folk-lore quiere recoger esas tradiciones que se pierden, esas costumbres 
que se olvidan y esos vestigios de remotas edades que corren peligro de 
desaparecer para siempre. Quiere recogerlos no con el fin de poner otra vez en 
uso lo que cayó en desuso... sino con el de archivarlos... y formar con ellos, por 
decirlo así, un museo universal donde puedan estudiarlos doctos la historia 
completa del pasado...” (Em González Reboredo, 1999: 44). 
 
Um exemplo do papel destas sociedades de folclore é a Sociedade de Folk-lore 
Andaluz, que editava a Revista de Folk-lore Andaluz e que tinha os seguintes 
objectivos (Machado y Álvarez, 1981: 5): 
 
“A la simple lectura de esa primera base -el estudio del saber popular 
obsérvase cuáles son los principales ramos de conocimiento que abraza 
nuestra Sociedad, los cuales pueden reducirse a cinco grandes grupos: 
primero, lo que hasta cierto punto podríamos llamar ciencia popular o sease los 
conocimientos que el pueblo ha adquirido por medio de su razón natural y de 
su larga experiencia; segundo, literatura y poesía populares, propiamente 
dichas; tercera, Etnografía, Arqueología y Prehistoria; cuarto, Mitología y 
Mitografía; y quinto, Filología, Glottología, Fonética: que todas estas ciencias 
son verdaderos auxiliares del Folclore”. 
 
O folclore significava, para eles, recolher contos, baladas, etc. Usava-se o 
conceito de “povo” como “verdadeiro conservador da linguagem” (Velasco, 
1988: 17). Os folcloristas eram indivíduos urbanos, que pouco tinham de “povo” 
ou classe baixa, embora considerassem que pensavam como estes. Os 
folcloristas chegaram a ser, no sec. XX, amadores e nostálgicos do romantismo 
do sec. XIX que predicam a urgência da recolha face ao que eles consideram 
perca de tradições e costumes. 
 Outro paradoxo é o facto de se ter introduzido uma palavra inglesa e 
alemã (“folclore”) para designar o mais genuinamente espanhol, andaluz, 
extremenho ou português (Velasco, 1988: 18). O folclore era pensado, pelos 
folcloristas, como uma Ciência, uma paixão e uma missão nacional. Com 
Velasco (1988: 19) podemos concordar em que: 
 
“O folclore é uma recuperação rural que a sociedade industrial realiza nos seus 
tempos de lazer”. 
 
Em tempos mais recentes do sec. XX, outras associações tiveram como 
objectivo especial uma parcela do folclore: as danças e as canções. Estas 
novasformas de institucionalização mostram um processo de escolha 
orientado para o espectáculo. Abandonou-se assim, parcialmente, o primeiro 
objectivo científico (Velasco, 1988: 20). 
Desde o ponto de vista da antropologia, o folclore tem muita plasticidade 
e está acomodado a diversas dinâmicas sociais, sendo dependente do conceito 
de cultura. O folclore, enquanto movimento cultural, não partiu do povo: foi uma 
recriação, um descobrimento da cidade, da burguesia e da modernidade. O 
povo, a gente do rural acabou por descobrir que tinha folclore, sem saber do 
assunto (Velasco, 1988: 21). 
Os difusores do folclore tiveram um papel de mediadores, entre o povo e 
outros sectores sociais. Esta mediação não era totalmente descomprometida. 
TEMA	3:	ANTROPOLOGIA,	FOLCLORE	E	CIÊNCIAS	SOCIAIS	
 
 
53 
Podemos afirmar que era uma espécie de mercadoria para sectores urbanos, 
com a etiqueta de “cultura popular” (Velasco, 1988: 22). A maioria dos 
folkloristas eram dos grupos dirigentes e descreviam o povo como natural, 
simples, iletrado, instintivo, irracional, tradicional, ancorado na terra, 
comunitário, sem sentido da individualidade (Burke, 1996: 43). Podemos falar 
num culto ao povo e ao que se considerava como primitivismo cultural, que 
levava nalguns casos a imitar este por razões estéticas, intelectuais e políticas. 
Este culto foi devido, segundo Peter Burke (1996: 45), a uma reacção contra o 
elitismo da Ilustração e nalguns casos contra a França (na Alemanha e em 
Espanha utilizou-se a cultura popular contra o gosto francês). É bem conhecida 
a associação entre o estudo do folklore e o nacionalismo. O folklore serviu 
como justificação e conteúdo na construção das nações. 
O conceito de nação foi um invento de intelectuais que se impus ao povo 
com o qual desejavam identificar-se, mas os camponeses e artesãos tinham 
nos começos do século XIX mais consciência identitária local e regional do que 
nacional (Burke, 1996: 48). Além mais a visão que os intelectuais burgueses 
tinham do povo costumava ser ambivalente. Por um lado pensavam que o povo 
era atrasado e supersticioso (conceito pejorativo), mas por outro admiravam 
nele pela sua simplicidade, hospitalidade e imaginação (Burke, 1996: 51). 
O folclore apoiou-se na etnografia, mas a etnografia não é uma ciência, 
é um conjunto de técnicas de investigação antropológica. Os folkloristas 
estudam o “folclore como saber” e não o “folclore como viver”. Estudam o 
pensamento e a imaginação como “popular” e não estritamente o humano, tal 
como a antropologia (Velasco, 1988: 25). 
Os folcloristas pensavam que era no povo que sobreviviam temas 
passados, porque não estavam incorporados à modernidade. Esta concepção 
relaciona-se com as teorias da antropologia evolucionista. Quando se fala de 
povo, fala-se de nação. Actualmente, as recuperações do “popular” encerram 
três aspectos (Velasco, 1988: 26-27): 
 
1. Um fundo que abastece determinado povo com traços de identidade. 
2. Reclama a diferença. 
3. Marca a identidade, em oposição à uniformidade. 
 
Uma posição crítica e esclarecedora do folclore é a do antropólogo espanhol 
Julio Caro Baroja (1968: 353): 
 
“Así, por ejemplo, en nuestros días (...), un autor famoso, ya muerto, el profesor 
Robert Redfield, acuñó la expresión Folk-Society y definió luego a ésta como 
una sociedad pequeña, aislada, iletrada (illiterate) y homogénea, con sentido 
estrecho de la solidaridad de grupo, definición que parece muy clara. La 
cuestión es encontrar tal sociedad. Personalmente he de confesar que, según 
mi experiencia, no existe en España, ni ha existido en puridad desde hace 
mucho. Cuando me he lanzado al field-ward, al llegar al último rincón de 
Andalucía o de Vasconia (...), me he encontrado con que el aislamiento, la 
homogeneidad, el agrafismo, etc., eran cosas tan problemáticas que no valía la 
pena insistir sobre ellas demasiado. En cambio, si tenía que estudiar 
ordenanzas municipales, ordenanzas de montes, reglamentos de cofradías, 
programas de fiestas, leyes generales y documentos escritos de diversa índole, 
que implican un género de investigación histórica.” 
TEMA	3:	ANTROPOLOGIA,	FOLCLORE	E	CIÊNCIAS	SOCIAIS	
 
 
54 
 
A antropologia é diferente do folclore: logrou maior prestígio académico 
(universitário), mas partilha com ele uma ideia de cultura não elitista. Tanto 
com a antropologia como com o folclore, a cultura e o seu conceito alargaram-
se (narrações, danças, vestidos, etc.). Podemos ainda afirmar que existiu uma 
certa continuidade e/ou influencia entre os estudos de ambas as disciplinas. 
Portanto, as diferenças relacionam-se mais com perspectivas metodológicas e 
teóricas do que com o objecto e a tradição organizativa do saber. 
 As divergências entre ambas remontam à rejeição dos estudos 
folclóricos por parte da antropologia social britânica. Esses estudos foram, 
porém, repescados pela Literatura e a História Social. Marcel Mauss também 
insistiu na distinção entre “Folklorismo” e “Antropologismo” (Luque Baena, 
1989: 51). 
Segundo Luque Baena (1989: 52), o folclorismo retiraria determinada 
actividade ou objecto. Descontextualizaria muito mais do que a antropologia 
cujo objectivo é estudar a cultura, nos seus contextos de significado específico. 
Os textos dos folcloristas só falam de pessoas que dançam, vestem, narram 
contos e lendas. Os textos dos antropólogos desenham pessoas cinzentas, que 
não dançam nem cantam. 
Para os folcloristas, os fenómenos culturais são produtos acabados, 
“coisas”, o que implica uma reificação e uma museística das pedras. Esses 
fenómenos são, muitas vezes, impessoais (Ex.: Dança-se, Come-se...), 
distanciando-se do indivíduo criador, pessoal e fisicamente. O folclorismo é, 
portanto, uma torpe e errada objectivação da Cultura; trata-se de ingenuidade e 
falsidade (Luque Baena, 1989: 53). 
Para os antropólogos os fenómenos culturais são processos criados 
pelos grupos humanos e “...los estereotipos, los tópicos, los clichés o los 
slogans, son buenos objetos de investigación, pero dudosos o sospechosos 
cuando los transformamos en herramientas conceptuales o heurísticas.” (Luque 
Baena, 1989: 54). 
Segundo Luque Baena (1989: 55-56), são três as criticas que podem ser 
apontadas ao folclore: a sua simplificação, os reduzionismos meio-
ambientalistas e a ausência de interpretação da expressividade social 
(exemplo: a retórica como persuasão, através de um discurso subliminal, quase 
imperceptível; a transmissão de sentidos e significados; os trocadilhos; as 
metáforas; as metonímias, etc.). 
 Outras críticas foram apontadas pelo historiador da cultura Peter Burke 
(1996: 58-60). No seu ponto de vista os folcloristas do século XIX não 
utilizaram um método de classificação que diferenciasse entre rural e urbano, o 
camponês e o nacional (eu diria o burguês), o primitivo e o medieval. Também 
utilizaram erroneamente três conceitos: primivitivismo, comunitarismo e 
purismo. Os folcloristas tenderam a localizar historicamente a cultura popular 
num período primitivo pré-cristão e a defender a ideia de que não tinham 
sofrido mudanças, algo totalmente falso. Os folcloristas pensavam que as 
criações da cultura popular eram comunitárias, obviando que existiram 
criadores individuais reproduzidos posteriormente por outros, também com 
estilos individuais. Os folcloristas acabaram por definir o povo e a nação por 
uma das suas partes, os camponeses, mais próximos da natureza e menos 
influenciados pelos modos estrangeiros. Este foi um exercício social 
metonímico que utilizou grupos subalternos como os camponeses para 
TEMA	3:	ANTROPOLOGIA,	FOLCLORE	E	CIÊNCIAS	SOCIAIS	
 
 
55 
representar toda a nação. Foi assim como se ignorou a relação entre urbano e 
rural, letrados e iletrados. Excluíram-se os habitantes das cidades dos estudos 
sobre a cultura popular. 
As diferenças entre antropologia e folclore poderiam sintetizar-se da 
seguinte forma (Dolores Juliano, 1986): 
 
ANTROPOLOGIA FOLCLORE 
 Ciência Socialque estuda a 
Cultura. 
 Estuda a diversidade humana, 
desde um nível de abstracção. 
 Origem teórica no 
Evolucionismo. 
 Cultura: Conjunto de regras e 
normas geradas socialmente. 
Disposições adquiridas pela 
aprendizagem. 
 Campo mais restrito: sectores 
rurais da sociedade industrial, 
expressões tradicionais e 
populares de uma área 
geográfica particular. 
 É uma área específica da 
antropologia. 
 Origem teórica no Romantismo. 
 Definições: 
a) Pelos conteúdos. 
b) Pela forma de 
transmissão dos 
conteúdos (oralidade). 
 Cultura: Conceito essencialista e 
reificador. “Alma popular”, “Criação 
colectiva do folclore”. “Inconsciente 
colectivo” (Jung). Essência 
materializada nalgumas 
actividades. 
DOLORES JULIANO, M. (1986): Cultura Popular. Barcelona: Anthropos, pp. 3-
6. 
 
A cultura popular 
De acordo com o historiador da cultura Peter Burke (1996: 20) as elites 
tentaram historicamente reformar a cultura popular. Noutros casos renunciaram 
a ela, e noutros descobriram ou redescobriram a cultura do povo, 
especialmente a dos camponeses, com a qual convergiram de algum modo. 
Isto último foi bem demonstrado pelo antropólogo William Christian, para quem 
na Espanha do século XVI os ex-votos, as relíquias e os santuários como 
forma de religiosidade eram tão característicos da família real como dos 
camponeses analfabetos (Christian, 1981). De acordo com Peter Burke (1996: 
25) as elites da Europa moderna eram “biculturais”, isto é, participavam da 
cultura popular e conservavam a sua própria cultura. 
Historicamente a cultura popular tem-se definido pela negativa, isto é, 
pela cultura que não era oficial, a cultura dos que não eram membros da elite 
(Thompson, 1987), dos subordinados em sentido gramsciano. Na actualidade o 
conceito de cultura popular redefiniu-se, e segundo John Storey (2002) 
podemos entender a cultura popular como: 
 
 A que é acolhida por muita gente, isto é, como cultura de massas. 
Estaria associada aos médios e as suas mensagens legitimadas, e 
também às criações para consumo de multidões. Esta perspectiva seria, 
no nosso entender semelhante ao que Abraham Moles denomina como 
TEMA	3:	ANTROPOLOGIA,	FOLCLORE	E	CIÊNCIAS	SOCIAIS	
 
 
56 
“cultura mosaico” (Moles, 1976). Esta cultura mosaico anularia 
cognitivamente o espectador e uma possível interpretação relacional da 
realidade. Hoje a cultura de massas pode ser contextualizada como 
“indústria cultural” (Adorno e Horkheimer, 1979). 
 
 O que não é “alta cultura” e é inferior a esta. Nesta perspectiva, temos 
que introduzir o conceito de “distinção”, para entender esta diferença. As 
distinções culturais apoiam distinções de classe e de estatuto. O gosto é 
uma categoria ideológica de classe, mas também uma categoria 
socioeconómica e de qualidade. O consumo da cultura encontra-se 
“predisposto, consciente e deliberadamente ou não, para cumprir uma 
função social de legitimação de diferenças sociais” (Bourdieu, 1984: 5). 
A “alta cultura” seria o resultado de um acto individual de criação 
adoptado por uma elite para defesa da sua continuidade. A “alta cultura” 
seria elitista, refinada no gosto, requintada e própria do apreço das 
classes superiores. 
 
 A cultura comercial para o consumo de masas. Este consumo é 
entendido como passivo, alienado e alienante e, simultaneamente, 
manipulador. Esta cultura popular foi inventada nos EUA e produz um 
processo de “norte-americanização” do mundo. Representa uma 
ameaça para a Direita, pois ataca os valores tradicionais da “alta 
cultura”, mas também para a Esquerda, pois ataca os modos de vida 
tradicionais dos povos e das classes mais baixas. Nesta óptica, a cultura 
popular seria, para o estruturalismo, uma máquina ideológica que 
reproduziria a ideologia dominante. Para o pós-estruturalismo, a cultura 
popular teria também um papel activo por parte do actor, encerrando 
também contradições, resistências... 
 
 A que tem origem na gente. Seria a cultura folclórica da gente para a 
gente, mas também a da classe trabalhadora e trabalhista, como 
protesto simbólico contra o capitalismo. Esta postura tem algumas 
fraquezas, pois a cultura popular não é espontânea e as matérias-primas 
que utiliza são obtidas no mercado capitalista. O que inserimos na 
categoria “gente”? De ai que a cultura popular como “cultura das classes 
trabalhadoras” seja um conceito difícil de delimitar, por causa do seu 
aburguesamento (ex.: camponeses, operários), um processo analisado 
por Richard Hoggart (1973) no caso inglês. 
 
 A cultura popular como terreno de luta política. Esta perspectiva integra 
o conceito gramsciano de “hegemonia” (Gramsci, 1998: 210). A 
hegemonia é o modo como os grupos dominantes da sociedade, tentam 
alcançar, através de um processo de liderança intelectual e moral, o 
consentimento dos grupos subordinados da sociedade. A cultura popular 
seria, portanto, um local de luta ideológica, entre a resistência dos 
grupos subordinados da sociedade e as forças dos grupos dominantes. 
Esta luta implicaria intercâmbios e negociações, entre os dois grupos. 
Assim, a cultura popular é entendida como um conceito político inserido 
num processo histórico e aplicado a diferentes objectos. 
 
TEMA	3:	ANTROPOLOGIA,	FOLCLORE	E	CIÊNCIAS	SOCIAIS	
 
 
57 
 A cultura popular entendida como igual ou semelhante à “alta cultura”. 
Segundo o pós-modernismo, assistimos, hoje, à extinção do elitismo, 
mas também à vitória final do comércio sobre a cultura. Desta forma 
podemos questionar a dicotomia entre alta e baixa cultura, pois em 
realidade são universos intimamente relacionados. Assim por exemplo, 
os dramas de Shakespeare e as comédias de Lope de Veja foram 
criadas para o consumo massivo. Outro exemplo, Dostoievski e Victor 
Hugo escreveram as suas obras em formato fascículo. E outro, a ópera 
nasceu como um espectáculo popular, ainda que logo tornou-se elitista. 
Podemos afirmar que a marcação de diferenças é causada pela 
distinção entre classes, a étnica e também a afirmação nacionalista. 
 
É muito complexo falar em cultura popular, pois subjaz sempre a necessidade 
de haver um termo de contraste (ex.: cultura popular/ alta cultura) e, como já foi 
referido, essas dicotomias são muito ambíguas ou até mesmo falsas. Estos e 
outros motivos levam-nos a afirmar que se bastantes problemas apresenta o 
conceito antropológico de cultura, muitos mais o de cultura popular. 
 O antropólogo Néstor García Canclini (1989) questiona-se também 
sobre o facto da cultura popular ser uma criação espontânea do povo ou uma 
memória convertida em mercadoria e um espectáculo exótico que a indústria 
reduz a curiosidade para turistas. García Canclini (1989: 15-21) coloca, assim, 
no centro do debate, os processos de mercantilização e festivalização da 
cultura, além da participação colectiva em propostas culturais. Desta forma o 
problema do significado continua, isto é, a actuação de um rancho folclórico 
pode não ter o mesmo significado para as classes baixas do que para as 
médias e altas. Isto implica que devemos estudar não apenas os elementos 
culturais considerados “populares”, porem os caminhos e vias pelas quais 
esses elementos são apropriados pelos grupos sociais 
 
3.3. A INVENÇÃO DA TRADIÇÃO 
Ainda que os antropólogos já levavam várias décadas analisando tradições e 
descobrindo como se construíam socialmente como forma de combate do 
essencialismo, em 1983 os historiadores britânicos Eric J. Hobsbawm e 
Terence Ranger (1983) popularizaram o conceito de “invenção da tradição”. 
Segundo eles o que definimos como tradição teria uma origem mais recente do 
que pensamos e não uma origem na noite dos tempos, e além mais seria 
inventada ou fabricada socialmente num tempo determinado por pessoas e 
grupos de poder determinados com interesses bem concretos. 
De acordo com eles uma tradição inventada seria um conjunto de 
práticas e normas, implícita ou explicitamente aceites, com uma natureza ritual 
ou simbólica e com o intuitode inculcar valores e normas de comportamento 
repetitivo continuados desde o passado. Nas tradições inventadas o passado 
histórico é oportunamente seleccionado para continuar no presente. Isto 
contrasta com a inovação e a mudança contínua do presente mundo moderno. 
A tradição inventada costuma ser apresentada como um atributo imóbil e 
imutável, algo que não é bem certo, pois em realidade ela é inventada e re-
inventada para adaptar-se ao presente. 
 A tradição não é bem costume, pois o costume é a prática de leis e 
hábitos, mas a tradição é fruto da toga, da admoestação e de comportamentos 
formais e práticas ritualizadas. Os dois conceitos estão interligados más 
TEMA	3:	ANTROPOLOGIA,	FOLCLORE	E	CIÊNCIAS	SOCIAIS	
 
 
58 
definem diferentes realidades. A tradição é uma convenção simbólico-ritual e a 
invenção dela é um processo de ritualização e formalização com referência ao 
passado para impor uma certa repetição. 
 As tradições inventadas podem recorrer-se de antigos usos e formas 
adaptadas às novas condições do presente com novos fins, é o que costuma 
fazer a Igreja católica, os tribunais de justiça, os exércitos e as universidades. E 
também podem recorrer-se de símbolos e instrumentos de todo novos, é o 
exemplo dos símbolos dos estados nacionais (bandeiras, hinos, etc.). 
 Seguindo aos autores citados, as tradições inventadas logo da 
Revolução Industrial apresentam-se em três tipos: 
a) Aquelas que simbolizam a coesão social, a pertença a um grupo ou 
comunidade, ainda que foram mais ou menos artificiais. 
b) Aquelas que fundamentavam ou legitimavam uma instituição, um 
estatuto ou uma referência de autoridade. 
c) Aquelas que se relacionavam com a socialização, que pretendiam 
ensinarem crenças, sistemas de valores e convenções de comportamento. 
 
3.4. A ANTROPOLOGIA PORTUGUESA 
 
O desenvolvimento histórico da antropologia portuguesa 
A antropologia, em Portugal, embora ainda em processo de desenvolvimento, 
tem presença, como curso de licenciatura e pós-graduação, nas seguintes 
universidades: 
 
Licenciatura Universidade 
Antropologia Social Universidade Nova de Lisboa (UNL) 
Antropologia Cultural Universidade Técnica de Lisboa-
Instituto Superior de Ciências Sociais 
(ISCSP) 
Antropologia Social Instituto Superior de Ciências do 
Trabalho e da Empresa (ISCTE) 
Antropologia Aplicada ao 
Desenvolvimento (abriu em 
1998/1999; suspensa hoje) 
UTAD-Pólo de Miranda do Douro 
Antropologia Universidade de Coimbra-Faculdade 
de Ciências e Tecnologia 
Antropologia (curso suspenso em 
1999/2000, abriu um Centro de 
Estudos de Antropologia Aplicada e 
uma licenciatura em Estudos Culturais 
em 2006-2007) 
(particular) Universidade Fernando 
Pessoa (Porto) 
Antropologia (Abriu em 1999/2000. 
Curso suspenso actualmente) 
(particular) Universidade Lusófona de 
Humanidades e Tecnologias (Lisboa) 
 
A antropologia que se ensina, em Portugal, é fundamentalmente social e 
cultural. Só no Museu e Laboratório Antropológico de Coimbra se assume a 
tentativa de integrar a investigação em antropologia física ligada à antropologia 
social e cultural. A formação em arqueologia está ligada às faculdades de 
História. 
TEMA	3:	ANTROPOLOGIA,	FOLCLORE	E	CIÊNCIAS	SOCIAIS	
 
 
59 
 Na actualidade, a formação em antropologia reflecte as diversas 
influências das escolas internacionais (Pina Cabral, 1986: 12). Em que fase se 
pode dividir a antropologia portuguesa? Segundo João de Pina Cabral (1991: 
15-36) estas fases seriam: 
 
1ª A cultura burguesa e o interesse pelos "costumes populares" 
Desde a subida ao poder da burguesia, na 1ª metade do s. XIX, o estudo dos 
"costumes populares" foi considerada uma questão de interesse fundamental. 
Criou-se o seguinte esquema mental: 
 
"CULTURA POPULAR"= 
"AUTENTICIDADE", "O POVO" = 
Identidade nacional 
"CULTURA BURGUESA"= 
"NAO AUTENTICIDADE" 
 
No s. XIX e 1ª metade do s. XX, a etnografia associa-se à procura de uma 
identidade nacional. A identidade nacional deve ser encontrada entre "o povo" 
e não entre as classes urbanas no poder (que não conformam o 
autenticamente português, por não serem rurais, apesar de poderem ter uma 
existência muito antiga). Nesta fase, estabeleceram-se as seguintes 
associações simbólicas: 
 
AUTÉNTICO↔ ÚNICO PARA UM POVO ↔ O QUE TEM LONGA 
EXISTÊNCIA ↔PRIMITIVO↔COSTUME POPULAR↔TÍPICO 
 
Acontece que o popular de hoje é rejeitado como má cultura e o popular de 
ontem é definido como "tradicional". Curiosamente o que antes era só 
hegemónico e burguês é agora considerado como "popular". 
Estes processos sociais relacionam-se com a constante redefinição e 
com a necessidade de perpetuação da burguesia. Há uma constante 
necessidade de redefinição, de procura dessa autenticidade fugida, que a 
sociedade burguesa não encontra em si mesma. Isto não significa uma 
subvalorização de si própria, mas uma relação de amor-ódio perante as 
camadas sociais no seio das quais a sociedade burguesa procura 
autenticidade. 
 
2.ª Os românticos 
Os ciclos de renovação da antropologia foram sempre impulsionados por uma 
importação de modelos analíticos desenvolvidos no estrangeiro: 
 
Anos 20 do século XIX 
(OS ROMÂNTICOS) 
Almeida Garret 
e Alexandre 
Herculano 
(Exilados 
políticos na 
Inglaterra, 
durante as lutas 
liberais) 
Fascínio romântico 
pelas "antiguidades 
populares" para uma 
definição de uma 
nova nacionalidade. 
Recolhera
m contos e 
canções 
populares. 
 
3ª A «Belle Époque » (1871-1920) 
TEMA	3:	ANTROPOLOGIA,	FOLCLORE	E	CIÊNCIAS	SOCIAIS	
 
 
60 
Intensa criatividade científica de uma geração que acompanhou a gestação da 
República: Oliveira Martins, Adolfo Coelho, Teófilo Braga, Rocha Peixoto, Leite 
de Vasconcelos,... Desenvolveram, de forma académica, pela primeira vez, o 
estudo da cultura e das artes. Para eles, a cultura popular era uma 
sobrevivência de crenças antigas. 
A burguesia procurava, na história e na cultura popular, uma grandeza 
nacional perdida (o império de ultramar). Segundo João de Pina Cabral (1991) 
nunca se chegou realmente a desenvolver uma tradição colonial da 
antropologia. 
 
1875 SOCIEDADE DE GEOGRAFIA DE LISBOA (Serpa Pinto: 
1881, sobre as suas explorações na África) (Lopes Mendes: 
1886, sobre as posses portuguesas na Índia) (Manuel 
Ferreira Ribeiro:1877, sobre Santo Tomé e Príncipe). 
Anos 1920 ESCOLA DE ESTUDOS COLONIAIS (associada á 
Sociedade de Geografia de Lisboa) 
 
Nesta época, apenas se escreveu uma monografia sobre as colónias: 
-JUNOD, Henri (1962, or. Fra. 1898): The Life of A South African Tribe. 
Sobre os Thonga de Moçambique, um dos clássicos do africanismo. O seu 
autor foi um missionário metodista suíço. 
 
4ª O pós-guerra 
A partir de 1935, o regime ditatorial instituiu o estudo das colónias, com o 
objectivo de elaborar mapas etnológicos. Isto foi bem definido no Primeiro 
Congresso Nacional de Antropologia Colonial (Porto, 1934). Um dos seus 
autores foi Mendes Correia que utilizou um método antropométrico de campo. 
Foram enviadas missões para todas as colónias portuguesas, nomeadamente 
para África. Entre os impulsores destas missões destaca-se Joaquim do Santos 
Júnior (Pereira, 1988). Esta antropologia representava as tendências mais 
conservadoras das ideologias coloniais do regime. 
A partir de finais de 1950 produz-se uma nova antropologia colonial, 
protagonizada por Jorge Dias, que distancia, cada vez mais, do grupo de 
Mendes Correia (Porto). 
 
1952 Jorge Dias mudou-se para Coimbra, onde leccionou Etnologia e 
História da Geografia 
1956 Integrou-se na Escola de Administração Colonial. Fez uma viagem à 
Guiné, Moçambique e Angola 
1957 Jorge Dias foi convidado para dirigir as Missões de Estudo das 
Minorias Étnicas do Ultramar Português. Os seus assistentes foram: 
Margot Dias (esposa dele) e Manuel Viegas Guerreiro. O objectivo era 
realizar descrições etnográficas, mas também relatórios confidenciais 
sobre as condições sociais e políticas das colónias. 
1961 A Escola de Administração Colonial passoua denominar-se Instituto 
Superior de Ciências Sociais e Política Ultramarina. Aqui leccionou 
Antropologia Cultural, Etnologia Regional e Instituições Nativas 
 Leitor de língua portuguesa na Universidade de Santiago de 
Compostela. 
 
TEMA	3:	ANTROPOLOGIA,	FOLCLORE	E	CIÊNCIAS	SOCIAIS	
 
 
61 
Jorge Dias estudou os chopes do Sul de Moçambique, os Bóeres e 
Bosquímanes do Sul de Angola, mas o seu trabalho central foi dedicado aos 
macondes do Norte de Moçambique, escolha influenciada pelo facto do seu 
professor, o alemão Richard Thurnwald, ter estudado, nos anos 30, os 
macondes de Tanganica (Tanzânia tornou-se independente em 1964). A 
tensão política era intensa e, em 1964, começa o movimento pela 
independência de Moçambique. 
Marvin Harris também trabalhou em Moçambique com os thongas 
(1959), mas foi expulso, nesse ano. Em 1960, Charles Wagley (também da 
Columbia University) foi convidado, pelo Ministério, para substituir Harris, como 
acto de relações públicas e de reduzir a má impressão da expulsão de Harris. 
Jorge Dias acompanhou a Wagley por Angola e Moçambique. 
 Em 1960, inicia-se, no planalto maconde, o levantamento de Mueda. 
Nestas circunstâncias, o trabalho etnográfico tornou-se inviável. Viegas 
Guerreiro continuou, contudo, a estudar o sul de Angola, nos verões europeus 
de 1962-63 e 64. 
 Segundo João de Pina Cabral (1991: 35-36), Jorge Dias nunca 
conseguiu ultrapassar as limitações teóricas de base e não compreendia a 
teoria sociológica nem a antropológica. 
 
5ª O pós 25 de Abril 
Um autor e uma obra inauguram a antropologia sociocultural contemporânea 
em Portugal: 
-Cutileiro, José (1977): Ricos e pobres no Alentejo. Uma Sociedade Rural 
Portuguesa. Lisboa: Livraria Sá da Costa. 
 
José Cutileiro, formado em Oxford, introduz, em Portugal, os métodos 
modernos da antropologia social. Outros autores consolidaram esse caminho: 
Brian O´Neill, Jõao de Pina Cabral, Joaquim Pais de Brito, Raúl Iturra, Jorge 
Crespo e muitos outros que pertencem já à geração pós 25 de Abril. 
 
Os usos do popular na antropologia portuguesa 
Segundo Paulo Castro Seixas (2000), estas seriam as mudanças na utilização 
e no estudo da cultura “popular”, em Portugal: 
 
A ANTROPOLOGIA PORTUGUESA 
FINS DO S. XIX- 1º XX 1940, 50 1970- 
 Ex.: José Leite de 
Vasconcelos 
 Paradigmas: 
etnografia e etnologia; 
difusionismo e 
evolucionismo. 
 “Estudo do povo 
português” 
 “Paixão lusitanista” 
 Popular: oraliteratura 
(contos...) 
 Estudam o que as 
pessoas dizem. 
 Ex.: Jorge Dias 
 Paradigma: 
antropologia 
 Interesse científico 
pelo folclore. 
 Espaço de estudo: 
aldeia e cidade 
(rituais aldeãos em 
espaço urbano). 
 Folclore como género 
da antropologia. 
 Objectos de estudo 
preferenciais: 
 Ex.: José Cutileiro, 
Brian O´Neill 
 Antropologia social 
tematizante. 
 Espaço: a aldeia 
(presente com 
diferenças e conflitos) 
e a cidade. 
 Abandono da noção 
de “popular”, pela 
antropologia, pois não 
é um universo 
simbólico autónomo. 
TEMA	3:	ANTROPOLOGIA,	FOLCLORE	E	CIÊNCIAS	SOCIAIS	
 
 
62 
 Recolhas de dados 
nas férias e nas 
viagens. 
 Espaço de estudo: a 
aldeia, o rural, o 
“primitivo” e o 
“comunitário”... 
 Idade dos 
informantes: os mais 
velhos. 
 Sem preocupação 
pela estrutura social e 
pela posição dos 
informantes na 
estrutura de poder. 
 O passado era 
entendido como 
igualitário. 
 A “cultura popular” 
era uma 
sobrevivência de um 
passado remoto, cuja 
sobrevivência estava 
ameaçada. 
 Interesse social e 
político: demonstrar a 
origem lusitana ou 
celta da nação 
portuguesa. 
 Existência de alguns 
etnógrafos da cultura 
aldeã, na cidade. 
tecnologia e ritual, 
pois o Estado Novo 
pretendia 
monumentalizar o 
trabalho e a fé. 
 Monografia: cultura 
popular, enquanto 
viver e não só saber. 
 Passagem da cultura 
popular à cultura 
quotidiana. 
 Interesse político: 
legitimar o Estado 
Novo. 
 O que era a “cultura 
popular” converteu-se 
numa estratégia 
eficaz para legitimar 
uma região, cidade, 
vila, grupo 
profissional, estrato 
social, família, casa... 
 O que era a “cultura 
popular” legitima a 
“cultura urbana”. 
 Converte-se a 
denominada “cultura 
popular” em recurso 
estratégico do 
desenvolvimento 
local. 
 
Em CASTRO SEIXAS, P. (2000): “Usos do Popular: da paixão ao desenvolvimento 
estratégico”, em Actas do Congresso Cultura Popular. Maia: Câmara Municipal da Maia, pp. 
277-284. 
 
De acordo com João Leal (2000), a cultura popular, em Portugal, foi entendida 
como ruralidade e testemunho do passado. A imagem que os trabalhos sobre 
esse tema trespassavam era textual e historicista (ex. literatura oral), mas, 
posteriormente, essa imagem converte-se em táctil e objectual (ex. tecnologias 
tradicionais). Nela, o povo era o guardador de textos criados anonimamente, 
em remotos tempos étnicos. Este era um olhar decorativista que se 
coreografou, no Estado Novo, com António Ferro. Naquela altura, a cultura 
popular era entendida como um substrato da nacionalidade (Leal, 2000) . 
 Sobre esse tempo, Kymberly DaCosta Holton (2005) vai estudar os 
ranchos folclóricos e os usos políticos dos mesmos no Estado Novo. Os 
ranchos folclóricos eram grupos de músicos e dançantes amadores que foram 
utilizados como emblema identitário nacional português e propaganda do 
regime. Com a queda da ditadura recuperaram um papel importante tanto em 
Portugal como nos seus contextos de diáspora. 
TEMA	3:	ANTROPOLOGIA,	FOLCLORE	E	CIÊNCIAS	SOCIAIS	
 
 
63 
 
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Alcalá) 
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TEMA	4:	BREVE	HISTÓRIA	DAS	TEORIAS	ANTROPOLÓGICAS	
 
 
66 
© APONTAMENTOS DE ANTROPOLOGIA SOCIOCULTURAL 2011-2012 – Prof. Dr. Xerardo 
Pereiro – Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) – antropólogo – Correio 
electrónico: xperez@utad.pt Web: www.utad.pt/~xperez/ 
 
TEMA 4: BREVE HISTÓRIA DAS TEORIAS 
ANTROPOLÓGICAS 
 
Objectivos: 
-Conhecer o desenvolvimento histórico das teorias antropológicas 
fundamentais para poder contextualizar melhor a compreensão do conceito 
antropológico de cultura. 
-Enquadrar os principais paradigmas e escolas antropológicas. 
-Familiarização com a genealogia das ideias dos principais antropólogos. 
-Explorar a articulação entre os diferentes paradigmas da antropologia 
sociocultural. 
-Contextualizar historicamente o significado dos contributos teóricos da 
antropologia. 
 
Índice: 
4.1. Apresentação 
4.2. Os primórdios da antropologia 
4.3. O evolucionismo. 
4.4. O difusionismo 
4.5. O particularismo histórico 
4.6. A escola de cultura e personalidade 
4.7. O funcionalismo 
4.8. O neoevolucionismo, a ecologia cultural e o materialismo histórico 
4.9. O estruturalismo 
4.10. A antropologia simbólica, a antropologia cognitiva e a antropologia 
semântica 
4.11. A antropologia pós-moderna 
Bibliografia 
Sítios em Internet 
Anexo I: A antropologia moderna e pós-moderna 
Anexo II: Correntes da antropologia pós-moderna 
Anexo III: Antigos e novos paradigmas em antropologia 
Anexo IV: Quadro de síntese da história das teorias da cultura 
 
4.1. APRESENTAÇÃO 
 
“A teoria é o par inseparável da etnografia” (Peirano, 2006: 7). 
 
De acordo com Ubaldo Martínez Veiga (2008: 14) a primeira história da 
antropologia é obra de Haddon em 1910, o que demonstra já uma antiga 
preocupação dos antropólogos por construir a história da disciplina, uma forma 
de reforçar a identidade dela. 
Neste capítulo abordamos de forma breve uma história da antropologia 
desde as teorias da cultura. Centramos mais nas escolas teóricas, na biografia 
de alguns representantes dessas escolas e da sua conquista metodológica e 
teórica. Interessa-nos ver de que forma o conceito antropológico da cultura foi-
TEMA	4:	BREVE	HISTÓRIA	DAS	TEORIAS	ANTROPOLÓGICAS	
 
 
67 
se construíndo e de que forma a perspectiva teórica condiciona os métodos de 
trabalho de campo do antropólogo. Ao longo do capítulo abordaremos o olhar 
que a antropologia foi construíndo sobre os “outros” e o reconhecimento da 
diversidade cultural, uma das grandes virtudes da antropologia. Não 
entraremos no debate sobre a origem histórica da antropologia como ciência, 
mas sim que, sucintamente, faremos referência aos primórdios e a uma proto-
antropologia científica, sublinhando que a história da antropologia não é a 
história da humanidade (Martínez Veiga, 2008: 20). 
 Pensamos que a história da antropologia ajuda a ver como as ideias 
actuais são algo efímeras, não apenas a construir uma genealogia intelectual 
dos seus autores e correntes de pensamento. Além mais a história das teorias 
antropológicas em particular ajuda a contextualizar estas no tempo e no espaço 
em que foram criadas,voltando assim sobre si própria de uma forma reflexiva e 
não apenas cronística. Para realizar este exercício de uma forma aprofundada 
recomendamos a leitura da obra do antropólogo e historiador da antropologia 
George Stocking (1982, 1992, 1996), a do antropólogo Adam Kuper (1973) e 
também a do antropólogo Ubaldo Martínez Veiga (2008). 
 
4.2. OS PRIMÓRDIOS DA ANTROPOLOGIA 
Nos livros sagrados da humanidade, hebreus, muçulmanos e hindus, 
encontramos documentação sobre os costumes de muitas sociedades da 
antiguidade. Essa documentação permitiu que, posteriormente, antropólogos 
estudassem essas sociedades. No entanto, é apenas com os gregos que 
surgem as primeiras reflexõe sobre os encontros entre culturas (lembremos 
que os gregos colonizaram amplas áreas do Mediterrâneo). 
 No século V a.C., os trabalhos de Heródoto mantêm um interesse 
antropológico muito desenvolvido. Herodoto viajou e visitou outros povos e 
culturas, interessando-se especialmente pelos costumes do casamento e os 
modos de subsistência. Descreveu, entre outras, a sociedade egípcia, 
comparando-a à sociedade grega. Heródoto é considerado também o pai da 
história. Escreveu sobre os “bárbaros”: considerava-os inferiores aos gregos, 
chegando a descreve-los como figuras com um só olho e com os pés virados 
para atrás. Desde o ponto de vista teórico, relacionou zonas climáticas e 
culturais. Também Platão, Aristóteles (sobre as cidades gregas), Jenofonte 
(sobre a Índia) e outros se dedicaram à descrição dos costumes doutras 
culturas. 
 Entre os romanos podemos também observar uma especulação 
antropológica. O poeta Lucrécio tentou descobrir as origens da religião, das 
artes e do discurso. Tácito descreveu as tribos germanas, baseando-se nos 
relatos dos soldados e viageiros; a sua visão é compreensiva, salientando o 
vigor dos germanos em contraste com os romanos da sua época. 
 Com a chegada do cristianismo, é introduzida, na escrita sobre outras 
culturas, uma perspectiva etnocêntrica. Santo Agostinho, um dos pilares 
teológicos da nova época, descreveu a Roma e a Grécia clássicas como 
“pagãs” e moralmente inferiores ás sociedades cristianizadas. A sua obra 
transparece uma intuição do “tabu do incesto” como norma social que garante 
a coesão da sociedade. No entanto, procurou, constantemente, explicações 
sobrenaturais para a vida sociocultural. 
 Na Idade Media, o domínio absoluto no mundo das ideias foi da Igreja 
Católica, ficando a especulação antropológica reduzida a considerações 
TEMA	4:	BREVE	HISTÓRIA	DAS	TEORIAS	ANTROPOLÓGICAS	
 
 
68 
teológicas. Até ao final do feudalismo o renascimento antropológico não se 
verificou. 
 Nos séculos. XVI e XVII, aumentam, consideravelmente, os 
descobrimentos geográficos e os contactos dos europeus com outras culturas. 
Será nesta altura (século XVI), quando se confirme a esfericidade do planeta 
com a primeira volta ao mundo de Juán Sebastián El Cano e Juán de La Cosa. 
Nessa época, as viagens ultramarinas incluiam, nas suas expedições, 
escritores encarregados de elaborar uma etnografia com fins administrativos, 
económicos e missionários. Foi este o caso do administrador francês Jean 
Bodin (1530-1596) que estudou os costumes dos povos conquistados, para 
explicar as dificuldades que os franceses tinham para administrar esses povos. 
 Outro exemplo foi o dos missionários jesuítas na América (ex.: 
Bartolomé de las Casas e o Padre Acosta) que escreveram as “Relaciones 
Jesuíticas” e elaboraram a “teoria do bom selvagem”, segundo a qual os índios 
tinham uma natureza moral pura que devia ser aprendida pelos ocidentais. 
Esta teoria idealizava, com nostalgia, uma cultura mais próxima do 
estado“natural”. 
A expansão foi justificada por motivações económicas e religiosas, 
assim o confirma Vasco da Gama na sua primeira viagem à Índia, afirmando 
aos locais que vinha para arranjar “cristãos e especiarias”. A visão europeia era 
que estos povos não tinham lei, nem fé, nem senhor (Bestard e Contreras, 
1987; Loureiro, 1991). 
No século XVI, o viageiro Marco Polo elaborou informações críticas 
sobre Oriente. Outro pensador social importante foi Gianbattista Vico (1668-
1744) que defendeu que os humanos podiam reconhecer a sua própria história 
porque eram autores da mesma (compreender o passado, recreando-o 
imaginativamente). 
 A Ilustração francesa aderiu às teorias da evolução unilinhar e do 
progresso social. Todas as sociedades passariam por uma série de estádios 
fixos: primitivismo, selvagismo e civilização. Montesquieu (1689-1755), Voltaire 
(1694-1778), Condorcet (1743-1794), Adam Smith (1723-1790), Adam 
Ferguson (1723-1816) e William Robertson (1721-1793) foram os autores de 
maior destaque. Montesquieu escreveu “Lettres Persanes” (1721) e “L´Espirit 
des Lois” (1748), obras em que defendeu a diversidade de instituiçoes e de 
governos existentes e onde afirma a ideia de que cada cultura é um conjunto 
lógico. Outro autor importante foi J. J. Rousseau (1712-1778) que publicou a 
obra “Émile” (1762) e defendeu, de novo, a “teoria do bom selvagem”, segundo 
a qual os humanos são intrinsecamente bons: a sociedade é que os corrompe. 
Para recuperar a bondade primitiva e original dos humanos é preciso voltar à 
natureza. Todos estes autores procuravam justificar a nova sociedade 
industrial. Os ilustrados pensavam que era possível encontrar leis gerais, como 
nas Ciências Naturais, para explicar a sociedade (da física). 
 Durante o século XIX, aumentaram os estudos empíricos de povoações 
primitivas. Outros aspectos da mudança de atitude relativamente a outras 
culturas foram o aparecimento de sociedades etnológicas (na Europa e na 
América), a criação de museus e de revistas antropológicas. 
 
4.3. EVOLUCIONISMO 
Na segunda metade do séc. XIX, nasce a antropologia como campo 
profissional. Esta foi uma época de hegemonia mundial europeia (colonialismo), 
TEMA	4:	BREVE	HISTÓRIA	DAS	TEORIAS	ANTROPOLÓGICAS	
 
 
69 
em que predominva um clima intelectual evolucionista e uma influência das 
ciências naturais nas ciências sociais. 
 Uma das teorias dominantes foi o evolucionismo uni-linhar que defendia 
uma evolução paralela. De acordo com esta teoria, as culturas foram criadas, 
independentemente, seguindo um percurso por estádios fixos: barbárie, 
primitivismo, selvagismo e civilização. Esta posição era similar à da Ilustração. 
Na Ilustração, a ideia de progresso foi central; e para o evolucionismo, as 
culturas encontravam-se em movimento, através de diferentes etapas de 
desenvolvimento, até alcançarem a etapa de desenvolvimento da cultura 
ocidental. Todas as culturas evoluiriam da mesma maneira e passariam pelos 
mesmos estádios. Seria, pois, necessário pensar numa evoluçao unitária do 
conjunto da humanidade. 
A evolução das culturas era resultado da evolução biológica, que tinha 
como princípio fundamental o princípio da sobrevivência dos mais aptos. Esta 
era uma ideia darwinista. Darwin (1809-1882) tinha escrito, em 1859, a obra “A 
Origem das Espécies”. 
 
Antropólogos evolucionistas: 
 
J.J. Bachofen (1815-1887), um jurista suíço, foi o primeiro a chamar a atenção 
para sociedades que seguem a linha de descendência através da mulher 
(culturas materlinhares). Imaginou que nessas sociedades não se reconhecia a 
paternidade; "construiu" um mundo greco-latino matriarcal. 
 
J.F.McLennan (1827-1881) (escocês) escreveu "Studies in Ancient History" e 
“Primitive Marriage” (1865). Nesta última obra, afirmou que a forma mais antiga 
de família era caracterizada pelo matriarcado. Observou a simulação do rapto 
da noiva pelo noivo, para logo atingir o casamento. A si se devem os termos 
“exogamia” (matrimónio fora do próprio grupo) e “endogamia” (matrimónio 
dentro do próprio grupo). 
 
Henry Sumner Maine (1822-1888) foi um etnólogo jurídico, membro do 
conselho britânico do vice-rei da Índia. Encontrou semelhanças entre as 
antigas leis de Roma, da Índia e da Irlanda (sociedades patrilinhares). O seu 
livro mais famoso é “Ancient Law” (1861),no qual defendeu que a mais antiga 
forma de família era a família patriarcal dos indo-europeus. Deixou-nos 
conceitos como: “agnação” (reconhecimento da relação por descendência, 
através dos varões) e “cognação” (reconhecimento da relação de 
descendência, através de um mesmo pai e uma mesma mãe). Defendeu que, 
na infância da humanidade, não havia nenhum tipo de legislação. Outra teoria 
que elaborou foi a do movimento de todas as sociedades do “status” para o 
“contrato”. O “status” seria uma condição própria das sociedades primitivas, de 
acordo com a qual as relações sociais se limitavam a relações de família (com 
supremacia do varão mais velho). Os indivíduos não seriam livres: estariam 
determinados pelo nascimento e não era possível mudar essa determinação 
com um acto de vontade pessoal. O “contrato” seria uma condição 
característica das sociedades progressivas e complexas. Os indivíduos, 
independentemente e separados do próprio grupo, formam parte de 
associações voluntárias, nas quais podem ocupar livremente a sua posição e 
determinar as suas próprias relações. 
TEMA	4:	BREVE	HISTÓRIA	DAS	TEORIAS	ANTROPOLÓGICAS	
 
 
70 
 
Robertson-Smith (1846-1894) foi um erudito que interpretou o Antigo 
Testamento (um dos primeiros, no seu contexto histórico). No seu livro "The 
Religion of the Semites" (1889), diz que, nas religiões tradicionais não 
reveladas, o rito é mais importante que o dogma. 
 
James G. Frazer (1854-1941) foi o primeiro a consciencializar o público da 
importância da antropologia. No seu livro "Golden Bough", (“O ramo dourado”: 
um estudo sobre a magia e a religião, 12 vols.) mostra interesse pela religião e 
elabora a teoria da "magia simpática" – homeopática – (o simbolismo através 
do qual os ritos mágicos imitam o efeito que tentam produzir) e da “magia por 
contacto” (por relação de contacto, ex.: Vudú, nas Caraíbas). Estas teorias 
foram criticadas por Frazer como sendo pensamentos erróneos e ciência 
bastarda. 
-Etapas evolutivas da humanidade: MAGIARELIGIÃOCIÊNCIA 
 
 
LEWIS HENRY MORGAN (1818-1881), (EUA) 
 Foi membro de uma sociedade de estudantes que se propunha imitar os 
rituais dos índios iroqueses, isto levou-o a conviver certo tempo com eles. 
 Advogado 
 Trabalho de campo com os índios seneca (iroqueses) 
 (1851): League of the Iroquois. Estudo das danças, religião, vivendas, 
organização política, parentesco e família. 
 (1870): Systems of Consanguinity and Affinity of Human Family. Estudo 
comparativo das terminologias de parentesco, em 139 sociedades. A sua 
teoria salienta a evolução de todas as sociedades da promiscuidade 
(poligamia) para a monogamia. 
 (1877): Ancient Society (1971: La Sociedad Primitiva. Madrid: Ayuso) (1976: 
A Sociedade Primitiva. Lisboa: Presença). Influenciado pelo evolucionismo 
biológico de Darwin, defende a teoria de que, no desenvolvimento histórico 
das culturas, acontecem as seguintes mudanças: 
 
 Selvagismo (caça e recoleção) Barbárie (cerâmica, agricultura) Civilização 
(escrita) 
 O parentesco é o princípio organizador da sociedade. 
 Engels apoiou-se nesse princípio para escrever os seus livros, sobretudo “A 
origem da família, a propriedade e o Estado”. 
 Defendeu que a mudança tecnológica determinava a mudança social, mas 
não analisou essa mudança. 
 
 
Elaborou também uma teoria dicotómica sobre a “societas” e a “civitas” e a 
passagem obrigatória, em todas as culturas, de uma para a outra. Na 
“societas”, o princípio de parentesco fundamenta todas as relações 
estratégicas ou a maioria delas. Como forma de organização, é preciso pensar 
na “gens” ou na “tribo”. Na “civitas”, as realções ideológicas e económico-
políticas orientam e limitam as funções de parentesco. Neste último caso, 
pensa-se no “Estado”, baseado num território e nas relações de propriedade. A 
TEMA	4:	BREVE	HISTÓRIA	DAS	TEORIAS	ANTROPOLÓGICAS	
 
 
71 
cidade seria, neste último caso, o fundamento do “Estado” e representaria a 
sua unidade. 
 
 
 
EDWARD BURNETT TYLOR (1832-1937) (Reino Unido) 
 Criador da antropologia social britânica. 
 Fundou o método comparativo em antropologia. 
 1861: Livro sobre México. 
 1871: Primitive Culture I 
 1874: Primitive Culture II 
 1884: Leitor de antropologia em Oxford. 
 Chegou a ser conservador de museu e catedrático de antropologia social, em 
Oxford. 
 Tylor, contrariamente de Morgan, não se preocupa com os mecanismos de 
mudança, mas sim com a "sobrevivência” de costumes e ritos antigos que, de 
acordo com ele, não tinham sentido comum. Defendeu uma reforma moral. 
Sublinhou que os aborígenes australianos eram sobreviventes da pré-história. Os 
“survivals” deviam ser identificados, através de um estudo histórico-cultural. 
 Interessou-se, particularmente, pela religião e pelo animismo. A evolução da 
religião seguiria a linha: 
animismo►feiticísmo►idolatria►politeísmo►monoteísmo. 
 Criou uma das definições mais divulgadas de cultura como objecto da 
antropologia: “A cultura ou civilização, em sentido etnográfico alargado, é aquele 
todo aquele complexo que inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, o 
direito, os costumes, e quaisquer outros hábitos e capacidades adquiridos pelo 
homem, enquanto membro de uma sociedade.” 
 Evans Pritchard (1987, or. 1980: Historia del pensamiento antropológico. Madrid: 
Cátedra), disse que Tylor pretendia converter a antropologia numa ciência de 
estatísticas, tabulações e classificações. Estudou 350 culturas, em fontes escritas, 
procurando as regras de matrimónio e descendência. Correlacionou também 
sistemas de casamentos e sistemas de residência (materlinhal, neolocal e 
paterlocal), para elaborar uma teoria da passagem de culturas maternas a culturas 
paternas e outra da sobrevivência de costumes de etapas anteriores. 
 Tylor foi filho da sua época e, por isso, defendeu a missão de civilização do 
imperialismo britânico. Desconhecia o princípio do relativismo cultural e não 
pensou no direito de outros a conservar a sua própria cultura. 
 Tylor influenciou o antropólogo Frazer que escreveu, em 1890, The Golden Bough. 
Neste livro, Frazer elabora a teoria evolucionista, segundo a qual os humanos 
percorrem as seguintes etapas: magiareligiãociência. A última etapa atribui um 
poder e validez superior. Frazer é conhecido porque, certa vez, lhe perguntaram se 
já tinha conhecido algum selvagem, ao que ele respondeu: “Livre-me Deus de 
semelhante atrocidade”. 
 
Visão crítica do evolucionismo 
 Os dados não falam por si próprios: é preciso organizar os dados, em 
relação à teoria. Os dados são apenas barulho, se não aportam um 
contributo à teoria antropológica. 
 Foram quase todos antropólogos de gabinete (só Morgan fez algo de 
trabalho de campo com os iroqueses), sem sair para o terreno. 
Trabalharam, fundamentalmente, com fontes documentais e com dados 
fornecidos por outros (misionários, agentes coloniais, viageiros, 
TEMA	4:	BREVE	HISTÓRIA	DAS	TEORIAS	ANTROPOLÓGICAS	
 
 
72 
comerciantes). Têm, contudo, o mérito de tentarem fazer da antropologia 
uma ciência de rigor. 
 Introduziram o método comparativo, na antropologia. 
 Foi o primeiro paradigma da antropologia. 
 Um dos seus eixos foi o das semelhanças e as diferenças culturais. Ainda 
que os evolucionistas se tenham preocupado mais com as semelhanças do 
que com as diferenças entre os grupos humanos. É complicado abarcar um 
objecto tão alargado: é começar a casa pelo telhado. 
 Para eles, as sociedades eram organismos naturais que evoluíam. 
 O seu modelo de civilização era a sociedade vitoriana inglesa (Ocidente): o 
resto do mundo tinha um desenvolvimento inferior. 
 Pensaram, erradamente, que os “povos primitivos” teriam que elaborar 
instituições semelhantes às da sua tecnologia. 
 Partem muitas vezes de supostos etnocéntricos. 
 A teoria da sobrevivência de costumes é uma perspectiva errada, porque, 
na realidade, muitos dos costumes foram inventados recentemente ou 
provocados pelos contactoscom ocidente. 
 Os evolucionistas foram os primeiros a iniciar os grandes temas da 
antropologia: parentesco, religião, política, economia, etc. 
 Estudaram mais de 300 sociedades, através do método comparativo. Este 
trabalho foi continuado, nos E.U.A., por Murdock no seu projecto “Humam 
Relations Area”. 
 Os dados apresentados delatam um desejo de rigor, mas encontram-se, 
frequentemente, abstraídos do seu contexto. Os dados não são meramente 
empíricos: tem significado. 
 Para os evolucionistas, para que aconteça uma mudança tem que haver um 
lugar, um espaço concreto, a identidade de um grupo em concreto: não a 
humanidade, no seu conjunto. 
 A crença não é um erro, como afirmava Tylor. A crença dá sentido à 
experiência humana. A mente não pode esperar que a ciência resolva todos 
os seus problemas, daí que se alimente a crença (tal disse Durkheim). 
 
4.4. O DIFUSIONISMO 
 Foi uma reacção contra o evolucionismo, mas coexistiu com ele. Foi uma 
escola antropológica que tentou entender a natureza da cultura, em termos 
da origem da cultura e da sua extensão de uma sociedade a outra. O 
empréstimo cultural seria um mecanismo básico de evolução cultural. 
 Defendeu que as diferenças e semelhanças culturais eram causa da 
tendência humana para imitar e a absorver traços culturais. 
 A diversidade cultural explica-se pelas relações de empréstimo e não pela 
invenção independente. 
 Bastian (1826-1905) (médico de um barco) interessou-se pelas crenças 
religiosas, mitos e rituais semelhantes. As suas conclusões levaram-no a 
falar de "unidade psíquica da Humanidade". Ratzel (1844-1904), oposto às 
teorias de Bastian, interessou-se mais pelos utensílios do que pelas ideias: 
utensílios inventados em lugares concretos e que se difundiam, para outros 
lugares, através das migrações. Procurou semelhanças entre objectos. Os 
difusionistas afirmaram que todos os objectos básicos e elementos 
TEMA	4:	BREVE	HISTÓRIA	DAS	TEORIAS	ANTROPOLÓGICAS	
 
 
73 
culturais, tais como o parentesco, o culto solar, a agricultura, a construção 
de pirâmides, etc., foram criados no Egipto. 
 Outros autores: no Reino Unido, Grafton Elliot Smith (1871-1937, 
antropólogo físico), William James Perry (1887-1949). W.H. Rivers (1864-
1922) integrou a expedição que estudou os nativos do Estreito de Torres. 
Na Alemanha, destacam-se: Fritz Graebner (1877-1934) que publicou, em 
1911, um manual de antropologia (“Methode del Ethnologie”); e o padre 
católico Fr. Wilhelm Schmidt (1868-1959), fundador da revista Anthropos, 
que inverteu as séries evolutivas dos evolucionistas, pois tentou demonstrar 
que a religião tinha origem no monoteísmo – ex.: pigmeus caçadores e 
recolectores. Os alemães postularam a formação de diversas culturas, a 
partir de poucos “círculos culturais”. Essas culturas estender-se-iam a 
outras culturas sob forma de traços, através da migração de populações e 
da melhoria dos meios de transporte. 
 Crítica ao difusionismo: Apesar da sua grande importância na recolha de 
dados, salientou demasiado a forma (unicamente uma dimensão das 
características culturais), em detrimento do significado que cada 
característica tem para os membros de cada cultura em particular. Ignorou 
também as relações com outras características. 
 
4.5. O PARTICULARISMO HISTÓRICO 
Escola norte-americana, dominada por Boas, que rejeitou o evolucionismo e 
dominou a antropologia durante a primeira metade do séc. XX. O paradigma 
fundamental era que cada cultura tem uma história particular e que a difusão 
de traços culturais pode ter lugar em qualquer direcção. A evolução pode 
acontecer também do complexo para o simples. O relativismo cultural é uma 
afirmação antropológica básica e a investigação antropológica deve estar 
baseada no trabalho de campo, no terreno do próprio antropólogo. 
 
FRANZ BOAS (1858-1942), alemão de origem judaica, emigrou para os 
E.U.A., onde desenvolveu a sua carreira científica. 
 Formado na Alemanha, como geógrafo e psicofísico, estudou geografia com 
Friedrich Ratzel (1844-1904) que afirmava que o meio ambiente era o factor 
determinante da cultura. 
 Viajou até ao Árctico e descobriu que diferentes grupos de esquimós 
controlavam e exploravam meios semelhantes de maneiras diferentes. 
 Deu aulas na Universidade de Columbia e foi director do American Museum 
of Natural History (New York). 
 Chegou a formar antropólogos como Melville Herskovits, Alfred L. Kroeber 
(1876-1960), Robert Lowie (1883-1957), Edward Sapir (1884-1931), 
Margaret Mead (1901-1978), Ruth Benedict (1887-1948) e Clyde Kluckhohn 
(1905-1960). 
 Para Boas, a tarefa do antropólogo era investigar as tribos primitivas que 
careciam de história escrita, descobrir restos pré-históricos, estudar tipos 
humanos e a linguagem. Cada cultura teria a sua própria história. Para 
compreender a cultura teríamos que reconstruir a história de cada cultura. 
 Defendeu que não há culturas superiores nem inferiores (relativismo 
cultural). Os sistemas de valores devem compreender-se dentro do contexto 
de cada cultura e não de acordo com os padrões da cultura do antropólogo. 
TEMA	4:	BREVE	HISTÓRIA	DAS	TEORIAS	ANTROPOLÓGICAS	
 
 
74 
 Estudou as teorias da evolução, sobre as quais se mostrou céptico, e 
defendeu a difusão da cultura. 
 Impulsionou a ideia de que os antropólogos deviam dominar as línguas dos 
povos estudados, com o objectivo de conhecer o mapa da organização 
básica do intelecto humano. 
 Criticou o evolucionismo e defendeu que os mesmos efeitos poderiam 
dever-se a diferentes causas. Também defendeu que muitas das 
semelhanças culturais eram originadas pela difusão, mais que pela 
invenção independente, e que, em muitos casos, a evolução não avança do 
simples para o complexo, antes o contrário (ex.: formas de arte, linguagem, 
etc.). 
 Esforçou-se por estudar as culturas índias dos EUA, porque estavam em 
risco de extinção. 
 Em vez da prática evolucionista de enquadrar dados etnográficos em 
categorias pré-definidas, Boas salientou a necessidade de um cuidadoso e 
intensivo estudo em primeira-mão, livre de todo prejuízo ou preconceito. As 
generalizações e as leis surgiriam depois de ter os dados apropriados. 
 Em contraste com os difusionistas alemães, Boas defendia que a difusão 
não se processava, apenas, do centro para a periferia, mas em qualquer 
direcção, entre os diversos grupos humanos. 
 
 
DISCÍPULOS DE FRANZ BOAS 
CLARK WISSLER (1870-1947) elaborou uma teoria sobre a distribuição da cultura por 
áreas circulares. De acordo com este autor, as culturas marginais apareciam onde os 
traços culturais de fronteira se interrelacionam. 
PAUL RADIN (1883-1959). Foi o mais crítico com Boas. O seu principal argumento era 
que os boasianos salientavam muito os aspectos materiais da cultura, ignorando o 
significado humano da cultura como importante elemento de interpretação. 
CLYDE KLUCKHOHN (1905-1960). Defendeu o estudo global da cultura. Criou o 
conceito de valores orientadores ou princípios básicos que ordenam e orientam a 
cultura no seu conjunto. Esta perspectiva também aparece com os funcionalistas 
britânicos. 
R. LOWIE (1883-1957) 
 
 
 
4.6. ESCOLA DE CULTURA E PERSONALIDADE 
 Escola dos E.U.A. coetânea ao funcionalismo britânico (Malinowski e 
Radcliffe Brown). 
 Fundada por discípulas de Franz Boas: Ruth Benedict e Margaret Mead, 
inspiradas em Sigmund Freud (psicanálise) e no filósofo Nietzsche. 
 Tentaram interpretar as culturas em termos psicológicos de personalidade 
básica. O seu paradigma central é que uma personalidade básica é 
partilhada por todos os membros de uma cultura. 
 De acordo com Margaret Mead (1968) existiriam 3 tipos de culturas: 
a) Culturas pós-figurativas: onde os filhos aprendem, em primeiro lugar, 
com os pais. O novo é uma continuação e repetição do velho, negando-
se a mudança. Os velhos e os avôs têm muita importância. A mobilidade 
social é reduzida e o passado forma um continuum com o presente e o 
futuro.Cultura da família extensa. 
TEMA	4:	BREVE	HISTÓRIA	DAS	TEORIAS	ANTROPOLÓGICAS	
 
 
75 
b) Culturas co-figurativas: quebram o sistema pós-figurativo. Os jovens 
rejeitam o modelo dos adultos e aprendem formas culturais inovadoras. 
Os adultos acabam por verificar que os seus métodos são insuficientes 
ou pouco adequados à formação do jovem e à sua integração na vida 
adulta. Os jovens conseguem a mobilidade social por si desejada; 
ignoram os padrões dos adultos ou são-lhes indiferentes. Cultura da 
família nuclear. Os velhos e os seus conhecimentos deixam de ser 
pensados como necessários. 
c) Cultura pré-figurativas: os adultos aprendem com os seus filhos. Nesta 
nova sociedade, só os jovens estão à vontade, pois dominam os 
progressos científicos. Em extremo, os adultos não tem descendentes e 
os filhos não têm antepassados. O futuro é agora e produz-se uma 
quebra entre uns e outros. O que interessava aos adultos já não 
interessa aos jovens. 
 
Ruth Benedict (1971; 1977), seguindo ao filósofo Nietszche, distinguiu dois 
tipos de culturas, entre os índios norte-americanos: 
 
CULTURAS DE TIPO “APOLÍNEO” CULTURAS DE TIPO “DIONISÍACO” 
 Ex.: Índios “pueblo”, os zuni. 
 Conformistas. 
 Pacíficos. 
 Solidários. 
 Respeitadores de outrem. 
 Comedidos na expressão dos 
seus sentimentos. 
 Símbolo da lógica, a razão e a 
ordem. 
 Destacam pelo seu equilíbrio. 
 
 Ex.: Índias das planícies, os 
kwakiutl. 
 Ambiciosos. 
 Individualistas. 
 Agressivos e violentos em 
ocasiões. 
 Desmessura em termos 
afectivos. 
 Símbolos da emoção, a 
apreciação dos excessos e o 
prazer. 
 Destacam o extâse. 
 
Um conceito chave desta escola é o de configuração (Benedict, 1971), que 
definia o conjunto de ideias que possui uma cultura, são os protótipos culturais 
de um determinado grupo social. Na mesma linha George M. Foster (1976) 
criou o conceito de orientação cognitiva para definir as propostas que fazem 
com que as pessoas vejam as coisas de uma ou outra forma, isto é, tenham 
uma visão do mundo. E em relação com esse conceito também é preciso situar 
o de eidos (Bateson, 1990), que define os princípios gerais que dão coerência 
a um sistema de crenças, um padrão de conhecimento que faz com que as 
crenças funcionem, ainda com contradições. 
 
4.7. O FUNCIONALISMO 
 
Os sociólogos franceses e a sua influência 
Influeciam, profundamente, os antropólogos britânicos do ínicio do século XX 
(como Malinowski e Radcliffe-Brown). Provocaram o abandono da arqueologia 
e da antropologia física pela antropologia social. 
 Émile Durkheim (1858-1917) foi um grande inspirador dos estudos 
antropológicos. Na sua revista "L´Année Sociologique"(1898-...), seguiu o 
TEMA	4:	BREVE	HISTÓRIA	DAS	TEORIAS	ANTROPOLÓGICAS	
 
 
76 
sociólogo britânico Herbert Spencer, afirmando a independência dos factos 
sociais (regras de comportamento, normas, critérios de valor, expectativas dos 
membros) relativamente à consciência dos indivíduos que formam a sociedade. 
Na expressão da individualidade, quebramos as normas, quer por impulso, 
quer de forma calculada. As normas são diferentes das expressões da 
individualidade: podem ser sociais (o que a gente acredita que deveria 
acontecer) ou estatísticas (o que normalmente acontece). O comportamento 
social apropriado é uma reacção ante pressões complexas. Durkheim escreveu 
"De la Division du Travail Social"(1893) e "Formes Elémentaires de la Vie 
Religieuse"(1912). Nesta última obra, dedicada aos aborígenes australianos, 
afirma que o totemismo é a religião mais antiga e que o ritual reflecte a ordem 
social e venera a sociedade. 
 Foram contemporâneos de Durkheim: Marcel Mauss (estudou o 
intercâmbio de prendas como princípio das relações sociais, processo 
actualmente denominado “reciprocidade”), Van Gennep (estudou vários tipos 
de rituais, sobretudo os rituais de passagem) e Max Weber (1864-1920). 
Marcel Mauss era sobrinho de Durkheim e aluno dele, erudito do sânscrito e 
historiador das religiões. Mauss era judeu e na segunda guerra mundial foi 
molestado pelos nazis durante a ocupação de França. Em antropologia é 
incontornável o seu estudo sobre a “dádiva”. Um dos seus discípulos foi o 
famoso antropólogo Louis Dumont (Evans-Pritchard, 1987: 240-244). 
 
A introdução dos estudos de campo 
No final do séc. XIX, generalizou-se a ideia da procura de dados próprios, em 
vez da análise de documentação elaborada por terceiros (ex.:viageiros). Entre 
1883 e 1884, Franz Boas estudou os esquimós, e, entre 1897 e 1902, Jesup 
North Pacific estudou a relação entre os aborígenes da Ásia Norte-oriental e os 
ameríndios da América do Norte. Em 1898, efectua-se uma expedição britânica 
ao Estreito de Torres e Nova Guiné, na qual participou W.H. Rivers que 
teorizará os conceitos de “descendência” (pertença ao grupo social da mãe ou 
do pai), “sucessão” (transmissão do estatuto ou do cargo) e “herança” 
(transmissão da propriedade). Segue-se a expedição de Malinowski às Ilhas 
Trobiand (Pacífico). Malinowski introduziu a ideia do trabalho de campo, com 
duração mínima de um ano como mínimo (preferivelmente 2, com um intervalo 
para ordenar os resultados e ver que perguntas faltaram por fazer). 
 
O conceito de função 
Herbert Spencer (1820-1903) foi o primeiro sociólogo britânico a usar 
este conceito. Viu um estreito paralelismo entre as sociedades humanas e os 
organismos biológicos (na forma de evolução e conservação), porque ambos 
existem graças à dependência funcional das partes. As funções seriam 
obrigações, nas relações sociais. Influenciou Marcel Proust. 
Émile Durkheim (1858-1917) relaciona o facto social com as 
necessidades que cumpre e satisfaz – função (exemplo: o castigo do delito, a 
divisão do trabalho). O social só poderia explicar-se pelo social e não por 
constituição biológica ou por psicologia individual. Este autor estava 
preocupado com o problema da ordem e da estabilidade social e pelo modo 
como se poderia evitar a desintegração da sociedade, sob a pressão dos 
interesses egoístas dos seus componentes. 
TEMA	4:	BREVE	HISTÓRIA	DAS	TEORIAS	ANTROPOLÓGICAS	
 
 
77 
B. Malinowski (1884-1942) criou a autodenominada “Escola 
Funcionalista”. Parte de Durkheim (os costumes inúteis e sem significado 
deixam de existir). Um fenómeno social serve o povo que o pratica. Relacionou 
a organização social com as necessidades biológicas (alimento, abrigo, 
reprodução). Essas necessidades são, porém, diferentes das necessidades 
dos animais, as necessidades humanas são satisfeitas através da cooperação 
numa sociedade organizada que fala, pensa, transmite experiência, 
conhecimentos, valores e regras de conduta. São também diferentes das 
necessidades dos animais porque requerem educação (dispositivo para 
transmitir a herança de conhecimentos e valores morais) e uma fonte de 
confiança na rectitude das suas normas e da continuidade da sua existência. 
Esta confiança deriva da religião. Malinowski critica Durkheim e afirma que as 
necessidades do organismo individual ou da espécie (abrigo, calor, liberdade 
de movimento) são diferentes das necessidades da sociedade (instituições 
sociais como a família ou o matrimónio são dispositivos sociais que atendem as 
necessidades sociais). 
A R. Radcliffe-Brown (1881-1955) insistirá no facto de que a função 
não deve ser usada no sentido de "intenção", "finalidade" ou "significado". A 
proposição "todo uso social tem uma função" pode converter-se facilmente em 
"todo uso social é bom". Para Radcliffe-Brown, a funçao é o que sustenta a 
estrutura social, ou seja, a coesao dentro de um sistema de relaçoes sociais. 
Por exemplo, a magia tem a funçao de actuar como um mecanismo de 
solidariedade social. 
 
 
BRONISLAW MALINOWSKI (Cracovia,1884-New Haven,1942) 
 De origem polaca. 
 Trabalho de campo nas Ilhas Trobriand. 
 Introduziu o método moderno do trabalho de campo (duração mínima de um 
ano). 
 1922: Argonauts of the Western Pacific. 
 1966: Diário de campo na Melanésia. Descriçãodescarnada dos nativos e 
do antropólogo. Inicia uma cisão na antropologia académica e nas ciências 
sociais, pois, graças às suas contribuições, debateu-se, com mais força, o 
cariz pessoal e a subjectividade do antropólogo. O seu diário está cheio de: 
observações etnográficas, metodológicas, paisagísticas, exotismo, ódio 
contra os nativos (que tanto escandalizou aos fariseus da antropologia). 
Manifesta, cruamente, a observação participante. 
 Influenciado pela obra de E. Durkheim: criticou a sua rejeição dos factores 
explicativos individuais e psicológicos. 
 Malinowski salientava a base psicobiológica da cultura. 
 Distinguiu necessidades humanas básicas: 
-Parentesco: resposta cultural à necessidade básica de reprodução. 
 Também diferenciou necessidades derivadas: 
-Necessidade de socializar as crianças, de acordo com as pautas da sociedade 
correspondente. 
 
 Para Malinowski, a função da magia era ajudar o indivíduo a evitar medos e 
superar ansiedades. 
TEMA	4:	BREVE	HISTÓRIA	DAS	TEORIAS	ANTROPOLÓGICAS	
 
 
78 
 Defendeu a interdependência entre as diversas partes da cultura. Assim, 
para explicar o “kula” (sistema de trocas das Ilhas Trobriand) estuda a sua 
ligação a outros aspectos da cultura, como a construção de canoas ou a 
magia. É um precedente da ideia de cultura como um todo integrado. 
 
 
A R. RADCLIFFE BROWN (1881-1955) 
 1922: The Adamam Islanders. 
 A principal função das instituições sociais é a sustentação da estrutura 
social, ou seja, assegurar a coesão dos sistemas de relações sociais 
vigentes. 
 O seu ponto de vista recebe o nome de “estructural-funcionalista”, para 
distingui-lo do de Malinowski. 
 Tal como Durkheim, pensava que os desejos individuais podem ser 
contrários às necessidades da sociedade e tendentes a criar conflitos. Para 
si, a cultura subordina cada indivíduo às necessidades de uma entidade 
superior: a sociedade. 
 Ao contrário de Malinowski, Radcliffe-Brown defende, na sua interpretação 
da magia e de outros rituais, que estes são mecanismos sociais que geram 
solidariedade social. Explica, portanto, esses fenómenos em termos 
sociológicos e não psicológicos. 
 Foi muito importante a sua definição de “estrutura social”: forma como os 
indivíduos e os grupos de uma sociedade se encontram organizados e se 
relacionam entre si. 
 Estudou, profundamente, os sistemas de parentesco. 
 Considerou a antropologia social como uma ciência natural, com um 
método específico que seria a comparação inter-cultural e que procuraria 
leis universais válidas para a vida social. 
 Ao contrário de Malinowski, que tentou estudar a cultura de acordo com as 
categorias dos próprios nativos, Radcliffe-Brown procurou categorias 
objectivas que pudessem servir para a comparação entre culturas. 
 Para ele, a predominância era das relações sociais. Destas derivaria a 
cultura como factor secundário. 
 Tanto ele como Malinowski fizeram estudos sincrónicos: tentaram explicar 
as culturas em termos do seu estado actual, sem fazerem referência ao 
passado. 
 Radcliffe-Brown cria que o seu trabalho tinha um grande valor prático, 
porque podia ser útil para a administração colonial britânica, ao 
proporcionar uma base científica para o controlo e a educação dos povos 
colonizados. 
 
 
 
E. E. EVANS-PRITCHARD (1902-1973) 
 Catedrático de antropologia social na Universidade de Oxford (1948-
1970) 
 Estudou a feitiçaria “azande”, no Sudão meridional. 
 Estudou os “nuer” (pastores do Sudão), interpretados como uma 
sociedade acéfala e de anarquia ordenada. 
TEMA	4:	BREVE	HISTÓRIA	DAS	TEORIAS	ANTROPOLÓGICAS	
 
 
79 
 Não partilha a posição anti-histórica e pouco diacrónica dos seus 
antecedentes. 
 Foi um defensor da antropologia histórica e da história antropológica. 
 Mestre, entre outros, de Carmelo Lisón Tolosana, um dos introdutores 
da moderna antropologia sociocultural, em Espanha. 
 
 
I. Schapera: Estudou os tswana de Botswana. Quando os tswana alcançaram 
a independência, depois da época colonial, dedicaram a Schapera, ainda em 
vida, duas avenidas da nova capital, “Gaborone”. Este exemplo demonstra bem 
que nem todos os antropólogos serviam interesses políticos colonialistas. 
 
Meyer Fortes (1906-1982): Estudou os “tallensi” do Gana setentrional. 
 
Raymond Firth: Estudou os “maoris” da Nova Zelândia, os “tikopia” da 
Polinésia e os pescadores malaios de Kalentan. Foi catedrático de antropologia 
social, na LSE, (antes de Malinowski), e o primeiro a estudar relações de 
parentesco, na sociedade inglesa contemporânea. 
 
S. F. Nadel (1903-1956): De origem austríaca, fugiu do nazismo. Estudou os 
“nubas” do Korfofam (Sudão meridional) e os nupes da Nigéria setentrional. 
 
Max Gluckman: Impulsionador da Escola de Manchester e do Instituto Rodhes 
Linvingstone, que realizou diversos trabalhos de campo urbanos na actual 
Zâmbia. Foi pioneiro nos estudos de antropologia urbana. 
 
 
 
4.8. O NEOEVOLUCIONISMO, A ECOLOGIA CULTURAL E O 
MATERIALISMO HISTÓRICO 
 
O paradigma teórico fundamental destas linhas teóricas é o de que a cultura é 
um sistema de adaptação ao meio ambiente. 
 
O NEOEVOLUCIONISMO 
-Leslie White (1900-1974): 
Estudou Ciências Sociais, na Universidade de Columbia, e Antropologia (Ph D), 
na Universidade de Chicago. Em contraste com Tylor e Morgan, White mais 
estava interessado em estudar o desenvolvimento da cultura universal (a 
cultura humana em geral) e não determinadas culturas, em particular. Entendia 
a cultura como algo progressivo e numa única direcção. 
 
“A cultura avança segundo um certo montante de energia per capita, 
incrementa-se e distribui-se…” 
 
-Os traços culturais mais adaptáveis são os que sobreviviam no seio da 
competência cultural. 
-A cultura dividia-se em 4 componentes: traços ideológicos, sociológicos, 
sentimentais e tecnológicos. O factor tecnológico determina os outros 
TEMA	4:	BREVE	HISTÓRIA	DAS	TEORIAS	ANTROPOLÓGICAS	
 
 
80 
componentes, isto é, a mudança social é motivada pela mudança tecnológica. 
Esta é uma visão determinista da Cultura. 
-Metodologia: A cultura devia ser estudada desde o exterior, observando-a de 
uma forma objectiva e sem adoptar o ponto de vista dos participantes. Esta 
acepção contradiz Boas e Malinowski. 
-Polémica com o antropólogo norte-americano Alfred Kroeber (discípulo de 
Boas). Para White, o desenvolvimento cultural era muito semelhante à 
evolução natural de Darwin; o motor do desenvolvimento cultural seria o 
aparato tecnológico. Kroeber concorda com Leslie White na concepção da 
cultura como fenómeno supra-orgânico (uma entidade que obedece a leis 
próprias que podem ser estudadas, independentemente dos seus portadores), 
mas não concorda no determinismo tecnológico, pois salienta os aspectos 
idealistas como motores do câmbio. 
 
A ECOLOGIA CULTURAL 
-Julian Steward (1902-1972). Discípulo de Kroeber e Carl Sauer (geógrafo). 
-Ecologia cultural: Estuda a forma através da qual os indivíduos e grupos 
humanos se adaptam às suas condições naturais, por meio da sua cultura. O 
meio natural exerce uma pressão selectiva sobre da cultura, eliminando os 
elementos culturais menos adaptados e que menos possibilidades têm de 
vingar no controlo do meio. 
-O “núcleo cultural” é o conjunto de traços ligados às actividades económicas e 
de subsistência. 
-A mudança cultural estaria motivada por mudanças na tecnologia ou nos 
sistemas produtivos. 
-Contrariamente aos Evolucionistas unilinhares e a Leslie White, Steward 
defendeu o Evolucionismo Multilinhar para explicar as diferenças culturais e a 
adaptação específica. 
-Steward coloca a questão dos processos materiais que incidem nos seres 
humanos confrontados com o seu meio envolvente. 
-Uma derivação da ECOLOGIA CULTURAL é representada pelo antropólogo 
RAPPAPORT. Este autor define a cultura como um sistema de adaptação que 
capacita os humanos para se apropriarem do seu meio; para isso contribuem 
aspectos materiais e não materiais (ciclos materiais),mas sempre para manter 
a produtividade de um meio. 
 
O MATERIALISMO CULTURAL 
-Marvin Harris (1931-2001) aplica os princípios deterministas de Steward. A 
sua teoria é a do determinismo tecno-ambiental, segundo a qual a aplicação de 
tecnologias semelhantes a meios semelhantes tende a produzir semelhanças 
na produção, distribuição, grupo social, sistemas de valores e de crenças. 
- Outorga prioridade ao estudo das condições materiais da vida sociocultural. 
-As causas da evolução cultural são: factores demográficos, tecnológicos, 
económicos e ambientais. Marvin Harris influenciará bastante a antropologia 
marxista: Maurice Godelier, na França (ligado também ao estruturalismo) e 
Stanley Diamond, nos EUA (fundador da revista Dialectical Anthropology). 
-Antropólogo polémico, grande divulgador da antropologia. Trabalhou na 
Universidade de Columbia (New York), entre 1953 e 1980, fixando-se, depois, 
na Universidade da Florida. Publicou 17 livros. 
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81 
-Entre as suas muitas polémicas teorias, sublinhamos a que se dedica às 
causas que guiam a abstinência dos judeus e muçulmanos no consumo de 
carne de porco. De acordo com Harris, estes não comem porco porque os 
porcos comem o mesmo que os humanos e isto torna a sua manutenção muito 
dispendiosa. Comem ovelhas e cabras, porque a sua manutenção é mais 
barata, para além de que dão leite, lã e força de trabalho. 
 
4.9. O ESTRUTURALISMO FRANCÊS 
A partir da 2ª guerra mundial, por influência da linguística estrutural de 
Ferdinand de Saussure, a cultura começou a entender-se como um sistema de 
ideias e de signos. Se o funcionalismo entendia a sociedade como um 
organismo ou máquina, na qual o actor social seguia determinadas regras, o 
estruturalismo começa a preocupar-se com os princípios lógicos das estruturas 
de sentido. Face ao modelo funcionalista, estático e incapaz de explicar a 
mudança e o individualismo, o estruturalismo francês começa a preocupar-se 
com a mudança e o individualismo. 
O seu representante máximo foi o francês – mas, natural da Bélgica – 
Claude Lévi-Strauss (1908- ), que defendeu uma ideia fundamental: as 
uniformidades culturais nasciam na cabeça humana e também num processo 
de pensamento inconsciente. A característica fundamental da mente humana é 
a tendência para criar dicotomias e para estabelecer opostos binários: 
puro/impuro, limpo/sujo... Estas dicotomias explicariam as similitudes e as 
diferenças entre as culturas. A antropologia seria para este autor uma 
semiologia da cultura. A estrutura foi entendida como o conjunto de princípios 
lógicos subconscientes organizados em oposições binárias. 
Exemplo: Segundo Carmelo Lisón (1971), a estrutura da “melhora” 
galega (sistema de herança que favorece a um dos herdeiros) estaria baseada 
na oposição relacional entre: 
Autoridade Obediência 
Controlo Económico Sem nada próprio 
Autonomia Dependência 
Direitos Obrigações 
 
Para o estruturalismo, as culturas são sistemas de signos partilhados e 
estruturados, segundo princípios que governam o funcionamento do intelecto 
humano que os gera. Influenciaram o estruturalismo francês: Durkheim, 
Jakobson (teoria linguística), Kant (idealismo) e Marcel Mauss (sogro de 
Durkheim) (1872-1950). No seu “Ensaio sobre a dádiva” (1924), Mauss 
interpreta as prendas como um facto que penetra cada um dos aspectos da 
vida social; daí falasse disso como um “facto social total”. O intercâmbio social 
fundamental e omnipresente encontrava-se governado por três tipos de 
obrigações: doar prendas, recebê-las e devolvê-las. Para explicar isto, Mauss 
postulou uma força mística interna aos objectos que se trocam. Marcel Mauss 
não fez pesquisa de terreno, mas deixou ensaios antropológicos magistrais. 
Em 1947, publicou um manual de antropologia. 
 Claude Lévi-Strauss (1908- ) clarificou o contributo de Mauss e deu 
uma interpretação mais convincente: as três obrigações (dar, receber e 
retribuir) não podem ser explicadas, adjudicando aos objectos trocados uma 
força intrínseca própria. A troca de prendas é mais importante que as próprias 
prendas. Através das trocas contínuas, criam-se, entre os indivíduos e os 
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82 
grupos laços sociais que estabelecem e organizam, entre eles, um sistema de 
relações complementares. A reciprocidade é a regra máxima dos intercâmbios. 
 Em 1949, Lévi-Strauss publica a sua obra “As estruturas elementares de 
parentesco” – sobre os aborígenes australianos-, na qual aplica os princípios 
de reciprocidade e de estrutura social ao estudo dos sistemas de matrimónio e 
parentesco. Analisa o tabu do incesto, como origem da exogamia, e as trocas 
matrimoniais. 
 Este autor defendeu e aplicou os métodos linguísticos à antropologia. 
Foi um grande estudioso dos sistemas míticos e dos seus significados, a partir 
da organização de opostos binários. Absorveu do linguista Saussure a 
diferença entre língua (sistema fixo de regras gramaticais e sintácticas) e fala 
(uso da língua pelos falantes). 
 Se Radcliffe-Brown (classificado de estrutural-funcionalista), tinha 
afirmado que a estrutura era uma interacção das relações sociais que tendia a 
formar e manter viva a sociedade, Claude Lévi-Strauss afirma que a estrutura é 
um modelo ou matriz sobre a qual se elabora o pensamento humano. O 
pensamento tem como princípio básico orientador a oposição dualista e 
dicotómica: esquerda-direita, negativo-positivo... 
 
Outros antropólogos estruturalistas franceses 
 
L. Lèvi-Bruhl (1875-1939): Para este autor, o pensamento dos chamados, na 
altura, “primitivos” é pré-lógico, ou seja: é determinado pelas representações 
colectivas; condicionado pela visão da realidade, como mística e sobrenatural; 
não científico; e não baseado em causas. Perante estas características, o 
pensamento dos europeus seria lógico. Sob um ponto de vista crítico, nem 
sempre pensamos e actuamos lógica, científica ou racionalmente. 
 
Marcel Griaule (1898-1959): Pesquisou, na Etiópia e no Mali (os dogon). 
Conduzir a pesquisa de um grupo de estudantes, na África Ocidental, entre 
eles Jean Rouch que fez cinema etnográfico. No seu livro “Dieu d´Euau”, relata 
como, só depois de 15 anos de convivência com eles, conseguiu descobrir o 
seu sistema cosmológico. Essa descoberta ocorreu durante um encontro com o 
velho sábio “Ogotemmeli”. Neste trabalho, Marcel Griaule demonstra a plena 
humanidade dos dogon. 
 
 
4.10. A ANTROPOLOGIA SIMBÓLICA, A ANTROPOLOGIA COGNITIVA E A 
ANTROPOLOGIA SEMÂNTICA 
 
 
TEMA	4:	BREVE	HISTÓRIA	DAS	TEORIAS	ANTROPOLÓGICAS	
 
 
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ANTROPOLOGIA SIMBÓLICA 
 
 
 As culturas são, para a antropologia simbólica, sistemas de símbolos e 
significados partilhados. 
 Os humanos são “animais simbólicos” (Cassirer: 1945). 
 A cultura é uma floresta de símbolos (Turner: 1980). 
 A cultura é um veículo de comunicação, através do qual se transmitem 
mensagens. 
 Autores mais representativos: Edmund Leach, Clifford Geertz, David 
Schneider, Victor Turner, Dan Sperber, Mary Douglas. 
 Clifford Geertz (1995) será o criador de um novo paradigma, a antropologia 
interpretativa: a cultura é um conjunto de textos que os antropólogos 
interpretam, no seu contexto. Geertz impulsioinou também outro paradigma: 
a antropologia pós-moderna. 
 Para a antropologia simbólica, os símbolos orientam a acção. 
 O seu enfoque é hermenêutico: sublinha a interpretação e a compreensão. 
 Nem os evolucionistas, nem os ecologistas culturais, nem os materialistas 
mecanicistas partilham este interesse pelos aspectos simbólicos da cultura.
 
 
Segundo Robert Parkin (1998), o simbolismo é uma característica humana 
fundamental. Os antropólogos simbólicos reduzem a condição humana a 
símbolos. Os símbolos representam algo, significam algo, e são colocados no 
lugar de objectos, ideias, valores, crenças, grupos sociais, acontecimentos, 
mitos, etc. 
 A metáfora e a metonímia estabelecem associações entre coisasdistintas, baseando-se para isso no simbolismo. A metáfora associa coisas 
diferentes, por similaridade ou analogia; a metonímia liga uma parte com o 
todo, na qual a parte representa ao todo (ex.: a coroa à monarquia) (ex.: “As 
relações de Moscovo com Washington...”). A ideia de sentido e significado é 
também importante no simbolismo. Os símbolos não estabelecem, apenas, 
associações entre as coisas, transmitindo também sentido e significado 
(informação cultural específica). Daí que o simbolismo seja pensado como uma 
forma de classificação especificamente humana. Outra noção importante é a de 
arbitrariedade: se os símbolos parecem estar unidos ao que representam, é 
porque sociedades concretas decidem que seja assim. O leão, a águia e a 
coroa podem representar a monarquia, mas ao mesmo tempo o leão 
representa o orgulho, o valor e o poder. Isto significa que os símbolos podem 
ser manipulados, para reforçar ou favorecer uma mensagem sobre outro. 
Exemplo da águia com coroa, símbolo da Polónia 
-------------------------------- 
1º. Símbolo dos reis polacos. 
2º. Perdeu a coroa, durante o comunismo. 
3º. Recuperou-a, no regime pós-comunista republicano. 
 
-Continuidade com o passado. 
-Natureza aberrante do regime comunista. 
-Símbolo da independência nacional e de uma história gloriosa. 
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* Os símbolos podem mudar de significado com o tempo, adoptando um novo 
significado. 
 
A linguagem é simbólica, mas os símbolos visuais transmitem sentido, 
directamente, sem a intervenção da linguagem. 
CLAUDE LÉVI-STRAUSS (1908- ) E O SIMBOLISMO NO MITO 
 
-Oposição binária aplicada ao parentesco, aos mitos, etc. 
-Os símbolos não só têm sentido em função do que representam, como 
também estão interligados como pares que se opõem entre si (como o sol e a 
lua, acima e abaixo, masculino e feminino, direita e esquerda, molhado e seco). 
-A dicotomia é uma característica universal da mente humana. 
-O significado dos símbolos pode ser analisado através do exame dos pares 
simbólicos, porque formam um código muito semelhante ao da linguagem. 
-Os símbolos são semiológicos: transmitem uma mensagem que pode ser 
descodificada e interpretada. 
 
VÍTOR TURNER (1920-1983) E O SIMBOLISMO NO RITUAL 
 
-Estudou os "ndembu", um povo matrilinear do centro de África. 
-Tal como Lévi-Strauss, defende que os símbolos são estruturantes. 
-Distingue vários níveis de observação e de interpretação: 
 
1. A observação do ritual, por parte dos indígenas e do antropólogo. 
2. A interpretação nativa. 
3. A interpretação do antropólogo (observação, conhecimento de outras 
culturas, teorias académicas, etc.). 
 
-Sublinha a multivocalidade dos símbolos: um mesmo símbolo pode 
representar coisas distintas, de acordo com as diferentes fases do ritual, e 
também coisas diferentes para pessoas distintas. 
-O ritual reforça os valores sociais que integram essa sociedade (ideia também 
defendida por Durkheim). Turner salienta o símbolo como agente de unidade 
social da comunidade, mas também do conformismo. 
 
 
O SIMBOLISMO COMO CLASSIFICAÇÃO: Robert Herz e Rodney Needham 
 
-Os símbolos são mais significativos pelas suas inter-relações do que pelos 
seus valores intrínsecos. 
 
-Robert Herz, discípulo e colaborador de Durkheim, estudou o simbolismo da 
mão esquerda e os seus aspectos negativos, associados ao pecado. 
 
DAN SPERBER 
-Sperber nega que os símbolos possam ser explicados. São os próprios 
símbolos que aclaram as coisas, porque evocam lembranças partilhadas, 
culturalmente, por todos os participantes sociais. A interpretação soma-se ao 
símbolo, mas não o substitui. 
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-Os símbolos não são um fim em si mesmo, mas um meio para entender o 
contexto social no qual se encontram, e não ao contrário. 
-A sua relevância encontra-se no que evocam e não no que significam. 
-Os símbolos não podem formar um código análogo à linguagem. 
-(Dan Sperber estudou os “dorzé” de Etiopia. Para ele, o simbolismo é um 
dispositivo de conhecimento que, junto dos mecanismos de percepção, 
participa na constituição do saber e no funcionamento da memória. O 
simbolismo é um universal cultural, mas os símbolos representam, não 
significam). 
 
OS ANTROPÓLOGOS SIMBÓLICOS: Clifford Geertz (*), David Schneider, Roy 
Wagner, Mary Douglass, ... 
 
(*) Para Clifford Geertz, os símbolos não são mensagens da sociedade para os 
indivíduos passivos que a constituem: são antes um meio de comunicação. A 
cultura é um assunto de símbolos, da sua criação, expressão e manipulação. 
Os símbolos transmitem valores, visões do mundo, a localização do poder, etc. 
Não devem ser explicados (como Sperber dizia), mas sim interpretados, de 
acordo com a hermenêutica. Os símbolos têm uma capacidade evocativa, mas 
evocam emoções, mais do que conhecimentos. São mais afectivos do que 
cognitivos. 
 
 
 
 
ANTROPOLOGIA COGNITIVA (1) OU ETNOCIÊNCIA 
 Também denominada etnociência, etnosemântica ou “nova etnografia”. 
 Para esta perspectiva teórico-metodológica, cada cultura tem um estilo 
de pensamento e conhecimento que modela a mente das pessoas e que 
configura a sua forma de ser, pensar, valorar e actuar. Cada cultura tem 
um sistema próprio para perceber, entender e organizar, 
codificadamente e partilhadamente, o seu mundo. 
 O objectivo da antropologia cognitiva seria estudar os princípios e a 
estrutura de funcionamento da mente humana. Para isso, deve 
 
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conhecer-se as categorias com as quais diferentes cultura classificam a 
sua experiência (ex.: cores, parentesco, etc. ). 
 A cultura é para eles conhecimento e para analisar esta temos que 
utilizar uma semântica formal. 
 Nasceu nos EUA, ligada ao estruturalismo. 
 Representantes: Gregory Bateson, Berlin, Kay, Conklin, Goodenough, 
Hymes, Tyler, etc. 
 Influência de Sapir e Whorf (discípulos de Franz Boas). 
 Considera a cultura como um sistema de conhecimentos, crenças e 
percepções partilhados colectivamente. 
 Na criação da cultura, prima o intelecto sobre os factores biológicos, 
materiais e ambientais. 
 Tende para uma abordagem indutiva. 
 Defende a ideia de que os humanos têm uma capacidade ilimitada para 
combinar signos. 
 Considera as emoções, as acções, o meio envolvente, etc. como 
elementos organizados pelo intelecto humano. 
 O seu objecto de estudo não são os fenómenos materiais enquanto tais, 
mas o modo como estes fenómenos se organizam na cabeça das 
pessoas. 
 O intelecto humano gera cultura, através regras finitas ou de uma lógica 
inconsciente. O objectivo dos antropólogos é determinar essas regras. 
 Partilha perspectivas teóricas com linguistas como Noam Chomsky. 
 Um aspecto importante foi a diferença que Goodenough estabeleceu 
(retomando a ideia de K. L. Pike) entre o ponto de vista “emic” (formas 
de percepção dos membros de cada cultura concreta e o modo como 
descrevem o seu mundo) e o “etic” (o ponto de vista externo, a descrição 
concreta que antropólogo faz, utilizando as categorias antropológicas). 
 
 
 
 
ANTROPOLOGIA COGNITIVA (2) 
 Cada cultura tem um estilo de pensamento que condiciona a mente das 
pessoas e configura a sua maneira de pensar, ser, valorar e actuar. 
 Cada cultura tem um sistema próprio de perceber, entender e organizar 
socialmente, através de códigos, o seu mundo. 
 Procura estudar os princípios e a estrutura de funcionamento da mente 
humana. 
 Tenta conhecer as categorias com as quais diferentes culturas classificam a 
sua experiência (ex.: cores, parentesco, etc.) 
 Para os antropólogos cognitivos, há uma série de leis, geralmente 
inconscientes, que regem os modos de pensar. 
 Realiza uma análise linguística para entender o sistema cognitivo e a 
conduta humana. 
 Empreende uma análise de categorias léxicas, para compreender os modos 
de conhecimento e os “esquemas culturais”. 
Utiliza a “análise de componentes”, como método do trabalho de campo. 
 
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Exemplo de análise de componentes cognitivo-relacionais (procura de 
analogias que partilham uma semântica): 
 
HOMEM 
◊ 
MULHER 
◊ 
CRIANÇA 
◊ 
TOURO 
◊ 
VACA 
◊ 
VITELO 
◊ 
GALO 
◊ 
GALINHA 
◊ 
FRANGO 
◊ 
CAVALO 
◊ 
ÉGUA 
◊ 
POTRO 
◊ 
CARNEIRO 
 
OVELHA CORDEIRO 
 
 
 
A ANTROPOLOGIA SEMÂNTICA 
A antropologia semântica estuda os seres humanos, enquanto criadores de 
sentido e não como receptores passivos de estruturas culturais. Alguns 
representantes desta corrente são Edwin Ardener e Robert Parkin. Esta 
antropologia realiza uma reflexão sobre o sentido dos dados, a experiência do 
antropólogo e o papel do antropólogo, enquanto membro do grupo humano 
estudado. 
O objecto de estudo da antropologia semântica é o sentido que é 
transmitido através da linguagem e o simbolismo. As culturas organizam 
sistemas semióticos, isto é, geografias morais que condicionam o meio social, 
autoperpetuando-se e modificando-se, apenas, com novas experiências. 
Reflecte também sobre o que a comunidade pensa sobre que é escrito pelo 
antropólogo. Ela pensa a antropologia como um jogo de espelhos, e o poder e 
a hegemonia como elementos fundamentais da definição de cultura. 
A experiência humana é mais complexa e variável do que qualquer 
modelo que tente explicá-la, de aí que o sentido esteja interligado como o 
contexto sociocultural. Um exemplo etnográfico é o seguinte: 
Um irlandês que seja ofendido, num pub inglês, não hesita em recorrer à 
violência para vingar a sua honra. Na Irlanda, todos os clientes do pub o 
travariam, mas na Inglaterra não o fazem. Isto só reforça a imagem do irlandês 
como violento (Parkin, 1998: 113-114): 
 
4.11. A ANTROPOLOGIA PÓS-MODERNA 
Uma grande diversidade caracteriza a antropologia hoje: ramos, objectos, 
perspectivas teóricas (Fernández, 1993; O´Neill, 2006; Martínez Veiga, 2008), 
mas o impacto da antropologia pós-moderna tem-se deixado sentir em todos 
eles. A corrente simbólica foi o caldo de cultivo da antropologia pós-moderna e 
os seus representantes: Clifford Geertz, James Clifford, George Marcus, 
Marilyn Strathern, Richard Thornton, Michael Fisher, Vicent Crapanzano, 
Dennis Tedlock, Kevin Dwyer, Renato Rosaldo e Paul Rabinow entre outros. 
Neles influiu também o pósmodernismo filosófico de Lyotar e o pósmodernismo 
estruturalista, e também a fenomenologia, a hermenêutica e a filosofia 
linguística. 
 O mundo pós-moderno é aquele do fim das grandes visões épicas do 
mundo, nele primam as imagens sobre os factos, a realidade virtual e 
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imaginada sobre a realidade fáctica. Segundo Stephen Tyler, em várias das 
suas publicações, o mundo pós-moderno é aquele desprovisto de ilusão 
transcendente, um mundo em processo de fragmentação. E uma das suas 
ideias centrais é que não há uma realidade em sí, porém uma realidade 
interpretada, portanto, a antropologia é uma interpretação de interpretações, 
uma construção de segundo grau. 
 A antropologia pós-moderna verificou como o trabalho de campo e a 
etnografia eram uma sistemática construção dos outros. Portanto, o etnógrafo 
não seria um testigo fiel dos dados, porém um construtor e um criador. A 
antropologia pós-moderna defendeu que detrás dos antropólogos havia 
mecanismos retóricos de “autor” e “autoridade”, e que a etnografia reproduz 
situações de subordinação face o saber, implicando relações de poder-saber. 
Assim, a etnografia, enquanto forma de representação da diversidade cultural é 
uma forma de literatura. 
O livro colectivo “Writing Culture” (Clifford e Marcus, 1986; 1991), que 
teve como base um seminário em Santa Fé (Califórnia), marcou um antes e um 
depois não apenas na antropologia pós-moderna, porém também na 
antropologia. A partir da análise desse livro podemos observar três correntes 
de pensamento: 
 
a) A meta-antropologia, que realiza uma análise crítica dos recursos 
retóricos e autoritários da antropologia convencional praticada pelo “realismo 
etnográfico” (empirista e positivista) na procura de leis gerais, para apresentar 
alternativas de investigação e exploração. Representantes desta corrente são 
alguns trabalhos de Cflifford Geertz, George Marcus, James Clifford o Marylin 
Strathern. E as críticas á antropologia tradicional foram estas: 
 
 Estruturação das monografías antropológicas como etnografía 
total. 
 O etnógrafo apresenta-se no texto como não intrusivo na cultura 
que estuda. 
 Exclui os informantes individuais e faz referência a um sujeito 
colectivo homogéneo. 
 Não narra o processo de trabalho de campo nas monografias. 
 Apresenta o material etnográfico como ponto de vista dos sujeitos 
culturais e não como o ponto de vista do antropólogo. 
 Exploração estatística de dados particulares. 
 Pratica uma exegese textual do idioma nativo. 
 
Estas características da antropologia convencional seriam utilizadas para 
convencer os leitores e academia sobre a verdade do investigado. 
 
 
b) A etnografia experimental seria a segunda corrente, e trataria de 
procurar alternativas para a escrita etnográfica no caminho de uma narração 
personalizada face a umas tais descrições objectivas. Nas suas obras integra o 
outro no discurso do antropólogo e defende a triangulação entre antropólogo- 
informante – leitor. O antropólogo renuncia a falar em vez do outro e as 
pessoas têm direito a palavra e voz nos textos etnográficos. Nesta corrente 
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também se reflicte sobre as dúvidas do trabalho de campo e mostra a 
problemática do encontro com o outro. Outras ideias chave são: 
 
 O método dialogal ou dialógico, em relação com o carácter 
intersubjectivo do trabalho de campo. 
 A polifonia e o cruzamento de laços entre os informantes. 
 A heteroglosia, em referência às vozes diferenciadas social e 
ideologicamente. 
 O trabalho de campo como realidade negociada 
 
Representantes de esta corriente son Dennis Tedlock, Paul Rabinow e Vincent 
Crapanzano. 
 
 c) O pós-modernismo estremista de Michael Taussing e Stephen Tyler, 
quem criticam não apenas a antropologia, porém também a ciência e a sua 
autoridade. Proõem redefinir a ciência e a antropologia com base numa certa 
irracionalidade. 
 
A antropologia pós-moderna sensibilizou-nos face a problemas antes não 
abordados pelas Ciências Sociais e do mesmo modo criticou o objectivismo 
ingénuo. Mas alguns riscos foram corridos. O primeiro é o de cair no relativismo 
mais absoluto, se bem é certo que sem relativismo não há antropologia, é 
preciso fazer um uso crítico dele, não dogmático, pois isso tornaria impossível 
a comparação intercultural. O relativismo absoluto também pode acabar num 
niilismo que negue a capacidade crítica, libertadora e transformadora da 
antropologia. 
O segundo risco é o “todo vale” de alguns aspectos do pós-modernismo 
neoliberal, que pode levar-nos a que não se garanta nemhum critério de 
aproximação da verdade. A alternativa é defender que “nada vale para explicar 
todo”, isto é, não acreditar em absolutos nem tampouco no todo tem o mesmo 
valor. 
O terceiro risco é cair numa filosofia ingénua da acção e pensar que as 
chaves intepretativas da vida cultural estariam apenas no nível imediato dos 
discursos dos informantes. Pelo contrário, para achar essas chaves é preciso 
situar-se numa posição de exterioridade explicativa-teórica e não apenas 
descritiva, asumindo os instrumentos de objectivação mental da acção social 
(contexto, observação, teorias, métodos, técnicas…). No nosso ponto de vista, 
o papel do antropólogo e a sua interpretação são fundamentais, pois os dados 
não falam por eles próprios e é o investigador quem dialoga com eles. 
De acordo com Renato Rosaldo (Montezemolo, 2003: 342), nos 
representantes da antropologia pós-moderna que escreveram o Writing Culture 
haviaduas correntes, a) os que pensavam que era preciso experimentar por 
amor ao experimento, e b) os que pensavam que as anteriores técnicas de 
representação etnográfica do outro já não serviam, pois já não se tratava de 
demonstrar o equilíbrio das sociedades periféricas, porém de demonstrar os 
processos históricos em contextos sociais de desigualdade e também o papel 
dos grupos subalternos e as suas percepções. 
 Do livro “Writing Culture” podemos observar duas tendências, a primeira 
a de aqueles que pretendiam destruir ou abandonar a etnografia pela literatura, 
entre eles estava James Clifford, um aluno não antropólogo de Clifford Geertz. 
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A segunda tendência pretendia reiventar a etnografia e fazer esta de outra 
forma, esta posição era representada por Renato Rosaldo (ver Montezemolo, 
2003: 343; ver também Fox, 1991). 
 Outra reacção interessante ao livro “Writing Culture” veio da antropologia 
feminista e o livro “Women Writing Culture” (Behar e Gordon, 1995), pois o 
primeiro foi escrito quase exclusivamente por homens. Nele expõe-se a 
triangulação entre escrita, género feminino e cultura e questionam o 
masculinismo da escrita antropológica. 
 
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TEMA	4:	BREVE	HISTÓRIA	DAS	TEORIAS	ANTROPOLÓGICAS	
 
 
93 
ANEXO I: A ANTROPOLOGIA MODERNA E A PÓS-MODERNA 
 ANTROPOLOGIA 
MODERNA 
ANTROPOLOGIA 
PÓS-MODERNA 
LEGITIMAÇÃO  “Autor” e “Autoridade 
única” 
 Científica 
 Autoridade dispersa, 
polifónica e negociada 
REPRESENTAÇÃO Realismo etnográfico 
 3ª pessoa 
 Narrativa 
 Experimentalismo 
 1ª, 2ª, 3ª pessoa 
 Dialógica 
INVESTIGAÇÃO  Método da observação 
participante 
 Método conversacional e 
dialogal 
 
 
 
 
 
 
 
TEMA	4:	BREVE	HISTÓRIA	DAS	TEORIAS	ANTROPOLÓGICAS	
 
 
94 
ANEXO II: CORRENTES DA ANTROPOLOGIA PÓS-MODERNA 
META-ANTROPOLÓGICA ETNOGRAFIA 
EXPERIMENTAL 
PÓS-MODERNISMO 
ESTREMO 
 Analisa as formas de 
legitimação autoral, nos 
textos etnográficos (James 
Clifford). 
 Estuda os recursos retóricos 
dos textos e a relação destes 
com as audiências (George 
Marcus, Dick Cushuman e 
Marilyn Strathern). 
 Pesquisa as instituições que 
promovem a escrita 
etnográfica, as relações entre 
o antropólogo e o “outro” e as 
formas alternativas de escrita 
etnográfica (Paul Rabinow). 
 Redefine as formas o 
trabalho de campo adopta, 
no texto etnográfico. 
 Vincent Capranzano, Kevin 
Dwyer, Paul Rabinow. 
 Dennis Tedlock e a 
etnografia dialógica. 
 Critica a escrita etnográfica, 
mas também a ciência em 
geral. 
 Stephen Tyler e Michael 
Taussig. 
 Epistemologia irracionalista 
que reformula o projecto 
científico. 
 
 
 
 
TEMA	4:	BREVE	HISTÓRIA	DAS	TEORIAS	ANTROPOLÓGICAS	
 
 
95 
ANEXO III: ANTIGOS E NOVOS PARADIGMAS EM ANTROPOLOGIA 
OS ANTIGOS PARADIGMAS O NOVO PARADIGMA PÓS-MODERNO 
 Os antropólogos consideravam a existência de estruturas de poder 
que definiam as suas posições e que reprimiam ou condicionavam 
a vida dos nativos. 
 Pouca sensibilidade para com a colonização, as relações de 
poder, autoridade e legitimidade. 
 Paradigma conceptual dominante: o objectivismo e o positivismo. 
 O regime colonial impunha, por definição, uma situação de 
desigualdade na relação do antropólogo com os nativos: 
antropólogo tinha uma posição de privilégio e uma autoridade 
implícita. 
 O antropólogo informava “neutralmente” como se não influisse nos 
nativos. 
 
 
 Influências de Talad Asad (orientalismo), Derrida 
(desconstrucionismo) e Foucault (saber e poder). 
 Questionamento da prática e do estatuto da antropologia. 
 Rejeição da orientação positivista e do objectivismo (a verdade da 
realidade objectiva era obtida através de procedimentos científicos 
repetíveis e demostráveis). 
 Maior preocupação com natureza do conhecimento antropológico e 
com as formas de produção etnográfica. 
 Preside uma das muitas fases de auto-exame da antropologia. 
 Reflexividade. 
 Questionamento e rejeição do papel neutro do antropólogo como 
observador. 
 Tomada de consciência, perante o contexto geo-político no qual a 
disciplina se tinha desenvolvido. 
 Antecedente: debate entre Robert Redfield e Oscar Lewis, nos 
anos 50 do s. XX, depois de ambos terem realizado trabalho de 
campo na mesma povoação (Tepoztlán) e de terem alcançado 
resultados diferentes. Este facto levou a pensar na origem social 
dos antropólogos, na sua personalidade e na sua influência nas 
perguntas que empreendem. 
 CLIFFORD, J. e MARCUS, G. (1986): Writing Culture. The Poetics 
and Politics of Anthropology. Berkeley: University of California 
Press. 
 
-HIRSCON, R. (1998): “Antropología reflexiva”, em Lisón, C. (ed.): Antropología: Horizontes teóricos. Granada: Comares, pp. 149-163. 
 
 
 
 
TEMA	4:	BREVE	HISTÓRIA	DAS	TEORIAS	ANTROPOLÓGICAS	
 
 
96 
ANEXO IV: QUADRO DE SÍNTESE DA HISTÓRIA DAS TEORIAS DA CULTURA 
 
Período Contexto histórico Escolas, ideias e teorias Autores
Antes do séc. 
XV 
Expansão do império e do 
comércio 
 Curiosidade pelos costumes exóticos e pelas 
explicações sobre esta diversidade 
 “Bárbaros” (os não gregos): “um olho na testa 
e os pés para atrás” (Heródoto). 
 O “barbaro” era o estrangeiro que era 
considerado inferior e incivilizado. 
 Santo Agostinho interpretava como pagãs a 
Grécia e a Roma clássicas. 
Heródoto (484-425 a.C.) 
Santo Agostinho (354-430) 
Autores medievais europeus 
e árabes 
Ibn Haldun (1332-1406) 
Séculos XV e 
XVI 
 
-Conhecimento ocidental do 
mundo. 
-Desenvolvimento do 
capitalismo mercantil e do 
comércio de escravos. 
-Confirmação da 
esfericidade da terra. 
 Descobrimento do "mundo selvagem" e 
constituição de um novo campo de estudo: a história 
moral (estudo dos hábitos e costumes dos diferentes 
povos). 
 Dicotomia: selvagens / humanos (europeus). 
 Índios considerados com natureza moral pura. 
 Bartolomé de las Casas foi dos primeiros a 
teorizar sobre o “bom selvagem”. Ele considerava os 
índios puros e bons selvagens, mas os negros não, 
de ai o dever de evangelizar os primeiros e 
escravizar os segundos. Foi um primórdio do 
relativismo cultural, junto com o português, Padre 
Vieira. 
 
José de Acosta (1539 – 
1600) 
Bartolomé de las Casas 
(1474-1566) 
Padre Vieira (1608-1697) 
Jean Bodin (1530-96) 
M. Montaigne (1533-92) 
 
TEMA	4:	BREVE	HISTÓRIA	DAS	TEORIAS	ANTROPOLÓGICAS	
 
 
97 
Século XVIII Início do colonialismo 
moderno e formação do 
capitalismo industrial. 
Começa a abolir-se a 
escravatura. 
Ilustração: 
 Razão humana como centro. 
 Interesse pelo estudo da história da humana. 
 De um teocentrismo a um humanocentrismo. 
 Aparece a dicotomia selvagem ou primitivo / 
civilizado. 
 Nasce a ideia de progresso da humanidade. 
 “Mito do Bom Selvagem” de Rousseau: os 
humanos são bons, é a sociedade que os corrompe. 
Solução: voltar à bondade primitiva da humanidade, 
que está na natureza. 
Montesquieu (1689-1755) 
Voltaire (1694-1778) 
Rosseau (1712-1778) 
Smith (1723-90) 
Século XIX 
 
Expansão colonial 
Ex.: EUA expande-se para o 
Oeste 
Evolucionismo 
 Influências da Ilustração e de Darwin: 
evolução biológica e sobrevivência dos mais aptos. 
 SelvagismoBarbárieCivilização 
 Continua a dicotomia primitivo / civilizado. 
 A antropologia nasce como disciplina 
académica. 
 Positivismo nas Ciências Sociais. 
 Igualdade, liberdade, fraternidade entre os 
humanos e desigualdade entre culturas. 
 Investigação sobre as leis gerais da evolução 
humana. 
 Preocupação pelas diferenças e semelhanças.
 MagiaReligiãoCiência (James Frazer) 
J.J.Bachofen (1815-1887) 
L.H, Morgan (1818-81) 
H. Maine (1822-88) 
J.F. Mc Lennan (1827-81) 
E.B. Tylor (1832-1917) 
J. Frazer (1854-1941) 
TEMA	4:	BREVE	HISTÓRIA	DAS	TEORIAS	ANTROPOLÓGICAS	
 
 
98 
Inícios do séc. 
XX 
Continua a expansão 
colonial e destroem-se 
algumas culturas índias. 
Industrialização. 
-Reacção contra o evolucionismo. 
-Mais preocupação pela diversidade cultural e menos 
pela diferença. 
Difusionismo (Destaque para a Alemanha) 
-O empréstimo cultural como mecanismo de 
evolução cultural. A causa é a tendência humana 
para a imitação. 
-Teoria dos círculos culturais, desde Egipto para 
outras culturas (ex.: vidro). 
Ratzel (1844-1904) 
Graebner (1877-1934) 
Frobenius (1873-1938) 
G.E. Smith (1871-1937) 
W.J. Perry (1887-1950) 
W.H. Rivers (1864-1922) 
 
Particularismo histórico (origem nos EUA) 
-Cada cultura tem uma história particular. 
-Noção de área cultural. 
- A difusão pode acontecer em qualquer direcção. 
- Relativismo cultural. 
- Evolução também do complexo para o simples. 
- Trabalho de campo no terreno (Boas) 
Franz Boas (1858-1942) 
Carl Wissler (1870-1947) 
Alfred Kroeber (1876-1960) 
Robert Lowie (1883-1957) 
Entre a 1ª e a 
2ª Guerras 
mundiais 
-Sucesso do colonialismo 
 
Funcionalismo (Reino Unido) 
 Noções de função, estrutura social, 
interdependência, equilíbrio funcional, necessidade, 
ordem. 
 Spencer: função = obrigação nas relações 
sociais. 
 Durkheim: função = satisfaz uma necessidade 
social. 
 Malinowski: função = a organização social 
satisfaz necessidades biológicas, psicológicas e 
sociais. 
 
Bronislaw Malinowski (1884-
1942) 
A.R. Radcliffe-Brown (1881-
1955) 
E.E. Evans-Pritchard (1902-
1973) 
Meyer Fortes (1906-1983) 
TEMA	4:	BREVE	HISTÓRIA	DAS	TEORIAS	ANTROPOLÓGICAS	
 
 
99 
Cultura e personalidade (EUA) 
 A personalidade é moldada pela cultura. 
 Discípulos de Franz Boas. 
 Influênciada psicanálise e de Nietzche. 
 “Personalidade de base” partilhada por todos 
os membros de uma cultura 
 Tipos de culturas: dionisíacas (extâse), 
apolíneas (moderação); pré-figurativas, pós-
figurativas, co-figurativas. 
Ruth Benedict (1887-1948) 
Margaret Mead (1901-1978) 
Gregory Bateson 
Ralph Linton (1893-1953) 
Abram Kardiner (1891-1981) 
Anos 1950 
 
 
 
 
-Começa a descolonização Neo-evolucionismo 
 Cultura como um sistema de adaptação ao 
meio ambiente. 
 A tecnologia, o uso da energia e a demografia 
como elementos chave da evolução. 
 Os estádios de complexidade social e avanços 
tecnológicos (bando, tribo, perfeitura e estado). 
 Evolucionismo unilinear. 
 Os factores tecnológicos determinam os traços 
ideológicos e sociológicos de um grupo humano. 
 Confronto com Alfred Kroeber (que sublinha os 
aspectos ideológicos como motores da mudança 
cultural). 
 
Leslie White (1900-1974) 
 
Ecologia Cultural 
 Cultura como sistema de adaptação ao meio 
natural. 
 Motor da mudança: aspectos tecnológicos, 
mas também a organização da produção. 
 Evolucionista multilinear. 
Julian Steward (1902-1972) 
TEMA	4:	BREVE	HISTÓRIA	DAS	TEORIAS	ANTROPOLÓGICAS	
 
 
100 
Materialismo cultural 
 Cultura como um mecanismo de adaptação 
ao meio. 
 A aplicação de tecnologias semelhantes 
tende a produzir sistemas de produção e de 
organização semelhantes. 
 As condições materiais da existência 
actuam, determinantemente, sobre a vida quotidiana 
e impõem limitações. 
 Ecossistema, energia, adaptação. 
 
Marvin Harris (1931-2001) 
Rappaport, Vayda, Marvin 
Harris, o 1º Marshall Sahlins 
Anos 
1960,1970 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
-Movimentos de liberação 
nacional e processo de 
descolonização 
-Guerra fria e liderança 
mundial dos EUA. 
-Guerra do Vietname 
-Maio de 1968 
Estructuralismo 
 Existe uma cultura humana, não só culturas. 
Existe uma unidade psíquica da humanidade. 
 Há regras culturais universais que são um 
apriori. 
 A cultura é entendida como um sistema de 
signos partilhados (influência da linguística). 
 A estrutura é subjacente à cultura e à 
sociedade. 
 Existe uma mente humana universal que 
organiza o conhecimento do mundo em opostos 
binários ou categorias dicotómicas: limpo /sujo; 
acima/ abaixo; ordem/ desordem; puro / impuro; 
direita / esquerda; homem / mulher... 
Claude Lévi-Strauss 
(1908-2009) 
 
 
 
TEMA	4:	BREVE	HISTÓRIA	DAS	TEORIAS	ANTROPOLÓGICAS	
 
 
101 
Antropologia Cognitiva ou etnociência 
 A Cultura é um sistema de conhecimentos, 
percepções e crenças partilhados. 
 Estuda a forma como os fenómenos são 
organizados na mente das pessoas. 
Berlin, Kay, Goodenough, Del 
Hymes, Tyler... 
Antropologia Simbólica 
 A cultura como um sistema de símbolos, 
através dos quais os membros de uma sociedade 
comunicam a sua visão do mundo. 
 Cultura como veículo de comunicação. 
 Clifford Geertz (1926-2006), 
David M. Schneider (1918-
1995), Victor Turner (1920-
1983), Mary Douglas… 
 
 
 
 
 
 
 Anos 1970 
 
 
 
 
 Antropologia Marxista 
 Paradigma dos modos de produção. 
 Relação dialéctica entre a base material e a 
cultura, entre a infra-estrutura e a superestrutura. 
 Articulação de diferentes modos de produção. 
Maurice Godelier, E.Terray, 
Claude Meillasoux, Maurice 
Bloch, Eric Wolf,… 
 
 
 
TEMA	4:	BREVE	HISTÓRIA	DAS	TEORIAS	ANTROPOLÓGICAS	
 
 
102 
Anos 1980 e 
1990 
 Antropologia Semântica 
 
 A antropologia semântica estuda os seres 
humanos, enquanto criadores de sentido e não como 
receptores passivos de estruturas culturais. 
 O sentido é transmitido através da linguagem 
e o simbolismo. 
 As culturas organizam sistemas semióticos, 
isto é, geografias morais que condicionam o meio 
social, autoperpetuando-se e modificando-se, 
apenas, com novas experiências. 
 A antropologia como um jogo de espelhos. 
 Pensa o poder e a hegemonia como 
elementos fundamentais da definição de cultura. 
 
 Edwin Ardener, 
Robert Parkin. 
 
Anos 1980 e 
1990 
 Antropologia interpretativa 
 A antropologia é uma interpretação de 
interpretações. 
 A cultura é uma rede de significados e de 
significações. 
Antropologia pós-moderna 
 A realidade é sempre interpretada. 
 A antropologia é uma interpretação de 
interpretações. 
 Crítica das retóricas de autoridade clássicas. 
 Novo paradigma do trabalho de campo: 
etnografia multisituada, dialogia,... 
Clifford Geertz 
James Clifford 
George Marcus 
Paul Rabinow 
Dennis Tedlock 
Renato Rosaldo 
Stephen Tyler 
Michael Taussing 
TEMA	4:	BREVE	HISTÓRIA	DAS	TEORIAS	ANTROPOLÓGICAS	
 
 
103 
2000 - Antropologia reflexiva 
 O antropólogo, enquanto instrumento de 
conhecimento antropológico deve reflectir sobre o 
seu papel no terreno para esclarecer melhor a 
construcção intersubjectiva do saber antropológico. 
 A forma de ver e pensar os problemas é parte 
do problema de investigação. 
 
 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 104 
© APONTAMENTOS DE ANTROPOLOGIA SOCIOCULTURAL 2011-2012 – Prof. Dr. Xerardo 
Pereiro – Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) – antropólogo – Correio 
electrónico: xperez@utad.pt Web: www.utad.pt/~xperez/ 
 
TEMA 5: METODOLOGIA DA INVESTIGAÇÃO 
ANTROPOLÓGICA 
 
Objectivos: 
-Apresentar o método etnográfico como uma das características distintivas da 
antropologia. 
-Reflectir e discutir sobre o trabalho de campo antropológico como experiência 
distintiva da antropologia. 
-Introduzir os estudantes nas técnicas de investigação antropológicas. 
 
Guião: 
5.1. Enfoques da investigação antropológica. 
5.2 A investigação antropológica enquanto projecto e processo. 
5.3. O trabalho de campo antropológico. 
5.4. Técnicas de investigação antropológica. 
5.5. A observação etnográfica. 
5.6. A entrevista oral. 
5.7. A história de vida. 
5.8. O antropólogo em contextos urbanos 
5.9. A ética do trabalho de campo. 
5.10. A escrita antropológica. 
Bibliografia 
Sítios em Internet 
 
“O peixe compreende a água na que vive quando sai à terra” (Peacock, 1989: 25) 
 
 
5.1. ENFOQUES DA INVESTIGAÇÃO ANTROPOLÓGICA 
 
“A estatística é como o biquíni, mostra quase tudo mas esconde o principal” 
(Roque Pinto, 2-04-2009, Vila Real, Restaurante Terra e Montanha). 
 
Em Ciências Sociais podemos considerar dois enfoques de cariz epistemológico: o 
enfoque quantitativo da investigação e o enfoque qualitativo. Há duas formas de 
entender a relação entre estes dois enfoques: 
 
a) A perspectiva de oposição e diferenciação entre os dois enfoques. 
b) A perspectiva de inter-relação e enfoque misto, que defende um continuum 
entre ambas e a utilização dos dois enfoques em função dos problemas, 
contextos e situações de investigação. 
 
Desde a primeira perspectiva podemos estabelecer uma dicotomia já histórica: 
 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 105 
Enfoque quantitativo (Positivismo) Enfoque qualitativo (Naturalismo) 
-Augusto Comte, Emile Durkheim. 
-Investigação “científica” ligada às 
ciências naturais (ex.: Física). 
-Objectivo: medir coisas ou 
fenómenos, procura factos e causas. 
-Métodos estatísticos e inquéritos por 
questionário. Também 
experimentação. 
-Procura leis universais através da 
explicação, da dedução, da amostra, 
da generalização de resultados, da 
utilização de variáveis e da verificação 
das respostas e hipóteses. 
 
 
-Max Weber. 
-Princípio: os fenómenos sociais são 
diferentes dos fenómenos físicos. O 
comportamento humano não é 
mecânico. 
-Procuram o entendimento 
(“verstehen”), os significados 
subjectivos, a compreensão do 
contexto. 
-Método dos “tipos ideais”, da 
descrição da experiência concreta, das 
suas regras e dos padrões sociais. 
 -Significados sociais. 
-Procura compreender os quadros de 
referência dos actores sociais. 
-Analisa o modo como as pessoas 
percebem o mundo. 
-Mais indutivo do que hipotético-
dedutivo. 
Adaptado de Hernández Sampieri,R.; Fernández-Collado, C.; Baptista Lucio, P. 
(2006: 3-30); Taylor e Bogdan (1998: 15-30); Hammersley e Atkinson (1994: 17). 
 
O positivismo estaria mais virado para a explicação da realidade, a investigação 
experimental e a análise quantitativa. Alguns dos seus princípios seriam: 
 
a) A ciência natural enquanto modelo das ciências sociais: lógica do 
experimento, variáveis quantitativas medíveis e manipuladas para estudar a 
relação entre elas. 
b) Tentativa de obter leis universais: método hipotético-dedutivo, estatística, 
inquérito por questionário, amostra, generalização de resultados, apelo a 
leis universais que permanecem constantes e estabelecem relações 
regulares entre variáveis. 
c) Observação da realidade com base nos sentidos (empirismo tradicional) e 
diferença entre ciência e senso comum. 
d) Verificação de teorias: confirmar ou desmentir estas por meio de 
experimentos e análise estatístico. 
 
Pelo contrário, o naturalismo defende um tipo de investigação algo diferente, isto 
é, para esta corrente, o principal objectivo do investigador social deve ser 
descobrir o que acontece num lugar, o significado das suas acções para a gente 
envolvida nele e a sua representação. Para o naturalismo, os fenómenos sociais 
são diferentes dos fenómenos naturais e físicos. A fenomenologia e a 
hermenêutica são alguns dos pressupostos filosóficos do naturalismo. Nesta linha, 
as relações sociais não podem ser entendidas em termos de causa-efeito ou baixo 
leis universais. As acções sociais obedecem a intenções, motivações, atitudes, 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 106 
crenças, valores, significados, sentidos, sentimentos, emoções, que não podem 
ser reduzidos a uma lei quantitativa. 
 Recentes críticas ao naturalismo questionam o risco de cair num relativismo 
extremo (ex.: as pessoas se comportam de forma diferente em função dos 
contextos). Nas últimas décadas tem havido uma certa desilusão pelos métodos 
quantitativos e um acréscimo do interesse pelos métodos qualitativos (ex.: 
histórias de vida...). Decerto, na nossa óptica, qualquer realidade social não pode 
ser entendida apenas através da quantificação matemática. Questões como a 
felicidade, a tristeza, a dor, os sentimentos, ou os afectos não podem ser 
reduzidos a uma quantificação, ainda que a quantificação possa ajudar na sua 
compreensão. 
 Na actualidade também são muitos os que adoptam um enfoque misto 
(qualitativo-quantitativo), ainda que predomine um enfoque sobre o outro, sim que 
se entrecruzam em muitas investigações. No caso da investigação antropológica, 
ainda que costuma utilizar técnicas mais qualitativas, pode servir-se também de 
técnicas quantitativas, mas o central em antropologia são as unidades de 
interpretação do significado e das significações. 
 
5.2. A INVESTIGAÇÃO ANTROPOLÓGICA ENQUANTO PROJECTO E 
PROCESSO 
 
“Las gentes entre las que estudian los antropólogos siempre dejan en ellos 
algunas huellas. Una de ellas, muy elemental y generalmente profunda, es el 
espíritu de convivencia, de comprensión” (Velasco, 1994: 14). 
 
Investigar é perguntar, o que leva a respostas e novas perguntas. O processo de 
investigação antropológica obedece a um modo de abordagem dos problemas 
socioculturais e às suas respostas. Toda investigação antropológica obedece a um 
projecto de investigação explícito ou implícito, de aí a importância de pensar e 
realizar um desenho da investigação. Este projecto deve adaptar-se ao terreno e 
problema de investigação e não sempre ao contrário ou de uma forma rígida. 
Um projecto de investigação obedece a uma reflexão epistemológica 
(abordada no ponto anterior), metodológica e tecnológica. A reflexão 
epistemológica define as questões dos paradigmas e problemáticas comuns à 
investigação científica em geral, ela enquadra teoricamente as conceitualizações 
dos objectos de investigação. 
Pelo que faz referência à reflexão metodológica, esta responde ao por quê 
das técnicas de investigação social, o seu sentido e significado, os seus princípios 
e orientações na sua ligação com a epistemologia e o problema em estudo. 
Enquanto à reflexão tecnológica, trata-se de reflectir sobre as técnicas de 
investigação social mais usuais no campo do turismo. E se os métodos podem ser 
considerados como a forma de ordenar os procedimentos para atingir um fim, as 
técnicas são os procedimentos em aplicação do ordenamento. A articulação 
destes três níveis permitirá um melhor desenho e desenvolvimento de um projecto 
de investigação. 
Destacar que o método de investigação antropológica é particular da 
antropologia e distingue à mesma, isto não quer dizer que a antropologia não 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 107 
partilhe com outras ciências a utilização de determinadas técnicas. A metodologia 
não é apenas um conjunto de técnicas de investigação, porém, é o conjunto de 
princípios orientadores da investigação. Em antropologia dois são os princípios 
metodológicos fundamentais: a) a etnografia e a atitude de observação no terreno, 
com imersão na vida dos “outros” com o objectivo de compreender estes; b) a 
comparação entre grupos humanos, épocas, géneros, etc. 
O conhecimento antropológico não procede dos laboratórios e sim de 
culturas e grupos humanos vivos (Burgess, 1997: 11), pelo que o antropólogo 
aborda o mais profundamente humano, o quotidiano das pessoas e os seus 
significados. Ainda assim temos que reconhecer que os conhecimentos 
produzidos pela antropologia obedecem a interesses pessoais e sociais, não 
apenas a interesses académicos e científicos, pelo que é importante reflectir sobre 
essas agendas. 
Estas são algumas das especifidades do processo de investigação em 
antropologia: 
 
1. Escolher o problema de investigação. 
2. Escolha da área de estudo (teórica e territorial). 
3. Documentação e literatura sobre essa área e a perspectiva teórica escolhida. 
4. Estudo da fala local, autorizações, vacina (ex.: contra a malária ou paludismo, 
febre amarela, etc.), material necessário, etc. 
5. Deslocação, contacto, convivência, entrada no terreno. 
 
No caso de trabalhar em contextos com riscos de contrair doenças é muito 
importante pensar nas vacinas. Destacar que a malária está a resistir, no Sudeste 
Asiático e na África, a “cloroquina” e a “pirimetamina”, medicamentos que 
costumam ser utilizados no seu combate e prevenção. A malária ou paludismo é 
uma doença transmitida pelo mosquito ánofele, que actualmente está em mutação 
e que oferece alguma imunidade através do parasita “plasmodium falciparum”, 
segundo fontes da revista Science (Jornal de Notícias, 20 de Agosto de 2004, p. 
10). 
 Como preparar um projecto de investigação antropológica? Vejamos um 
modelo que nos pode ajudar: 
 
PROJECTO DE INVESTIGAÇÃO: 
 
1. PERGUNTAS DE PARTIDA 
 
2. EXPLORAÇÃO: 
a) REVISÃO BIBLIOGRÁFICA. 
 
b) ENTREVISTAS E REUNIÕES EXPLORATÓRIAS. 
Nesta fase o objectivo é encontrar pistas de reflexão, ideias e hipóteses de trabalho. 
 
3. PROBLEMÁTICA: 
-Perspectiva teórica: (i.e.: antropologia simbólica e interpretativa) 
-Quadros conceptuais da investigação: (ex.: tempo linear, tempo cíclico, actor, cenário, 
bastidores, espaço publico, espaço privado, festa, catarse, estrutura social, ritual, 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 108 
performance,... ) 
 
4. CONSTRUÇÃO DO MODELO DE ANÁLISE: 
-Articular conceitos e hipóteses: Indicadores  Componentes  Dimensões  
Conceitos Hipóteses  Refutabilidade 
 
5. OBSERVAÇÃO: 
a) Que observar? 
b) Em donde observar? o campo de análise (unidades de observação), a amostra 
c) Como observar? Instrumentos de observação (inquéritos, guiões,...) 
 
Desenhos brandos (mais indutivos): 
-Baseados na etnografia (observação participante, trabalho com informantes chave) e em 
métodos qualitativos. 
-Melhor para contextos com obstrução, programas com metas menos definidas ou 
especialmente complexas e diversas, re- orientações dos programase circunstâncias de 
rápida mudança. 
-Obedece mais a objectivos do que às hipóteses prévias. 
 
Desenhos duros (mais dedutivos): 
-Com grupos controlados. 
-Com base em hipóteses prévias. 
-Com programas de objectivos claros e medíveis facilmente. 
-Verificar e comprovar hipóteses definidas a priori, com base em observações 
sistemáticas da problemática de estudo e as suas unidades de análise. 
-Para produzir uma avaliação final. 
-Investigação rápida para a tomada de decisões (Uma investigação tardia é uma mau 
investigação). 
 
Desenhos mistos (qualitativos e quantitativos) 
 
6. ANÁLISE DAS INFORMAÇÕES: INTERPRETAR OS DADOS. 
 
7. CONCLUSÕES. 
 
 
No desenho da investigação é fundamental a redacção de um projecto de 
investigação, pois o que não se escreve corre o risco de desaparecer e além mais 
é uma forma de delimitar o problema de investigação no tempo e no espaço. O 
projecto serve para orientar, definir e redefinir a investigação. É muito importante 
fazer uma revisão crítica da bibliografia existente, podendo assim esclarecer o 
estado de conhecimento ou “estado da arte” sobre o assunto abordado. Devemos 
ler o que outros já escreveram sobre o assunto, sobre métodos de investigação, 
teorias e modelos de análise. Aqui abaixo podemos encontrar um pequeno guião 
para a redacção de um projecto de investigação: 
 
 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 109 
ESTRUTURA DE REDACCÃO DE UM PROJECTO DE INVESTIGAÇÃO 
 
1. Introdução 
2. Formular o problema de investigação 
 2.1. Estado da questão 
 2.2. Modelo teórico 
 2.3. Hipóteses ou objectivos 
3. Contexto da investigação 
 3.1. Unidades de análise 
 3.2. Contexto geográfico 
 3.3. Período cronológico estudado 
4. Esquema do trabalho 
5. Metodologias e técnicas 
6. Planificação do trabalho 
 6.1. Plano de trabalho e calendário 
 6.2. Membros da equipa de trabalho 
 6.3. Orçamento 
7. Bibliografia 
8. Anexos 
 
 
 
 
5.3. O TRABALHO DE CAMPO ANTROPOLÓGICO 
 
“A compreensão de um mundo desterritorializado requer um ponto de vista 
desterritorializado. Para entende-lo na sua totalidade, a perspectiva analítica deve 
liberar-se das restrições locais e nacionais… Pensemos o mundo nos seus fluxos 
e, depois, façamos as perguntas pertinentes à nossa realidade” (Ortiz, 1998: XXI- 
XXII). 
 
O trabalho de campo antropológico é o que diferencia a antropologia, é “o que a 
sangue dos mártires era para a Igreja Católica” (Seligman, in Stocking, 1992: 30). 
O trabalho de campo é um método de investigação sóciocultural, um conjunto de 
procedimentos e regras para produzir e organizar conhecimento, e que integra 
(Velasco e Díaz de Rada, 1997): 
a) Uma situação metodológica que implica “estranhar-se, ter curiosidade, 
descrever densamente, traduzir e interpretar” a realidade sociocultural com 
a qual lidamos. Nesta situação de encontro com outros conhecemos os 
seus problemas, as suas percepções, o seu comportamento e os seus 
modos de vida nos seus próprios términos. 
b) Um processo de conhecimento com base numa estadia no terreno, através 
da qual estudar os significados socioculturais no seu contexto. 
c) Uma experiência de contacto intercultural com o fim de conhecer a 
alteridade. Partimos da ideia de que há diferentes maneiras de fazer 
trabalho de campo. 
 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 110 
Portanto, o trabalho de campo antropológico não é uma simples técnica de 
investigação ou um instrumento de recolha primária de dados, é algo mais. A 
etnografia é a forma de perguntar e escrever que produz descrições e registos 
sobre os modos de vida do antropólogo e o dos estudados (Kenzin, 1997). O 
trabalho de campo é uma forma de produzir conhecimento com base na 
experiência do investigador, isto é um contacto directo com a realidade, um 
conhecimento obtido por repetição de observações e/ou por prova de ideias ou 
hipóteses (Hessen, 1961). 
 O antropólogo faz trabalho de campo para examinar eventos singulares e 
microscópicos para responder a grandes perguntas universais. Ver o universal no 
quotidiano e ver o quotidiano no universal são tarefas do antropólogo em trabalho 
de campo, independentemente de que terreno seja uma pequena comunidade, 
uma população migrante transnacional ou a comunidade global. O antropólogo 
estuda no trabalho de campo problemas humanos em contextos de diversidade 
cultural. 
 
A invenção do trabalho de campo 
O trabalho de campo é também um ritual de passagem da tribo antropológica que 
tem os seus heróis e os seus mitos (ex.: mito fundador de Malinowski). Um dos 
primeiros antropólogos que aplicou o método etnográfico foi Lewis Morgan nos 
EUA, em concreto em 1859, quando estudou várias “tribos” de Nebraska e 
Kansas. Na Inglaterra antropólogos como James Frazer (autor de “O Ramo 
Dourado”, 12 volumes) quando foi perguntado se alguma vez na sua vida fez 
trabalho de campo e se conhecera algum “selvagem”, ele respondeu: “Deus me 
livre, nunca jamais,...”. Mas também é certo que autores como James Frazer ou E. 
B. Tylor promoveram, através da British Association for the Advancement of 
Science, a realização por outros de pequenos trabalhos de campo baseados em 
inquéritos formais aplicados por missionários e administradores coloniais. Foi 
assim como Franz Boas levou a cabo os seus estudos etnográficos entre os índios 
da Colômbia Britânica de 1888 a 1894. 
 E apesar de que já Rivers propunha no seu “Notes and Queries in 
Anthropology” algumas recomendações sobre como seguir os ciclos de vida da 
comunidade estudada – o género monográfico-, foi B. Malinowski (1973) quem 
sistematizou nos anos 1920 o método etnográfico de trabalho de campo, na sua 
obra sobre “Os argonautas do Pacífico Ocidental”: 
 
“En primer lugar, para empezar con temas que no pudieran despertar suspicacias, 
comencé a “hacer” tecnología. Unos cuantos indígenas se pusieron a fabricar diversos 
objetos. Fue fácil observarlos y conseguir los nombres de las herramientas e incluso 
algunas expresiones técnicas sobre los distintos procedimientos...” (Malinowski, 1973: 22) 
 
 “Sabía que el mejor remedio era ir recogiendo datos concretos, y obrando en 
consecuencia hice un censo del poblado, tomé notas de las genealogías, levanté planos y 
registré los términos de parentesco” (Malinowski, 1973: 23). 
 
“Debe tenerse en cuenta que los indígenas, al verme constantemente todos los días, 
dejaron de interesarse, alarmarse o autocontrolarse por mi presencia, a la vez que yo dejé 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 111 
de ser un elemento disturbador de la vida tribal que me proponía estudiar, la cual se había 
alterado con mi primera aproximación, como siempre ocurre en las comunidades 
primitivas cuando llega alguien nuevo” (Malinowski, 1973: 25). 
 
“Tuve que aprender a comportarme y, hasta cierto punto, adquirí el “sentido” de las 
buenas y las malas maneras indígenas. Y fue gracias a esto, a saber gozar de su 
compañía y a participar en alguno de sus juegos y diversiones, como empecé a sentirme 
de verdad en contacto con los indígenas; y ésta es ciertamente la condición previa para 
poder llevar a cabo con éxito cualquier trabajo de campo” (Malinowski, 1973: 26). 
 
“... hay toda una serie de fenómenos de gran importancia que no pueden recogerse 
mediante interrogatorio ni con el análisis de documentos, sino que tienen que ser 
observados en su plena realidad”. Refírese ao que el denomina “os imponderables da 
vida real” (Malinowski, 1973: 36). 
 
Malinowski (1973) converteu-se em uma espécie de herói para a antropologia e a 
sua obra “Os Argonautas do Pacífico Ocidental” num mito. Nesta obra, este traduz 
parte do trabalho de campo feito na Nova Guiné, concretamente nas Ilhas 
Trobriand (hoje ilhas Kiriwina, parte da Papua Nova Guiné), donde viveu com os 
nativos durante dois anos, aprendendo a conviver com eles, a sua língua e os 
seus costumes. As recomendações que ele dá sobre o trabalho de campo, foram 
muito importantes para a antropologia, convertendoo trabalho de campo num 
ritual de passagem da tribo antropológica (Velasco e Díaz de Rada, 1997: 19). 
Desta obra de Malinowski, o mito fundador do trabalho de campo, podemos 
destacar algumas ideias chave para reflectirmos sobre o trabalho de campo: 
 
 Ver os dados etnográficos como capazes de configurar uma teoria. O 
antropólogo sabe que as pessoas com as que estuda produzem “teorias 
nativas”. 
 Dar um esquema claro e coerente da estrutura social. 
 Destacar as normas culturais. 
 Estudar os fenómenos quotidianos e os extraordinários. 
 Um antropólogo deve expor que dados foram obtidos das suas 
observações directas, e quais das indirectas. 
 O antropólogo deve recolher os relatos dos informantes, documentos e 
dados de observação do comportamento (triangulação). 
 O diário de campo é um instrumento necessário no qual devem constar: 
peculiaridades, repetições no comportamento, situar o acto nas suas 
coordenadas, descrever actores, espectadores, sítio. Também é necessário 
participar na vida social. 
 É preciso ter em conta: a mentalidade, as conceições nativas, as formas de 
expressão, as ideias, os sentimentos, os motivos, os actos impostos pela 
costume,...Mas sobre todo o que sentem e pensam em quanto membros de 
uma comunidade determinada (Malinowski, 1973: 40). 
 É preciso citar as declarações nativas, e aprender a língua nativa. 
 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 112 
Apesar de que Haddon introduz o termo de “trabalho de campo”, derivado do 
discurso naturalista, na antropologia britânica, Malinowski descobriu uma nova 
forma de fazer trabalho de campo através do seu novo comportamento no campo. 
O seu primeiro trabalho de campo tinha sido também nas Trobriand, mas em 
Mailu. Neste terreno tinha realizado, seguindo o método de recolha total da cultura 
do “Notes and Queries” de Rivers, um informe etnográfico historicista e 
evolucionista, uma etnografia de varanda com intérprete e entrevistas, durante 
uma estadia curta (2 mêses) e superficial (Alvarez Roldán, 1994). 
 Não foi por acaso que Malinowski faz trabalho de campo nas ilhas 
Trobriand, pois ali tinha trabalhado o seu mestre, o antropólogo Seligman. No seu 
segundo trabalho de campo, o que depois o convertiria num antropólogo de 
prestígio, ele permanece em Kiriwina, onde muda a sua atitude no terreno, criando 
assim o que conhecementos como trabalho de campo malinowskiano (Álvarez 
Roldán, 1994): 
1. Longo tempo entre os nativos. 
2. Investigação centrada em temas específicos. 
3. Estudou o presente e não o passado. 
4. Aprendeu a língua nativa. 
5. Observou a vida quotidiana e as instituições nativas. 
6. Mudou o estilo da escrita etnográfica. 
 
Parece ser que ficou nas ilhas Trobriand muito tempo pelo tipo de comunidade 
que encontrou, isto é, materlinear e com chefaturas. Será em Kiriwina onde 
elabore informes etnográficos sincrónicos e funcionalistas (Malinowski, 1973). Em 
Kiriwina vai permanecer uma longa estadia e aprende a língua nativa para 
entender o significado nativo, sem conformar-se com chegar a encontrar uma 
equivalência verbal em outras línguas. É assim que Malinowski inventa o método 
etnográfico (Álvarez Roldán, 1994) quebrando assim a anterior separação entre a 
recolha de dados e a teoria elaborada por outros, e convertendo o antropólogo 
num autoinstrumento de investigação (Velasco e Díaz de Rada, 1997: 21). 
 
O trabalho de campo como método 
 
“… el etnógrafo es un tipo de carne y hueso, con sus debilidades, sus miserias y, 
sin embargo, con toda su humana grandeza que pone a prueba su propia persona 
al intentar captar la ajena” (Rabinow, 1992: 16). 
 
Um método é um conjunto de princípios que orientam a selecção do objecto de 
estudo, a formação dos conceitos apropriados e as hipóteses. Todo método é um 
caminho para chegar a algum sítio de uma maneira certa. A metodologia é um 
conjunto de procedimentos e regras para produzir conhecimento e está interligada 
com o enquadramento teórico global. Portanto é algo mais que uma técnica ou um 
conjunto delas. As técnicas de investigação são os procedimentos operativos e 
os instrumentos para produzir dados (i.e.: questionários, histórias de vida, 
inquéritos, entrevistas, etc.). Esses dados servem para compreender os 
fenómenos, para captar as relações entre os fenómenos e a intencionalidade das 
acções sem permanecer na parte exterior (só descrição de fenómenos). 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 113 
 O método dos antropólogos é o trabalho de campo etnográfico, através do 
qual se faz etnografia. De acordo com este método, o antropólogo converte-se no 
principal instrumento de recolha de dados, é por tanto uma inter-subjectividade 
entre observador e observado. A etnografia é a descrição do comportamento, das 
ideias, das crenças, dos valores, dos elementos materiais, etc. quotidianos e 
espontâneos de um grupo humano. A etnografia tem em conta 3 aspectos: 
1. O que as pessoas dizem. 
2. O que as pessoas fazem. 
3. O que as pessoas pensam que se deveria fazer. 
 
Como definimos mais acima, o trabalho de campo pode ser considerado como: a) 
uma situação metodológica de encontro intercultural; b) um processo; c) uma 
experiência que diferença à antropologia. De ai que possa haver diferentes formas 
de fazer trabalho de campo (Velasco e Díaz de Rada, 1997: 18) e de aí a 
necessidade de explicar as condições em que é realizado o trabalho de campo e a 
produção de conhecimento. Este é um dos grandes contributos da antropologia 
reflexiva, isto é, uma boa forma de tratar os problemas teóricos e práticos da 
metodologia de investigação é percorrer os caminhos andados na interacção entre 
o investigador e os investigados. Nessas interacções encontraremos relações de 
poder, espaços de negociação dos papéis identitários, e nalguns casos 
emporedamento dos próprios estudados. 
 Enquanto processo de socialização secundária, o trabalho de campo obriga 
a deslocar-nos do nosso meio sociocultural, contactar com as pessoas, integrar-
nos, aprender a sua cultura através do estranhamento e o questionamento dos 
nossos preconceitos, para logo retornar e desenhar um espelho da nossa cultura. 
 O trabalho de campo como processo metodológico obriga-nos a descrever, 
traduzir, explicar e interpretar a cultura e as relações sociais estudadas. A 
descrição etnográfica deve ser densa (Geertz, 1987) e microscópica (Velasco e 
Díaz de Rada, 1997: 48) para diferenciar os matizes de condutas, espaços e 
regras culturais e interpretar melhor os significados culturais. De aí a importância 
de utilizar o diário de campo como instrumento de investigação. Explicar significa 
desenhar tendências e regularidades da vida sociocultural que estudamos. 
Interpretar prende-se com uma visão da antropologia como uma das 
Humanidades ou das Artes pela sua forma de proceder e fazer. Interpretar é 
descobrir a ordem estrutural da sociedade, é captar os significados da realidade 
sociocultural para os diferentes agentes implicados nela. 
 De acordo com Paul Rabinow (1992: 16) há duas formas de fazer trabalho 
de campo: 
 
a) Orientar o trabalho de acordo com uns objectivos a atingir e não desviar-se com 
outras coisas por muito interessantes que estas possam parecer. 
b) Adaptar-se ao objecto de estudo e ser mais flexível no processo de trabalho. 
 
A etnografia e o método comparativo 
A etnografia é a base da comparação entre culturas, e o seu objectivo é 
representar a cultura. Podemos afirmar que a etnografia é hoje uma “fusão de 
horizontes”, uma conversa intercultural sem imposições (Gadamer, 1978). A 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 114 
etnografia é uma “dialógica” (Page, 1988), uma conversa com o outro para fazer 
crescer a consciência, não a unanimidade ou a verdade. A etnografia é uma 
“transvaloração”, uma maneira de aprender a ver-se uma vez que olhamos os 
outros, é voltar sobre nos próprios a mirada previamente informada pelo contacto 
com o outro. É tambémuma ponte através da qual a informação passa de uma 
cultura a outra, é um tipo de tradução (Todorov, 1988: 9-31). 
O trabalho de campo é um requisito metodológico que consiste em ir do 
distanciamento à proximidade, para logo regressar da proximidade ao 
distanciamento e construír uma interpretação e uma comparação entre nós e os 
outros. O trabalho de campo é um estado psicológico próximo do namoro às vezes 
(Buxó, 1995), mas também pode provocar angústias, ansiedades e cansaços 
fortemente humanos, como assim o reflecte o diário de campo de Malinowski 
(1989). 
Além mais o trabalho de campo pode ser pensado como um ritual de 
passagem da tribo antropológica, uma experiência auto-tranformadora, um ritual 
de iniciação e um dobre choque cultural: nativizar-se e re-nativizar-se (Peacock, 
1989: 95). 
O trabalho de campo está condicionado pela posição que o antropólogo 
ocupa nos sistemas políticos, sociais e económicos (i.e.: centro, semiperiferia, 
periferia). Estas agendas, muitas vezes ocultas, devem ser estudadas e feitas 
conscientes para entender melhor a experiência de trabalho de campo. Isto 
ajudar-nos-á a entender melhor o “efeito rashomon” (Heider, 1988; Cardín, 1988) 
em antropologia, isto é, durante o nosso trabalho de campo não seleccionamos 
todas as vozes dos nativos e portanto escolhemos algumas dentro da 
complexidade com a qual nos debruçamos. Reflectir sobre as causas de por quê 
escutamos mais umas do que outras obriga-nos a adoptar uma posição de 
reflexão e autoconsciência. 
Para que uma etnografia seja boa deve ser necessariamente comparativa. 
Quatro são os planos que podemos estabelecer na comparação: 
 
1. Comparação entre culturas. Ex.: nos – os outros. 
2. Comparação temporal entre o passado e o presente, ou também entre dois 
tempos históricos. 
3. Comparação entre duas ou mais teorias. 
4. Comparação entre as ideias prévias e as ideias finais depois do trabalho de 
campo. 
 
O trabalho de campo e a entrada no terreno 
O antropólogo deve explicar aos estudados o que vai fazer, a duração do trabalho 
e a utilização da informação. Para isso precisa de autorizações e pensar nos 
limites éticos (privacidade, confidencialidade, anonimato, permissões para 
publicar, etc.), negociar e ganhar-se a confiança da gente. Devemos pensar que 
podem ser precisas cartas, referências, etc. Todas as instituições e terrenos têm 
“porteiros”. 
A entrada pode ser por cima ou por baixo; entrar por cima através de 
alguém conhecido, importante ou de confiança para os estudados pode ser 
positivo, negativo ou neutro para o nosso trabalho (ex.: Não é igual entrar através 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 115 
de um presidente de Junta de Freguesia que através de um padre...). Tudo isto 
condiciona o terreno e os factores de produção de conhecimento mudam de 
acordo com os factores inter subjectivos, que são “objectivados” de alguma forma 
neste exercício reflexivo que deve integrar os relatórios de investigação ao pé da 
metodologia ou em relação com ela. 
Devemos ganhar-nos gradualmente a confiança dos estudados e 
ultrapassar a inibição com o tempo. Devemos também pensar no equilíbrio da 
amostra de informantes; uma técnica pode ser a da “bola de neve”, isto é, um 
informante vai-nos levando a outro; mas noutros casos a amostra de pessoas com 
as quais trabalhamos devem ser pensadas em função da sua representação face 
ao problema em estudo. Estes são alguns dos itens a considerar numa reflexão 
sobre a entrada num terreno: 
 
 Por quê a escolha de: objecto de estudo, instituição-local de estágio, 
orientador? 
 Como foi a entrada na instituição? (i.e.: paciência, ansiedade, negociação do 
acesso, relações e rituais com os porteiros, entrada por cima,...) 
 Como ganhas-te a confiança das pessoas? Como foi a tua apresentação? 
 Simpatias pelos estudados? 
 Qual o teu “papel” ou papéis na instituição de acolhimento? Qual a tua 
imagem? Qual a percepção que tinham de ti inicialmente? E agora? 
 Qual o teu local (zona) de residência? Condiciona as tuas observações do 
problema de investigação? De que maneira? 
 Qual a tua situação económica? (i.e.: bolsa, estágio profissional, etc.) 
 Qual a tua situação mental? Qual o grau de motivação para o trabalho? 
 
5.4. TÉCNICAS DE INVESTIGAÇÃO ANTROPOLÓGICA 
O antropólogo, além da observação participante pode e deve utilizar outras 
técnicas de investigação, com o objectivo de testar e comparar as informações 
que obtemos no terreno. O propósito final será sempre saturar a informação para 
garantir uma fiabilidade e legitimidade autorizada nas nossas análises. Com o 
objectivo de melhor testar, fundamentar e legitimar o conhecimento antropológico 
é ideal ter em conta a seguinte triangulação: 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
OBSERVAÇÃO 
– participante 
Trabalho 
documental 
ENTREVISTAS 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 116 
 
 
 
A triangulação anterior permite também chamar a atenção sobre a necessidade de 
fazer uma antropologia histórica que permita compreender melhor os problemas 
estudados através de uma abordagem diacrónica e processual. A continuação, 
apresentamos, de uma forma breve, algumas técnicas de investigação utilizadas 
em antropologia: 
 
1. Notas de campo (caderno de notas ou de campo). As primeiras impressões 
são muito reveladoras do impacto que outras culturas experimentam em nós. 
Estas notas adquirem maior importância com o tempo. Estas notas devem 
incluir o lugar e o momento de observação, assim como o momento da escrita. 
As notas são um passo intermédio entre os dados e os relatórios etnográficos. 
2. Diário de campo. É um registo diário da observação participante, no qual se 
relata a experiência do antropólogo em relação com os estudados, o que 
dizem, o que fazem e o que pensam (García Jorba, 2000). É uma forma de 
ordenação das notas e um instrumento de autodisciplina. Este é um 
instrumento de controlo da investigação, pois nele reflecte-se como se produz 
o conhecimento, orientando a subjectividade e o papel do investigador no 
terreno. A origem dele está na literatura de viagens. É uma informação relatada 
no momento em que acontece, que utiliza categorias de análise (ex.: 
conceitos...). Um diário de campo pode estar organizado seguindo critérios 
cronológicos ou temáticos. Nele integram-se: 
-Actividades do investigador. 
-Acontecimentos. 
-Conversas. 
-Observações. 
-Hipóteses. 
-Interpretações. 
 
É importante colocar a data, a pessoa, o local, a idade, os sentidos e os contextos 
ou cenários, para dar riqueza contextual e de significado. 
3. Mapas, plantas e censos. Um mapa informa sobre a distribuição espacial de 
certo fenómeno, localiza uma vivenda ou edifício, descreve os princípios de 
organização espacial de uma comunidade, etc. Neste sentido também 
podemos elaborar mapas de percorridos de pessoas durante o dia, mapas 
mentais de valorização do espaço, etc. Os censos informam sobre dos 
membros das unidades familiares, estes censos podem ser elaborados a partir 
de arquivos locais, mas muitas vezes não há e é muito mais rápido utilizar 
informantes. 
4. Genealogias. Informam sobre a distribuição familiar, as relações de 
parentesco, os vínculos familiares e comunitários, etc. No ano 1910 o 
antropólogo W. H. Rivers perguntava aos informantes: nome dos pais, nome 
dos filhos por ordem de idade, matrimónios e filhos deles, nomes dos pais da 
mãe e filhos dela. Há pessoas entre os mais idosos que são verdadeiros 
especialistas nesta problemática. Podem servir para prospectar os direitos de 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 117 
propriedade, as obrigas mútuas, as regras de residência e matrimónio, a 
herança de ofícios, etc. 
5. Histórias e relatos de vida. São relatos sobre a vida de uma pessoa, ainda 
que as primeiras incluem documentos que completem a oralidade biográfica. 
Esse relato informa não só sobre a vida dela, porém também sobre a vida da 
comunidade e os seus valores, opassado e o presente. Para verificar esta 
deveremos ter em atenção a coerência interna do relato, a informação 
proporcionada por outras pessoas, a observação participante e a avaliação 
externa através de documentos e outros. 
6. Histórias de família. 
7. Inquéritos por questionário. Com o objectivo de obter dados de grupos 
amplos e analisar logo estatisticamente as respostas. Pode ser de perguntas 
abertas ou fechadas. 
8. Estudo de casos. Com o objectivo de interpretar acontecimentos exemplares 
de pequena escala, por exemplo a relação entre médico e paciente. 
9. Fotografia e filmagem. São técnicas básicas da etnografia visual e 
audiovisual. São um instrumento de observação muito bom, porque permitem a 
outros reestudar o observado por nos. 
10. Entrevistas com informantes. Há acontecimentos que só acontecem em 
determinados momentos do ano, ou são infrequentes. Outras vezes acontecem 
coisas importantes para a nossa investigação, ao mesmo tempo, mas em 
lugares diferentes. Também é muito importante para descobrir aspectos do 
passado e da memória colectiva. Esta técnica adopta a forma de uma conversa 
informal com o objectivo de obter informação. A qualidade da informação 
depende da comodidade que sinta ao falar o informante, do bom conhecimento 
que tenhamos do informante e do grau de confiança estabelecido. Devemos 
usar vários tipos de informantes como forma de contrastar e verificar a 
informação recolhida, mas também com o objectivo de obter diferentes pontos 
de vista que podem ou não ser coincidentes. 
11. Grupos de discussão ou de debate. Trata-se de reunir a um pequeno grupo 
de pessoas para debater entre eles um assunto de interesse. 
12. Técnicas de análise documental. Essencial para o trabalho em hemerotecas 
e arquivos. 
13. Os orçamentos-tempo. Trata-se de pedir a uma ou várias pessoas que 
anotem ou nos contem as actividades, as horas e os espaços dessas 
actividades. É uma etnografia cronotemporal que permite estudar os 
movimentos no espaço e no tempo de uma pessoa, com o fim de compreender 
o seu modo de vida. 
14. Grupos de debate. É uma técnica de investigação social baseada na 
realização de uma sessão de diálogo em grupo sobre um tema ou assunto 
ligado com o objecto de investigação. Os participantes expressam as suas 
opiniões e pontos de vista. Permite conhecer imaginários colectivos, valores e 
discursos que configuram atitudes e moldam comportamentos. O grupo 
costuma ser reduzido, entre 7 e 10 pessoas. Esta técnica permite observar as 
posições ideológicas com relação ao assunto proposto. Também permite 
avaliar tendências sociais e matizes particulares. A representatividade do 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 118 
grupo obedece não a regras estatísticas e sim a regras sociais (ex.: equilíbrio 
entre grupos de género, idade, status, classe…). 
É fundamental que a convocatória do grupo de debate seja realizada por 
uma pessoa diferente ao moderador do grupo de debate, para que os 
participantes não estabeleçam algum vínculo prévio com ele. No relatório de 
investigação é preciso detalhar o processo de recrutamento dos membros do 
grupo de debate. O papel de moderador deve ser o de um facilitador, um 
apresentador, um animador do debate sem juízos de valor, e expressão da sua 
opinião (Ibáñez, 1979; Ortí, 1986; Callejo, 2001). 
 
15. DAFO (SWOT). É uma técnica que permite avaliar as debilidades, as 
ameaças, forças e oportunidades de uma organização, instituição, situação de 
um grupo humano, desenvolvimento e avaliação de um projecto, etc. A DAFO 
pode ser aplicada a um grupo de trabalho ou de debate, para melhor perceber 
o ponto de vista dos actores sociais. 
 
“Concentre-se nos pontos fortes, reconheça as fraquezas, agarre as 
oportunidades e proteja-se contra as ameaças” (Suntzu, 500 anos A C., militar 
chinês). 
 
Fraquezas Ameaças Forças Oportunidades 
-São elementos 
que dependem de 
nós, mas não 
funcionam bem ou 
como desejamos. 
-Circunstâncias 
que podem afectar 
negativamente um 
projecto. 
-São fortalezas 
próprias, que 
dependem de nós. 
-Se correm bem, 
facilitam o trabalho.
-São opções, 
portas abertas, que 
podem levar a um 
melhor 
desempenho. 
 
16. Etnografia através de correio electrónico (Marcus e Mascarenhas, 2005). É 
uma forma de fazer etnografia através das novas tecnologias e a obtenção de 
informação por meio do correio electrónico e a comunicação com informantes. 
Podemos denominar a isto ciber-etnografia, etnografia da rede ou etnografia na 
rede. 
 
5.5. A OBSERVAÇÃO ETNOGRÁFICA 
 
“A etnografia é um desconhecimento atento” (Penélope Harvey, Universidade de 
Manchester, 10-09-2008, XI Congresso de Antropologia da FAAEE, Donostia, 
Euskadi). 
 
A observação etnográfica é uma técnica de investigação basilar em antropologia, 
e também é uma atitude de investigação do antropólogo no terreno. Não é 
propriamente uma metodologia qualitativa ou quantitativa, ela pode integrar as 
duas vertentes. O seu princípio teórico-metodológico é o relativismo cultural. 
Através dela conhecemos melhor os humanos para teorizar sobre eles, é algo que 
a antropóloga brasileira Mariza Peirano (2006) denomina de “a teoria vivida”. 
 De acordo com Susan Tax de Freeman (1991), a observação e a 
autoconsciência dos preconceitos do antropólogo são os pontos fortes do trabalho 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 119 
do antropólogo e aquilo que valida o nosso trabalho. A observação, diz-nos Tax de 
Freeman (1991: 130-135), permite compreender uma cultura na intimidade dos 
nativos, convivendo com eles e tendo em conta a condição familiar do 
antropólogo, a sua residência, a idade, o sexo, a personalidade, a sua relação 
com a estrutura da cultura local, a sua biografia e o distanciamento para uma 
análise comparativa. Esta antropóloga (Tax de Freeman, 1991: 130) também 
afirma que a compreensão do antropólogo e a sua observação são sempre 
incompletas, e nenhuma cultura é completamente compreendida, pelo que uns 
antropólogos precisam de outros. 
 
 A observação etnográfica pode ser de dois tipos: não participante ou 
externa e participante ou interna (Roigé i Ventura et al., 1999). Na observação 
externa o observador não faz parte das acções que ocorrem no cenário. Desta 
forma os factos observados são mais fáceis de objectivar, devido à distância 
mantida. A desvantagem é o pouco controlo da informação e as limitações no seu 
acesso. 
 Na observação participante ou interna o observador partilha a vida da 
comunidade, instituição, organização ou grupo humano estudado. Ele participa 
nos seus quotidianos. O antropólogo tem que assumir um papel no terreno e 
apreender as normas, valorizações e percepções dos indivíduos, assim como os 
significados dos comportamentos observados. O risco é inibir os estudados com a 
nossa presença, sobre a qual deverá haver sempre uma reflexão, isto é, como ela 
condiciona a forma de reagir dos estudados. 
Como afirmamos, a observação participante implica participar na vida 
quotidiana do grupo humano a estudar, para compreender as lógicas locais e o 
significado sociocultural das suas práticas. Em antropologia observamos com 
teorias, categorias, ideias e hipóteses sobre o problema estudado. 
 As vantagens desta técnica são a riqueza e profundidade de informação 
sociocultural produzida no seu próprio contexto. A fiabilidade dos dados é 
garantida com uma boa observação, que testará o que as pessoas dizem e 
pensam, ao comparar isto com o que elas fazem. A observação participante 
depende da formação e experiência do investigador, mas também do seu rigor e 
empenho. 
 O antropólogo deve ser aceite para poder interpretar a visão desde dentro 
do grupo, deve também conseguir um trato normal e quotidiano, algo que muitas 
vezes só se consegue com muito tempo, confiança e redes sociais de informantes. 
O antropólogo é catalogado geralmente como um estranho ou intruso (i.e. 
maneiras de vestir diferentes), pelo qual o receio dos locais pode sergrande no 
início. Outras vezes, devido à nossa juventude podemos experimentar 
proteccionismo e paternalismo por parte das pessoas que estudamos. 
Os trabalhos de campo clássicos desenvolvem um tempo de estadia de um 
ano como mínimo (descrição do ciclo anual ritual, vital, agrícola, urbano, etc.). A 
investigação prolongada produz dados mais ricos e fiáveis, mas a antropologia 
aplicada já tem em conta técnicas de “valoração rápida” que inclui menor tempo 
de estadia no terreno. 
 A grande vantagem da observação participante é que cria um texto no seu 
contexto, na sua espontaneidade. Outras vezes a nossa presença corre o risco de 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 120 
vulnerar a espontaneidade, de que digam aquilo que queremos ouvir. A 
observação participante permite não forçar os dados, permite entender melhor a 
cultura através da convivência consciente, facilita portanto o aceso a informação 
restringida. O investigador é o principal instrumento de recolha, ele mira e observa 
com categorias prévias (teorias académicas, conceitos, preconceitos, etc.) mas 
também com imaginação e criatividade. É também um exercício de empatia, de 
pôr-se no lugar do outro para perceber melhor o que se diz (e o que não se diz), o 
que se faz e o que se pensa. 
Nesta linha é preciso chamar o linguista Kenneth Pike (1971), quem 
distinguiu em 1954 entre o ponto de vista “etic”, desde sistema concreto do 
analista ou investigador, do ponto de vista “emic”, desde o sistema do grupo 
estudado. O ponto de vista “emic” é aquele que representa o ponto de vista do 
nativo, representa os pensamentos de um povo nos seus próprios termos e 
conceitos. 
 E se bem não há um único modelo de realizar a observação participante, de 
acordo com Robert Burgess (1997: 21) três são os modelos de observação 
participante: 
 
a) O modelo “tornar-se nativo”, isto é, quando o investigador aprende a 
comportar-se como um “nativo” na situação em estudo. 
b) O modelo “agente oculto”, no qual o investigador tenta assumir um 
comportamento desapercebido e envolve frequentemente uma 
participação dissimulada. 
c) O modelo “advogado”, que é uma situação na qual os investigadores 
intervêm na ajuda e melhora da posição daqueles indivíduos que 
são estudados. 
 
Um problema da observação apresenta-se quando aplicamos esta no nosso 
mesmo meio sociocultural. Neste caso o objectivo será tornar estranho o que nos 
é familiar, assim como quando trabalhamos sobre outra cultura, subcultura ou 
grupo social temos que tornar familiar o estranho. 
 Na actualidade, a antropologia visual permite estudar e reestudar o texto e 
o contexto de estudo, portanto é uma ferramenta fundamental da observação, mas 
também é uma forma de relatar e interpretar o terreno e o problema de 
investigação. 
 
 Outros tipos de observação são os seguintes (Roigé i Ventura et al., 1999): 
 
a) Observação panorâmica (global): Trata de identificar os problemas e 
características da vida de um grupo social. 
b) Observação selectiva (focalizada): Implica delimitar um âmbito específico, 
tendo em vista conhecê-lo com maior profundidade. 
c) Observação transversal: Por exemplo a observação de organizações em 
toda a sua complexidade. 
d) Observação longitudinal: Seguir uma pessoa ou grupo durante um período 
de tempo determinado. 
 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 121 
E se até o momento nos temos referido à observação etnográfica no seu sentido 
mais metodológico resta-nos falar agora dos instrumentos e procedimentos de 
recolha de informações etnográficas fruto da observação participante: 
 
 
O DIÁRIO DE CAMPO (Jociles Rubio e Devillard, 2001) 
 
 Não existe o diário de campo perfeito. 
 É em função do objecto e dos objectivos de estudo que deve fazer-se 
uma valoração apropriada dos registos. 
 Há problemas e entraves comuns a todos os investigadores: 
 
2. Registo superficial e não detalhado: 
-Quando faltam muitas perguntas chave sobre as situações, acções e 
interacções observadas. 
 
-O diário de campo deve responder às perguntas: Quem? Como? Quando? 
Donde? 
-O diário de campo é uma recordação. 
 
3. Carácter interpretativo dos registos 
 Ter consciência ou não do ponto de vista valorativo. 
 Observar → Selecção que deve ser consciente e crítica. 
 Falta de estranhamento face ao observado. 
 Preconceitos + Familiaridade são inevitáveis às vezes. 
 Problema: Não questionamento dos nossos preconceitos e aprioris. 
 Problema: Ter pontos de vista parciais de partes do objecto. 
Exemplo: Tomar como muito importantes a palavra de só uns poucos 
informantes e observar o resto desde o seu ponto de vista. Exemplo: 
Seguir classificações e definições oficiais. 
 Reflexão: Ser conscientes dos pontos de vista do trabalho. 
 Problema: Má definição do objecto de estudo. 
 Problema: Registo de dados sem citar a fonte de informação ou a 
situação de produção dela. Como valorar os dados obtidos? 
 Problema: Utilização de categorias “emic” e “etic”. Especificar se é 
“emic” ou “etic”. Especificar se a diz uma pessoa, todas, um teórico... 
e em que contexto? 
 
4. Destacar os dados verbais (discurso) sobre os dados produto da 
observação (descrição) pode ser um problema. É muito importante a 
observação (o que fazem), tanto como o que dizem ou o que pensam. 
 
5. Condições nas quais se realiza a observação e o diário: 
 Data 
 Tempo de observação 
 Momento do dia 
 Lugar 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 122 
 Tiram-se notas 
 Gravou-se 
 Registo de memória 
 Qual o tempo entre a observação e o registo no diário de campo 
 Factores pessoais do investigador: género, idade, preparação teórica, 
experiência de campo, etc. 
 
 
EXERCÍCIO DE DESCRIÇÃO ETNOGRÁFICA 
1. Observar um fenómeno social concreto com todos os sentidos. 
2. Descrever este por escrito: ordenar o observado (dia, hora, lugar, duração, 
posição do observador, desenhos,...). 
3. Distinguir: 
-Informação da observação. 
-Informação da intuição e da imaginação. 
-Informação a priori. 
-Informação tirada das perguntas aos actores sociais. 
4. Evitar as suposições e objectivar as nossas miradas. 
5. Descrever a acção e o comportamento de todas as pessoas protagonistas, 
o familiar e o estranho, pois podem dar-nos detalhes significativos. 
6. Descrever a posição do observador: interior/exterior. 
7. Precisão na descrição. 
8. Ordenar a descrição, por exemplo cronologicamente. Ter em conta o 
espaço do cenário, os actores, as acções e as regularidades. 
9. Respeito pela intimidade dos descritos (ex.: técnica dos nomes fictícios) e 
pelo bom uso da informação. 
10. Descrever detalhadamente e evitar adjectivos ambíguos e juízos de valor. 
Ex.: velho / homem entre 60 e 70 anos. 
 
 
GUIA PARA A OBSERVAÇÃO ETNOGRÁFICA SISTEMÁTICA 
 Permite estruturar melhor a observação. 
 Define linhas gerais de observação. 
 Ideal para o trabalho em equipa porque permite a comparação. 
 Nemotécnica do que observar. 
 1. O espaço geral: medidas aproximadas, forma, estruturam, distribuição 
geral. 
 2. Os objectos: descrição, localização, uso. 
 3. Os actores: descrição (género, idade, vestiário), localização e movimento 
pelo espaço durante a acção. 
 4. A acção: duração, cronologia, estrutura (fases) da acção, actores que 
participam, acções, objectos manipulados, movimentos no espaço, conversas 
e palavras, interacções em cada fase da acção. 
 
MEMÓRIA FINAL DA OBSERVAÇÃO 
 
1. APRESENTAÇÃO: 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 123 
-Definir o tema estudado. 
-Justificar a escolha e o seu interesse. 
-Delimitar a unidade de observação e justificar a escolha dela. 
-Hipóteses iniciais (se houve). 
 
2. METODOLOGIA: 
-Explicar a metodologia. 
-Explicar as condições de observação, problemas e soluções. 
-Outras técnicas. 
 
3. RESULTADOS: 
-Apresentação geral do fenómeno estudado (espaço, estrutura da acção, tipos 
de actores e comportamentos). 
-Análise einterpretação da realidade apresentada (variáveis, factores, 
símbolos...). 
-Verificação das hipóteses iniciais (se houve). 
 
4. CONCLUSÕES 
5. APÊNDICE: 
-Primeiras observações. 
-Observações sistemáticas. 
-Bibliografia. 
 
 
5.6. A ENTREVISTA ORAL 
 
“… An interview is a behavioral rather than a linguistic even” (Mishler, 1986: 10). 
 
Esta é uma técnica de investigação, é um procedimento operativo para obter uma 
informação através do diálogo intersubjectivo com uma pessoa. Baixo a forma de 
uma conversa informal, orientamos ao nosso entrevistado face aos aspectos a 
conhecer ou deixamos que este se expresse abertamente. Esta técnica deve ser 
complementada por outras como a observação participante e o estudo de 
documentação histórica, pois as pessoas dizem coisas, ocultam dados, pensam e 
também fazem coisas. A entrevista não é um inquérito de perguntas fechadas, 
senão de perguntas abertas, é portanto um diálogo no qual a iniciativa é do 
pesquisador. O mais importante numa situação de entrevista é ganhar-se a 
confiança do nosso interlocutor, para o qual é relevante fazer uma boa 
apresentação do investigador ou investigadora. Durante a mesma devemos 
diminuir a reactividade por causa do método e promover a espontaneidade e 
sinceridade do entrevistado. 
 As entrevistas podem ser directivas, semi-directivas ou abertas (informais), 
em função do tema, do entrevistado e do contexto de situação da entrevista. É 
muito importante diferenciar uma entrevista de um inquérito por questionário. 
Neste último a estruturação e estandardização das respostas são maiores e mais 
fechadas, com o objectivo de cruzar e comparar variáveis. A entrevista 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 124 
antropológica é diferente da jornalística, da clínica e outras, pois os entrevistados 
reagem de forma diferente, os fins são diferentes e os procedimentos também. 
 
Procedimento: 
 
1. Elaboração de um questionário-guia: 
-As perguntas dependerão dos objectivos da entrevista, do nível de informação do 
entrevistado (o que interessa é a sua visão dos fenómenos estudados, não só a 
quantidade de informação), e do grau de conhecimento e confiança gerado entre 
entrevistador e entrevistado. 
-As perguntas não devem condicionar uma resposta a priori predeterminada pelo 
investigador. As perguntas devem ser abertas (não fechadas: sim ou não), 
provocando respostas livres, opiniões, matizados..., claras e não confusas. 
-A arrumação das perguntas seguirá a ordem seguinte: perguntas gerais (idade, 
género, breve história de vida...), até as específicas e especiais. A representação 
gráfica das mesmas será a de um funil. 
-As primeiras perguntas devem interessar-se pela pessoa, mostrando o nosso 
aprecio por ela e o nosso agradecimento pelo seu tempo –estou a pensar em que 
não vamos a pagar essa entrevista-. 
-As perguntas de tom político podem implicar um certo medo ou desconfiança por 
parte do informante. 
-Devemos adaptar a realidade ao questionário e não ao contrário. 
 
2. Marcação da entrevista. 
-Factores do investigador: formação, experiência, personalidade, habilidade, 
motivações, percepções, simpatia, empatia, língua, maneira de vestir... 
-Factores do entrevistado: preconceito face ao investigador, comportamento, 
valores, crenças, informação (quantidade, qualidade), o seu tempo livre... 
-É importante valorar a vida da gente à qual entrevistamos, e mostrar expressões 
de aprecio. 
-O objectivo final é criar um clima de confiança, para isso teremos que explicar os 
motivos da nossa presença e da realização da entrevista. 
-Pode ser bom combinar a entrevista uns dias antes da sua realização, para que a 
memória traga as lembranças ao presente, para que a mente organize melhor a 
informação. Outras vezes é melhor a realização imediata, sempre tentando 
respeitar à pessoa. 
-Em toda apresentação adoptamos um papel: estudante (risco de paternalismo), 
professor, vizinho, amigo, turista,... 
-É interessante apresentar-se através de um conhecido do informante, pois isso 
garante a nossa boa intenção. 
-Garantir o anonimato e a confidencialidade são princípios éticos fundamentais, se 
assim nos é pedido, ou se não somos autorizados a desvelar a identidade do 
entrevistado. 
 
3. Realização da entrevista: 
-Tentar utilizar os mesmo idioma que o entrevistado, ou utilizar intérprete. 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 125 
-Fazer uma boa apresentação do “eu”, dos métodos de trabalho e das intenções 
sobre a utilização da informação. 
-Personalizar as questões (ex.: o que é que você pensa sobre...?) 
-Criar um ambiente descontraído. 
-Respeitar as pautas culturais do outro (ex.: comensalidade como ritual social de 
interacção,...). 
-Colocar as questões em positivo, pois motiva uma resposta mais ampla e 
extensa. 
-Os silêncios também são informação, os esquecimentos e as negativas de 
reposta. Todo tem um sentido e um significado a interpretar. 
-Trabalhar em equipa pode ser positivo. Um homem e uma mulher representam 
um ideal nalguns contextos culturais (equilíbrio entre os géneros). Além disso a 
cumplicidade inter-género e a construção de um espaço de género pode gerar 
maior confiança e sinceridade no discurso do entrevistado. 
-Realizar uma 2ª e uma 3ª entrevista ao mesmo informante, ao longo do tempo, 
permite comprovar a fiabilidade e validação dos seus discursos, mas também 
aprofundar questões que ficaram na superfície. O objectivo fundamental é 
conhecer o ponto de vista do outro, não exibir as nossas opiniões sobre os 
assuntos tratados. 
-A gravação em cassete ou em vídeo da entrevista pode inibir ou não ao 
informante. É um risco a considerar. Também pode acontecer se escrevemos 
anotações entretanto ele fala. Cada pessoa e situação têm a sua especificidade. 
-Tirar notas durante a realização tem a vantagem de poder voltar a elas, de voltar 
a perguntar com maior profundidade. 
-Se a entrevista é gravada, no início da cassete virgem devemos deixar um 
espaço para inserir e registar os dados pessoais do entrevistado e do 
entrevistador, junto com a data e o local da entrevista. 
-Sem esses meios técnicos terá que ser a nossa memória a que grave os 
resultados da entrevista. 
-Evitar manifestar as nossas opiniões pessoais pois pode influenciar o 
entrevistado. 
-Deixar falar à vontade ao entrevistado. 
 
4. Transcrição da entrevista: 
-Se a entrevista é gravada (em áudio ou audiovisualmente), esta exige muito 
tempo e capacidade para escutar. A transcrição de uma entrevista pode ser 
parcial ou total. A ficha da transcrição deve contemplar no início da transcrição as 
seguintes informações: 
 N.º de registo. 
 Dados pessoais do entrevistador (nome, idade, contacto). 
 Dados pessoais do entrevistado ou entrevistados. (nome, idade, género, 
naturalidade, local de residência, estado civil, profissão). 
 Data da entrevista. 
 Local da entrevista. 
 Descrição do local da entrevista. 
 Estrutura temática da conversa 
 Palavras-chave. 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 126 
-A transcrição deve respeitar a língua do informante, os seus dialectalismos... que 
também dão informação cultural. 
-Convêm assinalar os “passos” ou “minutos” que sinala o marca-passos do 
gravador (ex.: cada 20), pois assim podermos voltar a localizar na fita gravada 
qualquer frase, palavra, ou parágrafo. 
-A transcrição literal e total implica uma grande quantidade de informação 
etnográfica que pode ser consultado em um futuro por nos mesmos ou por outras 
pessoas que acedam ao nosso arquivo. A transcrição literal significa anotar as 
risas, os silêncios, as lágrimas, os gestos, dialectalismos, etc. 
-Simbologia: P (pergunta), R (resposta), “....” (transcrição literal), `.... ´ (transcrição 
aproximada) <Manoel: ...........> (intervenção de uma terceira pessoa, silêncios, 
linguagem não verbal). 
-Se a entrevista não for gravada, e só anotada, devemos arrumar o discurso em 
um caderno de campo, no qual anotemos tambémas observações 
complementares do contexto de interacção, que podem ser importantes para 
compreender melhor o sentido do falado. 
 
FICHA DO INFORMANTE E DA ENTREVISTA
ENTREVISTADO 
-Nome completo: 
-Alcunha: 
-Nome da casa: 
-Morada completa: 
 
-Telefone: 
-Data de nascimento: Idade: 
-Profissão: 
-Local de residência: 
-Estado civil: 
-Justificação da escolha do informante: 
 
 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 127 
ENTREVISTA 
-Número de registo: 
-Data da entrevista: 
-Lugar e local da entrevista: 
-Condições da entrevista: 
 
 
-Hora da entrevista: 
-Duração: 
-Tipo de registo ou gravação: 
-Tipo de transcrição: 
-Palavras ou temas chave: 
-Breve resume dos conteúdos: 
 
 
 
 
ENTREVISTADOR 
-Nome: 
-Idade: 
-Contacto: 
 
 
Em síntese, as regras de uma boa entrevista são (Robson, 1993: 232): 
 
a) Ouvir mais do que falar. 
b) Colocar as questões de forma clara e compreensível para o 
entrevistado. 
c) Evitar fazer perguntas que condicionem a resposta do 
entrevistado na direcção desejada pelo entrevistador. 
d) Mostrar o nosso apreço pelo diálogo. 
 
 
5.7. A HISTÓRIA DE VIDA 
A história de vida é uma técnica de investigação das ciências humanas e sociais 
que tem como objectivo conhecer a biografia de uma pessoa ou grupo de pessoas 
(Poirier, Clapier-Valladon e Raybaut, 1995; Vieira, 1999; Lechner, 2009). Através 
dela recriamos uma vida num tom de intimidade e confiança (Measor e Sikes, 
2004). É um tipo de investigação interactiva que costuma exigir de nós 
reciprocidade, isto é, contar-nos também ao entrevistado. Nesta questão o 
investigador deve adoptar um ponto intermédio entre a auto-revelação ou o 
estriptease inicial e a posição neutral de não mostrar opiniões e atitudes pessoais. 
Nela o entrevistador tem-se que tornar de estranho em amigo. No seu 
aspecto mais técnico trata-se de escolher a pessoa, negociar com ela, entrevistar 
a pessoa numa ou em várias sessões, gravando as entrevistas se possível, 
transcrever as entrevistas e organizar a narrativa de vida da pessoa. Finalmente, 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 128 
desde uma perspectiva colaborativa é positivo retornar os relatos aos 
entrevistados para validar o relatado. 
As orientações das histórias de vida podem ser duas (Bertaux, 2005): 
 a) Psicobiográfica: A pessoa conta-se numa trama de acontecimentos 
sociais. O objectivo é estudar a personalidade e papel do indivíduo emergindo no 
social. 
b) Etnobiográfica: Orientada mais para os acontecimentos sociais. É uma 
biografia do colectivo. O narrador é um espelho do seu meio e do seu tempo. 
 
 Os tipos de histórias de vida são os seguintes (Bertaux, 2005; Pujadas, 
1992): 
a) Histórias de vida únicas: Psicobiográficas. 
b) Histórias de vida acumuladas: 
-Cruzadas: Polifonia. Cada pessoa conta a sua vida e a dos restantes biografados 
(ex.: história de família). 
-Paralelas: Várias biografias sobre um mesmo fenómeno ou época. 
 
Um guião tipo utilizado geralmente na confecção de histórias de vida é o seguinte: 
 
 Formulário 1: 
-Nome. 
-Endereço. 
-Data e local de nascimento. 
-Estado civil. 
-Ocupação. 
-Nivel educacional. 
-Número de flhos. 
-Informação sobre migrações. 
 
Formulário 2: 
-Casas de familiares na sua vizinhança? 
-Listagem de todos os seus parentes? 
-Outras pessoas que sejam como se fossem da sua família? 
 
Formulário 3: 
-Pais, filhos, tios, mulher, primos... segundo o Ego. 
-Nome oficial e alcunha, endereço, idade, profissão, nível educacional, história 
residencial, estado civil, filhos, experiência de migração de cada elemento citado. 
-“Os limites da genealogia são os limites do conhecimento que Ego tem do seu 
universo familiar”. 
 
Formulário 4: História de nascimentos 
-Quantas crianças teve? 
-Como se chamam? 
-Quando nasceram? 
-Quem foram os padrinhos? 
 
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 129 
Formuláro 5: Residência e co-residência 
-Locais em que o Ego se lembra de ter vivido. 
-Datas das mudanças. 
-Indivíduos que partilhavam a casa com Ego. 
 
Formulário 6: História migracional 
-Mudanças temporárias ou não de residência. 
-Razões da migração. 
-Destinos. 
 
Formulário 7: Educação 
-Habilidade para ler e escrever. 
-Anos de escolaridade. 
-Razão para o abandono da escola. 
-Valor dado à educação. 
-Formas de escolaridade não obrigatória. 
 
 
Os problemas levantados pela realização de histórias de vida são os seguintes: 
a) Autodescoberta do eu. 
b) Revelação a outros e partilha com eles da sua história e da sua vida. 
c) Forma de aprendizagem social entre gerações. 
d) Produção de conhecimento vivencial, experiencial, subjectiva. 
e) Viabilidade e fiabilidade das informações? Podemos generalizar a partir de 
uma história de vida? 
f) Com que direito nos introduzimos na vida das pessoas? (questão ética). 
Problema de negociação e contrato inicial sobre o uso da história de vida. 
g) Como interpretar e analisar a história de vida e os seus conteúdos? 
h) Quem é o autor? O relator, o investigador, os dois? 
 
5.8. O ANTROPÓLOGO EM CONTEXTOS URBANOS 
A identidade do antropólogo na cidade é diferente que no espaço rural. Na cidade 
a nossa presença pode ser ininteligível, e podemos refugiar-nos no anonimato, 
podemos observar sem explicar quem somos e que fazemos ali. 
 Uma vertente muito importante é o estudo do espaço público. O espaço tem 
umas pautas estabelecidas (ex.: saúdo, tertúlia, casamento, funeral, etc.), nele 
insere-se uma sintaxe pessoal e grupal que temos que descodificar para entender 
a identidade urbana. O objectivo do trabalho de campo é a integração no grupo 
humano estudado, isso significa reduzir o anonimato e criar redes sociais, 
participar em associações, grupos, etc. 
 Parte do nosso trabalho é o controlo da rede, se num primeiro momento as 
nossas interacções seguem um princípio de naturalidade e espontaneidade, as 
carências na nossa rede devem ser preenchidas com o trabalho com informantes 
de diversas zonas, classes sociais e minorias. Portanto a rede tem que ser 
representativa do grupo humano que estamos a estudar. 
 Devemos prestar atenção aos dramas sociais, pois são momentos 
extraordinários para penetrar na opaca vida quotidiana (ex.: festas, cerimónias 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 130 
públicas, religiosas, conferências, exposições, feiras, desportos, greves, 
manifestações, etc.) 
 Também é muito importante o estudo de documentação: os jornais locais 
são “informação quente”, mas também a rádio, a literatura localista (ex.: 
programas de festas), os arquivos municipais (ex.: multas, actas municipais, 
ordens, etc.), os planos gerais de ordenação urbana, documentação estatística, 
histórica, etc. 
 É importante também desenhar os mapas mentais e de uso da cidade, isso 
implica realizar uma etnografia de rua. Alguns dos critérios que podemos utilizar 
para classificar os espaços públicos são: 
-Ver e ser visto. 
-Não ver e ser visto. 
-Ver e que não nos vejam. 
 Para etnografiar cidades o salto importante é o trabalho em equipa, pois 
desta maneira a riqueza de dados permitirá uma visão holística e comparativa. 
 
5.9. A ÉTICA DO TRABALHO DE CAMPO 
Alguns princípios éticos de carácter geral são os seguintes: 
1. Respeito pela não falsificação dos dados observados. 
2. Respeito pelo uso anónimo da informação se assim nos foi pedido pelos 
informantes. 
3. Respeitar a privacidade dos informantes. 
4. Pensar em que informação pode ser publicada e qual não. Trabalhamos com 
pessoas e não com átomos. 
5. Explicar sempre como obtivemos os dados. 
6. Pensar em vários aspectos: patrocínio, investigadores, objecto de investigação, 
cidadãos. Todos eles têm direito de aceso ao conhecimento. 
7. Intervir ou não na ajuda das decisões da comunidade (antropologia aplicada). 
 
(-ASA (ed.)(1987): Ethical Guidelines for Good Practice. London: Association of 
Social Anthropologist of the Commonwealth. )(AAA, ed., s/d.: Code of Ethics of the American Anthropological Association, em 
www.ameranthassn.org/committees/ethics/ethcode.htm) 
 
5.10. A ESCRITA ANTROPOLÓGICA 
Ainda que hoje a antropologia visual tem cada vez maior peso e importância na 
apresentação dos resultados das suas investigações, o antropólogo ainda escreve 
para um leitor sobre as culturas que estuda. 
 Nesta escrita é importante praticar uma “etnografia reflexiva”, que reflicta 
sobre o papel dos informantes chave, dos companheiros ou companheiros do 
antropólogo, das famílias de acolhimento do antropólogo, das amizades no terreno 
e do local de habitação. Esta reflexão permitirá ao leitor compreender melhor a 
produção do texto etnográfico. 
 
Exercício 1: Análise de 3 tipos de escrita antropológica. 
 
Exercício 2: O ofício de antropólogo: crítica da representação antropológica 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 131 
 
Exercício 3: Duas maneiras de fazer antropologia 
 
Exercício 4: Prática de observação participante. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 132 
CRÍTICA DA REPRESENTAÇÃO ANTROPOLÓGICA 
2ª METADE DO SÉCULO XIX 1900-1920 1920-1960 
 Etnografia histórico-documentalista 
(com excepçao de L. H. Morgan, que 
trabalhou algum tempo com os índios 
séneca –iroqueses-). 
 Paradigma evolucionista 
 1899: Viagem antropológica ao Estreito 
de Torres. 
 Franz Boas promove o trabalho de 
campo. 
 São trabalhadores de campo 
provenientes das Ciências Naturais. 
 Paradigmas: evolucionismo, 
difusionismo, particularismo histórico. 
 Malinowski, Radcliffe-Brown, Margaret 
Mead. 
 Trabalho de campo com observação 
participante intensiva (mínimo 1 ano), 
com aprendizagem da língua nativa. 
 Escrita: realismo etnográfico: 
-Presente etnográfico. 
-Representam a realidade tal qual ela é. 
-Monológico (o antropólogo fala pelo nativo). 
-Metonímica. 
-Sincrónica (sem indagação histórica). 
 
ATÉ 1960 CLIFFORD GEERTZ JAMES CLIFFORD DENNIS TEDLOCK PÓS-
POSTMODERNISTAS
 Estudo do “outro”.  Estudo das 
representações do 
“outro”. 
 Estudo das 
interpretações que os 
antropólogos fazem 
dos outros. 
 Antropologia do 
conhecimento 
antropológico. 
-Antropologia dialógica 
-Paradigma conversacional 
-O diálogo como 
representação etnográfica: 
melhor reflexo das relações 
observador-observados; maior 
proximidade da realidade do 
trabalho de campo. 
-O antropólogo fala com os 
nativos. 
-Os nativos falam por si 
próprios (ex.: histórias de vida 
em bruto). 
-Os nativos não confirmam 
estritamente os pontos de 
vista do antropólogo. 
-A observação como escrita. 
-A observação como conversa: 
ouvido, escuta, boca e fala 
face ao olho, observação, mão 
e escrita. 
-Spencer, J., 1989: 
“Anthropology as kind of 
Writing”, em Man, vol. 24. 
 
 A validação da 
etnografia não está 
só nas questões 
literárias e de estilo, 
porém na mesma 
validação do trabalho 
de campo, núcleo da 
autoridade 
antropológica. O 
problema é como 
valida-lo. 
(*)-GEERTZ, C. (1999): “Dos 
visiones de la antropología”, em 
Revista de Occidente n.º 222, pp. 
136-151. 
(*)Manter a tradição de 
investigação, re-elabora-la e 
adoptar um enfoque dialógico, 
multicentrado e pluralista. 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 133 
DUAS MANEIRAS DE FAZER ANTROPOLOGIA 
-GEERTZ, C. (1999): “Dos visiones de la antropología”, em Revista de Occidente n.º 222, pp. 136-151. 
 
PIERRE CLASTRES JAMES CLIFFORD 
 Discípulo de C. Lévi-Strauss. 
 Representa a velha maneira de fazer etnografia. 
 Trabalhou entre os “guayakis” (“aches”, caçadores e recolectores do 
Paraguai), um pequeno grupo de aproximadamente 100 pessoas. 
 Descreve os ciclos vitais da comunidade. 
 Desenha com lápis a vida quotidiana. 
 Realiza as clássicas fotografias de “posse” para a máquina. 
 Estilo literário simples e concreto (o que aconteceu foi isto, e isto...), só 
com uma nota de rodapé, escrito em 1ª pessoa. 
 “Peregrino romântico” que pretende demonstrar “ter estado ali”. 
 Representa o antropólogo como herói, ortodoxo e directo, empirista, 
que realiza um estudo insular local. 
 
 
 
 Discípulo de Clifford Geertz, formado como historiador das ideias em 
Harvard, tem hoje 54 anos, e trabalha na Universidade da Califórnia (Santa 
Cruz). 
 O seu objecto de estudo não é uma comunidade concreta, senão o que 
ele chama “zonas de contacto” (conceito tomado de M.ª L. Pratt). Não é já 
um conjunto de nativos em aldeias, tradições culturais e diferenças, porém 
é já gente que viaja, são os ambientes híbridos e as culturas de viagem. 
 Estilo literário: prosa abstracta e académica, mais 
experimental, com muitas notas de rodapé para “criar 
ambiente”. Faz “collages”, não só ele tira fotografias 
(instantâneas e não de posse), senão que toma 
ilustrações de catálogos e fotografias feitas por outras 
pessoas, para dar pluriperspectivismo. 
 Ao igual que Clastres faz trabalho de campo 
antropológico, mas não parte ao encontro de um “outro” 
distante, senão que esse “outro” aparece nas “zonas de 
contacto”. Os dois estão contra os impérios e o 
neoliberalismo. 
 Relativiza o trabalho de campo tradicional, foge do 
paroquialismo, é pós-colonial. 
 Representa o antropólogo não imersivo, o estudo 
global, a distância e a experimentação, a incertidume e a 
desconstrução das hegemonias ocidentais face aos 
“outros”. 
 
 
 
 
 
 
TEMA	5:	METODOLOGIA	DA	INVESTIGAÇÃO	ANTROPOLÓGICA	
 
 134 
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SÍTIOS EM INTERNET 
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documentos sobre como escrever) 
TEMA	6:	A	LÍNGUA	E	A	COMUNICAÇÃO	
 
 
138 
© APONTAMENTOS DE ANTROPOLOGIA SOCIOCULTURAL 2011-2012 – Prof. Dr. Xerardo 
Pereiro – Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) – antropólogo – Correio 
electrónico: xperez@utad.pt Web: www.utad.pt/~xperez/ 
 
TEMA 6: A LÍNGUA E A COMUNICAÇÃO 
 
Objectivos 
-Introduzir o objecto de estudo da antropologia linguística. 
-Apresentar as teorias básicas. 
-Reflectir sobre a relação entre comunicação e cultura. 
 
Índice 
6.1. Que é a antropologia linguística? 
6.2. Qual é que é a estrutura da linguagem? 
6.3. A gramática de transformação e generativa: Noam Chomsky. 
6.4. Linguagem, pensamento e cultura: Edward Sapir e Benjamin L. Whorf. 
6.5. A teoria do discurso. 
6.6. Etnolinguística e Sociolinguística. 
6.7. Metáfora e metonímia. 
6.8.A Polisemia 
6.9. O Ciberespaço. 
 6.10. A comunicação não verbal. 
6.11. A construção social do idioma. 
6.12. A língua como património cultural. 
Bibliografia 
Sítios em Internet 
 
6.1. QUE É A ANTROPOLOGIA LINGUÍSTICA? 
A antropologia linguística é um ramo da antropologia que estuda a linguagem no 
seu contexto sociocultural. O que faz em concreto é: 
 
 Reconstruir línguas antigas por meio da comparação. 
 Estudar os traços universais da linguagem. 
 Pesquisar na relação entre identidade e língua. 
 Investigar o uso social da fala e a sua ligação com as diferenças sociais. 
 
A linguagem é o maior e mais importante código simbólico humano, que permite a 
abstracção (Burke, 1984) e a comunicação entre os seres humanos. A língua é um 
complexo sistema de regras através do qual os sons apresentam-se associados 
com significados (Saussure, 1991). 
 
 
 → Mensagem → → 
 
 
 
EMISOR 
(SIGNOS) 
CÓDIGO DE 
EMISSÃO 
CÓDIGO 
DE 
DESCODI
FICAÇÃO 
RECEPTOR
TEMA	6:	A	LÍNGUA	E	A	COMUNICAÇÃO	
 
 
139 
A diferença dos animais, que tem códigos de comunicação para entender-se, os 
humanos utiliza símbolos (Burke, 1984) e criamos signos linguísticos arbitrários. 
Essa criação é feita pela mente e representa algo arbitrário em cada língua. Os 
animais só comunicam o presente, o aqui e o agora. Os seres humanos 
comunicam o passado, o presente e o futuro. Os sistemas de comunicação 
animais não conseguem transmitir informação de geração em geração, só 
respondem a estímulos externos (ex.: cacatua). Outra diferença é que os humanos 
transmitimos conhecimentos a longas distâncias espaço-temporais. 
 Sobre este problema diz-nos o antropólogo Gregory Bateson (1972) que os 
animais utilizam sinais e signos, mas os humanos utilizamos símbolos complexos 
e signos arbitrários. 
 
O que dizem os grupos humanos quando lhes tiram uma fotografia 
Espanhóis Alemães Franceses Portugueses Norte-
americanos
“Patata” “Chiiiiis” “Ouistiti” -“Olha o 
passarinho” 
-“Ba-na-na” 
- “Cheese” 
 
Como diferentes humanos dizem: “Eu quero-te”: 
Árabe Chino 
mandarín 
Danês Holandês Inglês 
-Ana behebak 
(para o 
homem) 
-Ana behebik 
(para a mulher) 
-Wo ie ni Jeg elsker dig Ik hou van je I love you 
Francês Alemão Grego Havaiano Irlandês 
-Je t´adore 
-Je t´aime 
-Ich liebe dich -S´ayapo 
(“s´agapo”) 
-Aloha I´a aou 
oe 
-Taim i´ngra 
leat 
Japonês Coreano Filipino 
(tagalo) 
Ruso Sueco 
-Kimi o ai 
shiteru 
-Tangsinul 
sarang ha yo 
-Mahal kita -Ya tyebya 
Iyublyu 
-Jag aelskar 
dig 
 
A antropologia linguística descobre as categorias com as quais diferentes culturas 
classificam a sua experiência: 
 
Português Ibos (Nigéria) 
- braço 
- mão 
- cotovelo 
- aka (para braço, mão e cotovelo) 
 
Norte de Portugal litoral Norte de Portugal interior Beiras portuguesas 
Anho (mais antigo) cordeiro Borrego (mais recente) 
 
TEMA	6:	A	LÍNGUA	E	A	COMUNICAÇÃO	
 
 
140 
 
 
 
Curva: prostituta em idioma russo e em caló. 
“Aquela mulher dá umas curvas” (em português) 
 
Inglês Português Espanhol 
 
Mouse 
 
O rato / A rata 
 
El ratón / la rata 
 
 
 
O interesse da antropologia pela linguística está em que: 
 
a) A língua é uma expressão cultural e um traço identitário. 
b) A língua é um instrumento do trabalho de campo para conhecer ao outro. 
c) A antropologia linguística é uma subdisciplina antropológica. 
 
Uma breve história da linguística seria a seguinte: 
 
Pre- estrutural Desde os gregos ate o s. XIX. Evolucionismo antropológico. 
 Prioridade da escrita (mais precisão) sobre a fala. 
 Crença de que a língua alcança uma máxima perfeição num 
momento histórico concreto (ex.: Cervantes, Homero, etc.). 
 A gramática ensina a falar e a escrever. 
 As categorias de pensamento lógico são as da linguagem 
(Grécia). 
 O método comparativo é essencial, e também as origens da 
linguagem. 
 
Estrutural Inaugurada por Franz Boas nos EUA com os seus estudos sobre 
as línguas ameríndias, e por Ferdinand Saussure na Europa. 
 A palavra falada convertera-se em objecto mais importante de 
estudo. 
 O objecto da linguística será a língua (regras, sistema de 
signos aprendido, código), e não a fala (comportamento social 
e acto concreto de descodificar mensagens). Ex.: No Oxford 
English Dictionary contem-se 650.000 palavras, mas os 
falantes só utilizam normalmente entre 2000 e 4000. 
 Sublinha o presente, face à investigação histórica anterior. 
Pós-estrutural  A língua nos seus usos sociais (fala), como instrumento de 
poder e de agência social. 
 Os usos sociais identitários das línguas, como marcadores 
de diferenciação. 
 
6. 2. QUAL É QUE É A ESTRUTURA DA LINGUAGEM? 
TEMA	6:	A	LÍNGUA	E	A	COMUNICAÇÃO	
 
 
141 
A língua é um sistema de signos integrados por um significante (estudados pela 
fonologia e a morfologia) e um significado (estudados pela semântica). A 
linguagem verbal pode ser descomposta em sons (realização de fonemas na 
pronúncia) denominados fonemas (unidades mínimas da linguagem), estudados 
pela fonética e a fonologia. A fonética é o “solfeo” da língua. As formas de 
combinação dos sons para formar morfemas, palavras e frases... denominam-se 
morfologia. A relação de palavras em frases é denominada sintaxe. A relação de 
palavras e o seu significado é o léxico, compendiado no dicionário. 
 
6. 3. A GRAMÁTICA DE TRANSFORMAÇÃO E GENERATIVA: Noam Chomsky 
(1957). 
 
De acordo com as suas teses: 
 -Todas as línguas partilham um conjunto limitado de princípios de organização. 
 -A linguagem é exclusivamente humana. 
 -O cérebro humano têm um projecto prévio transmitido geneticamente que é 
denominado gramática universal ou plano linguístico para construir a 
linguagem, é por isso que as crianças aprendem a falar aproximadamente à 
mesma idade (5 anos). 
 -Aprender a falar significa dominar uma gramática, um conjunto particular de 
regras, limitado, para organizar a linguagem. 
 -A competência linguística implica um domínio da língua, o que tem que saber 
o falante. 
 
-Como se expressa um pensamento? 
 
ESTRUTURA PROFUNDA (Nível mental) (Formação do pensamento) 
 
 

 
 
ESTRUTURA SUPERFICIAL (Fala real) 
 
 
 
 
FALANTE 
 
 

 
 
OUVINTE (Tradução das frases à sua estrutura profunda) 
 
 
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142 
6. 4. LINGUAGEM, PENSAMENTO E CULTURA: Hipótese Sapir-Whorf 
Edward Sapir e Benjamin Lee Whorf (1971), foram discípulos de Franz Boas. 
Whorf estudou engenharia química e trabalhou no ramo dos seguros. Ele assistiu 
às aulas nocturnas de Sapir desde 1931, discípulo também de Franz Boas. Depois 
de estudar as línguas ameríndias impulsam o estruturalismo na linguística e 
afirmam: 
a) A natureza sociocultural da linguagem. 
b) A função simbólica da linguagem. 
c) A aprendizagem da linguagem como instrumento de socialização. 
d) A linguagem não só reflicte a realidade como também a conforma. 
e) O contributo da linguagem para a acção. 
f) A linguagem informa sobre a experiência humana. 
g) Diferentes línguas produzem diferentes formas de pensar. 
h) Dentro de cada língua os falantes pensam de maneira diferente. 
i) Cada língua é um universo único que deve ser estudado nos próprios termos 
(Princípio do relativismo linguístico estremo). 
j) As línguas são percepções diferentes do tempo e a realidade. As línguas 
determinam a forma como os seus falantes percebem o mundo. 
 
Exemplos: 
 
Exemplo 1: Os termos das cores que utilizam hoje as mulheres são diferentes dos 
que utilizam os homens, e também são diferentes aos utilizados por elas próprias 
há 50 anos; logo a indústria da cosmética, da perfumaria e da moda impulsaram 
muito a mudança. 
 
Exemplo 2: “Pão e circo”, era o ditado na Roma de Juvenal, “Pão e touros” no 
Madrid de Jovellanos, e “Pão, televisão e futebol”no dia de hoje. 
 
Exemplo 3: 
-Português: ele/ela; seu/sua (distinção de género na 3ª pessoa de singular) 
-Palaung (Birmânia): Não há distinção de género na 3ª pessoa de singular 
 
Exemplo 4: 
Espanhol Galego 
“Estar mal de la azotea” “Andar mau do telhado” 
 
Exemplo 5: 
Português: divide-se o tempo verbal em passado, presente e futuro. 
Hopi (Índios “pueblo” do Sudoeste dos EUA): não, só há diferentes factos. 
Japonês: Os tempos verbais –passado, presente e futuro- são idênticos no seu 
idioma. 
 
Exemplo 6: 
Esquimós: tem várias palavras para os diferentes tipos de neve. 
Português: só “neve”. 
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143 
 
Portanto, a linguagem está interligada com o pensamento e a cultura. As 
mudanças na cultura motivam mudanças na linguagem e no pensamento, mas 
também ao contrário. A mudança cultural pode ser estudada através das 
mudanças na linguagem. A semântica estuda o sistema de significados de uma 
língua, mas para a antropologia a semântica é um instrumento de análise dos 
significados da língua em acção, isto é dos significados sociais da língua 
convertida em fala. A etnociência e a etnosemântica estudam os sistemas de 
classificação em diversas línguas, do parentesco, das cores, etc. Um trabalho no 
muito importante no campo da etnosemântica é o de Berlin e Kay (1969/1992), 
quem estabeleceu as seguintes diferenças culturais no campo das cores: 
 
Europa e Ásia 
(em relação 
com a história 
dos tintes) 
10 Termos básicos para as cores: branco, preto, vermelho, 
amarelo, azul, verde, laranja, rosada, púrpura, madeira. 
- Primários: vermelho, amarelo e azul. 
- Secundários: violeta, laranja e verde. 
- Ternários: madeira, gris, negro, 
- Branco. 
Caçadores e 
recolectores 
australianos, e 
também 
cultivadores de 
Papua Nova 
Guiné 
2 Termos básicos: branco e preto 
 
Berlin e Kay limitarão o relativismo estremo de Sapir e Whorf, afirmando que há 
certas cores que tendem a ser universais semânticos nos seus termos (11 em 
muitas culturas), apesar de que as cores são potencialmente infinitos, as 
categorias culturais de cores são finitas. Ao mesmo tempo acontece que os sons 
são infinitos, mas os fonemas são finitos. 
 A etnosemântica pode ser aplicada a outros campos como os do sabor ou 
gosto alimentar. As categorias do sabor (ex.: salgado, insípido; acedo, suave; 
doce, …) não são puramente pessoais, arrumadas só por preferências individuais, 
porém foram construídas em contextos específicos definidos culturalmente. Um 
exemplo: 
 
A VIAGEM DO PEIXE 
Galiza Salamanca Madrid 
“Castanheta” (Peixe) “Palometa” “Japuta” (“gildas” nos 
Anos 1950, entre as 
peixeiras, quando Rita 
Hayworth era um mito 
erótico) 
 
6. 5. A TEORIA DO DISCURSO 
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144 
A teoria do discurso (Bardin, 1986) entende a comunicação como um processo, 
não como um dado, e nesse processo é essencial o discurso, que é uma 
comunicação com elementos constituintes (palavra, frase, enunciado, etc.) que 
implicam um acto, melhor dizer que são um acto. O discurso não é transpor 
transparentemente opiniões, atitudes ou representações de forma acabada, porém 
é um produto não acabado, um processo de elaboração, o que implica 
contradições, incoerências e in-conclusões. Isto é particularmente evidente nas 
conversas espontâneas de situação. O discurso está condicionado pelas 
condições de produção e por um sistema linguístico, pela semântica e sintáctica, 
mas também pela inserção num espaço social de emissor e receptor. Isto é, a 
eficácia social e simbólica de um discurso depende das condições sociais de 
produção do discurso. Um exemplo disto é o papel de Goebbels, que foi ministro 
de informação e propaganda de Hitler, e que chegou a afirmar que uma mentira 
contada 100 vezes passa a parecer verdade. 
De acordo com Van Dijk (2000: 22-23) o discurso contempla três elementos 
fundamentais: 
 
FORMA -Utilização da linguagem -Estrutura do texto e da 
conversa 
SENTIDO -Comunicação de crenças -Cognição 
ACÇÃO -Interacção em situações 
sociais 
-Estrutura social 
-Cultura 
 
6. 6. ETNOLINGUÍSTICA E SOCIOLINGUÍSTICA 
A língua é um dos traços identitários dos grupos humanos, não é apenas um 
veículo de comunicação. Géneros, classe, etnia, idade, profissão, etc. podem ser 
estudados a partir dos usos linguísticos dos falantes. A língua não é um sistema 
homogéneo no qual todos falam igual. É por isso que a socio-linguística estuda o 
que a gente fala e como fala. As variações linguísticas estão em relação com as 
diversidades sociais identitárias (classe, etnia, idade, género,...). A linguagem está 
interligada com o contexto social. 
Uma pergunta importante é: Como utilizam a mesma língua diferentes 
falantes? Esto significa que o facto linguístico não é produzido no vazio, porem na 
sociedade, cultura ou subcultura na qual se insere. Assim por exemplo um homem 
não fala igual que uma mulher, isto é, existe uma ideologia cultural que define a 
fala ideal do homem e da mulher: o femininolecto e o masculinolecto (Buxó, 1988). 
A sociolinguística estuda fenómenos como o bilinguismo e a diglósia, mas 
também a fala dos grupos de diferente estatuto. A diglósia é uma relação 
assimétrica entre duas línguas em contacto, que implica maior estatuto 
sociolinguístico para uma do que para outra (Ferguson, 1959). Um exemplo de 
diglósia é o das categorias pejorativas dadas antigamente ao mirandês (segunda 
língua oficial de Portugal desde o 29-1-1999 – Lei n.º 7/99): 
 
a) “fala charra” e “fala caçurra” (Vasconcelos, 1992: 5). 
b) “fala atravessada” e “fala espanholada” (Martins, 1997). 
 
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145 
O uso de uma língua está intimamente ligado com as posições sociais de uma 
escala de estratificação social. Assim por exemplo, William Labov (1972) concluiu 
logo de uma pesquisa que as classes sociais dos empregados de três grandes 
armazéns tendiam a reflectir a dos seus clientes. 
Outra variável social, a profissão, é um elemento fundamental para 
entender as falas. Existem conjuntos de palavras especializadas muito 
importantes para certos grupos com experiência ou actividade particular (gíria, 
calão), denominados vocabulário focal. Estes vocabulários focais definem limites 
para quem está por dentro e está por fora de um grupo profissional. 
Pierre Bourdieu (1985) afirma como a linguagem apropriada é uma 
estratégia de ascensão social. Falar correctamente é um recurso estratégico e um 
caminho para atingir a riqueza, o prestígio e o poder. A importância da habilidade 
verbal e da oratória são muito importantes na política, mas também na intervenção 
colectiva. As práticas linguísticas são um capital simbólico que as pessoas podem 
converte em capital sócio - económico. O bom uso ou a expressão correcta 
tendem a ser institucionalizadas por meio de um trabalho pedagógico. O mercado 
escolar está dominado por produtos linguísticos da classe dominante e tende a 
sancionar as diferenças de capital preexistentes. A hiper-correcção pequeno 
burguesa procura modelos e instrumentos consagrados pelos académicos, 
professores, gramáticos, etc. que “distinguem” as pessoas e o que falam do 
“vulgar” e o “grosseiro”. 
Outro fenómeno linguístico e social analisado por Bourdieu (1985) é a 
economia dos intercâmbios linguísticos. Isto é, os nomes das coisas tendem a 
simplificar-se quando são muito comuns no seu uso. Exemplos: telemóvel (telelé), 
televisão (t.v.), etc. Neste sentido Pierre Bourdieu (1985) fala da economia dos 
intercâmbios linguísticos, e de que a língua perdura no tempo e espaço porque se 
protege fronte à uma tendência para uma economia de esforço e rigor que induz 
às pessoas à simplificação analógica. 
 
6.7. METÁFORA E METONÍMIA 
A linguagem está cheia de metáforas e metonímias por meio das quais 
manipulamos a vida social e compreendemos a experiência em termos de outra. 
Longe de ser um simples adorno da linguagem, é uma questão de significado e 
pensamento. 
A metáfora é uma expressãolinguística por meio da qual substituímos um 
significante por outro com o qual existe uma relação de semelhança. É uma figura 
da fala que consiste em aplicar o nome de um objecto ou coisa a outro por meio 
de uma associação de ideias ou um processo de similaridade. A metáfora cria 
novos significados através da intersecção de dois campos semânticos. Assim, 
pode ser considerada como um procedimento que permite compreender e 
experimentar uma realidade em termos de outra (Frigolé, 1987; Lakoff e Johnson, 
1998). Por exemplo as metáforas animais típicas de muitas culturas: 
 
 “Burra velha não aprende língua”. 
 “A Galharda” (vaca). Típico das Astúrias, a Galiza e Portugal. 
 “Vocês são uns burros” / “E tu uma víbora” / ... 
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146 
 A figura do leão como metáfora da nobreza. 
 
Outro exemplo é o das acções rituais e as performances: 
 Comungar na missa católica (comemos metaforicamente a Deus). 
 
Muitos outros exemplos encontram-se nos ditados: 
 
-“Areia de mais para a minha cabeça”. 
-“Quem está de fora não racha lenha”. 
-“Roma não paga a traidores”. 
-“Desde que a minha filha é casada não lhe faltam pretendentes”. 
-“Não sair da cepa torta” (estudar e trabalhar mas nada consegue). 
-“Ainda dizem que as flores não andam” (galanteio dito a uma mulher). 
-“Quem não tem dinheiro fai do cú um candieiro” 
-“Ainda dizem que as flores não andam”. 
-“Puxar a febra à minha brasa”. 
-“Puxar a brasa à minha sardinha”. 
 
A metáfora não se pode entender ao pé da letra e promove um movimento de 
emoção, qualitativo, predica estrategicamente sobre um sujeito. Podemos afirmar 
que “dizer é um fazer”. Por exemplo, nos provérbios populares do Nordeste 
transmontano associados aos meses do ano temos muitas metáforas: 
 
-Janeiro, geadeiro. 
-Fevereiro molhado, enche o celeiro e farta o gado. 
-Março marçagão, manha de inverno, tarde de verão. 
-Abril, águas mil, peneiradas por um mandil. 
-No Maio, queima a velha o talho. 
-Junho secaio. 
-Julho foice no punho. 
-Agosto enceleirar. 
-Setembro vindima. 
-Outubro seca tudo. 
-Dos Santos ao Natal inverno natural. 
 
Segundo Lakoff e Johnson (1998) podemos diferenciar entre três tipos de 
metáforas: 
 
a) De orientação: acima, embaixo; diante, atrás; centro, periferia; perto, longe. 
Sem elas não poderíamos deslocar-nos pelo mundo. 
b) Ontológicas (ver e referenciar a experiência humana como uma entidade, 
substância ou objecto): 
-“A inflação fai-se notar nas bombas de gasolina” 
-“A honra do nosso país está em jogo” 
-“É preciso muita paciéncia para ler este livro” 
-“O ritmo da vida moderna é muito intenso” 
-“A pressão das responsabilidades foi a causa da sua crise” 
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147 
-“Veio a Miranda do Douro na procura de fama e dinheiro” 
c) Metáforas estruturais: Utilizam conceitos estruturados com relação a outros. 
-“O argumento racional é uma guerra” 
-“Eu sou mais forte do que tu” 
-“Eu sou o que manda” 
 
A metonímia expressa uma relação de contiguidade em virtude da qual se define a 
parte por outra parte. Ex: “os pratos da cozinha portuguesa” -continente pelo 
conteúdo-. Também se pode definir a parte pelo tudo. Ex: “um corneta” – soldado 
que toca a corneta- ou o todo pela parte, por exemplo: “um porto” -vinho do Porto-
; “os mortais” – as pessoas e não as plantas. 
A metonímia é um sinécdoque que consiste em aplicar o nome de uma coisa a 
outra que está perto ou com a qual guarda uma relação de contacto. É um 
sinécdoque, por exemplo: “Tonto dos narizes!”. 
 
6. 8. A POLISEMIA 
É um fenómeno cultural e linguístico que consiste em que o mesmo referente 
tenha diferentes significados para os falantes de diferentes grupos. Ex.: 
 
Caló (cigano) Castelhano Italiano Português Sueco 
Camello Camello Camello Camelho Camello 
Vigarista Vendedor de 
droga 
Pessoa feia Um homem 
dominado pela 
sua mulher 
Camareiro 
 
Também pode acontecer que o mesmo referente tenha diferentes significados 
para os falantes do mesmo grupo humano, por exemplo a palavra “tradutor”. 
 
6. 9. O CIBERESPAÇO 
A Internet e outras tecnologias da informação têm possibilitado novas formas de 
comunicação entre os humanos, permitindo criar um espaço mundial de 
informação simultânea. Neste campo geraram-se novos códigos simbólicos de 
comunicação. 
Este é um mundo navegável, internacional, fruto da revolução da 
informação (Castells: 1996 /2001). Por meio desse mundo há uma criação de 
cultura e de sociabilidade que se expressa em redes e contactos entre pessoas. É 
todo um mundo a explorar e investigar. 
Segundo o antropólogo Néstor García Canclini (2005) os seres humanos 
definem-se não apenas por contruir a diferença, porém também pela desigualdade 
e pelo grau de conexão – desconexão face ao sistema. Assim o acesso aos média 
e aos sistemas de novas tecnologias da informação está a condicionar a 
identidades dos seres humanos de forma capital. 
 
6. 10. A COMUNICAÇÃO NÃO VERBAL 
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148 
A cultura não poderia existir sem a linguagem (verbal e não verbal). O estudo da 
comunicação não verbal foi abordado por Edward T. Hall, Ray Birdwhistell, Del 
Hymes, Flora Davis, etc. 
A linguagem expressa mensagens, mas também valores. E a vida seria 
mecânica e muito conflituosa se não houvesse comunicação não verbal, sem ela 
seria muito fácil mentir e enganar. Estudar comunicação implica não só estudar 
palavras, senão também o tom de voz, os gestos, o espaço e o tempo. A 
linguagem corporal tem uma linguagem própria que devemos descodificar: 
- Proxêmica: Como os humanos estruturamos o microespaço para comunicar 
com outros. Temos portanto um certo sentido da territorialidade, uma definição 
e defessa do nosso espaço pessoal, só transgredido com regras como o 
desporto ou o sexo, ou permitido em casos como a viagem de autocarro ou de 
metro. A proxêmica define culturalmente a distância apropriada numa 
conversa, a posição relativa na mesa e noutros contextos de comunicação. 
- Quinêsia: Significados dos movimentos do corpo. 
 
Exemplos: 
1. “Os xaponeses dedican moito tempo á cortesía porque é un xeito de 
introducción social. Chegan a extremos como que o grao de inclinación da cabeza 
no saúdo indica o grao de respecto que un queira mostrar á outra persoa”. 
(Miguel Anxo Murado, en El Progreso, 9-6-2001, p. 75) 
2. Na Índia abanar a cabeça significa “sim”, o que em Ocidente significaria não. 
3. Nos países musulmanos a mão esquerda é considera impura porque é utilizada 
para limpar-se e asear-se na casa de banho. 
4. Nos países islámicos e no Japão não se deve apontar a alguém com o piso do 
sapato, pois é a parte mais baixa e mais suja. 
5. Na Ásia, para sinalar algo, utilizam toda a mão, faze-lo com o dedo é 
considerado groseiro. 
6. Ao entrar num local sagrado musulmano, hindú ou budista pensa-se como sinal 
de respeito tirar os sapatos e o chapeu. As mulheres devem levar a cabeça 
tapada. 
7. No templo de Chiang Mai (Norte de Tailándia) há galinhas à entrada que 
picoteam os pés a quem não atire os sapatos para entrar no templo. 
8. Nos templos budistas o normal é dar uma volta à estátua de Buda no sentido 
das agulhas do relógio. 
1. Os homens musulmanos costumam achegar-se os uns aos outros e é normal 
que se colham das mãos. Os norte-americanos devem manter-se na “confort 
zone”, aproximadamente um braço de distância. 
2. A forma normal de cumprimentar-se no Japão é a de inclinar-se um bocadinho. 
3. Um turista pergunta a um artesão navajo: 
-Tem você um anel grande? 
.- Para quê dedo? 
-Para este! (Indicando o dedo coração da mão direita e encolhendo os outros, 
realizando assim o gesto de “the fuck sign”). 
.-Sim tenho. 
Os turistas não se apercebem do assunto e o artesão vende o anel sem se 
ofender (Evans-Pritchard, 1989: 101). 
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149 
 
4. Um sorriso no Afeganistão significa irritação. 
5. Na Tailândia não se deve bater no topo da cabeça de alguém, pois acreditamque ali residem os espíritos. 
6. Na Rúsia, quando entra num teatro ou auditório e anda pelas filas à procura de 
um lugar, faça-o de frente para as pessoas já sentadas. Se estiver de frente 
para o palco, estará a ser pouco educado, ao passar com o seu traseiro pelos 
corpos e rostos dos outros. 
 
Anexo: Guia de observação de comunicação não verbal 
 
1. Indicadores de sexo-género: espaço público/espaço privado; direita / 
esquerda; acima / abaixo. 
2. Gestos e movimentos corporais ↔ Idioma 
3. O corpo como mensagem (i.e.: posturas, traços do rosto, forma,...) 
4. Saúdo: ver-se, reconhecer-se, usar a mão, achegar-se, proximidade e 
distância, separação, despedida. 
5. A face humana e o uso da sorrisa: expresão de sentimentos e emoções 
(alegria, surpressa, temor, raiva, tristeza, desprezo, nojo,...) 
6. Os olhos (i.e.: tabú de fixar a mirada numa pessoa). Para onde olhamos? 
Como olhamos? 
7. As mãos. 
8. Proxémica (posição apropriada numa conversa, contactos, posições 
relativas na mesma). 
9. O olfacto. 
10. Comportamento não verbal em geral: dominante, neutro, submisso. 
11. Mensagens em geral: de autoridade, exculpatórios, neutros,... 
 
6. 11. A CONSTRUÇÃO SOCIAL DO IDIOMA 
O nascimento dos estados-nação no século XIX gerou um processo de unidade 
territorial e de homogeneidade linguística, o que consolidou línguas nacionais e 
marginalizou outras. Este processo foi desenvolvido através da educação, os 
média e a administração, procurando eliminar as línguas minoritárias. Este 
processo tomou mais força com a industrialização e o progresso científico. O 
monolinguismo passou a ser um ideal (Bjeljac-Babic, 2000) e a fins do século XIX 
pensou-se numa língua universal, pensou-se em regrassar ao latim. Na 
actualidade o plurilinguismo é considerado uma riqueza cultural, preservar uma 
língua implica preservar uma forma de humanidade. 
Uma questão importante é como se chega a conformar uma língua, isto 
acontece por causa de considerar a diferença entre língua e dialecto, que é uma 
construção social com afirmação política. A língua para ser língua tem que 
preencher alguns critérios estritamente filológicos, mas também é uma invenção 
social e política. 
 
Exemplo (Gonçalves, 2002): 
Em 1882 José Leite de Vasconcelos descobriu o mirandês no Porto, quando 
estudava medicina. Dois colegas dele, Afonso Cordeiro e José Joaquim, 
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150 
informaram-lhe de que no Politécnico havia um rapaz de Duas Igrejas (Miranda do 
Douro) que falava português de maneira difrente. Foi assim como Leite de 
Vasconcelos contactou com o mirandês, sobre o qual chegou a fazer uma tese de 
doutoramento. Na actualidade os mirandeses lutaram por reconhecer e oficializar 
o mirandês como segunda língua oficial de Portugal, algo que se conseguiu no 
ano 1998 (aprovado pelo parlamento português em 17 de Setembro; publicado no 
Diário da República, 29-1-1999). De ter nomes pejorativos como “fala charra” ou 
“fala caçurra” (Leite de Vasconcelos, 1992: 5), “fala atravessada” ou “fala 
espanholada” (Martins, 1997), passou hoje a ter consideração e estima por parte 
da população mirandesa. 
 
A formação de palavras quotidianas também obedece a empréstimos e invenções 
sociais: 
 
Exemplo 1: 
Nos tempos da Segunda República espanhola o contrabando começou a receber 
um novo nome, o de “estraperlo”. A origem do nome coloca-se no escándalo de 
corrupção de “Strauss-Perle”, no qual estava implicado o político republicano 
Alejandro Lerroux. 
 
Exemplo 2: 
Em português, para definir a acção de carregar no teclado do computador 
utilizamos a palavra “clicar”, que procede do inglês “to click”. No terreno das novas 
tecnologias também se utilizam palavras estrangeiras, por exemplo “hardware” em 
vez de “ardido” (galego-português). Outras vezes essas palavras estrangeiras, 
como no primeiro caso, apropriam-se e aportuguesam-se, por exemplo a palavra 
“sandes” (do inglês “sandwich”) ou “pequenique” (do inglês pic-nic) em vez do 
galego-português “merenda”. 
 
Exemplo 3: 
 “SOS” vêm do inglês “save your souls”. 
 “YUPI!” vêm do inglês “UP”, fonéticamente iu, pi. 
 
Exemplo 4: 
A palavra “coco” (fruto do cocoteiro) teve origem nos navegantes portugueses que 
classificaram este fruto pelo seu aspecto de cabeça com cabelos (Harguindey, 
2004). 
 
 
6. 12. A LÍNGUA COMO PATRIMÓNIO CULTURAL 
 
“A língua é um monumento feito de palavras” (Manuela Barros, professora da 
Universidade de Coimbra). 
 
Hoje a língua é cada vez mais considerada como um património cultural colectivo, 
de ai que a Unesco tenha aberto em 2000 a “Listagem de Património Mundial Oral 
da Humanidade”. Das perto de 6000 línguas que existem hoje no mundo, quase a 
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151 
metade são faladas por menos de 10.000 habitantes e um 25% por menos de 
1000 pessoas (Bjeljac-Babic, 2000). Muitas destas línguas desapareceram, assim 
por exemplo, das 250 línguas que se falavam na Austrália nos finais do sec. XVIII, 
hoje só ficaram 20; no Brasil perderam-se 540 desde o início da colonização 
portuguesa em 1530. 
 Na actualidade as 96% das línguas são faladas pelo 4% da população 
mundial. As oito línguas de maior difusão mundial são: 
 
 
Chinês 1200 Milhões 
Inglês 478 m 
Hindi 437 m 
Espanhol 392 m 
Ruso 284 m 
Árabe 225 m 
Português 184 m 
Francês 125 m 
Fonte: Encyclopédie Millenium (1998). Dados sobre os falantes de línguas 
maternas. 
 
Toda língua encerra uma forma de ver o mundo e um conjunto de conhecimentos 
imprescindíveis para sobreviver dentro do seu mundo cultural. A conservação de 
um idioma significa muitas vezes a própria sobrevivência física do grupo humano 
em questão. 
 
BIBLIOGRAFIA 
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TEMA	6:	A	LÍNGUA	E	A	COMUNICAÇÃO	
 
 
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http://www.linguistic-declaration.org (Declaração universal dos direitos 
linguísticos) 
http://webworld.unesco.org/imld (Web da UNESCO de promoção da diversidade 
linguística) 
 
TEMA	7:	A	PRODUÇÃO	ECONÓMICA	
 
 
154 
© APONTAMENTOS DE ANTROPOLOGIA SOCIOCULTURAL 2011-2012 – Prof. Dr. Xerardo 
Pereiro – Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) – antropólogo – Correio 
electrónico: xperez@utad.pt Web: www.utad.pt/~xperez/ 
 
TEMA 7: A PRODUÇÃO ECONÓMICA 
 
Objectivos 
-Apresentar a relação entre a antropologia e a economia como objecto de 
estudo. 
-Conhecer diferentes tipos de economia, entendidos como formas de cultura. 
 
Índice 
7.1. Antropologia económica 
7.2. A reciprocidade 
7.3. A redistribuição 
7.4. O intercâmbio de mercado 
7.5. Modos de produção 
7.6. Caça, pesca e recolecção 
7.7. Pastorícia 
7.8. Cultivos agrícolas: horticultura e agricultura 
7.9. A sociedade industrial 
7.10. A sociedade pós-industrial 
Bibliografia 
Anexo I: Alguns modos de produção 
Anexo II: Das sociedades pré-industriais às sociedades pós-industriais 
 
7.1. ANTROPOLOGIA ECONÓMICA 
 
“Os economistas sabem o preço de todo e o valor de nada” (Oscar Wilde) 
 
A antropologia económica é uma subdisciplina da antropologia sociocultural 
que estuda os sistemas de produção, distribuição e consumo dos diferentes 
grupos humanos. A economia faz parte da cultura no sentido em que o fim da 
cultura é a sobrevivência, a reprodução e a continuidade dos grupos humanos. 
 A economia pode entender-se integrada em processos socioculturais, 
pois a produção realiza-se em famílias, comunidades e sociedades. As 
relações sociais funcionam como relações económicas e laborais (Godelier, 
1974). Além mais, a distribuição, o intercâmbio e o consumo têm funções e 
sentidos sociais e políticos. 
 
“Economy is a set of institutionalized activities which combine natural resources, 
humam labor, and technology to acquire, produce, and distribute material goods and 
specialist services in a structured, repetitive fashion.” 
(Dalton, 1969: 97) 
 
Diferentes culturas valorizam diferentes bens e serviços, algumas salientam a 
cooperação económica e outras a concorrência. Umas culturas sublinham o 
consumo como meio de aumentar o estatuto social, outras a generosidade e a 
doação de bens como meio para adquirir prestígio. 
TEMA	7:	A	PRODUÇÃO	ECONÓMICA	
 
 
155 
De acordo com Karl Polanyi (1994), o intercâmbio é fundamental em 
economia. O intercâmbio é a prática de dar e receber objectos e serviços com 
algum valor. Os modelos de intercâmbio variam de cultura para cultura, e 
podem ser de vários tipos: reciprocidade, redistribuição e mercado. As culturas 
humanas valorizam mais um tipo de intercâmbio do que outro, ou na mesma 
cultura podem coexistir vários tipos de forma articulada. Segundo Polanyi 
(1994) estes tipos de intercâmbio devem ser pensados como actos sociais 
pautados culturalmente. São estes três tipos de intercâmbio, modelos e não 
tipos de economia, pois em cada economia concreta pode haver elementos dos 
três. A diferença do que afirmava Adam Smith na sua obra “A riqueza das 
nações”, de que a troca tem a sua origem na tendência psicológica e psíquica 
inata para intercambiar, Karl Polanyi (1994) afirma que a troca nasce das 
instituições sociais. 
 
7.2. A RECIPROCIDADE 
 
“Com regalos se hacen esclavos, del mismo modo que com látigos se hacen 
perros” (Service, 1973: 26). 
 
As formas de intercâmbio recíproco acontecem em todas as culturas. Por 
exemplo, as esposas não são pagas pelos seus esposos por estas lhes 
preparar o jantar. Outro exemplo é o das “prendas” que damos a alguém. A 
expectativa neste tipo de intercâmbio é o da correspondência e o retorno. Não 
é bem uma relação de altruísmo puro. Sim que é uma relação semelhante às 
obrigações de parentesco e tem intensos significados sentimentais, pessoais, 
mas também modelados pela cultura. 
 Este é só um tipo de intercâmbio, e pode haver outros tipos de 
intercâmbio dentro da mesma cultura e protagonizado pelas mesmas pessoas. 
A reciprocidade é uma maneira de controlar a sobre–exploração da natureza, e 
também a desigualdade socio-económica. 
 
-O princípio de reciprocidade é: Trocar entre pessoas socialmente iguais, 
com vínculos entre si, em sociedades ou grupos igualitários. A simetria social é 
muito importante neste tipo de intercâmbio, mas também saber dar, receber e 
retribuir. Num sentido levi-estrusiano a reciprocidade pode ser de dois tipos: 
restrita e generalizada. A primeira reduz o leque de trocadores e a segunda é 
uma reciprocidade geral praticada com um leque de actores sociais mais 
alargado. Vejamos alguns exemplos etnográficos: 
 
1. O “comércio silencioso”: 
Este era um tipo de comércio praticado nalgumas zonas de África e de Ásia, e 
que facilitava o intercâmbio recíproco. Os objectos para serem intercambiados 
eram situados em um claro. O outro grupo, logo de esconder-se o primeiro, 
inspecciona os objectos, apanha estes e deixa os seus. O primeiro grupo 
regressa ao lugar se ficou satisfeito. Ex.: Os pigmeus mbuti trocam carne por 
bananas com os bantos africanos: 
 
 
 
 
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