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Todos os direitos reservados
Copyright © 2021 by AllBook Editora.
Direção Editorial: Beatriz Soares
Preparação e Revisão: Clara Taveira
Raphael Pelosi Pellegrini
Projeto Gráfico
Diagramação
Produção Digital:
Cristiane Saavedra
Saavedra Edições
Modelo da capa: Sahib Faber
Capa: Barbara Dameto
Todos os direitos reservados e protegidos pela lei 9.610 de 19/02/1998. Nenhuma parte deste
livro, sem autorização prévia por escrito da editora, poderá ser reproduzida ou transmitida
sejam quais forem os meios empregados: eletrônicos, mecânicos, fotográficos, gravação ou
quaisquer outros. Os direitos morais do autor foram declarados.
Esta obra literária é ficção. Qualquer nome, lugares, personagens e incidentes são produto da
imaginação do autor. Qualquer semelhança com pessoas reais, vivas ou mortas, eventos ou
estabelecimentos é mera coincidência.
Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa
(Decreto Legislativo nº 54, de 1995)
CIP - BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DA LIVROS, RJ
MERI GLEICE RODRIGUES DE SOUZA – B IBLIOTECÁRIA – CRB -7/6439
G613i
1.ed
Gomes, Eduarda
Indecente [recurso eletrônico] / Eduarda Gomes. - 1. ed. - Rio de Janeiro : Allbook, 2021.
Modo de acesso: word wide web
ISBN: 978-65-86624-38-0 (recurso eletrônico)
1. Romance brasileiro. I. Título.
CDD 869.3
CDU: 82-31(81)
DIREITOS CEDIDOS PARA ESTA EDIÇÃO À ALLBOOK EDITORA
https://www.saavedraedicoes.com.br/
contato@allbookeditora.com
HTTPS://ALLBOOKEDITORA.COM
https://www.allbookeditora.com/
 
RIDE
SoMo
FIRST
SoMo
SKIN
Rihanna
ONE
Ed Sheeran
SUGAR
Maroon 5
ROCKET 
Beyoncé
DIAMONDS
Rihanna
IS IT A CRIME
Sade
SUFFER
Charlie Puth
DOWNTOWN
Anitta, J Balvin
UNCONDITIONALLY
Katy Perry
LOVE FACE
Trey Songz
STRONGEST
Ina Wroldsen
PORN STAR
August Alsina
SEX THERAPY
Robin Thicke
CLOSE
Nick Jonas, Tove Lo
MANIAC
Michael Sembello
SLOW MOTION
Trey Songz
SEX WITH ME
Rihanna
SAY IT FIRST
Sam Smith
LLEGASTE TÚ
CNCO, Prince Royce
DEIXA ACONTECER
Grupo Revelação
YOU CAN BUY EVERYTHING
SoMo
MAR DE SÁBANAS
Jaime Kohen
WICKED GAMES
The Weeknd
CRAZY IN LOVE (REMIX)
Beyoncé
ONDE ANDA VOCÊ
Tiago Nacarato
FALLING LIKE THE STARS
James Arthur
YOU GIVE LOVE A BAD NAME
Bon Jovi
DANCE LIKE WE’RE MAKING LOVE
Ciara
ALL THE MAN THAT I NEED
Whitney Houston
BUTTONS
The Pussycat Dolls, Snoop Dog
REFRÃO DE BOLERO
Engenheiros do Hawaii
ROCKABYE
Clean Bandit, Sean Paulo, Anne-Marie
LOVE SEX MAGIC
Ciara feat. Justin Timberlake
JAI HO!
The Pussycat Dolls, A.R. Rahman
GET ON YOUR KNEES
Nicki Minaj, Ariana Grande
SUMÁRIO
CAPA
FOLHA DE ROSTO
CRÉDITOS
PLAYLIST
PRÓLOGO
Ayla
CAPÍTULO 1
Edgar
Ayla
CAPÍTULO 2
Edgar
Ayla
CAPÍTULO 3
Edgar
Ayla
CAPÍTULO 4
Edgar
Ayla
CAPÍTULO 5
Edgar
Ayla
CAPÍTULO 6
kindle:embed:000B?mime=image/jpg
Edgar
Ayla
CAPÍTULO 7
Edgar
Ayla
CAPÍTULO 8
Edgar
Ayla
CAPÍTULO 9
Edgar
Ayla
CAPÍTULO 10
Edgar
Ayla
CAPÍTULO 11
Edgar
Ayla
CAPÍTULO 12
Edgar
Ayla
CAPÍTULO 13
Edgar
Ayla
CAPÍTULO 14
Edgar
Ayla
CAPÍTULO 15
Edgar
Ayla
CAPÍTULO 16
Edgar
Ayla
CAPÍTULO 17
Edgar
Ayla
CAPÍTULO 18
Edgar
Ayla
CAPÍTULO 19
Edgar
Ayla
CAPÍTULO 20
Edgar
Ayla
CAPÍTULO 21
Edgar
Ayla
CAPÍTULO 22
Edgar
Ayla
CAPÍTULO 23
Edgar
Ayla
CAPÍTULO 24
Edgar
Ayla
CAPÍTULO 25
Edgar
Ayla
CAPÍTULO 26
Edgar
Ayla
CAPÍTULO 27
Edgar
Ayla
CAPÍTULO 28
Edgar
Ayla
EPÍLOGO
Edgar
Ayla
AGRADECIMENTOS
ALLBOOK EDITORA
“Você vai crescer e ter uma vida boa
Eu vou fazer o que eu tenho qu e fazer”
ROCKABYE – CLEAN BANDIT, SEAN PAUL, ANNE-MARIE
Dias antes
Ayla
ACARICIO OS CABELOS DO ANTÔNIO, O ÚNICO Q UE ME FAZ LEVANTAR da cama todos os dias e buscar
ganhar o mundo. Sorrio enquanto leio o livro do Pinóquio para ele pela
terceira noite seguida, já decorando quase todas as falas. Mudo meu tom de
voz em cada uma delas, e isso o diverte, o que me consola muito.
— Fim — digo, dirigindo o meu olhar a ele.
Seus olhinhos brilham na penumbra que o abajur da sua mesa de cabeceira
cria no ambiente. Puxo o cobertor do Batman, cubro Antônio e beijo sua
testa.
— Boa noite, meu filho.
— Vai trabalhar, mamãe...? — sussurra.
— Sim. — Sorrio. — Sua tia vai ficar lá na sala enquanto eu não chego,
como todos os dias. Agora durma, você tem aula amanhã.
Fecho o livro, deixando sobre a mesa de cabeceira, e deixo que Antônio
descanse. O vejo fechar os olhinhos brilhantes e se aconchegar embaixo do
cobertor, aquecendo também o meu coração.
— Nunca vou poder pagar o que você está fazendo — digo à minha irmã,
parada na porta do quarto.
— Não se preocupa... A gente mora na mesma casa, não é nada de mais
ficar de olho no meu sobrinho enquanto ele dorme.
Balanço a cabeça, me afastando e indo pegar a mochila a fim de sair para
o trabalho. Minha irmã me acompanha até a porta principal do pe-
queno apartamento.
— Tome cuidado, Ayla.
— Não se preocupa, Ana... Vou me virar. — Comprimo os lábios. — Me
ligue se algo acontecer.
— Ele vai ficar bem.
Dou as costas e me dirijo ao elevador, ouvindo a porta ser fechada atrás
de mim. Hoje começarei o turno estendido, preciso de dinheiro para manter
meu filho na escola e pagar o aluguel do apartamento. Depois que aquele
cafajeste sumiu do mapa, eu preciso me virar para que a criança não precise
de nada dele.
Quando as portas do elevador se abrem, o meu celular começa a vibrar na
bolsa, atraindo minha atenção. Entro rapidamente e aperto o botão, e
somente depois procuro o aparelho. Ao ver o nome do Régis na tela, hesito
em atender, mas o faço logo em seguida; pode ser algo importante.
— Régis.
— Será que a minha mais nova ex-garçonete está perto de chegar? O
bar está lotando por causa da sua estreia.
— Oh, meu Deus! — exclamo. — Estou muito nervosa, não sei se vou
conseguir.
— Para de frescura, menina. — Ele ri. — Você ensaiou exatamente
como eu ensinei?
— Claro que sim, apesar de achar aquilo muito ousado.
— É sensual, eletrizante... Vai deixar os marmanjos babando por você,
sem nunca ser perturbada por eles. Nem vão ver o seu rosto.
— De qualquer forma, já estou deixando o prédio, chego aí em vinte
minutos.
Encerro a ligação e volto a guardar o celular na bolsa. Corro para sair da
recepção e abrir o portão enferrujado. De longe, vejo meu ônibus parar no
sinal e me apresso em direção ao ponto mais próximo do prédio.
No caminho até lá, não consigo deixar de pensar no que me aguarda esta
noite. Régis me viu dançar enquanto recolhia as coisas das mesas, depois
que o bar havia fechado, e me propôs ser a nova atração. Eu não terei de me
expor além do necessário, e isso é o que realmente me fez aceitar esse
trabalho.
Entro pelos fundos do bar e já escuto a música alta tocar. Cumprimento
todos ao cruzar a cozinha revestida em cerâmicas brancas e balcões em
metal. Ao chegar no corredor, abro a porta, onde vejo “camarim” escrito, e
paro ao ver Régis.
— Minha deusa chegou. — Ele sorri, acenando para que eu me aproxime.
— Venha, vamos te arrumar.
Largo a bolsa em uma cadeira e me aproximo da penteadeira luminosa,
repleta de maquiagem, pentes, secadores, aparelhos de babyliss e grampos
de cabelo. Encaro o reflexo do corselete preto, transparente, no espelho.
Estou prestes a entrar em pânico e largar tudo isso.
— Aquele projetor não vai falhar, não é? — pergunto, encarando o meu
amigo pelo espelho.
Ele abre um sorriso, inclinando o corpo e colando a bochecha na minha e
me olhando através do espelho.
— Deusa, eu estarei lá para que seu segredo não seja revelado. — Toca
levemente o meu queixo. — Seu lindo rostinho não será visto.
Respiro fundo e aceno levemente com a cabeça. Só aí Régis alcança o
secador de cabelo e começa a me preparar para a estreia. Fecho os olhos,
me concentrando e acalmando a respiração. Vou conseguir fazer isso, pelo
meu filho.
Visto as meias pretas e o corselete com a ajuda de Régis, que continua me
dizendo o quanto estou deslumbrante no traje. Por fim, ele pinta os meus
lábios de vermelho-vivo e decreta que estou pronta. O pequeno ato faz meu
coração disparar dentro do peito. É agora, não hámais como fugir. Deixo o
camarim com ele, que me relembra as instruções dadas ontem, enquanto
passamos por um corredor mal iluminado que nos leva direto aos degraus do
palco.
— Espere aqui, querida — diz ele. — Vou anunciar você.
Aceno levemente com a cabeça, jogando os cabelos para o lado em
seguida. Agora não há mais volta.
Atualmente
Edgar
DECLARO A REUNIÃO ENCERRADA E FICO DE PÉ, EMPURRANDO a cadeira metálica para trás e
aguardando que todos os funcionários se retirem da sala de reuniões e abram
a concessionária. Olho, pela janela panorâmica da sala, no primeiro andar, a
rua movimentada.
Solto um longo suspiro, volto à grande mesa marfim e recolho os papéis
que me foram entregues. Abotoo o paletó e cruzo a sala revestida em
madeira, com detalhes claros e muito bem iluminada pela luz do dia. Deixo o
local em direção à minha sala, um pouco mais adiante no corredor.
Sigo diretamente até a minha mesa, também na cor marfim,
impecavelmente arrumada. Sento na cadeira, de costas para a janela
panorâmica, passo as mãos nos cabelos e coloco os papéis sobre a mesa.
Apoio o cotovelo no braço da cadeira de metal, e o dedo indicador vaga
pelo queixo, mexendo na barba por fazer, pensando no novo investimento nas
ações que tenho desde a época da faculdade. Elas fizeram com que a nossa
fortuna aumentasse um pouco desde que o meu pai me presenteou com elas.
Fez o mesmo com minha irmã.
— No que tanto pensa, irmão?
Ergo o olhar e vejo minha irmã, quatro anos mais velha, entrar na sala,
elegante como sempre, balançando os cabelos loiros tingidos. Sorrio e ergo
o corpo da cadeira para lhe receber. Helena se equilibra em saltos finos e
traz um pacote de compras na mão.
— Tenho alguns problemas a resolver, nada de mais — respondo,
buscando decifrar o motivo de sua visita. — De onde vem?
— Fui ao shopping encontrar algumas amigas e, bom... comprei algo para
você.
Franzo o cenho, surpreso ao ver que ela me estende o pacote.
— Para mim?
— Sim, achei a sua cara... Pegue.
Faço o que ela me pede e me concentro em abrir a bolsa de papel preto
com o emblema dourado de uma loja. Retiro uma caixa enquanto sorrio para
a minha irmã, desconfiado, antes de abrir e revelar um relógio prateado
muito elegante.
— Obrigado, Helena — digo, sem desviar o olhar da bela peça. —
Realmente gostei. Obrigado.
— Sabia que gostaria. — Dá de ombros. — Mas isso era somente um
pretexto para ver você... Temos nos visto tão pouco ultimamente...
— Tenho andado ocupado fazendo isto aqui girar desde que o nosso pai se
foi.
Helena não trabalha, depende exclusivamente do dinheiro gerado pela
concessionária, que também é sua, já que é igualmente herdeira. Tomo todas
as decisões aqui dentro, cuido de cada detalhe para não perdermos nenhum
cliente sequer. Ela só vem à empresa quando realmente precisa de dinheiro
ou quando sua mente meticulosa pretende fazer algo.
— Sinto falta do meu irmãozinho.
— Você não sente minha falta, Helena. — Sorrio. — Diga de uma vez o
que quer.
— Que bom que me conhece tão bem, ó poderoso Edgar Montenegro. —
Ergue uma sobrancelha, cruzando os braços. — Quero saber por que fui
notificada da redução da minha parte na empresa.
Bingo.
Helena nunca se preocupou com o bem-estar de ninguém, exceto o seu
próprio. A única coisa que a preocupou na morte do nosso pai foi saber que
eu faria da sua vida um inferno.
— E ainda pergunta? — Cruzo os braços. — Quem não trabalha, não tem
direitos... Fui misericordioso deixando um cartão à sua disposição.
Raivosa, ela se aproxima de mim, pensando que me causa algum tipo de
medo. Mantenho os braços cruzados, inabalável.
— Eu tenho tanto direito quanto você a tudo isso.
— Não vou sustentar mais nenhum dos seus luxos, Helena. — Bato na
mesa. — Ou você vem e trabalha como qualquer pessoa, ou eu reduzirei
ainda mais o seu poder sobre a empresa.
— Você não pode fazer isso! — berra.
— Sim, eu posso. — Sorrio. — Nosso pai deixou bem claro e registrado
antes de morrer. Helena Montenegro, você está nas minhas mãos.
— Mentiroso.
Dou de ombros e, calmamente, sigo até o cofre que fica entre os livros da
estante próxima à porta. Não via a hora de poder colocar em ação as coisas
que meu pai deixou encaminhadas. Se nem ele mesmo aguentava a filha
sanguessuga, por que eu deveria? Ele sabia o que se passaria quando
morresse, e isso o fez deixar alguns papéis, passando para mim mais uma
boa porcentagem da empresa se ela se recusasse a trabalhar. A esta altura,
ela tem somente quarenta por cento, e é por isso que está tão raivosa.
Digito a senha rapidamente, me certificando de que Helena não está por
perto, e abro a porta de metal do cofre embutido na parede. Retiro uma pasta
com o logotipo da concessionária e volto a sorrir, me aproximando dela.
Minha irmã toma de mim a pasta, a abrindo em seguida e lendo o conteúdo.
Seu olhar de ódio só se intensifica a cada linha. Ela não pode perder toda
a participação, mas papai soube fazer tudo muito bem. Espero calmamente
enquanto ela processa todas as coisas que está lendo.
— Você e o papai... dois conspiradores!
— E você, primogênita, uma sanguessuga. — Tomo a pasta das suas mãos.
— Se acostume com a ideia e volte a trabalhar, não vou facilitar sua vida.
— Odeio você.
Fico em silêncio, assistindo minha irmã raivosa deixar a sala. Não
deixarei essa mulher fútil acabar com todo o esforço de anos do nosso pai, e
ele também estava disposto a não deixar que isso acontecesse. Helena nunca
foi um exemplo de irmã, sempre tinha gestos cruéis comigo por eu ser mais
novo e ter mais atenção.
Quando cresci, deixei a casa e comprei o meu apartamento, me livrei de
sua convivência tóxica, manipuladora e fútil. Ela só consegue pensar no
próprio umbigo, assim procura tirar proveito de todas as situações que
puder. Nem parece ser filha do nosso pai.
Volto a guardar a pasta dentro do cofre, travo e arrumo os livros que
afastei do lugar. Respiro fundo algumas vezes antes de retornar à mesa,
guardar o presente que recebi e terminar de avaliar as planilhas. Todavia
não consigo sequer voltar a ler porque Joaquim irrompe à porta.
— Edgar, vim te convidar para um lugar incrível. — Ele, além de meu
amigo, é o gerente da loja.
— Que romântico — comento.
— Olha aqui, seu filho da puta ranzinza. — Ele ri, sentando na cadeira
diante de mim. — Vou relevar seu mau humor porque sua irmã é um pé no
saco e porque o lugar é mesmo muito bom.
— Estou ouvindo.
— Conheci um bar, tem uma apresentação de uma gata maravilhosa. —
Recosta na cadeira. — E muito misteriosa.
— Não frequento cabarés, prefiro selecionar melhor antes.
Joaquim revira os olhos, cruzando os braços.
— Mas quem disse que é um cabaré? A moça não se vende, ela apenas se
apresenta e não mostra o rosto.
Agora ele conseguiu ter a minha total atenção.
— Está bem, vou conhecer esse lugar e essa “gata maravilhosa”.
— À noite, depois do expediente. — Fica de pé e coloca um cartão de
visita sobre os meus papéis. — Aí está o cartão, se quiser verificar as redes
sociais.
Meu amigo arruma a camisa e se afasta em direção à porta, deixando
minha sala em seguida. Desço o olhar para o cartão preto, com detalhes
brilhantes em vermelho. Analiso rapidamente os dados no pequeno cartão e
alcanço meu celular. Digito o nome do usuário estampado no verso do
pedaço de papel e espero a página carregar. Desço pelas fotos de drinques
diferenciados e placas em neon e me detenho na publicação em que há a
silhueta de uma mulher contra diversas luzes que parecem emanar de um
projetor. Amplio a foto com os dedos, analisando a “gata maravilhosa” que
Joaquim falou.
— Deve ser você — digo, olhando fixamente a bela imagem diante de
mim.
Desperto do meu transe quando lembro que preciso voltar a analisar as
planilhas. Saio da rede social e retomo o trabalho, agora estou realmente
curioso para conhecer este bar.
Ayla
Desligo a boca do fogão, me aproximando rapidamente da pia para lavar
as mãos. A van escolar já deve estar chegando com Antônio. Solto os
cabelos rapidamente e arrumo minha blusa e o short. Pego as chaves do
apartamentoe saio para ir buscar meu filho lá embaixo.
Ao chegar ao térreo, cumprimento o porteiro gentil do turno da manhã e já
vejo o carro parar na rua. Eu me aproximo, ajudo o meu filho a descer e
agradeço ao motorista, que sorri em resposta. Pego na mão de Antônio a fim
de voltar ao prédio e alimentar o esfomeado.
— Como foi a escola hoje? — pergunto.
— Aprendi muitas coisas novas.
— Isso é ótimo, é bom lembrar de tudo quando formos fazer a lição mais
tarde.
O menino abre um sorriso nervoso, me mostrando que vai me dar um
pouco de trabalho. Enquanto espero a subida do elevador, lembro do dia em
que descobri que estava grávida daquele homem infeliz. Foi um baque na
minha vida. Precisei desistir da faculdade, por ser muito nova e não ter
apoio de ninguém além da minha irmã. Mas não me arrependo de nada,
somente de o pai do Antônio ser um canalha.
Quando as portas metálicas do elevador se abrem, seguro sua mão
novamente, e saímos juntos em direção ao nosso pequeno lar. Abro a porta, e
isso faz meu filho correr imediatamente para o seu quarto.
— Lembre-se de lavar as mãos e não deixar a farda jogada no chão —
digo. — Dobre.
— Sim, mamãe.
Deixo a chave sobre o móvel da televisão depois de trancar a porta e sigo
em direção à cozinha, começando a servir o nosso almoço.
— Querido, venha — chamo. — A comida vai esfriar.
Dentro de instantes, ele me obedece, vindo somente de cueca até a mesa.
Coloco o prato diante dele, que lambe os lábios antes de pegar o garfo e
atacar a comida. Sirvo um prato para mim e me junto a ele.
— Mamãe, eu sonhei que o meu papai vinha me ver. — Dá uma garfada na
comida.
Ergo o olhar em sua direção e fico em silêncio por alguns instantes. Eu
nunca fiz a cabeça do meu filho contra o pai, ele sempre soube a verdade, e
eu o deixo falar nele sempre que tem vontade. Lúcio não quis assumir o
menino, sua intenção era me enganar e levar o pouco dinheiro que eu tinha
juntado para o nosso casamento. Na certidão do meu Antônio não há o nome
do pai, e meu filho sabe que aquele miserável foi embora.
— Talvez ele venha mesmo algum dia, Toninho — digo, tentando não
mostrar meu incômodo.
— Você fica triste quando falo dele, mamãe?
— Não, meu anjo... Você nunca me deixa triste. — Aliso seus cabelos,
idênticos aos meus. — Vamos, coma antes que fique frio.
Meu filho me obedece, um pouco desconfiado, e eu volto a sorrir,
torcendo que esqueça esse assunto. Odeio falar sobre Lúcio porque sempre
lembro de tudo o que me fez, de todas as coisas que eu vi e ouvi. Mas nada
disso tem importância mais, o que importa é o bem-estar do Antônio.
Desde que o meu filho nasceu, seis anos atrás, eu não tive mais tempo
para pensar na minha vida amorosa ou em alguma forma de consertar meu
coração quebrado. Nunca dei oportunidade a homens outra vez, nenhum
deles. Todos que tentaram aproximação, fiz questão de afastar.
Depois do almoço, lavo a louça, e Antônio faz questão de me ajudar com
o que pode, para que eu possa ajudá-lo com as lições de casa em seguida.
Dou boas risadas com ele, mas logo assumo meu lado mãe séria quando ele
faz manha com os deveres de casa. Observo atentamente enquanto escreve
cada palavra, me sentindo orgulhosa do seu avanço.
— Mãe, quando eu terminar aqui, assiste televisão um pouquinho comigo?
— pede.
— Está bem. — Olho para ele. — O que vamos assistir?
— Carros!
— De novo? — Sorrio.
— Sim! Eu amo esse filme!
— Ok. Vamos assistir.
A tarde com o Antônio foi maravilhosa, depois que o ajudei com as
tarefas, assistimos a alguns desenhos que ele gosta e brincamos juntos.
Agora estou penteando meus cabelos para poder ir ao trabalho, não posso
me atrasar. Ana, minha irmã, aparece na porta do meu quarto, e eu a olho
através do espelho perto da cama.
— Como foi o dia de trabalho hoje? — pergunto. — Chegou calada e foi
direto para o quarto.
— Exaustivo. — Cruza os braços. — Tivemos uma reunião com o dono da
concessionária antes de abrir a loja hoje.
— Algum problema?
— Não, só a irmã mimada do homem, que estava usando alguns recursos
da empresa, e isso acarretou alguns problemas... Ele é um bom patrão, mas
ela só pensa em como pode tirar vantagem do fato de ser uma herdeira da
empresa.
— Não entendo gente rica — brinco. — Sempre há algo errado com eles.
— Ainda bem que a bomba não é minha irmã... Aquela mulher vai destruir
a empresa se continuar dessa maneira.
Coloco o pente no móvel ao lado do espelho, giro o corpo e pego a bolsa
sobre a cama. Chego perto de minha irmã, a abraço rapidamente e passo por
ela, saindo do quarto. Ao abrir devagar a porta do quarto do meu filho, o
vejo dormindo.
— Vá tranquila — diz Ana quando fecho a porta. — Cuidarei dele.
— Obrigada.
Saio apressada rumo ao ônibus que me levará ao trabalho. Fico feliz que a
ideia do Régis quanto ao SKIN tenha dado certo, tanto para mim quanto para
ele. Agora tenho uma remuneração um pouco maior, e ele tem mais clientes
no bar, portanto estou conseguindo dormir mais aliviada quanto às contas
que temos e às dívidas que Lúcio deixou.
Edgar
MERDA.
Não sei por que inventei de acompanhar Joaquim até este bar, eu só queria
ir para casa depois de um dia fodido de trabalho na loja. Ao adentrar no
ambiente escuro, observei os quadros em neon pelas paredes e as mesas
confortavelmente organizadas. Nós nos sentamos a uma mesa um pouco
afastada do palco, mas que tem uma boa visão.
Imagens são projetadas no palco, e eu deduzo que a apresentação da tal
“gata maravilhosa” esteja prestes a começar. Joaquim me garantiu que ela é
boa, e eu acho bom que seja mesmo, não quero perder uma noite por nada.
Uma música, com batidas lentas e sensuais, começa e faz o bar inteiro
silenciar.
Estreito o olhar e me atento fixamente ao palco, onde surge uma bela
mulher ondulando o corpo no ritmo da música. Noto seus cabelos longos e
castanhos soltos e o corselete — a meu ver, o tipo de lingerie mais sexy que
existe. Há um sofá no meio do palco, atrás dela.
Entreabro a boca quando ela rebola um pouco travada enquanto desliza as
mãos pelas próprias curvas. Em seguida dá as costas e caminha até o sofá. A
mulher senta, e, logo em seguida, deita-se e arqueia o corpo de maneira
provocante enquanto encara a plateia. Não consigo distinguir seu rosto, já
que ela dança sob as imagens do projetor.
— Ela realmente nunca mostra o rosto? — pergunto, interessado.
— Não.
Observo seu corpo se movendo no sofá, dançando, sensualizando, e sua
maestria na arte de seduzir. Ela é divina. Eu a vejo sentar, fazendo um
movimento circular com o pescoço e jogando os longos cabelos para trás.
Em um impulso ardente, levanto, decidido a ir até ela. Ouço o meu amigo
protestar, mas não dou atenção, preciso sentir essa provocação de perto.
Subo no palco determinado a contemplar a deusa de perto, mas ela faz um
sinal. Nesse momento o projetor é apagado junto com as luzes do palco,
deixando o bar apenas com as luzes das placas em neon espalhadas pelas
paredes. Paro de andar, pensando que ela vai mandar parar a música, mas a
mulher não o faz.
Somente assim retomo minha aproximação. Ela continua dançando, de pé
desta vez, facilitando um pouco para mim, mesmo com o palco na penumbra.
Eu me coloco atrás dela, segurando firmemente em sua cintura, e a
acompanho em sua dança completamente sensual.
— Diga-me o seu nome — peço.
Uma risada de mulher safada emana de seus lábios. Mesmo com a música,
eu a ouço nitidamente. Inspiro o seu cheiro adocicado fechando os olhos,
louco para senti-la melhor. Lentamente, ondulando os quadris, a mulher sai
da minha frente e inverte a posição, passando as mãos atrevidas pelas
minhas costas.
— Me chame de Sereia — sussurra. — É o que pode saber sobre mim.
Deliciosa. Como deve ser gostoso ouvir seus gemidos.
— Agora sente ali — ordena, apontando o sofá.
Obedeço sem demora, ansioso para saber o que ela quer fazer comigo.
Abro bem as pernas quando a moça se aproxima vagarosamente, e não ouso
tirar o olhar da sua linda silhueta na penumbra. Entreabro os lábios,
assistindo, enquanto ela monta no meu colo, fazendo o meu pau pulsar.
Não tenhotempo de fixar o olhar em seu rosto, uma luz é acesa em cima
de nós, em um lugar estratégico, para que me ofusque e eu não a veja como
quero. Porra.
— Encontre-me fora daqui — insisto, evitando tocá-la.
Em resposta, a Sereia rebola, silenciosa, e eu a vejo curvar o corpo e
colar sua bochecha na minha.
— Você é capaz de me satisfazer? — pergunta.
— No que quiser, Sereia.
Sem responder, ela volta a erguer o corpo, a fim de manter a postura ereta
sobre mim, enquanto dança no meu colo.
— Gosto da sua ousadia...
— Posso assegurar que vai gostar muito mais se aceitar sair comigo daqui
hoje — digo, notando que a música chega ao final.
— Não. — Para de se mover e se afasta cuidadosamente. — Me encontre.
Sua frase fica no ar, e eu não tenho tempo de perguntar como ou onde, a
mulher simplesmente caminha até os fundos do palco e some por uma porta.
A plateia aplaude, e eu resolvo ficar de pé e seguir a Sereia, o seu perfume
ainda nítido nas minhas narinas. Sigo em sua direção, mas sou impedido de
passar por uma mão dura no meu peito.
— Não pode passar daqui — diz o segurança.
“Me encontre.”
— Eu só preciso falar com...
— Não vai rolar. — O sujeito me empurra. — Volte para a sua mesa,
agora.
— Tire a porra das mãos de mim, entendeu?
Antes que eu possa empurrar o segurança, meu amigo me puxa e me
arrasta de volta à mesa.
— Está louco? — pergunta. — É só uma dançarina, porra... O que ela te
disse provavelmente diz para todo mundo que ousa subir lá.
— Me solta.
Joaquim obedece, mas nega com a cabeça, sem entender o que deu em
mim. O pior é que nem eu entendo.
— Ela dança aqui todos os dias?
— Sim — diz ele. — O que ela te disse que te deixou desse jeito?
— Me mandou encontrá-la... Eu quero encontrá-la.
— Ninguém aqui viu essa mulher, Edgar. — Ele sorri. — Ela brincou com
você, esqueça isso, amigo.
— Eu a reconhecerei... Se eu a ouvir novamente, a reconhecerei. — Bufo.
— Voltarei amanhã, estou decidido.
— Seja lá qual for o feitiço que ela jogou em você, foi dos bons.
— Vamos pedir uma bebida. — Aceno a uma garçonete alta e loira.
Volto a sentar à mesa depois de fazer o pedido e vejo um homem
agradecer à plateia pela noite de hoje. Ele nos pede que esperemos para ver
mais do espetáculo e nos convida a ver mais amanhã. Com certeza voltarei
para vê-la outra vez.
Ayla
Entro no camarim ainda trêmula devido a ousadia do homem de subir ao
palco. E da minha também, por dançar para ele e me deixar levar por seu
corpo. Suas mãos seguraram com firmeza a minha cintura, como se eu
pertencesse a ele. Eu quis aquilo, seu belo rosto está gravado na minha
memória.
Apesar de o palco estar escuro quando nos falamos, eu o vi se
aproximando, e ele tem uma beleza impressionante. Sentar naquele colo e
sentir seus músculos duros sob a roupa me fizeram aquecer de uma maneira
que há muito não acontecia. Balanço a cabeça, querendo me livrar da
sensação que me toma. Ele deve ser casado e estar em busca de sexo fácil.
— Ayla! — Patrícia entra no camarim, e eu já posso imaginar do que se
trata. — Quem era aquele? Vocês pareciam bem íntimos no palco.
— Não o conheço.
Viro em sua direção, preocupada.
— Não sabe?
Balanço a cabeça, negando rapidamente em resposta. Ela ergue as
sobrancelhas, cruzando os braços.
— E pedi que me encontrasse... — murmuro.
— Que safada! — Ela ri. — Pensei que fossem conhecidos, pela forma
que se deram bem. Mas que é um gostoso, isso ele é.
— Engraçadinha, você sabe que dançar aqui é um segredo nosso e do
Régis... Não quero ser reconhecida por isso, só quero ter uma renda melhor.
— Bufo, retirando o bracelete. — Anda, me ajuda, ainda tenho que voltar lá
e dançar outras músicas.
— Vai mesmo deixar aquele maravilhoso passar?
— Provavelmente é casado, como o último que tentou subir no palco e
conseguir algo. Não vai rolar. — Dou de ombros.
Visto minhas roupas por cima do corselete que usei na apresentação de
hoje e amarro os cabelos em um rabo de cavalo. Paty está me esperando,
mas de cara feia, porque vou desperdiçar aquele pedaço de mau caminho.
Sento diante da penteadeira e começo retirar a maquiagem, ignorando o
protesto silencioso da minha amiga. Assim que pego o algodão e molho com
o demaquilante, a porta é aberta por Régis. Olho seu rosto pelo espelho sem
me abalar.
— Mas o que diabos foi aquilo com aquele gostoso, dona Ayla de
Oliveira? — pergunta, colocando as mãos na cintura. — Estou com calor até
agora só de ver a encoxada que aquele homem deu em você.
— Você também? — Sorrio. — Paty está com a mesma coisa... É todo de
vocês, estou fugindo de tudo que possa me trazer mais problemas.
— Ah, e você não está toda quente? Engraçadinha... Se ele não tivesse
causado alguma coisa, você não teria dançado no colo dele. O homem está
louco lá fora.
Mantenho o sorriso no rosto e não respondo à ousadia do meu amigo. A
palavra homem é um problema por si só, e homem bonito, cheiroso e gostoso
é um quarteto de problemas, não vou conseguir lidar.
Por fim, fico de pé a fim de deixar o camarim, preciso sair pela cozinha a
fim de não correr o risco de ser reconhecida. Escuto Régis me chamar e
paro, esperando meu amigo se aproximar.
— Vou dar uma carona a vocês, não gosto ver as duas correndo perigo
saindo daqui de madrugada.
— Hoje vou aceitar, estou exausta. — Sorrio. — Vou esperar lá fora.
— Tá bom, minha deusa, só vou buscar minhas coisas.
— Não posso aceitar, vou dormir na casa do meu amado hoje... É caminho
oposto ao de vocês. — Paty dá de ombros, sorrindo. — Beijos e até amanhã.
Cumprimento os funcionários da cozinha e saio pela porta de serviço,
cruzando os braços ao sentir frio quando chego na calçada. Eu me aproximo
do carro de Régis e apoio a lombar, o aguardando. Olho para o lado e avisto
o homem que subiu ao palco se aproximar vagarosamente dentro de um
carro.
Engulo em seco, confirmando quão bonito ele realmente é. Dirijo meu
olhar para a frente, rezando que ele não pare e me pergunte nada. Será que
vai mesmo levar o meu pedido a sério? Oh, merda! Falei demais na hora da
adrenalina e agora vou ter de lidar com isso. Vejo Régis sair e sorrir
enquanto caminha na minha direção. Olho por sobre o ombro e noto que o
carro está parando.
— Régis, me beije.
— O quê? — Franze o cenho. — Enlouqueceu a essa hora? Sabe quantos
anos faz que beijei uma mulher?
— Me beije agora! — Faço pressão.
Mesmo sem entender, meu amigo me puxa pela cintura e me beija de forma
intensa. Passo os braços por seu pescoço, ficando na ponta dos pés para ter
um melhor acesso ao seu beijo gostoso. Quando ouço o carro acelerar e se
afastar, solto Régis, que me olha sem entender.
— Mas que porra foi essa?
— Desculpe — peço, pensando em algo a dizer. — Eu senti medo daquele
carro que passou aqui.
Régis olha em direção ao automóvel já distante e logo depois se volta 
para mim.
— Viu como pode ser perigoso? — diz ele. — Vamos.
— Vamos. — Sorrio. — Você beija muito bem.
— Você pare com isso, sua safada, vai acabar se apaixonando pela minha
bela pessoa.
Assinto, ainda com um sorriso no rosto, e abro a porta do carro logo
depois de ouvir que foi destravada. Não sabia que aquele homem levaria
algo simples tão a sério, e o pior de tudo é que fiquei mexida quando senti
seu toque duro contra a minha cintura. Como isso pôde acontecer? Eu nunca
o vi na vida.
Sigo o caminho todo em silêncio, sentindo o corpo exausto e desejando
apenas a minha cama. Olho Régis, completamente sério dirigindo, e sorrio,
pensando no beijaço que trocamos na saída do bar. Trabalho com ele desde
que saí da licença-maternidade e fui demitida do buffet onde trabalhava. Ele
e Paty sempre me ajudaram com tudo que precisei. Antes de começar a
dançar, eu era garçonete no SKIN, e sou imensamente grata a ele por ter me
empregado e confiado em mim.
— Tá rindo do que, sua palhaça?
— Da loucura que você aceitou fazer comigo. — Cruzo os braços. —
Obrigada.
— Que nada. — Ele sorri também. — Por você e pela Paty, eu faço
qualquer coisa, você sabe disso.
Ele estaciona o carro diante do meu prédio, eu o abraço rapidamente, me
despedindo, e saio doveículo. Entro no edifício, cumprimento o porteiro do
turno da noite e sigo em direção ao elevador. Meu corpo está implorando
por um pouco de descanso, mas ao olhar o relógio, lembro que tenho
algumas coisas a fazer.
— Farei o almoço e, quando estiver pronto, acordarei o Antônio, em
seguida o organizo para ir à escola — enumero, organizando minhas tarefas.
— Somente depois disso vou dormir a manhã toda.
Entro em casa, retiro os sapatos e sigo diretamente até a cozinha, a fim de
retirar algumas coisas da geladeira e preparar o almoço. O cansaço me
domina de uma forma quase incontrolável, mas me mantenho firme e fazendo
o mínimo de barulho possível, porque a minha irmã acorda cedo. Ana
trabalha como vendedora em uma concessionária há algum tempo e
recentemente foi promovida e passou a ganhar um pouco mais. Seu salário
ajuda muito com as despesas da casa e com as contas que o canalha do Lúcio
deixou no meu nome.
Não sei como pude ser tão burra a ponto de me apaixonar por aquele
infeliz. Eu confiava tanto nele, parecíamos realmente um casal feliz,
tínhamos planos juntos. Tudo mudou quando eu descobri que estava grávida
e resolvi contar a ele. Foi assim que descobri que estava sendo traída. Eu
era jovem e inexperiente demais, acreditei naquele amor, minha inocência
não viu maldade nele. Lúcio foi embora dois dias depois da descoberta da
gravidez, simplesmente sumiu do mapa, alegando que não poderia assumir a
criança.
Hoje eu agradeço a ele por ter me dado o meu pequeno.
Quando termino de preparar tudo, noto os raios de sol entrando pela
pequena janela da cozinha. Olho o relógio na parede e solto um suspiro,
exausta.
— Você ainda está acordada? — A voz da minha irmã me assusta.
Vejo sua imensa cara de sono, e sorrio.
— Deixando tudo pronto para descansar um pouco mais — justifico. — E
quero ver a carinha de sono do Antônio quando acorda.
— Tá bom. — Ela sorri também. — Tenha um bom descanso.
— E você tenha um bom trabalho.
Beijo o seu rosto e sigo até o quarto de Antônio, preciso acordá-lo e
ajudar com o banho, a farda e o café da manhã. Em seguida, finalmente
deitarei na minha cama e dormir.
Edgar
ABRO A PÁGINA DA REDE SOCIAL DO BAR DA NOITE PASSADA, mas não há nenhuma pista que possa me
revelar quem é a bela mulher que me mandou encontrá-la. Estou à beira da
loucura desde que ela me disse aquilo, levei suas palavras a sério. Quero e
vou encontrar aquela sereia, e o seu encanto será meu por pelo menos uma
noite.
Abro a foto da apresentação de ontem, a imagem projetada na mulher, o
seu corpo arqueado com elegância no sofá... extremamente sexy. Respiro
profundamente, lembrando do seu aroma delicioso.
— Com licença, senhor Montenegro. — A chefe do departamento de
vendas me tira dos pensamentos.
— Entre, Ana — digo. — Aconteceu algo?
— Desculpe interromper, senhor. — Ela se aproxima da minha mesa
sutilmente. — É que há um cliente lá embaixo requisitando a sua presença.
— Onde está o Joaquim?
— Está resolvendo o problema das peças que faltaram para a manutenção
dos clientes.
— Está bem. — Fico de pé, abotoando o paletó, e guardo o celular no
bolso lateral da calça em seguida. — Vamos.
Ana assente levemente, e eu aceno para que siga na minha frente. Ela
sempre foi a vendedora mais dedicada da concessionária, nunca olhou de
forma diferente para mim, como algumas outras fazem. É uma mulher
competente e extremamente profissional, por isso foi promovida há alguns
dias a chefe de departamento.
Detesto a ideia de me envolver com pessoas do meu trabalho, não é certo
e muito menos ético, isso pode soar como vantagem. Minha concessionária é
séria e tem muitos anos no mercado, não posso me dar ao luxo de colocar
prazer no meio do trabalho.
Desde que me divorciei de Penélope, há dois anos, não tive interesse em
passar por mais nenhum relacionamento. O que vivi com ela foi bom, fomos
felizes, mas passou. Fui precipitado em me casar, o meu pai a adorava, e foi
isso que me fez tomar a decisão. Nosso divórcio foi uma bomba para ele,
mas estávamos bem com isso.
Sigo em direção às escadas, com Ana, e desço rapidamente ao notar que
um casal olha especialmente uma das nossas motos mais potentes e mais
caras. Abro um sorriso e me aproximo do casal, que notam a minha chegada
no mesmo instante.
— Em que posso ajudá-los? — pergunto.
— Estamos aqui por essa beleza — diz o homem.
— É uma bela escolha. Já sabem de todas as qualidades do veículo?
Envolvo os dois em uma conversa agradável, já que desejaram ser
atendidos exclusivamente por mim. Explico um pouco mais sobre a potência,
o conforto e a qualidade do produto que estão escolhendo, para que não haja
dúvidas de que estão investindo no veículo e no lugar certo.
O casal fica tão interessado, que fecha de cara o negócio. Eu os deixo sob
a responsabilidade de Ana, a mais competente da categoria, quando vejo
minha irmã entrar na loja retirando os óculos escuros. Eu me aproximo dela,
que exibe sua cara de nojo habitual.
— Passei muito tempo pensando nas condições que você me deu.
— Que o nosso pai estabeleceu — corrijo. — Não se esqueça disso.
— Que seja — resmunga. — Não me resta outra opção a não ser vir para
cá. Satisfeito?
— Não pense que a ideia de ter que conviver com você aqui dentro me
agrada, Helena... Eu sou o responsável por essa empresa, não vou deixar que
acabe pelas suas mãos.
Minha irmã revira os olhos.
— Não vim aqui brigar, querido irmão, vim realizar o desejo do papai.
Engulo minha vontade de dar uma boa resposta e sorrio ao notar que os
clientes estão atentos. Estendo o braço para que Helena siga na minha frente
e suba as escadas primeiro.
— Vamos conversar na minha sala.
Eu me despeço dos clientes e os agradeço antes de seguir com Helena
pelas escadas. No caminho, fecho os olhos, tentando me acalmar e não dizer
nada que possa se virar contra mim depois. Minha irmã é uma das pessoas
mais ardilosas e vitimistas que já conheci, então não vou permitir que saia
ganhando dessa vez.
Sigo diretamente até minha sala e deixo que Helena entre primeiro,
concentrando todas as minhas forças em me manter calmo. Não vou perder a
linha por causa dela, eu ainda preciso investigar aquela bela dançarina.
— Então, querido irmãozinho, estou aqui... Onde é a minha sala?
— Sua sala? — Sorrio.
— O que esse sorriso quer dizer, Edgar?
— Você não tem uma sala, Helena. — Retiro o paletó, me mantendo
apenas com a camisa social e o colete. — Terá somente quando se adaptar e
aprender tudo o que precisa saber.
— O quê?
— Você ficará na sala com o Joaquim, lá embaixo, aprendendo o básico
da concessionária.
— Está fazendo isso de propósito, Edgar? — Aponta o dedo para mim.
Seguro firme seu pulso e afasto o dedo do meu rosto. Não permitirei que
Helena se sinta no direito de fazer o que quer dentro desta empresa.
— Você vai aprender o que precisa para trabalhar aqui, como todo mundo,
isso não está em discussão. — Passo a mão nos cabelos depois de soltar seu
braço. — Não me provoque.
— Ou o quê? Vai me bater? — Ela abre um sorriso. — Farei da sua vida
aqui dentro um inferno, Edgar, você não perde por esperar.
— Vamos ver quem faz a de quem um inferno primeiro, irmã.
Tiro o telefone do gancho e interfono para a sala de Joaquim. Enquanto
espero que ele atenda, encaro minha irmã seriamente e ela faz o mesmo.
Recordo o que Ana disse que ele estaria fazendo e torço que já tenha
terminado.
— Edgar — atende.
— Preciso que venha à minha sala imediatamente.
— Está bem, subo em instantes.
Volto a colocar o telefone no gancho e aponto a cadeira diante da minha
mesa para ela. Sigo até a outra cadeira e ocupo o meu lugar, trocando farpas
silenciosas com minha irmã. Helena sempre fez questão de deixar claro que
nunca gostou de mim, e, com o tempo, eu aprendi a fazer o mesmo. Não
permitirei nunca que acabe com as memórias do nosso pai nesta empresa, sei
que é o seu maior desejo.
Instantes depois, Joaquim bate à porta e entra, aproximando-se da minha
mesa.
— Pois não, Edgar?
— Joaquim, deixarei você encarregado de ensinar a Helena sobre as
coisas mais básicasda concessionária e sobre como funcionamos aqui.
Meu amigo tem um ar de riso, mas logo volta à sua seriedade habitual.
— Como quiser — diz ele. — Cuidarei bem dela. Devemos começar
agora?
— Depois de uma conversa nossa. — Olho Helena. — Pode nos dar
licença um minuto, irmã querida?
A mulher me lança um olhar mortal antes de ficar de pé, pegar a bolsa e
deixar a sala, caminhando sobre os seus saltos. Não se pode negar, ela é
mesmo uma bela mulher, mas o que tem de bonita, tem de podre por dentro.
Tenho pena dos homens que já se apaixonaram por Helena, sei que partiu o
coração de todos por pura maldade.
— Ela não me parece nada contente em trabalhar comigo, Ed.
— Eu sei, teremos trabalho com ela. — Solto um suspiro. — Mas não
poderia deixar que Helena gastasse todo o dinheiro da família, ela precisa
saber de onde vêm os seus luxos.
Joaquim fica em silêncio, apenas me ouvindo.
— Você já foi avisado previamente dos truques da minha irmã, sabe que
ela vai tentar te seduzir e fazer com que ceda aos seus caprichos.
— Sei. — Balança a cabeça. — Não se preocupe.
— Obrigado, Joaquim. — Sorrio. — Ela é toda sua.
Meu amigo sorri de volta, ficando de pé e arrumando a camisa social, e
vira de costas antes de sair. Solto um suspiro quando vejo a porta ser
fechada e recosto na cadeira, sentindo a cabeça fervilhar. Espero que esteja
enganado, mas creio que Helena não vai mesmo me deixar em paz.
Volto ao computador, dando ao meu trabalho a concentração que demanda.
Amanhã um carregamento com novas motos vai chegar, e tudo precisa estar
preparado, o espaço na loja, a segurança e os trâmites fiscais.
Inesperadamente, imagens da dançarina do SKIN voltam, perturbando
minha atenção. Não consigo esquecer sua rebolada firme enquanto dançava
em cima de mim. A imagem que tenho na mente está repleta de fachos de luz
que me impediram de ver o seu rosto, mas não serei capaz de esquecer sua
voz e o seu cheiro adocicado.
O que diabos aquela mulher fez comigo?
Ayla
Deixo Antônio na sala assistindo os seus desenhos animados, depois de
passarmos a tarde juntos. Sigo ao meu quarto e trato de colocar a música Sex
Therapy, do Robin Thicke, a fim de ensaiar uma última vez a coreografia.
Fecho os olhos ao lembrar do belo homem que veio até mim ontem, ele me
deixou com frio na barriga e eu ainda posso senti-lo se fechar os olhos.
Rebolo no ritmo da música, ainda com os olhos fechados, o olhar duro
daquele homem, seu maxilar quadrado e perfeito, a sua voz encantadora e a
sua barba por fazer me deixam ofegante somente por lembrar. Este homem
misterioso exala uma sensualidade sem tamanho, e eu não gostaria de estar
sentindo isso.
Confesso que estou torcendo que o homem vá ao SKIN e me assista outra
vez. Eu me senti estranhamente bem dançando para ele, é como se
tivéssemos uma conexão antiga, mesmo nunca o tendo visto antes.
Sinto o mesmo calor que me tomou quando estava com aquele homem
voltar, uma vontade absurda de ter mais dele. Faço os passos que Régis me
passou, mas ainda com os pensamentos distantes.
Não consigo parar de pensar naquele atrevido indecente.
Ouço o barulho da porta principal do apartamento sendo aberta e vou
verificar, mas vejo o meu menino sentado no sofá. Sorrio e vou receber
minha irmã.
— Hum... Me recebendo na porta? — Ela sorri, entrando no apartamento.
— Pensei que Antônio estivesse tentando sair de novo — explico.
Dou meia-volta, retorno ao quarto e continuo meu breve ensaio antes da
apresentação. Depois de algum tempo, noto a hora avançada e decido
colocar Toninho na cama, para que eu possa sair sem maiores complicações.
Visto o corselete por baixo da calça jeans e da blusa desta vez, quero
conversar um pouco com Régis antes de me apresentar, precisarei de um
pouco de tempo livre.
Eu me despeço da minha irmã e lhe desejo uma boa noite antes de sair do
apartamento com a minha bolsa pendurada no ombro, partindo para mais uma
noite de trabalho. Não demora muito, chego ao SKIN, já que a hora de pico
já passou. Ao entrar no camarim, dou de cara com o Régis organizando tudo.
— Boa noite, deusa. — Toca o meu queixo quando me aproximo. —
Sente-se, que eu vou endeusar você ainda mais.
— Boa noite. — Sorrio levemente. — Régis, podemos conversar um
pouco?
Ele me olha, completamente sério desta vez. Sento na cadeira diante da
penteadeira, e o meu amigo me encara através do espelho.
— Mas é claro, Ayla... diga.
— Eu passei o dia inteiro pensando naquele homem que subiu ao palco 
ontem...
— É mesmo? — Abre um sorrisinho sacana. — E por que está com essa
cara de enterro?
— Porque eu não penso em ninguém dessa maneira há anos, entende? Não
tenho mais tempo para esse tipo de coisa.
— Nem comece com esse seu espírito do século passado, Ayla! — Alisa
os meus cabelos e me faz encarar minha imagem no espelho. — Olhe como
você é linda, é jovem... desimpedida. Pode e deve pensar no próprio prazer,
buscar se satisfazer.
— Não sei mais como se faz essas coisas.
— Sexo? — Ele ri. — Ninguém desaprende essas gostosuras da vida, não,
querida.
— Estou falando sério — digo, prendendo o riso. — Não transo há
tempos.
— Isso vai mudar hoje então. — Pega o pincel e o blush e passa um pouco
nas minhas bochechas. — O bofe magia está aí, aguardando a sua
apresentação.
— O quê?
— É isso mesmo, ele gostou tanto, que voltou... Hoje essa periquita 
levanta voo.
Eu lhe dou um tapa no braço, o que o faz sorrir junto comigo.
— Nada vai levantar voo aqui, eu nem o conheço. — Faço uma pausa. —
Só estou pensando nesse homem mais do que o necessário.
— Isso é o tesão de anos querendo sair da caixinha. Aproveita que o bofe
é lindo e gostoso.
Fico em silêncio, encarando meu reflexo no espelho, pensando no que
Régis acabou de me dizer. Aquele homem é mesmo uma tentação, mesmo
nunca o tendo visto antes, estou pensando nele desde o momento em que
notei sua aproximação.
— E se ele for casado?
— Já verifiquei isso enquanto você estava lá fora... Na verdade, a Paty foi
quem verificou e me passou a informação. — Passa mais um pouco do blush
no meu rosto. — Não vimos nenhuma aliança. Se joga.
O meu amigo faz um sinal pedindo que eu aguarde, virando-se em seguida
em direção à sua bolsa. Através do espelho, o vejo buscar algo, empenhado.
Por fim, ele ergue o corpo, voltar até mim e se posiciona atrás da minha
cadeira.
— Trouxe isso para você hoje. — Estende uma máscara veneziana preta.
— Vai poder contemplar mais do rostinho e corpinho dele.
— Não vale nada mesmo. — Sorrio.
Régis encaixa a máscara no meu rosto com cuidado, prendendo-a por
baixo dos meus cabelos e a fixando bem com grampos de cabelo. Ela cobre
até o meu nariz, deixando meu rosto quase completamente escondido. Logo
em seguida, ele pega um batom vermelho e pinta os meus lábios com cuidado
e precisão.
— Pronto, está uma verdadeira deusa grega. — Toca meu queixo para que
eu o erga. — Agora retire essas roupas e vire uma deusa completa.
Balanço a cabeça, eternamente grata por Régis ter conseguido essa
máscara. Estou eufórica por saber que o homem indecente está aqui outra
vez, quero ter o seu olhar e as suas mãos sobre mim novamente. Fico de pé,
já começando a retirar as minhas roupas, ficando somente com o corselete
preto.
— As meias estão na sua bolsa? — pergunta.
— Estão, vou calçá-las.
— Estou ansioso para ver vocês dois pegando fogo lá fora.
— O que está dizendo, seu depravado? — Sorrio, me dirigindo à minha
bolsa. — Eu disse que não transo há anos, e você me vem com uma dessas.
Régis solta uma risada sincera, me fazendo negar com a cabeça. Visto as
meias também pretas e prendo as ligas do corselete nelas, subo no salto e
contemplo a minha imagem no espelho. Toco a máscara no rosto, querendo
me reconhecer por trás dessa personagem que assumo todas as noites.
— Está pronta, meu bem?
— Sim — respondo, respirando fundo. — Estou.
Penso no olhar duro daquele homem misterioso e sinto minha pele
arrepiar somente por saber que ele estará lá me assistindo. Por fim, sigo com
o Régis para fora da sala, ajustando a meia na coxa.
Ao chegar ao palco, vejoquando ele faz um sinal, e a música eletrônica
para. O rapaz responsável pelo som traz o microfone até ele e me
cumprimenta rapidamente. Respondo com um breve aceno. Fecho os olhos
quando Régis se afasta, vai cruzar as pesadas cortinas vermelhas e começa a
falar, me anunciando.
Quando escuto meu apelido, empurro as cortinas e apareço sob as luzes
do projetor. A música que ensaiei esta tarde começa a ecoar pelo salão, me
levando a fazer a coreografia sensual. Deslizo o olhar por todas as mesas,
buscando desesperadamente encontrar aquele homem.
Eu o vejo sentado em uma mesa próxima ao palco, sozinho. Fixo meu
olhar nele, executando a coreografia e notando que está em uma posição
favorável. Jogo os cabelos para frente e para trás, subindo as mãos pela
minha barriga, seios e pescoço, até alcançar os cabelos pela nuca e guiar os
fios para um lado em seguida.
Tomo coragem, buscando o lado mais ousado dentro de mim, enquanto a
voz sensual e deliciosa do Robin Thicke me incentiva. Eu me aproximo das
escadas dianteiras do palco e as desço devagar, parando em cada degrau e
ondulando o quadril. Tomo o cuidado de permanecer no ritmo da música. O
olhar do homem não desvia do meu um minuto sequer, me devorando.
Desfilo lentamente até parar diante das suas pernas abertas, ao erguer o
olhar em minha direção, noto a surpresa estampada em seus olhos. Estou tão
surpresa quanto ele com a minha ousadia. Suas roupas sociais me fazem
observar todo o seu corpo demarcado enquanto deslizo as mãos pelo meu
corpo, rebolando diante do homem. Ele tensiona os músculos quando toco
em seus ombros e monto em seu colo devagar, mantendo o olhar no seu.
— Sereia.
Sorrio, gostando de ouvir o apelido na sua bela voz grave e compassada.
Inclino o corpo e aproximo a boca de sua orelha, sendo atingida em cheio
pelo delicioso perfume.
— Que bom que veio me encontrar — digo, voltando a erguer o corpo e
continuando rebolando.
Levanto de suas pernas e dou um passo para trás, mas ele segura minha
mão. Ousado.
— Não negaria um pedido tão tentador...
Mordo o lábio inferior, sentindo o corpo aquecer por ter sua atenção
sobre mim. Esse homem atrevido e indecente tem um ímã, meus pensamentos
não conseguem se distanciar dele.
Continuo ali, dançando um pouco afastada dele, mas sem soltar de sua
mão firme e quente. Jogo os cabelos de um lado para o outro, deslizando o
olhar por toda a plateia de homens famintos. Todavia, este, sentado à minha
frente, tem toda a minha atenção. Seu olhar devastador sobre mim faz meu
tesão adormecido há anos, despertar.
A música entra nos seus acordes finais, e eu torno a coreografia mais
lenta, rebolando e jogando os cabelos no ar uma última vez. Quando a
melodia acaba, curvo o corpo para agradecer aos aplausos e toco a máscara
no rosto, ouvindo uma música ambiente começar a tocar. Assim que o meu
olhar encontra o do belo homem outra vez, ele me estende a mão, ficando de
pé.
Vejo o segurança se aproximar ao nosso lado, mas ergo a mão para que se
mantenha distante, quero saber até onde iremos com isso. Estendo a mão,
aceitando a sua, e recebo um sorriso torto de homem safado, completamente
sacana. Minhas pernas ficam bambas assistindo a este pecado ambulante.
— Venha comigo — pede, suplicante.
— Eu ainda vou dançar hoje — digo suavemente. — Não posso sair.
— E como posso ter um momento com você?
— Não estou à venda, senhor... Eu apenas me apresento aqui.
— Edgar... meu nome é Edgar — diz, apressado. — E eu sei que você não
está à venda, mas percebi que está tão interessada quanto eu. Ou não teria
vindo até mim.
Fico em silêncio por alguns instantes, olhando atentamente cada traço de
seu belo rosto enquanto ele espera uma resposta. Aperto sua mão, ainda na
minha. Eu quero ceder, mas não me sinto segura em sair com um
desconhecido.
— Sabe de uma coisa, Sereia? — Ele sorri, me interrompendo quando
abro a boca para lhe responder. — Eu gosto de um bom desafio, e ter esse
mistério diante de mim está me deixando com muito tesão.
— Isso fará você voltar?
— Claro. — Beija o dorso da minha mão. — Sem dúvidas.
— Sereia — Régis chama. — Querida, temos a próxima apresentação
ainda.
— Estou indo. — Olho rapidamente meu amigo e volto a olhar Edgar. —
Preciso voltar a dançar agora.
— Eu estarei bem aqui vendo você.
Edgar solta a minha mão cuidadosamente, e eu sinto o coração disparado
dentro do peito. Viro de costas e acompanho Régis, mas me detenho no
mesmo instante e olho o homem indecente por sobre o ombro.
— Gostei de você — digo.
Ele não me responde, apenas lança um sorriso torto, sacana e passa a mão
na barba por fazer, sexy. As mechas dos seus cabelos sedosos estão
bagunçadas, e algumas caem sobre os olhos. Jamais serei capaz de esquecer
esse belo rosto; o desejo que estou sentindo só cresce.
Por fim, sigo com Régis, vendo Edgar voltar a se sentar à mesa. Solto um
suspiro quando adentro o corredor, seguindo meu amigo. Ao entrarmos no
camarim, ele cruza os braços e me encara, provavelmente esperando que eu
conte tudo o que conversamos.
— E aí? Vai trepar hoje, criatura? Me conta logo, que está me dando uma
síncope já.
— Não sei, Régis.
— Como não sabe? — Franze o cenho. — A boceta não é sua?
— Claro que é. — Dou risada. — Mas estou insegura, não me sinto
pronta.
— Tá bom, minha Sereia. — Ele me abraça. — Vai como você preferir, o
importante é se sentir confortável e gozar bem gostoso.
Balanço a cabeça, sorrindo enquanto me dirijo à penteadeira. Eu quero
isso, estou realmente muito interessada naquele homem de olhar intenso.
Olho a imagem refletida no espelho, o rosto quase inteiramente coberto pela
máscara veneziana.
— Você foi divina na primeira coreografia e...
— Régis, eu quero a sua ajuda — interrompo.
— Para o quê? — Ergue as sobrancelhas.
— Quero deixar aquele homem pensando em mim antes de realmente sair
com ele... Se for mesmo sair com ele... quero que me deseje.
— Bom... — Leva a mão ao queixo lisinho. — Eu tenho uma ideia.
Fico em silêncio, esperando que pense melhor e me diga o que podemos
fazer.
— Você vai presentear esse homem... Vai dar algo a ele, de preferência
perfumado.
— O que eu poderia dar? — pergunto.
Régis olha em volta, pensando um pouco, mas logo sorri ao se dirigir até
sua mochila. Ele vasculha um pouco até encontrar uma fita na cor do meu
corselete.
— Você trouxe o seu perfume?
— Sim. — Viro-me na cadeira. — Está na minha bolsa.
Meu amigo segue até lá, alcança o pequeno vidro e borrifa algumas vezes
no tecido em suas mãos. Depois vem até mim, me faz ficar novamente de
frente para o espelho e amarra a fita na minha cabeça. O laço é dado por
baixo dos meus cabelos, e ele arruma os fios logo em seguida.
— Está linda. — Coloca os meus cabelos sobre os ombros. — Agora vá
lá, dance lindamente e deixe aquele homem maluco com esse presentinho.
— Farei isso.
— Com certeza vai fazer muitas coisas com essa fitinha assim que chegar
em casa. — Ele me dá uma piscadela. — Se é que me entende.
— Oh, Deus. — Dou risada. — Seu safado.
— Vamos, faça o seu melhor naquele palco.
Deixo o camarim ainda rindo das brincadeiras do meu amigo e sigo
diretamente até o palco. Ele gosta de mistérios, e eu estou gostando dessa
tensão que está sendo criada entre nós. Vou aproveitar essa situação e tentar
me abrir outra vez ao sexo, quero voltar a saber o que é sentir prazer. Régis
e Patrícia estão certos, eu preciso voltar a viver, a me divertir.
Quando a música Rocket, da Beyoncé, começa a soar, respiro fundo e
entro em cena, sendo coberta pelas imagens do projetor. Encaro toda a
plateia, evitando o olhar do homem, que disse se chamar Edgar, por
enquanto. Bato as mãos nas coxas e as subo até o meu quadril, rebolo e viro
de costas, parando junto com a breve pausa que a música faz.
A batida firme e sensual retorna, e eu viro a cabeça, pausando novamente,
olhando Edgar por sobre o ombro. Vejo um leve sorriso surgir em seus
lábios enquanto beberica sua dose de uísque. Ele me devora com o olhar.
Trago a mão ao laço da fita embaixo dos meus cabelos e o puxo pela ponta,
o desfazendo. Estendoo tecido diante de mim e seguro a outra ponta.
Passo a fita pelo pescoço, busto e a deslizo por entre os meus seios, sobre
o corselete. Somente depois desço as escadas, ordenando os meus
movimentos com o ritmo da música. Paro diante do palco, rebolando,
ondulando as partes principais do meu corpo.
Giro a cabeça sensualmente, jogando os cabelos para um lado, séria. Em
seguida volto a caminhar até ele, que se prepara para me receber no seu colo
outra vez. Jogo a fita, passando-a por seu pescoço e monto em seu colo,
puxando o tecido e aproximando nossos rostos.
— Meu presente para você, Edgar — sussurro próximo aos seus lábios.
Deixo a fita pendurada nele, mas antes que eu possa me afastar, Edgar
segura firme a minha cintura.
— Diga outra vez... o meu nome. Diga outra vez — pede.
— Edgar — sussurro.
— Porra. Está me provocando tanto.
Sorrio levemente, sem deixar de executar os passos, mesmo sentada nele.
— Quer me tocar?
— Oh, como quero, Sereia. — Faz uma breve pausa. — Quero tanto, que
mal estou me contendo.
Meu corpo está quente, um calor se espalha dentro de mim, e eu sinto
vontade de beijar os seus belos lábios agora mesmo, mas me contenho.
Seguro suas mãos na minha cintura, as deslizo pelas minhas coxas, me
desvencilho levemente.
Arrasto uma cadeira da sua mesa e paro diante do palco, sentando e
abrindo as pernas. Jogo os cabelos, ouvindo elogios da plateia, mas não me
atenho a eles. Fecho as pernas, sentindo a força do tesão me dominar como
nunca. Rebolo na cadeira, deslizando as mãos pelo corpo, imaginando as
mãos daquele homem indecente em mim.
Volto a ficar de pé, dando as costas à plateia, trazendo as mãos ao meu
bumbum e balançando o quadril de um lado a outro. Somente assim volto a
caminhar até Edgar, curiosa, louca por sua reação. Paro diante dele,
curvando o corpo e fazendo uma expressão suplicante antes de cantar:
PUNISH ME, PLEASE
TELL ME WHAT YOU’RE GOING TO DO WITH ALL OF THIS ASS.*
O homem entreabre os lábios, ele está entendendo o que estou cantando.
Edgar segura a fita entre os dedos e logo a leva ao nariz e aspira o cheiro
enquanto me observa fixamente. Solto um beijo para ele antes de me afastar
e passear por entre as mesas, cumprimentando todos os meus expectadores.
Quando a música encerra, volto ao palco e curvo o corpo em
agradecimento enquanto sou aplaudida. Por fim, lanço um longo olhar a
Edgar e saio pelas cortinas, sentindo o coração inquieto no peito. Régis abre
um sorriso quando me vê e assente rapidamente.
— Conseguiu, querida... Ele vai passar não só a noite, mas o dia todo
amanhã pensando em você.
— Acha isso? — pergunto.
— Tenho absoluta certeza, eu vi o jeito que ele estava naquela cadeira,
quase arrancando fora seu corselete.
Sorrio, gostando de ouvir as palavras do meu amigo. Tenho de admitir que
também pensarei nele, não vou conseguir esquecer suas mãos em mim e seu
olhar intenso. Eu o desejo, mesmo sendo um completo desconhecido.
* Me puna, por favor. Me diga o que você vai fazer com toda essa bunda.
Edgar
ENTRO EM MEU APARTAMENTO INTEIRAMENTE DECORADO EM preto e branco. Na sala de estar, as três
paredes claras contrastam com a única escura, que é onde fica a minha
prateleira com livros e a televisão. Deixo as chaves do carro e do
apartamento sobre a mesa de jantar.
Uma porta de vidro e cortinas turvas, na outra extremidade da sala, me
separam do barulho que a cidade ainda faz a esta hora. Ao lado desta porta,
há um balcão em mármore, que divide a sala e a cozinha. Nela há uma
grande janela, por onde entra a luz durante o dia. Neste balcão, há uma
pequena adega instalada, com vinhos importados de diversos lugares e das
melhores marcas. Uma pequena coleção particular.
Caminho calmamente com a fita que recebi presa entre os meus dedos, até
alcançar o tapete que se estende aos pés do sofá. Sento-me nele, sentindo
meu pau reclamar dentro da calça. Não consigo tirar aquela mulher dos meus
pensamentos. Olho a fita que me deu, seu cheiro delicioso emana sutilmente
dali, me lembrando de que não a terei esta noite. Estou tão excitado por toda
essa tensão que estamos criando...
Trago o tecido ao meu nariz, aspirando profundamente, com os olhos
fechados, trazendo de volta à minha mente as imagens dessa mulher
dançando. Seus movimentos sensuais, seu olhar, sua ousadia, a maciez do
seu toque... Tudo naquela mulher me atrai, me deixa com tesão, querendo
despi-la sem qualquer pudor.
“Quer me tocar?”
— Porra — xingo. — Como posso pensar tanto em uma mulher que nunca
realmente vi na vida?
“Me encontre.”
Olho a fita pendurada nos meus dedos e solto um suspiro, jogando a
cabeça para trás no sofá. Sinto todo o cansaço do dia bater forte, e o tesão
acumulado me deixa querendo subir pelas paredes. Decido enrolar com
cuidado o presente delicado que recebi enquanto ergo o corpo.
Sigo em direção à última porta branca, depois de um curto corredor
branco, onde existem três portas. A primeira é o quarto de hóspedes, a
segunda, o banheiro social, e a terceira, o meu quarto. Abro a porta do
cômodo e me dirijo imediatamente à minha cama, forrada com lençóis
pretos. As paredes brancas contrastam com as mesas de cabeceira, o móvel
com a televisão, um aparelho som via Bluetooth e com a poltrona.
Olho através da janela panorâmica do quarto toda a cidade se estendendo
em luzes, construções e um vasto céu nublado. Deixo a fita, já enrolada,
sobre a cama e em seguida coloco a carteira e o celular na mesa de
cabeceira. Retiro o paletó e começo a desabotoar a camisa social sem
pressa alguma enquanto empurro os sapatos com os pés. Depois de me
despir completamente, pego o pequeno presente outra vez e sigo até o
banheiro do quarto, nu. Necessito de um banho relaxante.
Deixo a fita sobre o balcão em mármore da pia, parando para observá-la
por alguns instantes, me negando a crer que uma completa desconhecida, a
qual nunca vi o rosto, está me deixando louco. Entro no boxe, fechando a
porta antes de ligar o chuveiro e deixar que a água morna corra pelo meu
corpo. Olho meu pau e solto um suspiro, cedendo aos comandos do corpo.
Preciso gozar.
Apoio a mão esquerda na parede úmida, curvando um pouco o corpo, e
agarro meu pau com a mão direita. Começo a bater uma lentamente, de olhos
fechados, me imaginando dentro daquela mulher enlouquecedora. Mordo o
lábio inferior, gemendo baixo, pensando apenas em como deve ser deliciosa.
Eu imagino quão deliciosos devem ser os seus gemidos. Sua imagem
cantando aquela maldita música me perturbou profundamente. Ela está
brincando comigo, e eu estou gostando de entrar no seu jogo, irei até onde
for preciso para desvendá-la por completo.
— Sereia — digo entredentes, gemendo.
Aquela dançarina me tirou do eixo, e eu vou encontrá-la, vou realizar seu
pedido, e somente assim vou fodê-la como realmente merece. Toda aquela
provocação tem me deixado fora de mim, preciso de mais dela, e
conseguirei. Vi em seu olhar que também me deseja, também me quer.
Eu me deixo levar pelas imagens que tenho gravadas na mente sem parar
de me masturbar. A sensação de ter o seu rebolado em mim, seu cheiro, a
porra da sua sensualidade... Minhas bolas queimam, e o meu corpo arde em
busca do gozo. Tensiono os músculos, sentindo a pressão aumentar, o que me
faz intensificar os movimentos da mão.
Gemo alto, deixando a deliciosa sensação de alívio tomar o meu corpo, ao
passo que meu pau convulsiona na minha mão, derramando todo o gozo
pacientemente. Deslizo a mão nele mais algumas vezes, me certificando de
que terminei. Ofegante, ergo a cabeça e deixo a água levar embora as
gotículas de suor que se acumularam em meu rosto.
Passo as mãos nos cabelos, controlando a respiração e os pensamentos
sujos que estou tendo. É como se ela realmente fosse uma sereia, encanta
com seus poderes de sedução, atrai para si e depois some... ou mata. Será
essa sereia fatal?
Depois de tomar um bom banho, enxugo o corpo rapidamente e saio nu,
com a toalha no ombro e o pequeno presente nas mãos. Paro diante do
aparelho de som, apertando um botão, conecto o celular e busco pelaSinfonia n.9ª de Beethoven. A música clássica sempre me acompanhou desde
bem pequeno, minha mãe amava, estava sempre ouvindo. Isso, de uma forma
ou outra, me ajuda a tirar todo o estresse do dia.
Deixo o meu presente na mesa de cabeceira e sigo ao closet em busca de
uma cueca. Em seguida, levo as roupas sujas ao cesto na área de serviço,
depois da cozinha. Ao retornar ao quarto, puxo as cortinas pesadas, cobrindo
a janela panorâmica.
Passo as mãos nos cabelos ainda molhados antes de me dirigir à cama,
pensando no que terei de enfrentar amanhã na empresa. Helena não vai me
deixar em paz, muito menos o pobre Joaquim, que terá de aguentar suas
complicações o dia todo. Preciso mesmo relaxar o quanto posso, porque
amanhã vou utilizar toda a minha paciência acumulada.
Arrumo a camisa social diante do espelho, dentro do closet, pensando em
alguma forma de conseguir me manter são diante das coisas que Helena pode
aprontar. Passo as mãos pela barba por fazer e arrumo a mecha de cabelo
que cai na testa antes de voltar ao quarto.
Abro as cortinas, deixo a luz do dia entrar, me dirijo à mesa de cabeceira,
pego minha carteira e o celular e sigo em direção à sala, onde estão as
chaves do carro e do apartamento. Olho em meu relógio de pulso e constato
que a diarista deve chegar dentro de instantes.
Sigo apressado até o elevador e aperto o botão momentos antes de ouvir o
toque do meu celular. Vejo a chamada de Joaquim, meu amigo e gerente da
concessionária. Fecho os olhos brevemente, rogando que minha irmã não
tenha aprontado tão cedo.
— Joaquim — atendo.
— Ed, você demora?
— Estou saindo de casa, por quê?
— Sua irmã está aqui. — Solta um suspiro. — Devo começar com ela?
— Sim, claro... Não demoro a chegar.
— Está bem.
Encerro a ligação no momento exato em que as portas do elevador se
abrem diante de mim. Enquanto vou até a garagem, desejo que Helena aceite
a condição e faça o seu melhor, assim como faço o meu todos os dias. A
empresa foi do nosso pai, ele odiaria ver aquilo ruir, e eu também.
Ao entrar no carro, coloco o cinto e dou a partida imediatamente,
seguindo em direção à concessionária. Hoje será um dia cheio, alguns
clientes levarão suas motocicletas para revisão ou troca de peças, outros vão
buscar suas compras, há muito a se fazer.
Depois de enfrentar o trânsito, estaciono o carro na garagem da
concessionária e desço quase imediatamente. Após cumprimentar os
vendedores, rumo até a sala do meu amigo, a fim de verificar se ainda está
vivo com a minha irmã lá dentro.
Abro a porta e vejo Helena sentada na cadeira dele, diante do
computador, Joaquim está de pé atrás da cadeira, e Ana, a vendedora-chefe,
está ao lado do meu amigo. Estreito o olhar para os três e logo recebo um
sorriso da minha irmã.
— Bom dia.
— Bom dia, irmãozinho.
— Tudo bem aqui? — pergunto.
— Tudo em perfeita ordem — Joaquim responde. — Estou atualizando o
estoque de peças com Ana e aproveitando para mostrar tudo à sua irmã.
— Está bem. — Balanço a cabeça. — Vou subir.
Fecho a porta logo em seguida e me dirijo às escadas de cerâmica branca
que levam ao andar superior, onde ficam a sala de espera dos clientes, toda
em vidro, com todo o conforto, ar-condicionado, lanche, café, sofás,
televisões e rede de Wi-fi, a sala de reuniões e a minha sala. Destranco a
porta do meu escritório e entro, me dirigindo imediatamente à mesa. Ao
sentar, enquanto espero o computador iniciar, retiro de dentro do bolso a fita
que recebi de presente da Sereia. Seu cheiro me atinge quase imediatamente,
prendendo meu olhar no objeto. Mal posso conter a ansiedade de vê-la esta
noite e dar mais um passo...
Coloco o presente ao lado do teclado do computador e finalmente inicio o
dia de trabalho. Abro o e-mail e respondo os mais importantes e urgentes. Eu
me detenho em um deles, que diz algo importante sobre um carregamento de
motocicletas que apresentou defeito.
— Bom início de dia — resmungo, apoiando o cotovelo sobre a mesa e
trazendo a mão à boca, cobrindo-a. — Porra.
Eu me aprofundo neste problema, entrando em contato com a fabricante
para saber quando vão mandar recolher os veículos e enviar o novo
carregamento. Faço ligações, envio e-mails, mando mensagens, o tempo
corre enquanto resolvo todas as pendências. Quando menos espero, a porta
da minha sala se abre; ergo o olhar até Helena, completamente sério.
— Irmão, o seu funcionário é um indelicado e importunador! — acusa,
apontando a porta.
Joaquim aparece segundos depois, pálido. Respiro profundamente, com a
expressão fechada. Aceno para que meu amigo entre na sala e feche a porta,
sem dizer uma palavra ainda.
— Você não vai dizer nada, Edgar? — Ela senta na cadeira diante da
minha mesa.
— Vou ouvir os dois — digo, sem qualquer humor. — Comece a me
explicar.
— Eu estava sentada, você viu quando chegou, concentrada nas coisas do
estoque de peças e a maneira como tudo funciona. — Faz uma pausa,
cruzando os braços. — Seu funcionário começou a se insinuar para mim
assim que aquela vendedora saiu... Mas eu me esquivei. Fiquei concentrada
no trabalho, mas ele quase me agarrou à força, estou tremendo até agora.
Abaixo um pouco a cabeça e massageio a testa com a mão que estava no
queixo, perturbado com a ideia de ter de resolver mais isso.
— Joaquim — digo, voltando a erguer a cabeça.
— Eu não fiz nada, Edgar. — Também cruza os braços. — O único
movimento que fiz foi puxar uma cadeira para sentar ao lado dela e continuar
as explicações, você me conhece. Sua irmã começou a passar a mão em mim,
me dizendo como eu poderia ser demitido se não fizesse o que ela mandasse.
— Edgar, você não vai deixar isso passar, não é? — Helena está
claramente alterada. — Esse homem precisa ser mandado embora! Isso é
mentira!
Solto o ar pela boca, irritado.
— Se vocês não entram em um consenso sobre o que realmente aconteceu
aqui... — Ajusto o corpo na cadeira. — Eu mesmo verifico o que aconteceu.
— O quê?
Viro o rosto na direção de Helena, que tem uma expressão confusa no
rosto.
— Tenho câmeras em todas as partes desta empresa, Helena, a
concessionária precisa ser um lugar seguro — explico. — Vou averiguar esta
situação imediatamente.
Desvio o olhar dela à tela do computador, notando a tranquilidade de
Joaquim. Eu sei que a minha irmã é uma víbora, mas não imaginei que ela
fosse capaz de algo tão sujo e baixo somente para se aproximar de mim.
Abro o aplicativo que me mostra as imagens de todas as câmeras de
segurança da concessionária.
Analiso os nomes de todas as câmeras e seleciono a que mandei instalar
na sala de Joaquim. Entro nas configurações para colocar a data e hora que
quero ver imagens, sem dizer uma palavra sequer. Não sei exatamente o que
estou sentindo neste momento. Os problemas de hoje começaram cedo,
passei a manhã praticamente toda afundado neles, e agora me aparece isso.
Começo a assistir as imagens desde o momento em que Helena entrou na
concessionária. Acelero um pouco e vejo mais rapidamente o que aconteceu
naquela sala. Fecho os olhos ao ver que realmente Joaquim está dizendo a
verdade, minha irmã se enfureceu com a sua recusa.
Pauso as imagens, voltando a me recostar na cadeira e olhando fixamente
Helena, pensando que toda sua elegância e beleza não adiantam de nada.
Realmente gostaria de entender suas intenções, começar a enxergar a
finalidade das suas ações, porque eu só vejo uma aproveitadora que não
mede esforços para conseguir o que quer.
O mínimo respeito que eu ainda tinha por ela acabou de se esvair.
— Que porra você pensa que está fazendo aqui, sua irresponsável? —
rosno.
— Vou sair para que possam conversar — diz Joaquim.
— Você fica! — Eu me coloco de pé. — E essa irresponsável vai me
ouvir.
Helena se mantém em silêncio, tremendo, sabe que não há explicação e
muito menos justificativa para o que fez. Brincar com uma coisa dessas
quando tantas pessoas passam por isso de verdade e saem traumatizadas...
Sinto meu sangue ferver de raiva.
— Tem noção do quanto poderia ter prejudicado Joaquim? — Cruzo os
braços. — Era essa a porra da sua intenção, não é? Fodera vida dele por
não ceder a você?
— Edgar, olhe como você fala comigo, eu sou a sua...
— Cale essa sua boca, está me ouvindo, porra? — Aponto o dedo, e o
meu amigo se aproxima de mim, tocando o meu ombro para que eu me
mantenha calmo. — Não é nada minha, nunca foi. Sempre fez questão de
infernizar a minha vida, uma ligação de sangue não faz de você uma ente
querida.
Olho meu amigo e penso nos problemas que ainda tenho de resolver no
dia. Penso por alguns instantes em silêncio, tentando escolher qual das
pendências devo resolver primeiro.
— Joaquim, chame a chefe do departamento de vendas aqui imediatamente
— digo.
Ele assente rapidamente e deixa a sala sem dizer uma palavra, claramente
preocupado. Tensiono o maxilar, tentando dissipar parte da tensão que se
acumula no meu corpo.
— Você vai para casa — ordeno. — E só me aparece aqui amanhã para
que possamos resolver a sua situação aqui dentro.
— O que você vai fazer, Edgar? — Ela chega perto de mim.
— Estou pensando a respeito. Saia, tenho assuntos a resolver.
Helena passa as mãos nos cabelos tingidos de loiro, os arrumando. Em
seguida, alisa saia e volta a me olhar com a sua expressão raivosa no rosto.
— Pense bem no que vai fazer, Edgar, não me queira como inimiga.
— Você não está em posição de fazer ameaças, Helena.
Estendo o braço, apontando a porta. Ela entende o recado e se dirige à
saída rapidamente, equilibrando-se sobre os saltos finos. Espero que se vá e
passo as mãos pelo rosto até aos cabelos, tentando controlar a raiva. Eu me
aproximo da janela e vejo minha irmã sair da concessionária e entrar em seu
carro.
Ouço batidas à porta e volto à minha cadeira antes de mandar Joaquim
entrar com Ana. Bufo, tentando colocar minha irmã um pouco de lado para
tentar resolver os problemas mais importantes.
— Joaquim, desculpe por tudo aquilo — peço.
— Não se preocupe, Edgar... Você sempre me disse como ela era, foi bom
ter me avisado sobre aquilo. E que bom que existem câmeras na sala. Se não
fosse por isso, eu estaria completamente ferrado, seria a minha palavra
contra a dela.
Balanço a cabeça, concordando e me sentindo envergonhado ao mesmo
tempo. Aquela pessoa infeliz me coloca nas piores situações possíveis.
Amanhã mesmo darei um jeito nela, para que não precise ver a sua cara
todos os dias.
— Vamos ao que interessa — digo. — Sentem-se, por favor.
Ayla
Paro diante da concessionária em que a minha irmã trabalha, de mãos
dadas com meu filho. Vim trazer seu almoço o mais rápido que pude, depois
que recebi sua ligação dizendo que tinha acontecido um problema na
empresa e que ela não poderia sair para almoçar. Arrumo minha blusa
simples e a calça jeans, um pouco acuada de entrar em um lugar tão luxuoso.
— Uau, quanta moto bonita, mamãe! Vrum!
— São lindas mesmo, filho... Mas não toque em nada, sim? — peço.
Para pagar uma dessas, eu levaria muito tempo.
Olho em volta, admirada com a beleza e requinte do lugar, as motocicletas
espalhadas pelo vasto salão polido. Os vendedores e vendedoras possuem
seus fardamentos impecáveis. Mais adiante, uma escada em cerâmica branca
que dá acesso ao primeiro andar.
Paro no meio do salão e já vejo minha irmã descer as escadas, apressada.
Ana arruma o fardamento quando termina de descer, caminha até mim
rapidamente e me puxa para um canto da loja.
— É algo sério? — pergunto.
— A irmã do chefe fez uma cena com o gerente, o acusou de assédio. —
Está claramente nervosa. — Por sorte, na sala há câmeras e foi provado que
Joaquim é inocente.
— O seu Joaquim? — Faço cara de espanto. — Coitado.
— Não é meu. — Ela sorri levemente.
Minha irmã tem uma paixonite pelo gerente da concessionária desde que
ele mostrou seu lado cavalheiro a ela quando assumiu o posto de chefe do
departamento de vendas.
— Fiquei apreensiva por ele.
— Bom, eu não sou a mais indicada para dar conselhos amorosos. —
Sorrio, dando de ombros em seguida. — Mas você deveria falar com
Joaquim em particular, perguntar como está.
— Farei isso. — Toca os cabelos do sobrinho, que sorri. — Você trouxe o
almoço? Daqui a pouco o chefe chama de novo.
— Sim. — Solto a mão de Antônio e estendo para a minha irmã a bolsa
térmica. — Aqui. Boa sorte.
— Obrigada.
Ana beija a cabeça de Antônio e me abraça rapidamente em despedida.
Pego a mão do meu filho novamente e espero que ele acene para a tia. Em
seguida, o guio de volta para fora da concessionária.
— Toninho — chamo enquanto cruzamos o estacionamento da empresa. —
O que acha de irmos tomar um sorvete agora?
— Oba! — exulta.
Sorrio e volto a olhar para frente, ajustando minha bolsa no ombro.
Caminhamos um pouco até encontrarmos uma pracinha, onde algumas
crianças brincam. Paro diante de uma barraquinha e deixo que Antônio
escolha seu sabor favorito, chocolate. Pago pelo sorvete, pego alguns
guardanapos e agradeço ao vendedor sorridente.
Eu me afasto com o meu menino, que já se lambuza todo, e resolvo sentar
em um banco a fim de ajudá-lo. Antônio senta ao meu lado, completamente
concentrado, o que me faz observar como está crescido e belo. Aliso seus
cabelos e recebo um sorriso lindo de volta.
— Depois eu posso brincar um pouquinho no parque, mamãe?
— Pode, apenas um pouco — decreto. — Lembre-se que ainda precisa
fazer a lição de casa.
Ele faz um bico suplicante que me faz sorrir, mas mantenho firme minha
ordem. Eu o deixo brincar um pouco no parque e fazer amizade com as
crianças. Olho tudo de longe, pensando no quanto tenho sorte por tê-lo
comigo, apesar de tudo o que passei por causa do seu pai.
Depois de algum tempo, o chamo para irmos e recebo um pouco de birra
em resposta, que é controlada por algumas palavras minhas. Vamos direto ao
ponto de ônibus, e não demora muito, nosso ônibus aparece. Eu aceno,
segurando firme a mão do Toninho, que está distraído.
Ao entrarmos em casa, giro a chave na porta rapidamente, organizando
mentalmente todas as coisas que preciso fazer antes de ir trabalhar. Sigo até
meu quarto e deixo a bolsa aberta sobre a cama.
— Antônio — chamo. — Tome um banho, e depois vamos fazer as lições
de casa.
— Sim, mamãe.
Aproveito seu momento do banho para separar a roupa da apresentação de
hoje. Régis me trouxe pela manhã, logo depois que acordei: um body na cor
marsala, com algumas transparências na barriga e nas costas, e uma liga de
perna.
Instintivamente, penso em Edgar, em como quero vê-lo esta noite e
receber o seu olhar devorador. Não consigo deixar de pensar nele, a forma
como me deixa à vontade é encantadora. Eu quero mais dele, e talvez hoje eu
consiga dar o primeiro passo depois de anos sem o fazer.
Arrumo os cabelos enquanto ouço meu amigo me anunciar e me preparo.
Sinto o coração disparado dentro do peito, e isso se intensifica ao ouvir meu
apelido. Passo pelas cortinas e tento não fechar os olhos quando a luz do
projetor me atinge. Caminho sensualmente até meu companheiro de palco, o
sofá. Deito e fecho os olhos, aguardando a música começar.
Ride, do SoMo, começa a tocar, e eu movo o meu corpo em pequenas
ondulações, ainda deitada. Abro os olhos e dirijo o olhar para a plateia, que
aplaude, gostando do início da coreografia. Toco a máscara no rosto
rapidamente, erguendo o tórax e sentando elegantemente.
Fico de pé, dançando ritmadamente com a música, movendo o corpo e
jogando os cabelos. Procuro Edgar discretamente por toda a plateia, mas não
o encontro em lugar algum. Desço do palco e danço por entre as mesas,
enquanto ouço elogios e propostas de diversos homens.
Ao constatar que Edgar realmente não está, volto ao palco e executo a
coreografia da música, me sentindo estranha. Eu gostaria que ele estivesse
aqui, adoraria sentir suas mãos em mim outra vez... Até estava tomando
coragem para lhe dar meu número ou algo parecido. Talvez ele tenha
desistido de investir em uma dançarina que não mostra o rosto.
Depois da apresentação, desço do palco e sigo em direção ao camarim,
um pouco apreensiva. A única coisa que tenho dele é a imagem do seu belo
rosto gravado na minha memória, seu sorriso torto indecente e seu nome.
Não sei sequer onde

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