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2019
6ª
edição
revista
ampliada
atualizada
1
POR QUE MARIA DA PENHA?
Muitos questionam o motivo de a lei de combate à violência do-
méstica e familiar contra a mulher ser chamada de Lei Maria da Penha.
Há quem não saiba, mas trata-se de lei de iniciativa do Poder Exe-
cutivo. Foi elaborada por um consórcio de entidades feministas e enca-
minhada ao Congresso Nacional pelo Presidente da República. Quando 
de sua sanção chamou-a de Lei Maria da Penha e afirmou: Esta mulher 
renasceu das cinzas para se transformar em um símbolo da luta contra a 
violência doméstica no nosso país.
Mas não foi somente a referência presidencial que justifica ser ela 
assim chamada. A menção tem origem na dolorosa história de Maria 
da Penha Maia Fernandes, uma farmacêutica casada com um professor 
universitário e economista. Eles viviam em Fortaleza (CE), e tiveram três 
filhas. Além das inúmeras agressões de que foi vítima, em duas oportuni-
dades o marido tentou matá-la. Na primeira vez, em 29 de maio de 1983, 
simulou um assalto, fazendo uso de uma espingarda. Como resultado, 
ela ficou paraplégica. Poucos dias depois de ter retornado do hospital, na 
nova tentativa, buscou eletrocutá-la por meio de uma descarga elétrica 
enquanto ela tomava banho. 
As investigações começaram em junho de 1983 e a denúncia foi ofe-
recida pelo Ministério Público somente em setembro de 1984. Em 1991, 
o réu foi condenado pelo tribunal do júri a oito anos de prisão. Recorreu 
em liberdade e, um ano depois, o julgamento foi anulado. Levado a novo 
júri, em 1996, foi-lhe imposta a pena de dez anos e seis meses de prisão. 
Mais uma vez recorreu em liberdade e somente 19 anos e seis meses após 
os fatos é que foi preso, em 2002, e posto em liberdade em 2004, depois 
de cumprir apenas dois anos de prisão.
A LEI MARIA DA PENHA NA JUSTIÇA • Maria Berenice Dias16
Mas as agressões não aconteceram de repente. Durante o casamento, 
Maria da Penha sofreu repetidas agressões e intimidações. Nunca reagiu 
por temer represália ainda maior contra ela e as filhas. Neste período, como 
muitas outras mulheres, reiteradamente, Maria da Penha denunciou as 
agressões que sofreu. Como nenhuma providência foi tomada, chegou a 
ficar com vergonha e a pensar: se não aconteceu nada até agora, é porque 
ele, o agressor, tinha razão de ter feito aquilo.1 Ainda assim, não se calou. 
Depois de ter sido quase assassinada, por duas vezes, tomou coragem e 
decidiu fazer uma denúncia pública.2 Em face da inércia da Justiça, es-
creveu um livro,3 uniu-se ao movimento de mulheres e, como ela mesma 
diz, não perdeu nenhuma oportunidade de manifestar sua indignação.4
Essa é a história de Maria da Penha, igual à de tantas outras vítimas 
da violência doméstica deste país. A repercussão foi de tal ordem que o 
Centro pela Justiça e o Direito Internacional – CEJIL juntamente com 
o Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da 
Mulher – CLADEM formalizaram denúncia à Comissão Interameri-
cana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos. 
Foi a primeira vez que a OEA acatou uma denúncia pela prática de 
violência doméstica.5 
Apesar de, por quatro vezes, a Comissão ter solicitado informações 
ao governo brasileiro, nunca recebeu nenhuma resposta. Em 2001 o Brasil 
foi condenado internacionalmente. O Relatório n. 54 da OEA, além de 
impor o pagamento de indenização no valor de 20 mil dólares, em favor 
de Maria da Penha, responsabilizou o Estado brasileiro por negligência 
e omissão frente à violência doméstica, recomendando a adoção de várias 
medidas, entre elas “simplificar os procedimentos judiciais penais a fim de 
que possa ser reduzido o tempo processual”. A indenização, no valor de 60 
mil reais, foi paga a Maria da Penha, em julho de 2008, pelo governo do 
Estado do Ceará, em uma solenidade pública, com pedido de desculpas. 
1. Maria da Penha, Antes de tudo, uma forte, 22.
2. Iáris Ramalho Cortês, Myllena Calasans de Matos, Lei Maria da Penha: do papel para 
a vida.
3. Maria da Penha Maia Fernandes, Sobrevivi... posso contar.
4. Maria da Penha, Antes de tudo, uma forte, 22.
5. Roberta Toledo Campos, Aspectos constitucionais e penais..., 272.
Cap. 1 • Por que Maria da Penha? 17
Só então o Brasil resolveu dar cumprimento às convenções e tratados 
internacionais do qual é signatário. Daí a referência, na ementa da Lei, 
à Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação 
contra as Mulheres6 e à Convenção Interamericana para Prevenir, Punir 
e Erradicar a Violência contra a Mulher – a chamada Convenção de 
Belém do Pará.7
O projeto, que teve início em 2002, foi elaborado por cinco orga-
nizações não governamentais – ONGs que trabalhavam com a violência 
doméstica.8 O Grupo de Trabalho Interministerial, criado pelo Decreto 
5.030/04, sob a coordenação da Secretaria Especial de Políticas para as 
Mulheres, elaborou o projeto que, em novembro de 2004, foi enviado ao 
Congresso Nacional.
O Projeto de Lei 4.559/04 ficou sob a relatoria da Deputada Federal 
Jandira Feghali, a qual realizou audiências públicas em vários Estados 
e apresentou um substitutivo. Novas alterações foram levadas a efeito 
pelo Senado Federal, como PLC 37/06. Finalmente a Lei 11.340/06 foi 
sancionada pelo Presidente da República, em 07 de agosto de 2006, e 
entrou em vigor em 22 de setembro de 2006.
Tanto Maria da Penha quanto a Comissão Interamericana de Di-
reitos Humanos da OEA e o legislador fizeram sua parte. Agora, ainda 
que vagarosamente, o Estado vem implantando as medidas necessárias 
e adotando as políticas públicas que estão previstas na Lei.9 
Mas o grande responsável pela sua eficácia tem sido o Poder Ju-
diciário. Além das inúmeras decisões de juízes e tribunais, tem sido o 
Supremo Tribunal Federal o grande artífice para que a Lei atenda à sua 
finalidade precípua: se não de eliminar, ao menos de reduzir, em muito, 
os números da violência doméstica contra a mulher.
6. Texto no Anexo 2.
7. Texto no Anexo 2.
8. CLADEM/Brasil – Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos 
da Mulher; CEPIA – Cidadania, Estudo, Pesquisa, Informação e Ação; CFEMEA – Cen-
tro Feminista de Estudos e Assessoria; IPE – Instituto para a Promoção da Equidade 
e THEMIS – Assessoria Jurídica e Estudos de Gênero. 
9. O elenco se encontra no cap. 21.
3
UM OLHAR NO TEMPO
Sumário: 3.1. No passado – 3.2. Um novo tempo – 3.3. Sem 
mais tempo.
3.1. NO PASSADO
Desde que o mundo é mundo humano, a mulher sempre foi dis-
criminada, desprezada, humilhada, coisificada, objetivizada, moneta-
rizada.1 Ainda assim, a violência de que as mulheres são vítimas no 
reduto doméstico, nunca mereceu a devida atenção da sociedade. A ideia 
sacralizada da família e a inviolabilidade do domicílio sempre serviram 
de justificativa para barrar qualquer tentativa de coibir o que acontecia 
entre quatro paredes. Como eram situações que ocorriam no interior do 
“lar, doce lar”, ninguém interferia. Afinal, “em briga de marido e mulher, 
ninguém bota a colher!”.
A Constituição da República de modo enfático consagra o princí-
pio da igualdade, e explicitamente ressalta a igualdade entre homens e 
mulheres (CR, art. 5.º, I), inclusive no âmbito das relações familiares (CR, 
art. 226, § 5.º). Do mesmo modo, impõe ao Estado o dever de assegurar 
assistência à família e criar mecanismos para coibir a violência no âmbito 
de suas relações (CR, art. 226, § 8.º). No entanto, ao prever o julgamento 
das infrações penais de menor potencial ofensivo de maneira sumária 
por juizados especiais, mediante procedimento oral e sumaríssimo, admi-
tindo a transação penal e a aplicação de medidas despenalizadoras (CR, 
art. 98, I), olvidou-se de excluir a violência doméstica. 
1. Belmiro Pedro Welter, A norma da Lei Maria da Penha.
4
TRATADOS INTERNACIONAIS
Sumário: 4.1. Compromissos internacionais – 4.2. A força 
dos tratados.
4.1. COMPROMISSOS INTERNACIONAIS 
Proclama a Constituição da República (art. 226): A família, base da 
sociedade, tem especial proteçãodo Estado. E promete (art. 226, § 8.º): O 
Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a 
integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas 
relações. 
A Lei Maria da Penha veio atender esse compromisso constitucional. 
No entanto, chama a atenção o fato de, na sua ementa, fazer menção 
não só à norma constitucional, mas também à Convenção sobre a Eli-
minação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e à 
Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência 
contra a Mulher.
Esse tipo de referência é pouco usual, mas lá está porque a Lei Maria 
da Penha foi editada para atender à recomendação da OEA, decorrente 
de condenação imposta ao Brasil. A menção também reflete nova postura 
frente aos tratados internacionais de proteção dos direitos humanos.
Basta ver os sucessivos eventos realizados em âmbito internacional 
voltados à tutela dos direitos da população feminina, e que marcam 
importantes avanços. 
A ONU traz garantias de proteção à mulher mediante acordos in-
ternacionais. Foi realizada no México a I Conferência Mundial sobre 
5
UMA VIOLAÇÃO AOS DIREITOS 
HUMANOS
Sumário: 5.1. O direito desdobrado em gerações – 5.2. A 
violência contra a mulher.
5.1. O DIREITO DESDOBRADO EM GERAÇÕES
A noção de direitos fundamentais decorreu da evolução histórica e 
social como um conjunto institucionalizado de direitos e garantias do ser 
humano que tem por finalidade básica o respeito a sua dignidade, por meio 
de sua proteção contra o arbítrio do poder estatal e o estabelecimento de 
condições mínimas de vida e desenvolvimento da personalidade humana.1 
Inicialmente nominados de direitos subjetivos do homem e do cida-
dão, passaram a ser chamados de direitos humanos, graças ao movimento 
feminista, que impôs a alteração em face da carga sexista da expressão. Por 
serem indispensáveis à existência das pessoas, possuem as seguintes carac-
terísticas: (a) inalienabilidade: são direitos intransferíveis e inegociáveis; 
(b) imprescritibilidade: não deixam de ser exigíveis em razão do não uso; 
(c) irrenunciabilidade: nenhum ser humano pode abrir mão da existência 
desses direitos; (d) universalidade: devem ser respeitados e reconhecidos no 
mundo todo e (e) ilimitabilidade: não são absolutos. Podem ser limitados 
sempre que houver uma hipótese de colisão de direitos fundamentais.2
O desdobramento dos direitos fundamentais em gerações advém 
da socialização da sociedade contemporânea, dando continuidade à am-
pliação subjetiva e objetiva do direito. Esse processo resultou do avanço 
1. Alexandre de Morais, Direitos humanos fundamentais, 34.
2. Fernanda Silva Bianco. As gerações de direitos fundamentais.
6
CONCEITO E ÂMBITO DE INCIDÊNCIA 
Sumário: 6.1. Conceito de violência doméstica – 6.2. Tipi-
ficação fora do âmbito do direito penal – 6.3. Família – 6.4. 
Relação íntima de afeto – 6.5. Unidade doméstica – 6.6. Uniões 
homoafetivas – 6.7. Namoro.
6.1. CONCEITO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
A Lei Maria da Penha, em sua ementa, invoca a Convenção Intera-
mericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher 
– conhecida como Convenção de Belém do Pará1, que define a violência 
contra a mulher como qualquer ato ou conduta baseada no gênero, que 
cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, 
tanto na esfera pública como na esfera privada. Este foi o conceito que 
serviu de norte para o legislador criar mecanismos para coibir a violência 
doméstica no país.
A absoluta falta de consciência social do que seja violência doméstica 
é que acabou condenando à invisibilidade esta prática tão recorrente. 
Aliás, as agressões contra a mulher sequer eram identificadas como 
violação dos direitos humanos. Daí louvável a iniciativa do legislador 
em expressamente fazer tal afirmativa (LMP, art. 6.º), que, inclusive, tem 
caráter pedagógico.
A Lei Maria da Penha inseriu no seu âmbito de proteção não só a 
mulher, mas a própria entidade familiar ao falar também em violência 
doméstica e não apenas em violência contra a mulher. Com efeito, a 
violência praticada contra a mulher no âmbito doméstico é capaz de 
1. Texto do Anexo 2.
A LEI MARIA DA PENHA NA JUSTIÇA • Maria Berenice Dias54
lesar, simultaneamente, vários bens jurídicos protegidos. Salta aos olhos 
que a violência doméstica diz respeito não apenas à instância privada 
de órbita familiar, mas também, e especialmente, às instâncias públicas 
dotadas de poder para resguardar os direitos fundamentais dos membros 
da família.2
Outra questão relevante, que não pode passar despercebida, diz com 
o uso, pela Lei Maria da Penha, da expressão mulheres em situação de 
violência, em contraposição ao termo vítima. Mais do que um recurso 
linguístico, a mudança tem por objetivo retirar o estigma contido na cate-
goria “vítima”, que coloca as mulheres na posição de objeto da violência.3 
Necessário atentar que a Lei Maria da Penha utiliza tanto a palavra 
mulher como a palavra gênero. A distinção entre sexo e gênero é sig-
nificativa. Sexo está ligado à condição biológica do homem e da mulher, 
perceptível quando do nascimento pelas características genitais. Gênero é 
uma construção social, que identifica papéis sociais de natureza cultural, 
e que levam a aquisição da masculinidade e da feminilidade.4 
Ainda que a lei não seja a sede adequada para emitir conceitos, 
andou bem em definir violência doméstica (LMP, art. 5.º) e identificar 
suas formas (LMP, art. 7.º). O conceito legal de violência recebeu algu-
mas críticas da doutrina, sendo chamado de lamentável, uma norma mal 
redigida e extremamente aberta. Chegou-se ao ponto de afirmar que, pela 
interpretação literal da lei, qualquer crime contra a mulher seria violência 
doméstica e familiar, uma vez que lhe causa, no mínimo, sofrimento psi-
cológico.5 Ora, esse temor não se justifica. Não há risco de todo e qualquer 
delito cometido contra a mulher ser considerado como violência domés-
tica. A agravante do art. 61, II, f, do Código Penal tem limitado campo 
de abrangência, pois restringe a violência contra a mulher na forma que 
a lei específica. Assim, somente a violência praticada contra a mulher e 
em razão do convívio familiar ou afetivo é que leva ao aumento da pena.
O mesmo ocorre no âmbito da Lei Maria da Penha. Para se chegar 
ao conceito de violência doméstica é necessária a conjugação dos seus 
2. Maria Celina Bodin de Moraes, Vulnerabilidades nas relações de família, 313.
3. Carmen Hein Campos e Salo de Carvalho, Lei Maria da Penha, 146.
4. Acir de Matos Gomes, Discurso jurídico, mulher e ideologia, 88.
5. Guilherme de Souza Nucci, Leis penais e processuais penais comentadas, 863.
9
VIOLÊNCIA E SUAS PENAS
Sumário: 9.1. O que mudou – 9.1. Reflexos nas relações 
familiares – 9.2. Alterações no Código Penal – 9.3. Prisão pre-
ventiva – 9.4. Comparecimento a programa de recuperação e 
reeducação – 9.5. Cesta básica – 9.6. Sursis.
9.1. O QUE MUDOU
A Lei Maria da Penha não é uma simples lei, é um precioso estatuto, 
não somente de caráter repressivo, mas, sobretudo, preventivo e assis-
tencial.1 Verdadeiro microssistema que visa coibir a violência doméstica 
trazendo importantes mudanças. Apesar de não ser uma lei penal, nítido o 
seu colorido penalizador, ao tratar com mais rigor as infrações cometidas 
contra a mulher, no âmbito familiar, doméstico e em relações íntimas de 
afeto. Enquanto no processo penal comum vige o princípio in dubio pro 
reo, no caso de violência doméstica vigora o in dubio pró-mulher. Pela 
primeira vez é emprestada credibilidade à palavra da mulher. Quando 
se está diante de um episódio de violência doméstica, é indispensável 
reconhecer a condição de vulnerabilidade da vítima que jamais dispôs 
de um instrumento ágil e eficaz para se proteger do agressor com quem 
coabita. Cabe lembrar que, antes da Lei Maria da Penha, o registro da 
violência perante a autoridade policial não gerava qualquer iniciativa 
protetiva imediata. Era necessário oingresso de um procedimento cau-
telar de separação de corpos no juízo de família. O tempo decorrido 
entre o ato de violência e a resposta efetiva do Estado deixava a vítima à 
mercê do agressor. Certamente esta era uma das causas de a mulher ter 
dificuldade de denunciar a violência da qual era vítima.
1. Rogério Sanches Cunha e Ronaldo Batista Pinto, Violência doméstica, 20.
A LEI MARIA DA PENHA NA JUSTIÇA • Maria Berenice Dias96
9.3. ALTERAÇÕES NO CÓDIGO PENAL
As mudanças levadas a efeito pela Lei Maria da Penha na legislação 
infraconstitucional foram de pequena monta. No Código Penal, limitou-se a 
acrescentar mais uma circunstância agravante quando o agente se prevalece 
de relações domésticas, de coabitação ou hospitalidade (CP, art. 61, II, f). 
Quando o delito de lesões corporais é cometido em decorrência do 
relacionamento familiar, houve aumento da pena máxima e diminuição 
da pena mínima. Tal alteração acabou por abrandar a apenação da lesão 
corporal leve, pois a tendência dos juízes é quantificar a pena perto do mí-
nimo legal. Também foi estabelecida uma majorante quando a vítima da 
violência doméstica é portadora de alguma deficiência (CP, art. 129, § 11.º).
Após a edição da Lei Maria da Penha, alterações mais significativas 
foram introduzidas no Código Penal para coibir a prática de delitos 
contra as mulheres.
São efeitos da condenação a incapacidade para o exercício do poder 
familiar, nos crimes dolosos sujeitos à pena de reclusão cometidos por 
um genitor contra o outro (CP, art. 92, II).
Foi inserida uma forma qualificada do delito de homicídio, com o 
nome de feminicídio (CP, art. 121, § 2º, VI), o que acabou por escancarar 
uma realidade ainda chocante. O perigo a que estão expostas as mulheres 
pelo simples fato de desejarem sair de um relacionamento.
Foi alterado o Código Penal para tipificar como crime: importuna-
ção sexual (CP, art. 215-A); divulgação de cena de estupro ou de cena 
de estupro de vulnerável, de cena de sexo ou de pornografia (CP, art. 
218-C); estupro coletivo (CP, art. 226, IV, a) e o estupro corretivo (CP, 
art. 226, IV, b).
Também foram tipificados como crime: induzimento, instigação, 
incitação ou apologia a crime contra a dignidade sexual (CP, art. 128-D 
e par. único). Esclarece a lei que ocorre estupro de vulnerável. 
Os crimes praticados contra a liberdade sexual (CP, art. 213 a 
216-B) e os crimes sexuais contra vulneráveis (CP, art. 217 a 218-C) 
são reconhecidos como de ação pública incondicionada (CP, art. 225). 
Deste modo, Ministério Público tem legitimidade para o oferecimento 
da denúncia, independentemente de representação da vítima.
12
DELITOS SUJEITOS À REPRESENTAÇÃO 
A Lei 9.099/1995 veio para atender a determinação constitucional 
(CF, art. 98) de que fossem criados Juizados Especiais para o julgamento 
de infrações penais de menor potencial ofensivo. 
Para isso, era necessário que fossem eleitos delitos a serem con-
siderados de pequeno potencial ofensivo. Neste rol foram incluídas as 
contravenções penais e os crimes com pena máxima não superior a dois 
anos (Lei 9.099/1995, art. 61). Neste universo, acabou, inadvertidamente, 
inserido o delito de lesão corporal leve (Lei 9.099/1995, art. 88). Certa-
mente estas são as práticas criminais em que as mulheres são as maiores 
vítimas no ambiente doméstico. Como afirma Cláudio do Prado Amaral: 
“E nem se diga que ao ser projetada a Lei 9.099/95 não se pensou nas 
agressões contra a mulher, pois tendo aquela lei acolhido uma política 
criminal de informalização da justiça penal, automaticamente teve cons-
ciência de que também passaria a dispor sobre a violência de gênero”.1
O rito nos Juizados Especiais é bem ágil. A autoridade policial não 
elabora inquérito policial, limitando-se a redigir termo circunstanciado, 
a ser encaminhado ao Juizado Especial Criminal – JECRIM. Nesta esfera, 
as infrações são apreciadas por meio de procedimentos que a lei chama 
de sumaríssimo, marcados pelos critérios da oralidade, informalidade, 
economia processual e celeridade (Lei 9.099/95, art. 62). Na audiência 
preliminar, aberta a possibilidade conciliatória, a composição de danos 
leva à extinção da punibilidade. A instauração do processo é condiciona-
da à representação da vítima (Lei 9.099/1995, art. 75). Mesmo havendo 
a representação da vítima, o Ministério Público pode propor transação 
penal ou suspensão condicional do processo (Lei 9.099/1995, art. 89), 
1. Cláudio do Prado Amaral, A Lei n. 9.099/95, a política criminal e a violência..., 117.
13
QUESTÕES CONSTITUCIONAIS
Como tudo que é novo gera resistência, claro que a Lei Maria da Pe-
nha não fugiu à regra. Alguns poucos doutrinadores, bem como número 
não expressivo de decisões judiciais suscitaram a inconstitucionalidade 
ou de toda a lei ou de um punhado de seus dispositivos, na vã tentativa 
de impedir sua vigência ou limitar sua eficácia. 
A alegação era que a Lei havia criado a desigualdade na entidade 
familiar.1 Ora, como se a igualdade constitucional existisse no âmbito da 
família! Segundo a Min. Eliana Calmon, se levarmos em conta, em termos 
absolutos, o princípio da igualdade formal, todas as ações afirmativas 
padeceriam de inconstitucionalidade.2
O fundamento da alegada afronta ao princípio da igualdade decor-
re do fato de a Lei direcionar-se exclusivamente à proteção da mulher, 
uma vez que o homem não pode figurar como sujeito passivo e nem ser 
beneficiário de suas benesses. No dizer de Valter Santin, a pretexto de 
proteger a mulher, numa postura “politicamente correta”, a nova legisla-
ção é visivelmente discriminatória no tratamento de homem e mulher.3 
Mas nenhum questionamento desta ordem foi suscitado com relação aos 
Estatutos da Infância e da Adolescência, do Idoso e da Igualdade Racial, 
todos microssistemas que amparam determinados segmentos sociais, 
resguardando direitos a quem se encontra em situação de vulnerabi-
lidade. Leis voltadas a parcelas da população merecedoras de especial 
1. João Paulo de Aguizer Sampaio Souza e Tiago Abud da Fonseca, A aplicação da Lei 
9.099/95..., 4.
2. Eliana Calmon, A Lei Maria da Penha, 52.
3. Valter Foleto Santin, Igualdade constitucional na violência doméstica.
14
A POSIÇÃO DOS 
TRIBUNAIS SUPERIORES
Sumário: 14.1. Supremo Tribunal Federal – 14.2. Superior 
Tribunal de Justiça.
Em face da força normativa das decisões dos Tribunais Superiores, 
que têm o fim precípuo de interpretar as leis e a própria Constituição, os 
julgamentos vêm provocando acentuadas mudanças e fazendo verdadeira 
correção nos rumos da jurisprudência.
14.1. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Em face do crescente número de julgados negando a constituciona-
lidade de um punhado de artigos da Lei Maria da Penha, o Presidente da 
República, por meio do Advogado Geral da União, propôs a Ação Direta 
de Constitucionalidade – ADC 19. Apesar de indeferida a liminar de 
suspensão dos atos que, direta ou indiretamente, negavam vigência à 
Lei Maria da Penha, o Relator, Ministro Marco Aurélio, admitiu a ação 
e encaminhou-a ao julgamento pelo plenário da Corte.1
Em 09/02/2012, o Supremo Tribunal Federal proferiu as mais emble-
máticas decisões sobre a Lei Maria da Penha. Acolheu por ampla maioria 
– 10 votos favoráveis e apenas um voto contrário – a ADC 19, proposta 
pelo Presidente da República reconhecendo a constitucionalidade dos 
1. STF, ADC 19, Rel. Min. Marco Aurélio, Dec. Monocrática, j. 21/12/2007.
18
O PAPEL DO MINISTÉRIO PÚBLICO
Sumário: 18.1. Atuação – 18.2. Banco de dados – 18.3. 
Atribuições.
18.1. ATUAÇÃO
O Ministério Público tem o dever, imposto constitucionalmente, 
de defender os interesses sociais e individuais indisponíveis (CR, art. 
127). Assim não há como negar sua obrigação primordial de defesa dos 
direitos fundamentais em todas as suas esferas de atuação, inclusive, nas 
relações familiares.1 Ao menos enquanto em conflito com a lei. Não 
foi por outro motivo que o Superior Tribunal de Justiça de há muito já 
afirmou a competência do MinistérioPúblico para requerer a aplicação 
de medidas protetivas.2
Em sede de violência doméstica, a Lei Maria da Penha atribui ao 
Ministério Público atuação em três esferas: institucional, administrativa e 
funcional. A atuação institucional diz com a integração operacional com 
as demais entidades envolvidas na aplicação da Lei, trabalhando conco-
mitantemente com os demais órgãos públicos ou privados que se ligam 
à proteção da mulher (LMP, art. 8.º, I e VI). Na esfera administrativa, 
dispõe do poder de polícia, cabendo-lhe fiscalizar os estabelecimentos 
públicos e particulares de atendimento à mulher em situação de vio-
lência doméstica e familiar (LMP, art. 26, II). Também como atividade 
1. Sumaya Saady Morhy Pereira, O Ministério Público e a Lei Maria da Penha, 28.
2. STJ, HC 92.875/RS (2007/0247593-0), Rel. Des. convocada do TJMG Min. Jane Silva, j. 
30/10/2008.
19
PROVIDÊNCIAS POLICIAIS
Sumário: 19.1. Para onde se dirigir – 19.2. Escuta da vítima 
– 19.3. Registro da ocorrência – 19.4. Fato atípico – 19.5. 
Representação – 19.6. Encaminhamento da medida protetiva a 
juízo – 19.7. Prisão em flagrante – 19.8. Fiança – 19.9. Prisão 
preventiva – 19.10. Inquérito policial – 19.11. Identificação 
criminal.
A Lei Maria da Penha veio corrigir perversa realidade histórica. 
A ausência de legislação própria desestimulava a vítima a denunciar o 
seu algoz, o que tornava a violência doméstica um crime praticamente 
invisível. Após a sua edição, a voz das mulheres ganhou força, e toda a 
sociedade passou a enxergar essa chaga que corrói a vítima em silêncio.
Ainda que haja determinação legal para que a Polícia Civil dê priori-
dade à criação de Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher 
– DEAM, Núcleos Investigativos de Feminicídio e mantenha equipes 
especializadas para o atendimento e a investigação das violências graves 
contra a mulher (LMP, art. 12-A), ainda é pouco significativo o número 
de tais espaços neste imenso Brasil. 
Era desastrosa – para dizer o mínimo – a forma como a violência 
contra a mulher era enfrentada no país, principalmente após a Lei dos 
Juizados Especiais que considerou a lesão corporal leve crime de pequeno 
potencial ofensivo, cujo desencadeamento era condicionado à represen-
tação da vítima. Ninguém duvida que este é o crime que mais vitimiza 
as mulheres no ambiente doméstico. E dela, fragilizada, que tem enorme 
dificuldade de denunciar a violência, exigir ainda que represente contra 
o agressor era colocá-la em situação de mais vulnerabilidade. Às claras o 
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LEI 11.340, DE 7 DE AGOSTO DE 2006
Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e 
familiar contra a mulher, nos termos do § 8.º do art. 
226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eli-
minação de Todas as Formas de Discriminação contra as 
Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, 
Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe 
sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e 
Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo 
Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá 
outras providências.
O Presidente da República:
Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a se-
guinte Lei:
TÍTULO I
DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
Art. 1.º Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência 
doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8.º do art. 226 
da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as 
Formas de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para 
Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros trata-
dos internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe 
sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a 
Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em 
situação de violência doméstica e familiar.
Art. 2.º Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, 
orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza 
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TEMAS, SÚMULAS E JURISPRUDÊNCIA 
EM TESE DOS TRIBUNAIS SUPERIORES
Sumário: 3.1. Supremo Tribunal Federal – 3.2. Superior Tri-
bunal de Justiça.
3.1. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL 
3.1.1. Tese de repercussão geral
Tema 761: i) O transgênero tem direito fundamental subjetivo à 
alteração de seu prenome e de sua classificação de gênero no registro 
civil, não se exigindo, para tanto, nada além da manifestação de vontade 
do indivíduo, o qual poderá exercer tal faculdade tanto pela via judicial 
como diretamente pela via administrativa; ii) Essa alteração deve ser 
averbada à margem do assento de nascimento, vedada a inclusão 
do termo “transgênero”; iii) Nas certidões do registro não constará 
nenhuma observação sobre a origem do ato, vedada a expedição de 
certidão de inteiro teor, salvo a requerimento do próprio interessado 
ou por determinação judicial; iv) Efetuando-se o procedimento pela via 
judicial, caberá ao magistrado determinar de ofício ou a requerimento 
do interessado a expedição de mandados específicos para a alteração 
dos demais registros nos órgãos públicos ou privados pertinentes, os 
quais deverão preservar o sigilo sobre a origem dos atos.
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ENUNCIADOS 
Sumário: 5.1. Fórum Nacional de Juízes da Violência Do-
méstica (FONAVID) – 5.2. Comissão Permanente de Combate 
à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (COPEVID) 
do Conselho Nacional de Procuradores-gerais de Justiça dos 
Ministérios Públicos dos Estados e da União – 5.3. IBDFAM – 
Instituto Brasileiro de Direito de Família.
5.1. FÓRUM NACIONAL DE JUÍZES DA VIOLÊNCIA 
DOMÉSTICA (FONAVID)
Enunciado 01: Período de relacionamento
Para incidência da Lei Maria da Penha, não importa o período de rela-
cionamento entre vítima e agressor (a), nem o tempo decorrido desde 
o seu rompimento, bastando que reste comprovado que a violência
decorreu da relação de afeto.
Enunciado 02: Coabitação
Inexistindo coabitação ou vínculo de afeto entre agressor (a) e ofen-
dida, deve ser observado o limite de parentesco estabelecido pelos 
artigos 1.591 a 1595 do Código Civil, quando a invocação da proteção 
conferida pela Lei n. 11.340/06 decorrer exclusivamente das relações 
de parentesco. 
Enunciado 03: Competência cível
A competência cível dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar 
contra a Mulher é restrita às medidas protetivas de urgência previstas na

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