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ESTADO DE MATO GROSSO SECRETARIA DE ESTADO DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA UNIVERSIDADE DO ESTADO DE MATO GROSSO CAMPUS UNIVERSITÁRIO DE PONTES E LACERDA UNIDADE FORA DE SEDE E PARCELADAS POLO – COMODORO/MT DEPARTAMENTO DE DIREITO FICHA DE LEITURA TEMA: RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO OBJETO CARVALHO FILHO, José dos Santos, Manual de Direito Administrativo, 34ª edição 2020 Cap. 10. Capítulo 10 – Responsabilidade Civil do Estado I. Introdução 1. RESPONSABILIDADE. NOÇÃO JURÍDICA “A noção de responsabilidade implica a ideia de resposta, termo que, por sua vez, deriva do vocábulo verbal latino responder e, com o sentido de responder, replicar. ” pg 806 1”No que diz respeito ao fato gerador da responsabilidade, não está ele atrelado ao aspecto da licitude ou ilicitude. Como regra, é verdade, o fato ilícito é que acarreta a responsabilidade, mas, em ocasiões especiais, o ordenamento jurídico faz nascer a responsabilidade até mesmo de fatos lícitos. Nesse ponto, a caracterização do fato como gerador da responsabilidade obedece ao que a lei estabelecer a respeito.” 1.1. Tipos de Responsabilidade “Temos, então, que se a norma tem natureza penal, a consumação do fato gerador provoca responsabilidade penal; se a norma é de direito civil, teremos a responsabilidade civil; e, finalmente, se o fato estiver previsto em norma administrativa, dar-se-á a responsabilidade administrativa.” Pg 806 “Podem, eventualmente, conjugar-se as responsabilidades, mas isso só vai ocorrer se a conduta violar, simultaneamente, normas de naturezas diversas. No crime de peculato (art. 312, CP), por exemplo, o servidor que se apropria indevidamente de bem público sob sua custódia tem, cumulativamente, responsabilidade penal, civil e administrativa, porquanto sua conduta violou, simultaneamente, esses três tipos de norma.” 2. RESPONSABILIDADE CIVIL “’”O vigente Código Civil mantém o sentido básico do art. 159 do CC/1916, embora com texto mais preciso e com desmembramento da disciplina pertinente ao ato ilícito e à responsabilidade.” Assim, dita o art. 186 do Código: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.” No capítulo destinado à responsabilidade civil e à obrigação indenizatória, averba o mesmo Código no art. 927: “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.” Pg 806 e 807 3. O DANO E A INDENIZAÇÃO “A responsabilidade civil tem como pressuposto o dano (ou prejuízo). Significa dizer que o sujeito só é civilmente responsável se sua conduta, ou outro fato, provocar dano a terceiro. Sem dano, inexiste responsabilidade civil.” Pg 808 “Toda responsabilidade rende ensejo a determinada sanção, cuja natureza varia em função do tipo de responsabilidade: a responsabilidade penal importa a aplicação de sanção penal; a civil, penalização de caráter privado, e assim por diante. Se o mesmo fato provoca responsabilidade de mais de uma natureza, são aplicáveis, cumulativamente, as respectivas sanções. A sanção aplicável no caso de responsabilidade civil é a indenização, que se configura como o montante pecuniário que representa a reparação dos prejuízos causados pelo responsável.” Pg 809 II. Evolução 1. A IRRESPONSABILIDADE DO ESTADO “Na metade do século XIX, a ideia que prevaleceu no mundo ocidental era a de que o Estado não tinha qualquer responsabilidade pelos atos praticados por seus agentes. A solução era muito rigorosa para com os particulares em geral, mas obedecia às reais condições políticas da época. O denominado Estado Liberal tinha limitada atuação, raramente intervindo nas relações entre particulares, de modo que a doutrina de sua irresponsabilidade constituía mero corolário da figuração política de afastamento e da equivocada isenção que o Poder Público assumia àquela época.” “Modernamente, portanto, o direito positivo das nações civilizadas admite a responsabilização civil do Estado pelos danos que seus agentes causem a terceiros, podendo variar aspectos específicos e de menor importância no que toca à responsabilidade do agente, ao montante da reparação, à forma processual de proteção do direito etc.” pg 810 2. TEORIA DA RESPONSABILIDADE COM CULPA “O abandono da teoria da irresponsabilidade do Estado marcou o aparecimento da doutrina da responsabilidade estatal no caso de ação culposa de seu agente. Passava a adotar-se, desse modo, a doutrina civilista da culpa. “ “Entretanto, procurava distinguir-se, para esse fim, dois tipos de atitude estatal: os atos de império e os atos de gestão. Aqueles seriam coercitivos porque decorrem do poder soberano do Estado, ao passo que estes mais se aproximariam com os atos de direito privado. Se o Estado produzisse um ato de gestão, poderia ser civilmente responsabilizado, mas se fosse a hipótese de ato de império não haveria responsabilização, pois que o fato seria regido pelas normas tradicionais de direito público, sempre protetivas da figura estatal.” 3. TEORIA DA CULPA ADMINISTRATIVA “O reconhecimento subsequente da culpa administrativa passou a representar um estágio evolutivo da responsabilidade do Estado, eis que não mais era necessária a distinção acima apontada, causadora de tantas incertezas.” Pg 811 “A falta do serviço podia consumar-se de três maneiras: a inexistência do serviço, o mau funcionamento do serviço ou o retardamento do serviço. Em qualquer dessas formas, a falta do serviço implicava o reconhecimento da existência de culpa, ainda que atribuída ao serviço da Administração. Por esse motivo, para que o lesado pudesse exercer seu direito à reparação dos prejuízos, era necessário que comprovasse que o fato danoso se originava do mau funcionamento do serviço e que, em consequência, teria o Estado atuado culposamente. Cabia-lhe, ainda, o ônus de provar o elemento culpa.” 4. TEORIA DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA “Das doutrinas civilistas e após a teoria da culpa no serviço, o direito dos povos modernos passou a consagrar a teoria da responsabilidade objetiva do Estado.” Pg 811 “Não há dúvida de que a responsabilidade objetiva resultou de acentuado processo evolutivo, passando a conferir maior benefício ao lesado, por estar dispensado de provar alguns elementos que dificultam o surgimento do direito à reparação dos prejuízos, como, por exemplo, a identificação do agente, a culpa deste na conduta administrativa, a falta do serviço etc.” 5. FUNDAMENTO DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA: A TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO “Tem havido alguma controvérsia sobre as noções do risco administrativo e do denominado risco integral. No risco administrativo, não há responsabilidade civil genérica e indiscriminada: se houver participação total ou parcial do lesado para o dano, o Estado não será responsável no primeiro caso e, no segundo, terá atenuação no que concerne a sua obrigação de indenizar. Por conseguinte, a responsabilidade civil decorrente do risco administrativo encontra limites. 13 Já no risco integral a responsabilidade sequer depende do nexo causal e ocorre até mesmo quando a culpa é da própria vítima. Assim, por exemplo, o Estado teria que indenizar o indivíduo que se atirou deliberadamente à frente de uma viatura pública. É evidente que semelhante fundamento não pode ser aplicado à responsabilidade do Estado, 14 só sendo admissível em situações raríssimas e excepcionais.” Pg 812 “Além do risco decorrente das atividades estatais em geral, constituiu também fundamento da responsabilidade objetiva do Estado o princípio da repartição dos encargos. O Estado, ao ser condenado a reparar os prejuízos do lesado, não seria o sujeito pagador direto; os valores indenizatórios seriam resultantes da contribuição feita por cada um dos demais integrantes da sociedade, aqual, em última análise, é a beneficiária dos poderes e das prerrogativas estatais.” Pg 813 III. Direito Brasileiro 1. CÓDIGO CIVIL “O Código Civil em vigor, entretanto, alterou o art. 15 e dispôs no art. 43: “As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis por atos dos seus agentes que nessa qualidade causem danos a terceiros, ressalvado direito regressivo contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo.” Diante dos novos termos, impõe-se reconhecer que o Código, na parte que constitui o núcleo básico da norma, passou a disciplinar o tema em consonância com a vigente Constituição, como veremos adiante.” Pg 813 2. CONSTITUIÇÃO FEDERAL “A Constituição Federal de 1946 passou a dar diferente redação para regular a matéria. Nos termos do art. 194, ficou assentado que “as pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis pelos danos que seus funcionários, nessa qualidade, causem a terceiros”. Se comparado esse texto com o do art. 15 do Código Civil revogado, não será difícil observar que foram retirados da norma os pressupostos da conduta contrária ao direito e da inobservância de dever legal, exatamente aqueles que denunciavam a adoção da responsabilidade subjetiva ou com culpa.” “Além desse dispositivo, que de resto é o mandamento básico sobre o assunto, não se pode esquecer de mencionar o art. 21, XXIII, d, da Lei Fundamental, segundo o qual, competindo à União Federal explorar os serviços e instalações nucleares de qualquer tipo, exercendo monopólio sobre pesquisa, lavra, enriquecimento e reprocessamento, industrialização e comercialização de minérios nucleares e derivados, assevera que “a responsabilidade civil por danos nucleares independe da existência de culpa”. A norma reforça a sujeição do Poder Público à responsabilidade objetiva, tendo como fundamento a teoria do risco administrativo, de modo que, se a União ou outra pessoa de sua administração causarem qualquer tipo de dano no desempenho de tais atividades, estarão inevitavelmente sujeitas ao dever de reparar os respectivos prejuízos através de indenização, sem que possam trazer em sua defesa o argumento de que não houve culpa no exercício da atividade. Haverá, pois, risco administrativo natural nas referidas tarefas, bastando, assim, que o lesado comprove o fato, o dano e o nexo causal entre o fato e o dano que sofreu.” Pg 815 3. ANÁLISE DOS ELEMENTOS CONSTITUCIONAIS “O texto do art. 37, § 6 o , da Constituição de 1988, a despeito de não alterar a doutrina já consagrada anteriormente, apresenta, em nosso entender, três elementos que merecem especial análise para sua perfeita interpretação. Vejamos esses elementos.” Pg 815 3.1. Pessoas Responsáveis “A regra constitucional faz referência a duas categorias de pessoas sujeitas à responsabilidade objetiva: as pessoas jurídicas de direito público e as pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos. Em relação à primeira categoria, não há novidade. São objetivamente responsáveis as pessoas jurídicas de direito público: as pessoas componentes da federação (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), as autarquias e as fundações públicas de natureza autárquica.” Pg 815 e 816 “A segunda categoria constituiu inovação no mandamento constitucional – as pessoas de direito privado prestadoras de serviços públicos. A intenção do Constituinte foi a de igualar, para fins de sujeição à teoria da responsabilidade objetiva, as pessoas de direito público e aquelas que, embora com personalidade jurídica de direito privado, executassem funções que, em princípio, caberiam ao Estado. Com efeito, se tais serviços são delegados a terceiros pelo próprio Poder Público, não seria justo nem correto que a só delegação tivesse o efeito de alijar a responsabilidade objetiva estatal e dificultar a reparação de prejuízos pelos administrados.” Pg 816 “Diante do requisito constitucional, ficam, pois, excluídas as empresas públicas e as sociedades de economia mista que se dedicam à exploração de atividade econômica, por força do art. 173, § 1 o , da CF, que impõe sejam elas regidas pelas normas aplicáveis às empresas privadas. Em consequência, estão elas sujeitas à responsabilidade subjetiva comum do Direito Civil.” Pg 817 3.2. Agentes do Estado “Dispõe o art. 37, § 6 o , da CF que o Estado é civilmente responsável pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, venham a causar a terceiros. Como pessoa jurídica que é, o Estado não pode causar qualquer dano a ninguém. Sua atuação se consubstancia por seus agentes, pessoas físicas capazes de manifestar vontade real. Todavia, como essa vontade é imputada ao Estado, cabe a este a responsabilidade civil pelos danos causados por aqueles que o fazem presente no mundo jurídico.” Pg 818 “Diante disso, são agentes do Estado os membros dos Poderes da República, os servidores administrativos, os agentes sem vínculo típico de trabalho, os agentes colaboradores sem remuneração, enfim todos aqueles que, de alguma forma, estejam juridicamente vinculados ao Estado. Se, em sua atuação, causam danos a terceiros, provocam a responsabilidade civil do Estado.” Pg 818 “Quanto aos ofícios de notas (tabelionatos) e de registro, existem algumas particularidades e controvérsias sobre a matéria, e a razão consiste no fato de que, apesar de os titulares serem agentes do Estado, desempenham sua atividade por delegação, em caráter privado (art. 236, § 1º, da CF), numa aparente contradictio.” 3.3. A Duplicidade de Relações Jurídicas “Na primeira parte do dispositivo, a Constituição regula a relação jurídica entre o Estado e o lesado, sendo aquele considerado civilmente responsável por danos causados a este. O fundamento jurídico dessa relação, como temos visto, reside na responsabilidade objetiva do Estado, dispensada a prova da culpa pelo prejudicado.” Pg 819 “ A parte final do texto, no entanto, faz menção à relação jurídica pertinente ao direito de regresso, dela fazendo parte o Estado e seu agente. Ao dizer que o Estado pode exercer seu direito de regresso contra o agente responsável nos casos de culpa ou dolo, a Constituição vinculou as partes à teoria da responsabilidade subjetiva ou com culpa. Significa dizer que o Estado só pode ressarcir-se do montante com que indenizou o lesado se comprovar a atuação culposa de seu agente, o que, aliás, constitui a regra geral no direito privado. Não custa acrescer que no Direito Penal é fundamental a distinção entre a culpa e o dolo para a configuração do crime, mas no direito privado é irrelevante para fins de responsabilidade civil. A culpa civil abrange o dolo e a culpa stricto sensu, como deflui do art. 186 do Código Civil.” . IV. Aplicação da Responsabilidade Objetiva 1. PRESSUPOSTOS “Para configurar-se esse tipo de responsabilidade, bastam três pressupostos. O primeiro deles é a ocorrência do fato administrativo, assim considerado como qualquer forma de conduta, comissiva ou omissiva, legítima ou ilegítima, singular ou coletiva, atribuída ao Poder Público. Ainda que o agente estatal atue fora de suas funções, mas a pretexto de exercê-las, o fato é tido como administrativo, no mínimo pela má escolha do agente (culpa in eligendo) ou pela má fiscalização de sua conduta (culpa in vigilando).” Pg 819 “O segundo pressuposto é o dano. Já vimos que não há falar em responsabilidade civil sem que a conduta haja provocado um dano. Não importa a natureza do dano: tanto é indenizável o dano patrimonial como o dano moral. Logicamente, se o dito lesado não prova que a conduta estatal lhe causou prejuízo, nenhuma reparação terá a postular.” “O último pressuposto é o nexo causal (ou relação de causalidade) entre o fato administrativo e o dano. Significa dizer que ao lesado cabe apenas demonstrar que o prejuízo sofrido se originou da condutaestatal, sem qualquer consideração sobre o dolo ou a culpa. 32 Se o dano decorre de fato que, de modo algum, pode ser imputado à Administração, não se poderá imputar responsabilidade civil a esta; inexistindo o fato administrativo, não haverá, por consequência, o nexo causal. Essa é a razão por que não se pode responsabilizar o Estado por todos os danos sofridos pelos indivíduos, principalmente quando decorrem de fato de terceiro ou de ação da própria vítima.” “O nexo de causalidade é fator de fundamental importância para a atribuição de responsabilidade civil do Estado. O exame supérfluo e apressado de fatos causadores de danos a indivíduos tem levado alguns intérpretes à equivocada conclusão de responsabilidade civil do Estado. Para que se tenha uma análise absolutamente consentânea com o mandamento constitucional, é necessário que se verifique se realmente houve um fato administrativo (ou seja, um fato imputável à Administração), o dano da vítima e a certeza de que o dano proveio efetivamente daquele fato. Essa é a razão por que os estudiosos têm consignado, com inteira dose de acerto, que “a responsabilidade objetiva fixada pelo texto constitucional exige, como requisito para que o Estado responda pelo dano que lhe for imputado, a fixação do nexo causal entre o dano produzido e a atividade funcional desempenhada pelo agente estatal’’.’’ Pg 819 2. ÔNUS DA PROVA: INVERSÃO “A questão relativa à prova leva, primeiramente, em conta a defesa do Estado na ação movida pelo lesado. Diante dos pressupostos da responsabilidade objetiva, ao Estado só cabe defender-se provando a inexistência do fato administrativo, a inexistência de dano ou a ausência do nexo causal entre o fato e o dano.” Pg 820 3. PARTICIPAÇÃO DO LESADO “O fato de ser o Estado sujeito à teoria da responsabilidade objetiva não vai ao extremo de lhe ser atribuído o dever de reparação de prejuízos em razão de tudo o que acontece no meio social. É essa a razão do repúdio à denominada teoria do risco integral, que, como já vimos, é injusta, absurda e inadmissível no direito moderno.” “Se o lesado em nada contribuiu para o dano que lhe causou a conduta estatal, é apenas o Estado que deve ser civilmente responsável e obrigado a reparar o dano.” “Se, ao contrário, o lesado, juntamente com a conduta estatal, participou do resultado danoso, não seria justo que o Poder Público arcasse sozinho com a reparação dos prejuízos. Nesse caso, a indenização devida pelo Estado deverá sofrer redução proporcional à extensão da conduta do lesado que também contribuiu para o resultado danoso. Desse modo, se Estado e lesado contribuíram por metade para a ocorrência do dano, a indenização devida por aquele deve atingir apenas a metade dos prejuízos sofridos, arcando o lesado com a outra metade. É a aplicação do sistema da compensação das culpas no direito privado. Exemplo interessante foi o de acidente de trânsito em que dois veículos colidiram em cruzamento por força de defeito no semáforo: provado que ambos trafegavam com excesso de velocidade, contribuindo para o resultado danoso, foi-lhes assegurada indenização do Poder Público apenas pela metade dos danos.” Pg 823 4. FATOS IMPREVISÍVEIS “São fatos imprevisíveis aqueles eventos que constituem o que a doutrina tem denominado de força maior e de caso fortuito. Não distinguiremos, porém, essas categorias, visto que há grande divergência doutrinária na caracterização de cada um dos eventos. Alguns autores entendem que a força maior é o acontecimento originário da vontade do homem, como é o caso da greve, por exemplo, sendo o caso fortuito o evento produzido pela natureza, como os terremotos, as tempestades, os raios e trovões. Outros dão caracterização exatamente contrária, considerando força maior os eventos naturais e caso fortuito os de alguma forma imputáveis ao homem. Há, ainda, quem considere caso fortuito um acidente que não exime a responsabilidade do Estado.” Pg 825 “Em certas circunstâncias, a situação decorrente de danos provocados por fatos de terceiros assemelha-se à relativa aos fatos imprevisíveis no que concerne à análise da responsabilidade civil da Administração. Sem que se possa imputar atuação omissiva direta ao Estado, não há como responsabilizá-lo civilmente por atos de terceiros. Somente mediante a constatação de que a omissão foi a responsável conjunta pela ocorrência do dano é que se pode atribuir a responsabilidade estatal. É o caso, lamentavelmente frequente, de furtos e assaltos à mão armada em transportes coletivos ou na via pública. Sem a prova da culpa, não há como responsabilizar a empresa concessionária de transporte, já que ela própria assume a condição de lesada juntamente com os passageiros. Nesse sentido se têm pronunciado os Tribunais. 50 É justo reconhecer que opiniões em sentido contrário se justificam em razão do cansaço da sociedade pelo alto grau de violência que tem assolado as grandes cidades. Semelhante visão, porém, funda-se em argumento de ordem emocional, que, por isso mesmo, resulta dissociado da verdadeira análise jurídica.” 5. ATOS DE MULTIDÕES “Não é incomum que os indivíduos sofram prejuízos em razão de atos danosos praticados por agrupamentos de pessoas. Nas sociedades de massa atuais se torna cada vez mais comum que multidões dirijam sua fúria destruidora a bens particulares, normalmente quando pretendem evidenciar algum protesto contra situações especiais. Em todo o mundo ocorrem esses movimentos, ora de estudantes contra a polícia, ora da população contra o Estado, ora de delinquentes contra o indivíduo. Sabemos que, nos agrupamentos de pessoas, o indivíduo perde muito dos parâmetros que demarcam seus valores morais e sociais, deixando-se levar pela caudalosa corrente do grupo e agindo, dentro do grupo, como não o faria individualmente. Daí ser reconhecida hoje a chamada psicologia das multidões.” Pg 826 6. DANOS DE OBRA PÚBLICA “A questão da responsabilidade do Estado oriunda de danos provocados por obras públicas tem apresentado alguma controvérsia entre os estudiosos e nas decisões judiciais. Entretanto, parece-nos que se pode estabelecer um sistema lógico para o assunto, procurando distinguir as várias hipóteses que o tema encerra.” “A primeira hipótese é aquela em que o dano é provocado pelo só fato da obra. Por alguma razão natural ou imprevisível, e sem que tenha havido culpa de alguém, a obra pública causa dano ao particular. Se tal ocorrer, dar-se-á a responsabilidade objetiva do Estado, independentemente de quem esteja executando a obra, eis que presentes todos os pressupostos para sua configuração. 54 Ainda que não se possa caracterizar de ilícita a atividade estatal, a responsabilidade decorre da própria teoria do risco administrativo.” Pg 827 “Uma segunda hipótese pressupõe que o Estado tenha cometido a execução da obra a um empreiteiro através de contrato administrativo, e que o dano tenha sido provocado exclusivamente por culpa do executor. A solução será a de atribuir- se ao empreiteiro a responsabilidade subjetiva comum de direito privado, sabido que cumpre o contrato sob sua conta e risco. A ação deve ser movida, no caso, somente contra o empreiteiro, sem participação do Estado no processo. A responsabilidade do Estado é subsidiária, isto é, só estará configurada se o executor não lograr reparar os prejuízos que causou ao prejudicado.” 7. CONDUTAS OMISSIVAS “O Estado causa danos a particulares por ação ou por omissão. Quando o fato administrativo é comissivo, podem os danos ser gerados por conduta culposa ou não. A responsabilidade objetiva do Estado se dará pela presença dos seus pressupostos – o fato administrativo, o dano e o nexo causal.” Pg 829 “A consequência, dessa maneira, reside em que a responsabilidade civil do Estado, no caso de conduta omissiva, só se desenhará quando presentes estiverem os elementosque caracterizam a culpa. A culpa origina-se, na espécie, do descumprimento do dever legal, atribuído ao Poder Público, de impedir a consumação do dano. Resulta, por conseguinte, que, nas omissões estatais, a teoria da responsabilidade objetiva não tem perfeita aplicabilidade, como ocorre nas condutas comissivas.” Pg 830 “Uma das hipóteses que, sem qualquer dúvida, evidenciam culpa em conduta omissiva da Administração é a que resulta de descumprimento de ordem judicial. Na verdade, nem deveria ocorrer essa omissão, mas infelizmente aqui e ali alguns administradores relutam em atender a determinações judiciais. Quando não a descumprem, retardam o seu cumprimento, o que também revela omissão quanto a dever concreto de agir. Nesses casos, o lesado tem direito a ser indenizado pela Administração omissa. 64 Além da responsabilidade civil, é possível ainda, dependendo das circunstâncias do caso, que os agentes responsáveis pela omissão sejam responsabilizados funcional e criminalmente. “ “Outra hipótese reside na omissão do Estado, quando devida e comprovadamente advertido da possibilidade de ocorrer o fato causador dos danos. Mesmo que o fato provenha de terceiros, o certo é que conduta diligente do Estado poderia ter impedido a sua ocorrência. Aqui a responsabilidade civil do Estado pela omissão é concreta, não podendo fugir à obrigação de reparar os danos. Exemplo: professora recebeu ameaças de agressão por parte de aluno e, mais de uma vez, avisou a direção da escola, que ficou omissa; tendo-se consumado as agressões, tem o Poder Público responsabilidade por sua omissão.” Pg 830 8. RESPONSABILIDADE PRIMÁRIA E SUBSIDIÁRIA “Nem sempre, entretanto, a responsabilidade do Estado será primária. Como já vimos anteriormente, há muitas pessoas jurídicas que exercem sua atividade como efeito da relação jurídica que as vincula ao Poder Público, podendo ser variados os títulos jurídicos que fixam essa vinculação. Estão vinculadas ao Estado as pessoas de sua Administração Indireta, as pessoas prestadoras de serviços públicos por delegação negocial (concessionários e permissionários de serviços públicos) e também aquelas empresas que executam obras e serviços públicos por força de contratos administrativos.” Pg 831 V. Atos Legislativos 1. REGRA GERAL “A função de legislar constitui uma das atividades estruturais do Estado moderno, senão a mais relevante, tendo em conta que consubstancia a própria criação do direito (ius novum). Além do mais, a função legislativa transcende à mera materialização das leis para alcançar o status que espelha o exercício da soberania estatal, vale dizer, da autodeterminação dos Estados com vistas à instituição das normas que eles próprios entendem necessárias à disciplina social.” Pg 832 “Cumpre reconhecer, entretanto, que moderna doutrina tem reconhecido, em situações excepcionais, a obrigação do Estado de indenizar, ainda que a lei produza um dano jurídico lícito. Isso ocorre particularmente quando a lei atinge direitos de determinado grupo de indivíduos (p. ex.: o de propriedade), à custa de algum outro benefício conferido a um universo maior de destinatários. Trata-se aqui de dano lícito indenizável, sujeito, no entanto, a que seja (a) economicamente mensurável, (b) especial e (c) anormal. 75 De qualquer modo, sempre será necessária certa precaução no que tange à análise de tais situações, em ordem a evitar que lei contrária a meros interesses possa gerar pretensões reparatórias despidas de fundamento jurídico.” Pg 833 2. LEIS INCONSTITUCIONAIS [...] “é plenamente admissível que, se o dano surge em decorrência de lei inconstitucional, a qual evidentemente reflete atuação indevida do órgão legislativo, não pode o Estado simplesmente eximir-se da obrigação de repará-lo, porque nessa hipótese configurada estará a sua responsabilidade civil. 76 Como já acentuou autorizada doutrina, a noção de lei inconstitucional corresponde à de ato ilícito, provocando o dever de ressarcir os danos patrimoniais dele decorrentes.” [...] “Em primeiro lugar, a responsabilidade só se consuma se o ato legislativo efetivamente produziu danos ao particular, pois que frequentemente a inconstitucionalidade da lei em nada afeta a órbita jurídica patrimonial das pessoas. Depois, é preciso que a lei tenha sido declarada inconstitucional, visto que milita em seu favor a presunção de constitucionalidade, presunção esta desmentida apenas quando o órgão judiciário expressamente proclamar a inconstitucionalidade. 78 Por último, não há confundir o dano proveniente da lei inconstitucional ou aquele derivado de ato praticado com base na lei inconstitucional. Em ambos os casos, o Estado será civilmente responsável, mas no primeiro é a lei em si que provoca o dano, ao passo que no segundo é o ato praticado com base na lei; assim, a inconstitucionalidade lá é causa direta da responsabilidade, enquanto que aqui é causa indireta” Pg 834 3. LEIS DE EFEITOS CONCRETOS “Leis de efeitos concretos são aquelas que se apresentam como leis sob o aspecto formal, mas que, materialmente, constituem meros atos administrativos. Para que surjam, seguem todo o processo legislativo adotado para as leis em geral. Não irradiam, todavia, efeitos gerais, abstratos e impessoais como as verdadeiras leis, mas, ao contrário, atingem a esfera jurídica de indivíduos determinados, razão por que pode dizer-se que são concretos os seus efeitos.” pg 834 4. OMISSÃO LEGISLATIVA “Pensamos, todavia, que a evolução da responsabilidade civil estatal deve avançar mais e conduzir a solução mais rigorosa e menos condescendente com as omissões do Estado. Se é certo que inexiste, como regra, prazo certo para o exercício da função legislativa, não menos certo é que o reconhecimento da mora no caso de expressa previsão constitucional quanto ao prazo para legislar deve implicar, por sua própria natureza, a responsabilidade civil do Estado e o dever de indenizar, uma vez que tal inação reflete inaceitável abuso de poder. Na verdade, é desnecessária decisão judicial que figure como condição dessa responsabilidade. 83 A indevida leniência com os abusos estatais não ajuda em nada e, ao revés, contribui para a perpetuação desse tipo de inconstitucionalidade.” Pg 836 VI. Atos Judiciais 1. ATOS ADMINISTRATIVOS E JURISDICIONAIS “As expressões atos judiciais e atos judiciários suscitam algumas dúvidas quanto a seu sentido. Como regra, tem-se empregado a primeira expressão como indicando os atos jurisdicionais do juiz (aqueles relativos ao exercício específico da função do juiz). Atos judiciários é expressão que tem sido normalmente reservada aos atos administrativos de apoio praticados no Judiciário. Para o tema da responsabilidade civil do Estado, é preciso distinguir a natureza dos atos oriundos do Poder Judiciário.” “Os atos jurisdicionais, já antecipamos, são aqueles praticados pelos magistrados no exercício da respectiva função. São, afinal, os atos processuais caracterizadores da função jurisdicional, como os despachos, as decisões interlocutórias e as sentenças. Em relação a tais atos é que surgem vários aspectos a serem considerados.” Pg 837 2. CONDUTAS DOLOSAS “Há hipóteses, embora não muito comuns, em que o juiz pratica ato jurisdicional com o intuito deliberado de causar prejuízo à parte ou a terceiro. No caso, a conduta é dolosa e revela, sem dúvida, violação a dever funcional, como estatuído na Lei Orgânica da Magistratura.” “Para a compatibilização da norma do Códigode Processo Civil com a Constituição, forçoso será reconhecer que o prejudicado pelo ato jurisdicional doloso terá a alternativa de propor a ação indenizatória contra o Estado ou contra o próprio juiz responsável pelo dano, ou, ainda, contra ambos, o que é admissível porque o autor terá que provar, de qualquer forma, que a conduta judicial foi consumada de forma dolosa” Pg 838 3. CONDUTAS CULPOSAS “O ato jurisdicional causador do dano pode, entretanto, ter sido praticado de forma culposa. É o caso, por exemplo, em que o juiz profere sentença de modo negligente, sem ter apreciado devidamente as provas produzidas no processo.” “Como regra, já se viu, os atos jurisdicionais decorrentes de conduta culposa do juiz na área cível não ensejavam a responsabilidade civil do Estado, pois que afinal teria o interessado os mecanismos recursais com vistas a evitar o dano. No entanto, o texto que está no art. 5 o , LXXV, da CF dá margem a dúvidas, visto que se limita a mencionar o condenado por erro judiciário, sem especificar que tipo de condenação, cível ou criminal. Apesar da dúvida que suscita, entendemos que o legislador constituinte pretendeu guindar à esfera constitucional a norma legal anteriormente contida no Código de Processo Penal, sem, todavia, estender essa responsabilidade a atos de natureza cível. Em nosso entendimento, portanto, se um ato culposo do juiz, de natureza cível, possibilita a ocorrência de danos à parte, deve ela valer-se dos instrumentos recursais e administrativos para evitá- los, sendo inviável a responsabilização civil do Estado por fatos desse tipo. A não ser assim, os juízes perderiam em muito a independência e a imparcialidade, bem como permaneceriam sempre com a insegurança de que atos judiciais de seu convencimento pudessem vir a ser considerados resultantes de culpa em sua conduta.” Pg 839 VII. Reparação do Dano 1. A INDENIZAÇÃO “A indenização é o montante pecuniário que traduz a reparação do dano. Corresponde à compensação pelos prejuízos oriundos do ato lesivo.” “A indenização devida ao lesado deve ser a mais ampla possível, de modo que seja corretamente reconstituído seu patrimônio ofendido pelo ato lesivo. Deve equivaler ao que o prejudicado perdeu, incluindo-se aí as despesas que foi obrigado a fazer, e ao que deixou de ganhar. Quando for o caso, devem ser acrescidos ao montante indenizatório os juros de mora e a atualização monetária. Tendo havido morte, incide a regra do art. 948 do Código Civil, que fixa os fatores suscetíveis de serem indenizados. 91 Por outro lado, ocorrendo lesões corporais ou redução de capacidade de trabalho, aplicam-se os arts. 949 e 950 do mesmo Código.” Pg 840 2. MEIOS DE REPARAÇÃO DO DANO “Na via administrativa, o lesado pode formular seu pedido indenizatório ao órgão competente da pessoa jurídica civilmente responsável, formando- se, então, processo administrativo no qual poderão manifestar-se os interessados, produzir-se provas e chegar-se a um resultado final sobre o pedido. Se houver acordo quanto ao montante indenizatório, é viável que o pagamento se faça de uma só vez ou parceladamente, tudo de acordo com a autocomposição das partes interessadas.” Pg 841 . 3. PRESCRIÇÃO “O direito do lesado à reparação dos prejuízos tem natureza pessoal e obrigacional. Como ocorre com os direitos subjetivos em geral, não podem eles ser objeto da inércia de seu titular, sob pena do surgimento da prescrição da ação que tenha por fim a tutela desses direitos.” Pg 841 “O vigente Código Civil, no entanto, introduziu várias alterações na disciplina da prescrição, algumas de inegável importância. Uma delas diz respeito ao prazo genérico da prescrição, que passou de vinte (específica para direitos pessoais) para dez anos (art. 205). Outra é a que fixa o prazo de três anos para a prescrição da pretensão de reparação civil. 92 Vale dizer: se alguém sofre dano por ato ilícito de terceiro, deve exercer a pretensão reparatória (ou indenizatória) no prazo de três anos, pena de ficar prescrita e não poder mais ser deflagrada.” Pg 842 4. SUJEITO PASSIVO DA LIDE “De início, não há qualquer dúvida de que a pessoa jurídica de direito público ou a de direito privado prestadora de serviço público têm idoneidade para figurar no polo passivo do processo. Terão, portanto, a condição de rés, porque a elas é imputada a responsabilidade civil e a obrigação de reparar o dano.” Pg 842 “O entendimento configura-se como notoriamente restritivo: não se compadece com o amplo direito de ação assegurado aos administrados em geral e deixa em situação cômoda o agente que efetivamente perpetrou o dano. Por outro lado, não vislumbramos no ordenamento jurídico fundamento para a blindagem do agente causador do dano em virtude da possibilidade de ser ajuizada ação em face do Estado. Semelhante pensamento, portanto, é antagônico ao sistema de garantias outorgado pela Constituição.” Pg 843 “istrado no exercício da função jurisdicional, a ação indenizatória deve ser ajuizada somente em face da respectiva pessoa de direito público, e não diretamente em face do magistrado, e isso porque este se caracteriza como agente político do Estado, não se podendo, na hipótese, vislumbrar responsabilidade concorrente, mas apenas a que eventualmente venha a decorrer do exercício do direito de regresso. 102 A despeito de ter havido divergências entre os órgãos das várias instâncias judiciais no assunto, parece-nos acertada a solução alvitrada, tendo em vista, realmente, a especificidade da natureza da atividade jurisdicional. Tratando-se, no entanto, de ato meramente administrativo, entendemos que a ação pode ser endereçada diretamente ao juiz, tal como ocorre com os demais agentes administrativos.” Pg 844 5. DENUNCIAÇÃO À LIDE “No que concerne especificamente à ação indenizatória contra o Estado, a divergência persiste mesmo diante do art. 125, II, do vigente CPC. Na visão de muitos especialistas, não é cabível a denunciação. O primeiro fundamento consiste em que tais disposições do CPC concernem ao regime de responsabilidade civil no campo privado, mas não à responsabilidade civil do Estado, que tem previsão própria na Constituição (art. 37, § 6º). A relação entre o lesado e o Estado escora-se na responsabilidade objetiva, ao passo que o vínculo regressivo entre o Estado e seu agente funda-se na responsabilidade subjetiva. São, portanto, diversos os elementos da causa de pedir relativamente às pretensões do lesado (originária) e do Estado (regressiva). Acresce, ainda, um fundamento de ordem lógica: a ser admitida a denunciação do servidor à lide, poderia haver gravame ao lesado, já que, em muitos casos, teria ele que aguardar o desfecho (costumeiramente demorado) do litígio entre o Estado e seu servidor, baseado na culpa civil, quando a Constituição o beneficiou com pretensão que, em razão da responsabilidade objetiva, independe da discussão desse elemento subjetivo. Essa é, a nosso ver, a melhor doutrina a respeito do assunto.” Pg 845 “Aliás, o intuito de proteção ao hipossuficiente em relações jurídicas de caráter indenizatório foi o mesmo adotado pelo Código de Defesa do Consumidor, que, na relação de regresso, exige processo indenizatório autônomo, vedando expressamente a denunciação à lide. Nas hipóteses em que o comerciante é solidariamente responsável com o fabricante, construtor, produtor ou importador, o consumidor pode demandar qualquer deles e, para nãoser prejudicado, a lei impõe que aquele que pagar a indenização deve exercer seu direito de regresso contra o outro responsável em ação diversa da ajuizada originariamente pelo consumidor.” Pg 845 VIII. O Direito de Regresso 1. SENTIDO “É importante lembrar que no tema da responsabilidade civil do Estado existem duas relações jurídicas diversas – uma que liga o lesado ao Estado e outra que vincula o Estado a seu agente. Esta última relação é que consubstancia o direito de regresso do Estado, estando prevista na parte final do art. 37, § 6 o , da Constituição Federal.” 2. MEIOS DE SOLUÇÃO “Na via administrativa, o pagamento da indenização pelo agente será sempre resultado de acordo entre as partes. Ao Estado é vedado estabelecer qualquer regra administrativa que obrigue o agente, manu militari, a pagar o débito. É ilegal, por exemplo, qualquer norma que autorize o Estado a descontar, por sua exclusiva iniciativa e sem qualquer barreira de contenção, parcelas indenizatórias dos vencimentos do servidor. O Estado é um credor como qualquer outro nesse caso e não dispõe de privilégio nesse sentido. Somente será legítimo o desconto em folha se: (1 o ) houver anuência expressa do servidor; (2 o ) houver previsão em lei, com fixação de percentual máximo de desconto, observado o princípio da razoabilidade; 111 e (3 o ) for assegurado ao servidor, nesta última hipótese, o contraditório e a ampla defesa.” Pg847 3. CAUSA DE PEDIR “A causa de pedir da ação a ser ajuizada pelo Estado, por conseguinte, consiste na existência do fato danoso, causado por culpa do agente, e na responsabilidade subjetiva deste. Sendo assim, cabe ao Estado, autor da ação, o ônus de provar a culpa do agente, como estabelece o art. 373, I, do CPC.” 4. INTERESSE DE AGIR “O interesse de agir reside na utilidade que tem o titular do direito material de recorrer ao Judiciário para fazer valer sua pretensão.” “Cada pessoa estatal regulamentará a forma pela qual seus procuradores devem providenciar a propositura da ação de indenização no exercício do direito de regresso. Em alguma legislação, todavia, encontra-se norma que assina a seus procuradores determinado prazo para propor a ação, contado do trânsito em julgado da sentença condenatória.” “Em contrário, todavia, já se pronunciou o STJ, decidindo, após entender cabível a denunciação à lide do servidor, que não é necessário o deslinde da ação indenizatória contra o Estado para que este venha a exercer seu direito de regresso contra o seu agente. 114 Para nós, soa estranho esse entendimento: tal possibilidade renderia ensejo até mesmo a enriquecimento sem causa em favor do Estado, visto que poderia ele receber a indenização de seu servidor sem ter pago anteriormente nem vir a pagar no futuro qualquer indenização ao lesado e, em consequência, sem sofrer qualquer lesão patrimonial que pudesse amparar o pedido indenizatório regressivo.” 5. PRESCRIÇÃO “Segundo dispõe o art. 37, § 5 o , da CF, cabe à lei fixar os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, que provoquem prejuízos ao erário, ressalvando, contudo, “as respectivas ações de ressarcimento”.” “Primeiramente, deve registrar-se que o STF decidiu, de início, que a imprescritibilidade abrangeria apenas a ação que vise ao ressarcimento de prejuízos causados por atos danosos de improbidade administrativa. 117 Posteriormente, exigiu que tais atos terão que ser praticados com dolo. 118 Diante de tal premissa, podem ser alcançados agentes públicos ou não, e terceiros, desde que o ato seja previsto nos arts. 9º a 11, da Lei nº 8.429/1992, a Lei de Improbidade Administrativa. Entretanto, se o caso é de ilícito civil, a ação é prescritível, aplicando-se o art. 206, § 3º, V, do Código Civil, que fixa o prazo de três anos. A regra, pois, é a prescritibilidade da pretensão ressarcitória em nome da segurança jurídica” “Por último, cabe relembrar que a norma se aplica somente no caso dos efeitos danosos (prejuízos) advindos das condutas ilícitas de natureza civil. Quer dizer: outras pretensões do Estado decorrentes de responsabilidade civil do agente, que não tenham cunho ressarcitório pela ausência de prejuízos, não estão incluídas na garantia da imprescritibilidade.” Pg849
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