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Políticas Sociais em Habitação

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Prévia do material em texto

2016
Políticas sociais
em Habitação
Profª. Silvana Braz Wegrzynovski
Copyright © UNIASSELVI 2016
Elaboração:
Profª. Silvana Braz Wegrzynovski
Revisão, Diagramação e Produção:
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI
Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri 
UNIASSELVI – Indaial.
Impresso por:
360
W411p
 Wegrzynovski; Silvana Braz 
 Políticas sociais em habitação/ Silvana Braz Wegrzynovski 
 : UNIASSELVI, 2016.
 228 p. : il.
 
 ISBN 978-85-7830-971-8
 1.Serviço social. 
 I. Centro Universitário Leonardo Da Vinci. 
III
aPresentação
A disciplina que se inicia neste momento no curso de Serviço Social, 
Políticas Sociais em Habitação, tem como objetivos a apresentação da história 
da habitação popular no Brasil, contextualizando o desenvolvimento urbano; 
a discussão das políticas públicas na área da habitação social e o enfoque em 
torno da atuação e dos desafios para o profissional do Serviço Social.
A disciplina Políticas Sociais em Habitação é essencial para o curso 
de Serviço Social, pois apresentará eixos fundamentais para entendermos de 
que forma aconteceu a estruturação dos espaços urbanos. Para compreender 
melhor essa estruturação, faz-se necessário estudarmos as principais sequelas 
do sistema capitalista no processo de urbanização das nossas cidades 
brasileiras e seus reflexos sociais.
No contexto da sociedade em que estamos inseridos, precisamos ter a 
clareza de que uma das bandeiras de luta da sociedade brasileira é a questão 
social do direito à moradia, pela legalidade dessa e por políticas públicas que 
atendam a esta demanda.
A atuação do assistente social, diante das políticas de habitação 
de interesse social, é fundamental para a implementação dessa, pois o 
profissional trabalha diretamente com a população beneficiária.
Esta disciplina mostrará determinadas propostas de mobilização 
social para o enriquecimento do trabalho do assistente social, de forma a 
orientá-lo em sua trajetória profissional.
Vamos aos estudos!
Profª. Silvana Braz Wegrzynovski
IV
Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para 
você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há 
novidades em nosso material.
Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é 
o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um 
formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. 
O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova 
diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também 
contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.
Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, 
apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade 
de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. 
 
Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para 
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto 
em questão. 
Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas 
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa 
continuar seus estudos com um material de qualidade.
Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de 
Desempenho de Estudantes – ENADE. 
 
Bons estudos!
NOTA
V
VI
VII
UNIDADE 1 – A URBANIZAÇÃO DA PERIFERIA, UMA CONSEQUÊNCIA DO 
 CAPITALISMO ............................................................................................................ 1
TÓPICO 1 – O AVANÇO DA DESIGUALDADE SOCIAL NO MEIO URBANO ..................... 3
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 3
2 A CIDADE E SUAS DIVERSIDADES............................................................................................. 4
RESUMO DO TÓPICO 1....................................................................................................................... 14
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 16
TÓPICO 2 – A CIDADE: LEGAL x ILEGAL ...................................................................................... 17
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 17
2 A EXCLUSÃO SOCIAL E DO DIREITO A CIDADE ................................................................... 17
RESUMO DO TÓPICO 2....................................................................................................................... 33
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 35
TÓPICO 3 – A VIOLÊNCIA URBANA E A SEGREGAÇÃO AMBIENTAL ............................... 37
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 37
2 A VIOLÊNCIA URBANA x DESENVOLVIMENTO URBANO ............................................... 37
RESUMO DO TÓPICO 3....................................................................................................................... 46
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 48
TÓPICO 4 – A CIDADE OCULTA ....................................................................................................... 49
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 49
2 A CIDADE OCULTA ENTRE O REAL E O IMAGINÁRIO: A REALIDADE BRASILEIRA ......49
LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................. 58
RESUMO DO TÓPICO 4....................................................................................................................... 61
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 63
UNIDADE 2 – A DEMANDA DA HABITAÇÃO NO BRASIL ..................................................... 65
TÓPICO 1 – DIREITO À MORADIA NO BRASIL COMO UM PROCESSO DE LUTAS E
 CONQUISTAS ................................................................................................................. 67
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 67
2 MORADIA: LUTAS E CONQUISTAS ............................................................................................ 68
RESUMO DO TÓPICO 1....................................................................................................................... 79
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 81
TÓPICO 2 – OS MARCOS LEGAIS DO DIREITO À MORADIA .............................................. 83
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 83
2 ENTENDENDO OS MARCOS LEGAIS DO DIREITO À MORADIA .................................... 83
RESUMO DO TÓPICO 2.......................................................................................................................94
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 96
sumário
VIII
TÓPICO 3 – AS POLÍTICAS PÚBLICAS, PLANOS DE HABITAÇÃO DE INTERESSE 
 SOCIAL E OS FINANCIAMENTOS HABITACIONAIS ...................................... 97
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 97
2 BREVE HISTÓRICO DA POLÍTICA DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL
 À SUA EFETIVAÇÃO ....................................................................................................................... 98
RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 114
AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 116
TÓPICO 4 – UM NOVO OLHAR PARA POLÍTICA HABITACIONAL ................................... 119
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 119
2 OS PLANOS LOCAIS DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL E O PROGRAMA 
 MINHA CASA MINHA VIDA ....................................................................................................... 120
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................ 137
RESUMO DO TÓPICO 4..................................................................................................................... 140
AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 142
UNIDADE 3 – A ATUAÇÃO DO ASSISTENTE SOCIAL NA POLÍTICA DE
 HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL ................................................................ 145
TÓPICO 1 – A EFETIVAÇÃO DO TRABALHO DO ASSISTENTE SOCIAL NA
 POLÍTICA DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL ....................................... 147
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 147
2 SERVIÇO SOCIAL x PRÁTICA x TEORIA x POLÍTICA DE HABITAÇÃO DE
 INTERESSE SOCIAL ........................................................................................................................ 147
RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 156
AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 157
TÓPICO 2 – A TRAJETÓRIA HISTÓRIA DO TRABALHO DO ASSISTENTE
 SOCIAL NA POLÍTICA DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL E
 AS DIRETRIZES ATUAIS ............................................................................................ 159
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 159
2 SERVIÇO SOCIAL: A SUA ATUAÇÃO NA POLÍTICA DE HABITAÇÃO DE
 INTERESSE SOCIAL ........................................................................................................................ 159
RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 169
AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 172
TÓPICO 3 – A ADAPTAÇÃO DO TRABALHO DO ASSISTENTE SOCIAL NA PNHIS .... 173
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 173
2 TRABALHO DO ASSISTENTE SOCIAL NA PNHIS, SEU COTIDIANO ............................ 174
RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 187
AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 189
TÓPICO 4 – OS AVANÇOS E DESAFIOS DO TRABALHO DO ASSISTENTE
 SOCIAL NA PHIS ......................................................................................................... 191
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 191
2 O DESAFIO DO ASSISTENTE SOCIAL NA PHIS .................................................................... 192
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................ 205
RESUMO DO TÓPICO 4..................................................................................................................... 210
AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 212
REFERÊNCIAS ...................................................................................................................................... 215
1
UNIDADE 1
A URBANIZAÇÃO DA PERIFERIA, UMA 
CONSEQUÊNCIA DO CAPITALISMO
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
PLANO DE ESTUDOS
A partir desta unidade você será capaz de:
• entender o avanço da desigualdade social no meio urbano;
• analisar a cidade considerada legal com a cidade considerada ilegal;
• compreender o que é a violência urbana e a segregação ambiental;
• despertar um olhar crítico para a cidade oculta.
A Unidade 1 está dividida em quatro tópicos. Para um melhor aprofundamento 
do conteúdo e para fixar melhor seus conhecimentos, no final de cada tópico 
você terá oportunidade de realizar as atividades propostas.
TÓPICO 1 – O AVANÇO DA DESIGUALDADE SOCIAL NO MEIO 
 URBANO
TÓPICO 2 – A CIDADE: LEGAL X ILEGAL
TÓPICO 3 – A VIOLÊNCIA URBANA E A SEGREGAÇÃO AMBIENTAL
TÓPICO 4 – A CIDADE OCULTA
2
3
TÓPICO 1
UNIDADE 1
O AVANÇO DA DESIGUALDADE SOCIAL NO MEIO URBANO
1 INTRODUÇÃO
Neste primeiro tópico será discutido como aconteceu o processo de 
crescimento excludentes das cidades, ou seja, período onde as cidades começaram 
a se estruturar de forma diferenciada, através do processo de industrialização 
brasileira, que ocorreu entre as décadas de 1930 até 1980.
Foram cinco décadas em que o crescimento populacional urbano se 
expandiu de tal forma que marcou negativamente toda a década de 80, que 
ainda contou com o fim do desenvolvimentismo e com novas emergências dos 
arranjos econômicos internacionais, ampliando descontroladamente o índice de 
desigualdade social.
A importância de realizar primeiramente esse resgate histórico se 
concretiza pela necessidade de compreender, em outro momento desta importante 
disciplina, como evoluíram as políticas públicas de habitação e a fundamental 
atuação do assistente social.
O desenvolvimento urbano nos centros populacionais, como as cidades, é 
decorrente de toda uma história social, cultural, econômica e política que permeou 
o Brasil durante todo o seu desenvolvimento, até os dias atuais. Entender esse 
contexto é necessário para conseguir realizar uma leitura das questões sociais 
emergentes, como no caso a habitação.
As demandas habitacionais são frutos de todo o processo de segregação 
urbana, oriunda do crescimento das cidades. Sendo assim, neste primeiro 
momento é importante entender o processo de urbanismo nas cidades, para 
compreendermos as políticas públicas de habitação.
Então, chegou a hora de buscar novos conhecimentos.
Bons estudos!
UNIDADE 1 | A URBANIZAÇÃO DA PERIFERIA, UMA CONSEQUÊNCIA DO CAPITALISMO
4
2 A CIDADE E SUAS DIVERSIDADES
FIGURA 1 – CIDADE E SUAS DIFERENÇAS
FONTE: Disponívelem: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_
arttext&pid=S0103-40142003000200013>. Acesso em: 25 fev. 16.
Ao analisar as grandes cidades do Brasil através das áreas construídas em 
todo o seu território, pode-se constatar que o uso ilegal do solo e a ilegalidade 
das edificações em solo urbano podem chegar a mais de 50% da área construída, 
como é visto nos grandes centros urbanos. Essa é uma informação empírica e 
fundamentada no conhecimento adquirido cotidianamente pelos diversos meios 
de comunicação social que existem, porém basta realizar uma pesquisa nos 
cadastros de imóveis de cada cidade para se constatar tal realidade.
O grande elo que existe entre as normas e os fatos constituídos em uma 
cidade provoca um olhar crítico para a maioria dos técnicos e analistas que 
atuam sobre as questões urbanas, pois existe uma realidade que é ignorada 
pela maioria dos governantes. Para a classe dominante, o correto é que o Estado 
tenha uma atuação de punição para quem mão cumpre as normas. Essas normas, 
fundamentadas na “legalidade”, historicamente beneficiam determinados grupos 
sociais, ou políticos, em conformidade com o jogo de interesses que, na maioria 
das vezes, fica de acordo com os detentores de poder e de riqueza.
As cidades vêm desenvolvendo e avançando nos cadastros das áreas de 
ocupação irregular, através de setores de monitoramento que têm como objetivo 
fiscalizar os loteamentos clandestinos, invasões de áreas públicas, construções 
em áreas de risco e núcleos de favelas. Porém, ainda existem muitas cidades 
brasileiras que não possuem nenhuma ação para esse monitoramento, onde os 
cadastros municipais estão incompletos e defasados. A falta de um cadastro 
dessas áreas gera uma cidade ilegal e inexistente, pois o poder público não pode 
intervir nessas áreas. Nesse sentido ela existe como espaço, mas inexiste como 
cidade legal, onde a população que reside neste espaço não possui o direito de ter 
um endereço fixo e o poder público não pode intervir de forma oficial.
TÓPICO 1 | O AVANÇO DA DESIGUALDADE SOCIAL NO MEIO URBANO
5
Muitas cidades vêm aumentando qualificadamente e quantitativamente 
o número de profissionais técnicos para atuarem nas áreas consideradas ilegais, 
e estes trabalham diretamente nessas áreas, colocando em prática a teoria que 
vivenciaram quando acadêmicos das mais diversas formações.
O planejamento urbano tem se tornado uma prática que vem considerando 
cada vez mais o mercado imobiliário, através de leis que regulamentam o uso 
e o zoneamento do solo. Essas propostas, chamadas de “solo criado”, vêm, 
desde as décadas de 1970 e 1980, envolvendo diversos pensadores com as mais 
diferentes ideologias, refletindo sobre o acúmulo de análises e de soluções para a 
resolutividade de vários conflitos, que são gerados entre a propriedade privada e 
a ocupação ilegal e irregular das áreas urbanas.
 
Na década de 1990, as cidades começaram a efetivar os Planos Diretores 
(PDs), que objetivavam de forma geral uma totalidade do urbano e do urbanismo 
moderno.
Conforme Maricato (1995, p. 22-23):
A incorporação do conceito pós-moderno de fragmentação, 
valorizando o desenho urbano, não implica necessariamente na visão 
alienada do planejamento oficial, em encarar a cidade real que exige 
intervenção emergencial menos generalizante e abstrata. Para grandes 
áreas do território urbano esta regulamentação nada significa. Gestão 
e não simples regulamentação, operação, ação administrativa e não 
apenas planejamento de gabinete é o caminho para a prevenção das 
tragédias cotidianas que vitimam moradores dos morros e encostas 
que deslizam a cada chuva, ou moradores das beiras dos córregos 
atingidos por enchentes, ou bairros inteiros atingidos por epidemias. 
O distanciamento que existe entre quem pensa a consolidação da cidade 
nos poderes executivos municipais e quem exerce o controle urbanístico é visível 
em todos os aspectos. Como, por exemplo, a aprovação e liberação das plantas 
de construção e o poder policial sobre a ocupação das áreas irregulares. São 
dissolvidas ou diluídas pelas práticas do favoritismo e do pragmatismo dos 
interesses individuais e são mediadas pela corrupção que, infelizmente, acaba 
denegrido a imagem do poder público.
Novamente citando Maricato (1995, p. 23):
A legislação detalhista e "rigorosa" contribui para a prática de 
corrupção e constitui um exemplo paradigmático da contradição entre 
a cidade do direito e a cidade do fato. Pois em um ambiente onde 
‘a infração, além de infração, é norma e a norma além de norma é 
infração, como se deveria esperar de uma contravenção sistemática’, 
qual é o papel das leis que pretendem regulamentar procedimentos 
detalhados do universo individual do interior da moradia, quando a 
maior parte das moradias e do contexto urbano constitui um imenso 
universo clandestino que ignora normas mais gerais e básicas? 
UNIDADE 1 | A URBANIZAÇÃO DA PERIFERIA, UMA CONSEQUÊNCIA DO CAPITALISMO
6
Essas práticas favorecidas, que têm sempre um cunho político e eleitoral, 
são usufruídas não só pelo Poder Executivo, com o famoso “dar o jeitinho”, como 
também pelo Poder Legislativo, que se aproveita dessas práticas. O correto seria 
o Poder Legislativo ajustar a legislação conforme a realidade, ou propor, dentro 
da legalidade, alterações possíveis diante da realidade com a lei, e não usufruir 
de determinada situação.
Esse clientelismo que se alastra nos poderes Executivo e Legislativo 
municipais fortalece o crescimento das ocupações ilegais, pois a população que reside 
nesses locais fica à mercê da vontade do poder público. Essas áreas são desprovidas 
de qualquer infraestrutura para atender as necessidades básicas de moradia.
UNI
As comunidades formadas em áreas de ocupação irregular são estruturadas 
por trabalhadores que estão excluídos do direito à cidade, pelo sistema capitalista. 
Para conseguir sobreviver neste sistema, buscam as alternativas oferecidas pelo próprio 
sistema. Acabam ocupando áreas irregulares, e não conseguem obter de forma alguma 
a posse legal da área ocupada. Sem a escritura legal, ficam carentes de investimentos de 
infraestrutura da parte do poder público.
Para resolver essas questões, como, por exemplo, famílias em áreas irregulares que não 
conseguem o acesso legal de instalação da rede pública de energia e nem a autorização 
para ser instalada em suas moradias, acabam dando “um jeitinho” e puxam um “gato”, 
de outro vizinho que possui luz em casa, ou que puxou o “gato” da própria rede pública. 
Esses chamados “gatos”, “rabichos”, se alastram em toda a área ocupada, gerando um alto 
consumo e podendo até causar um acidente por curto circuito.
Mesmo que sejam instalações visíveis aos olhos dos gestores, não se adota nenhuma 
intervenção para impedir, proibir ou legalizar as áreas de ocupação irregular através de 
projetos de reurbanização. A falta de interesse político se dá, pois esses assentamentos são 
um mecanismo inesgotável de clientelismo eleitoral praticado há muitos anos no Brasil.
Como profissional de Serviço Social, trabalhei na relocação de famílias de áreas de risco 
para um loteamento público. As dificuldades técnicas foram muitas. Uma delas é o 
apadrinhamento do Poder Legislativo com essa população.
 
A população não consegue perceber que a questão da moradia, de infraestrutura básica, 
são direitos garantidos na Constituição Federal de 88, e que essa população não deve favor 
eleitoral para ninguém.
Os vereadores diziam, com todas as letras, que os moradores podiam utilizar a luz, com 
rabicho, pois ele tinha contato pessoal no órgão responsável. E assim, a comunidade vivia 
presa ao favoritismo eleitoral.
TÓPICO 1 | O AVANÇO DA DESIGUALDADE SOCIAL NO MEIO URBANO
7
O surgimento de novas leis que vêm sempre articuladas com os interesses 
do poder público e do mercado imobiliário acaba colocando em conflito a atuação 
do Poder Judiciário, que tem como objetivo assegurar os direitos garantidos em leis.
A questão da ocupação urbana vem,a cada dia, ganhando mais destaque 
na atuação do Poder Judiciário e do Ministério Público. São casos que envolvem 
sérias negociações entre os governos municipais, estaduais e o Poder Judiciário, 
por vários anos. 
O senso comum afirma que o Poder Judiciário vem atuando de forma 
flexível nas questões urbanas e nos casos de ocupações de terras, porém este 
conceito, desde os anos de 1980, mostra que não é real, pois vários casos que 
aparecem diariamente na mídia levam para outras conclusões. É importante, 
diante disso, analisar os intransigentes conflitos nas disputas pelas terras urbanas 
entre os poderes Judiciário e Executivo. 
Em muitos casos de ocupações irregulares do solo urbano, a atuação do 
Poder Judiciário torna a negociação pacífica entre ocupantes e proprietários. 
Porém, em outros casos, onde existe uma ação de despejo, muitos proprietários 
não são sensíveis às questões sociais, e utilizam meios mecânicos para destruir 
as construções edificadas em seus terrenos, com ou sem moradores dentro. Em 
casos de ocupações em áreas particulares, o poder público não pode intervir. 
Nestes casos, o que de fato ocorre é que os proprietários legais das terras 
ganham judicialmente o direito de reintegração de posse de sua propriedade e 
não entram em acordo com os moradores.
DICAS
Caro acadêmico, neste link: http://www.conjur.com.br/2012-jan-30/pinheirinho-
direito-propriedade-atender-funcao-social você poderá ver elementos verídicos da realidade 
vivenciada no Brasil, diante da questão da posse da terra.
UNIDADE 1 | A URBANIZAÇÃO DA PERIFERIA, UMA CONSEQUÊNCIA DO CAPITALISMO
8
Sendo esta leitura de relevância para nossos estudos, apresentamos um 
comentário a respeito (MAIOR, 2012):
O que aconteceu na localidade conhecida por Pinheirinho, em São José 
dos Campos, município que possui um dos maiores orçamentos per 
capita do Brasil, pode ser considerado uma das maiores agressões aos 
Direitos Humanos da história recente em nosso país.
Querem dizer que tudo se deu em nome da lei, mas com tal argumento 
confere-se ao Direito uma instrumentalidade para o cometimento de 
atrocidades e tenta-se fazer com que todos os cidadãos sejam cúmplices 
do fato. Só que o Direito não o corrobora. Senão, vejamos.
Na base jurídica do ato cometido, está, dizem, o direito de propriedade. 
Um terreno foi invadido, obstruindo-se o direito da posse tranquila ao 
seu titular, e, portanto, precisa ser desocupado. Simples assim. 
Mas o direito de propriedade, conforme previsto constitucionalmente, 
deve atender à sua função social (artigo 5º, inciso XXIII, da Constituição 
Federal). Sem esse pressuposto, nenhum direito de propriedade pode 
ser exercido.
A Constituição ainda garante a todos os cidadãos, como preceito 
fundamental, o direito à moradia (artigo 6º, inserto no Título II, do 
Capítulo II, da CF).
Perante a situação acima relatada, o próprio Poder Judiciário não consegue 
aplicar as leis e, por algumas vezes, antes de tentar aplicá-las, realiza acordos 
como mecanismos de negociação. A decisão judicial vem de encontro com o fim 
do clientelismo, já citado anteriormente.
Muitos dos imóveis que possuem valores irrisórios no mercado imobiliário 
acabam sendo ocupados de forma irregular e se estruturam sem a intervenção do 
Estado, independentemente da sua localização geográfica. Quando uma comunidade 
se desenvolve em área ilegal e começa a ser valorizada por determinados fatores 
urbanísticos, as relações que se fundam passam a ser regidas pelas legislações 
federais, estaduais e municipais, conforme a demanda que se apresenta.
A diversidade que existe nas cidades e que está oculta (cidade real) para a 
burguesia ou até mesmo para a classe média, acaba sendo uma área restritiva para 
as pessoas, ficando isoladas dos centros urbanos. Essa cidade real é decorrente de 
todo o processo histórico de formação das cidades, e que aconteceu por meio do 
êxodo rural. 
O Brasil passou por diferentes momentos em relação ao crescimento de 
favelas. A taxa de crescimento populacional na década de 90 chegou a ser superior 
às cidades em sua totalidade.
 O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA (2014, p. 7) 
problematiza a oscilação da população que vive em favelas, em diferentes capitais 
brasileiras, de 2000 até 2010, concluindo que: 
TÓPICO 1 | O AVANÇO DA DESIGUALDADE SOCIAL NO MEIO URBANO
9
Uma comparação direta entre os censos 2000 e 2010 indica o grau 
de incompatibilidade dos dados de aglomerados subnormais. O 
número de domicílios nas áreas de favelas teria dobrado (passando 
de 1,6 milhão para 3,2 milhões), e a população residente em favelas 
teria crescido 75%, passando de 6,5 milhões em 2000 para 11,4 
milhões em 2010. Isto é, os residentes de favelas teriam crescido de 
3,8% da população nacional em 2000, para 6% em 2010. Um processo 
de favelização tão intenso seria incompatível com a melhoria dos 
indicadores socioeconômicos, redução da pobreza e da desigualdade 
registrados na última década. 
Desde o início do século XX, as políticas públicas no Brasil, voltadas para 
o planejamento urbano, sempre tiveram como objetivo resolver as demandas 
sociais da população residente em favelas e nos cortiços, através da retirada 
dessas pessoas das áreas consideradas valorizadas pelo mercado imobiliário, sem 
levar em consideração as questões sociais.
Autores como Sevcenko (1993), Vaz (1994), Barboza (1995) e Maricato 
(1995) afirmam que essa prática vem sendo aplicada nas reformas urbanas 
higienistas que tiveram início no período da República, continuando durante 
período populista e varguista até a ditadura militar.
O interesse econômico é o principal foco das questões das ocupações ilegais, 
onde o jogo de poder é nítido e sem muita flexibilidade. Diante disso, ocorre uma 
certa desinformação e desinteresse sobre as condições de habitação e da miséria 
urbana, gerando assim uma omissão da realidade sobre a exclusão social.
Outro fator, além do econômico, que omite as questões sociais por falta de 
informação, é a atuação representativa das entidades ambientalistas, sendo essa, 
quase que em sua maioria, em oposição ao mercado imobiliário. Isto significa que 
muitos militantes dos movimentos ambientalistas são contrários à urbanização 
e à regularização das áreas ocupadas ilegais, sendo favoráveis à remoção dessas 
pessoas de um modo geral. E não consideram todo o contexto social e econômico 
dessas famílias.
Segundo Maricato (1995, p. 14):
Podemos afirmar, entretanto, sem temer exageros, que a abstração 
em relação à realidade urbana brasileira, que está presente em 
toda a sociedade, está também, fortemente presente, nas entidades 
ecológicas, que, embora reconhecendo os males de uma concentração 
demográfica considerada "excessiva", desconhecem a real dimensão 
da ocupação anárquica do solo e as contradições que são inerentes a 
esse processo. Esse "desconhecimento" sobre a realidade próxima é 
acompanhado de uma construção ideológica da representação sobre o 
urbano, que repete a marca das “ideias fora do lugar”, também entre 
muitas das entidades ambientalistas, atrasando a urgente e necessária 
defesa do meio ambiente. 
UNIDADE 1 | A URBANIZAÇÃO DA PERIFERIA, UMA CONSEQUÊNCIA DO CAPITALISMO
10
No Brasil, a maioria das temporadas de chuvas acontece em diferentes 
regiões e tempo, são infelizmente marcadas por grandes tragédias urbanas, 
ocasionadas pelos fenômenos ambientais, como as enchentes, desmoronamentos, 
vendavais, chegando a ocasionar diversas mortes. Esses fenômenos ambientais, 
até alguns anos atrás, eram comuns de acontecerem somente nas grandes cidades, 
mas se acompanharmos as mídias, percebemos que estas tragédias ambientais 
estão em todos os lugares.
FIGURA 2 – TRAGÉDIA AMBIENTAL DE 2008 NO VALE DO ITAJAÍ
FONTE: Disponível em: <http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticias/noticia/2016/02/depois-
de-tragedias-rio-e-santa-catarina-decidiram-apostar-na-prevencao-4965861.html>. 
Acesso em: 27 fev. 16.
Quando a mídia apresenta e repete uma notícia sobre uma tragédiaambiental, em momento algum consegue fazer uma análise ou referenciar 
o processo descontrolado do uso do solo, nem mesmo fazer uma análise da 
conjuntura em que se encontravam as famílias afetadas, desconsiderando as 
questões sociais. 
As questões climáticas há algum tempo vêm afetando não somente a 
população considerada de baixa renda que mora em encostas, mas sim toda a 
sociedade, sem escolher lugar.
DICAS
Caro acadêmico, para entender melhor, assista ao vídeo deste link: <https://
www.youtube.com/watch?v=V1jtBvdxMgg&ebc=ANyPxKoWXLQM1auqC5G1688Sbn_
fQNhtJF3Pn6T-AB0DhqsG8f6adGwkNeihxFxaoHCQS_ZuzwErQi5BiPwC3nwxmCWNiNxg>.
TÓPICO 1 | O AVANÇO DA DESIGUALDADE SOCIAL NO MEIO URBANO
11
Revelando a história de formação das cidades, torna-se necessário ressaltar 
os movimentos urbanos que se destacaram durante os anos 70 no Brasil. Esses 
movimentos tinham o apoio de intelectuais, e como visavam transformação das 
cidades, através das ideias da Assembleia Nacional Constituinte, cobravam uma 
Reforma Urbana.
A busca pela Reforma Urbana teve início em 1960, através dos setores 
progressistas da sociedade que exigiam propostas de mudanças estruturais das 
questões fundiárias, e que focavam na concretização da Reforma Agrária. Sendo 
constituída a proposta inicial da reforma urbana em 1963, através do Instituto dos 
Arquitetos do Brasil (Observatório Internacional do Direito à Cidade), porém não 
foi viabilizada em decorrência do golpe militar de 1964.
Nas décadas de 70 e 80, os temas da Reforma Urbana reaparecem 
novamente, juntamente com os movimentos populares de luta pela moradia, 
centralizados em alguns bairros de diversas cidades. A consolidação desses 
movimentos, nacionalmente, se concretizou na década de 80. Devido aos rumos 
da conjuntura política, estes movimentos se fortaleceram, ganhando maior 
visibilidade e relevância nas decisões políticas.
Conforme afirma Gohn (2007, p. 278):
Na prática surgem novas lutas, como pelo acesso à terra e por sua 
posse, pela moradia, expressas nas invasões, ocupações de casas e 
prédios abandonados; articulação dos movimentos dos transportes; 
surgimentos de organizações macro entre as associações de moradores; 
movimentos de favelados ou novos movimentos de desempregados; 
movimentos pela saúde.
A Igreja Católica foi fundamental neste período, contribuindo com o 
lançamento do documento “Ação Pastoral e o Solo”, que defendia ideologicamente 
a função social da propriedade urbana, se tornando um referencial na luta pela 
Reforma Urbana.
Entre as décadas de 70 e 80, o Estado incorporou os movimentos sociais 
através dos partidos políticos, visando o monitoramento das ações desses 
movimentos e até mesmo a criação de diferentes entidades para fins políticos, e que 
serviam como trampolim para a negociação e cooptação de lideranças populares.
Em janeiro de 1986, os movimentos populares e pastorais, através das 
entidades de assessoria, lançaram o Movimento Nacional pela Constituinte, 
que incide na articulação de várias plenárias e reuniões de trabalho, focando a 
iniciativa popular. Este período contou com a participação de vários segmentos 
profissionais, que compuseram um corpo técnico e reformista, que defendia a 
democratização do planejamento e da gestão das cidades, com a participação dos 
mesmos. Esse movimento foi riquíssimo no sentido de envolver a sociedade civil, 
pesquisadores universitários, representantes de entidades e sindicatos de classe, 
técnicos ligados à área de planejamento urbano e poder público, num debate 
sobre os rumos das cidades.
UNIDADE 1 | A URBANIZAÇÃO DA PERIFERIA, UMA CONSEQUÊNCIA DO CAPITALISMO
12
ESTUDOS FU
TUROS
Na próxima unidade será aprofundado como se procedeu a organização desses 
movimentos.
Para Maricato (1995), a expectativa em torno do desenvolvimento e 
evolução urbana no Brasil foi cenário para a superação do modelo arcaico, antigo, 
pelo sistema capitalista. A urbanização foi marcada pelo modelo acelerado 
e concretado do desenvolvimento moderno, que a partir dos anos 80, com o 
crescimento econômico, teve diversas sequelas negativas, como, por exemplo: 
a baixa qualidade de vida, a predação do meio ambiente, aumento da miséria 
social, da violência urbana, entre outros. A autora continua apontando que o 
desenvolvimento industrial no Brasil, se assegurou categoricamente a partir 
da chamada Revolução de 1930, convencionou o crescimento urbano com o 
industrial através dos regimes arcaicos de produção agrícola. O chamado " pacto 
estrutural”, entre antigos proprietários rurais e a burguesia urbana, aprovou 
mudanças sem rupturas e a convivência de políticas contraditórias.
Com a nova correlação de forças sociais que foram amadurecendo no Brasil 
neste período, requereu-se a reformulação do aparelho estatal, a regulamentação 
da relação trabalho e capital e novas regras de crescimento do mercado interno.
O Estado passa a desenvolver um modelo centralizador, inventor e 
protecionista do processo de acumulação urbano-industrial, e institui uma 
legislação trabalhista, elencando alguns privilégios para o trabalhador urbano 
sobre o trabalhador rural.
Para Maricato (1995, p. 19):
Alguns fatos estão na base do gigantesco processo de migração 
que ocorreu no território brasileiro, neste século, do campo para as 
cidades: a referida concentração fundiária em primeiro lugar, seguida 
da introdução de tecnologia em certos setores da produção rural 
destinada principalmente à exportação e também o desprezo pelo 
avanço das relações trabalhistas no campo. 
O processo de migração, para Santos (1993, p. 74), significa:
De 1940 a 1980 a população urbana passa de 26,35% do total para 
68,86%. No final desse período, aproximadamente 40 milhões de 
pessoas (33,6% da população) haviam migrado do local de origem. 
Somente entre 1970 e 1980 incorporam-se à população urbana mais de 
30 milhões de novos habitantes. Em 1960 havia no Brasil duas cidades 
com mais de 1 milhão de habitantes: São Paulo e Rio de Janeiro. Em 
1970 havia cinco, em 1980 dez e em 1990 doze.
TÓPICO 1 | O AVANÇO DA DESIGUALDADE SOCIAL NO MEIO URBANO
13
O fenômeno da metropolização das cidades esteve diretamente ligado 
com o crescimento industrial em todo o território brasileiro, resultando na 
industrialização, urbanização, crescimento da classe média, fixação do salário 
e produção de bens de consumo duráveis. Consequentemente, o Brasil, pós-
década de 50, formou um “simulacro” da modernidade em torno do crescimento 
urbanístico das cidades.
Torna-se perceptível que atualmente as cidades refletem o resultado 
do processo industrial que foi instalado, e que está fundamentado na intensa 
exploração entre a força de trabalho e a exclusão social.
DICAS
Para um aprofundamento dos temas desse 
tópico, sugerimos que você leia o seguinte livro, que analisa a 
propriedade urbanística e a edificabilidade em terrenos urbanos, 
investigando as funções do plano urbanístico e do potencial 
construtivo na busca de cidades sustentáveis.
14
Neste tópico, vimos que:
• As cidades vêm desenvolvendo e avançando nos cadastros das áreas de 
ocupação irregulares, através de setores de monitoramento de áreas irregulares, 
que têm como objetivo fiscalizar os loteamentos clandestinos, invasões de áreas 
públicas, construções em áreas de risco e núcleos de favelas.
• Muitas cidades vêm aumentando qualificadamente e quantitativamente o 
número de profissionais técnicos para atuarem nestas áreas consideradas ilegais.
• Na década de 1990, as cidades começaram a efetivar os Planos Diretores (PDs), 
que objetivavam de forma geral uma totalidade do urbano e do urbanismo 
moderno.
• A imprecisão e incoerência que estão marcadas nas ações do Poder Executivo 
e Legislativo acabam afetando diretamente o Poder Judiciário, pois é esse que 
tem como dever garantir os direitos assegurados em lei.
• A questão da ocupação urbana vem a cada dia ganhando mais destaque na 
atuação do Poder Judiciário e do Ministério Público.
• Perante a situação acima relatada,o próprio Poder Judiciário não consegue 
aplicar as leis e, por algumas vezes, antes de tentar aplicá-las realiza acordos 
como mecanismos de negociação.
• A diversidade que existe nas cidades e que está oculta (cidade real) para a 
burguesia ou até mesmo para a classe média acaba sendo uma área restritiva 
para as pessoas, ficando isoladas dos centros urbanos.
• Desde o início do século XX, as políticas públicas no Brasil, voltadas para o 
planejamento urbano, sempre tiveram como objetivo resolver as demandas 
sociais da população residente em favelas e nos cortiços, através da retirada 
dessas pessoas das áreas consideradas valorizadas pelo mercado imobiliário, 
sem levar em consideração as questões sociais.
• O interesse econômico é o principal foco das questões das ocupações ilegais, 
onde o jogo de poder é nítido e sem muita flexibilidade.
• No Brasil, a maioria das temporadas de chuvas acontece em diferentes regiões e 
tempo, são infelizmente marcadas por grandes tragédias urbanas, ocasionadas 
pelos fenômenos ambientais, como as enchentes, desmoronamentos, vendavais, 
chegando a ocasionar diversas mortes.
RESUMO DO TÓPICO 1
15
• Relevando a história de formação das cidades, torna-se necessário ressaltar os 
movimentos urbanos que se destacaram durante os anos 70 no Brasil. 
• Esses movimentos tinham o apoio de intelectuais, e como visavam transformação 
das cidades, através das ideias da Assembleia Nacional Constituinte, cobravam 
uma Reforma Urbana.
• A expectativa em torno do desenvolvimento e evolução urbana no Brasil foi 
cenário para superação do modelo arcaico, antigo, pelo sistema capitalista.
• A urbanização foi marcada pelo modelo acelerado e concretado do 
desenvolvimento moderno, que a partir dos anos 80, com o crescimento 
econômico, teve diversas sequelas negativas, como, por exemplo: a baixa 
qualidade de vida, a predação do meio ambiente, aumento da miséria social, 
da violência urbana, entre outros.
• Com a nova correlação de forças sociais que foram amadurecendo no Brasil neste 
período, requereu-se a reformulação do aparelho estatal, a regulamentação da 
relação trabalho e capital e novas regras de crescimento do mercado interno.
• O Estado passa a desenvolver um modelo centralizador, inventor e protecionista 
do processo de acumulação urbano-industrial, e institui uma legislação 
trabalhista, elencando alguns privilégios para o trabalhador urbano sobre o 
trabalhador rural.
• O fenômeno da metropolização das cidades esteve diretamente ligado 
com o crescimento industrial em todo o território brasileiro, resultando na 
industrialização, urbanização, crescimento da classe média, fixação do salário 
e produção de bens de consumo duráveis.
16
1 O clientelismo é caracterizado como marca especialmente distintiva da República 
Velha, onde exercia uma relação dominante de articulação entre o sistema político 
e a sociedade, além de ser referência generalizada para o comportamento político 
e social daquele tempo (SILVA, 2007, p.40). No entendimento de Grahan apud 
Seibel e Oliveira (2006, p.136), o clientelismo constituiu a trama de ligação da 
política no Brasil do século XIX. Durante a primeira república, a vitória eleitoral 
sempre dependeu do uso competente dessa forma de relação, que incidia sobre 
a distribuição de cargos oficiais, sobre a concessão de proteção e outros favores, 
em troca de lealdade política e pessoal.
FONTE: Disponível em: <http://pensamentoplural.ufpel.edu.br/edicoes/10/08.pdf>. Acesso em: 
11 abr. 2016.
Diante da contextualização acima, produza um texto, de no mínimo 
10 linhas, conceituando as consequências do Clientelismo político, para o 
desenvolvimento das cidades.
2 (Adaptado de ENADE, 2010) O Serviço Social como profissão vem ganhando 
espaços nas discussões inerentes às questões ambientais. A discussão 
ambiental como política pública, traz diversas possibilidades de estudos 
interdisciplinares que proporcionam reflexões ligadas ao desenvolvimento 
urbano, à preservação do meio ambiente e à geração de renda, consideram a 
importância das questões para a sociedade, e acabam criando oportunidades 
de atuação profissional para o assistente social. Essas ações acontecem 
através de mobilização, organização das populações que estão de certa 
maneira ameaçadas em decorrência da degradação do seu meio ambiente 
em que vivem ou de educação, visando assim a preservação. 
A educação ambiental, nesse contexto, passa a ser entendida como um dos 
mecanismos mais importantes para a edificação de valores, conhecimentos, 
habilidades e atitudes, e que acaba tendo como objetivos:
a) Valorizar somente as práticas preservacionistas pelo senso comum.
b) Abonar o sigilo sobre dados ambientais que possam causar prejuízos às 
comunidades e que comprometam a segurança nacional.
c) Valorizar a influência dos povos detentores de consciência ambiental sobre 
os crescentes procedimentos de destruição do meio.
d) Favorecer a responsabilização do poder público na preservação do equilíbrio.
e) Instigar e fortalecer uma consciência crítica sobre a problemática ambiental 
e social.
AUTOATIVIDADE
17
TÓPICO 2
A CIDADE: LEGAL x ILEGAL
UNIDADE 1
1 INTRODUÇÃO
Caro acadêmico, este segundo tópico tem o objetivo de apresentar e basear 
os conceitos que estão fundamentados na cidade através da legalidade e ilegalidade.
O direito à cidade, que deveria garantir para toda a população o acesso 
às políticas públicas básicas, não consegue se concretizar por diversos interesses. 
Fator que acaba refletindo na exclusão social.
A questão da legalidade e da ilegalidade faz parte da nossa vivência em 
sociedade. Para podermos comprovar o direito de posse e a legalidade de algum 
bem material, caso não se possua, vive-se na ilegalidade, longe de se ter um 
endereço fixo e de se conseguir o título de propriedade.
Porém, no cotidiano, o profissional de Serviço Social, independentemente 
de sua área de atuação, irá encontrar demandas relacionadas à cidade, seja ela 
legal ou ilegal, pois todo o cidadão está inserido em um espaço, urbano ou rural.
2 A EXCLUSÃO SOCIAL E DO DIREITO A CIDADE
Durante os anos de 1940, os representantes políticos brasileiros visavam 
as cidades como sendo o mecanismo de avanço da modernidade, sobre o modelo 
arcaico que o representava.
Nos anos de 1990, essas mesmas cidades que tinham um potencial de 
urbanização e de industrialização refletiram a figura de um espaço como o avanço 
da violência urbana, dos maus tratos à criança e ao adolescente, do tráfico de 
drogas e de pessoas, da poluição e do desmatamento ambiental.
Sob o ideário positivista, do lema ordem e progresso, o processo de 
industrialização e urbanização tinha como propósito abrir caminho para a 
independência brasileira, que por muitos séculos teve a dominação coronelista. 
UNIDADE 1 | A URBANIZAÇÃO DA PERIFERIA, UMA CONSEQUÊNCIA DO CAPITALISMO
18
 Com o desenvolvimento econômico e o processo de urbanização, a 
evolução da sociedade sofreu o aumento da pobreza em todas as regiões do país. 
A sociedade, como um todo, passou a ser dependente do processo de urbanização 
e de progresso, deixando para trás o modelo da República Velha.
O desenvolvimento urbano passou a ser visto como o futuro das cidades, 
através dele seria possível a realização de conseguir um emprego, de ter o amparo 
do Estado na assistência social, lazer, cultura, habitação e de constituir uma família 
com mais filhos, pois as oportunidades eram muitas. Porém o resultado foi outro.
Nas primeiras décadas do século XX, o Brasil conseguia atender as 
demandas que existiam para os imigrantes e migrantes, através da inserção 
econômica e da melhoria da qualidade de vida, entretanto essas possibilidades 
foram extintas. Como consequência da extinção dessas oportunidades sociais, 
culturais e econômicas, aumentou consideravelmente a exclusão social da 
população em situação de vulnerabilidade social.
Diante das condições precárias de sobrevivência, essa população excluída foi 
obrigada a se isolarem relação a espaço de habitabilidade, formando os chamados 
“bolsões de pobreza”, “ilhas” no meio do espaço urbano. Uma das expressões mais 
importantes desse processo de exclusão social foi a segregação ambiental.
A segregação ambiental, como parte ativa da exclusão social, aconteceu 
devido a dificuldades de acesso da população aos serviços de infraestrutura urbana, 
diminuição do mercado de trabalho e de profissionalização, a disseminação da 
violência urbana, aumento da discriminação racial, aumento da violência contra 
mulheres e crianças, escassez dos serviços de lazer e cultura e burocracia para se 
ter acesso à justiça.
Diante das demandas acima citadas, não se consegue determinar um 
perímetro preciso entre a “população excluída” e a “população incluída”. Essa 
dificuldade se estabelece no Brasil através dos trabalhadores do setor secundário, 
com as indústrias de modelo fordista, sendo eliminados do mercado imobiliário 
privado e passando a habitar as favelas.
Essa exclusão é fruto do processo de industrialização, pois as cidades, 
além de não darem conta de atender a demandas da população, o Estado não 
cumpre seu papel como mentor das políticas públicas, e as indústrias brasileiras, 
com os baixos salários para os trabalhadores. 
Florestan Fernandes (1977, p. 30), refletindo sobre as classes sociais que 
estão alicerçadas na América Latina, afirma que os “dinamismos nucleares e 
determinantes” nas sociedades evidenciam as relações “mais adiantadas e ativas do 
regime de classes". Segundo o autor, existem algumas especificidades nas relações 
entre a sociedade capitalista europeia e norte-americana, e as sociedades latino-
americanas "não se organizam para um desenvolvimento autônomo da economia, 
da sociedade e da cultura". Ele ainda continua pontuando: 
TÓPICO 2 | A CIDADE: LEGAL x ILEGAL
19
Ela (a ordem social competitiva) reconhece a pluralização das estruturas 
econômicas, sociais e políticas como "fenômeno legal". Todavia, não 
a aceita como "fenômeno social" e, muito menos, como "fenômeno 
político". Os que são excluídos do privilegiamento econômico, 
sociocultural e político também são excluídos do "valimento social “e 
do "valimento político". Os excluídos são necessários para a existência 
do estilo de dominação burguesa, que se monta dessa maneira. 
(FERNANDES, 2005, p. 222)
A divisão externa e interna do capital excedente econômico, que é uma 
consequência de vantagens e regalias no desenvolvimento do pensamento 
burguês, ou seja, heranças do sistema colonial que ficaram enraizadas no processo 
de modernização e urbanização da sociedade brasileira, trouxe a exclusão das 
classes sociais de baixa renda no seu processo histórico e social. 
NOTA
Este processo negou a existência de uma classe social formada por cidadãos, 
com direitos sociais que deveriam ser respeitados.
Para Maricato (1995, p. 30):
A exclusão social não é passível de mensuração, mas pode ser 
caracterizada por indicadores como a informalidade, a irregularidade, 
a ilegalidade, a pobreza, a baixa escolaridade, o oficioso, a raça, o sexo, 
a origem e, principalmente, a ausência da cidadania.
A questão da ilegalidade é um dos instrumentos que permite a criação de 
critérios para impor conceitos fundamentais para a compreensão da conjuntura, 
como, por exemplo, o conceito de exclusão, de segregação social, ambiental, 
cultural, econômica, política. Esses conceitos acabam sendo utilizados pelos 
diversos grupos sociais conforme o interesse de cada um. Como, por exemplo, 
um governo municipal pode desenvolver uma política de habitação municipal 
utilizando-se da sua realidade social, ambiental e outras.
Quando se trata da ilegalidade diante das questões relacionadas à 
propriedade de terra, meio rural e urbano, a questão ambiental tem sido eixo 
prioritário nas tomadas de decisões, tanto pelo poder público como pelo poder 
jurídico, e depois vêm os eixos do desenvolvimento social.
 O autor Baldez (2003) enfatiza que, até os anos de 1850, a forma legítima de 
conseguir o direito de posse de terra no Brasil acontecia através da ocupação. Para 
o autor, ainda, a situação do trabalhador livre era acompanhada da emergência 
de legislação sobre o uso da terra, que iria oferecer garantia e continuidade do 
comando e domínio dos latifundiários sobre a produção dessa.
UNIDADE 1 | A URBANIZAÇÃO DA PERIFERIA, UMA CONSEQUÊNCIA DO CAPITALISMO
20
A estruturação, fortalecimento e o crescimento do mercado imobiliário 
estão diretamente ligados ao surgimento de leis específicas para as questões 
urbanas, conforme o interesse de cada grupo.
No final do século passado, os municípios foram obrigados a elaborar 
Códigos Municipais de Posturas. Mesmo sendo uma lei que existe desde o período 
colonial, não tinha a obrigatoriedade de ser elaborada, e sempre teve o objetivo 
de ordenar a complexidade existente na vida urbana. Consequentemente, com 
o crescimento acelerado do meio urbano, os Códigos de Posturas tiveram uma 
determinada perda de importância, como também desenvolveram uma função de 
subordinação de algumas áreas da cidade para o capital imobiliário, resultando 
na expulsão da classe trabalhadora assalariada do centro da cidade.
Entretanto, o Código de Posturas se fortaleceu após a Constituição Federal 
de 1988, quando os municípios passaram a assumir novas funções nas estruturas da 
política nacional, crescendo elevadamente as posturas municipais em todo o país. 
Sendo assim, este código teve um papel fundamental na segregação do espaço urbano.
 
Todo o contexto diante das questões existentes entre mercado fundiário, 
legislação e exclusão social que se evidenciavam nas grandes metrópoles está 
cada vez mais visível em todas as cidades brasileiras, através da ocupação 
desordenada em áreas rejeitadas pelo mercado imobiliário, independentemente 
de ser área privada ou pública, situadas nas encostas dos morros, na beira de 
córregos, nas áreas em quota de enchente ou de risco, regiões completamente 
poluídas ou áreas de proteção ambiental.
Conforme o Censo Demográfico de 2010, do Instituto Brasileiro de 
Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil possui 6.329 aglomerados subnormais, 
favelas, que são em sua maioria superpovoadas, e ainda não estão localizadas 
nos mapas geográficos, considerados como vazios cartográficos.
FIGURA 3 - LOCALIZAÇÃO DAS FAVELAS
FONTE: Disponível em: <http://www.fiapodejaca.com.br/wp-content/uploads/favela-
do-Rio-de-Janeiro.jpg>. Acesso em: 2 mar. 2016.
TÓPICO 2 | A CIDADE: LEGAL x ILEGAL
21
IMPORTANT
E
O Censo 2010 mostra as características territoriais dos aglomerados subnormais 
e suas diferenças das demais áreas das cidades.
Dados do Questionário da Amostra do Censo 2010 evidenciam desigualdades entre a 
população que residia em aglomerados subnormais (assentamentos irregulares conhecidos 
como favelas, invasões, grotas, baixadas, comunidades, vilas, ressacas, mocambos e 
palafitas, entre outros) e a que morava nas demais regiões dos municípios, diferenças estas 
que se evidenciavam também entre as cinco grandes regiões do país. Enquanto 14,7% da 
população residente em outras áreas tinha concluído o Ensino Superior, nos aglomerados 
esse percentual era de 1,6%.
A informalidade no trabalho também era maior nos aglomerados (27,8% dos trabalhadores 
não tinha carteira assinada) em relação às outras áreas da cidade (20,5%). As desigualdades 
também se manifestavam em relação aos rendimentos: 31,6% dos moradores dos 
aglomerados subnormais tinham rendimento domiciliar per capita até meio salário mínimo, 
ao passo que nas demais áreas o percentual era de 13,8%. Por outro lado, apenas 0,9% dos 
moradores dos aglomerados tinham rendimento domiciliar per capita de mais de cinco 
salários-mínimos, percentual que era de 11,2% nas demais áreas da cidade. Os resultados 
da Amostra do Censo para os aglomerados subnormais incluem ainda informações sobre 
escolarização, posse de bens no domicílio e tempo de deslocamento para o trabalho.
Em 2010, o Brasil tinha 15.868 setoresem aglomerados subnormais (cerca de 5% do total 
de setores censitários), que somavam uma área de 169,2 mil hectares e comportavam 
3,2 milhões de domicílios particulares permanentes ocupados nos 6.329 aglomerados 
subnormais identificados. 
Para ampliar o conhecimento da diversidade dos aglomerados subnormais do país, foi 
realizado no Censo Demográfico 2010, pela primeira vez, o Levantamento de Informações 
Territoriais (LIT). O conhecimento dos aspectos territoriais dos aglomerados subnormais é 
importante complemento à caracterização socioeconômica dessas áreas. O LIT mostrou 
que 52,5% dos domicílios em aglomerados subnormais do país estavam localizados em 
áreas predominantemente planas (1.692.567 domicílios), 51,8% tinham acessibilidade 
predominante por ruas (1.670.618 domicílios), 72,6% não possuíam espaçamento entre si 
(2.342.558) e 64,6% tinham predominantemente um pavimento (2.081.977).
Essas e outras informações estão disponíveis na publicação “Censo Demográfico 2010 – 
Aglomerados Subnormais – Informações Territoriais” (acessível em http://www.ibge.gov.
br/home/estatistica/populacao/censo2010/aglomerados_subnormais_informacoes_
territoriais/default_informacoes_territoriais.shtm) e nas tabelas de resultados da Amostra do 
Censo 2010 para Aglomerados Subnormais, publicadas no Banco de Dados Agregados do 
IBGE (SIDRA) (acessível em http://www.sidra.ibge.gov.br/cd/CD2010RGAADAGSN.asp).
FONTE: Disponível em: <http://censo2010.ibge.gov.br/noticias- censo.html?view=noticia&id
=3&idnoticia=2508&busca=1&t=censo-2010-mostra-caracteristicas-territoriais-aglomerados-
subnormais-suas-diferencas-demais-areas-cidades>. Acesso em: 2 mar. 2016. 
UNIDADE 1 | A URBANIZAÇÃO DA PERIFERIA, UMA CONSEQUÊNCIA DO CAPITALISMO
22
A imprecisão que existe entre o legal e o ilegal vai além da totalidade do 
conjunto da sociedade, pois não se pode referenciar como um “Estado paralelo”, 
e sim como uma realidade bem mais intrínseca do que aquela que estamos 
acostumados a visualizar. No decorrer da história da urbanização das cidades, 
o Brasil constituiu dois vieses diversificados: de estruturação e acumulação de 
material, e com a multiplicidade das classes sociais. Mesmo com uma vasta 
legislação que visa a regularização da urbanização, o Brasil, ainda não consegue 
evoluir nesta questão, por falta de interesse dos poderes públicos, que tratam o 
direito à cidade como uma troca de favores meramente políticos.
Quando falamos em segregação urbana, podemos afirmar que ela é 
multidimensional e que a dificuldade do acesso à terra, tanto na área urbana 
quanto na rural, delineou decisivamente as áreas chamadas de “civilizadas” no 
Brasil. Juntamente, aconteceram transformações do modelo produtivo campal. 
Transformações essas que conduziram grande parte da população dependente 
do campo para as cidades em busca de sobrevivência, aumentando, assim, 
significativamente, as áreas periféricas dos centros urbanos.
Alfonsin (2003, p. 70) afirma que “a terra é toda a hipótese da vida”, que 
mesmo com toda a sua importância, a história da humanidade mostra que a luta 
pela posse e propriedade da terra é um processo contínuo e histórico, pois este 
procedimento iniciou na antiguidade, com a valorização e individualização da 
terra como sendo um bem particular, e fortalecendo na Idade Moderna, mesmo 
como decisões jurídicas do Estado Democrático e de Direito.
O processo de individualização e de mercantilização do uso da terra 
estrutura um dos cernes da exclusão populacional do meio rural, sendo definida 
como Questão Agrária, que é fundamentada com as relações determinadas 
como pré-capitalistas. Significando deste modo que o direito de continuar ou 
permanecer na terra foi alterado com o novo modelo capitalista, que mudou as 
relações entre o trabalho e o capital, permeados na livre concorrência econômica, 
visando absolutamente o lucro, pela inciativa privada.
 
A ilegalidade mediante a posse da terra passa a ser vinculada diretamente 
como a questão da exclusão social. O autor Boaventura de Souza Santos (1993), 
em seu estudo da dimensão jurídico-social de Pasárgada, revela que a população 
residente em áreas irregulares tem medo de ser despejada, por isso acaba aceitando 
a situação de ilegalidade em que se encontra.
TÓPICO 2 | A CIDADE: LEGAL x ILEGAL
23
NOTAS SOBRE A HISTÓRIA JURÍDICO-SOCIAL DE PASÁRGADA
Boaventura de Souza Santos
1 INTRODUÇÃO
Este texto faz parte de um estudo sociológico sobre as estruturas internas 
de uma favela do Rio de Janeiro, a que dou o nome fictício de Pasárgada. Tem 
por objetivo analisar em profundidade uma situação de pluralismo jurídico 
com vista à elaboração de uma teoria sobre as relações ente Estado e Direito nas 
sociedades capitalistas. Existe uma situação de pluralismo jurídico sempre que 
no mesmo espaço geopolítico vigoram (oficialmente ou não) mais de uma ordem 
jurídica. Esta pluralidade normativa pode ter uma fundamentação econômica, 
rácica, profissional ou outra; pode corresponder a um período de ruptura social, 
como, por exemplo, um período de transformações revolucionárias; ou pode 
ainda resultar, como no caso de Pasárgada, da conformação específica do conflito 
de classes numa área determinada da reprodução social - neste caso, a habitação.
A favela é um espaço territorial, cuja relativa autonomia decorre, 
entre outros fatores, da ilegalidade coletiva da habitação à luz do direito 
oficial brasileiro. Esta ilegalidade coletiva condiciona de modo estrutural o 
relacionamento da comunidade enquanto tal com o aparelho jurídico-político 
do Estado brasileiro. No caso específico de Pasárgada, pode detectar-se a 
vigência não oficial e precária de um direito interno e informal, gerido, entre 
outros, pela associação de moradores, e aplicável à prevenção e resolução 
de conflitos no seio da comunidade decorrente da luta pela habitação. Este 
direito não oficial - o direito de Pasárgada, como poderei chamar - vigora em 
paralelo (ou em conflito) com o direito oficial brasileiro e é desta duplicidade 
jurídica que se alimenta estruturalmente a ordem jurídica de Pasárgada. Entre 
os dois direitos estabelece-se uma relação de pluralismo jurídico extremamente 
complexa, que só uma análise muito minuciosa pode revelar. Muito em geral 
pode dizer-se que não se trata de uma relação igualitária, já que o direito de 
Pasárgada é sempre e de múltiplas formas um direito dependente em relação 
ao direito oficial brasileiro. Recorrendo a uma categoria da economia política, 
pode-se dizer que se trata de uma troca desigual de juridicidade entre as classes 
cujos interesses se espalham num e noutro direito.
A análise da ordem jurídica de Pasárgada circunscreve-se, no que 
interessa para este estudo, aos recursos internos que são mobilizados para 
prevenir e resolver conflitos decorrentes da propriedade ou posse da terra e dos 
direitos sobre construções (casas e barracos) que nesta se implantam. É através 
da análise dos tipos de conflito e dos seus modos de resolução que melhor se 
surpreende o direito de Pasárgada em ação, isto é, enquanto prática social. Esta 
análise, feita num certo momento do desenvolvimento de Pasárgada, requer, 
para ser completa, a inclusão de uma dimensão histórica. Mais concretamente, 
trata-se de saber como se constituíram e se desenvolveram, a partir da formação 
da favela, as normas e as formas jurídicas e os órgãos de decisão jurídica, 
UNIDADE 1 | A URBANIZAÇÃO DA PERIFERIA, UMA CONSEQUÊNCIA DO CAPITALISMO
24
que hoje se centram à volta da associação de moradores e de outros polos de 
organização comunitária autônoma, que continuam a subsistir, ainda que de 
modo cada vez mais precário, anos depois do apogeu do desenvolvimento 
comunitário do início da década de 60.
[...] As dificuldades da investigação histórica no domínio sociojurídico 
são inúmeras, sobretudo quando o objetivo é capturar a gênese das formas 
e estruturas jurídicas. As dificuldades são ainda maiores quando, como no 
caso presente, é quase total a carência de documentaçãoescrita. Para as obviar, 
recorri a entrevistas com os moradores mais antigos de Pasárgada e sobretudo 
com aqueles que ali viveram desde o início da comunidade. É sabido que este 
método sociológico tem muitas limitações e que o rigor do conhecimento através 
dele obtido é sempre muito problemático. E isto é tanto mais assim quando 
se trata de pesquisar "questões jurídicas" porque, consoante a perspectiva 
analítica usada pelo entrevistador, tais questões, ou se referem a fatos que não 
ultrapassam os umbrais de um quotidiano, por vezes longínquo, ou envolvem 
mitos e tabus à volta dos quais o conhecimento e o desconhecimento social se 
organizam estratégica e "caprichosamente". [...]
OS MAUS E VELHOS TEMPOS
Quando os primeiros habitantes se fixaram em Pasárgada em meados 
da década de 30, existia muita terra disponível. Cada morador demarcava o seu 
pedaço de terra e construía seu barraco, deixando em geral espaços abertos para 
o cultivo de verduras, plantio de árvores ou para criação de animais domésticos. 
Segundo os mais antigos moradores de Pasárgada, naquela época quase não 
existiam conflitos entre os habitantes envolvendo direitos sobre a terra e as 
habitações. "Não havia necessidade de brigas", dizem eles. Os barracos eram 
de construção muito primitiva, pouco valor tendo. Podiam ser construídos ou 
demolidos em questão de horas. Por outro lado, uma vez que existia muita 
terra desocupada, qualquer conflito relacionado com a posse da terra (limites, 
preferências e servidões) poderia ser evitado facilmente com a simples mudança 
de uma das partes do conflito para outro lugar no morro. 
Mas o povoado cresceu muito rapidamente e a qualidade das construções 
melhorou consideravelmente, de tal modo que na segunda metade da década 
de 40 eram já frequentes os conflitos envolvendo a propriedade e a posse 
da terra. Quando se pergunta aos moradores mais antigos a maneira como 
naquela época tais conflitos eram resolvidos, eles respondem invariavelmente: 
"violência, a lei do mais forte". Quando, a fim de evitar, em alguma medida, 
distorções de percepção e de memória, se procura obter informações com base 
num paralelo entre o modo como os conflitos eram tratados naquele tempo e 
como são tratados agora, é frequente obter-se uma resposta deste teor: "Oh! 
Agora é diferente. Agora as questões são tratadas em paz e tenta-se decidir de 
acordo com a justiça. Naquela época, eram resolvidas com facas e revólveres". 
Este tipo de resposta envolve ainda uma certa distorção, porque não é verdade 
TÓPICO 2 | A CIDADE: LEGAL x ILEGAL
25
que hoje em dia todos os conflitos sejam pacificamente resolvidos, muito 
embora não seja menos verdade em Pasárgada do que o é na sociedade brasileira 
em geral. À luz de informações obtidas e tendo em conta a possibilidade de 
distorção, é talvez seguro concluir que a probabilidade de relações sociais 
pacíficas envolvendo a propriedade e a posse da terra e o tratamento também 
pacífico dos conflitos decorrentes de tais relações é hoje muito mais elevada do 
que há 20 ou 30 anos.
O aumento da violência, numa primeira fase da história de Pasárgada, 
resulta, obviamente, de uma pluralidade de fatores. Entre eles apenas se 
referem dois que têm mais pertinência para os objetivos do presente estudo: por 
um lado, a indisponibilidade ou inacessibilidade estrutural dos mecanismos 
de ordenação e controle social próprios do sistema jurídico brasileiro; por 
outro lado, a inexistência de mecanismos alternativos, de origem comunitária, 
capazes de exercer, ainda que de modo diferente e apenas nos limites da 
comunidade, funções semelhantes às dos mecanismos oficiais. No que respeita 
ao primeiro fator, a indisponibilidade diz-se estrutural, sempre que as suas 
razões transcendem ao domínio motivacional e, portanto, o nível de eventos da 
interação social, independentemente do grau de universalização desta. Entre 
os mecanismos oficiais de ordenação e controle social, serão referidos dois: a 
Polícia e os Tribunais.
A Polícia não tinha delegacias em Pasárgada e, mesmo se as tivesse, é 
improvável que fossem solicitadas pela população para intervir em casos de 
conflito, e as delegacias policiais nas áreas urbanizadas próximas também não 
eram chamadas a agir. Quando se pergunta aos moradores mais antigos as 
razões porque eles não usavam os serviços da Polícia, eles primeiro riem pela 
surpresa que lhes causa tal pergunta - tão óbvia é a resposta -, depois fazem 
um esforço para expressar o óbvio. Desde os primórdios da ocupação do morro, 
a comunidade "entendeu" que estava numa contínua luta com a Polícia. Antes 
de os terrenos de Pasárgada passarem para o domínio público, várias foram as 
tentativas empreendidas pela Polícia para expulsar em massa os moradores. E 
mesmo depois disso, a sobrevivência da comunidade nunca esteve garantida, 
uma vez que se conheciam casos de remoção de favelas construídas em terrenos 
do Estado. Chamar a Polícia aumentaria a visibilidade de Pasárgada como 
comunidade ilegal e poderia eventualmente criar pretextos para remoção.
Outros fatores contribuíram ainda para que a Polícia fosse vista como 
um inimigo pelos moradores de Pasárgada. Criminosos, suspeitos, vagabundos 
e em geral "maus elementos" eram considerados pela Polícia como formando 
uma considerável proporção da população de Pasárgada. Por conseguinte, 
pelo que contam desse tempo (que não é, neste aspecto, muito diferente do 
tempo presente), a Polícia fazia incursões repressivas, isto é, dava batidas na 
comunidade com muita frequência. Estas batidas eram tão ineficientes do ponto 
de vista de objetivos policiais quanto eram repugnantes para os moradores que 
delas eram vítimas. Aqueles que de fato eram "maus elementos" quase nunca 
UNIDADE 1 | A URBANIZAÇÃO DA PERIFERIA, UMA CONSEQUÊNCIA DO CAPITALISMO
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eram apanhados e as pessoas inocentes eram levadas com frequência para 
prisões de onde não eram libertadas a não ser através de suborno.
Neste contexto, e mesmo colocando de lado perigos envolvidos, não 
existia qualquer propósito útil em chamar a Polícia em caso de conflito. Se a 
vítima, ou, em geral, a pessoa prejudicada chamasse a Polícia, sabia que esta 
provavelmente não se disporia a vir (a menos que por outros motivos tivesse 
nisso interesse) e, se viesse, o culpado e todas as relevantes testemunhas já teriam 
então desaparecido ou, se não, quando interrogadas, fugiam o possível para não 
fornecer quaisquer informações úteis. Por outro lado, o morador que chamasse a 
Polícia seria considerado traidor ou informante (caguete) pelos outros moradores 
e isso poderia fazer perigar a sua permanência na comunidade.
Não existe razão para duvidar da exatidão deste relato, tanto mais que 
ele se refere a comportamentos e atitudes que continuam ainda hoje a constituir, 
em grande parte, o quotidiano das relações entre os moradores de Pasárgada 
e a Polícia. Apesar de ter agora delegacia em Pasárgada, a Polícia continua a 
desempenhar um papel mínimo na prevenção e na resolução de conflitos. Não 
obstante os seus esforços no sentido de uma aceitação mais positiva por parte 
da comunidade, continua a ser vista por esta como uma força hostil investida 
de funções estritamente repressivas.
Para além da Polícia (ou em complemento à ação desta), os tribunais 
constituem outro mecanismo oficial de ordenação e controle social a que os 
habitantes de Pasárgada poderiam, em teoria, recorrer para prevenir ou 
resolver conflitos internos de natureza jurídica. Tal recurso estava, no entanto, 
igualmente vedado e várias são as razões apontadas pelos moradores mais 
velhos para tal fato. Em primeiro lugar, juízes e advogados eram vistos como 
demasiado distanciados das classes baixas para poder entender as necessidades 
e as aspirações dos pobres. Em segundo lugar, os serviços profissionais dos 
advogados eram muito caros. Segundo a descrição de um dos moradores, 
"nós estávamos brigando por barracos e pedaços de terra que, do ponto de 
vista dos advogados, não valiam nada.Além disso, quando você contrata um 
advogado, você é de uma classe mais baixa do que a dele e ele fica muito a fim 
de fazer acordos com outros advogados e com o juiz, que podem prejudicar 
os seus interesses. Então ele vem a você com aquele jeito de falar de advogado 
e tenta convencer que foi o melhor que ele podia fazer por você, e que, afinal 
de contas, o acordo não é tão mau assim. E você não pode fazer nada". Esta 
observação, embora referida a atitudes para com os advogados na época inicial 
de Pasárgada, baseia-se provavelmente em experiência e percepções adquiridas 
muito tempo depois. Em qualquer caso, pressupõe um conhecimento bastante 
íntimo da ação dos advogados que duvido fosse comum em Pasárgada há 
20 ou 30 anos. Comum era (e continua a ser) a ideia de que os serviços dos 
advogados são muito caros e, por isso, longe do alcance das posses das classes 
mais baixas. Uma terceira razão invocada pelos moradores de Pasárgada para 
não recorrerem aos tribunais reside no fato de saberem desde o início que a 
TÓPICO 2 | A CIDADE: LEGAL x ILEGAL
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comunidade era ilegal à luz do direito oficial, quer quanto à ocupação da terra, 
quer quanto aos barracos que nela iam construindo. Na expressão perspicaz 
de um deles, "nós éramos e somos ilegais". Recorrer aos tribunais para resolver 
conflitos sobre terras e habitações não só era inútil como perigoso. Era inútil 
porque "os tribunais têm que seguir o código e pelo código nós não tínhamos 
nenhum direito". Era perigoso porque trazer a situação ilegal da comunidade à 
atenção dos serviços do Estado poderia levá-los a "nos jogar na cadeia".
Esta série de observações requer uma análise detalhada, porque esclarece 
alguns aspectos básicos da gênese e estrutura da ordem jurídica interna de 
Pasárgada. A expressão "nós éramos e somos ilegais", que, no seu conteúdo 
semântico, liga o status de ilegalidade com a própria condição humana dos 
habitantes de Pasárgada, pode ser interpretada como indicação de que nas 
atitudes destes para com o sistema jurídico nacional tudo se passa como se 
a legalidade da posse da terra se repercutisse sobre todas as outras relações 
sociais, mesmo sobre aquelas que nada têm com a terra ou com a habitação. 
Tal seria o caso se, por exemplo, um conflito jurídico de índole estritamente 
pessoal não fosse levado à atenção dos operadores do sistema jurídico nacional, 
pela suspeita das partes de que a ilegalidade do seu status residencial afetasse 
desfavoravelmente o modo como o conflito seria processado pelos tribunais. 
Não tenho provas cabais do funcionamento deste mecanismo de feedback e 
julgo que seria muito difícil, senão impossível, obtê-las. Na verdade, apesar 
de a inacessibilidade dos tribunais em relação aos conflitos envolvendo terras 
ocupadas por favelas assumir aspectos peculiares à luz da inexistência ou 
nulidade legal dos respectivos títulos de propriedade e de posse, é necessário 
reconhecer que tal inacessibilidade é geral em relação aos problemas jurídicos 
das classes baixas, residindo ou não em favelas e constitui, por isso, uma das 
manifestações mais evidentes da natureza classista do aparelho jurídico do 
Estado numa sociedade capitalista.
No entanto, em muitas entrevistas com os moradores de Pasárgada 
obtive declarações nas quais a ideia do mecanismo de feedback é subentendida. 
Eis uma declaração típica: "parece que, somente porque a terra não é nossa, o 
Estado não tem obrigação de nos fornecer água e luz elétrica e a Polícia pode 
invadir nossas casas quando bem entende. Existem mesmo patrões que recusam 
candidatos a emprego quando estes dão endereço numa favela". O significado 
implícito deste extrato de entrevista é que, de acordo com os princípios de 
justiça, a ilegalidade da posse da terra nas favelas não se deveria repercutir 
sobre a provisão de serviços públicos pelo Estado ou sobre o comportamento 
da Polícia e dos patrões. No contexto em que esta declaração foi feita, significa 
também que o mecanismo de feedback, embora existindo de fato, não é sequer 
legal em face do sistema jurídico oficial. Na realidade, o feedback é legal no que 
respeita à provisão de serviços públicos referidos. De acordo com as leis gerais 
e com as disposições do código urbano, o fornecimento por parte do Estado de 
serviços públicos, tais como água, esgoto, luz elétrica, pavimentação, é limitada 
a áreas cuja utilização tenha sido aprovada nos termos da legislação em vigor. 
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No que respeita ao comportamento da Polícia, foi possível, depois de algumas 
entrevistas com policiais trabalhando noutras favelas, confirmar a disparidade 
entre o direito nos livros e o direito na prática. Indiferente ao disposto na lei, 
a Polícia tende a agir segundo o princípio de que, uma vez que os favelados 
estão ilegalmente domiciliados, não têm razões para reclamar quando a Polícia 
invade suas casas "no cumprimento do dever”. 
A análise da expressão "nós éramos e somos ilegais" parece indicar que 
a ideia de uma capitis diminutio geral (de uma ilegalidade quase existencial) 
e a prática social em que ela se espelhou e reforçou agiram como fatores 
bloqueantes do acesso aos tribunais. O estatuto (e, portanto, os limites) desta 
declaração de ilegalidade encontra-se precisado na expressão, também já 
mencionada, de que "os tribunais têm que observar o código e pelo código nós 
não tínhamos nenhum direito". Juntamente com a anterior, esta citação mostra 
a ambiguidade profunda da consciência popular do direito nas sociedades 
caracterizadas por grandes diferenças de classes. Por um lado, a apreciação 
realista de que o direito do Estado é o que está nos códigos e de que nem estes 
nem os juízes, que têm por obrigação aplicá-lo, se preocupam com as exigências 
de justiça social. Por outro lado, o reconhecimento implícito da existência de 
um outro direito, para além dos códigos e muito mais justo que estes, à luz 
do qual são devidamente avaliadas as condições duríssimas em que as classes 
baixas são obrigadas a lutar pelo direito à habitação.
CONCLUSÃO
Da discussão procedente conclui-se que, para além das razões 
diretamente econômicas, o estatuto de ilegalidade da comunidade favelada 
e o bloqueamento ideológico que lhe foi concomitante criaram uma situação 
de indisponibilidade ou inacessibilidade estrutural dos mecanismos oficiais 
de ordenação e controle social. Esta situação poderia ter sido de algum 
modo neutralizada, se, entretanto, se tivessem desenvolvido na comunidade 
mecanismos internos, informais e não oficiais, capazes de articular e exercer uma 
legalidade e uma jurisdição alternativas para vigorar dentro da comunidade. 
Sucede, no entanto, que na fase da história de Pasárgada que estamos a 
analisar, tais mecanismos não surgiram e nem surpreende que assim tenha 
sido. A existência de tais mecanismos pressupõe um índice bastante elevado 
de organização comunitária, que obviamente não existia ao tempo. Mesmo 
hoje, numa altura em que Pasárgada é já uma velha e estável comunidade, 
a sua organização é ainda baseada numa pluralidade de redes de ação social 
frouxamente estruturadas. É de suspeitar que, quando a comunidade era muito 
mais jovem e ainda em processo de formação, a sua organização social fosse 
ainda mais precária e totalmente desprovida de qualquer polo centralizador.
A indisponibilidade estrutural dos mecanismos oficiais da ordenação e 
controle social e a ausência de mecanismos não oficiais comunitários criaram 
uma situação que designarei por privatização possessiva do direito. É uma 
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situação susceptível de ocorrer, por exemplo, em sociedades muito jovens 
constituídas à margem dos estatutos organizativos definidos, como é o caso 
da sociedade de fronteira, ou em sociedades em fase de ruptura (devido a 
revolução, guerra, etc.) e de desestruturação e reestruturação profundas. Esta 
situação caracteriza-se pela apropriação individual da criação e aplicação

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