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Fundação Biblioteca Nacional ISBN 978-85-387-3099-6 C IÊ N C IA S SO C IA IS N A S O R G A N IZ A Ç Õ ES CIÊNCIAS SO CIAIS N A S ORGA N IZA ÇÕES CI ÊN CI AS SO CI AIS N A S OR GA N IZ A ÇÕ ES M ÁR CI A LO ND ER O Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Márcia Londero Ciências Sociais nas Organizações IESDE Brasil S.A. Curitiba 2012 Edição revisada Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br © 2008 – IESDE Brasil S.A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito dos autores e do detentor dos direitos autorais. CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ __________________________________________________________________________________ L838c Londero, Márcia Ciências sociais nas organizações / Márcia Londero. - 1.ed., rev. - Curitiba, PR : IESDE Brasil, 2012. 156p. : 28 cm Inclui bibliografia ISBN 978-85-387-3099-6 1. Sociologia organizacional. I. Título. 12-6855. CDD: 302.35 CDU: 3.07 20.09.12 08.10.12 039329 __________________________________________________________________________________ Capa: IESDE Brasil S.A. Imagem da capa: Shutterstock IESDE Brasil S.A. Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200 Batel – Curitiba – PR 0800 708 88 88 – www.iesde.com.br Todos os direitos reservados. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Sumário O surgimento da Sociologia e suas principais contribuições | 7 O desenvolvimento da Sociologia e a Sociologia do Desenvolvimento | 12 A Sociologia do Desenvolvimento | 13 Sociologia do Desenvolvimento, Sociologia do Trabalho e Sociologia das Organizações | 19 As contribuições da Sociologia clássica | 19 A evolução histórica do pensamento econômico no Brasil | 20 Diferentes formas de organização do trabalho | 22 Analisando racionalmente as organizações | 24 Conceitos básicos para a compreensão da vida social | 33 O objeto de estudo da Sociologia das Organizações | 33 Sociabilidade e socialização | 34 Convívio social, isolamento e contato | 34 Interação | 37 Relação indivíduo-sociedade | 40 Características e tipologias dos principais grupamentos sociais | 47 Grupos sociais | 48 Os agregados sociais | 50 Mecanismos de sustentação dos grupos sociais | 52 Organizações e sociedade | 59 Conceito de organizações | 59 Teorias das organizações: o enfoque sociológico | 60 Classificação e objetivos das organizações | 63 Novas abordagens teóricas das organizações | 69 A teoria das relações humanas | 70 A teoria dos sistemas | 74 A teoria contingencial | 75 O poder nas organizações | 81 O conceito de poder | 82 O poder organizacional | 83 As principais fontes de poder nas organizações | 85 Liderança nas organizações | 86 Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br O estudo das empresas pela compreensão de sua cultura | 93 Definindo cultura | 93 Mudança social | 93 Cultura organizacional | 94 As subculturas organizacionais | 96 A mudança organizacional | 97 A inovação | 98 Grau de resistência à mudança | 100 As organizações e suas relações com o entorno | 105 A influência das culturas nacionais nas organizações | 105 As interdependências institucionais da empresa | 107 A empresa e a estrutura educacional | 107 A empresa e as relações com a estrutura hierárquica nacional | 108 A empresa e a família | 108 A empresa e o Estado | 109 Democracia e estrutura hierárquica nas organizações modernas | 110 Concluindo | 111 Aprendizagem organizacional | 119 As relações entre ator e empresa: a força do coletivo | 119 A empresa como produtora de cultura | 120 A aprendizagem cultural | 121 Quatro tipos de identidades no trabalho | 122 As organizações que aprendem | 123 Inovação tecnológica e organizacional | 131 As transformações impulsionadas pela implementação de novas tecnologias na empresa | 131 A influência da tecnologia para uma boa organização | 132 As relações entre tecnologia e estrutura | 133 A previsão das mudanças nas organizações | 135 Novas tecnologias, novos horizontes | 136 Novas perspectivas para a inovação nas organizações | 137 A globalizaçãoe as organizações | 143 As novas formas de organização | 144 As organizações em rede | 145 A organização pós-moderna | 146 A responsabilidade social | 147 Referências | 153 Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Apresentação Uma fronteira não é o ponto onde algo termina, mas, como os gregos reconheceram, a fronteira é o ponto a partir do qual algo começa a se fazer presente. Martin Heidegger (apud BHABHA, 1998, p. 19) Deparamos-nos hoje com imensas transformações políticas e econômicas de alcance mundial que abalam as formas mais íntimas de nos relacionarmos com o planeta. As noções de tempo e espaço relativizadas pelos avanços tecnológicos, principalmente nas áreas de informática e telemática, nos colocam grandes questões. As informações e os contatos com as pessoas feitos através dessas novas tecnologias vêm revolucionando o nosso modo de vida como um todo. Visões dicotômicas sobre o que é moderno e o que é arcaico, o que é real ou virtual, o perto e o distante, o possível e o impensável se revelam ultrapassadas. As novas tecnologias impulsionam modificações profundas e nos impelem para caminhos incertos, ainda não traçados. Perdemos o apoio das tradições, mas vivemos hoje em um cenário de possibilidades. As organizações, nessa conjuntura, sustentam e fazem crescer a globalização transformando-se em uma estrutura cada vez mais aberta e permeável às situações da sociedade como um todo. Apesar de tantas incertezas, as ciências continuam contribuindo para iluminar os novos caminhos ainda em construção. A realidade dinâmica de hoje nos ajuda a refletir sobre o novo, e o que era impensável até pouco tempo, hoje pode ser realizável. Por isso, esperamos que essa nova realidade global sirva de referência para a construção de novas atitudes e valores mundiais que devam ser assumidos por todos, mas destacamos neste trabalho o papel das organizações que objetivam construir uma sociedade mais justa e responsável. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br O surgimento da Sociologia e suas principais contribuições Márcia Londero* Ciência é um conceito presente em muitas de nossas falas e ao longo da história tem sido defini- da de diferentes formas. Em qualquer explicação que se dê ao termo, encontraremos: certeza, previsão, lei. Por mais distintas que sejam as explicações, todas elas convergem para a indicação de alguns quesi- tos indispensáveis para a sua compreensão. Ciência é conhecimento provado através da observação e da experimentação. Nesta definição entendemos que: os conhecimentos articulados entre si formam uma teoria que constantemente está sendo :::: posta à prova; essa teoria ou conjunto de conhecimento foi gerada através de uma investigação criteriosa, :::: metodológica com respeito à lógica ou à coerência; a investigação é realizada de forma objetiva, sem opiniões pessoais dos pesquisadores que :::: possam interferir no resultado; investigação empírica significa que o conhecimento é obtido a partir de experiências e tenta-:::: tivas repetitivas, que podem assegurar os seus resultados. É possível existir conhecimento que não seja científico? Sim, se considerarmos que é possívelassimilar um conjunto de informações acerca de fenôme- nos da natureza e de fenômenos que ocorrem na sociedade e na vida das pessoas em geral. No entanto, mesmo as experiências mais marcantes como, por exemplo, o nascimento de um filho ou a participa- ção de um grupo de bombeiros em um incêndio, por serem exclusivas de uma pessoa ou de um grupo, * Mestre em Sociologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Graduada em Ciências Sociais pela UFRGS. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br não poderão ser reproduzidas sempre com o mesmo resultado. Um pescador pode, por exemplo, saber bem onde estão os melhores cardumes, um agricultor pode saber, pela experiência acumulada ao lon- go de anos de observação e trabalho, das melhores colheitas e do tempo, mas esta experiência é subje- tiva, pessoal, não pode ser reproduzida por outras pessoas. Diante disso, podemos entender que a Ciência se diferencia do senso comum, do saber que o in- divíduo acumula tendo como base informações de seu grupo, crenças pessoais. Todas as experiências que acumulamos são chamadas de conhecimento, mas nem todo conhecimento é científico, pois não advém da busca sistemática, metodológica e nem podem ser repetidas com o mesmo resultado. Contexto histórico do desenvolvimento das ciências: o surgimento da Sociologia Encontramos na Filosofia grega importantes subsídios para a divisão das ciências. Não poderia ser diferente, uma vez que a Filosofia antiga é a gênese de muitas ciências. Na Antiguidade, a Filosofia abarcava todos os conhecimentos. A primeira classificação das ciências foi dada por Aristóteles (384- 322 a.C.). Ele esquematiza as ciências da seguinte forma: ciências teóricas (Física, Matemática, Metafísica);:::: ciências práticas (lógica e moral).:::: As obras O Elogio da Loucura, de Erasmo de Rotterdam (1466-1536), O Leviatã, de Thomas Hobbes (1588-1679) e outras que as precederam, surgidas do Renascimento, tais como O Príncipe, de Maquiavel (1469-1527), Utopia, de Thomas Morus (1478-1535) e Nova Atlântida, de Francis Bacon (1561-1626), foram de suma importância para as Ciências Sociais e contribuíram para o desenvol- vimento desta porque marcaram os primórdios das preocupações da ciência com o mundo social. Esses autores construíram análises sobre as diferentes formas de organização da política; estudos sobre o Estado e as formas de governar e também trabalharam teoricamente propondo compara- ções e requisitos para a construção de sociedades ideais, como foi o caso da obra de Francis Bacon, Nova Atlântida. Alguns anos depois, Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), reconhece a decisiva influência da so- ciedade sobre o indivíduo em sua obra O Contrato Social (1762), ressaltando o poder da sociedade em transformar o homem, que, segundo ele, ao nascer, é por essência um homem bom e a vida social é que o corrompe. Mas foi no final do século XVIII, início do século XIX, com Auguste Comte (1798-1857), Herbert Spencer (1820-1903), Jean Gabriel de Tarde (1843-1904) e principalmente com Émile Durkheim (1858- 1917), Max Weber (1864-1920) e Karl Marx (1818-1883), que a investigação dos fenômenos sociais ga- nhou um caráter verdadeiramente científico. Auguste Comte, referendado pelo crescimento das explicações científicas, baseia-se num princí- pio mais rigoroso para classificar a Ciência. Subdivide as ciências segundo sua complexidade crescen- te e sua generalidade decrescente, o que resulta no seguinte: Matemática, Mecânica, Física, Química, Biologia, Psicologia e Sociologia. Essas classificações ilustram como historicamente as concepções de ciência foram se configurando. Atualmente sabemos que não abarcam a totalidade das diferentes for- mas sistematizadas do conhecimento. 8 | O surgimento da Sociologia e suas principais contribuições Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 9|O surgimento da Sociologia e suas principais contribuições A crescente credibilidade alcançada pelo pensamento científico contribuiu para o surgimento da Sociologia. Sob a perspectiva da população da Europa da época, eram vitoriosas as mudanças que a Revolução Industrial e a era dos inventos trazia para o modo de vida cotidiana. As ideias de progresso e avanço do controle da natureza pelo homem encantavam e aceleravam o crescimento científico com os investimentos dos próprios capitalistas industriais deste período nesta área. Se o homem pode con- trolar cada vez mais os fenômenos da natureza, por analogia poderá controlar também os fenômenos sociais. A Ciência volta-se então à análise do mundo social. Métodos sociológicos mais relevantes A preocupação em compreender o meio social trouxe à tona a necessidade de encontrar também o meio racionalmente mais adequado para chegar a este objetivo. Foi daí que vieram as primeiras dis- cussões sobre o método científico das ciências sociais. O campo de estudos das ciências sociais recém constituído define, de forma ambiciosa, um con- junto de saberes acerca de aspectos da vida social ou da realidade social concreta. As disciplinas como Antropologia, Sociologia, Economia, Geografia, Psicologia, Etnologia, História e Ciência Política formam um conjunto sistemático, aceito como o bojo estrutural das Ciências Sociais. Nesse sentido, apresenta-se também para todas as Ciências Sociais a importância do quadro me- todológico, válido indistintamente para cada uma das disciplinas elencadas. Veremos brevemente algu- mas características neste capítulo. A metodologia nas Ciências Sociais compõe um amplo conjunto de procedimentos usados para se chegar ao conhecimento com segurança e rapidez. São considerados os diferentes princípios e técnicas para a realização de uma investigação: a indução;:::: a dedução;:::: a observação;:::: a coleta de dados;:::: os questionários;:::: a análise e interpretação de dados.:::: A indução é o método que concebia o conhecimento como resultado da experimentação suces- siva e da utilização da manipulação empírica, ou seja, concreta, pregada por Francis Bacon (1561-1626) desde o fim do Renascimento. A Ciência é conhecimento objetivo porque podemos prová-la concreta- mente. Por outro lado, René Descartes (1596-1650) defendia a validade do método dedutivo, ou seja, aquele que possibilitava descobertas através do encadeamento lógico de hipóteses elaboradas a partir da atividade primordial da razão. Podemos dizer que a Ciência começa com a observação e que a observação produz uma base se- gura de onde deriva o conhecimento. A teoria é baseada na maneira rigorosa com que obtemos os dados a partir da observação e da experimentação. A Ciência é baseada naquilo que podemos observar com Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br nossos sentidos, ver, ouvir, tocar etc. Mas também podemos dizer que para tornar mais preciso o nosso olhar, a observação científica da realidade necessita da teoria, uma não pode prescindir da outra. A coleta de dados orientada pela teoria e perpassada pela observação é o passo seguinte, em que selecionamos os dados relevantes para explicar o fenômeno que estudamos. Questionários, formulários, ou entrevistas fechadas e abertas são técnicas utilizadas pelos dife- rentes métodos e vão ser escolhidas a partir das características dos dados a serem coletados e do obje- to a ser analisado. Esses dados podem ser levantados através de pesquisa bibliográfica, em documentos históricos ou através de material coletado por nós mesmos em entrevistas ou questionários. A análise e interpretação dos dados coletados aparece como o último passo a ser realizado para se chegar a uma conclusão sobre o fenômeno estudado. A pesquisa, portanto, engloba um conjunto de instrumentos para a investigação, cujo objetivo é tentar solucionar e explicar um problema ou um fenômeno. Em Ciências Sociais são usados diferentes métodos, alguns comunsa outras ciências, outros específicos das Ciências Sociais, a saber: Empirismo, Positivismo, Estruturalismo, Funcionalismo, Marxismo. O Empirismo acredita que a Ciência é baseada na observação dos fenômenos concretos, em opo- sição à influência religiosa que propunha a fé como explicação maior. O Positivismo, criado por Auguste Comte, baseia-se na suposição de que é possível observar a vida social e reunir conhecimentos válidos sobre como ela funciona. Esses conhecimentos então seriam utili- zados para aperfeiçoar a vida social. A Sociologia deveria interessar-se apenas pelo que pode ser obser- vado com os sentidos, de maneira que os críticos desta corrente apontam a falha da análise em não levar em consideração a subjetividade do real que não pode ser percebida pela mera observação dos fatos. O estruturalismo defende que existem, na sociedade, estruturas subjacentes, que não podem ser observadas diretamente, mas que são concretas e modelam a vida social, como por exemplo a estrutu- ra social e a cultura. Pode-se também conceber o método como o referencial teórico ou conhecimento prévio a orien- tar a busca científica. Nas Ciências Sociais, utilizamos duas grandes correntes metodológicas ou dois grandes métodos: o Funcionalismo e o Marxismo. Funcionalismo:::: : também chamado de organicismo. Deriva da palavra “organismo”, que é a for- ma como entende a sociedade, tal como um organismo vivo, onde as partes estão integradas num todo, harmoniosamente vinculadas entre si. Qualquer problema ocasional que surja é tido como uma patologia, um caso anormal que a sociedade terá de sanar. Um autor clássico desse método é Émile Durkheim (1858-1917). O método funcionalista predominou como instrumento teórico até meados de 1950, e marcou trabalhos importantes na Antropologia e na Linguística. O Funcionalismo interpreta a realidade social pela harmonia e funcionamento equilibrado entre todas as instituições sociais. Marxismo:::: : também chamado de dialético e histórico-crítico. Embora considerado ao mesmo tempo uma filosofia da história, um método de investigação e, em alguns sistemas políticos, um dogma, a produção de Karl Marx (1818-1883) marca a introdução de conceitos obtidos da Filosofia, no sentido de estudar a vida social e sua dinâmica própria. A dialética compreen- de uma tese e uma antítese que se chocam constantemente e resultam em uma outra tese. O marxismo interpreta uma realidade social estimulada pelo conflito ou luta de classes. 10 | O surgimento da Sociologia e suas principais contribuições Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 11|O surgimento da Sociologia e suas principais contribuições Principais pensadores e leituras clássicas das Ciências Sociais Os clássicos das Ciências Sociais interpretaram a sociedade e os problemas dela oriundos, cada um a seu tempo e momento histórico-cultural. Atualmente, as Ciências Sociais avançaram tanto em metodologia quanto em teoria, que compartilham o cosmopolitismo do universo científico, ou seja, hoje se pode adotar, com facilidade, diversos recursos metodológicos de diferentes correntes ao mes- mo tempo, fazendo uso da melhor combinação entre eles para alcançar a compreensão do fenômeno estudado. Paulatinamente, está se construindo o conceito de que pertencemos a um mesmo grupamen- to e a uma mesma espécie, a espécie humana que, para os pessimistas, parece não estar dando certo. Sabemos que pensamos da mesma forma, mas encontramos no mundo social tantos problemas que é preciso encontrar respostas coerentes ou pelo menos que aliviem e tornem a existência humana um pouco mais compreensível. A leitura dos clássicos é de fundamental importância para alunos que se dediquem ao estudo da sociedade. Cada leitura ou obra postula uma seguinte, pois vislumbra mais aberta e ampla a paisagem. Para efeito de estudos num curso de Ciências Sociais, e tendo em vista o objetivo desta discipli- na que enfoca organizações em particular, elencamos obras e autores de diferentes matizes que se tornaram clássicas pela abordagem que oferecem aos estudos nesse campo, mas é importante frisar que não pretendemos esgotar toda a gama de pensadores que contribuíram de forma importante na constituição do campo de estudos desta ciência. Embora classificados em uma delas, os pensadores, como já dissemos, incorporam no bojo de seus escritos o contexto histórico e político da época em que viveram. Na Sociologia, destacamos: Émile Durkheim (1858-1917): principais obras – :::: O Suicídio (1897) e da Divisão do Trabalho Social (1893); Karl Marx (1818-1883): principal obra – :::: O Capital (1867-1879); Max Weber (1864-1920): principais obras – :::: A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo (1904- 1905) e Economia e Sociedade (1922). Na Antropologia, deve-se consultar: Michel de Montaigne (1533-1592) – em sua obra :::: Ensaios (1588) o capítulo “Dos canibais” ; Roger Bastide:::: (1898-1974) – Brasil, terra de contrastes (1957); Lévi-Stra:::: uss (1908-2009) – As Estruturas Elementares do Parentesco (1949). Na Ciência Política destacamos: John Stuart Mill (:::: 1806-1873): Princípios de Economia Política (1848); Vilfredo Pareto (:::: 1848-1923): Curso de Economia Política (1896-97); Herbert:::: Spencer (1820-1903): O Indivíduo Contra o Estado (1884). Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br O desenvolvimento da Sociologia e a Sociologia do Desenvolvimento Ao aprofundarmos nossos estudos em direção ao objetivo deste curso, que é o de compreender a Sociologia das Organizações, focalizamos a preocupação dos teóricos das Ciências Sociais na questão econômica, ou seja, no próprio desenvolvimento do capitalismo industrial, pano de fundo do surgimen- to da Sociologia. Essa preocupação deu origem a uma disciplina chamada Sociologia Econômica, bas- tante comum no início do ensino acadêmico da Sociologia e posteriormente da chamada Sociologia do Desenvolvimento. As críticas ao evolucionismo, embutido neste conceito de desenvolvimento, fez com que recentemente esta nomenclatura fosse abandonada, mais precisamente no final dos anos 1980, quando surgiu a Sociologia do Trabalho de onde se derivou a Sociologia das Organizações. O quadro histórico do desenvolvimento do capitalismo Problemas conjunturais como as guerras mundiais, o monopólio das grandes empresas em lugar da livre concorrência e a intensificação da organização dos trabalhadores culminando com as revolu- ções socialistas revelavam as imperfeições do capitalismo e colocavam abaixo as esperanças de alguns sociólogos de democratização deste sistema. Em consequência, a burguesia se distanciava de um projeto de igualdade e fraternidade se com- portando de forma mais conservadora e utilizando aparatos de repressão físicos e ideológicos para as- segurar sua dominação. No cenário internacional surgem duas grandes potências econômicas: os Estados Unidos e a União Soviética, cada uma delas representando uma corrente política diferente, a saber, o capitalismo e o socialismo, respectivamente. O conhecimento também passa a submeter-se aos interesses dessa ordem e as Ciências Sociais são utilizadas como técnica de manutenção das relações dominantes, tanto em um sistema como no outro. Mas é com investimentos provenientes do capitalismo que a Sociologia vai se desenvolver atra- vés do surgimento da Escola de Chicago nos Estados Unidos onde os grandes pensadores da Europa, refugiados da Primeira Guerra Mundial, vão desenvolver os métodos de investigação de campo que se- rão plenamente testados na realidade. No século XX, a aceleração do processo de industrialização e o aumento de nações concorrentes na corrida imperialista fizeram com que um novo surto de modernização e formação de novos estados independentes atingisse os continentes asiáticos, africanos e também as recentemente independenti- zadas nações latino-americanas. Esse processo revelava a constanteinternacionalização do processo de industrialização e a expansão do modo de produção capitalista. As novas nações então adotaram um modelo de desenvolvimento baseado na expansão do capitalismo industrial ditado pelos países líderes do capitalismo na Europa. O papel dessas nações periféricas era, neste momento, o de possibilitar a expansão necessária, ao aumento da produção na Europa e nos Estados Unidos, dos mercados consumidores de produtos in- dustrializados produzidos nestes países e também fornecer matéria-prima para estas indústrias. 12 | O surgimento da Sociologia e suas principais contribuições Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 13|O surgimento da Sociologia e suas principais contribuições Para consumir esses produtos e fornecer as matérias-primas necessárias ao avanço da produção capitalista central, essas novas nações necessitaram passar por um processo de modernização de seus meios de transporte e produção de matérias-primas semelhante ao dos países industrializados, o que as aproximava do modelo capitalista industrial europeu. A partir dessa aproximação passou-se a interpretar o desenvolvimento da economia dessas na- ções novas como uma mera cópia do modelo do capitalismo central, concebendo como única diferen- ça o grau de desenvolvimento e não de qualidade deste sistema. Nessa perspectiva, todas as nações do mundo pareciam marchar rumo ao desenvolvimento industrial. A Sociologia para interpretar estas mudanças As ex-colônias transformadas em nações capitalistas, consumidoras dos produtos industrializa- dos dos países do capitalismo central e fornecedoras de matérias-primas para os mesmos, não podiam mais ser classificadas em categorias evolucionistas dos tipo “civilizadas” e “primitivas”. A Sociologia cria então novos conceitos para interpretar o recente processo de internacionalização do capitalismo. Junto com esse movimento de industrialização foi necessário a criação de técnicas nacionais e a importação de modelos, não só de industrialização, como também de conhecimento. Surgem novas universidade e novas teorias para explicar a situação específica dos países recém-industrializados ou dos países do chamado Terceiro Mundo. O objeto de estudo da Sociologia neste contexto, passa a ser justamente o desenvolvimento, que neste período era o foco das políticas econômicas nacionais e internacionais. As categorias de análise da sociologia do desenvolvimento buscam definir estas mudanças. O mundo passa a ser dividido em nações desenvolvidas, nações em desenvolvimento e nações subdesen- volvidas. A Sociologia continua a ampliar seus campos de análise, porém, as teorias sobre desenvolvimen- to e subdesenvolvimento passam a ser centrais principalmente para os países do capitalismo periférico e dentro deles localizamos os sociólogos brasileiros. A Sociologia do Desenvolvimento Na ânsia de explicar esta conjuntura em que as novas nações capitalistas buscavam copiar o mo- delo de desenvolvimento das nações do velho mundo, e não apenas isso, reproduzir também os mo- delos de organização das instituições políticas e econômicas, surge na Sociologia um novo tipo de evo- lucionismo chamado por alguns sociólogos como modelo desenvolvimentista. Estas análises acreditavam que as diferenças entre estas sociedades, chamadas então de desen- volvidas, para as conhecidas como subdesenvolvidas, estavam localizadas apenas no grau de desen- volvimento. Ou seja, os países subdesenvolvidos alcançariam os padrões dos desenvolvidos bastando seguir os passos que os últimos tinham percorrido. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Assim, as Ciências Sociais contribuíram com suas análises no sentido de alcançar instituições que, aos moldes das que já existiam nos países da Europa Central e nos Estados Unidos, garantiriam uma transição segura do subdesenvolvimento para o desenvolvimento e do progresso prometido pelo capi- talismo. As nações que apareciam como centros de dominação política e econômica passaram a cons- truir modelos superiores a serem almejados por todos os povos para que alcançassem o progresso. A teoria desenvolvimentista difundia-se como explicação para os diferentes estágios de desen- volvimento econômico dos países capitalistas e servia como modo de manter a submissão dos países considerados subdesenvolvidos aos padrões e modelos dos chamados desenvolvidos. O norte americano William Wilber Rostow, em seu livro Etapas do Desenvolvimento (1974, p. 16) formu- la em 1967 uma teoria em que classifica as diferentes sociedades em cinco etapas de desenvolvimento: as sociedades tradicionais;:::: as sociedades em processo de transição;:::: as sociedades em início de desenvolvimento;:::: as sociedades em maturação;:::: as sociedades de produção em massa.:::: Este autor, portanto, acredita que todas as sociedades devem estar localizadas em algum desses estágios desconsiderando a possibilidade de diferentes caminhos para alcançar o desenvolvimento. Essa subdivisão, que serve de exemplo clássico da teoria desenvolvimentista, fundamenta-se na ideia de que o desenvolvimento do capitalismo e o modelo de organização da civilização ocidental europeia é o único modelo a ser seguido. Cada estágio entre esses cinco apresentados seriam lentamente alcan- çados através do desenvolvimento econômico do capitalismo. Muitos teóricos adeptos deste modelo buscavam identificar as causas do subdesenvolvimento nas formas tradicionais de organização das sociedades mais atrasadas e em explicações muitas vezes ra- cistas e preconceituosas. Isso porque estes estudiosos ligavam as causas do subdesenvolvimento de pa- íses da América Latina e da África, por exemplo, às características étnicas e culturais destes povos. Índios e negros foram responsabilizados pelo atraso de uma civilização baseada em moldes europeus que eles nem conheciam e tampouco foram convidados a fazer parte. As teorias desenvolvimentistas, portanto, oportunizaram a proliferação desses preconceitos para explicar as causas do subdesenvolvimento, não reconhecendo aquilo que era o próprio efeito de um modelo de exploração capitalista colonial por eles mesmos praticada. Um crescimento baseado no im- perialismo colonial que eles praticavam nos países mais pobres e da periferia do capitalismo. 14 | O surgimento da Sociologia e suas principais contribuições Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 15|O surgimento da Sociologia e suas principais contribuições Textos complementares De que se ocupam as Ciências Sociais (OLIVEIRA, 2001) O comportamento humano é muito diversificado. Cada indivíduo recebe influências de seu meio, forma-se de determinada maneira e age no meio social de acordo com sua formação. O indi- víduo aprende com o meio, mas também pode transformá-lo em sua ação social. Há comportamentos como andar, respirar, dormir – estritamente individuais que se originam na pessoa enquanto organismo biológico. São comportamentos estudados pelas ciências físicas e biológicas. Por outro lado, receber salário, fazer greve, participar de eventos, casar-se, educar os fi- lhos são comportamentos sociais, pois se desenvolvem no contexto da sociedade. Ao longo da história, a espécie humana organizou sua vida em grupo. As Ciências Sociais (a So- ciologia é um de seus ramos) pesquisam e estudam o comportamento social humano e suas várias formas de organização. Como ciência voltada para o social, tem um amplo corpo de conhecimento. O conhecimento teórico e técnico das Ciências Sociais é de tal forma amplo que pode ser aplicado tanto para entender um fato social como para elaborar e implementar desde pequenos projetos até estudos de política de governo. Objeto e objetivo das Ciências Sociais Pode-se dizer que as Ciências Sociais são o estudo sistemático do comportamento social do ser humano. Ocupando-se sistematicamente docomportamento social humano, o objeto das Ciências Sociais é, portanto, o ser humano em suas relações sociais. Tendo como objeto de interesse o ser humano em suas relações sociais, o objetivo das Ciências Sociais é ampliar o conhecimento sobre o ser humano em suas interações sociais. Assim, as Ciências Sociais contribuem para um melhor entendimento da sociedade em que vi- vemos e dos fatos e processos sociais que nos rodeiam. A investigação científica é o método usado pelas Ciências Sociais em suas atividades. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Os índices do subdesenvolvimento (PEREIRA, 1970) As formulações mais elementares e vulgares recorrem, basicamente, à disposição num conti- nuum de países ou religiões de baixa renda per capita, e de alta renda per capita; e tomam, explícita ou implicitamente, além da própria renda per capita, indicadores dessa baixa renda per capita, no caso dos países ou regiões ditos subdesenvolvidos. De fato, a renda per capita é tomada pelo lado do consumo de bens e serviços: precárias ou insuficientes condições de salubridade, de escolarização, de residência, dieta alimentar etc.; e tomada pelo lado da produção quando se apontam fatores pró- ximos responsáveis por esta baixa renda per capita: estrutura pouco diferenciada do aparelho pro- dutivo (predominância do setor primário), baixa produtividade, baixa taxa de investimento etc. Atividades 1. Pesquise em jornais, na internet ou em revistas, exemplos de comportamentos sociais. Não es- queça de referendar o título do assunto, a data e nome do veículo de comunicação que você usou. Escreva em uma folha, um resumo do texto. Depois, faça um comentário pessoal sobre o tema pesquisado. 2. Elabore com suas palavras o conceito, o objetivo e o objeto das Ciências Sociais. 16 | O surgimento da Sociologia e suas principais contribuições Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 17|O surgimento da Sociologia e suas principais contribuições 3. Houve modificações nas análises evolucionistas da Sociologia com o surgimento das novas na- ções? Por quê? 4. Qual a crítica de Luiz Pereira em relação aos índices escolhidos para medir o grau de desenvolvi- mento ou subdesenvolvimento dos países, apresentada no segundo Texto complementar? Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Gabarito 1. É esperado que o aluno inicie o processo de pesquisa em fontes primárias, use os conceitos expli- cados e reflita sobre o significado das interações que os indivíduos estabelecem no convívio com seus semelhantes. 2. As Ciências Sociais realizam estudos sistemáticos do comportamento social do ser humano. As Ciências Sociais contribuem para um melhor entendimento da sociedade em que vivemos e dos fatos e processos sociais que nos rodeiam. O objeto das Ciências Sociais é, portanto, o ser huma- no em suas relações sociais. 3. Não, porque as análises do surgimento das novas nações apenas reproduziram um modelo que deveria ser alcançado através do cumprimento de etapas e passos já percorridos pelos países considerados desenvolvidos. 4. A crítica do autor está relacionada ao fato de que não se pode medir o grau de desenvolvimento ou subdesenvolvimento de um país meramente comparando suas rendas per capita. Estas devem servir para interpretar dados mais complexos da economia. 18 | O surgimento da Sociologia e suas principais contribuições Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Sociologia do Desenvolvimento, Sociologia do Trabalho e Sociologia das Organizações As contribuições da Sociologia clássica A Sociologia surge para compreender as mudanças ocorridas na sociedade do final do século XIX, permeada por duas revoluções que transformaram radicalmente o modo de organização da vida social, política e econômica, as Revoluções Francesa e Industrial as quais marcam esta conjuntura. Desde en- tão a Sociologia procura explicar as grandes questões com as quais os atores sociais de cada época se defrontam. As obras de Karl Marx, Émile Durkheim e Max Weber alicerçam a Sociologia do século XIX. É neste período que os fenômenos econômicos marcam fortemente a reflexão sociológica. A preocupação com os fenômenos ligados à economia da época, que se apresentava em profun- da transformação, está fortemente presente na vida e obra de Karl Marx que trabalha durante toda sua vida em uma grande obra chamada O Capital. Para Marx a sociedade se divide em infra e superestrutu- ra. A infraestrutura é a estrutura econômica, formada pelas relações de produção e pelas forças produ- tivas. Já a superestrutura pode ser dividida em dois níveis: a estrutura jurídico-política, que é formada pelas normas e leis que correspondem à sistematização das relações já existentes; e a estrutura ideoló- gica (filosofia, arte, religião etc.), que é formada por um conjunto de ideias de determinada classe social, a qual através de sua ideologia, defende seus interesses. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Nos trabalhos de Émile Durkheim, em sua primeira obra publicada: Da Divisão do Trabalho Social de 1893, o autor estabelece uma relação entre o aumento da divisão social do trabalho nas sociedades industriais e a criação de um novo tipo de solidariedade que vem a fortalecer a coesão social entre seus membros. Para ele, o equilíbrio e a ordem sociais obtidos com a divisão do trabalho social geram a so- lidariedade social. A solidariedade social aparece aqui como uma consequência da própria divisão do trabalho social que necessita da união e da aproximação dos indivíduos para realizar-se. A mesma inter- dependência necessária para realizar o trabalho social é a que sustenta os indivíduos coesos dentro da sociedade em que vivem. A preocupação com os fenômenos econômicos orienta também os trabalhos de Max Weber que considerava estes fenômenos como profundamente ligados às instâncias da vida social, influenciando- -as e, por sua vez, sendo influenciados pelos diferentes aspectos da vida social. Max Weber distingue três tipos de fenômenos econômico-sociais: os fenômenos econômicos propriamente ditos – são aqueles centrados na importância que :::: possuem na luta material pela existência; os fenômenos economicamente importantes – aqueles que têm importância econômica em si :::: mesmos, mas podem gerar efeitos econômicos; os fenômenos economicamente condicionados – os que têm pouca importância econômica :::: em si, mas são influenciados pela economia. Sabemos que nos primórdios da Sociologia como disciplina nas universidades havia uma Sociologia econômica como parte do currículo formador básico do sociólogo. Hoje a Sociologia contemporânea começa a perceber novamente a necessidade de se preocupar com a chamada esfera da vida econômica e é nessa tradição forte que se incluem os trabalhos de alguns autores que vamos desenvolver ao longo de nosso curso. A evolução histórica do pensamento econômico no Brasil Durante o período de 1930 a 1970 o Brasil cresceu e se industrializou através principalmente dos incentivos do Estado aos setores industriais e agrícolas com o objetivo de modernizar a indústria para a exportação. O Estado passava a se empenhar em criar condições para essa industrialização através, principalmente, da regulamentação das leis trabalhistas, fixação de preços, subsídios e investimentos em infraestrutura para a criação das indústrias de base, como, por exemplo, a siderurgia e também a im- plantação da indústria de bens de produção ou bens de capital, (máquinas, equipamentos etc.). A partir da década de 1970 passa-se a considerar o Brasil como um país industrializado e as ques- tões centrais que envolviam o desenvolvimento do capitalismo vão se localizando no desenvolvimento das empresas. Estas questões podemser resumidas na participação fundamental do Estado, em termos de incentivo da produção nacional e nos entraves da relação entre um modelo tradicional baseado na produção agrícola familiar e o modelo industrial moderno. 20 | Sociologia do Desenvolvimento, Sociologia do Trabalho e Sociologia das Organizações Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 21|Sociologia do Desenvolvimento, Sociologia do Trabalho e Sociologia das Organizações A Sociologia do Desenvolvimento foi o principal marco teórico deste período. Voltada para os problemas macroestruturais do desenvolvimento e influenciada pela corrente funcionalista, compre- endia os problemas do desenvolvimento brasileiro através de uma perspectiva que contrastava os atra- sos do modelo de uma economia tradicional com as necessidades de modernização das relações sociais de produção. A cultura nacional clientelista e o populismo são considerados entraves a um desenvolvi- mento racional necessário ao modelo capitalista das empresas baseado no desenvolvimento científico e tecnológico e nas relações de trabalho assalariadas. Neste período as Ciências Sociais partiam das análises sobre o trabalho e se dedicavam a estu- dar a classe operária, o sindicalismo brasileiro e a constituição do empresariado industrial, ou seja, como a sociedade empresarial convivia com os valores do Brasil “arcaico”. O papel dos empresários no desen- volvimento social e econômico do país e suas relações com o Estado, ou seja, o capitalismo no Brasil e seus atores sociais. No entanto, o processo de industrialização brasileiro não trouxe, como era de se esperar, a re- dução da pobreza e nem a integração da população nestes novos setores. Pelo contrário, o fosso entre as classes dirigentes e empresariais e a massa de assalariados aumentava, pois o crescimento econômi- co estava baseado na aquisição de grandes empréstimos internacionais, no incentivo à instalação de grandes empresas multinacionais no país e numa produção e modernização orientada para a exporta- ção. Estes eram setores que economizavam mão de obra e, portanto, não geravam empregos suficien- tes para a população economicamente ativa do país. Este modelo de desenvolvimento não absorvia a mão de obra disponível resultando em desemprego em larga escala e empurrando os salários para ní- veis cada vez mais baixos. Reagindo criticamente a esta conjuntura de superexploração da classe trabalhadora, as pesqui- sas sociológicas no Brasil, fortemente influenciadas pelo marxismo, passam a privilegiar o estudo da classe operária enfocando as indústrias como espaço privilegiado do conflito de classes. Assim, a Sociologia do Trabalho vai se firmando através das análises da economia, principalmen- te pelo viés da classe trabalhadora, ficando o estudo das elites, tanto empresarial como agrária, pratica- mente de fora dos temas de interesse das Ciências Sociais no Brasil. Na década de 1980 os problemas econômicos pioraram muito a situação da população. As em- presas e os empresários passam a fazer parte das análises dos sociólogos que começam a perceber os problemas da flexibilização da produção e do trabalho. Com a crise do modelo fordista de produção e a ascensão do modelo taylorista, os pesquisadores dividiram-se em dois blocos: os que aceitavam a as- censão do modelo pós-fordismo e os que acreditavam em diferentes modelos de modernização tecno- lógica. A empresa é ainda estudada sob a óptica do trabalho, ou seja, as transformações ocorridas no processo de produção, gestão e organização do trabalho. Nesta conjuntura de mudanças radicais que se apresenta para todo o planeta a partir do pro- cesso de globalização das economias, que teve início na década de 1990, o Estado brasileiro negocia com o setor privado a venda de setores estratégicos como as telecomunicações e a eletricidade, e abre à competição alguns serviços monopolizados por grupos privados. Esta política de liberalização da eco- nomia e de menor intervenção estatal afetou profundamente a economia brasileira que se internacio- nalizou rapidamente. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br A Sociologia enfatiza então, em seus estudos, a flexibilização ou a precarização do trabalho no contexto pós-fordista. Diferentes formas de organização do trabalho O que entendemos por flexibilização da produção e do trabalho? O que é Fordismo, Taylorismo e Toyotismo? Estes conceitos foram elaborados ao longo do tempo, motivados pelo crescimento das em- presas capitalistas. O pleno funcionamento dessas empresas era o foco central das análises científicas interessadas no desenvolvimento do sistema capitalista. Soluções organizacionais e modelos racionais foram, a partir daí, formulados e postos em ação ao longo da história da indústria. Vamos compreender como isto ocorreu para depois estudarmos cada um destes conceitos. As indústrias e fábricas que nasceram na França, Inglaterra e Alemanha no período da Revolução Industrial partiram de modelos de organizações preexistentes. Para exemplificar vamos citar aqui os principais. A organização da igreja representava um modelo de hierarquia que era baseado na crença dos mesmos valores, construídos por uma doutrina de que todos faziam parte. As organizações militares de soldados mantinham uma disciplina através de regulamentos e regras que variavam conforme a mis- são. As armas que utilizavam e o poder era centralizado por uma motivação: vencer a guerra. O comércio e a agricultura eram, nos seus primórdios, tarefa de pequenas empresas familiares que ofereciam um modelo baseado na autoridade patriarcal. Na era dos inventos e das máquinas, por outro lado, a estrutura produtiva deixa de se basear no poder familiar e passa a ser mais técnica, mais racio- nal. Tal estrutura das organizações, baseada, por analogia, no encadeamento das peças, o chamado ma- quinismo industrial, segue a lógica do encaixe perfeito de todas as peças, o que traria melhor resultado na produção; ou seja, o trabalho de cada homem devia funcionar como uma peça dentro da máquina, formando um mecanismo único, o trabalho humano considerado como simples sequência do funcio- namento de uma máquina. Até mesmo os estudos antropológicos de diferentes populações e tribos indígenas do começo do sécu- lo XX serviram para a compreensão da importância dos valores e da cultura para a organização de agru- pamentos humanos. As ideias de cultura da empresa, valores, hierarquias e disciplina, centralização de decisões, chefia, funcionamento racional da empresa, entre outras, tem essas origens mais longínquas. No entanto, estes modelos, que são importantes porque continuam até hoje inspirando diferen- tes formas de organizações, necessitaram de aprofundamento na medida em que as sociedades come- çaram a se complexificar. As organizações passam, então, a ser estudadas cientificamente enquanto microssociedades com o objetivo de produção econômica. Um dos primeiros objetivos de uma abordagem sociológica das empresas é marcar, classificar e reconhecer as práticas normativas e as regras sobre as quais os modos de racionalização de suas estru- turas funcionam. Para isso foram analisados os diferentes modos de organizar o trabalho na prática, o que deu ori- gem a diferentes teorias utilizadas pela Sociologia do Trabalho, que nos ajudam a compreender as eta- pas pelas quais passaram as formas de organização do trabalho dentro da indústria. Em outras palavras, 22 | Sociologia do Desenvolvimento, Sociologia do Trabalho e Sociologia das Organizações Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 23|Sociologia do Desenvolvimento, Sociologia do Trabalho e Sociologia das Organizações os modos de organização da produção dentro das empresas (de Taylor, de Ford e da Toyota) deram ori- gens às teorias taylorista, fordista e toyotista ou da flexibilização. O foco das análises de Weberforam as regras e procedimentos legais e a autoridade dentro das empresas, o que deu origem à teoria racional legal ou burocrática. Podemos dizer, portanto, que além de modos de organizar as empresas, eles tam- bém viraram teorias. Vejamos os principais: Taylorismo:::: Frederick Taylor (1856-1915) Teoria que surgiu em 1911, repousa em uma análise científica da tarefa do trabalhador, a me- lhor maneira, em um tempo organizado, para se atingir um modo operatório melhor e mais produtivo, conhecido como One best Way. Taylor comparou o corpo humano com uma máqui- na e analisou o tempo e os movimentos sucessivos realizados pelo homem para produzir. O trabalho era fragmentado em tarefas para obter uma adaptação melhor do trabalhador que acaba se concentrando em uma especialidade limitada da tarefa. Isso vai trazer a divisão do trabalho por competências onde uns vão executar e os outros vão pensar, analisar e preparar as condições de seu trabalho. É considerado o pai da administração científica. Fordismo:::: Henry Ford (1863-1947) Henry Ford, o fabricante americano de automóveis buscava formas de aumentar a produtivi- dade de sua linha de montagem com a ideia de que, produzindo carros idênticos que só ti- nham o número de série para os diferenciar, baratearia o custo da matéria-prima e do trabalho. Seu método se apoia, portanto, na organização do trabalho em série introduzido pela inven- ção da esteira que transportava as peças em um circuito dentro das fábricas, sendo que os tra- balhadores é que ficavam em lugares fixos. Nasce assim o trabalho em linhas de montagem e a produção em série. Além do processo do trabalho repetitivo imposto ao trabalhador a linha de montagem possibilitava um controle bem maior dos supervisores e administradores sobre as tarefas do operário. Burocracia:::: Max Weber (1864-1920) No mesmo momento em que Taylor realizava seus estudos, o sociólogo Max Weber analisa- va o trabalho de escritório e problematizava com isso o campo da informação e das competências necessárias para o exercício da autoridade que aparecia paralelamente às questões diretamen- te ligadas à produção. Para Weber, não é suficiente que haja a autoridade de um chefe, é preci- so que essa autoridade seja aceita, quer dizer, que ela seja legítima. Assim, o autor se dedica a estudar o problema da organização, que considera como um problema ligado à informação e às competências necessárias para o exercício da autoridade em um mundo econômico novo. Para ele, a autoridade se divide em três tipos diferentes de poder: o poder tradicional – arraigado através dos costumes e hábitos enraizados. Ex.: o poder paterno;:::: o poder carismático – fundado na pessoa e nas suas características extraordinárias. Ex.: o :::: poder de um líder religioso, como Dalai Lama, ou de um político, como Fidel Castro; Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br o poder legal – que se dá em virtude da crença no valor de leis existentes ou de uma com-:::: petência fundamentada sobre regras estabelecidas racionalmente. Ex.: o poder de um pre- sidente da República. Esta divisão, didaticamente descrita por Weber, permite opor o funcionamento do poder na sociedade tradicional com o poder que se fundamenta na legitimidade racional. No primeiro caso, a legitimidade baseia-se em uma ordem estabelecida pelas tradições e, por isso, suficiente em si mesmo, como, por exemplo, o poder dos reis que é herdado. No segun- do caso, o poder na sociedade de massa só é legitimo porque é racional, ou seja, os proce- dimentos pelos quais as regras são fixadas são legais e, portanto, se a autoridade segue os procedimentos legais, sua autoridade não é contestada. Como podemos notar, os tipos de au- toridades entre os dois casos são diferentes. A do primeiro caso é mais forte porque é devi- da ao indivíduo que herdou esse poder. No segundo é mais frágil, porque essa autoridade fica presa ao cumprimento das regras preestabelecidas. A obediência é devida não ao indivíduo, e sim, às leis e regulamentos. O tipo de autoridade legal ou racional é o tipo que mais se adapta às sociedades industriais e é esse estudo da questão da legitimidade no exercício da autoridade desenvolvida por Weber que dará origem ao que ele chamou de burocracia ou administração racional legal. Toyotismo:::: Surgiu em 1950, na fábrica da Toyota no Japão, e ficou conhecido mundialmente a partir dos anos 1970. Este modelo, ao contrário do Fordista, que se baseava em uma linha de montagem em que o trabalhador ficava fixo realizando sempre a mesma tarefa, contava com menos mão de obra e por isso o sistema investia na qualificação profissional desta mão de obra e na flexi- bilização da produção. Produzindo menos, mas com modelos mais variados e utilizando mão de obra mais qualificada, possibilitava que o trabalhador realizasse também o que foi chama- do de trabalho flexível, sendo requisitado em diferentes etapas do processo produtivo. Analisando racionalmente as organizações Segundo Renaud Sainsaulieu (2006, p. 59), a análise científica da organização das empresas tem origem na sociologia compreensiva de Max Weber: [...] o nascimento de um pensamento sobre a racionalidade das empresas apoia-se nas categorias da sociologia compre- ensiva de Max Weber (1965). Seu estudo trata da compreensão que se pode adquirir de um comportamento humano e do tipo de interpretação que se pode dar a ele. Para este autor, o objeto específico de uma sociologia compreensiva é a “atividade”, isto é, um comportamento relativo a objetos que é especificada de maneira mais ou menos consciente por um sentido qualquer [...] Esta atividade orientada não pode compreender-se a si mesma sem introduzir o compor- tamento do outro visado pelo sentido desse ato e, ele próprio, influenciado por essa relação significativa. Ou seja, Max Weber ressalta que é necessário compreender a ação do homem e considera como objeto da Sociologia a ação social, aquela que tem um significado não apenas para ele próprio, mas também para outros membros da sociedade. A importância desta interpretação para a Sociologia das organizações seria a capacidade de prever prováveis ações a partir de determina- das situações padrão, o que se poderia esperar como uma ação racional para cada situação da re- alidade social. 24 | Sociologia do Desenvolvimento, Sociologia do Trabalho e Sociologia das Organizações Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 25|Sociologia do Desenvolvimento, Sociologia do Trabalho e Sociologia das Organizações A utilização de teorias taylorianas, fordistas e weberianas, por exemplo, nos princípios que vimos anteriormente, são a base para o desenvolvimento de modelos racionais de organização das empresas ao longo de séculos. Porém, estes modelos também sofreram muitas críticas. Vantagens e desvantagens do modelo racional de organização As vantagens podem ser agrupadas em cinco: a substituição da intuição pelo saber científico. Através de um método de análise é possível :::: encontrar soluções para os problemas da organização, explicá-los e corrigi-los; a substituição do “dom” do artesão pela competência do profissional. As competências técnicas :::: são buscadas em cada profissional para situá-lo onde elas possam ser melhor aproveitadas; a substituição da informalidade da rotina de trabalho pela disponibilidade de regras escritas :::: que podem ser consultadas tornando mais impessoais as relações de trabalho; a facilidade de realizar mudanças nas estruturas de trabalho quando as regras são claramen-:::: te definidas é maior, pois estas podem ser mais facilmente identificadas e transformadas nos pontos necessários; a facilidade de transpor ou comparar um modelo racional de uma indústria para outra ou com :::: outras indústrias. Por isso essa organização da empresa em métodos racionais é até hoje almejada por muitas em- presas contemporâneas que aindanão chegaram lá. Porém, há também muitas críticas feitas a esse modelo racional de organização. Estas críticas co- meçaram na França de 1950 e podem ser resumidas em quatro principais: A crítica sociológica:::: – esta tratou de dois pontos principais. Em primeiro lugar foi de encon- tro ao termo One best way, ideia criada por Taylor que significava um modo operatório ótimo, ou seja, a mais eficiente maneira de produzir, aquela que busca a produtividade máxima do trabalhador; em segundo lugar criticou-se também a impessoalidade do modelo racional. Essa crítica levantava o problema do surgimento de fatores imprevisíveis que podem entrar em jogo e modificar a pertinência das estruturas em ação. Por exemplo: acasos econômicos, con- tingências tecnológicas, políticas e sociais, motivações pessoais e a complexidade dos polos decisórios e de comunicação dentro de uma empresa. Por outro lado, a impessoalidade acarre- taria um empobrecimento do conhecimento da realidade humana composta de indivíduos (li- deranças ou não), conflitos, valores profissionais e de identidades coletivas complexas. A crítica econômica:::: – dá-se em função da fraca possibilidade de mudança oferecida à gran- de maioria dos trabalhadores de base, os quais estariam mais submetidos às regras. As posi- ções fixas que ocupavam dentro das empresas dando margens inclusive ao aparecimento de graves problemas psíquicos e mentais. (Ver filme de Charles Chaplin – Tempos Modernos). Há, portanto, um efeito contraproducente no excessivo processo de racionalização formal da pro- dução, limitando a capacidade criativa do trabalhador. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br A crítica política :::: – formulada por autores franceses influenciados pelo marxismo e depois re- tomada pelos sindicalistas italianos, questionava a proibição feita aos operários de participar da análise de suas próprias condições de trabalho. Fundamentava-se em dois pontos principais: os sindicatos e os defensores dos operários são excluídos do organograma da empresa;:::: a divisão extrema do trabalho entre planejadores e executores cria uma nova alienação dos :::: tempos atuais e abre uma contradição crescente com as capacidades intelectuais e profis- sionais adquiridas durante o tempo livre de uma sociedade avançada. Ou seja, a organiza- ção social do trabalho é criticada aqui por reproduzir a divisão social do trabalho do início do capitalismo, pois mantém as vantagens econômicas e culturais daí resultantes para as gerações subsequentes. A burocracia e a Organização Social do Trabalho – OST, aparente- mente fundamentadas na ciência, servem de fato a ideologias não igualitárias de grupos tecnocratas no poder das estruturas econômicas. A crítica cultural:::: – aponta, por um lado, para a deformação do modelo racional diante de sua extensão para o resto dos países em função das diferentes culturas sociais. As variações com- plexas de diferentes modos de organização e gestão das empresas em função das culturas na- cionais. Por outro lado, a crítica cultural relaciona-se ao caráter fechado da organização racional, pois a estrutura de uma empresa depende fortemente de seus ambientes educativos, sindicais e polí- ticos, ou seja, a microssociedade empresa não pode ser isolada da grande sociedade nacional. Concluindo, podemos dizer que a organização racional proposta como modelo foi importan- te no período de crescimento industrial e ganhou espaço de destaque dentro das teorias que analisavam as organizações na época, mas trouxe à tona o problema de sua aplicação na di- versidade dos contextos existentes. Neste sentido, a Sociologia das organizações no Brasil vai dedicar-se a analisar o desenvolvi- mento econômico e social da empresa, entendida esta como uma estrutura social formada por atores da produção e seus dirigentes. Textos complementares Os três tipos puros de dominação legítima (WEBER, 1986) A dominação, ou seja, a probabilidade de encontrar obediência a um determinado mandato pode fundar-se em diversos motivos de submissão. Pode depender diretamente de uma conste- 26 | Sociologia do Desenvolvimento, Sociologia do Trabalho e Sociologia das Organizações Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 27|Sociologia do Desenvolvimento, Sociologia do Trabalho e Sociologia das Organizações lação de interesses, ou seja, de considerações utilitárias de vantagens e inconvenientes por parte daquele que obedece. Pode também depender de mero costume, do hábito cego de um compor- tamento inveterado. Ou pode fundar-se, finalmente, no puro afeto, na mera inclinação pessoal do súdito. Não obstante, a dominação que repousasse apenas nesses fundamentos seria relativamente instável. Nas relações entre dominantes e dominados, por outro lado, a dominação costuma apoiar- -se internamente em bases jurídicas, nas quais se funda a sua “legitimidade”, e o abalo dessa crença na legitimidade costuma acarretar consequências de grande alcance. Em forma totalmente pura, as “bases de legitimidade” da dominação são somente três, cada uma das quais se acha entrelaçada – no tipo puro – com uma estrutura sociológica fundamentalmente diversa do quadro e dos meios administrativos. Dominação Legal A dominação legal se dá em virtude de estatuto. Seu tipo mais puro é a dominação burocrática. Sua ideia básica é: qualquer direito pode ser criado e modificado mediante um estatuto sancionado corretamente quanto à forma. A associação dominante é eleita ou nomeada, e ela própria e todas as suas partes são empresas. [...] O quadro administrativo consiste de funcionários nomeados pelo senhor, e os subordinados são membros da associação (cidadãos, camaradas). Obedece-se não à pessoa em virtude de seu direito próprio, mas à regra estatuída, que estabe- lece ao mesmo tempo a quem e em que medida se deve obedecer. [...] Dominação Tradicional A dominação tradicional se dá em virtude da crença na santidade das ordenações e dos pode- res senhoriais há muito existentes. Seu tipo mais puro é o da dominação patriarcal. A associação do- minante é de caráter comunitário. O tipo daquele que ordena é o “senhor”, e os que obedecem são “súditos”, enquanto o quadro administrativo é formado por “servidores”. Obedece-se à pessoa em virtude de sua dignidade própria, santificada pela tradição: por fidelidade. O conteúdo das ordens está fixado pela tradição. [...] Dominação Carismática A dominação carismática se dá em virtude de devoção afetiva à pessoa do senhor e a seus dotes sobrenaturais (carisma) e, particularmente, a faculdades mágicas, revelações ou heroísmo, poder in- telectual ou de oratória. O sempre novo, o extracotidiano, o inaudito e o arrebatamento emotivo que provocam constituem aqui a fonte da devoção pessoal. Seus tipos mais puros são a dominação do profeta, do herói guerreiro e do grande demagogo. A associação dominante é de caráter comunitário, na comunidade ou no séquito. O tipo que manda é o líder. O tipo que obedece é o apóstolo. Obedece- -se exclusivamente à pessoa do líder por suas qualidades excepcionais e não em virtude de sua po- sição estatuída ou de sua dignidade tradicional; e, portanto, também somente enquanto essas quali- dades são atribuídas, ou seja, enquanto seu carisma subsiste. [...] O quadro administrativo é escolhido segundo carisma e vocação pessoais e não devido à sua qualificação profissional (como o funcionário), à sua posição (como no quadro administrativo estamental) ou à sua dependência pessoal, de caráter doméstico ou outro ( como é o caso do quadro administrativo patriarcal). Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Toyotismo (NOTÍCIASBR, 2008) O Japão foi o berço da automação flexível pois apresentava um cenário diferente do dos Estados Unidos e da Europa: um pequeno mercado consumidor, capital e matéria-prima escassos, e grande disponibilidadede mão de obra não especializada, impossibilitavam a solução taylorista-fordista de produção em massa. A resposta foi o aumento na produtividade na fabricação de pequenas quanti- dades de numerosos modelos de produtos, voltados para o mercado externo, de modo a gerar divi- sas tanto para a obtenção de matérias-primas e alimentos, quanto para importar os equipamentos e bens de capital necessários para a sua reconstrução pós-guerra e para o desenvolvimento da própria industrialização. O sistema pode ser teoricamente caracterizado por quatro aspectos: mecanização flexível, uma dinâmica oposta à rígida automação fordista decorrente da :::: inexistência de escalas que viabilizassem a rigidez; processo de multifuncionalização de sua mão de obra, uma vez que, por se basear na :::: mecanização flexível e na produção para mercados muito segmentados, a mão de obra não podia ser especializada em funções únicas e restritas como a fordista. Para atingir esse objetivo os japoneses investiram na educação e qualificação de seu povo e o toyo- tismo, em lugar de avançar na tradicional divisão do trabalho, seguiu também um cami- nho inverso, incentivando uma atuação voltada para o enriquecimento do trabalho; implantação de sistemas de controle de qualidade total, nos quais através da promoção :::: de palestras de grandes especialistas norte-americanos, difundiu-se um aprimoramento do modelo norte-americano, em que, ao se trabalhar com pequenos lotes e com matérias- -primas muito caras, os japoneses de fato buscaram a qualidade total. Se, no sistema for- dista de produção em massa, a qualidade era assegurada através de controles amostrais apenas em pontos do processo produtivo, no toyotismo, o controle de qualidade se de- senvolve por meio de todos os trabalhadores em todos os pontos do processo produtivo; sistema :::: just-in-time que se caracteriza pela minimização dos estoques necessários à pro- dução de um extenso leque de produtos, com um planejamento de produção dinâmico. Como indicado pelo próprio nome, o objetivo final seria produzir um bem no exato mo- mento em que é demandado. O Japão desenvolveu um elevado padrão de qualidade que permitiu a sua inserção nos lucra- tivos mercados dos países centrais e, ao buscar a produtividade com a manutenção da flexibilidade, o toyotismo se complementava naturalmente com a automação flexível. A partir de meados da década de 1970, as empresas toyotistas assumiriam a supremacia produ- tiva e econômica, principalmente pela sua sistemática produtiva que consistia em produzir bens pe- quenos, que consumissem pouca energia e matéria-prima, ao contrário do padrão norte-americano. Com o choque do petróleo e a consequente queda no padrão de consumo, os países passaram a de- mandar uma série de produtos que não tinham capacidade e, a princípio, nem interesse em produzir, o que favoreceu o cenário para as empresas japonesas toyotistas. A razão para esse fato é que devi- do à crise, o aumento da produtividade, embora continuasse importante, perdeu espaço para fatores tais como a qualidade e a diversidade de produtos para melhor atendimento dos consumidores. 28 | Sociologia do Desenvolvimento, Sociologia do Trabalho e Sociologia das Organizações Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 29|Sociologia do Desenvolvimento, Sociologia do Trabalho e Sociologia das Organizações Atividades 1. Tendo em vista o contexto histórico de surgimento da Sociologia, explique por que a Sociologia econômica foi tão marcante na Sociologia e como ela aparece em cada um dos autores clássicos. 2. No Brasil, qual era o principal foco da Sociologia do trabalho e por quê? Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 3. Cite e explique as diferentes formas de organização do trabalho. 4. A partir do processo de globalização do planeta a flexibilização do trabalho e do trabalhador é crescente. Consultando o segundo Texto complementar, explique o que significa a flexibiliza- ção do trabalho. 30 | Sociologia do Desenvolvimento, Sociologia do Trabalho e Sociologia das Organizações Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 31|Sociologia do Desenvolvimento, Sociologia do Trabalho e Sociologia das Organizações Gabarito 1. As grandes transformações ocorridas nas sociedades no período de surgimento da Sociologia fo- ram em grande medida determinadas pelas modificações econômicas. Assim, a Sociologia, bus- cando compreender e explicar tais modificações, passou a dar ênfase às análises econômicas. Marx divide a sociedade em super e infraestrutura e destaca as implicações da segunda sobre a primeira. Durkheim analisa a divisão social do trabalho e seus resultados na vida social. Weber considera que os fenômenos econômicos influenciam os fenômenos sociais e são também in- fluenciados pelos mesmos. 2. O foco era o estudo dos trabalhadores, da classe operária, ficando as elites de fora. Isso porque a Sociologia brasileira foi fortemente influenciada pela teoria marxista. 3. Taylorista: analisa a melhor maneira, em um tempo organizado, para se atingir um modo opera- tório melhor, mais produtivo conhecido como One best Way. Fordista: organização do trabalho em série introduzido pela invenção da esteira que transportava as peças em um circuito dentro das fábricas, onde os trabalhadores tinham lugares fixos. Burocrática: Weber analisava o trabalho de escritório e problematizava com isso o campo da in- formação e das competências necessárias para o exercício da autoridade que aparecia paralela- mente às questões diretamente ligadas à produção. O tipo de autoridade legal ou racional é o tipo que mais se adapta às sociedades industriais e é esse estudo da questão da legitimidade no exercício da autoridade desenvolvida por Weber que dará origem ao que ele chamou de burocra- cia ou administração racional legal. Toyotista: produzir menos, mas com uma maior variedade de modelos (a chamada flexibilização da produção) e utilizando mão de obra mais qualificada possibilitando que o trabalhador realize o que foi chamado de trabalho flexível, sendo requisitado em diferentes etapas do processo produtivo. 4. É o processo pelo qual a empresa passa a utilizar os trabalhadores em diferentes setores produ- tivos e não mais em posições fixas (processo de multifuncionalização de sua mão de obra); em decorrência disso, o produto também sofre uma diversificação ao invés de ser produzida uma grande quantidade de produtos iguais, “em série”(minimização dos estoques necessários à pro- dução de um extenso leque de produtos). Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 32 | Sociologia do Desenvolvimento, Sociologia do Trabalho e Sociologia das Organizações Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Conceitos básicos para a compreensão da vida social A vontade de organizar melhor as empresas pôs em evidência a complexidade do fator humano. Quanto mais se buscava organizar o trabalho, mais se desembocava numa série de manifestações indi- viduais e coletivas que até então não entravam na organização científica. Como analisar vontades, dese- jos e intenções? Subjetividades que envolviam conflitos os quais aos poucos se tornavam entraves para o bom funcionamento destas organizações. O fator humano aparecia assim de forma preponderante e ressaltava os aspectos da moral, os conflitos, a comunicação insuficiente, os grupos, as classes ou camadas, os imprevistos, a insubordina- ção, a rotina, a falta de iniciativas e as críticas. Em torno destas questões, o período de 1950 a 1990 foi marcado pelo desenvolvimento de uma nova corrente centrada na integração do fator humano aos diversos contextos da produção, da comu- nicação e da organização geral da empresa. O objeto de estudo da Sociologia das OrganizaçõesA Sociologia das Organizações se propõe a estudar os grupos de indivíduos que interagem den- tro das organizações e toda a complexidade que provém de suas inter-relações e de sua relação com o meio. O desenvolvimento social é a base da mudança porque para se desenvolver é necessário contar com o fator humano. Nesse sentido, o estudo das organizações trouxe recentemente para o centro das discussões a importância de analisar o fator humano e suas relações que são permeadas também pelos fatores sociais externos à própria organização. Para estudar as relações humanas no trabalho é necessário analisarmos algumas das categorias principais, necessárias para a compreensão da vida social. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Sociabilidade e socialização Anthony Giddens (2004, p. 28-29)refere-se ao processo de socialização comumente analisado pe- los sociólogos como algo que ocorre em duas fases: [...] a socialização primária decorre durante a infância e constitui o período mais intenso de aprendizagem cultural. É a altura em que a criança aprende a falar e aprende os mais básicos padrões comportamentais que são os alicerces de aprendizagens posteriores. Nesta fase, a família é o principal agente de socialização. A socialização secundária decor- re desde um momento mais tardio na infância até a idade adulta. Nesta fase, outros agentes de socialização assumem alguma da responsabilidade que pertencia à família. As escolas, os grupos de pares, instituições, os meios de comuni- cação e eventualmente o local de trabalho, tornam-se forças de socialização de um indivíduo. Nestes contextos, as inte- rações sociais ajudam as pessoas a aprender as normas, valores e crenças que constituem os padrões da sua cultura. Porém, o conceito de socialização para este autor é mais dialético; assim como o agente aprende os valores, normas e crenças que são padrões na sociedade em que vive, ele também intervém na cria- ção desses padrões, ou seja, o indivíduo não apenas desempenha um papel social dentro daquilo que aprende, mas é sim um agente social em intensa interação com o seu meio. Na verdade a socialização é um processo pelo qual os seres humanos se tornam agentes. Eles não são simplesmente sujeitos passivos à espera de serem instruídos ou programados. Os indivíduos concebem e assumem papéis sociais, no decurso de um processo de interação social. (GIDDENS, 2004, p. 29) Já para Guy Rocher, socialização é o processo que se dá ao longo da vida, pelo qual a pessoa apren- de e interioriza os elementos socioculturais de seu meio integrando-os na sua personalidade. (ROCHER, 1976 In: DUARTE, 1998, p. 12). Esse processo de socialização pode ser dividido em três partes: a aquisição da cultura:::: – a partir do nascimento o indivíduo, ao longo de sua vida, começa a adquirir as maneiras de pensar, agir e sentir de seu grupo. Esse processo constitui o principal canal de transmissão da cultura através do tempo e das gerações; a integração da cultura na personalidade:::: – quando há o processo de socialização, os ele- mentos da cultura e da sociedade integram-se na personalidade do indivíduo. Quanto maior for esse processo de interiorização, menor será a pressão do grupo no indivíduo; a adaptação ao ambiente social:::: – é a consequência do processo de socialização, fazendo com que a pessoa compartilhe ideias, crenças e sentimentos com os membros de seu grupo. Convívio social, isolamento e contato A liberdade é uma das condições para o convívio humano, outra é a responsabilidade, ou seja, responder pelos seus atos, sofrer as consequências das resoluções. A solidariedade também é um valor que condiciona a vida social, é um vínculo recíproco sendo que é o sentido moral que vincula o indiví- duo aos interesses de um grupo social, de uma nação ou da humanidade. 34 | Conceitos básicos para a compreensão da vida social Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 35|Conceitos básicos para a compreensão da vida social Tipos de isolamento Os processos sociais derivam da interação, ou seja, da ação exercida constantemente por indiví- duos ou grupos, uns sobre os outros, causando reações mútuas. O isolamento pode ser definido como a oposição a isso, ou seja, a falta de contato entre indivídu- os ou grupos é, portanto, um tipo de interação negativa. Para o homem que vive em sociedade não há isolamento absoluto, mas podemos falar em graus diferenciados de isolamento. Quando falamos em uma comunidade isolada queremos dizer que esta tem pouco ou quase nenhum contato com outras sociedades ou comunidades. Mas o isolamento pode referir-se também a um indivíduo dentro de seu grupo ou sociedade. Esta categoria pode ser dividida teoricamente em: isolamento espacial ou físico:::: – dá-se por fatores geográficos como montanhas, rios, florestas e pela distância das comunidades que funcionam como isolantes. O desenvolvimento tecno- lógico é que pode diminuir estes obstáculos. O isolamento individual pode ocorrer entre pre- sos em solitária ou voluntariamente, no caso dos eremitas; isolamento estrutural:::: – este tipo constitui-se por diferenças biológicas, como por exemplo, etnia, sexo e idade. A sociedade pode atribuir diferença de funções e atividades partindo des- tas características biológicas. Como no passado recente, tínhamos a escravidão entre os ne- gros, hoje temos o isolamento relativo dos guetos formados principalmente por imigrantes provindos de vários pontos do mundo em direção aos grandes centros como Europa e Estados Unidos. Como por exemplo, os guetos de latinos, nos Estados Unidos, Harlem negros em Nova York, nos Estados Unidos, de judeus em vários países do mundo, a segregação de mulheres nas religiões muçulmanas e em menor grau nas sociedades industriais, evidenciadas pelas lu- tas do movimento feminista e o aculturamento dos índios pela evangelização que ainda hoje é prática de muitas igrejas dos países desenvolvidos; isolamento funcional:::: – origina-se de deficiências físicas individuais as quais acarretam ne- cessidades especiais que, se não forem atendidas, afastam estes indivíduos do convívio com outros e com a própria sociedade. Por exemplo, a surdez, a cegueira e outras limitações físicas exigem condições especiais, que só nas sociedades atuais têm sido levadas em consideração, para que os indivíduos possam diminuir a distância imposta a eles na vida cotidiana, ou seja, no trabalho, no lazer etc; isolamento psíquico:::: – origina-se em fundamentos da própria personalidade individual em indivíduos da mesma cultura, como por exemplo, os gostos, temperamentos, pontos de vista, atitudes e sentimentos. Isto ocorre pelo fato de que dentro de uma mesma sociedade existem grupos sociais diversos, cada um com sua experiência. Como exemplo temos o isolamento en- tre o analfabeto e o cientista, o religioso e o cético etc. A sociedade de consumo hoje contribui muito para o isolamento psíquico porque dependendo do poder aquisitivo de determinado grupo haverá um conjunto correspondente de valores a ele associados, valores de consumo, de lazer etc. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Contatos sociais As relações sociais são processos dinâmicos porque, através delas, os indivíduos podem se apro- ximar ou afastar-se, dando origem a formas de associação ou dissociação. Um primeiro aspecto funda- mental destas relações é o contato social. Do contato social dependem todos os outros processos ou relações sociais. As relações resultantes do contato são chamadas de interação. Os contatos podem ser divididos em: físicos, que são apenas os instrumentos, a forma de se fazer o contato – o aperto de mão, o sinal de cabeça, o assobio, o piscar de olhos etc; e os contatos que envol- vem significados, ou seja, a transmissão de ideias, valores e atitudes. Portanto, o importante do contato social éa interpretação, a comunicação de significados. Os contatos podem ser: contatos diretos e indiretos:::: – os primeiros ocorrem por meio da percepção física, realizados face a face e os contatos indiretos são realizados através de intermediários ou de meios técni- cos de comunicação – telefone, carta, telegrama, rádio etc.; contatos voluntários e involuntários:::: – os contatos sociais voluntários são derivados da von- tade própria, sem coação, e opõem-se aos contatos involuntários, que derivam da imposição de uma das partes sobre a outra (como o contato entre guardas e prisioneiros); contatos com o passado e com o presente:::: – o primeiro tem por finalidade a transmissão da herança social através do estudo histórico ou do intercâmbio com gerações mais velhas, e o contato com o presente tem a finalidade de acolher ideias ou atitudes de outros grupos dando origem a um processo de mobilidade e mudança. É de importância fundamental; contatos primários e secundários:::: – os contatos primários são pessoais, íntimos e espontâ- neos, em que os indivíduos tendem a compartilhar suas experiências particulares; envolvem o elemento emocional, permitindo certa fusão de individualidade que dá origem aos “nós”. O contato é completo, considerado como um fim em si mesmo. Ex.: família, grupos de amizade e de vizinhança. Os contatos secundários são formais, impessoais, racionais e calculados, ge- ralmente superficiais envolvendo apenas uma faceta da personalidade. Ex.: aeromoça e passa- geiros de avião; comprador e vendedor; contatos do “nosso grupo”:::: – esta categoria está baseada no conceito de etnocentrismo cria- do por William Summer (1953). Os contatos do “nosso grupo” são baseados no fenômeno do etnocentrismo com a supervalorização da cultura e dos costumes. Os membros de um grupo são conscientes de suas semelhanças. É uma relação baseada nos sentimentos de identifica- ção, simpatia, lealdade e amizade. O bairrismo, o regionalismo e o nacionalismo fanáticos são também formas de etnocentrismo; contatos categóricos:::: – definido pelo sociólogo americano Shaler, são os contatos resultantes da classificação que fazemos de uma pessoa desconhecida, baseada na aparência física, fei- ções e profissão. Nas sociedades mais complexas há um numero bem maior de contatos secundários e categóricos e os contatos tendem a tornar-se cada vez mais fugazes e superficiais (LAKATOS, 1999). 36 | Conceitos básicos para a compreensão da vida social Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 37|Conceitos básicos para a compreensão da vida social Interação Interação social é a ação social que exige reciprocidade de dois ou mais indivíduos ou grupos em con- tato. Um agregado de indivíduos torna-se um grupo ou uma sociedade a partir do relacionamento de seus membros e de uma influência recíproca, direta ou indireta. É o entrelaçamento dos atos, ideias e sentimen- tos de pessoas ou grupos, causando modificação do seu comportamento, interna (socialização) ou externa (adaptação). A capacidade de interação destes grupos O instrumento de interação social é a comunicação que aparece através dos sentidos, das emo- ções e dos sentimentos e ideias. Os dois primeiros níveis de comunicação são básicos e comuns a to- dos os animais, já o nível das ideias é limitado ao homem pelo uso da linguagem, ou seja, a utilização de palavras ou símbolos perpassados pela cultura que formam o idioma. Novas tecnologias aumentam a comunicação e aproximam enormemente diferentes grupos e sociedades. Um bom exemplo disso é a internet e a TV a cabo. Assim, a compreensão do conceito de processos sociais e de seus principais tipos é fundamental para analisar a importância das relações humanas dentro das organizações. Segundo Lakatos (1999, p. 81), processos sociais são aqueles através dos quais a personalidade in- dividual se desenvolve e se relaciona com a sociedade, ou seja, se inter-relaciona. A interação tem sido classificada em seis formas básicas: cooperação, competição, conflito, adap- tação, acomodação e assimilação. Cooperação É a atuação de dois ou mais indivíduos, em conjunto, para alcançar um objetivo comum e requer uma combinação das atividades de forma organizada. É requisito indispensável para a manutenção e continuidade dos grupos e sociedades. Ela pode ser temporária, quando indivíduos se reúnem para re- alizar uma tarefa durante um período de tempo (Ex.: mutirão); e pode ser contínua quando, fixados em determinado local, os indivíduos cooperam uns com os outros (Ex.: controle de poluição). Pode também ser direta quando pessoas ou grupos realizam em conjunto coisas semelhantes. Ex.: quando um engenheiro contrata o trabalho de um arquiteto, de um pedreiro e de um eletricista, entre outros, para complementar seu trabalho. Ou indireta na realização de trabalhos diferentes, pois ninguém é autossuficiente. Ex.: quando consciente ou inconscientemente um agricultor trabalha para produzir matéria-prima para um industriário. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Competição e conflito Em todos os grupos sociais e sociedades existem diferentes capacidades e desejos entre seus componentes. Estes indivíduos ou sociedades competem entre si a fim de satisfazerem suas necessi- dades e aspirações. É considerado pelos estudiosos como um tipo de luta universal, por acontecer em ambos os mundos: animal e vegetal. Em alguns casos pode ser impessoal, contínua, destituída de vio- lência e, geralmente, os indivíduos não têm consciência deste fato. Ex.: um estudante aprovado no ves- tibular está impedindo, consciente ou inconscientemente, e indeliberadamente, a entrada de outro na universidade. Em alguns casos fica difícil perceber onde termina a competição e onde começa o conflito, isso porque quando a competição é consciente e deliberada está beirando o conflito. Formas de conflito A luta de interesses, pessoal e emocional implicando hostilidade na relação define o conflito e a diferencia da competição. É sempre uma luta entre indivíduos ou grupos por uma posição mais eleva- da, seja no plano econômico, político ou social, envolvendo sempre uma relação de tensão. O conflito pode apresentar-se de diversas maneiras: rivalidade:::: – acontece pelo ciúme e antagonismo. Ex.: a rivalidade entre torcedores de equi- pes de futebol de uma mesma localidade; debate:::: – contestação a respeito de ideias ou crenças diferenciadas entre indivíduos ou gru- pos. Ex.: os debates entre candidatos de partidos políticos em períodos de eleições; discussão:::: – polêmica ou disputa de ideias, forma mais acalorada de debate. Ex.: as discussões são comuns entre vizinhos em reuniões de condomínio; litígio judicial:::: – enfrentamento judicial entre partes contrárias. Ex.: partilha de bens em uma separação; contenda:::: – briga entre indivíduos ou grupos. Ex.: entre gangues juvenis; guerras:::: – enfrentamento armado entre nações, grupos religiosos ou étnicos e partidos políticos. Ex.: Revolução Francesa, Guerras Mundiais, guerra que provocou a partição da Ex-Iugoslávia. Os efeitos do conflito podem ser negativos ou positivos. Na maioria das vezes, são efeitos positi- vos quando o conflito se dá entre grupos, isso porque a solidariedade e o companheirismo são fortale- cidos num processo interno de cooperação para vencer o desafio que o outro grupo lhes impõe. Mas são negativos e enfraquecem a solidariedade e os valores morais deste grupo, quando se dá dentro de um mesmo grupo. Adaptação Fatores associativos que sucessivamente propiciam certo grau de adesão e conformidade às nor- mas estabelecidas; a diminuição do conflito e o estabelecimento de um modo de vida, a integração so- ciocultural entre indivíduos e grupos, no âmbito de uma sociedade. Realiza-se em três níveis principais: no nível biológico ou psicomotor:::: – o desenvolvimento de determinadas necessidades, gos- tos e atitudes corporaisse faz através do conhecimento do organismo neurofisiológico e de 38 | Conceitos básicos para a compreensão da vida social Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 39|Conceitos básicos para a compreensão da vida social seu aparelho sensitivo-motor. O corpo e os gostos dos indivíduos sofrem uma socialização que tende a adaptá-los a um determinado ambiente sociocultural; no nível afetivo:::: – verifica-se a modificação de sentimentos. Por exemplo: hoje se incentiva o amor no casamento e não o interesse das famílias; no nível de pensamento:::: – quando as faculdades intelectuais se desenvolvem através da in- corporação de elementos da cultura. A adaptação de um indivíduo ao grupo pressupõe a utilização de uma margem de liberdade e au- tonomia concedida pelo meio, não implicando necessariamente em conformidade social, ou seja, não significando a mera obediência às normas deste grupo. Acomodação É o processo social que objetiva atenuar o conflito entre indivíduos ou grupos, reduzindo-o. Pode ser considerado como um ajustamento formal e temporário, pois só aparece nos aspectos externos do comportamento, sendo quase nula a mudança interna relativa a valores e significados. Para alguns soció- logos a organização social humana é baseada na acomodação de elementos em conflito. Esse arranjo pos- sibilita a convivência entre elementos e grupos antagônicos e restaura o equilíbrio afetado pelo conflito. Segundo Lakatos (1999), a acomodação assume diferentes formas: coerção:::: – através do uso da força ou ameaça a parte mais forte submete a mais fraca, quando as partes envolvidas têm poderes desiguais. Ex.: escravidão; compromisso:::: – chegam à acomodação porque fazem concessões mútuas, no caso de possu- írem igual poder. Ex.: disputas parlamentares; arbitragem:::: – dá-se por meio de atuação de um árbitro ou mediador. Ex: disputas trabalhistas ou das varas de família; tolerância:::: – maneira de impedir o conflito manifesto, considerado como grau mínimo de aco- modação. Ex.: a convivência de grupos religiosos dentro de um mesmo país; conciliação:::: – é uma forma consciente de acomodação, há diminuição da hostilidade e harmo- nização entre os antagonistas. Ex.: respeito mútuo entre pesquisadores da mesma comunida- de científica que defendem teorias que se contrapõem uma a outra. Assimilação Ao contrário da acomodação a assimilação é uma mudança interna, cultural. É o processo pelo qual pessoas e grupos adquirem maneiras e costumes de outros grupos compartilhando sua experiên- cia e história e a incorporando numa vida cultural comum. Os fatores que influenciam o processo de as- similação são: linguagem :::: – a linguagem aparece como o primeiro e às vezes mais prolongado empecilho no processo de assimilação, pois é através da linguagem que valores, sentimentos e atitudes po- dem ser compartilhados; contatos primários :::: – através deles o processo de assimilação é mais fácil e natural. Ex.: como nos grupos de amigos; Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br ausência de caracteres físicos distintivos:::: – quando os indivíduos se assemelham fisicamen- te entre si, a assimilação também é facilitada pelo processo de identificação; número e concentração de indivíduos :::: – quando os imigrantes se estabelecem em grande número em determinado local (bairros de uma cidade), sua assimilação é mais difícil porque o convívio entre si mantém seus padrões culturais por mais tempo e as relações com o grupo lo- cal tornam-se menos necessárias; prestígio da cultura:::: – se os imigrantes desejam fazer parte daquela cultura nova porque a consideram uma cultura superior, a sua assimilação é mais rápida. Relação indivíduo-sociedade Como ações individuais podem ser explicadas no seu relacionamento com outras ações (exem- plo da eleição) ou como regras de ação coletiva podem ser incorporadas pelos indivíduos (exemplo da escola)? Nestas situações está em jogo a relação entre indivíduo e sociedade. A relação entre indivíduo e sociedade é uma relação central na análise sociológica, até hoje. Discutem- -se através de diversas teorias quais as possíveis formas de interação do indivíduo com a sociedade, até que ponto o indivíduo é determinado pela sociedade e até onde ele tem liberdade em suas escolhas. A Sociologia trata o indivíduo como um produto social em alguma medida. Mas quais são as relações funda- mentais que os indivíduos estabelecem em suas comunidades e até onde estas relações com o grupo os influencia nas decisões da vida cotidiana? Essa influência do meio em que nascemos é reconhecida pelos sociólogos, mas isso não significa que seja negada a individualidade dos seres humanos. Na verdade a so- cialização só é possível se houver liberdade e individualidade, pois cada um de nós, como seres individuais, vai desenvolver um sentido de identidade e capacidades para pensar e agir de forma independente. A Sociologia nasce no século XIX como uma reação ao individualismo predominante na socieda- de capitalista que nascia e a teoria econômica consolida seus modelos baseando-se principalmente em ações individuais. Contrapondo-se a isso, como nos coloca Tomazi (2000), o homem passa a ser visto na Sociologia a partir de sua inserção na sociedade e nos grupos sociais que a constituem. A empresa se constitui numa forma de comunidade humana mais ou menos aberta ou obrigatória. Visto que também associa homens, mas aqui com um objetivo específico que é a realização de uma produção econômica, é sobre a capaci- dade de comunicação e de colaboração desses homens dentro da empresa que se fundamenta uma par- te essencial da qualidade dos resultados e da intensidade dos desempenhos desta organização. Pelo simples fato de ser social, ou seja, constitutiva de laços de solidariedade duráveis, a realida- de humana da empresa é histórica. É preciso admitir que hoje o social não vem mais antes ou depois do econômico, mas no coração da produção como forma de integração possível entre os atores da produção, conduzindo a uma quali- dade de sociedade que se tornará um trunfo importante da economia. Em termos sociológicos, fala-se de construção de sociedade, de dinâmica de coesão social neces- sária à pertinência dos esforços de colaboração entre atores. É por isso que se faz necessário, no estudo racional das organizações produtivas, partir da análise das formas de interação social dos indivíduos na abordagem de alguns modelos de administração dos recursos humanos. 40 | Conceitos básicos para a compreensão da vida social Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 41|Conceitos básicos para a compreensão da vida social Textos complementares Identidade (GIDDENS, 2004) De uma forma geral, a identidade está relacionada com os entendimentos que as pessoas têm acerca de quem são do que é importante para elas. Esses entendimentos formam-se em função de determinados atributos que são prioritários em relação a outras fontes geradoras de sentido. O gê- nero, a orientação sexual, a classe social, a nacionalidade ou a etnicidade são algumas das principais fontes de identidade. Os sociólogos referem-se, sobretudo, a dois tipos de identidade: a identida- de social e a identidade pessoal. Embora analiticamente distintas estas formas de identidade estão intimamente relacionadas. Por identidade social entendem-se as características que os outros atri- buem a um indivíduo. Estas podem ser vistas como marcadores que indicam, de um modo geral, quem essa pessoa é. Ao mesmo tempo, posicionam essa pessoa em relação a outros indivíduos com quem partilha os mesmos atributos. Estudante, mãe, advogado, católico, sem-teto, asiático, disléxi- co, casado etc., são exemplos de identidades sociais. Muitos indivíduos têm identidades sociais que abrangem mais do que um atributo. Uma pessoa pode simultaneamente ser mãe, engenheira,mu- çulmana e vereadora. O fato de se ter múltiplas identidades sociais reflete as muitas dimensões da vida de uma pessoa. Embora esta pluralidade de identidades sociais possa constituir uma fonte po- tencial de conflitos, a maioria das pessoas organiza o sentido e a experiência das suas vidas à volta de uma identidade principal que é relativamente contínua no tempo e no espaço. As identidades sociais implicam, então, em uma dimensão coletiva, estabelecendo as formas pelas quais os indivíduos se “assemelham” uns aos outros. As identidades partilhadas – decorren- tes de um conjunto de objetivos, valores e experiências comuns – podem constituir um importante ponto de partida para os movimentos sociais. Feministas, ambientalistas, sindicalistas, fundamenta- listas religiosos e/ou nacionalistas são exemplos de casos em que uma identidade social comum é construída como fonte importante de sentido. Se as identidades sociais estabelecem as formas pelas quais os indivíduos são semelhantes a outros, a identidade pessoal distingue-nos enquanto indivíduos. Este tipo de identidade diz respei- to ao processo de desenvolvimento pessoal através do qual formulamos uma noção intrínseca de nós próprios e do relacionamento com o mundo à nossa volta. A noção de identidade pessoal deri- va em grande medida da obra dos interacionistas simbólicos. A negociação constante do indivíduo com o mundo que o rodeia ajuda a criar e moldar a sua identidade. O processo de interação entre o eu e a sociedade contribui para ligar o mundo pessoal e o mundo público. Embora o contexto cul- tural e social seja um fator que dá forma à identidade pessoal, a agência e a escolha individual são de importância central. Ao abordar as mudanças da identidade pessoal das sociedades tradicionais até as modernas, pode perceber-se um afastamento dos fatores invariáveis e herdados que antigamente determi- navam a formação da identidade. Se antes a identidade das pessoas era em grande medida deter- minada pela sua pertença a grupos sociais vastos, delimitados pela classe ou nacionalidade, hoje a identidade é mais multifacetada e instável. Os processos de crescimento urbano, a industrialização e Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br o colapso das antigas formações sociais enfraquecem o impacto das convenções e regras herdadas. Os indivíduos passaram a ter mais mobilidade social e geográfica, fato que libertou as pessoas das comunidades unitárias e relativamente homogêneas do passado onde os padrões eram transmiti- dos de uma forma rígida de geração em geração. Esta mudança criou espaço para que outras fontes de sentido, como o gênero ou a orientação sexual, desempenhassem um papel mais importante na noção de identidade das pessoas. No mundo atual, temos a oportunidade sem precedentes para decidir a nossa vida e criar a nossa própria identidade. Somos o nosso melhor recurso na definição de quem somos, de onde vie- mos e para onde vamos. Agora que sinais tradicionais se tornaram menos determinantes, o mundo social confronta-nos com um estonteante leque de escolhas acerca de quem devemos ser, como viver e o que fazer – sem oferecer grandes orientações acerca das seleções a fazer. As decisões que tomamos no cotidiano – acerca do que vestir, como vestir, como agir ou como ocupar o tempo – ajudam-nos a tornar-nos quem somos. O mundo moderno força-nos a descobrir-nos a nós próprios. Como seres humanos cientes e autoconscientes, criamos e recriamos as nossas identidades a todo o momento. Refletindo sobre a interação social em ambientes virtuais de aprendizagem (MACHADO, 2005) Alguns estudos sugerem que ambientes mediados por computador são capazes de suportar interação interpessoal afetiva, nomeadamente em estudos que envolvem ambientes educativos. Por exemplo, os estudos de Angeli, Bonk e Hara (1998), citados por Rourke, Andreson, Garrison e Ar- cher (2001) apontam que em determinado ambiente, 27% do total de mensagens continha expres- sões de sentimentos, anedotas, cumprimentos e outros. Em pesquisas na graduação em Psicologia e cursos de formação de professores, Maraschin e Axt (1999) relatam a emergência de uma escrita autonarrativa e autopoiética, centrada na experiência pessoal e grupal da comunidade virtual. Além disso, discutem que se constituem vínculos afetivos entre os participantes, a partir da potenciali- dade desagregadora e reflexiva oportunizada pelos recursos informáticos e por sua forma de uso a partir de proposta pedagógica baseada na autonomia e na construção do conhecimento. Peter Berger e Thomas Luckmann (2004) afirmam que a presença social é permeada pela for- mação de um mundo coerente que dê sustentação e significado a cada um de seus membros e esse mundo é objetivo e subjetivo, onde a experiência é fator fundamental para a criação da realidade. O sujeito e o objeto da experiência se perfazem de maneira “interativa”. Para esses autores, a possibilidade de interação social só pode ocorrer quando houver o encon- tro real e pessoal com o outro. Para eles, a linguagem é fator preponderante na objetivação da vida, pois ela sustenta e dá significado à existência. A possibilidade da vida ter significados para os indi- víduos está na criação de uma “estrutura de plausibilidade” onde a plausibilidade é a capacidade de tornar o mundo algo possível e compreensivo, sendo uma questão de conservação e de transfor- mação da realidade subjetiva – a base social específica e os processos sociais exigidos para sua con- 42 | Conceitos básicos para a compreensão da vida social Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 43|Conceitos básicos para a compreensão da vida social servação. A necessidade de confirmação, identificação e conservação estão presentes na conversa – o veículo mais importante para a conservação da realidade. A simples conversa, inclusive a corri- queira, marca essa necessidade de identificação do indivíduo com seu mundo (em amplo aspecto). Conservá-lo é encontrar-se, estar em sintonia com seu próprio pensamento. A conversa significa que os indivíduos interagem e nessa conversa está a fala e a comunicação não verbal. Para manter a realidade subjetiva, a conversa deve ser com continuidade e coerência, pois se houver rupturas podem representar ameaças para a paz subjetiva, portanto deve ser cons- tante. Essas ameaças ocorrem não apenas com o mais importante veículo para a conservação da realidade, mas com qualquer outro que interrompa a definição da realidade na consciência. Desta forma, há a possibilidade da realidade subjetiva ser transformada, o que Berger e Luckmann cha- mam de “alternação”. Atividades 1. Baseado na leitura do primeiro Texto complementar, qual é a relação entre a identidade pessoal e as identidades sociais? 2. Que importância tem a socialização primária nas sociedades complexas? Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 3. Em sua opinião, quais são os principais processos sociais? Conceitue-os. 4. Quais são as formas básicas de interação? 44 | Conceitos básicos para a compreensão da vida social Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 45|Conceitos básicos para a compreensão da vida social Gabarito 1. Elas estão intimamente relacionadas porque o indivíduo está em constante negociação com o mundo que o rodeia e esse mundo social ajuda a criar e moldar a sua identidade pessoal. O pro- cesso de interação entre o eu e a sociedade contribui para ligar o mundo pessoal e o mundo público. Embora o contexto cultural e social seja um fator que dá forma à identidade pessoal, a agência e a escolha individual são de importância central. 2. A importância da socialização primária baseada nos valores mais tradicionais vem diminuindo. Isso porque os fatores invariáveis e herdados que antigamente determinavam mais fortementea formação da identidade, como, por exemplo, a medida determinada pela sua pertença a grupos sociais vastos, delimitados pela classe ou nacionalidade, hoje em dia não o fazem, pois a identi- dade é mais multifacetada e instável. 3. Isolamento – pode ser definido como a falta de contato entre os indivíduos ou grupos e é, por- tanto, um tipo de interação negativa. Para o homem que vive em sociedade não há isolamento absoluto, mas podemos falar em graus diferenciados de isolamento. Contato – do contato social dependem todos os outros processos ou relações sociais. Socialização – processo pelo qual o indivíduo aprende os valores, normas e crenças que são pa- drões na sociedade em que vivem, mas também intervém na criação desses padrões, ou seja, tor- nando-se assim um agente social em seu meio. Interação – ação social que exige reciprocidade de dois ou mais indivíduos ou grupos em contato. São as relações resultantes do contato. 4. Sabendo que a interação social é a ação social que exige reciprocidade de dois ou mais indivíduos ou grupos em contato, podemos enumerar algumas formas básicas de interação. Cooperação – atuação de dois ou mais indivíduos, em conjunto, para alcançar um objetivo :::: comum. Competição e conflito – resultado das diferentes capacidades e desejos entre os componen-:::: tes do grupo. Adaptação – processos biológicos (necessidades, gostos e atitudes corporais), afetivos (modi-:::: ficação de sentimentos) e intelectuais (através da incorporação de elementos da cultura) que propiciam a adesão e conformidade às normas estabelecidas pelo grupo. Acomodação – é o processo social que objetiva atenuar o conflito entre indivíduos ou gru-:::: pos, reduzindo-o, o que pode ser um ajustamento formal e temporário. Esse arranjo possi- bilita a convivência entre elementos e grupos antagônicos e restaura o equilíbrio afetado pelo conflito. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Assimilação – trata-se de um processo que envolve uma mudança interna e cultural em que :::: pessoas e grupos adquirem maneiras e costumes de outros grupos compartilhando sua expe- riência e história e a incorporando numa vida cultural comum. 46 | Conceitos básicos para a compreensão da vida social Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Características e tipologias dos principais grupamentos sociais A análise das formas de interação social é importante para a Sociologia, pois nossas ações cotidia- nas de interação com as pessoas estruturam o nosso dia a dia. Isso porque organizamos as nossas vidas através de padrões que se repetem diariamente. Também é possível conhecer, através desse estudo, a forma como, em interação, agimos consciente ou inconscientemente, modificando a sociedade em que vivemos. Esta relação se dá de maneira diferenciada, de indivíduo para indivíduo e de grupo para gru- po, isso porque ela vai depender da posição social que o indivíduo ocupa, de suas motivações e de seus interesses. Ou seja, o homem como um ser criativo tem sempre a possibilidade de tomar diferentes de- cisões frente a questões diversas que lhes aparecem a todo o momento. Por último, podemos dizer que estudar as interações sociais também nos ajuda a compreender e interpretar as organizações e as insti- tuições que formam a sociedade em que vivemos. O estudo do comportamento cotidiano centra-se em indivíduos ou grupos pequenos, mas não podemos descontextualizar estas análises da influência dada pelo enquadramento social mais amplo de que fazem parte. Estas relações envolvem a cultura, o ambiente físico (rural ou urbano) e político (es- trutura organizacional da sociedade) em que vivem. Portanto, estes estudos de grupamentos sociais em menor escala são necessários, também, para que possamos compreender as instituições mais amplas. Vamos nos concentrar na análise de alguns agrupamentos humanos mais importantes para o nosso estudo das organizações. A compreensão desses conceitos se faz necessária para que possamos aprofundar nossa compreensão de como se dão essas interações. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Grupos sociais Historicamente, o ser humano logo descobriu que a vida em grupo facilitava em muito as tarefas necessárias a sua sobrevivência e que como indivíduos isolados teriam menos chances de sobrevivên- cia. Assim, o homem passa a caçar em grupos e aos poucos vai aperfeiçoando esta técnica descober- ta com a divisão das tarefas dentro desses grupos permitindo um melhor resultado. Este importante aprendizado se estendeu aos poucos para muitas outras situações da vida e o homem passou a se or- ganizar e a participar de diversos grupos sociais que, dentro de grupos maiores, foram formando o que hoje chamamos de sociedades. Mas o que entendemos por grupos sociais? Os grupos sociais, como agentes de socialização, podem ser definidos como sistemas de relações sociais de cooperação duradouras e estáveis que possuem um objetivo em comum. Portanto, a caracte- rística principal dos grupos é a de apresentar integração social entre seus membros, da qual decorrem relações de reciprocidade e a unidade do grupo advém de um objetivo comum ou de consenso. O fato de haver cooperação entre os membros do grupo não significa que seja necessária a exis- tência de relações amigáveis entre seus integrantes, elas podem também ser hostis, mas a cooperação deve implicar a existência de normas que orientem a ação de seus membros. Assim, participantes de um grupo social têm direitos e obrigações que as outras pessoas não têm. Essa é a característica que as distingue como membros de um grupo. Em sociedade, participamos de diferentes grupos que estão constantemente surgindo das relações de interação entre seus integrantes. Mas como se dá o recrutamento dos membros de um grupo social? Lakatos relaciona seis for- mas diferenciadas de formação dos grupos. Através da aceitação voluntária da participação, como no casamento, em grupos de amigos, em clubes sociais ou associações. Por indicação, através de outros membros; nomeação ou designação pelo grupo ou seus dirigentes. Por eleição, onde todos os mem- bros do grupo podem participar da escolha de mais um. Por qualificação do indivíduo e contrato, que é utilizado principalmente pelas empresas. Por alistamento, usado principalmente pelas forças armadas. E por coerção, legítima ou ilegítima, empregada por variados grupos como a família (coerção moral), Estado (coerção legal), sistema penitenciário (coerção física). Os grupos, portanto, obedecem a diferentes formas de recrutamento, organização, finalida- de e objetivos, no entanto, possuem algumas características comuns. Conforme Fitcher (In: LAKATOS; MARCONI, 1999, p. 119-120), as características dos grupos sociais podem ser divididas em: identificação:::: – o grupo deve poder ser identificado como tal pelos seus membros e pelos ele- mentos de fora; estruturação social:::: – decorrente do fato de que cada componente ocupa uma posição rela- cionada com a posição dos demais; papéis individuais:::: – condição essencial para a existência do grupo e sua permanência como tal, pois cada um de seus membros tem uma participação determinada; relações recíprocas:::: – entre os membros de um grupo deve haver interação. Para alguns auto- res, esta é a única característica empregada na conceituação de grupo social; 48 | Características e tipologias dos principais grupamentos sociais Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 49|Características e tipologias dos principais grupamentos sociais normas comportamentais:::: – são certos padrões, escritos ou não, que orientam a ação dos componentes do grupo e determinam a forma de desempenho do papel; interesses e valores comuns:::: – o que é considerado bom, desejável, aceito e compartilhado pelos membrosdo grupo. O grupo geralmente se divide quando ocorre o conflito de valores; finalidade social:::: – razão de ser e objetivo do grupo; permanência :::: – para que um grupo seja considerado como tal, é necessário que a interação entre os membros se prolongue durante determinado período de tempo. Podemos também classificar os grupos sociais a partir de diferentes critérios. Se levarmos em consideração o tipo de contato entre seus membros, a partir dos estudos de Clooney, renomado soció- logo norte americano, podemos dividi-los em dois principais: primários:::: – os que estabelecem um contato direto entre seus membros, representando o con- tato face a face, um valor maior para a socialização do indivíduo. Ex.: a família, a vizinhança; secundários:::: – os que ocorrem predominantemente de forma indireta, mediante instrumentos ou meios de comunicação, ou outras pessoas. Ex.: na relação do Estado com os indivíduos. Segundo Lakatos eles também podem se classificar em: espontâneos:::: – quando se formam espontaneamente. Ex.: multidão e cidade; contratuais:::: ou voluntários – criados com uma finalidade determinada e possuidores de es- tatutos. Ex.: grupos econômicos, recreativos e educacionais; acidentais:::: ou periódicos – constituídos acidentalmente, também se desfazem em pouco tempo. Ex.: auditório, multidão; permanentes ou contínuos:::: – são aqueles estáveis no tempo. Ex.: família, igreja, escola, empresa; difusos:::: – agrupamentos nos quais inexistem leis, estatutos e regulamentos, baseia-se em de- terminados padrões de comportamento e em distribuição rudimentar de autoridade e subor- dinação. Ex.: grupo de amigos, grupo de estudos; organizados:::: – aqueles que obedecem a regras preestabelecidas, especificadas em regimen- tos, estatutos e leis. Ex.: clubes filantrópicos, sindicatos e Estado. Estes tipos divididos pela origem, duração e estrutura dos grupos podem aparecer conjuntamen- te na realidade estudada, pois não são excludentes. No entanto, a característica fundamental entre todas as estudadas na classificação dos grupos so- ciais é sem dúvida o tipo de relações entre os membros. Assim, outro sociólogo e também demógrafo norte-americano da mesma escola de Clooney, Kingsley Davis, propõe-se a analisar mais profundamen- te a diferença proposta por Clooney entre grupos primários e grupos secundários a partir das condições físicas de proximidade, limitação no número de seus integrantes e duração da relação do grupo, como também das características sociais de relação existentes entre seus membros. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Para que esta característica fique mais clara na classificação proposta, vejamos o quadro abaixo elaborado por Davis (LAKATOS; MARCONI, 1999, p. 127). Condições Físicas Características Sociais Exemplo de Relações Exemplo de Grupos Pr im ár ia Proximidade física Exiguidade do grupo Duração prolongada da relação Identificação dos fins. A relação é um fim em si mesma – avaliação intrínseca da relação. A relação é pessoal – avaliação intrínseca de outra pessoa. A relação é completa – completo conhecimento de outra pessoa. A relação é espontânea – sentimento de liberdade e espontaneidade, funcionamento dos controles informais. Marido – mulher Amigo – amigo Professor – aluno (escolas de 1.º grau) Família Grupo de brinquedos Grupo de amigos Aldeia ou vizinhança Se cu nd ár ia Distância física Grande número de pessoas Pouca duração da relação Disparidade dos fins. Avaliação intrínseca da relação. Avaliação extrínseca de outra pessoa. Conhecimento especializado e limitado de outra pessoa. Sentimento de constrangimento externo. Funcionamento dos controles formais. Presidente da República – eleitores Papa – fiéis Oficial de Estado-Maior – soldado Vendedor – freguês Estado Igreja Forças Armadas Federações e Confederações de Trabalhadores Os agregados sociais Conhecidos o conceito e os tipos de grupos sociais existentes, que historicamente constituíram as diferentes formas de organizações sociais, vamos analisar outros grupamentos sociais importantes em nossa análise: os agregados sociais. Para começar, vamos diferenciar grupos e agregados sociais e, para isso, podemos fazer uso de um exemplo bem simples: o diretório de um partido político em uma determinada cidade é um grupo 50 | Características e tipologias dos principais grupamentos sociais Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 51|Características e tipologias dos principais grupamentos sociais social e um comício promovido por esse diretório forma um agregado social. Ou seja, se quisermos defi- nir agregados sociais em comparação com os grupos sociais, são duas as diferenças básicas. Os agrega- dos têm proximidade física como os grupos sociais, porém, pode não haver comunicação ou as relações sociais entre seus membros pode ser considerada mínima. Alguns tipos principais de agregados Multidão Segundo Lakatos é um “agregado pacífico ou tumultuoso de pessoas ocupando determinado espaço físico” (LAKATOS; MARCONI, 1999, p. 111). A multidão pode ser caracterizada como desordena- da, onde a interação aparece de forma descontrolada, espontânea e imprevisível, os seus componen- tes são anônimos, pois a comunicação, o contato e a interação não são obrigatórios, podendo aparecer em grau mínimo, e as ações são simultâneas e análogas, pois os sentimentos são comuns a todos os in- tegrantes do grupo. Apesar de poder ter um líder, não possui divisão de trabalho nem sistema de po- sições, mas seus participantes adquirem segurança e poder pelo simples fato de que os seus membros procedem da mesma forma, o que os torna iguais, e também a atenção da multidão é fixa em uma úni- ca ideia. A ação da multidão é sempre de baixo nível intelectual em comparação com as ações dos in- divíduos, pois as pessoas dotadas de forte personalidade podem até resistir à sugestão, mas são muito poucas para lutar contra a corrente. As multidões são ainda classificadas, segundo Lakatos, em: casuais, com existência momentânea; convencionais ou auditórios, possuem duração limitada e um comportamento preeestabelecido; ativa ou turba, onde a ação é canalizada para um alvo e em geral é agressiva e destrutiva, como em saques e pi- lhagens; multidões em pânico, voltada para a fuga de um perigo em comum, a ação em que o grupo in- tensifica o caráter irracional; e multidão expressiva que não se dirige a um objetivo determinado, mas sim, serve para descarregar tensões, como nas comemorações de carnaval, as comemorações esportivas etc. Público e massa Lakatos trabalha com as características de público e massa a partir de suas diferenças. Público. Conjunto de indivíduos em que: é praticamente igual o número de pessoas que expressam e recebem opiniões; a. a organização da comunicação pública permite uma resposta imediata e efetiva a uma opinião publicamente ex-b. pressa; a opinião, formada através dessa discussão, encontra possibilidades de se transformar em ação efetiva, mesmo con-c. tra o sistema de autoridade vigente, se necessário; as instituições de autoridade não têm penetração – o público é, portanto, mais ou menos autônomo em suas ações.d. Massa. Conjunto de elementos em que: o número de pessoas que expressam opiniões é incomparavelmente menor do que aquele que as recebe; a mas-a. sa é uma coleção abstrata de indivíduos, recebendo impressões e opiniões já formadas, veiculadas pelos meios de comunicação de massa; Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br a organização da comunicação pública impede ou dificulta a resposta imediata e efetiva às opiniões externadas b. publicamente; as autoridades controlam e fiscalizam os canais por meio dos quais a opinião se transforma em ação;c. os agentes institucionais têm maior penetração;a massa, portanto, não tem autonomia, sendo reduzida a formação d. da opinião independente através da discussão. (LAKATOS; MARCONI, 1999, p. 114-115) Assim, o tipo de comunicação é uma característica básica na diferenciação entre público e massa. Quando a comunicação principal for a discussão, ampliada ou não por veículos de comunicação, esta- mos falando de um público, mas quando a comunicação predominante se der através de veículos for- mais onde as pessoas aparecem apenas como espectadoras de opiniões já formadas, trata-se de uma sociedade de massa. Mecanismos de sustentação dos grupos sociais Os elementos que sustentam a permanência dos grupos sociais são mecanismos de controle que organizam o comportamento de seus membros de acordo com os padrões estabelecidos. Esses meca- nismos são racionalmente preestabelecidos e devidos à própria dinâmica interna dos grupos sociais. Aqui tratamos dos principais: liderança, normas, sanções, valores e símbolos sociais. Liderança:::: : é a capacidade de influenciar o que acontece dentro de um grupo. Na maioria das vezes está baseada em alguma forma de autoridade legítima em associação com uma posição social ou cargo dentro do grupo, tem importante papel integrador entre seus mem- bros por representar os interesses e valores do mesmo. Podemos dividir os tipos de liderança em: pessoal (baseada no prestígio, nas habilidades próprias da personalidade do indivíduo) e institucional (baseada na autoridade, na faculdade socialmente reconhecida de mandar). Normas sociais:::: : são regras que regulam o comportamento e a aparência das atitudes dos in- divíduos, pois estabelecem uma relação entre um ato (p. ex. falar caluniosamente) e as san- ções sociais (ser processado). Os grupos oferecem aos indivíduos certos padrões ideais, em função dos quais estes devem ajustar o seu comportamento, se não o fazem sofrem sanções. Sanções sociais:::: : controlam o comportamento e as atitudes dos indivíduos através de re- compensas ou punições. As recompensas são aplicadas sob a forma de aceitação, aplausos, honrarias etc. As punições vão desde vaias, insultos, perdas de bens e multas até a prisão do indivíduo. A toda norma social corresponde uma sanção social. Valores sociais:::: : são conjuntos de ideias utilizadas para categorizar coisas em relação a outras e não compará-las como sendo apenas semelhantes. Ajudam também a sustentar os grupos sociais quando são reconhecidos pelos membros do grupo. Os valores existem fora do indiví- duo que pode tê-los ou não. São valores do grupo ou daquela sociedade. Valores são partes importantes de todas as sociedades porque influenciam a maneira como pessoas escolhem e como sistemas sociais se desenvolvem e mudam. Os valores estão em constante evolução. 52 | Características e tipologias dos principais grupamentos sociais Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 53|Características e tipologias dos principais grupamentos sociais Símbolos:::: : constituem o núcleo do sistema social, pois é com eles que formamos pensamen- tos, ideias e outras maneiras de representar a realidade e pode ser definido como qualquer coisa usada para representar algo mais do que si mesmo. É um sinal convencionado que evo- ca ou substitui algo relevante para determinado grupo social. A linguagem pode ser conside- rada o mais complexo conjunto de símbolos da humanidade. Para concluir, o estudo da forma como os seres humanos se organizam em grupos e a análise dos grupamentos sociais nos dá uma ideia de como se estruturam e se relacionam as organizações, des- de as menores como as empresas até as maiores como as sociedades. Quando estudamos a estrutura de alguma coisa, estamos estudando a inter-relação das diversas partes (grupos e grupamentos) que a compõem. É a relação entre essas partes que forma a estrutura do todo e nos ajuda a compreender as instituições existentes na sociedade desde sua lógica interna. Texto complementar Teoria X: pressuposições acerca da natureza e do comportamento humano (MCGREGOR, 2008) O ser humano, de modo geral, tem uma aversão essencial ao trabalho e o evita sempre 1. que possível. A ênfase dada pela gerência à produtividade, ao conceito de “uma boa média de traba- lho por dia”, aos males da operação tartaruga e da sonegação do produto, aos prêmios para melhor desempenho – conquanto tenha uma lógica em termos dos objetivos da empresa – reflete uma crença subjacente de que a gerência deve agir de forma a neutra- lizar uma inerente tendência humana a fugir do trabalho. Para muitos gerentes, à evidên- cia da verdade essa pressuposição seria incontestável. Devido a essa característica humana de aversão ao trabalho, a maioria das pessoas pre-2. cisa ser coagida, controlada, dirigida, ameaçada de punição para que se esforce no sen- tido da consecução dos objetivos organizacionais. A aversão é tão forte que nem mesmo a promessa de recompensas é geralmente suficiente para vencê-la. As pessoas aceitam as recompensas e as exigem cada vez mais elevadas, mas isso não basta para produzir o esforço necessário. Só a ameaça de punição terá efeito. O ser humano, de modo geral, prefere ser dirigido, quer evitar responsabilidade, tem re-3. lativamente pouca ambição, e quer garantia acima de tudo. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Essa pressuposição da “mediocridade das massas” raramente é expressa de maneira as- sim tão rude. De fato, muito se louva o valor do ser humano. Nossos valores sociais e po- líticos exigem essas expressões públicas. Não obstante, um grande volume de gerentes apoia, privadamente, essa pressuposição, que se pode facilmente ver refletida na políti- ca e na prática. Paternalismo passou a ser palavrão, mas não é, de forma alguma, uma fi- losofia gerencial já morta e enterrada. Teoria Y: pressuposições acerca da natureza e do comportamento humano (MCGREGOR In: DIAS, 2008) O dispêndio de esforço físico e mental no trabalho é tão natural como o jogo ou o des-1. canso. O ser humano não detesta, por natureza, o trabalho. Dependendo de condições contornáveis, o trabalho pode ser uma fonte de satisfação (e será voluntariamente reali- zado) ou uma fonte de punição (e será evitado, se possível). O controle externo e a ameaça de punição não são os únicos meios de estimular o traba-2. lho em vista dos objetivos organizacionais. O homem está sempre disposto a se autodi- rigir e se autocontrolar a serviço de objetivos com os quais se compromete. O compromisso com os objetivos é dependente das recompensas associadas à sua con-3. secução. A mais importante dessas recompensas, isto é, a satisfação do ego e das neces- sidades de autoafirmação pode ser produto direto do esforço feito em vista dos objetivos organizacionais. O ser humano comum aprende, sob condições adequadas, não só a aceitar responsabi-4. lidades como a procurá-las. A recusa de responsabilidades, a falta de ambição e a busca de garantia são, geralmente, consequências da experiência, e não características huma- nas natas. A capacidade de usar um grau relativamente alto de imaginação, de engenhosidade e de 5. criatividade na solução de problemas organizacionais é mais amplamente distribuída na população do que geralmente se pensa. Nas condições da vida industrial moderna, as potencialidades intelectuais do ser huma-6. no comum estão sendo parcialmente usadas. 54 | Características e tipologias dos principais grupamentos sociais Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 55|Características e tipologias dos principais grupamentos sociais Atividades 1. Seria possível a vida social sem interação entre indivíduos e grupos sociais? Por quê? 2. Agora pare e pense na sua vida cotidiana. Você tem escolhas a fazer e opções que deve tomar em seu dia a dia. Identifique quais de suas ações dependem de sua vontade e quais você poderia im-putar ao contexto mais amplo em que está inserido. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 3. Como podemos definir grupos sociais? 4. A partir das ideias do Texto complementar podemos identificar alguns mecanismos utilizados pelos gerentes para controlar o grupo social que lideram, no caso um grupo econômico, ou mais especifi- camente uma empresa. Cite exemplos de normas, sanções e valores sociais encontrados no texto. 56 | Características e tipologias dos principais grupamentos sociais Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 57|Características e tipologias dos principais grupamentos sociais Gabarito 1. Não, porque nossas ações cotidianas de interação com as pessoas estruturam o nosso dia a dia. Organizamos as nossas vidas através da interação entre nós, como indivíduos ou enquanto gru- pos sociais dos quais fazemos parte. 2. O aluno deve refletir sobre quais ações cotidianas estruturam o seu dia a dia e apontar as que são tomadas por opções pessoais e quais são consideradas fruto da influência dada pelos grupos de que fazem parte. Essas relações envolvem a cultura, o ambiente físico e político em que vivem. 3. Os grupos sociais são sistemas de relações sociais de cooperação duradouras e estáveis que pos- suem um objetivo em comum. Podem ser concebidos como agentes de socialização cuja princi- pal característica é de apresentar a integração social entre seus membros. 4. Na teoria X: Norma – “uma boa média de trabalho por dia”.:::: Sanção – “prêmios para o melhor desempenho, ameaça de punição”.:::: Valores sociais – “o ser humano, de modo geral prefere ser dirigido, tem pouca ambição e quer :::: garantia acima de tudo”. Na teoria Y: Norma – “dependendo de condições controláveis, o trabalho pode ser uma fonte de satisfação”.:::: Sanção – “o compromisso com os objetivos é dependente das recompensas associadas à sua :::: consecução”. Valores sociais – “o ser humano comum não detesta o trabalho, aprende não só a aceitar res-:::: ponsabilidades como a procurá-las”. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 58 | Características e tipologias dos principais grupamentos sociais Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Organizações e sociedade O surgimento da Sociologia das Organizações está diretamente vinculado ao aparecimento das empresas industriais ocorrido no período das grandes transformações estruturais decorrentes do pro- cesso de industrialização e do surgimento do capitalismo. A passagem da produção artesanal para a produção fabril revolucionou a forma como os trabalhadores se organizavam até então para o trabalho. Essa nova forma de organização dos trabalhadores em empresas industriais foi de importância funda- mental para o crescimento do sistema capitalista como até hoje se apresenta. A Sociologia das Organizações tenta compreender a organização social da empresa entenden- do-a como uma unidade constituída por grupos de indivíduos em interação. Toda a complexidade que provém de suas inter-relações e de sua relação com o meio é objeto da Sociologia das Organizações. Com o tempo aparecem estruturas de grupo, nascem relações entre estas forças e as regulações coletivas tornam-se indispensáveis. A empresa não pode desconsiderar a complexidade da estrutura social de suas capacidades de produção. É para analisar esta complexificação dentro das organizações que surge a Sociologia das Organizações. A quantidade de modelos de organização estruturados por diversos teóricos da área demonstram uma constante tentativa de encontrar respostas aos problemas técnicos de produção e de comporta- mento dos homens no trabalho. Vamos trabalhar com algumas destas conceituações que nos ajudarão a compreender melhor esta realidade. Conceito de organizações Vamos primeiramente conhecer o significado de organização. Segundo Anthony Giddens: “uma organização é um grupo amplo de pessoas, estruturado em linhas impessoais e constituído para se al- cançarem objetivos específicos; no caso de um hospital, estes objetivos são os de curar doenças e pres- tar outras formas de assistência médica.” (GIDDENS, 2004, p. 348). Podemos dizer ainda que uma organização é uma forma de comunidade humana mais ou menos aberta ou obrigatória, visto que associa homens para realizar um objetivo e é sobre sua capacidade de comunicação e de colaboração que se funda uma parte essencial da qualidade de seus resultados. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Nossas vidas estruturadas em sociedades modernas são perpassadas pelas organizações de for- ma constante e permanente e, muitas vezes, várias delas estão interagindo para possibilitar a vida que levamos. Por exemplo, ao abrirmos uma torneira estamos em contato com as empresas públicas ou pri- vadas que tratam a água em nossa cidade, e a canalizam para que saia em nossas casas. Este simples fato de se obter água encanada em casa mobiliza mais de uma organização existente em nossa socie- dade e das quais nos tornamos dependentes. Giddens também nos aponta o lado negativo desta enorme influência que as organizações exer- cem em nossas vidas. Isso porque, com a complexificação das sociedades modernas aumenta também a nossa dependência em relação às organizações, passamos a ser controlados por especialistas e autori- dades que através de regras normativas determinam aquilo que somos obrigados a fazer, de forma que, se não fizermos, teremos a possibilidade de sofrer sanções. A obediência às leis, o pagamento de impos- tos e a participação dos jovens em guerras, são exemplos bem claros desse controle. Teorias das organizações: o enfoque sociológico Três autores, mais especificamente, tiveram grande impacto na construção do pensamento so- ciológico acerca das organizações. Max Weber, que desenvolveu o primeiro estudo mais sistemático do surgimento das organizações modernas e Robert Merton que, partindo dos trabalhos de Weber, ana- lisou o tipo ideal de burocracia salientando as consequências prejudiciais deste sistema, ou seja, de- monstrando as suas disfunções decorrentes da própria burocratização do processo. Depois deles, Michel Foucault fez uma grande contribuição nessa área, com seus estudos sobre as relações de poder e o aumento do controle das instituições sobre os indivíduos, chamando atenção para o fato de que a arquitetura de uma organização está diretamente relacionada com a ordenação so- cial e o sistema de autoridade da mesma. Para ele, o controle do tempo e do espaço, disponíveis aos in- divíduos dentro das organizações é fundamental para que essa organização atinja seus objetivos. A perspectiva de Max Weber Este autor inicia seus estudos sobre a burocracia enfocando-a de uma perspectiva histórica, atra- vés de um paralelo entre a mecanização da indústria e o aumento das formas burocráticas de organiza- ção das mesmas. O termo burocracia é empregado por Weber para explicar um modelo organizacional considerado por ele como ideal, porque é racional e eficiente pela existência de regras claras que de- vem ser seguidas, não dando margens às variações e instabilidades do ser humano. Historicamente, esta palavra já fazia parte de estudos relacionados ao funcionamento das organizações públicas como nos mostra Giddens nesta passagem: A palavra burocracia foi utilizada pela primeira vez por de Gournay em 1745, que juntou ao prefixo “Bureau” (origi- nalmente em francês), que tanto significava escritório como secretária, a palavra “cracia”, derivada do verbo grego “governar”. A burocracia é por conseguinte, o poder dos funcionários. A princípio o termo era aplicado apenas aos fun- cionários do governo, mas o seu uso foi generalizado gradualmente para nos referirmos às grandes organizações em geral. (GIDDENS, 2004, p. 350) 60| Organizações e sociedade Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 61|Organizações e sociedade Para Weber, as organizações constituem formas de coordenar as atividades dos seres humanos de uma maneira constante no tempo e no espaço. É a partir da questão da legitimidade no exercício da autoridade legal que ele vai criar sua teoria sobre a “administração racional legal”. Considerava legítima a autoridade apoiada na competência do funcionário, em oposição à forma mais presente na sociedade da época que se baseava na tradição ou no carisma da autoridade. As pessoas seriam escolhidas para suas funções ou cargos conforme suas aptidões e sua formação ou através de regras explícitas já exis- tentes. O conjunto de regras escritas para cada organização seriam os estatutos que ajudariam a esta- belecer critérios de escolha e distribuição dos indivíduos dentro das organizações. Weber, quando define os três tipos de dominação, nos fala que na dominação burocrática: [...] é decisivo, todavia que o trabalho rotineiro esteja entregue, de maneira predominante e progressiva, ao elemento burocrático. Toda a história do desenvolvimento do Estado moderno, particularmente, identifica-se com a da moderna burocracia da empresa burocrática, da mesma forma que toda a evolução do grande capitalismo moderno se identifi- ca com a burocratização crescente das empresas econômicas. As formas de dominação burocrática estão em ascensão em todas as partes. (WEBER apud COHN, 1986, p. 130) Ele chama atenção para o fato de que o desenvolvimento das organizações estaria baseado no domínio da informação e da competência necessárias para o exercício da autoridade em um mundo econômico inteiramente novo na história das sociedades. Para ele toda a informação sobre a organiza- ção em questão deve estar registrada através da existência de regras escritas e de registros guardados em arquivos contendo o histórico da organização. Weber percebia a estrutura das organizações como fortemente hierarquizadas, estando o poder concentrado no topo da organização. Para ele, portanto, as grandes organizações modernas são, por natureza, formadas pela concentração de poder e por uma organização burocratizada. Weber considerava que o processo de racionalização, para o qual as sociedades modernas se en- caminhavam, tornaria a burocratização das organizações inevitável e atingiria todos os campos da vida moderna, desde a Ciência, substituindo-se as crenças religiosas pelas explicações científicas, passando pela Educação e chegando aos sistemas de governo. Todas as decisões das pessoas passavam a obede- cer a objetivos concretos e racionais. O caminho melhor e mais eficiente seria escolhido para produzir determinado resultado. A autoridade burocrática então aparecia como a única forma de lidar com as implicações admi- nistrativas de grandes sistemas sociais. À medida que as tarefas se tornaram mais complexas, tornou- -se necessário desenvolver sistemas de controle e de gestão de forma a lidar com essa complexificação. Para ele a superioridade técnica do sistema de racionalização legal era comparável com a precisão das máquinas mais avançadas e sofisticadas, o que garantiria a máxima eficiência na execução dos objeti- vos da organização. No entanto, sabemos que este conceito de burocracia é, desde sua formulação, bastante polêmi- co. Por um lado é sinônimo de ineficiência e por outro de cautela e organização. Vejamos o que nos co- loca Anthony Giddens sobre isso: De Gournay falou do desenvolvimento do poder dos funcionários como uma “doença chamada buromania”. O roman- cista francês Honoré de Balzac retratava a burocracia como “O poder gigante dos pigmeus”. Este tipo de opinião tem persistido até aos nossos dias. A burocracia é frequentemente associada à formalidade, à ineficácia e ao desperdício. Outros autores, contudo, conceberam de forma diferente a burocracia – como um modelo de gestão cautelosa, precisa, eficaz. Partilham a ideia de que a burocracia é, de fato, a forma de organização mais eficaz que os seres humanos desen- volveram, dado todas as tarefas serem reguladas por regras de procedimento escritas. (GIDDENS, 2004, p. 350). Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Apesar disso, as análises de Weber sobre a burocratização das organizações são utilizadas como ponto de partida da maioria dos trabalhos sobre as organizações e é a partir delas que aprimoramen- tos no conceito foram realizados. As críticas de Robert Merton à burocracia Robert Merton foi um sociólogo americano de orientação funcionalista e importante teórico da burocracia. Merton, ao analisar o tipo ideal de burocracia de Weber, percebeu disfunções prejudiciais para o funcionamento da própria burocracia. Suas críticas voltavam-se principalmente às dificuldades dos burocratas em usar as capacidades individuais de pensar e de buscar soluções originais por estarem por demais presos a um conjunto de regras preestabelecidas. O sociólogo preocupava-se com a situação em que a obediência às regras pu- desse virar um fim em si mesmo, tolhendo a flexibilidade natural do ser humano em aplicá-las quando necessário ou em buscar outras soluções que não fossem as já registradas e disponíveis. Em função da importância dada ao procedimento correto, seria perigoso perder de vista o verdadeiro objetivo. Como no exemplo dado por Giddens, em que um burocrata responsável pelo processamento de pedidos de seguros, por danos legítimos, evocando a ausência de um formulário ou o preenchimento incorreto do mesmo, recusa que ele receba o benefício porque ele não preencheu corretamente o pedido e perdeu o prazo, ou seja, o ritual burocrático poderia assumir prioridade sobre as necessidades do cliente que sofreu a perda (GIDDENS, 2004, p. 35). Assim, Merton previu a possibilidade da existência de tensão entre o público e a burocracia, pois uma das maiores fraquezas da burocracia é a dificuldade que a mesma tem em lidar com casos que pre- cisam de uma consideração e tratamento especiais. E quase todos nós sabemos dos problemas em lidar com as grandes burocracias quando, por exemplo, necessitamos de licenças e concessões do governo ou quando tentamos resolver nosso caso em particular que, por algum motivo, não está previsto nas re- gras da burocracia e por isso sofremos com respostas generalizadas de funcionários que parecem não perceber nossas necessidades específicas. Michel Foucault e o controle do tempo e do espaço Uma das preocupações centrais da obra de Michel Foucault foi analisar o aumento do controle social e do processo de disciplinarização e normalização, realizado a partir do surgimento das socieda- des industriais no século XIX. Neste sentido, Foucault realizou minuciosos estudos sobre instituições, até então consideradas de segunda categoria, como as prisões e os manicômios. Na tentativa de evi- denciar as formas de controle utilizadas por estas organizações, demonstrou inclusive que a arquitetura de uma organização está diretamente implicada no controle do tempo e do espaço da mesma, facilitan- do a obediência de uns e a autoridade de outros (FOUCAULT, 1987). Ao pensarmos nas organizações modernas percebemos que as mesmas funcionam em espa- ços físicos especificamente planejados para elas e ao mesmo tempo existem características gerais em todas elas. Grandes corredores que se abrem para muitas salas ordenadas uma depois da outra, decorados de forma padronizada e por onde circulam as pessoas, muitas vezes usando uniformes ou 62 | Organizações e sociedade Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 63|Organizações e sociedade crachás que as identifiquem como membros da organização e as distingam dos visitantes ou clien- tes. Todas estas estratégias são criadas com o objetivo de facilitar o controle do tempo e do espaço nesses ambientes. Através do estudodas características físicas das organizações podemos ainda observar a distri- buição do poder através da estruturação hierárquica de seus funcionários, de maneira que muitas vezes os postos de chefia mais importantes são aqueles onde os escritórios estão nos andares mais elevados do prédio. Assim dizemos que estamos galgando o último degrau na empresa quando nos referimos aos cargos mais altos que podemos atingir dentro da hierarquia da mesma. O próprio organograma da empresa tem este formato e a proximidade ou distância física das chefias afeta de forma significativa as relações e os grupos que aí se formam. Por exemplo, no relacio- namento entre departamentos em uma empresa a proximidade física facilita a formação de grupos pri- mários e, por oposição, a distância pode aumentar a polarização dos grupos. O controle do tempo também é fator fundamental para o bom funcionamento de uma empre- sa. A produtividade da mesma pode ser medida, por exemplo, pela eficiência da utilização do tempo de seus funcionários e, por isso, as atividades dentro da empresa podem ser realizadas de forma intensiva através do controle do tempo e do espaço. Classificação e objetivos das organizações Para facilitar a compreensão dos tipos de organizações existentes e as funções para que foram criadas, Dias (2008) propõe classificá-las quanto ao setor em que atuam dividindo-as em públicas, pri- vadas e as do terceiro setor (ONGs, fundações etc.). Segundo os objetivos estabelecidos para as organizações por seus fundadores e quem as controla em um momen- to determinado, podemos distinguir três grandes tipos de organizações na sociedade contemporânea baseando-se em suas especificidades macrossetoriais: o primeiro, constituído pelas diversas formas organizacionais da adminis- tração pública, se caracteriza por buscar o bem comum como valor essencial; o segundo, a empresa, busca antes de tudo o interesse privado em sua expressão econômica; e o terceiro, as organizações sociais, reunidas num terceiro se- tor e que pretendem realizar interesses privados, de conteúdo não econômico, ou interesses comuns a certos seto- res da população que não encontram resposta na administração pública. Aqui se incluem ONGs (Organizações Não Governamentais), organizações filantrópicas, OSCIPs (Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público), fundações etc. Estas diferenças estabelecidas a partir dos objetivos encontram correlação em outros aspectos das semelhanças e diferenças mais importantes entre elas. (DIAS, 2008, p. 31) Características dos três grandes tipos de organizações Administração pública (setor público) Empresas (setor privado) Organizações sociais (terceiro setor) Modo primário de filiação Obrigatório Voluntário Voluntário Fundamento da filiação primária Cidadania Propriedade Inscrição Fundamento da filiação secundária Emprego Emprego Emprego (IN FE ST A S G IL 2 00 1, p . 5 7. In : D IA S, 2 00 8, p . 3 1. Ad ap ta do .) Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Administração pública (setor público) Empresas (setor privado) Organizações sociais (terceiro setor) Tipos de tarefas Geral Específica Específica Estrutura primária de poder Estrutura política Propriedade Estrutura participativa Conforme Dias, o tipo de organização chamado Administração Pública tem como função princi- pal a prestação de serviço para o bem comum. E por causa de sua importância para a sociedade, apre- senta uma disputa de poder que a organiza sob uma forte estrutura hierárquica. Já as empresas têm como função a atividade econômica, ou seja, a produção de capital. Este tipo de organização é a mais estudada entre todas, pela posição central que ocupa dentro do modelo das sociedades atuais. Já as organizações sociais buscam objetivos de caráter solidário. Estes se definem a partir da pos- sibilidade de realizá-los, ou seja, da existência de meios disponíveis para realizá-los. Por terem participa- ção voluntária, as relações entre seus membros são menos hierárquicas e mais flexíveis. Existem ainda as chamadas instituições totais como as prisões, os manicômios, os hospitais e os quartéis que têm como característica principal o fato de que seus membros ficam isolados enquanto fa- zem parte das mesmas. Estas instituições têm uma influência muito mais direta sobre os indivíduos que dela participam. Outros autores como o alemão Renate Maintz e o americano Charles Perrow buscam ainda defi- nir as organizações a partir de seus objetivos. Sob a perspectiva do sociólogo Renate Maintz (1984) podemos dividi-las em: organizações voluntárias :::: – têm como objetivo a relação de coexistência entre seus mem- bros, como nos clubes e nas organizações recreativas; organizações estruturadas:::: – têm como objetivo atuar de maneira determinada sobre um grupo de pessoas e podem ser de incorporação voluntária, no caso de escolas, universidades e igrejas; ou forçada no caso de internações em hospitais psiquiátricos ou em prisões; organizações com objetivo de obter um determinado resultado:::: – como por exemplo, aquelas que visam o lucro onde os membros participam porque sobrevivem disso; visando o bem comum, como é o caso das ONGs, ou da Administração Pública; visando o bem de seus associados, como os sindicatos, as associações profissionais ou ainda, visando a obtenção de poder, como é o caso dos partidos políticos. Há ainda as de tipo misto, que combinam as características de mais de uma delas, como as coo- perativas, os consórcios e as fundações. Charles Perrow (apud DIAS, 2008, p. 34-35) afirma que o objetivo das organizações pode também ser conflitante relacionando cinco categorias principais de objetivos: objetivos da sociedade:::: – que têm como ponto de referência a sociedade em geral. São exem- plos: produzir bens e serviços, manter a ordem, criar e manter valores culturais etc.; 64 | Organizações e sociedade Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 65|Organizações e sociedade objetivos de produção:::: – aqui o ponto de referência é o público que entra em contato com a organização. São exemplos: bens de consumo, serviços à empresa, cuidados com a saúde, educação etc.; objetivos de sistemas:::: – neste caso o ponto de referência “é o estado ou maneira de funcio- nar da organização independentemente dos bens e serviços que produz, ou dos objetivos daí resultantes”. São exemplos “a ênfase dada ao crescimento, estabilidade, lucros ou às modalida- des de funcionamento, tais como fazê-los sob controle escrito ou mais liberal”; objetivos de produtos:::: – na realidade, objetivos caracterizados pelos produtos. O ponto de referência são as características dos bens e serviços produzidos. São exemplos: “a ênfase so- bre a qualidade ou quantidade, variedade, estilo, disponibilidade, originalidade ou inovação dos produtos.”; objetivos derivados:::: – cujo ponto de referência é o uso que a organização faz do poder ori- ginado na consecução de outros objetivos. São exemplos: “metas políticas, serviços comuni- tários, desenvolvimento profissional, política de investimento e localização das instalações de modo a afetar a economia e o futuro de comunicações específicas.” Estas classificações devem ser entendidas apenas como exemplos entre os mais variados tipos de organizações existentes na realidade. Suas validades e limitações devem ser consideradas a partir do es- tudo que se deseja realizar buscando aquela que mais se aproxima de um desses tipos puros, construí- dos teoricamente apenas para facilitar as análises. Texto complementar (GIDDENS, 2004) Um dos estudos mais influentes sobre as organizações foi conduzido pelo sociólogo america- no Erving Goffman em finais dos anos 1950 e publicado no livro Asylums (Asilos), de 1968. Goffman trabalhou com base na tradição interacionista, investigando o fenômeno social na perspectiva dos próprios atoressociais, tendo em conta os significados que estes atribuíam ao mundo à sua volta. Nesse estudo específico, Goffman procurou compreender o funcionamento das instituições totais através das experiências dos indivíduos que passam por elas. As instituições totais são instalações como os hospitais mentais, as prisões, os reformatórios e os mosteiros que impõem coercitivamente aos seus residentes um sistema de existência completamente isolado do mundo exterior. Goffman estava particularmente interessado em compreender as mudanças profundas que ocorriam no sen- tido de si dos indivíduos nestas condições. As instituições totais podem ser vistas como exemplos de burocracias elaboradas, quitadas por procedimentos complexos e rígidos que são obrigatórios para os seus membros. Os indivíduos em instituições totais encontram-se rodeados por um mundo rigidamente organizado, inteiramente Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br planejado e meticulosamente supervisionado. Goffman descobriu que tipos distintos dessas insti- tuições têm certas características em comum. Em todos os casos, os recém-chegados são despidos do seu sentido de si e de sua individualidade enquanto pessoas e “reconstruídos” de acordo com as regras da instituição. Os bens pessoais são retirados e os traços identificativos neutralizados: as roupas são trocadas por uniformes, fazem-se cortes de cabelo estandardizados, atribui-se um novo nome ou número de identificação e as ligações com o mundo exterior, incluindo os amigos e a fa- mília, são restringidas. Recorda-se ao interno, de muitas maneiras que já não é a pessoa que foi an- teriormente, mas que assumiu uma nova identidade como membro da instituição. Existem linhas claras que separam os residentes em instituições totais do pessoal. As rotinas diárias são planejadas e supervisionadas pelos empregados que têm autoridade para castigar ou recompensar os residentes de acordo com o grau de obediência revelado. Este processo de garan- tia de submissão é ajudado em parte por aquilo que Goffman chamou de mortificação do eu. Os re- cém-chegados a instituições totais são sistematicamente humilhados e rebaixados perante os seus superiores e pares até o seu autoconceito anterior ser quebrado. A mortificação do eu pode ocorrer através de uma variedade de formas, em que se incluem exames de saúde e exames de cavidades corporais, atribuições de tarefas domésticas ou servis, impressões digitais, uma falta constante de privacidade e a necessidade de pedir licença antes de realizar qualquer tarefa. Goffman identificou cinco respostas da parte dos internos às suas experiências em instituições totais. Estas variavam ente a retirada completa e a resistência ostensiva à acomodação e ao “fazer o seu papel”. Contudo concluiu que, no conjunto, a maioria dos internos resiste à pressão para aban- donar o seu sentido de si “levando as coisas com calma” – protegendo-se psicologicamente e fazen- do o mínimo necessário para ir andando e evitar problemas. Em vez de resistirem completamente ao sistema, muitos internos encontram formas pragmáticas de se ajustarem ao mesmo. Resistências às instituições totais: críticas à Goffman Como muitos trabalhos pioneiros, o estudo de Goffman sobre as instituições totais tem atraído tanto louvores como críticas. Alguns sociólogos defendem que Goffman exagerou a dimensão do “ajustamento” e que, de fato, existe uma resistência muito maior nestas instituições do que a que ele sugeriu. Stanley Cohen e Laurie Taylor, no seu estudo sobre a penitenciária de Durham (1972), en- contraram mais provas de resistência à autoridade do que Goffman. Enquanto Goffman considerou a resistência obstinada como uma forma mais direta de resistência à autoridade, Cohen e Taylor ob- servaram formas de resistência que iam bem além da mera proteção do sentido de si. Argumenta- vam que muitas formas de resistência nas prisões assentam em objeções coletivas ao sistema e têm como objetivo provocar mudanças no funcionamento da instituição. Assim, greves de fome, campa- nhas de abaixo-assinados, tentativas de fuga e motins nas prisões podem ser vistos como exemplos de reações ativas à experiência do aprisionamento. Uma forma de resistência menos pública indica- da por Cohen e Taylor reside na tendência para os hóspedes rejeitarem os rótulos atribuídos pelas autoridades prisionais. Recusavam-se a ver-se como “criminosos” e a diminuir a imagem que tinham de si próprios como resultado da sua posição no sistema de justiça criminal. 66 | Organizações e sociedade Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 67|Organizações e sociedade Atividades 1. Em função do sucesso da forma burocrática de estruturação de uma organização, cite quais são as suas vantagens. 2. O que há de comum entre os hospitais psiquiátricos, as prisões e os quartéis? Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 3. Cite quais são as características dos três grandes tipos de organizações. Gabarito 1. As vantagens são: as decisões das pessoas passam a obedecer a objetivos concretos e racionais. O caminho mais eficiente seria escolhido para produzir determinado resultado. Acreditava-se em uma superioridade técnica do sistema de racionalização legal comparável à precisão das máqui- nas mais avançadas, o que garantiria a máxima eficiência na execução dos objetivos da organiza- ção superando as deficiências da instabilidade humana. 2. São instituições totais e, como tais, possuem as seguintes características gerais: impõem coercitivamente o isolamento de seus membros do resto da sociedade;:::: apresentam-se como burocracias complexas e com uma série de procedimentos rígidos que :::: são obrigatórios; os indivíduos são meticulosamente controlados;:::: os indivíduos são neutralizados através da negação de traços que os possam identificar – suas :::: roupas são trocadas por uniformes, fazem-se cortes de cabelo estandartizados, e muitas vezes atribuem-se um novo nome ou número de identificação; as rotinas diárias são todas planejadas e supervisionadas pelos funcionários.:::: 3. Administração Pública: em que a função principal é a prestação de serviço para o bem comum.:::: Empresas: em que a função principal é a atividade econômica.:::: Organizações sociais: que têm objetivo de caráter solidário e se definem a partir da existência :::: de meios disponíveis para realizá-los. 68 | Organizações e sociedade Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Novas abordagens teóricas das organizações A análise sociológica das organizações trabalha primeiramente com modelos racionalizadores clássicos da Sociologia das Organizações que dão ênfase à eficiência dos processos organizacionais buscando a otimização do desempenho das mesmas através da estrutura organizacional. Esses mode- los ficaram conhecidos como fordista, taylorista e burocrático. Com o aprofundamento destas análises foram construídos outros modelos mais atuais baseados nas teorias das relações humanas, na teoria dos sistemas e na contingencial. O Modelo Racionalizador Clássico dá ênfase principalmente à eficiência e à produtividade e pro- cura alcançá-las através da busca de mecanismos de controle do indivíduo para que este possa realizar as tarefas do trabalho de forma mais eficiente. O Modelo Humanista dentro da organização passa a abranger o fator humano a partir da análise dos grupos sociais internos e das relações informais que se formam dentro da organização. No Modelo Sistêmico as organizações são consideradas como sistemas abertos que estão em constante relação com o ambiente externo à organização, o que também inclui a relação com outras or- ganizações e com elas trocam influências. Quanto ao Modelo Contingencial, ele pressupõe a importância de fatores específicos de cada organização como elementosdeterminantes nas decisões administrativas da empresa e combinados com fatores externos já ressaltados pela teoria sistêmica. Esse modelo refuta a existência de princípios universais de administração e ressalta a necessidade de se avaliar as particularidades de cada empresa. Nesse sentido, dificulta a possibilidade de utilização de modelos de análise mais globais que possam ser utilizados em diferentes organizações. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br A teoria das relações humanas A vontade de organizar as empresas, sempre de forma mais eficaz, pôs logo em evidência a com- plexidade do fator humano. Quanto mais se procurava organizar o trabalho e toda a empresa, mais se desembocava numa série de manifestações individuais e coletivas que não estavam previstas nos estu- dos da organização científica clássica: conflitos; comunicação insuficiente entre os indivíduos, grupos, classes ou camadas; imprevistos; insubordinação; rotina e falta de iniciativa. Todos estes comportamen- tos, por parecerem depender das pessoas, e não da estrutura organizativa, eram deixados de lado pela preocupação mais urgente em aumentar a produtividade das empresas. Portanto, as análises realizadas nas organizações até então não levavam em consideração a constituição humana da mesma e tratavam os problemas dos indivíduos dentro da organização como questões individuais. No entanto, as relações de interação entre os grupos de trabalhadores e entre estes grupos e seus dirigentes problematizavam o próprio funcionamento da organização além do que o modelo racional dava conta de explicar. Auxiliados pela Psicologia Industrial, estudos passaram a ser realizados dentro de uma fábrica nos Estados Unidos. Na Western Electric Co., um grupo de trabalhadores foi separado dos demais em uma sala que funcionaria como um laboratório. A esse grupo foi proposto que continuasse trabalhando nor- malmente enquanto modificavam-se as condições físicas do ambiente através de alterações na lumino- sidade, temperatura, cor das paredes, ruído etc. e se descobriu que independente destas variações no ambiente físico local a produtividade do grupo estudado só aumentava. Elton Mayo integra-se a esta pesquisa numa segunda fase na qual são incluídas outras variáveis como: aumento na duração e na quantidade de intervalos de descanso, redução da jornada de trabalho e modificações na forma de pagamento dos salários. Todos estes fatores também contribuíram para um efetivo aumento na produtividade do grupo. A conclusão a que chegaram foi, em primeiro lugar, a de que o aumento da produção não estava ligado às condições físicas de trabalho, mas sim ao chamado efeito Hawthorne, ou seja, o trabalhador sentia-se reconhecido por ter feito parte de um estudo científico e isso implicava maior motivação para o trabalho. Em segundo lugar, descobriu-se que a forma de gerenciar direitos e deveres do trabalhador é também um fator que pode modificar a produtividade. E por último, ao realizar entrevistas com as operárias da mesma fábrica, ficou clara a existência de grupos criados por elas de maneira informal, in- clusive com lideranças, que serviam para que se protegessem dos atos das chefias e dos administrado- res daquela empresa. Quanto maior a integração interna desses grupos, e deles com a própria empresa, maior a satisfação dos trabalhadores. A conclusão aqui foi a identificação da existência de grupos infor- mais e da importância do papel desempenhado por eles nas organizações. Percebe-se a partir disso um complexo sistema de relações interpessoais estabelecido de forma espontânea entre os membros de qualquer organização, que configuram uma estrutura informal cons- truída por diferentes grupos que podem ou não ter objetivos comuns aos da organização. Como esses grupos funcionam também como pontos de referência para as pessoas que traba- lham na empresa, no caso da existência de interesses comuns aos da organização, os grupos servem como incentivadores dos indivíduos, mas se os interesses são diversos, podem surgir conflitos porque ambas as estruturas organizacionais, formal e informal, estarão buscando objetivos contrários. Resumindo, podemos caracterizar os grupos informais dizendo que eles variam em quantida- de dentro de uma mesma empresa, em número de integrantes de um mesmo grupo, em objetivos e 70 | Novas abordagens teóricas das organizações Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 71|Novas abordagens teóricas das organizações podem apoiar ou não a organização a que pertencem. São formados de forma independente de auto- rização na empresa, podem ou não corresponder às equipes de trabalho formadas pela administração e suas lideranças podem não corresponder àquelas escolhidas pela gerência. Portanto, são como uma organização social menor que coexiste dentro de uma maior. Assim, se os indivíduos buscam a satisfação de suas necessidades complexas também no traba- lho, as relações informais de grupo podem servir de fonte para encontrar estas respostas, que não esta- riam apenas ligadas às condições físicas do trabalho. A originalidade desse movimento foi certamente chamar a atenção dos dirigentes sobre os comportamentos humanos que antes se consideravam sob o ângulo puramente econômico, técnico ou ideológico. Se os assalariados manifesta- vam agressividade, apatia, até mesmo a implicação voluntária, havia três hipóteses possíveis: eram mal pagos, a tarefa era mal definida ou a oficina mal organizada; os indivíduos eram de má-fé ou agiam por razões psicológicas e políticas as quais a empresa não tinha como conhecer. Na nova perspectiva das “relações humanas” admite-se, ao contrário, que esses problemas têm um significado específico que remete à lógica das ações interindividuais e às motivações coleti- vas suscitadas pelas circunstâncias do trabalho. (SANSAULIEU; KIRSCHNER, 2006, p. 88) Nesse sentido inicia-se uma nova forma de analisar a eficiência no trabalho e buscam-se regras para acompanhar a forma com que os indivíduos participam deste ambiente no sentido de observar se a integração do fator humano aos diversos contextos da produção da comunicação e da organização geral da empresa influencia na produtividade dos trabalhadores. A melhora das relações humanas aparece assim como a resposta a uma espécie de corrente de evolução sociocultural, a qual provém de diminuições do crescimento econômico e técnico. A tarefa dos dirigentes Dado o crescimento dos grupos industriais e das empresas e até mesmo da estrutura organiza- cional dos Estados, as decisões dos gestores tornam-se cada vez mais complicadas. Surge a necessidade de levar em consideração um grande número de fatores complexos que passam a influenciar de forma mais direta as organizações, como por exemplo, o aumento da concorrência, a necessidade de investi- mentos a longo prazo e a gestão de filiais distantes da mesma empresa. Para tudo isso é exigido maior rigor na tarefa do dirigente. Esse tema passa a ser objeto de análise de muitos autores que se preocupa- vam principalmente com cinco pontos considerados fundamentais na função de um gestor: planificar, organizar, escolher as pessoas, dirigir e controlar. O sociólogo americano Chester Barnard trabalhou também dentro desta perspectiva analisando o papel do gestor nas organizações complexas e desenvolveu uma teoria sobre a forma cooperativa de trabalho dentro das empresas. Para ele, uma organização funciona bem quando há equilíbrio nas rela- ções dos agentes envolvidos. Na relação entre interesses e objetivos dentro da empresa existirão sem- pre pontos conflitantes e sistemas cooperativos e a medida do equilíbrio entre estas forças dá-se através da negociação entre seus agentes. Ao definir as organizações, Barnard ressalta o aspecto cooperativo na realização das atividades. Organizações são como “sistemas de atividades coordenadas conscientemente entre dois oumais indi- víduos” (BARNARD, 2008, p. 92). No entanto, a cooperação só faz sentido na execução de objetivos a se- rem alcançados e pode ser eficaz quando permite atingir estes objetivos, e eficiente quando, além disso, permite a satisfação dos agentes envolvidos. Para que a cooperação se realize é essencial uma boa comunicação entre as partes garantindo a transmissão dos objetivos e a organização das atividades. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Assim, para que sejam realizados de forma cooperativa, esses objetivos devem ser entendidos como sendo coletivos, capazes de fazer os indivíduos abdicarem de interesses próprios para atingir os objeti- vos da organização. A estrutura decisória se mantém hierárquica, mas necessita negociar com os dife- rentes grupos e deve buscar esse espírito comum que englobe os interesses de todos os seus membros. Para Barnard, segundo Dias, portanto, o dirigente de uma organização deve ter as seguintes fun- ções principais: garantir a comunicação na organização – envolve a definição da estrutura organizacional e o preenchimento das :::: funções com uma equipe de gestores adequada; as:::: segurar os serviços e tarefas essenciais da organização – implica o recrutamento e gestão de pessoal qualificado para as funções que lhe são atribuídas, criação de um código de conduta e a manutenção de um moral elevado; definir a missão e os objetivos da organização – deve-se defini-los em termos gerais, mas garantir a efetividade de :::: sua transmissão aos níveis inferiores da organização. (DIAS, 2008, p. 93) Outras técnicas se juntaram às do grupo cooperativo para racionalizar o processo de gestão nas empresas, entre elas as de Douglas McGregor que nos anos de 1950, ao criticar o modelo da escola clás- sica, chamou a atenção para a importância da engenhosidade da direção em descobrir como engajar o potencial dos membros da organização. O princípio fundamental da teoria desse autor “é o da integração: a criação de condições tais que permitam aos membros da organização alcançar melhor os seus próprios objetivos dirigindo os seus es- forços para o sucesso da empresa” (DIAS, 2008, p. 97). A gestão dos recursos humanos Os métodos de gestão dos recursos humanos aparecem como um caminho natural no processo de racionalização dos fatores de produção, centrando seus esforços de melhorias diretamente sobre os indivíduos, buscando a utilização de suas qualidades técnicas e de suas competências no cotidiano do trabalho e no planejamento de futuro. Este método se desenvolveu através de duas etapas: o desenvol- vimento da motivação e o aproveitamento das capacidades dos membros da organização. Na busca de uma organização mais motivadora investiu-se principalmente em diminuir a estru- tura hierárquica da empresa criando-se grupos de aconselhamento, melhorando a comunicação inter- na, a autonomia e incentivando a independência criativa dos trabalhadores. A busca do fator humano como fator específico do desenvolvimento das empresas procurou acompanhar os indivíduos na realização de projetos pessoais no trabalho a fim de obter seu envolvi- mento nas atividades requeridas pela produção. Neste sentido, surgiram alguns estudos teóricos im- portantes que identificaram cinco grandes dimensões do envolvimento dos indivíduos no trabalho: o grupo, o ofício, o emprego, a mobilidade, os projetos e a cultura. O grupo é importante, pois é onde os indivíduos podem se apoiar, encontrar reconhecimento, e construir uma identidade própria possibilitando um melhor envolvimento no trabalho. O ofício, no sentido de aprender uma profissão através da experiência e da aprendizagem ao lon- go dos anos, significa a análise das competências e do saber fazer dos indivíduos comparados com as tarefas, as condições e as oportunidades da empresa que levem a um desempenho previsível. 72 | Novas abordagens teóricas das organizações Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 73|Novas abordagens teóricas das organizações No emprego, a gestão como técnica auxiliar do gerenciamento de recursos humanos foi aprimo- rada com a excessiva oferta de mão de obra, através da reorganização do tempo de trabalho, com a in- serção de jovens em contratos temporários, estágios, programas de formação de adultos etc. As políticas de mobilidade do pessoal visam salvar o emprego e o desempenho, propondo aos in- divíduos mudar de trabalho, de função e até de ofício, o que pode incluir deslocamentos de região ou de estado para o indivíduo realocado. Os projetos coletivos de desenvolvimento das empresas são importantes fontes de mobilização dos indivíduos e implicam na união de esforços em torno de objetivos comuns como a qualidade do produto final, o contato com o cliente, a imagem da marca etc. A cultura da empresa é o mecanismo pelo qual estes objetivos são divulgados. Para que os traba- lhadores sintam-se envolvidos pelos objetivos da empresa eles têm que se sentir parte integrante des- sa cultura da empresa. Para resumir a gestão de recursos humanos e suas transformações ocorridas desde os anos 1970 até por volta do ano 2000, Sansaulieu nos propõe um gráfico e esclarece que: [...] diante da forte coação das contingências de um mercado que se tornou mundial, a administração da GRH (Gestão de Recursos Humanos) visa desenvolver um tipo de racionalidade, a do acordo entre projetos e as capaci- dades pessoais com os objetivos e os projetos coletivos de desenvolvimento da empresa em ambiente aleatório. (SANSAULIEU, 2006, p. 106) Gráfico 1 – O sistema da gestão das relações humanas (S A N SA U LI EU , 2 00 6, p . 1 06 ) Contingências econômicas e técnicas. Coações de com- petitividade, flexibilidade e criatividade. A mobilidade Políticas de GRH Organização qualificante participativa reativa Projeto, cultura, comunicação O emprego O ofício O grupo Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br As políticas de GRH, levando em conta as influências externas econômicas e técnicas, as coações de competitividade, flexibilidade e criatividade do mercado devem buscar combinar os projetos da em- presa e as capacidades pessoais dos trabalhadores com os objetivos e projetos coletivos. Tudo isso para chegar a uma organização mais qualificada, participativa e reativa. A teoria dos sistemas Diferentemente da escola Clássica, que estabeleceu os parâmetros de organização da indústria como uma unidade produtiva voltada exclusivamente para o seu interior, o modelo sistêmico de análise das organizações considera a empresa a partir de sua constituição como uma teia de relações humanas. Este modelo, desenvolvido a partir da Teoria Geral dos Sistemas, importada da Biologia, compre- ende a análise das organizações como um sistema aberto e neste sentido revela a importância da influ- ência do meio externo em suas relações com a unidade. A teoria geral dos sistemas foi importante no sentido de estabelecer uma conexão entre o nível macro e o microssocial. Para essa teoria existem estruturas típicas muito gerais que permitem entabu- lar comparações ou que possibilitam também um complexo intercâmbio de conhecimentos científicos quando realizamos análises de diferentes organizações. Conforme Dias nos explica nesta passagem: [...] de acordo com a teoria dos sistemas, o todo (o sistema) é produto de partes que interagem, cujo conhecimen- to e estudo deve ocorrer sempre relacionando o funcionamento dessas partes em relação ao todo (um sistema) que apresentará um conjunto de partes interativas que o compõem. Assim o estudo do turismo pode ser realizado consi- derando-o como um todo complexo (um sistema) constituído de inúmeras partes que interagem e que o compõem. (DIAS, 2008, p. 98) Para esta teoria, portanto, as organizações podem ser estudadas como partes de um sistema maior que seriam as sociedades em que vivemos, asquais estão divididas também em subsistemas onde as organizações estariam incluídas. Esses subsistemas seriam, por exemplo, o econômico (onde se localizam as empresas), o político (onde estão os partidos), o religioso (onde estão as igrejas) etc. Todo este esquema serve para compreender a complexa rede de relações às quais as organizações estão liga- das e de onde sofrem influências. Esta compreensão da estrutura relacional ajudaria a explicar proble- mas que do lado de dentro das organizações pareceriam incompreensíveis. Este autor define sistema como: [...] um conjunto de elementos interligados que sofrem influência recíproca, ou seja, influenciam e são influenciados. Ocorre uma interdependência entre as partes do sistema, de tal modo que a alteração em uma delas provoca efeitos nas outras, podendo afetar o conjunto. Assim as sociedades humanas podem ser estruturadas como um sistema social, no qual o conjunto das relações entre as pessoas forma um todo. Uma abordagem sistêmica permite compreender o papel das partes isoladas, pois muitas ações que podem ser incom- preensíveis isoladamente passam a ter algum significado em função do papel que desempenham no conjunto. A teoria geral de sistemas fundamenta-se em quatro premissas básicas: :::: os sistemas existem dentro de sistema maiores; :::: os sistemas são abertos e estabelecem trocas com os outros que lhes são contíguos; 74 | Novas abordagens teóricas das organizações Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 75|Novas abordagens teóricas das organizações :::: as funções dos sistemas dependem de sua estrutura; :::: os princípios formulados através da teoria geral de sistemas devem ser válidos para qualquer tipo de sistema. (DIAS, 2008, p. 99) Tal teoria identificou entidades que não eram um simples somatório das suas partes componen- tes, mas o resultado de complexas interações de um conjunto perfeitamente identificado, ou seja, um sistema em que as diversas partes que o compõe estão inter-relacionadas entre si e contidas num siste- ma ambiental. Sua base teórica consiste em formular princípios que são válidos para os sistemas de um modo geral, qualquer que seja a natureza de seus componentes e as relações entre eles. Ao buscar realizar uma análise sociológica da empresa, muitos acadêmicos utilizaram o modelo sistêmico para explicar a composição da mesma dividindo-a em diversas partes ou subsistemas que in- cluíam, por exemplo: [...] um subsistema técnico (documentos, técnicas, equipamentos etc.); um subsistema estrutural (tarefas, fluxo de tra- balho, hierarquia de autoridade, fluxo de informações etc.); um subsistema psicossocial (recursos humanos, atitudes, percepções, clima organizacional etc.); um subsistema de metas e valores (objetivos gerais, específicos e individuais); e um subsistema gerencial (objetivo, planejamento, controle etc.). (DIAS, 2008, p. 101) Dias chama a atenção ainda para o fato de que todos estes subsistemas estariam em interação for- mando uma organização que, como conjunto, estaria também se relacionando com o meio externo. A teoria contingencial Proveniente da teoria dos sistemas, esta procura ampliar o grau de abrangência da mesma, que por valorizar o caráter aberto das organizações e suas influências provindas do meio em que existe, res- salta a casualidade de que cada existência nunca é igual a outra. Assim descarta qualquer teoria geral que pretenda explicar as organizações como um todo, valorizando a variação dos fatores que podem in- fluenciar diferentemente em cada caso particular. Valoriza a imprevisibilidade de que determinado fato aconteça ou não e, portanto afirma que cada caso nas organizações deve exigir atitudes diferenciadas. Propõe assim que cada organização apresente sua própria particularidade em resolver tanto suas ques- tões internas como as externas. Para essa teoria não existem fórmulas eficientes de administrar uma organização, mas por con- siderá-la também como um sistema aberto, acredita que cada forma será influenciada diferentemente pelo meio com o qual a mesma mantém relação. A importância deste enfoque é ressaltar a flexibilidade que as organizações podem ter para en- frentar situações externas instáveis em que podem ocorrer mudanças aceleradas. As organizações aten- tas a essas mudanças que ocorrem no contexto em que estão inseridas teriam mais chances de se ajustar às novas necessidades da sociedade e, portanto estariam mais propícias a realizar adaptações necessá- rias para alcançar melhores resultados. Dias (2008, p. 107) relaciona alguns fatores contingenciais que influenciam no desempenho das organizações: o tamanho das organizações;:::: o contexto ou o meio onde está inserida a organização;:::: Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br a tecnologia existente;:::: objetivos e estratégias dos elementos do entorno, em particular a concorrência.:::: Esta teoria foi seguida por vários autores reconhecidos da área da Sociologia das Organizações e o ponto em comum entre eles foi o de que todas as organizações deveriam levar em consideração fa- tores contingenciais na construção de uma estrutura mais eficaz de organização. No entanto, os fato- res mais importantes a serem considerados variavam na interpretação de cada autor, por exemplo, para Charles Perrow (1972) a contingência mais importante seria a variável tecnológica, já para outros pode- riam ser o contexto ou mesmo o tamanho da empresa. O avanço dos estudos científicos realizados na área da Sociologia das Organizações está sem- pre voltado para a realização de melhorias na eficiência das empresas. A estruturação dos três modelos analisados neste capítulo, que se baseiam na preocupação com o fator humano, com sua relação com o ambiente e com a consideração de fatores contingenciais que influenciam no desempenho e no fun- cionamento das organizações, são estratégias de análise elaboradas para aproximação desta realidade tão complexa que compõe o estudo das empresas. Texto complementar Outros aspectos do ambiente (PERROW, 1972) Todas as organizações, sejam ou não industriais, têm um ambiente constituído, no mínimo, de fornecedores, concorrentes, clientes ou usuários, ligações potenciais ou efetivas; instituições gover- namentais que regulam, em nível local, nacional e às vezes internacional; novas tecnologias e, natu- ralmente, o complexo meio político e social das comunidades em que vivem. Muitas organizações tentam estabilizar e controlar estas influências ambientais, isto é, tentam lidar com as mudanças de ambiente, estabelecendo regras e criando cargos que tornem possível tratar tal ambiente em ba- ses previsíveis e de rotina. Tomemos o simples assunto de compras e de controle e estoque de uma indústria, ou da admissão de um beneficiário, numa organização de bem-estar social. Se a procura por bens ou serviços fosse estável e pudesse manter-se assim, haveria pouca necessidade de regu- lamentos complexos com relação à quantidade de estoque a ser mantida, ou de provisões a serem compradas, e tampouco haveria necessidade de cargos especializados tais como os de agentes de compras, funcionários de estoque, ou comitês de admissão; uma vez estabelecida a rotina, cada in- divíduo que precisasse de um fornecimento de material, ou de beneficiários, poderia fazer seu pró- prio pedido. Mas onde há oscilação da procura, em virtude das alterações ambientais e quando não se pode prever o volume de produção dos fornecedores, exigem-se regulamentos complexos para decidir sobre estoques e compras e as organizações acham que vale a pena contratar especialistas ou criar comitês especiais para tratar desse tipo de problema. 76 | Novas abordagens teóricas das organizações Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 77|Novas abordagens teóricas das organizações Naturalmente, quem precisa de fornecimento ou debeneficiários queixa-se das políticas com- plicadas e se pergunta por que não pode simplesmente obter o que precisa, na hora em que precisa. Afinal, ele sabe que uma determinada espécie de material presta-se melhor às exigências do servi- ço, mas mesmo assim acha que em algum ponto distante, na lata administração, alguém decidiu dar-lhe justamente o contrário do que ele pediu. Tudo isso complica seu trabalho e ele se irrita com a ineficiência. Entretanto, o técnico de outra parte da organização provavelmente decidiu que um certo fornecedor é mais digno de confiança do que outro e que pode-se economizar fazendo gran- des pedidos, ou ainda, que a qualidade varia de um fornecedor para outro e que, portanto, pode não conseguir exatamente o item desejado. Uma outra maneira de encarar os cargos de pessoal é considerá-los como pontos de contato com o ambiente – o selecionador recruta, emprega, demite e julga; o contador lida com entrada e saída de dinheiro; as unidades de pesquisa e desenvolvimento pesquisam itens técnicos; o setor de “marketing” prevê as alterações de oferta e de procura. Os que se encontram realmente envolvidos na produção e vendas diretas, não estão eles próprios em condições de executar suas funções de maneira eficiente. E sua posição tampouco lhes permite ver como o mercado de trabalho ou o va- lor do dinheiro está mudando, nem como os progressos técnicos afetarão a firma, ou como se faz a previsão de linha e o pessoal burocrático pode ser muito grande. A necessidade de estabilidade e criação de rotina A casa aberta Quando pensamos em organizações, geralmente vêm-nos à ideia entidades estáveis, duradou- ras, com limites bem precisos e características tão marcadas, que as distinguem de tudo mais ao re- dor. As organizações têm um local, um endereço, enfim, e os indivíduos são parte delas. Trabalham lá durante certo tempo, diariamente, e depois voltam para casa. A organização existe nos fins de se- mana e durante as férias mesmo quando não está presente a força de trabalho. Enfim, ela parece es- tar separada de tudo o mais, no mundo. De certa forma, este é um retrato completamente falso da organização. Se o conceito fosse exato, poderíamos supor com segurança que dentro desta “casa”, por assim dizer, há controle sobre o comportamento dos que entram e saem; que seus muros constituem proteção contra o mundo de fora; que os fornos estão equipados de maneira que a temperatura se mantém em nível ótimo, o tempo todo; que a luz vai e volta, quando necessário. Caso tudo isso fosse verdade, a organização seria tão perfeita e confortável como as residências e não teríamos que nos preocupar com ela. Mas, como vimos, os que por ela transitam têm consigo sinais muito fortes do mundo de fora. O trabalho de seleção não é tão perfeito que possamos escolher a dedo os que colocamos na orga- nização; e nem ficamos com eles o tempo suficiente para modificá-los totalmente. Além disto, as ja- nelas e portas estão sempre abertas, porque a organização industrializa a matéria-prima, que entra por uma porta, é trabalhada, e sai pela outra. Esse processo exige ainda outras portas e janelas para entrada de maquinário, know-how etc. Desta perspectiva, é muito difícil manter controle de qual- quer espécie sobre a organização. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br O alto preço do controle Os elementos de que se dispõe para controle são muito dispendiosos. As ordens e regulamen- tos às vezes não conseguem atender às exigências do caso e são eles próprios conflitantes. Cada decisão que se toma é um compromisso porque, por exemplo, não se podem diminuir os custos de emprego e, ao mesmo tempo, fomentar a educação, treinamento e experiência de novos empre- gados. Não se pode providenciar estoques de reposição adequados para manter a produção inin- terruptamente, e pretender ter estoques baixos a fim de evitar empate de capital. Além de baixar ordens e regulamentos, as organizações empregam especialistas para tentar manter a ordem den- tro dessa casa altamente exposta e sujeita a influências. Muitos especialistas em pessoal estão em posição de tentar mediar disputas entre várias partes da organização, arriscando-se, portanto, a cair em desgraça com uma das outras partes, a menos que sejam dotados de alto grau de tolerância e habilidade. Atividades 1. Fale sobre os principais modelos racionalizadores da Sociologia das Organizações que surgiram depois da teoria clássica e suas principais diferenças. 78 | Novas abordagens teóricas das organizações Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 79|Novas abordagens teóricas das organizações 2. Ao comparar os modelos clássico, humanista, sistêmico e contingencial, segundo sua opinião, qual deles seria o melhor para administrar uma empresa? Por quê? 3. Por que problemas como conflitos, comunicação insuficiente entre os indivíduos, grupos, classes ou camadas, imprevistos, insubordinação, rotina e falta de iniciativa eram deixados de lado pelas análises racionais realizadas nas empresas? 4. Segundo o sociólogo americano Chester Barnard, quais as funções principais do dirigente de uma organização? Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Gabarito 1. Os modelos são o humanista, o sistêmico e o contingencial. O Modelo Humanista, dentro da organização, passa a abranger o fator humano a partir da análise dos grupos sociais internos e das relações informais que se formam dentro da organização. O Modelo Sistêmico considera que as organizações são como sistemas abertos que estão em constante relação com o ambiente externo à organização, o que inclui outras organizações que com elas trocam influências. O Modelo Contingencial pressupõe a importância de fatores específicos de cada organização, combinado com os fatores externos já ressaltados pela teoria sistêmica, como elementos deter- minantes nas decisões administrativas da empresa. Esse modelo refuta a existência de princípios universais de administração, que por isso possam ser utilizados em grande parte das mesmas, e ressalta a necessidade de se avaliar as particularidades de cada empresa. 2. O aluno deve ser capaz de se posicionar a partir de uma fundamentação feita ao resumir os mo- delos apresentados. 3. Todos esses comportamentos pareciam depender das pessoas e não da estrutura organizativa, e assim eram interpretados como questões individuais e incontroláveis. 4. Garantir a comunicação na organização: o que envolve a definição da estrutura organizacional :::: e o preenchimento das funções com uma equipe de gestores adequada. Assegurar os serviços e tarefas essenciais da organização: o que implica o recrutamento e ges-:::: tão de pessoal qualificado para as funções que lhe são atribuídas, criação de um código de conduta e a manutenção de um moral elevado. Definir a missão e os objetivos da organização: deve-se defini-los em termos gerais, mas ga-:::: rantir a efetividade de sua transmissão aos níveis inferiores da organização. 80 | Novas abordagens teóricas das organizações Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br O poder nas organizações Ao analisar o modelo de organização burocrático aplicado na maioria das empresas de tipo ad- ministrativo ao longo dos anos, os sociólogos se depararam com disfunções provenientes de vícios bu- rocráticos que ao invés de ajudarem na organização efetiva do trabalho, como propunha originalmente Max Weber, acabam por travar a própria organização. Pesquisas realizadas em empresas francesas cons- tataram a existência de verdadeiros círculos viciosos entre disfunções desse sistema, que se reforçam mutuamente. Os excessos na burocracia podem ser identificados, por exemplo, no caso da criação de gigantescos livros de estatutos escritos com o intuito de regulamentar detalhadamente as atividadesfuncionais, mas que em função da enormidade de regras criadas, dificultaria a leitura e a utilização des- tas normas. Ou ainda, no fato de profissionais superespecializados acabarem isolados em sua própria especialidade. Assim, as rotinas e os ritualismos dos comportamentos burocratizados tornam-se eles próprios empecilhos para um melhor funcionamento da empresa. A principal contribuição destes estudos para a compreensão das relações de poder dentro das or- ganizações foi a constatação de que a reprodução dos comportamentos burocratizados se dá em fun- ção da prática dos atores desse sistema, na elaboração de jogos que, de forma consciente ou não, são constituídos em torno de interpretações das regras formais que sustentam este tipo de organização. Estas interpretações acabam por criar regras informais que aos poucos vão ganhando força de lei den- tro da empresa e, em muitos casos, concorrem em vantagem com as regras formais, sendo seguidas como normas pelos “mais experientes” nas relações de trabalho. Como nos demonstra Sainsaulieu nes- ta passagem: [...] os jovens ou os novos recém-chegados, e que buscam na regra formal da organização do trabalho ou carreiras e da remuneração a explicação dos comportamentos de colegas, são vistos como ingênuos. “Eles ainda não sabem”, dir-se-á deles; sua adaptação consistirá em descobrir, por um lado, que a regra não se aplica diretamente, mas que cada um joga com ela para alcançar um certo número de objetivos mais pessoais; por outro lado, que a regra do jogo de todas essas liberdades relativas é uma margem de manobra resultante, em segundo grau, de todos esses jogos de atores so- ciais. A análise sociológica consiste, pois, em descobrir, antes de tudo, que há disfunção e, em seguida, compreender os jogos de cada um e a regra do jogo terminal, que, ainda que formal, constitui como que um modelo, um verdadeiro sis- tema de ação, acessível a quem quer e sabe jogar. A disfunção, variação repetitiva entre a regra formal e a realidade de condutas, é apenas o sintoma de um sistema de jogos informais, que se reproduzem à medida que não se mudou nem a regra, nem os atores, nem o conjunto das coações que marcam o cenário; os papéis são o jogo de cada um em torno da regra formal, e o cenário da peça é a regra do jogo. (SAINSAULIEU, 2006, p. 138) As principais disfunções da burocracia podem assim ser resumidas, por um lado, na rigidez das regras, que acaba tolhendo a iniciativa e a criatividade dos mais jovens ritualizando a realização das ta- refas e por outro lado, no isolamento que a especialização das funções acarreta, dificultando a passa- Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br gem das informações de centros de especialistas para os trabalhadores e dos clientes para os próprios gestores. Esse círculo vicioso a que se referem os pesquisadores causa um efeito indesejado ao próprio conceito de burocracia que passa a significar mais uma organização que não consegue mais eliminar as suas disfunções e que vive pelo menos tanto sobre suas leis informais como sobre a regulamentação formal inicial. Este desenvolvimento inesperado de relações informais em todas as direções dificulta as capaci- dades de decisão dos responsáveis que se defrontam com as resistências ocultas dos estratos e das re- des informais das organizações. O conceito de poder A análise do poder é fundamental para a Sociologia, pois está presente em todas as relações so- ciais e em todas as sociedades. Existem muitas definições de poder, mas a mais abrangente ainda pa- rece ser a de Michel Foucault que define poder como uma relação de forças: “o poder não se dá, não se troca, nem se retoma, mas se exerce, só existe em ação, [...] o poder é acima de tudo uma relação de for- ça.” (FOUCAULT, 1984, p. 175). Nesse sentido podemos pensar que o poder circula entre dois polos e é em função desta disputa que se articulam as relações. Se pensarmos nas organizações, entra nessa disputa a possibilidade de uma pessoa ou um grupo de pessoas imporem seus próprios interesses a outros e as estratégias que utilizam para conseguir este ob- jetivo são de importância fundamental para que o poder seja mantido. Para fazer valer os interesses dos di- rigentes das empresas ou os dos trabalhadores, diferentes estratégias são utilizadas por ambas as partes e é nesse jogo de forças que se constroem diferentes formas de controle e de autoridade na empresa. Para Max Weber, poder é “toda a probabilidade de impor a própria vontade numa relação so- cial, mesmo contra resistências, seja qual for o fundamento dessa probabilidade.” (WEBER, apud DIAS, 2008, p. 179). Ao considerarmos o poder como algo que é exercido e não como algo que se possua, cabe ana- lisar as três principais formas como ele pode se manifestar. Conforme Dias, estas podem se dar através da força; da autoridade que pressupõe uma dominação; ou de influência. O poder baseado no uso da força ou da coerção física se dá em última instância pelo uso de ar- mas. Ao Estado é reservado o monopólio legal do uso da força, no entanto, existem outros grupos que também utilizam a força como forma de poder, como no caso do crime organizado. O poder baseado na autoridade é o poder legitimado pela dominação legal ou burocrática, tra- dicional e carismática. A partir de um estudo clássico de Max Weber que analisa “os três tipos puros de dominação legítima”, o autor define dominação como sendo “a probabilidade de encontrar obediência a um determinado mandato” (WEBER, 1986, p. 128) dividindo-a em burocrática ou racional-legal, tradi- cional e carismática. A autoridade burocrática ou racional-legal está baseada no cargo ou na posição que a pessoa ocupa dentro da organização e que a autoriza através de leis ou regras a exercê-la. Já a autoridade tra- dicional fundamenta-se na legitimidade das tradições, às quais os outros se submetem apenas em fun- 82 | O poder nas organizações Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 83|O poder nas organizações ção de seus costumes. E, por último, a administração carismática está baseada nas qualidades pessoais do líder a quem se obedece em função de sua qualidade enigmática, e é devida única e exclusivamen- te à pessoa do líder. O poder da influência é aquele que, apesar da ausência de autoridade para tal, baseia-se na capa- cidade de uma pessoa afetar as decisões de outra. Conforme Dias, “é influente um indivíduo que con- segue modificar o comportamento dos outros sem ocupar um cargo público ou privado e sem utilizar nenhuma forma de coerção física” (DIAS, 2008, p. 181). O poder organizacional Em primeiro lugar é importante identificar as organizações que conhecemos, ou seja, aquelas que existem na prática, como estruturas permanentemente permeadas por uma hierarquização das re- lações sociais, hierarquia essa que distribui seus membros em diferentes posições a partir de suas capa- cidades pessoais ou do poder formal que possuem. No entanto, sabemos que existe também uma rede de relações informais que estruturam poderes informais que devem também entrar em nossos estudos. Portanto, a Sociologia, que já se preocupou com a dominação absoluta da autoridade existente nas or- ganizações do início do século XIX, como forma pura de dominação e identificada em estudos clássicos, hoje trabalha sobre o emaranhado das relações humanas dentro da empresa, as sutilezas de jogos de poder que se dão ao redor das regras formais que devem ser cumpridas pelos membros de uma orga- nização e que acontecem nos entrelaçamentos das relações sociais dentro da empresa formando polos de resistência e de poder informais. Mas se essa análise não se concentra mais apenas no poder formal da hierarquia nas empresas e sim na compreensão deste jogo, criado pelas novas formas de participação mais democrática nas orga- nizações, interessa compreender qual é a forma de poder que vem a contrabalancear o poder formalda hierarquia encarregada de fazer e aplicar as regras da organização para que ela funcione e chegue ao seu objetivo final. A busca das pesquisas se dá no sentido de revelar as estruturas de jogo e as lógicas de ação que se constroem nestas inter-relações profissionais e que convivem de forma simultânea com as estruturas formais de poder hierárquico dentro da empresa. Os sinais desse embate de forças nas estruturas da organização são muitos, mesmo hoje quan- do as greves, por exemplo, já perderam grande parte de sua força política e as negociações com os trabalhadores já fazem parte do cotidiano das empresas, paralisações de trabalhadores são sempre ins- trumentos cuja dimensão de força não pode ser facilmente avaliada pelo administrador. Por outro lado, para os sindicalistas há uma dificuldade concreta em mobilizar as massas que pode ser explicada pelo poder de coerção das estruturas hierárquicas da empresa. Tudo isso revela o quão dinâmicas são as re- lações interpessoais de trabalho. Estudiosos da área de comportamento organizacional identificam French e Raven como auto- res que, inspirados nos trabalhos de Max Weber sobre dominação, realizaram um estudo clássico onde diferenciam vários tipos de influências dentro das organizações e as definem como uma relação entre duas pessoas A e B, em que B, por exemplo, muda seu comportamento em função de uma ação espe- cífica de A. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Apresentaremos agora oito categorias de poder relacionadas por Sainsaulieu e que foram elabo- radas principalmente por French e Raven com a ajuda de pesquisas realizadas por um sociólogo holan- dês chamado Mauk Mulder (1975, 1972 apud Sainsaulieu, 2006, p. 148). São elas: O poder da recompensa:::: (sanção positiva) – o comportamento de B é determinado pela esperança de uma recom- pensa se ele realizar os desejos de A; O poder de punição :::: (sanção negativa) – o comportamento de B é influenciado pelo temor de uma punição se não se dobrar às exigências de A; O poder de sanção :::: (positivo ou negativo); O poder formal:::: – B segue seu chefe A porque este está situado acima dele na hierarquia; O poder legítimo:::: – trata-se de situações onde o poder formal tem justificações suplementares sobre a legitimidade de seu exercício. Insiste-se sobre o caráter mais ou menos correto do poder; O poder de referência:::: : – B considera que ele e A são do mesmo gênero e que isso justifica a sua influência, no extre- mo isso pode levar a uma imitação total; O poder de experto:::: – B reconhece que A dispõe de mais conhecimentos e de competência que ele; O poder de persuasão:::: – cada um dos parceiros da relação de poder está pronto a deixar-se persuadir pela superio- ridade dos argumentos do outro. Um ou outro pode vencer; entretanto, não se trata de uma ausência de poder, é uma situação de igualdade de poder. Conforme Sainsaulieu, esta pesquisa foi realizada com o objetivo de elaborar um método de aná- lise do poder que envolvesse as lideranças e seus subordinados imediatos. O objetivo era avaliar qual era o tipo de poder, dentro destas categorias construídas, utilizado em diferentes situações no cotidiano da empresa. Os resultados apresentados foram os seguintes: em circunstâncias cotidianas de trabalho, os poderes dominantes eram os de persuasão, o de referência e o de experto (baseado na competência) e nas situações de crises no trabalho, os poderes mais utilizados foram o formal, a influência exterior e superior e o poder de referência. Sainsaulieu conclui, portanto, que: [...] destes resultados se podem tirar as conclusões teóricas seguintes: um bom chefe é exatamente apreciado por suas qualidades “de jogo”, diríamos, em uma outra linguagem. Comandar e dirigir não se faz apenas com galões; esta posi- ção exige capacidades gerais de compreender, de persuasão e de relações complexas. [...] Assim, o fenômeno do po- der assemelha-se a um jogo de relação entre os chefes e seus subordinados ou superiores; esse jogo pode depender de mudanças nas circunstâncias dos problemas a resolver. (SAINSAULIEU, 2006, p. 149) Evidencia-se assim, como característica positiva de uma chefia, o reconhecimento da existência de jogos informais que englobam o cotidiano de situações complexas dentro de uma empresa e exi- gem de sua liderança a capacidade de reconhecer e negociar para além das regras preestabelecidas. A abordagem das relações humanas que amplia a abordagem burocrática ressalta que os líderes, por exemplo, podem ter uma influência muito maior do que aquela provinda da autoridade legal que o mesmo pode possuir. “O poder aparece então como uma espécie de capacidade às vezes psicológica: há homens influentes; às vezes ideológica: grupos e massas podem ser mobilizados; e às vezes situacio- nal quando as posições técnicas e econômicas [...]” (SAINSAULIEU, 2006, p. 147) conferem poder sobre outros, ao ponto de autorizar quase jogos subversivos com a regra instituída. A partir da constatação da existência de fatores externos que complexificam as organizações, fazendo surgir jogos informais de atores que em interação, modificam a distribuição de poder hierar- quicamente construída dentro da empresa, estudiosos da área nos apresentam três tipos de pressões sociais que influenciam nestas relações cotidianas de trabalho: 84 | O poder nas organizações Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 85|O poder nas organizações as pressões diretas:::: – provenientes dos regulamentos da própria organização, da comunica- ção interna e da disciplina; as influências ideológicas e os modelos culturais :::: – têm origens de classe ou categoria pro- fissional e origens socioculturais. Nesse caso, o próprio estado das incertezas externas, da téc- nica, do comércio e da estrutura da organização abre permanentemente um jogo possível entre os atores do sistema de relações humanas e do trabalho; a posição superior na hierarquia:::: – tem o poder de influenciar seus parceiros, decorrente de sua posição e do acesso às fontes de capital que essa posição lhe dá. Sem esquecer que nu- merosas decisões superiores são frequentemente desobedecidas, deformadas ou esquecidas, o que revela um poder de ação mais difuso do que o apresentado na pirâmide hierárquica da empresa. As principais fontes de poder nas organizações Partindo dessa complexificação das relações de poder dentro da empresa através da considera- ção de fatores externos influentes e que estão permanentemente em transformação, a análise socioló- gica de Michel Crozier e Erhard Friedberg (1977) procura identificar alguns pontos de incerteza entre os atores que, se puderem ser controlados, podem garantir um certo poder. Para ele, as fontes de poder es- tariam baseadas no maior ou menor controle destas incertezas: o controle do conhecimento :::: – dá-se a partir da competência profissional, da expertise do ofí- cio, é o saber fazer que supre uma necessidade real da organização. Engloba também o con- trole das novas tecnologias que estão em constante transformação; o controle das comunicações:::: – na medida em que se pode filtrar as informações ou controlar os contatos que serão estabelecidos internamente entre os diferentes setores; o controle dos processos de decisão:::: – que depende de pôr em ação a regra e procedimen- to como chefe ou subordinado o qual, ao fazê-lo interpretar a regra ou ao aplicar o texto ao pé da letra, se desprende um meio de proteção contra o arbítrio dos superiores; o controle das relações da empresa com seu ambiente externo:::: – de indivíduos ou fun- ções que permitem manter contatos com seus parceiros externos: clientes, bancos, sindicatos, Estado e concorrentes. Assim, a grande contribuição teórica destes autores, Crozier e Friedberg, foi a importância que de- ram ao peso das incertezas. Para eles, compreender de onde viriam as incertezas se converteria emuma forma de poder informal. Essas teorias foram enormemente utilizadas por pesquisadores e estudantes em diferentes uni- versidades, mas também foram aplicadas por diferentes engenheiros e consultores como método de análise estratégica. No entanto, observaram-se numerosas transformações para a teoria das organizações quanto à complexidade, à criatividade e ao emprego ocorridas desde meados dos anos 1980 e estas modifi- cações se refletem na estrutura das relações de poder dentro das empresas. Segundo Sainsaulieu, as Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br novas tecnologias, aumentando a autonomia e a necessidade de colaboração das equipes e de serviços incorporados em cada tarefa e cada função têm como consequência a difusão do poder do especialis- ta ao próprio nível da execução. A abertura dos mercados à concorrência externa e as intervenções em termos de políticas ecológicas de privatização e de legislação trabalhista causam uma ação reativa das empresas e, com isso, o futuro das organizações passa a ser mais incerto, fazendo com que elas tenham que se adaptar às novas demandas e aos possíveis riscos dos mercados internacionais. O controle das comunicações e da organização em redes para compor as parcerias torna-se de importância crescente na relação com fornecedores, clientes e usuários do mundo todo. Assim, a principal conclusão destas análises é de que, na atual estrutura de poder das empresas, todas as posições na organização são fontes de jogos de atores quando o trabalho acarreta incertezas técnicas e organizacionais que apenas jogos de interações permitirão resolver. Liderança nas organizações A liderança é considerada uma forma especial de poder, apoiada principalmente nas caracterís- ticas pessoais do líder e sem relação alguma com o cargo ou a posição que o mesmo ocupa dentro da organização. Conforme Dias (2008), o conceito de liderança pode ser traduzido como uma capacidade humana que permite influenciar os outros, em suas motivações e competências. Para ele, a caracterís- tica mais importante da liderança está na forma como se dá essa influência. Isso porque uma liderança fundamenta sua autoridade em características pessoais, em suas habilidades individuais de influenciar comportamentos e atitudes dos seguidores, que vão muito além daquilo que lhe poderia ser exigido. Outra característica importante que diferencia a autoridade do líder da de um dirigente ou gestor é de que seus seguidores agem por livre e espontânea vontade, assim, o comportamento de seus se- guidores estará baseado na confiança e na identificação dos mesmos com suas ideias, intenções e com- portamentos. Dias (2008, p. 193) elenca três implicações práticas da dimensão ética na prática da liderança: em primeiro lugar, que a capacidade de liderança pode ser adquirida e melhorada, sempre que a pessoa que queira :::: ser líder esteja disposta a colocar as próprias qualidades a serviço dos demais membros da organização, e que faça o possível para melhorar essas qualidades em três âmbitos: do útil, do agradável, e do bom; em segundo lugar, que a capacidade de liderança, em sua dimensão ética, está ao alcance de qualquer pessoa, pois :::: sua raiz mais profunda está na vontade daquele que a quer, e em sua atitude no trabalho. Isto não quer dizer que toda pessoa vá ser líder, mas sim que está em condições de o ser em sua dimensão ética; em terceiro lugar, no comportamento do líder eticamente bom percebe-se que a motivação transcendente está :::: presente, entende-se que atua no serviço para o bem dos demais, e não para o benefício próprio exclusivamente. Deste modo, somente quem se comporta assim é capaz de incentivar que quem o segue livremente faça o mesmo; que saia de si mesmo para dar voluntariamente mais do que dariam normalmente. No ambiente organizacional a liderança é valorizada como uma qualidade necessária nos mem- bros que detêm o poder formal dentro da estrutura hierárquica da empresa, pois isso garante a eficácia do trabalho de seus seguidores. Ao contrário, a característica de liderança em membros da organização que não detêm nenhum poder formal é considerada como um fator perigoso para a estabilidade desta mesma hierarquia de poder formal constituído dentro da empresa. Caso essa liderança não esteja dire- 86 | O poder nas organizações Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 87|O poder nas organizações cionada para os interesses da empresa, pode significar um ponto de fraqueza para a autoridade de seus dirigentes. As análises sobre diferentes tipos de liderança seguiram caracterizando a figura do líder a par- tir de diferentes aspectos. Por um lado, uma corrente que valorizava as características pessoais do líder como, por exemplo, a inteligência, o magnetismo pessoal, a autoconfiança etc. e, por outro lado, uma corrente que valorizava mais a conduta do líder em relação a seus seguidores. Esta última é também di- vidida em duas: uma que valorizava o respeito mútuo e a confiança dos seguidores e a outra unilateral, baseada na realização de uma tarefa que deveria ser bem orientada pelo líder através de especificações claras de como, quando e onde deveria ser realizada a tarefa. Para acompanhar o desenvolvimento da teoria das organizações e as novas formas de gestão mais democráticas, a teoria da liderança busca adaptar-se às situações específicas de vida dos liderados dentro da empresa. A atuação das lideranças volta-se cada vez mais para a importância em observar as aptidões e capacidades dos liderados em executar adequadamente as tarefas designadas. As atitudes dos seguidores e suas disponibilidades em realizar a tarefa são também fatores que devem ser levados em consideração pelo líder. Assim percebemos que hoje não se pode falar de uma liderança ideal no sentido de ter validade em todos os casos porque é somente na situação concreta que se poderá dizer quais as características mais importantes e o estilo de liderança mais apropriado para cada caso. A atuação do líder, portanto, poderá variar entre “a delegação de atribuições, a participação na tomada de decisões, a persuasão e a mera direção” (DIAS, 2008, p. 194) dos seus seguidores. Texto complementar Liderança individual ou coletiva? (URIBE, 2001) Peter Senge tem se notabilizado por suas análises sobre a liderança. Em O Novo Trabalho do Líder (STARKEY, 1997), o autor procura caracterizar os requisitos da liderança da organização que aprende, as novas habilidades que ela deveria incorporar, referindo-se, ainda, a algumas ferramen- tas de desenvolvimento da liderança. O líder deveria ser encarado, segundo o autor, como projetis- ta, professor e regente. No exercício do primeiro papel, a liderança se envolve como projetista dos ideais e propósitos da organização e, de sua tradução prática, das políticas e estratégias, construí- das coletivamente. Se a responsabilidade primária da liderança é com esse planejamento, isso não quer dizer que esse ato seja solitário. A expressão construção coletiva sugere conceber o processo de planejamento das políticas e estratégias como um processo de aprendizagem organizacional am- pla. Citando Mintzberg, o autor assume que esse planejamento não pode ser visto como um esque- ma racional elaborado no plano abstrato e implementado em toda a extensão da organização, mas Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br como um fenômeno emergente. Organizações de sucesso “fabricam sua estratégia”, uma vez que estão continuamente aprendendo com as constantes mudanças nas condições dos negócios, pon- derando o desejável e o factível. O segredo não está em obter a estratégia certa, mas sim em pro- mover o pensamento estratégico. A escolha da ação individual é apenas parte da necessidade do criador da política. O mais importante é a necessidade de conseguir enxergar a complexidade ede formular conceitos e visões de mundo para lidar com essa complexidade. A promoção de um am- biente de aprendizagem através da difusão do pensamento estratégico seria uma das funções es- senciais da liderança. O líder como professor corresponde à visão do mentor, do guia, do facilitador. Os objetivos fundamentais desse professor seriam trazer à tona e ajudar a reestruturar os modelos mentais e visões da realidade das pessoas e promover o pensamento sistêmico, no sentido daquele pensamento voltado para as causas estruturais ou profundas dos fenômenos. O líder como regente das pessoas e da missão organizacional é uma instância que se compe- netra dos ideais de alta responsabilidade que caracterizam uma organização que aprende e que se coloca a serviço dos interesses superiores da organização. O conceito de uma liderança que presta serviços (servant leadership) é o oposto da liderança egocêntrica. Entre as habilidades que a liderança deveria desenvolver, Senge cita Rivera (2000a): a construção de visões compartilhadas, implicando alguns requisitos: a) o líder deve saber :::: comunicar sua visão, pedir apoio e indagar sobre a posição dos outros, no sentido de con- ferir se ela merece o comprometimento dos outros e de se dispor a questionar seu pon- to de vista, assumindo um tipo de construção interativa; b) as visões pessoais devem ser estimuladas e não anuladas; c) a construção da visão é um processo contínuo, que não se deixa apreender pela figura da “declaração da missão” em reuniões especiais, mas que cor- responde à difusão de um tipo de pensar estratégico capaz de apoiar o questionamento quotidiano do que realmente queremos conseguir em cada circunstância prática; d) a li- derança deve poder combinar visões extrínsecas (do tipo “derrotar um oponente”) com vi- sões intrínsecas (criar um novo produto, um novo padrão de satisfação de necessidades); e) a liderança deve saber distinguir visões positivas (alicerçadas em aspirações) e negativas (baseadas no medo), fortalecendo as primeiras; trazer à tona e testar modelos mentais, implicando alguns requisitos: a) a possibilidade de :::: perceber saltos de abstração, questionando generalizações; b) equilibrar indagação e ar- gumentação, assumindo que situações complexas exigem um aprendizado cooperativo; c) distinguir a teoria esposada (o que a pessoa diz que faz) da teoria em uso, assumindo que a distância entre o declarado e o real em uso implícito é crítica para o aprendizado; d) reconhecer e dissipar rotinas defensivas; desenvolver o pensamento sistêmico, que corresponde a: a) enxergar inter-relações, não :::: coisas, processos, fotos instantâneas; b) ir além das acusações, assumindo que a fonte das falhas não são as pessoas, mas os sistemas; c) concentrar-se na complexidade dinâmica (saber relacionar causas e efeitos distantes no tempo e espaço e distinguir consequências remotas) e não na complexidade de detalhes; d) concentrar-se, em termos da ação, em áreas de alta alavancagem; e) evitar soluções sintomáticas; definir dilemas estratégicos: refere-se à capacidade de evocar os dilemas ou de distinguir :::: os valores distintos e às vezes aparentemente conflitantes atrás das decisões (por exemplo, 88 | O poder nas organizações Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 89|O poder nas organizações custo e qualidade), procurando sintetizá-los. Como acréscimo apontaríamos, aqui, a capa- cidade de lidar com paradoxos, na linha do posto por Mitroff; criar uma rede de proteção para a reflexão individual e coletiva, capaz de sustentar a pos-:::: sibilidade da inovação e da mudança. Aqui, a capacidade de garantir um tempo livre para a reflexão dos sujeitos organizacionais é fundamental. No livro A Dança das Mudanças (1999), Senge desenvolve a versão mais atualizada de sua con- cepção de liderança. A partir da metáfora do jardim, o autor se contrapõe à imagem da liderança- -herói. A liderança “jardineiro” não é aquele tipo que, prostrado sobre as plantas, implora: “cresçam plantas, cresçam com afinco”. Essa liderança, ao contrário, reconhece que o crescimento das mesmas depende de seu potencial e se decide a acompanhar seu ciclo natural, preocupando-se com as con- dições que reforçam e que limitam seu crescimento (água, solo, nutrientes, sol, outras árvores). Atrás dessa imagem está a ideia de que as organizações devem ser vistas como sistemas biológicos e não como máquinas. No caso de uma concepção maquinal da organização, quando surge um problema, este é assimilado à condição de uma peça defeituosa que deve ser trocada. Na concepção biológica organizacional, lidamos com gente, com pessoas, que assim como as plantas, não podem ser tratadas como peças de uma engrenagem maquinal. No caso do jardim, uma planta não morre para ser substituída por outra, simplesmente. O que acontece é que uma nova vai crescendo e acaba por tomar o lugar da velha. O mesmo ocorre com o comportamento. Se um comportamento novo é mais eficaz do que o antigo, então o novo acaba conquistando espaço. Dessa maneira, o líder-jardineiro seria aquele que tenta atuar sobre as condições limitadoras e pro- motoras do desenvolvimento potencial das pessoas organizacionais, especialmente sobre as condi- ções básicas para uma aprendizagem coletiva solidária. Seriam essas as condições de aprendizado, fatores propulsores ou realizadores do potencial de crescimento das pessoas, potencial esse que po- deria ser tolhido em contextos impositivos e objetivantes. A liderança para Senge não seria um fator individual. Ou apenas individual. Na sua visão eco- lógica de liderança, esta corresponde a uma capacidade coletiva para moldar as mudanças. Na organização haveria vários líderes, em vários níveis, não necessariamente executivos. Destacam-se entre eles os “que portam a semente”, isto é, aqueles que têm a capacidade de estabe- lecer redes mais ou menos informais de comunicação, de impulsionar a todos os níveis, em relações de transversalidade, a possibilidade da transferência de habilidades e de conhecimentos. Esses lí- deres retirariam seu potencial da capacidade de estabelecer interconexões entre inovadores. Para o autor, os grandes problemas que a mudança enfrenta são de tipo gerencial. Referem- se à incapa- cidade de gerar uma dinâmica de negociação de uma visão compartilhada, à dificuldade de trazer à tona temas “indiscutíveis” mediante o desenvolvimento de habilidades de reflexão e indagação, à tendência de evitar o enfrentamento das causas mais complexas dos problemas em prol de um tra- tamento sintomático, a um tipo de conduta defensiva que escamoteia medidas que podem afetar interesses etc. Essas restrições, típicas da despreocupação dos dirigentes com a aprendizagem co- letiva, podem ser compensadas através de estratégias de aprendizagem. Mas isso não é suficiente. A mudança exigiria uma maior concentração sobre os aspectos limitadores do crescimento, enten- dendo mudança não como troca ou substituição, ou produção de algo absolutamente novo, mas como crescimento (como evolução do novo a partir do antigo). A referência de Senge a Maturana: “a história é a transformação para a conservação”, ou dito de outra forma: “cada movimento está sendo Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br inibido à medida que ocorre”, corresponde ao reconhecimento de tendências naturais de compen- sação ou de limitação do crescimento, que deveriam ser o alvo privilegiado de uma reflexão estra- tégica sobre como agir para enfraquecer ou atenuar essas tendências e para adiar os momentos de inflexão compensadora. Toda esta reflexão aponta para a necessidade de pensar não em termos de impor mudanças, mas de cultivar mudanças. Essa perspectiva não pretende afirmar que a lideran- ça não seja individual. Trata, isso sim, das relações entre capacidades individuais e sociais. Tenciona reforçar a ideia de que líder é quem fomenta os processos de aprendizagemque podem gerar uma liderança disseminada. Motta (1991) formula que a essência da liderança consiste de capacidades de domínio do contexto (capacidades de análise estratégica do ambiente e dos problemas organi- zacionais, de intuição do futuro e de formulação da visão), capacidades de manejo intersubjetivo (comunicação e negociação) e individuais (como o bom conhecimento de si, a capacidade de so- cialização e a autenticidade). Reforçando a dimensão subjetiva, o autor se detém na importância do ilógico e da intuição na gestão administrativa, que explicam o caráter às vezes pouco coerente e ra- cional da mesma. O mesmo acrescenta que a intuição mistura elementos de racionalidade formal e informal e que esta se apoia fortemente na experiência acumulada pela liderança. Esse destaque dado à dimensão subjetiva não formal ou racional da liderança opera aqui como um argumento im- portante para não omitir a natureza individual da mesma. Em Bennis (RIVERA, 2000), encontramos, por fim, ideias importantes sobre a liderança como um fenômeno voltado prioritariamente para a mobilização das pessoas (e não necessariamente para a indução da motivação), para a reflexão fu- turista da grande visão em detrimento do detalhe operacional e para o desenvolvimento da inova- ção. Diferentemente da lógica do controle inerente à gestão tecno-burocrática clássica, o fenômeno da liderança atuaria como o exercício do poder para o desenvolvimento de dinâmicas de equipe e de interação disciplinar que favoreceriam a inovação e a mudança. A promoção da liderança depen- deria muito de um tipo de aprendizado caracterizado pelo trânsito cultural entre disciplinas diferen- ciadas e informações aparentemente distantes. Essa linha de pensamento reforça, portanto, a ideia da liderança como processo de aprendizagem e como instância de mobilização das capacidades in- dividuais e intersubjetivas da organização. Atividades 1. Qual o significado de disfunção burocrática? 90 | O poder nas organizações Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 91|O poder nas organizações 2. Por que a análise dos entraves produzidos pelas disfunções burocráticas é importante para com- preender as relações de poder dentro da empresa? 3. Defina o conceito de “poder” e explique por que ele é tão importante para a Sociologia das Organizações. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Gabarito 1. É a variação repetitiva entre a regra formal e a realidade das condutas. São vícios burocráticos que surgem principalmente em função: da rigidez das regras, que acaba tolhendo a iniciativa e a criatividade dos mais jovens rituali-:::: zando a realização das tarefas; do isolamento que a especialização das funções acarreta, dificultando a passagem das informa-:::: ções de centros de especialistas para os trabalhadores e dos clientes para os próprios gestores. A disfunção burocrática acaba por criar regras informais que aos poucos vão ganhando força de lei dentro da empresa e concorrem com as regras formais sendo seguidas como normas pelos “mais experientes” nas relações de trabalho. 2. A principal contribuição desses estudos para a compreensão das relações de poder dentro das organizações é a constatação de que a reprodução desses comportamentos se dá em função da ação dos ocupantes desse sistema na elaboração de jogos, que são constituídos em torno de in- terpretações das regras formais que sustentam a organização. Essas interpretações acabam por criar regras informais que aos poucos vão ganhando força de lei dentro da empresa. O desenvolvimento inesperado de relações informais em todas as direções dificulta a capacidade de decisão dos responsáveis que se defrontam com as resistências ocultas dos estratos e das re- des informais das organizações. 3. Michel Foucault define poder como uma relação de forças: “o poder não se dá, não se troca, nem se retoma, mas se exerce, só existe em ação, [...] o poder é acima de tudo uma relação de força.” É importante conhecer o jogo de forças existente dentro de uma empresa porque, para fazer va- ler os interesses dos dirigentes das empresas ou os dos trabalhadores, cabe identificar as diferen- tes estratégias que são utilizadas por ambas as partes e é nesse jogo que se constroem diferentes formas de controle e de autoridade na empresa. 92 | O poder nas organizações Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br O estudo das empresas pela compreensão de sua cultura Definindo cultura As definições de cultura são muitas, isso porque o conceito é central dentro do campo da Antropologia e vem se transformando ao longo do tempo na medida em que esta área aprofunda in- vestigações que abordam o tema. Aqui vamos utilizar o conceito de Clifford Geertz, autor bastante reco- nhecido na área das Ciências Sociais, que a define como um sistema de significados, criador de um tipo de identidade coletiva, uma espécie de teia que une os indivíduos ao mundo e filtram suas perspectivas, orientando suas práticas sociais em conformidade com seus diferentes pertencimentos a grupos ou ca- tegorias dentro de uma sociedade (GEERTZ, 1978). Essa definição mais ampla pode ser ajustada aos tipos de fenômenos particulares que se preten- de analisar, como por exemplo, os fenômenos relativos à cultura de uma organização. Mudança social Pode-se dizer que a mudança social ocorre quando há uma alteração na cultura. Essas alterações podem ser mais complexas, quando sua abrangência é maior ou mais simples, dependendo do grau de resistência, de adaptação ou de aceitação da mudança, porém, nunca são de fácil realização podendo algumas vezes durar vários anos até se concretizarem. O mais comum é que se modifiquem alguns pa- drões da cultura em questão e não a cultura como um todo. Qualquer mudança encontra resistência na dimensão da cultura, pois é ela que compõe a rede de entrelaçamentos que une o grupo ou a sociedade. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br E quando ocorre a mudança? Há uma dimensão dinâmica no entendimento da cultura, pois as práticas culturais desenvolvem-se no sentido de reproduzi-la e mantê-la, mas por outro lado é ao cul- tivar as tradições que surgem os questionamentos da própria cultura e dos rituais existentes que aca- bam pondo em xeque essa mesma cultura. É através das mudanças adotadas que surgem novas visões de mundo, assim, as culturas são formadas, ao mesmo tempo, por movimentos de adaptação e por fon- tes de mudança. As separações existentes entre “povos primitivos” e “povos civilizados”; “sociedades arcaicas” e “so- ciedades modernas” e entre países desenvolvidos e subdesenvolvidos são meras tentativas de explicar diferentes culturas, e a partir de uma perspectiva eurocêntrica e ocidentalizada, que percebe o “resto do mundo” através de seus próprios princípios, de suas próprias concepções de sociedade e de desen- volvimento. Percebemos, com o aprofundamento dos estudos culturais, que há uma lógica binária através da qual estas identidades de diferença são quase sempre construídas e que não nos deixam conhecer o espaço que está no meio destas identidades: primitivo versus civilizado, moderno versus arcaico, sub- desenvolvido versus desenvolvido são categorias que se apresentam fechadas, polarizadas e que por isso entram em profundo processo de redefinição. Busca-se complexificar estes conceitos, evidencian- do que nem mesmo as culturas nacionais europeias dominantes são culturas homogêneas (veja os con- flitos na ex-Iugoslávia, por exemplo) e sua transmissão não é, tampouco, consensual ou contínua. As comunidades têm seus próprios processos de crescimento e muitas das causas destas comparações an- tagônicas têm explicações nos processos de colonialismo e dominação de determinadas culturas con- sideradas “desenvolvidas” sob outras chamadassubdesenvolvidas. Ao mesmo tempo, as próprias sociedades industriais desenvolvidas passam também por crises econômicas e sociais, o que reforça a ideia de que o desenvolvimento e o crescimento das comunida- des é fragmentado e apresenta-se desigual em diferentes sociedades. O padrão de desenvolvimento de culturas consideradas mais atrasadas, que cresceriam nos mesmos moldes das grandes potências industriais ocidentais, até atingir o seu grau de desenvolvimento, cai por terra, e a análise de diferentes modelos de organização da vida e das riquezas sociais, em distintas culturas, passa a fazer parte de aná- lises mais aprofundadas nestes estudos. A cultura vai aparecer então de forma interiorizada e transmitida historicamente por um conjun- to de valores e regras que funcionam na intimidade das relações humanas. Percebe-se hoje que a possi- bilidade de mudança nas sociedades também depende muito das capacidades de escolher e julgar de cada ser humano. Cultura organizacional Levando-se em consideração o fato de que a empresa está em constante troca com o ambiente externo em que está inserida, a mesma deve ser compreendida a partir de sua inserção na cultura des- se ambiente, ou seja, da sociedade a que pertence. Portanto, não se pode compreendê-la em sua tota- lidade por princípios puramente organizacionais. 94 | O estudo das empresas pela compreensão de sua cultura Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 95|O estudo das empresas pela compreensão de sua cultura Conforme Sainsaulieu: [...] as investigações recentes [...] demonstram que a empresa é um sistema social além de um sistema econômico e téc- nico. Ela tem, pois, todas as características de uma sociedade humana com sua história própria, seus valores específicos, centrados no trabalho e nos valores e nas relações interprofissionais e hierárquicas, e sua inscrição em uma sociedade global que também é portadora de cultura. Tanto do interior como do exterior a empresa não pode escapar das influ- ências culturais. A questão é fundamentalmente a das interdependências entre a sociedade e a empresa, dado que os indivíduos dirigentes ou simples executantes não podem facilmente mudar de identidade e de cultura ao passar pelas portas da empresa. Até onde esta última é, de fato, dona da base cultural de seu potencial humano? Eis uma pergunta crucial para o estudo de seu desenvolvimento. (SAINSAULIEU, 2006, p. 174) No entanto, temos que cuidar para não reduzir a forma como percebemos a cultura nas socieda- des mais amplas como correspondente ao conceito de cultura nos limites de uma empresa, pois uma não é o mero prolongamento da outra. Hoje, mais do que nunca, as empresas necessitam adaptar-se às mudanças externas e, como es- tas mudanças ocorrem em uma velocidade crescente, essa habilidade da empresa em conformar-se às novas circunstâncias transforma-se em uma questão de sobrevivência para a mesma. Descobrir quais elementos culturais intervêm na regulação das relações sociais do trabalho, por- tanto, é fator primordial das análises organizacionais atuais. A cultura organizacional pode então ser definida como o conjunto de valores, crenças e entendi- mentos que adquirem um significado comum para os integrantes de uma organização e que guiam o comportamento daqueles que integram a organização. Estudiosos deste campo identificam algumas características comuns na cultura organizacional. Elas são únicas e devem ser distintas de outras organizações para que possam gerar identidade de seus integrantes, é aprendida através da experiência no grupo, é implícita na estrutura formal e explícita na ação de seus membros; manifesta-se em todas as partes e elementos da organização, pode se expres- sar através de sinais pela linguagem, emoções, ordem, disciplina e organização do ambiente físico dos locais de trabalho; é aceita pela maioria e transmitida a novos membros e é um sistema em permanen- te mudança e contato com o seu entorno. Estas características gerais aparecem todas inter-relacionadas com o contexto externo no qual a organização se insere. Isso, combinado aos valores e crenças dos fundadores da organização, às experi- ências de seus membros e aos conhecimentos trazidos pelos líderes e pelos novos membros, compõe a essência da cultura de uma organização. A importância da cultura de uma organização pode ser identificada por inúmeros fatores, entre os quais citamos a delimitação de papéis diferenciados para seus integrantes, o que contribui para um senso de identidade e de pertencimento aos membros de uma organização. Fortalece a estabilidade do sistema, pois envolve todos os seus integrantes em um mesmo compromisso que se apresenta aci- ma de cada indivíduo, facilitando a união do grupo e diminuindo a importância de valores individuais. Indica um jeito específico de realizar as tarefas, um guia de atitudes e comportamentos aceitos dentro daquela empresa. A identificação com esses valores por parte dos indivíduos, ao favorecer a integração do mesmo, contribui para a consequente ascensão dos membros da organização. É importante compo- nente da história da empresa que através da repetição de rituais se atualiza e por isso permite a cons- tante adaptação da empresa a seu ambiente externo. Ajuda a distinguir seus membros, portadores de uma identidade comum, de outros grupos e organizações. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br As subculturas organizacionais A cultura organizacional, assim como qualquer cultura, não se apresenta de forma homogênea na realidade das empresas. Isso porque ela é formada por diversas “subculturas” que competem entre si ao se inter-relacionarem. Diferenças entre os grupos dentro da empresa podem gerar formas diversas de gerenciamento, atribuições e modos de realização de determinas atividades. Diversidades religiosas, étnicas, sociais e até mesmo de categorias profissionais podem dar pesos diferentes a determinadas ações ou maneiras de atingir os objetivos e realizar atividades dentro da empresa. Essas maneiras dife- renciadas vão estar em constante competição dentro da organização, formando o que chamamos de subculturas organizacionais. Dias (2008), de forma bastante didática, divide em 16 os elementos fundamentais que compõem a cultura organizacional: os valores:::: – são as concepções compartilhadas do que é importante para uma determinada organização e que influenciam e orientam as ações dos membros de uma organização; as crenças:::: – é a aceitação consciente que as pessoas têm de uma ideia, sem que essa necessi- te de uma demonstração concreta. Elas eliminam as dúvidas e indicam linhas de ação para to- dos, pois estão imersas na consciência coletiva daquele grupo; os ritos:::: – são atividades planejadas como eventos especiais onde se reforçam valores es- pecíficos da empresa através da celebração de símbolos ou de pessoas importantes para a mesma. Elas se repetem no sentido de manter vivos os comportamentos e metas mais impor- tantes para o grupo. Alguns exemplos: a entrega de prêmios por resultados alcançados, reu- niões periódicas para avaliação, organizações de eventos especiais onde os funcionários são os convidados especiais; cerimônias ou rituais de reconhecimento público dos resultados dos melhores trabalhadores; os mitos:::: – são histórias contadas e recontadas ao longo do tempo e que podem ou não apoiar-se em situações verídicas, criadas com o objetivo de transmitir os valores e crenças da empresa. Têm forte apelo emocional e se apresentam como narrações de sucessos ou fracas- sos estabelecendo limites do que é certo ou errado para os indivíduos-membros; a linguagem:::: – inclui todas as formas de comunicação dentro da empresa que formam as brin- cadeiras, jargões, metáforas etc., e que contêm significados especiais que são apenas compre- endidos pelos componentes da organização; lendas:::: – são narrativas de fatos históricosque podem estar misturados com fatos fantasiosos, os quais ao longo do tempo vão sendo acrescentados para ficarem mais atrativos; slogans:::: ou lemas – é a forma resumida de dar significado à ideia central da cultura da organi- zação, significa “grito de guerra”. Por exemplo: “somos vencedores”; condutas de forma geral:::: – a maneira de vestir, comer, descansar, reunir-se etc., vão se tornan- do características em cada organização. Esses modos vão sendo copiados pelo grupo como um sinal de integração; 96 | O estudo das empresas pela compreensão de sua cultura Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 97|O estudo das empresas pela compreensão de sua cultura tabus:::: – os tabus são importantes demarcações das proibições dentro de uma organização. Podem ser temas delicados para a empresa que não podem ser citados, por exemplo; símbolos:::: – são quaisquer objetos ou eventos primeiros da organização que são cultuados como forma de relembrar os valores mais fundamentais da mesma; hábitos:::: – são comportamentos adquiridos pela realização de ações repetitivas que ajudam a regular comportamentos e atividades dentro da empresa; normas e costumes:::: – as primeiras são codificadas e configuram o direito, as leis, os decretos e os regulamentos que são quase todos escritos e os últimos são comportamentos ritualizados, como por exemplo, não mascar chicletes durante o expediente, sentar em cadeiras etc.; comunicações:::: – alicerçada na troca de mensagens e de significados que criam, sustentam, transmitem e mudam as culturas; ideologia:::: – pode ser definido como o reflexo do sistema de ideias que de forma explícita ou implícita definem o que deve ser feito e como fazer dentro da empresa; elementos:::: materiais – são as instalações, a arquitetura da empresa, a distribuição física dos departamentos, dos equipamentos etc. A organização dos elementos físicos de uma empresa pode estimular atividades e até mesmo estruturar relações de poder dentro de uma empresa; elementos estruturais:::: – são os aspectos formais da organização como, por exemplo: a estru- tura de autoridade e decisão da empresa, formas de controle, hierarquia, estratégias e proce- dimentos preestabelecidos. A mudança organizacional As organizações, como sistemas abertos que são, estão sempre sofrendo com influências que po- dem ser boas quando proporcionam seu crescimento, ou ruins, quando podem ameaçar sua existência. Esses fatores externos que influenciam as organizações empurram-nas, muitas vezes, para a necessida- de de se adaptarem às novas realidades e para isso é necessário que mudem. Hoje, com a aceleração das mudanças sociais, é cada vez mais imprescindível que uma empresa saiba como realizar suas adap- tações internas, necessárias para que possa acompanhar as pressões externas e sobreviver em tempos de aceleradas transformações globais e tecnológicas. As consequências da globalização dos mercados e de capitais são importantes fontes de mudan- ça nas organizações. É necessário passar a considerar a influência de empresas internacionais, regula- ções de mercado e influências culturais de todos os cantos do planeta. São exigidas novas posturas dos membros de uma organização que viabilizem a integração desta organização neste contexto onde o foco não é mais o desenvolvimento local, mas sim o desenvolvimento mundial. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Os contextos locais estão submetidos a contextos mais amplos e é dessa perspectiva que as orga- nizações devem se estruturar, tendo em vista os mercados mundiais e o mercado de trabalho mundial que agora aparece também disponível a seus membros. A mudança e a constante adaptação ao novo, neste contexto, se incorporam como fatores coti- dianos e inevitáveis nas empresas. “A busca pela estabilidade foi substituída pelo movimento contínuo” (DIAS, 2008, p. 218). Neste sentido, aprender a fazer essa mudança torna-se central para as organizações e passa a ser primordial também nas análises organizacionais. Em termos organizacionais, mudar significa alterar a estrutura física, os procedimentos administra- tivos, a tecnologia, mas principalmente as atitudes e valores frente a esta nova realidade. Impulsionada por estes fatores, para que a mudança em uma organização se efetive, importa muito a política e as es- tratégias adotadas para reorganizar as coisas. O que deve ser alterado é principalmente a forma de se organizar o trabalho, a forma de se pensar e atuar dentro de uma organização. Os impulsos transformadores podem surgir tanto de fora como de dentro da organização, porém as causas mais comuns para a mudança organizacional advêm da necessidade de adaptação ao am- biente externo na busca de uma maior flexibilização para melhoria de resultados, o que impulsiona mu- danças internas necessárias. A forma ideal de realização destas mudanças é sem dúvida aquela que é implantada de forma gradativa, levando-se em consideração os fatores imprevisíveis e o risco de mexer em uma estrutura complexa, que sempre desencadeará fatores imprevisíveis. A mudança sempre gera certa resistência, pois a busca da estabilidade é alicerçada na permanência da ordem conhecida. A melhor mudança é aquela planejada que leva em conta os fatores externos que nem sempre são facilmente perceptíveis aos gestores dessa mudança, pois não estão diretamente relacionados com os objetivos da organiza- ção, como, por exemplo, a localização geográfica da empresa, o tipo e o tamanho da mesma. A inovação Colocar em prática um conjunto de ideias novas dentro de uma empresa é o que Dias chama de Inovação Organizacional (DIAS, 2008). Assim entendida, inovação nada mais é do que um tipo de mu- dança que pode estar apoiada na implementação de novas tecnologias dentro da empresa ou de um novo jeito de administrar a mesma, e frequentemente uma coisa exige a outra. A inovação tecnológica que se dá em função da aquisição de novos produtos e equipamentos exige uma readaptação da forma como se organiza o trabalho para absorver o uso desses novos equipamentos, o que requer uma modi- ficação nos modos de concepção, realização e comercialização do produto. Dias nos apresenta um quadro onde estão sistematizadas nove medidas de inovação implemen- tadas por pequenas e médias empresas que fizeram parte do estudo a citado seguir. 98 | O estudo das empresas pela compreensão de sua cultura Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 99|O estudo das empresas pela compreensão de sua cultura Porcentagem de empresas (%) Medidas adotadas Fo nt e: p es qu is a re al iz ad a en tr e as 1 00 p eq ue na s e m éd ia s em pr es as q ue m ai s cr es ce ra m no s úl tim os tr ês a no s, p ub lic ad a pe la re vi st a Ex am e- pm e, n º 1 0, s et ./o ut . 2 00 7, p . 3 6. In : D IA S, 2 00 8, p . 2 22 . 67 Investem constantemente em tecnologia. 60 Buscam disseminar uma cultura aberta a novas perspectivas na solução de problemas. 55 Fazem parcerias com fornecedores para o desenvolvimento de produtos e serviços. 48 Formam profissionais capacitados a lidar com a maior diversidade possível de desafios. 44 Dispõem de área de pesquisa e desenvolvimento ou departamento voltado para novos produtos ou serviços. 39 Colhem ideias novas dos funcionários e têm mecanismos para avaliar seus produtos ou serviços. 35 Adotam uma estratégia formal de negócios que prioriza a inovação. 32 Possuem uma política de reconhecimento e incentivo aos funcionários, que contribuem com ideias inovadoras. 10 Contam com medidas para avaliar a adequação da cultura de inovação da em- presa a seus objetivos de negócios. Ao analisar essa gama de fatores, o que parece fundamental a ser ressaltado é a necessidade de envolver todos os membros da organização naspossibilidades de mudança e de sua contribuição para o surgimento de novas ideias. Para esse autor, importa ainda ressaltar a existência de três dimensões principais onde se realizam a mudança: quanto à intensidade, quanto à origem e quanto à velocidade. A :::: intensidade da mudança corresponde ao alcance da mesma e pode ser evolutiva, quando se modificam apenas alguns fatores internos para aumentar a sua eficácia; e a estratégica, que modifica a essência da organização ao se redefinirem os objetivos, a estrutura de poder, a cul- tura organizacional e a escala de valores da mesma. A :::: origem da mudança pode ser reativa, quando ocorre a partir de pressão externa, ou proa- tiva quando a organização atua de forma preventiva identificando os primeiros impulsos de inovações e reagindo rapidamente no sentido de antecipar-se às exigências externas. É a ten- tativa de planejar a mudança antes que ela se imponha. Quanto à :::: velocidade das mudanças elas podem ser: gradativas, quando se desenvolvem pas- so a passo, de forma planejada e discutida em todos os níveis da empresa e tem a vantagem de envolver mais seus integrantes; ou podem ser mudanças rápidas promovidas em espaços cur- tos de tempo e geralmente oriundas de pressões externas. Por ser menos discutida e planeja- da por um número restrito de membros, tem a desvantagem de ter menor adesão do grupo. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Em situações concretas todas estas características podem aparecer misturadas e devem, por- tanto, ser elementos a considerar. Como sabemos, as mudanças sociais são permanentes e constantes acontecendo quase sempre de forma gradativa, mas hoje, não raro, também de forma mais abrupta e profunda impulsionada principalmente pelos grandes avanços tecnológicos atuais. O ideal é que as or- ganizações consigam realizar suas mudanças de forma mais lenta e planejada, adaptando-se constan- temente ao meio em que estão inseridas. Grau de resistência à mudança A mudança organizacional não é sempre boa ou sempre ruim, mas ela é sempre confrontada com forças que a colocam em xeque e que geram adaptações e resistências que quase sempre aparecem de forma conjunta nos diferentes níveis da organização. Assim, a dificuldade de adaptação à mudança, que chamamos aqui de resistência à mudança pode ser identificada principalmente por três fatores internos: a familiaridade com os padrões existentes, a qual impede que os indivíduos percebam a nova :::: realidade que lhes impõe a mudança; a oposição à mudança por parte de grupos que, por terem vantagens no modelo vigente, se :::: sentem ameaçados pelas reestruturações trazidas pela mudança e se mostram contrários a qualquer modificação da estrutura; a incapacidade para a mudança por estar alicerçada na insegurança em não saber como fazê-:::: -lo ou como agir sob novas bases estruturais. Existem fatores adicionais que contribuem para a resistência à mudança. São obstáculos do am- biente externo em que as organizações estão inseridas e incluem fatores como as restrições oficiais (leis e regulamentos), as restrições ao comportamento não oficiais e não planejadas (quando há imobilida- de por falta de regramento e reprimem-se as ações improvisadas); os acordos internos de categorias de trabalho (feitos entre operários e administração); e a falta de recursos (financeiros ou de esforços pesso- ais) necessários para concretizar as mudanças. Vale lembrar ainda que toda mudança é fruto da ação humana e tem como resultado uma reação que pode ser positiva ou negativa, portanto, para toda a mudança haverá um maior ou menor grau de resistência a ela. Para amenizar esse processo, Dias propõe um maior cuidado com a comunicação, va- lorizando o diálogo e a divulgação de intenções para alcançar melhores resultados e menor resistência às transformações. Para este autor existem três formas principais de promover a mudança dentro da empresa: atra- vés da educação para a mudança, que se dá em longo prazo e tem por objetivo aumentar a receptivi- dade a elas; pela adoção de normas mais rígidas, regulamentos formais e regras que possam coagir a mudança e através do endomarketing, que seria uma forma de promover as mudanças divulgando-as internamente, promovendo debates e pedindo sugestões, com o objetivo de difundi-las aumentando a adesão e diminuindo as resistências. 100 | O estudo das empresas pela compreensão de sua cultura Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 101|O estudo das empresas pela compreensão de sua cultura Mudanças recentes no ambiente das organizações (SACOMANO NETO; ESCRIVÃO FILHO, 2000) O mundo contemporâneo assiste a um período de grandes transformações sociais, políticas e econômicas em esfera mundial. Essas transformações radicais afetam todos os países do mundo com o fenômeno irreversível da globalização. Atualmente não existe um consenso de interpretação deste fenômeno. Na visão de Fonseca (1997), existem três forças poderosas agindo neste processo: primeiro, a terceira revolução tecnoló- gica com os avanços da transmissão da informação e das inovações da engenharia genética; segun- do, a formação de áreas de livre comércio e dos blocos econômicos; terceiro, a crescente interligação e interdependência dos mercados físicos e financeiros em uma escala planetária. Em contrapartida, Chesnais (1997, p. 4), um grande estudioso da gênese e dos efeitos da glo- balização, coloca que “estamos diante de um novo modo de funcionamento sistêmico do capitalis- mo mundial ou, em outros termos, de uma nova modalidade do regime de acumulação”. Difere-se dos outros regimes de acumulação, pois sua natureza é essencialmente excludente em relação aos países em desenvolvimento. Com a consolidação do capitalismo e o crescimento da “sociedade de consumo”, as organizações buscam adaptar-se a um novo cenário competitivo. As inovações tecno- lógicas e as transformações sociais dominam a sociedade atual: mudam profundamente a produção de bens e a vida das pessoas (MOTTA, 1998). Em decorrência da internacionalização dos mercados, a adaptação organizacional torna-se imperativa para a sobrevivência das empresas neste ambien- te competitivo e turbulento, implicando uma dinâmica complexa e incessante no contexto das mu- danças e inovações. Como colocado por Hoffman e Kaplinsky (apud AMATO NETO, 1995), um dos principais meca- nismos organizacionais para a melhoria da competitividade é a adequação da estrutura ao foco de atenção da empresa, isto é, aos objetivos que se pretende atingir, buscando a obtenção de vanta- gens advindas da diferenciação estrutural. A flexibilidade organizacional que corresponde à capacidade de reação da organização frente aos sobressaltos impostos pelos movimentos de inovação, representa uma das vantagens competiti- vas na concorrência de mercado. As adaptações das estruturas organizacionais refletem um impacto sensível na forma pela qual o trabalho é organizado (MARX, 1997), onde uma das alternativas a este impacto é a formação das equipes de trabalho. Como colocado por Wellins et al. (1994), a implantação das equipes de trabalho torna-se uma das peças centrais para a flexibilização do processo produtivo. Neste sentido, torna-se indispensável uma análise destes aspectos, pois exercem influência di- reta no ambiente das organizações brasileiras que, até recentemente, viviam dentro de uma “redo- ma de vidro”. Assim, desde a abertura dos mercados para a concorrência internacional, as empresas Texto complementar Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Atividades 1. Defina cultura e explique por que ela ajuda na compreensão das organizações. brasileiras, tanto de capital nacional como internacional, têm realizado um esforço significativo para atingir patamares mais competitivos. Este esforço está intimamente ligado aos novos arranjos orga- nizacionais,entre os quais pode-se citar as mudanças na estrutura organizacional e a formação das equipes de trabalho. 102 | O estudo das empresas pela compreensão de sua cultura Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 103|O estudo das empresas pela compreensão de sua cultura 2. O que é mudança social e para que ela serve? 3. Quais são os obstáculos à mudança e a partir de que fatores eles podem ocorrer dentro da empresa? Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Gabarito 1. Cultura pode ser definida como um sistema de significados, criador de um tipo de identidade cole- tiva que une os indivíduos ao mundo e filtra suas perspectivas, orientando suas práticas sociais em conformidade com seus diferentes pertencimentos a grupos ou categorias dentro da sociedade. A empresa está em constante troca com o ambiente externo em que está inserida, e, por isso, a mesma deve ser compreendida a partir de sua inserção na cultura deste ambiente, ou seja, da so- ciedade a que pertence. No entanto, temos que cuidar para não reduzir a forma como percebemos a cultura nas socieda- des mais amplas, como correspondente ao conceito de cultura nos limites de uma empresa, pois uma não é o mero prolongamento da outra. 2. A mudança social é fruto de uma alteração na cultura. Esta possui necessariamente uma dimensão dinâmica, sendo que é comum que se modifiquem alguns padrões da cultura em questão (e não a cultura como um todo). Qualquer mudança encontra resistência na dimensão da cultura, pois geral- mente, as práticas culturais desenvolvem-se no sentido de reproduzi-la e mantê-la. Mas por outro lado é ao cultivar as tradições que surgem os questionamentos sobre a própria cultura, que levam às mudanças sociais. É através das mudanças adotadas que surgem novas visões de mundo, assim, as culturas são formadas, ao mesmo tempo, por movimentos de adaptação e por fontes de mudança. 3. A dificuldade de adaptação à mudança, que chamamos de resistência à mudança, pode ser iden- tificada principalmente por três fatores internos: a familiaridade com os padrões existentes, que impede que os indivíduos percebam a nova re-:::: alidade que lhes impõe a mudança; a oposição à mudança por parte de grupos que, por terem vantagens no modelo vigente, se :::: sentem ameaçados pelas reestruturações trazidas pela mudança e se mostram contrários a qualquer modificação da estrutura; a incapacidade para a mudança por estar alicerçada na insegurança em não saber como fazê-:::: -lo ou como agir sob novas bases estruturais. 104 | O estudo das empresas pela compreensão de sua cultura Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br As organizações e suas relações com o entorno O crescente aumento na implementação de inovações nas empresas atribuído à aceleração do avanço tecnológico, principalmente ligado às tecnologias informacionais, e a consequente aproxima- ção da sociedade mundial através das redes de comunicação que facilitam a circulação destas infor- mações, tem levado os estudiosos da teoria organizacional a refletir ainda mais sobre a natureza da organização como um sistema aberto que está em constante troca com seu meio. Para responder aos desafios de um mercado consumidor e de oferta de trabalhadores cada vez mais globalizado é necessá- rio, no entanto, ampliar ainda mais o campo de visão destas análises. Dentro desta perspectiva, podemos dizer que uma empresa funciona bem quando consegue rea- gir a pressões externas. Assim, para situar a empresa em um quadro mais amplo de análise é necessário ter em vista que ela está em relação de interdependência com todas as instituições sociais que estrutu- ram a vida em sociedade. Agora, vamos tentar compreender como se dão essas relações nas organizações, levando em consideração as influências que a empresa exerce em cada contexto em que se insere. A influência das culturas nacionais nas organizações A experiência organizacional parece estar fundada sobre a realidade cultural nacional na busca de uma forma mais eficaz de organização. É possível perceber tais fatores não apenas no modelo ameri- cano, baseado principalmente no fordismo; mas também no escandinavo, com iniciativas de democra- tização dentro da empresa, apoiado na política social democrata que permaneceu por anos à frente do poder estatal nos países escandinavos; no modelo francês, sustentado por uma estrutura bastante bu- rocratizada e que acarretava maior proteção dos trabalhadores em função de uma estrutura hierárqui- ca e da existência de regras e leis protecionistas que possibilitavam também a organização coletiva; e, no final do século, no modelo japonês, que se apoiava na produção minuciosa de variados modelos do mesmo produto, com estoques muito menores e agilidade na comercialização dos mesmos. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Vamos analisar com mais detalhes este último, por apresentar características mais marcadamen- te ligadas à cultura daquela nação. Diferenciando-se enormemente da maioria das grandes corporações ocidentais, o modelo de organização japonês, que obteve um grande sucesso na década de 1980, mere- ce ser estudado mais aprofundadamente. Conforme Giddens (2004), podemos relacionar algumas das principais características deste modelo: tomada de decisões de “baixo pra cima”:::: – nas grandes corporações japonesas são realiza- das consultas aos trabalhadores que ocupam posições inferiores na organização, a respeito das políticas que vêm sendo aplicadas pela gerência; e até mesmo altos executivos reúnem-se regularmente com esses trabalhadores; menos especialização:::: – os empregados especializam-se bem menos que no Ocidente. Os jo- vens trabalhadores que entram na empresa como estagiários em uma posição de treinamen- to gerencial passam um ano aprendendo o funcionamento dos diversos departamentos e só depois passarão por várias posições em diferentes sedes da mesma empresa, para adquirirem experiência nas diversas dimensões de atividades da empresa. Até chegar ao auge da carreira passarão em média 30 anos para que o funcionário tenha dominado todas as tarefas impor- tantes da empresa; segurança no emprego :::: – o empregado tem a garantia de emprego vitalício pelas grandes empresas no Japão. O plano de carreira baseia-se na antiguidade do trabalhador, que seguido por estas corporações garante a importância deste longo aprendizado; produção voltada para o grupo :::: – os trabalhadores participam de pequenas equipes ou gru- pos de trabalho em todas as esferas da empresa. E são esses grupos que serão avaliados, não os trabalhadores individualmente, o que facilita o trabalho cooperativo; fusão da vida profissional com a vida privada:::: – não há uma divisão clara na relação do em- pregado com a empresa no Japão. As grandes empresas sustentam muitas das necessidades de seus funcionários em troca de total fidelidade e lealdade destes em relação à empresa. Algumas delas fornecem, por exemplo, moradias e auxílios para educação dos filhos, cobrem despesas com casamentos e funerais. Muitas destas características têm sido adaptadas por outros países principalmente no Ocidente, na tentativa de acompanhar os resultados proveitosos que este modelo obteve nas empresas japonesas. Todos estes exemplos servem de prova da importante penetração das características culturais de um contexto nacional mais amplo, na forma de organização do trabalho dentro da empresa. Assim, após tantos estudos e análises realizados em várias organizações de nações diferenciadas, investigadores da área concluem pela importância do ajustamento das estruturas de organização das empresas às especificidades culturais nacionais. A influência da cultura nacional dos membros da em- presa é fator dominante da diversificação dos comportamentos organizacionais.Os homens no traba- lho não conseguem abstrair-se de sua cultura para se organizar. 106 | As organizações e suas relações com o entorno Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 107|As organizações e suas relações com o entorno As interdependências institucionais da empresa A empresa é realmente o lugar de mudanças e de adaptações permanentes às suas diversas con- tingências. As instituições são configurações estruturais onde as normas e regras são interiorizadas e é nas instituições que sentimos o peso dos regulamentos que se apresentam de forma mais ou menos co- ercitiva e como parte que deve ser integrada. As organizações são construídas necessariamente a partir das relações com o entorno, cada setor dentro da empresa tem que considerar as regras sociais existentes na cultura mais ampla em que esta está inserida para elaborar a forma como essas regras vão funcionar dentro da organização. As exigên- cias de habilidades e qualificações por profissão devem corresponder, por exemplo, àquelas formadas pelas universidades e escolas locais; as obrigações e direitos dos trabalhadores cumpridos pela empre- sa devem encontrar correspondência com aqueles estabelecidos pelas regras do Direito formal e pelas organizações sindicais; os planos de carreira dos funcionários e as regras de seus estatutos devem tam- bém ser supervisionados pelo Estado e regulados por profissionais destes mesmos setores. Assim, a em- presa deve levar em consideração todas essas estruturas externas já existentes que auxiliam a moldar a sua forma de atuação interna. As análises teóricas da Sociologia das Organizações, baseadas em inúmeras pesquisas, explicam as especificidades encontradas em diferentes países através de quatro processos de interdependência das principais instituições sociais: a Educação, as relações com a estrutura hierárquica, a família e o Estado. A empresa e a estrutura educacional Um estudo citado por Sainsaulieu (2006, p. 186) foi pioneiro nesta área. Realizado entre os anos de 1975 e 1979, comparava indústrias na França e Alemanha na tentativa de compreender as diferenças nacionais das organizações no processo de qualificação de grandes empresas nestes países. Estas dis- tinções podem ser resumidas da seguinte forma: na Alemanha :::: – existência de poucos chefes (um para vinte e cinco operários), os operários têm tarefas polivalentes e se apoiam em uma boa qualificação. A manutenção é feita dentro da indústria por funcionários desta. O trabalho é feito com autonomia, aos pares, de forma complementar, com assistência e conselhos. As relações hierárquicas entre operário, chefia e quadros parece fácil. A ascensão para postos de chefia está baseada na competência; na França :::: – há mais chefes (um para dez operários), os operários são menos versáteis porque mais especializados em tarefas que suas funções exigem. A manutenção é frequentemente terceirizada. O trabalho é realizado de forma isolada e geralmente controlado de forma coerci- tiva. A ascensão dentro da empresa é mais difícil, pois tem critérios culturais. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br As diferenças constatadas impressionam porque os dois países são fronteiriços e industrializados praticamente ao mesmo tempo, e neste sentido justificam-se as análises sociológicas que as explicam através da importância do contexto da educação nacional. Assim, torna-se evidente o peso da formação diferenciada dos operários, dos técnicos e dos engenheiros nos dois países analisados. Na França, esse aprendizado se dá em escolas estatais e as promoções são feitas mais por antiguidade e baseadas em relações pessoais do que por qualificação. Já na Alemanha, a aprendizagem acontece dentro da indús- tria onde os trabalhadores passam por diversos setores para aprender as diversas tarefas e funções e as promoções são feitas naturalmente pela qualificação dos operários. Portanto, conclui-se que a distribui- ção das funções dentro do organograma hierárquico da empresa é bastante diferente nos dois países. A empresa e as relações com a estrutura hierárquica nacional Outro trabalho comparativo realizado no mesmo período (WARNER; MAURICE; SORGE apud SAINSAULIEU, 2006) tinha como foco a variável tecnológica de produção. A primeira observação desse es- tudo foi de que na França há um número muito maior de grupos funcionais em relação ao conjunto dos funcionários do que na Inglaterra e esta última tem mais grupos do que a Alemanha. A predominância da estrutura hierárquica é também maior na França, mas na Inglaterra há mais liberdade de manobra e a Alemanha destaca-se por uma fraqueza do controle técnico, mas uma maior autonomia dos operários. No caso da introdução de novas tecnologias, o estudo evidenciou que, na Alemanha, as ativida- des de programação dessas tecnologias são realizadas mais frequentemente nas próprias oficinas de trabalho e pelos próprios trabalhadores. Isso porque é principalmente no local de trabalho que se dá a aprendizagem das técnicas necessárias para os trabalhadores alemães. Já no caso da Inglaterra a utiliza- ção dessas novas tecnologias seriam confiadas preferencialmente a especialistas diplomados, podendo estes corresponder aos próprios engenheiros. A empresa e a família No Japão tornou-se famoso o termo “grupismo” para classificar um tipo de organização do traba- lho dentro das empresas que valoriza mais as atividades realizadas em grupo e menos a individual. Tal modo de organização permite uma aprendizagem local apoiada na versatilidade de posições e tarefas em forma de rodízio dentro da empresa e as relações hierárquicas são respeitadas de forma positiva. Estudos de Sylvaine Trinh (apud SAINSAULIEU, 2006) constatam que estas relações estariam menos liga- das a uma reprodução da estrutura familiar rural e mais apoiadas nas interdependências institucionais essenciais entre a família, a vida doméstica e a empresa, apoiadas na participação precária das mulheres no mundo do trabalho, na sua permanência em casa e disponibilidade para acompanhar a mobilidade do marido necessária em função das exigências de sua empresa. Além disso, estaria ainda baseada em uma sociedade desigual que garante a integração das famílias com a empresa apenas para os setores privilegiados que apostariam na não terceirização e, portanto, trariam maiores garantias de segurança a seus funcionários. Sabe-se, no entanto, da existência de inúmeras empresas menores que não estariam investindo nestes princípios integradores que as maiores investem. 108 | As organizações e suas relações com o entorno Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 109|As organizações e suas relações com o entorno Na França, apesar desta relação de interdependência entre as empresas e as estruturas familiares não ter sido objeto de estudos mais profundos, ressalta-se a importância de uma estrutura paternalis- ta na concepção de autoridade nas empresas, demonstrada em várias outras investigações. Percebe-se uma forte tendência, em termos gerenciais, de considerar as empresas como uma extensão da família aplicando-lhes formas hierárquicas na solução de problemas da empresa baseadas no modelo paterna- lista, ou seja, por analogia ao poder de um pai dentro da família. Constata-se hoje que a interdependência entre família e empresa sofre influências da própria evolução econômica, social e cultural principalmente em três fatores: o tempo parcial que surge como solução para o desemprego;:::: o aumento da influência das mulheres nas empresas espalhado pelas estruturas profissionais, :::: hierárquicas, técnicas e, sobretudo, administrativas; o papel predominante das famílias na busca de soluções “caseiras” para o aumento do desem-:::: prego, seja criando pequenas e médias empresas artesanais, seja pela influência das famílias nas grandes greves das indústrias empaíses como a França e Inglaterra. A empresa e o Estado As empresas do Leste europeu que foram objeto de estudos sociológicos, entre eles os de Bafoil, Fratelli e Lowiet (apud SAINSAULIEU, 2006, p. 190) apresentam resultados completamente diferentes, pois pelo fato de existirem sob um regime político socialista, ainda que decadente e em transição inicia- da na década de 1980 e que se estendeu até 1989, não poderiam ser compreendidas sem a análise das influências do Estado e do partido. A hierarquia destas empresas distribuía o poder decisório verticalmente, ou seja, de cima para baixo e estruturava-se a partir de três elementos principais: os sindicatos nacionais, mas, sobretudo, os regionais estavam oficialmente presentes na uni-:::: dade produtiva; o partido cujos representantes de base estão em relação com o nacional, que garante outro :::: controle oficial sobre o conjunto das atividades da fábrica; especialistas delegados pelo planejamento econômico centralizado que podiam juntar-se aos :::: da empresa e ao poder da direção. Assim, a empresa nessa época era um simples prolongamento do aparelho de poder do Estado. Durante este período de decadência do comunismo surgem fenômenos interessantes que foram destacados nas empresas polonesas (RYCKARDS et al., apud SAINSAULIEU, 2006, p. 190): grupos e categorias profissionais que provocam mais conflitos de interesses abertos que an-:::: tes, no auge do comunismo; as relações entre os administradores, as categorias profissionais e os operários aproximaram- :::: -se de uma espécie de consenso baseado na negociação como meio de resolver os problemas ao nível da empresa; Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br as estruturas de assembleia e conselho, que já existiam, tiveram oportunidade de restringir-se :::: a tratar dos problemas da organização. Pegando-se o exemplo da Polônia, de um paradigma organizador centralizado baseado no pa- pel do partido, do planejamento e dos sindicatos, este país passara, nos anos de 1970, a um paradigma marcado pela emergência de diferenças entre grupos e ramos interessados. Com todas estas transfor- mações no início da década de 1980, a empresa atravessou mais conflitos, e a organização da fábrica se tornou um desafio local. Na França, as pesquisas de Michel Bauer e Elie Cohen (apud SAINSAULIEU, 2006, p. 191) mostra- ram que, com a importância crescente dos desafios econômicos e a força dos acasos da contingência internacional, as decisões principais não resultam mais de níveis intermediários da tecnoestrutura das empresas na conjuntura de desenvolvimento do capitalismo. Agora, quando novos períodos de insta- bilidade econômica mundial apontam, são os pequenos núcleos de grandes dirigentes que tomam as decisões estratégicas em longo prazo em um sistema de influências e de redes no qual a relação com o Estado é um trunfo, uma preocupação e um parceiro principal. Segundo pesquisa citada por Sainsaulieu [...] as pesquisas de Michel Bauer e de Bènédicte Bertin-Mourot sobre a produção social das elites dirigentes de gran- des empresas privadas e públicas explicitam ainda um pouco mais, e de maneira muito original, a relação que as em- presas mantêm com o Estado. Para estes autores, três trunfos principais modelam o acesso aos postos dirigentes: o capital possuído pelas famílias, a carreira que se baseia na experiência de uma promoção dentro de uma mesma em- presa, e o Estado, que provém da passagem de engenheiros de grandes corporações e de alunos do ENA nos gabi- netes ministeriais antes de “vestirem o pijama” nas empresas. Na França o trunfo Estado domina os outros dois, ao passo que na Alemanha seria antes o trunfo carreira que tomaria a “direção” e a Inglaterra ocupa uma posição inter- mediária entre esse dois países. (BAUER, BERTIN-MOUROT; THOBOIS, 1995, apud SAINSAULIEU, 2006, p. 190) Assim, na França também há uma relação direta com o Estado, com suas regras, seus costumes, e seus projetos. Este dado é de importância fundamental para as próprias lutas sindicais e corporativas pois o poder de barganha destes passa também pela compreensão de um Estado protetor, o que in- fluencia muito a vida nas empresas. Democracia e estrutura hierárquica nas organizações modernas Os modelos de organização da empresa estão apoiados também no problema central da demo- cracia e da hierarquia das sociedades onde estas empresas estão inseridas. O próprio enfraquecimento da democracia social, perpetrado pelo crescimento das organizações e de suas formas de controle da vida em sociedade sempre foi uma preocupação de Max Weber, pois para ele a vida em sociedade tendia a níveis cada vez mais altos de racionalização, o que aumentava o poder das organizações, necessariamente burocráticas e hierárquicas. Assim, o aumento de nossa de- pendência das organizações torna maior o controle das mesmas sobre o nosso cotidiano e, consequen- temente, menor a liberdade e o exercício da democracia. O que Max Weber temia era que o surgimento de uma casta burocrática, limitada pelo cumprimento das regras e normas, se distanciasse dos interes- ses de qualquer um que estivesse de fora dessa estrutura. 110 | As organizações e suas relações com o entorno Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 111|As organizações e suas relações com o entorno Mesmo dentro das organizações, o efeito alienante dos altos níveis de controle gerencial necessá- rio para que se realizasse a tarefa era motivo de preocupação deste autor que percebia um processo de distanciamento real, por parte dos trabalhadores, da tarefa realizada e, como consequência, o cerceamen- to da capacidade criativa e autodeterminada dos mesmos. Assim, com a evolução da crítica ao excessivo controle sobre os indivíduos no ambiente de trabalho e à estrutura hierárquica muito rígida que o susten- ta, muitas organizações buscaram como alternativa modelos mais horizontais e cooperativos de forma a tornarem-se mais flexíveis e com maior capacidade de resposta às instabilidades do mercado. Por outro lado, em relação ao exercício da democracia interna da unidade produtiva, vários es- tudos já citados aqui demonstram não haver uma correlação tão direta entre a participação dos tra- balhadores nas decisões da empresa e o exercício da democracia na mesma. A existência de relações mais horizontais dentro de unidades produtivas, nesta perspectiva, não dependeria apenas de es- truturas externas formais de descentralização. Comparando sistemas de hierarquias em diferentes países e sua relação com a participação democrática, estudiosos da área concluíram que há dois in- dicadores, no entanto, que possuem forte influência destas estruturas. Há uma relação inversa entre o comprimento das cadeias hierárquicas e os indicadores de participação e uma relação direta entre os últimos e a satisfação no trabalho. “Quanto mais longa for a hierarquia, menos se é livre, satisfei- to, informado, motivado, capaz de ajustamentos pessoais, de iniciativas, de influências sobre os ou- tros” (SAINSAULIEU, 2006, p. 192). E segundo este autor, estes resultados variam ainda de um país ou de um lugar para outro. Em uma investigação subsequente em países da Europa Ocidental de 1981, de um grupo intitu- lado IDE (International Democracy in Europe), quando se acentuou mais os indicadores de participação do que os de hierarquia constatou-se uma distribuição nacional diferenciada de indicadores de parti- cipação direta e indireta, concluindo-se que a participação não está fortemente correlacionada com o indicador global de satisfação, mas sim com o grau de hierarquia. Aí se observam vários tipos de demo- cracia participativa variando, conforme as diferentes nações pesquisadas, entre: estruturas formais legais e sindicais de participação; :::: aquela que é mais fortemente influenciada pelo ambiente sociopolítico dos países do que pe-:::: los fatores econômicos e tecnológicos.Para que haja participação deve haver canais formais e legais (sindicatos, regras jurídicas de re- presentação e de expressão), normas que regimentem essa participação, mas, também, tem de haver lideranças e grupos capazes de decidir e influenciar os demais trabalhadores em longo prazo. Isso ex- plica algumas das vias necessárias à participação democrática na empresa. Por isso, a democratização permanece uma escolha difícil de fazer, que se inscreve em um sistema complexo de fatores internos e externos à empresa. Concluindo A enorme gama de investigações sobre as influências de diferentes fatores (principalmente os culturais) nas estruturas racionais de organização do trabalho está amplamente alicerçada no próprio interesse da área. Sendo este um campo que não para de se desenvolver através de recentes e extensas pesquisas de sociólogos de diferentes países, podemos resumir alguns resultados. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br A organização das empresas pode variar consideravelmente, de um país para outro, em fato-:::: res estruturantes fundamentais para a mesma, como a distribuição hierárquica e participativa dentro da mesma, o tipo de chefia, os centros decisórios, as qualificações e tipos de formação profissional, a relação entre fabricação e serviços técnicos, a presença de grupos no trabalho etc. A caracterização da organização produtiva racional, portanto, não é mais considerada uni- versal, pois deve se adaptar às exigências específicas dos contextos locais, regionais ou mes- mo nacionais em que estão inseridas. Esta diversidade na forma de organização das empresas não se deve apenas às diferenças das :::: culturas nacionais vivenciadas pelos membros da organização e filtros de suas práticas coti- dianas de interação e de relações no trabalho. O que pode explicar sobremaneira estas dife- renças de um país ou lugar para outro, é a interdependência entre a empresa e as instituições que fazem parte de sua sociedade. Ainda cabe ressaltar que o desemprego exerce um papel coercitivo muito forte frente a novas :::: possibilidades informais de organização trazendo importante papel às comunidades locais, aos centros de formação e às estruturas familiares que podem desempenhar um papel deter- minante no futuro das empresas. Esta análise do entorno deve contribuir para desvelar como cada organização está relacionada com as instituições de seu ambiente, quais as influências locais dos sindicatos, do Estado, da Educação e das estruturas políticas e administrativas que apoiam a sociedade em que essa organização está inserida. A empresa, buscando seu desenvolvimento interno, deve basear-se no funcionamento social de um sistema aberto a seus diversos ambientes e assim integrar os recursos exteriores capazes de ampliar o seu sistema de ação, na busca de outra forma de racionalidade. Texto complementar Percepções de incerteza em um sistema de planejamento e controle Um estudo comparativo Brasil – Inglaterra (FONSECA, 1999) Os estudos de Hofstede Para Sondergaard (1994) a pesquisa de Hofstede (1980) Culture’s Consequences parece ter sido relevante para efetuar mudanças no enfoque dos estudos cross-cultural. Segundo Sondergaard (1994), em uma análise do índice de citações de ciências sociais foram encontradas 1136 citações de Culture’s Consequences em jornais, das quais mais de 80% são poste- 112 | As organizações e suas relações com o entorno Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 113|As organizações e suas relações com o entorno riores a 1986. Da mesma forma, Adler e Bartholomew (1992) detectaram que, a partir da segunda metade dos anos 1980, os estudos nas áreas internacionais de comportamento organizacional e ge- rência de recursos humanos tenderam a reconhecer a importância da cultura e de seu impacto. Em sua opinião, essa tendência pode ter sido ocasionada pela influência da pesquisa de Hofstede (1980) sobre as demais da área, principalmente após 1986. O estudo de Hofstede (1980) analisou gran- de quantidade de dados sobre valores de pessoas em mais de 50 países ao redor do mundo, partindo da suposição levantada por vários antropólogos americanos da primeira metade do século 20: todas as sociedades enfrentam os mesmos problemas, só variando as respostas. O projeto foi conduzido entre 1967 e 1973, contando com 116 respondentes, que trabalhavam em subsidiárias de uma corporação multinacional, a IBM. De acordo com Hofstede (1980), as amostras eram semelhantes em todos os as- pectos, exceto nacionalidade, o que faria com que o efeito de diferenças nacionais ficasse bem claro. Hofstede (1994) acrescenta que, além do primeiro projeto, outros dois foram realizados en- tre estudantes de 10 e 23 países, respectivamente. Hofstede (1991) concluiu que a análise estatís- tica das respostas das questões sobre valores revelou problemas comuns, mas soluções peculiares a cada país, em algumas áreas básicas por ele denominadas dimensões. Segundo Hofstede (1991) uma dimensão agruparia um número de fenômenos em uma sociedade que se descobriu, empirica- mente, que ocorrem em combinação, mesmo que, à primeira vista, não pareça haver uma necessi- dade lógica de ficarem juntos. Para cada dimensão separada, os extremos opostos descrevem tipos ideais; entretanto os índices obtidos pelos países nas dimensões mostram que a maior parte dos ca- sos reais se situa entre os extremos. As quatro primeiras dimensões encontradas foram interpretadas da seguinte forma por Hofs- tede (1983). Distância do poder trataria da forma como uma sociedade lida com desigualdades en- tre as pessoas. Individualismo versus coletivismo relacionar-se-ia com o grau de interdependência que uma sociedade mantém entre as pessoas. Fuga à incerteza consistiria no grau em que os mem- bros de uma sociedade se sentem desconfortáveis com a incerteza e a ambiguidade. Masculinidade versus feminilidade abordaria a forma como cada sociedade aloca papéis sociais aos sexos. Final- mente, a última dimensão, orientação de longo prazo versus orientação de curto prazo, encontrada apenas em 1987, utilizando questionário desenhado por pesquisadores chineses, lidaria, segundo Hofstede (1994), com a busca da virtude. Valores associados à orientação de longo prazo seriam fru- galidade e perseverança; valores associados à orientação de curto prazo seriam respeito pela tradi- ção, cumprimento de obrigações sociais e proteção da face. Hofstede (1991, p. 110) afirma: “como seres humanos, nós todos temos de encarar o fato de que não sabemos o que acontecerá amanhã: o futuro é incerto, mas temos que conviver com isto”. As- sim, como o tempo corre numa única direção, não seria possível desfazer o que já foi feito, nem se poderia prever o que está por vir. Então, a questão fundamental levantada por esta dimensão seria: como a sociedade lida com a incerteza sobre o futuro; se ela tenta controlá-lo ou o deixa acontecer; a extensão em que seus membros seriam capazes de lidar com a incerteza, sem apresentar estresse excessivo. Desta forma, alta fuga à incerteza levaria as pessoas a abraçarem crenças que prometem certezas; a manter ins- tituições que protegem tradições e costumes; a tentar gerenciar situações imprevisíveis adotando um código rígido de comportamento, regras explícitas e regulamentos, rejeitando ideias novas, e aceitando a existência de verdades absolutas. O comportamento inverso indicaria tolerância para circunstâncias novas e ambíguas. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Hofstede (1980) observa ainda que a incerteza é conceito-chave nas teorias organizacionais mo- dernas. As sociedades distintas lidariam com incerteza de formas diferentes, afetando a maneira como elas constroem suas organizações. O conceito de incerteza estaria frequentemente ligado ao conceito de ambiente, que geralmente inclui tudo o que não estásob controle direto das organizações. Seria uma fonte de incerteza, que a organização tentaria compensar. Enquanto as sociedades em geral em- pregariam tecnologia, leis e religião para lidar com a incerteza, as organizações fariam uso de tecnolo- gia, regras e rituais para este fim. A tecnologia, como, por exemplo, a automação de processos, tornaria os resultados mais previsíveis a curto prazo. O estabelecimento de regras e regulamentos reduziria a incerteza interna causada pela imprevisibilidade do comportamento de seus membros e investidores. Finalmente, rituais seriam práticas não racionais desenvolvidas para tornar a incerteza tolerável. Conforme destacado por Hofstede (1980), os rituais de fuga à incerteza não tornariam o futuro mais previsível; mas, ao construir uma certeza simbólica dentro da qual os membros da organização soubessem como se comportar, aliviariam um pouco do estresse causado pela incerteza. Hofstede (1980) inclui os seguintes itens na categoria de rituais para evitar incerteza: memorandos e relatórios geralmente não conteriam nenhuma informação de que alguém :::: fosse precisar para agir, mas seriam dispositivos para parar o tempo por um momento; o sistema contábil seria considerado um processo de absorção de incerteza, já que mante-:::: ria o moral em face da incerteza, uma vez que a informação contábil seria frequentemente usada com uma justificativa, após o fato de decisões que pareceriam ter sido tomadas por razões não lógicas à primeira vista; uma parte considerável dos sistemas de planejamento não garantiria necessariamente :::: operações mais eficazes, mas permitiria que gerentes dormissem mais tranquilamente, à medida que acreditassem que poderiam reduzir a incerteza, adotando um planejamento mais elaborado; uma parte considerável dos sistemas de controle seriam rituais que poderiam ser danosos, :::: pois eles seriam capazes de encobrir questões reais por meio de certezas simbólicas, tornan- do as coisas menos discutíveis. Mesmo quando fosse possível medir as realizações, os sistemas de controle poderiam ainda ser ritualísticos, como, por exemplo, a checagem dos minutos na contabilidade de viagens, quando não houvesse possibilidade de julgar a sua necessidade; especialistas que trabalham numa organização, tanto membros internos como consulto-:::: res externos, transformariam incerteza em certeza aos olhos dos membros da organização, mesmo que não possuíssem maior quantidade de informação ou maior capacidade para resolver o problema. Os rituais expostos por Hofstede (1980) parecem estar fortemente re- lacionados com o sistema de planejamento e controle. Conclusões A pesquisa parece ter permitido que fossem evidenciados nos dois grupos aspectos que poderiam ter alguma influência sobre o sistema de planejamento e controle. A identificação de tais pontos pode- ria ajudar a compreender problemas que estariam ocorrendo dentro do sistema de planejamento e con- trole da empresa e que não poderiam ser solucionados pelo sistema formal. O conhecimento de valores 114 | As organizações e suas relações com o entorno Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 115|As organizações e suas relações com o entorno do grupo brasileiro, tais como necessidade de harmonia e dificuldade em transmitir notícias ruins, per- mitiria identificar causas de atritos em relação ao cumprimento das metas entre os dois grupos que, na maioria das vezes, seriam atribuídas à situação econômica e política. Por outro lado, a identificação de valores comuns poderia contribuir para criar pontos de identificação entre as duas equipes, melhorando o relacionamento entre elas ou, ainda, ajudando a formular políticas que incluíssem esses aspectos valo- rizados tanto pela subsidiária quanto pela matriz. Por exemplo, políticas de compensação que envolves- sem riscos, deveriam ser evitadas, já que nenhum dos dois grupos se mostrou favorável a elas. Verifica-se, ainda, uma complementação entre as pesquisas quantitativa e qualitativa, uma vez que a análise conseguiu aprofundar o que havia sido sugerido em alguns estudos quantitativos en- contrados na literatura. Determinados pontos previstos em pesquisas anteriores foram confirmados, enquanto, em outros casos, nos quais havia mais de um comportamento possível, pode-se escolher entre as alternativas apresentadas. Em outro extremo, alguns aspectos não puderam ser corrobo- rados ou mostraram-se totalmente opostos ao que seria esperado com base na teoria, sugerindo que outros fatores, tais como outros aspectos culturais atuam em sentido contrário ao da dimensão fuga à incerteza. Em particular, destacam-se aqueles peculiares à cultura brasileira, como o jeitinho, o qual possivelmente permitiria acomodar flexibilidade e preferência por um sistema de controle nor- mativo, ou ainda, como a característica marcadamente relacional da sociedade brasileira que, pos- sivelmente, poderia explicar a verificada orientação para pessoas por parte dos gerentes brasileiros, quando a literatura sugere que sociedades com alta fuga à incerteza apresentariam maior orientação para tarefas. Essas e outras idiossincrasias da cultura brasileira deveriam ser evidenciadas para que se conheçam os limites da aplicação de uma dimensão tão ampla como fuga à incerteza a essa cultura. Tal procedimento permitiria empregar com maior segurança essa dimensão às empresas brasileiras, o que, como sugere este estudo, pode ser muito útil nas suas relações com empresas localizadas em outras culturas. Além dos aspectos relativos à cultura brasileira, contingências externas também po- deriam ser levadas em conta, para explicar os resultados que contrariam a teoria. Por exemplo, a onda de reestruturação de empresas na Europa talvez possa explicar a ênfase dos britânicos em seguran- ça no emprego, em oposição ao que seria esperado com base somente em aspectos culturais. Final- mente, a cultura organizacional poderia explicar as semelhanças detectadas nos dois grupos, como as referentes à alienação dos funcionários em relação à vida organizacional ou à crença deles no de- sinteresse da empresa por seu bem-estar, que também não haviam sido previstas na literatura. Atividades 1. O que tem levado os estudiosos da teoria organizacional a refletir sobre a natureza da organiza- ção como um sistema aberto? Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 2. Segundo Giddens, quais as características principais do modelo de organização japonês? 3. Como podemos resumir as influências de diferentes fatores culturais nas estruturas racionais de organização do trabalho? 116 | As organizações e suas relações com o entorno Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 117|As organizações e suas relações com o entorno Gabarito 1. O crescente aumento na implementação de inovações nas empresas atribuído à aceleração do avanço tecnológico, principalmente ligado às tecnologias informacionais e a consequente apro- ximação da sociedade mundial através das redes de comunicação. 2. As principais características do modelo japonês são: a orientação de consultar a opinião dos traba- lhadores (mesmo aqueles que ocupam posições inferiores na organização) sobre as políticas im- plementadas pela gerência; o longo processo de treinamento gerencial, no qual os trabalhadores passam anos aprendendo o funcionamento dos diversos departamentos para adquirirem experi- ência nas diversas dimensões de atividades da empresa antes de fixarem-se em determinada fun- ção; a garantia de emprego vitalício (dentro das grandes empresas) que tem como ponto central para a carreira profissional o tempo de trabalho do empregado; o estímulo à produção coopera- tiva, centrada no grupo, que será avaliado coletivamente bem como a tendência de fundir a vida profissional dos trabalhadores com sua vida privada, pois as empresas responsabilizam-se pordi- versas necessidades de seus funcionários em troca de total fidelidade e lealdade dos mesmos. 3. A caracterização da organização produtiva racional não pode mais ser considerada universal, pois deve se adaptar às exigências específicas dos contextos locais, regionais ou mesmo nacionais em que estão inseridas. Tal fato faz com que a organização das empresas possa variar conside- ravelmente, de um país para outro, mesmo em seus fatores estruturantes fundamentais como: a distribuição hierárquica e participativa de seus quadros, o tipo de chefia e centros decisórios, as qualificações e tipos de formação profissional etc. Além das diferenças das culturas nacionais, podemos também destacar como forte influência a interdependência entre a empresa e as ins- tituições que fazem parte de sua sociedade e o forte papel coercitivo exercido pelo desemprego frente às possibilidades informais de organização. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 118 | As organizações e suas relações com o entorno Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Aprendizagem organizacional Hoje a subjetividade na gestão é um tema bastante estudado em função do aprofundamento dos estudos culturais e da reconhecida influência que o ambiente externo exerce nas organizações. A im- portância das abordagens que valorizam a cultura e as relações intercomunicativas reconhece a cons- trução de identidades dentro da organização e reforçam a análise da atuação de seus membros como indivíduos que atuam num ambiente de aprendizagem. As formas de socialização dentro da empresa passam a ser então objeto central de análise, pois é nestas instâncias que se acredita que o aprendizado se realize. Estudos antropológicos mais aprofundados demonstram a construção de diferentes formas de relações sociais duráveis e prolongadas entre os membros de uma organização. Apoiando-nos em tra- balhos de Sainsaulieu (2006, 1988, 1978) sobre a análise cultural e os laços de sociabilidade que funda- mentam a vida cotidiana no trabalho, vamos buscar compreender como ocorre a aprendizagem dentro das organizações. As relações entre ator e empresa: a força do coletivo Para concretizarem um trabalho em conjunto as pessoas necessitam de regras, valores e práticas elaboradas de forma consensual que façam funcionar suas relações cotidianas como relações de solida- riedade, de complementação técnica e de autoridade profissional, de circulação da informação, de con- trole e de avaliação. Para isso, elas se organizam em grupos de diferentes formas. Os grupos organizados comunitariamente e de forma mais igualitária podem se apresentar de- fensivamente ou com capacidade de reações coletivas às mudanças sociais e tecnológicas externas, pois sua lógica é de defesa de sua identidade social e profissional. A empresa é parte interessada na vida e na efetividade social de tais comunidades profissionais. A análise das interdependências culturais en- tre a sociedade e a empresa põe em evidência a força e a eficiência organizacional, mas também social dessas comunidades profissionais. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br O estudo das relações sociais em grupos de trabalho nos mostra que os atores podem ter mui- to poder se o estabelecerem em áreas que dominem a técnica necessária, ou no “seu saber profissio- nal”, ou seja, nas especialidades que dominam nos diferentes ofícios. Por ofício, podemos entender um tipo de trabalho que exige saberes específicos que são geralmente adquiridos através da aprendiza- gem informal, muitas vezes herdada de algum familiar ou mesmo aprendidos dentro da empresa. Não são saberes profissionais, aprendidos em centros de educação formais, mas são também saberes espe- cializados. Sabemos hoje que o exercício de um ofício é em geral constitutivo de fenômenos de sociabilida- des coletivas mais duráveis, constantes e profundas. Existem, por exemplo, verdadeiras comunidades humanas construídas em torno de formas associativas resultantes do trabalho profissional do ator sin- dical ou profissional. Um determinante poderoso da ação coletiva está localizado na defesa da comunidade. Isso por- que no cerne de todas as lutas sindicais fortes, por exemplo, há muito mais que a defesa de direitos e vantagens para determinadas categorias. São as representações culturais que definem um modo asso- ciativo destes grupos, suas lutas, seu modo de vida no trabalho, sua profissão e uma comunidade huma- na a que pertençam. Quando as culturas da comunidade estão em jogo, as lutas sociais só param depois de ter obtido o reconhecimento social de seus valores. O verdadeiro desafio da ação coletiva está ligado aos valores desses grupos que através de lutas coletivas são mantidos e renovados, fortificando ainda mais os elos de sociabilidade dos mesmos. É nes- te sentido que se ressalta a importância da análise cultural de empresas para compreensão de uma ca- mada mais profunda das relações sociais, que são as relações comunitárias. A maneira como esses grupos estão inseridos nas relações sociais na empresa é, portanto, o foco das análises culturais das organizações. Essas análises mostram também a existência de outro desfio so- cial na articulação das relações entre atores. É a compreensão dos sistemas de representação acerca do trabalho, da técnica, das funções, das relações, bem como da definição de um código de vida a propó- sito do poder, da autoridade e da distribuição de vantagens materiais. Valores coletivos, normas, códi- gos, símbolos formam a organização profunda dessa realidade humana que se constroem segundo as exigências das relações de trabalho. A análise cultural destas comunidades deve, portanto, compreen- der de forma mais aprofundada estas relações. A empresa como produtora de cultura Observando os comportamentos coletivos nas empresas Sainsaulieu percebe uma construção de identidades de grupo que são fruto das relações sociais de trabalho. Portanto, para ele a empresa é tam- bém um lugar central de socialização, da definição de identidades e de representações do mundo. Ela organiza as relações entre os indivíduos de forma intensa, com exigências cognitivas e afetivas e, por- tanto, é também identificada como uma fonte de aprendizagem cultural assim como a escola, a família ou o bairro, pois pode produzir sistemas de representações e de culturas e não ser somente o depositó- rio de culturas comunitárias e profissionais. Assim, a empresa é também capaz de difundir suas próprias influências culturais para o resto da sociedade. 120 | Aprendizagem organizacional Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 121|Aprendizagem organizacional Porém, o autor se pergunta: [...] onde estão os lugares produtores de representações sobre os grupos humanos, de definição de suas diferenças e de reconhecimento de suas identidades específicas? Como os indivíduos chegam a se reconhecer, a se apreciar e a se diferenciar coletivamente na multiplicidade de suas interações obrigadas de trabalho? Podem aprender a se socializar desde que passem aí uma parte importante de sua vida? Tais são as interrogações de toda a sociedade sobre ela mes- ma, porque é preciso fornecer aos indivíduos os meios de encontrarem-se em sociedade para viver, agir e perseguir, com ou contra outros, seus projetos. (SAINSAULIEU, 2006, p. 199) Estes questionamentos trazem à tona o problema de como se constroem as identidades dos in- divíduos, coletivamente ou por oposição a outros grupos. É possível a construção de uma identidade social dentro da empresa? A Sociologia das Organizações formula hipóteses de construção coletiva de identidades nas relações sociais dentro da empresa. Muitas pesquisas na área comprovam que a empre- sa é um lugar de socialização importante, de representação de si e dos outros. A aprendizagemcultural A Sociologia das Organizações estuda a forma de apreensão da cultura, principalmente para po- der explicar como ocorrem as mudanças nas organizações. Segundo Sainsaulieu, “falar de aprendiza- gem cultural significa, então, que as pessoas podem mudar de cultura, ou fazer evoluir seus sistemas de representação recebidos da infância, por ocasião de experiência da vida adulta.” (SAINSAULIEU, 2006, p. 200). Assim, se as mudanças de “representações mentais”, ou seja, da forma como vemos o mundo e como o compreendemos, podem acontecer ao longo de toda a vida e, portanto, inclusive na fase adul- ta, ao falar de aprendizagens específicas à empresa, é preciso pensar quais os lugares e contextos da vida em organização onde seriam possíveis de realizar estas aprendizagens. A questão aqui posta para a Sociologia das Organizações é saber explorar esses processos de mudança das representações ou de maneira mais simples, de aprendizagem, para perceber se também é possível aprender dentro das em- presas e, no caso de uma resposta afirmativa, onde e como isso é possível. Analisando o conceito de re- presentações sociais podemos compreender melhor as situações de mudanças culturais. Os psicólogos sociais Serge Moscovici e William Doise investigaram o papel dos grupos no pro- cesso de aprendizagem e constataram a importância da troca de informações para aproximação e união destes grupos (MOSCOVICI, 1972-1973 apud SAINSAULIEU, 2006). Quanto mais trocam informações, mais unidos ficam os indivíduos pelas concepções construídas pelo grupo, pois assumem estes enten- dimentos como seus. Portanto, uma parte importante da transformação cultural se dá nos diferentes grupos de perten- ça social em que o indivíduo vive relações duráveis e diferentes na vida cotidiana. O problema social da transformação das culturas que nos interessa aqui deve ser buscado nas si- tuações coletivas que favorecem tais processos de identificação e de análise nas relações cotidianas. As relações hierárquicas, as de ensinamentos, mas também as de equipes, de debates e de confrontações de ideias, são veículos desse trabalho de análise de suas próprias representações, porque permitem pro- cessos de transferência e de identificação. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Quatro tipos de identidades no trabalho A aprendizagem de novos valores pode levar a diferentes interpretações de si e dos outros e tam- bém conduzir para a produção de identidades coletivas resultante de processos sociais que envolvem indivíduos e grupos. Estudos mais aprofundados nesta área (SAINSAULIEU, 1972, 1988) evidenciam que as situações cotidianas de troca e de poder exigidas pelo próprio ambiente de trabalho podem também acarretar efeitos de aprendizagem cultural. Sainsaulieu nos fala de um vasto estudo realizado em oficinas e serviços, nos anos 1960 e começo dos anos 1970 que sintetizou quatro modelos de identidades coletivas, “quatro modos de estar com os colegas” existentes no mundo do trabalho, que vamos aqui apresentar de forma bastante resumida. Uma primeira identidade aparece junto aos trabalhadores da linha de produção, dos trabalhos mais simples e repetitivos em que as representações coletivas remetem a um “modo de fusão nas rela- ções”, ou seja, os componentes deste grupo procuram pontos de convergência entre si, moldando-se uns com os outros e desprezando-se as diferenças. As características deste modo foram: o coletivo é valorizado como um refúgio e uma proteção contra as divergências e as fragmen-:::: tações; as relações entre iguais são intensamente afetivas, mas pouco centradas no debate das :::: ideias; a relação com o chefe ou com o líder é indispensável para orientar o grupo e centralizar nele a :::: maior parte dos combates de ideias; os valores da massa, da unidade e da camaradagem são centrais.:::: A segunda identidade é caracterizada de maneira inversa à primeira pela negociação e pela acei- tação das diferenças. Pode ser encontrada entre os profissionais operários, entre os empregados e entre os agentes técnicos que exercem um ofício. As características identificadas foram: grande riqueza afetiva e cognitiva das relações interpessoais; :::: importância de uma vida coletiva de tipo democrático em que se aceita o debate produtivo :::: entre maioria e minoria e se recusa toda a autoridade imposta. Os líderes ou chefes devem ser escolhidos ou eleitos por suas aptidões; valoriza a solidariedade, mas também a diferença e a experiência do grupo;:::: o ofício e seus valores conexos de autonomia, de independência e de domínio de si e dos ou-:::: tros é muito valorizado. A terceira identidade, a das afinidades, aparece mais nas situações de mobilidade socioprofissio- nal prolongadas, onde as relações se fundamentam em afinidades seletivas e sem identificação de gru- po. Encontradas nas empresas onde houve a promoção interna graças ao crescimento do pessoal e do número de categorias e de agentes. Baseado na evolução pessoal rápida. As características identifica- das foram: a cultura de autodidatas;:::: 122 | Aprendizagem organizacional Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 123|Aprendizagem organizacional vivencia a mobilidade social na empresa;:::: tem relações conflituosas marcadas pela exclusão do grupo e de afinidades seletivas;:::: estas relações interpessoais com os colegas são pouco numerosas, mas intensas no plano afe-:::: tivo e cognitivo; para estes indivíduos os grupos são considerados perigosos porque são vistos como freios à :::: sua promoção individual; o chefe toma um lugar considerável, dele se exige atenção e apoio nesta tentativa de movi-:::: mento; o líder é rejeitado, pois evoca o grupo, mas o comando hierárquico é visto como indispensável, :::: no entanto este deve ser liberal e atento aos problemas dos subordinados; o trabalho é valorizado como um lugar de crescimento pessoal e de apego a uma estrutura :::: preocupada com as relações humanas e com os problemas de cada um; o :::: status e a carreira são considerados meios de estratégias evolutivas pessoais e não tanto for- mas de proteção coletiva. A quarta identidade é chamada por Sainsaulieu de “retirada” e se caracteriza por uma participa- ção muito fraca no complexo das relações interpessoais e coletivas com os demais membros da organi- zação. Por analogia, poderíamos dizer que o termo “retirada” provém da ideia de que os trabalhadores pertencentes a esta categoria são os que estariam se retirando da empresa, ou melhor, com interesses mais fortes fora dela. Há poucos amigos entre os colegas e as relações permanecem superficiais no trabalho.:::: O grupo é recusado.:::: O líder também é recusado.:::: A relação com o chefe é fundamental porque as outras relações são minimizadas, tudo passa :::: pelo chefe que deve ser ao mesmo tempo compreensivo, responsável e até autoritário quan- do se quer ser protegido. O trabalho não é um valor e sim uma necessidade econômica ou meio de realizar um proje-:::: to exterior. Os tipos de identidades aqui apresentados são apenas modelos, tipos ideais (no sentido que Weber dá), ou seja, resultantes de uma construção que parte da observação da realidade empírica. São quatro formas de sintetizar os modos de comportamento entre os pares: entre os colegas, grupos e che- fes que podem estar presentes no interior de um mesmo grupo socioprofissional ainda que de forma mais ou menos desenvolvidas. As organizações que aprendem Alguns fatores facilitam a aprendizagem das empresas. Segundo resultados de pesquisas de Sainsaulieu (1974, 1981 apud SAINSAULIEU, 2006) estes poderiam ser resumidos em três: Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br os desafios presentes nas situações do cotidiano da empresa:::: – nas relações cotidianas de trabalho que podem produzir crescimento ou não, com relação àsculturas já existentes ou pa- ralelamente adquiridas; os movimentos individuais dos empregados :::: – impostos por situações diversas e imprevisí- veis dentro da empresa; as mudanças tecnológicas ou de pessoal:::: – impostas pela administração ou por necessida- des de adaptação a momentos de crise. Ou seja, são as mudanças nas situações exteriores ao trabalho tanto vindas de fora como de den- tro da própria organização que podem impor aos membros dela, modificações na parte profissional de seus comportamentos e, portanto, na cultura. Outra forma de aprendizagem bastante marcante e durável dentro da empresa é o que o au- tor chama de “desenvolvimento de capacidades estratégicas” aprendidas através da prática de jogos desenvolvidos no cotidiano das relações de poder no trabalho. Esses jogos seriam produzidos princi- palmente em ambientes mais competitivos dentro da empresa e repetidos como estratégias de sobre- vivência ou de conquista de espaços dentro das organizações. As relações ditas humanas são apenas o supérfluo que viria a amenizar as relações de trabalho; é preciso ver bem que estas últimas são profundamente constituídas de relações interpessoais, coletivas e hierárquicas, onde se pesam e se jogam os imperativos econômicos e técnicos da produção de bens, mas também de serviços. Neste contexto, o sujei- to encontra mais ou menos oportunidades estratégicas para viver as provas de força impostas pelas mudanças de pro- dução. Em termos de acesso a bastante poder formal ou informal para viver estas provas de força, é preciso reconhecer que o lugar em organização confere não somente os meios desiguais, mas também variáveis; sob a condição de admitir a ideia de que o poder em nossa sociedade é, para uma grandíssima maioria de atores sociais, antes de tudo uma ques- tão de saber profissional, de controle sobre as comunicações, de direito à aplicação das regras e das redes de influên- cia, que podem até chegar a sair dos limites do organograma. Tais relações movediças e perigosas são então abordadas com a cultura transmitida pela família e pelo meio de origem que vai guiar as escolhas, as afinidades, as solidariedades e as submissões. (SAINSAULIEU, 2006, p. 210) Os quatro tipos de identidades analisadas (fusão, negociação, afinidade e retirada) podem ser en- tendidos como quatro modalidades de experiência de poder pelo trabalho, ou seja, como os indivíduos exercitam o poder dentro da empresa. Quando há pouco ou nenhum poder acessível na relação de tra- balho ocorre a fusão de identidades (reforço do grupo pela valorização dos pontos de convergência), a cultura está baseada em estratégias coletivas de proteção dos indivíduos que sozinhos não têm poder algum no ambiente de trabalho. Quando há poder baseado no saber profissional ou na posição hierárquica ocupada e as relações de trabalho são longas e densas, as relações são diferenciadas entre seus membros, porque as coerções hierárquicas ou de grupos encontram sempre resistência suficiente para impor o debate. Quando há mobilidade organizacional a cultura das afinidades é a mais comum. O poder se esgo- ta na preocupação da promoção de seus membros e as relações interpessoais ganham importância. O sistema de representações no ambiente de trabalho está, portanto, profundamente marcado pelas relações de poder que aí se desenrolam. A cultura da negociação aparece nas situações de trabalho ricas em poder pelo ofício ou pela hie- rarquia. Nestas, é importante o debate com os colegas em grupo, mas também com os chefes e a iden- tificação entre o grupo acontece mais pela oposição aos outros do que por imitação. 124 | Aprendizagem organizacional Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 125|Aprendizagem organizacional Quando situações de mobilidade profissional impulsionam crescimentos acelerados, o sujeito deve compensar a perda de seus grupos de identificação anteriores pela adesão às relações interpesso- ais novas e a dependência e a identificação com os outros se dão na imitação dos superiores. Concluindo: A situação de trabalho é assim uma dupla oportunidade de aprendizagem: ou se verifica que o sistema de repre- sentações culturais anteriormente adquiridas é sempre suficiente para esclarecer e viver outro encontro de riscos e confrontações; ou se descobrem outros modos de respostas face aos parceiros e às estratégias novas e se modifica progressivamente o estoque de normas e de valores já representados. Nestas duas hipóteses a cultura não é objeto de aprendizagem senão em uma compreensão racional do sujeito individual que reage às coerções materiais de toda si- tuação por um jogo complexo no campo do social. (SAINSAULIEU, 2006, p. 212) A própria dinâmica das relações de poder dentro da empresa (que o autor aqui classifica como jo- gos de poder), conduz os indivíduos à possibilidade de rearranjos nos acordos vigentes e esses novos arranjos são também novas fontes de aprendizagem ligadas às diferentes situações de trabalho. Isso porque a organização disponibiliza assim “oportunidades de constituir coalizões ofensivas ou defensi- vas, isto é, de desenvolver jogos mais ou menos complexos e mutáveis” (SAINSAULIEU, 2006, p. 212). O autor chama esses jogos com três atores de tríades, e admite que são bastante comuns nas empresas. Essas tríades (termo utilizado pelo autor para se referir às alianças entre, por exemplo, chefe – adjuntos – subordinados, chefe – militares – base etc.) funcionam, por exemplo, através de alianças de dois con- tra um chamada por ele de “conservadora” quando se conserva a relação anterior; de “revolucionária” quando inverte a situação de poder pela aliança de dois fracos contra um forte, e “ilegítima” quando há uma modificação parcial da ordem existente por zonas de resistência. Pode também ser formada atra- vés do que ele chama de “curtos-circuitos”, quando há uma transformação parcial e momentânea da or- dem através de zonas de resistências à mudança. Assim, também as relações de poder, os jogos e negociações podem construir situações novas, riscos diferentes que imponham novas formas de atuação que se convertam em situações de aprendi- zagem e modificações culturais. Novas tecnologias, reformas técnicas ou de serviços e melhoras nas condições de trabalho tam- bém são fontes de aprendizagem cultural, pois atingem as relações entre os membros de uma organi- zação diretamente. Até mesmo as lutas sociais, sindicais e de categorias profissionais, negociações coletivas, ações, comitês de militantes e de representantes das categorias de trabalho são situações de aprendizagem, pois os trabalhadores vivenciam outras formas, outros valores e outras normas e experienciam assim di- ferentes posições de poder. Assim, a análise cultural dos grupos e comunidades de trabalho comprovou a força das formas de associação coletiva no sentido de transformação de sujeitos trabalhadores em sujeitos capazes de ação e de transformação. A empresa é também produtora de identidades nas relações humanas de trabalho. Porém, as identidades coletivas, assim produzidas pela experiência das relações organizadas pela empresa, não são tão fortes e duráveis como as resultantes de grupos profissionais integrados em verdadeiras comu- nidades e que realizam trocas e mantêm relações mais íntimas (como por exemplo, as que se estabele- cem durante um movimento prolongado de greve de uma categoria). Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Sainsaulieu ressalta ainda que além de produzir identidades, as relações organizadas de trabalho produzem diferentes tipos de atores sociais resultantes dessas aprendizagens culturais no trabalho. Ele nos apresenta então quatro tipos de atores sociais: o ator de massa:::: – corresponde às identidades com características dos grupos de fusão, sus- tentado pelas ações de reivindicação coletiva sob direção sindical. Expressão que resta aos que não podemcontrolar, nem sabem fazer, nem tem liberdade de manobra, nem oportuni- dades de iniciativa; o ator estrategista:::: – refere-se ao universo dos poderes profissionais operários ou dos grupos reconhecidos em suas organizações que participam das possibilidades de negociação, aque- les que sabem negociar; o ator de si:::: – é aquele cujas energias pessoais estão empenhadas em construir uma integra- ção social e o reconhecimento pessoal. Esse ator é característico da cultura das afinidades, onde há mobilidade e promoção técnica e hierárquica dentro da empresa; o ator externo:::: – ocupa uma posição muito importante na vida das organizações, porque tra- duz a realidade humana fundamental dos diferentes pertencimentos dos indivíduos aos mais variados contextos sociais. Característico das mulheres, dos imigrados, dos jovens e dos ope- rários rurais. Podemos observar desde o início dos anos 1980 um processo de aceleração das mudanças eco- nômicas, tecnológicas, políticas e culturais, por muitos conhecido como globalização ou mundialização. A forma de organização da economia capitalista ocidental difundiu-se através da expansão de grandes corporações transnacionais e impulsionou uma crise prolongada principalmente entre as pequenas e médias empresas mundo afora. Esta situação desestruturou muitas maneiras de gerir as empresas que estavam baseadas no crescimento econômico e na oferta de emprego. Hoje buscam-se soluções de gestão que comportem a convivência de empresas nacionais (principalmente pequenas e médias), com as transnacionais globais. Muitas questões ainda estão postas e as análises culturais realizadas nas em- presas podem fornecer esclarecimentos ainda muito pertinentes sobre os atores destas organizações produtivas contemporâneas. Sabemos que na esfera cultural a aprendizagem acontece de forma bas- tante lenta, mas o aumento das pressões externas, a saber as ameaças de desemprego, o aumento da concorrência, o avanço da substituição do trabalho humano pelo uso da tecnologia provocando a dimi- nuição da carga horária do trabalhador, e outras inovações sociais, acabam modificando enormemente o contexto das aprendizagens que podem se realizar no ambiente de trabalho. 126 | Aprendizagem organizacional Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 127|Aprendizagem organizacional Texto complementar Um estudo de caso sobre as organizações que aprendem Organização que aprende (FRANCO; FERREIRA, 2007 Adaptado1.) A literatura revela a falta de um corpo teórico convergente sobre as organizações que apren- dem. Este resultado surge possivelmente do caráter multidisciplinar nesta área do conhecimento. Contudo, pelo menos seis disciplinas têm contribuído, consistentemente, para o desenvolvimen- to deste tópico: psicologia e desenvolvimento organizacional; ciência da administração; sociologia e teoria organizacional; estratégia; gestão da produção; e antropologia cultural. Esta interdiscipli- naridade gera uma área que contém contribuições tanto complementares quanto competitivas (EASTERBY-SMITH, 1997; BONTIS et al., 2002). A essência das organizações que aprendem é a habilidade da organização em utilizar a capaci- dade mental de todos os seus membros para criar processos que melhorem este processo de apren- dizagem. Uma organização que aprende é uma organização que facilita a aprendizagem de todos os seus membros e ao mesmo tempo transforma-os (PEDLER et al., 1991). Para Senge (1996, p. 3), organizações que aprendem são “organizações nas quais as pessoas ex- pandem continuamente a sua capacidade de criar os resultados que realmente desejam, onde se esti- mulam padrões de pensamento novos e abrangentes, onde a aspiração coletiva ganha liberdade e onde as pessoas aprendem continuamente a aprender juntas.” De fato, o conceito de organização que aprende foi introduzido por Senge, no início da década de 1990, fundamentando-se em cinco disciplinas, premissas com um corpo teórico e técnico que, quando colocadas em prática, podem transformar uma organização qualquer numa ”organização que aprende”: (1) domínio pessoal; (2) modelos mentais; (3) visão compartilhada; (4) aprendizagem em equipe e (5) pensamento sistêmico. O conceito de organizações que aprendem também foi apresentado por Garvin (1993). Este in- vestigador define este termo como organizações que são capacitadas a criar, a adquirir e a transferir 1 Adaptado livremente, para fins acadêmicos, por Márcia Londero. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br novos conhecimentos e, ainda, a modificar os seus comportamentos de modo a refletir sobre os no- vos conhecimentos. Garvin et al. (1998, p. 58) compreendem que “as empresas possuem conheci- mento organizacional, e este é a capacidade de poder executar tarefas em conjunto que as pessoas não conseguem alcançar de forma isolada, visando essas tarefas criar valor às partes interessadas na organização”. Assim, esta definição, apesar de atribuir ao coletivo humano o papel central na cons- trução e aplicação do conhecimento, destaca-o como um potencial. Alguns autores (CROSSAN et al., 1999; POPPER; LIPSHITZ, 2000) compreendem as organizações que aprendem como a aprendizagem individual que ocorre no contexto organizacional, uma vez que é o indivíduo que possui a capacidade de agir nesse contexto. A aprendizagem individual depende da percepção, da inteligência, da experiência e das neces- sidades e motivações de cada um. Depende, ainda, do ambiente de aprendizagem. Caracteriza-se por uma racionalidade e por uma especificidade individuais e resulta em mudanças cognitivas e/ou comportamento individual. Por outro lado, a aprendizagem de grupo caracteriza-se por uma racionalidade e um quadro de referência coletivo. Mas, como referem Probst et al. (1998), a criação e manutenção de construções sociais comuns à realidade da organização, só pode acontecer, se os membros aceitarem modifi- car as suas representações e hipóteses individuais, comunicando-as e discutindo-as com os outros membros. Após uma análise a essa questão, Popper e Lipshitz (2000) sugerem que, independentemente da definição de aprendizagem organizacional utilizada, esta será sempre mediatizada pela apren- dizagem dos membros da organização (nível de grupo), uma vez que uma organização só pode aprender por intermédio dos indivíduos que a compreendem. Estes investigadores consideram os grupos como elos fundamentais entre a aprendizagem individual e a aprendizagem organizacional. No entanto, o seu sucesso ou insucesso dependem do grau de liberdade que lhes é permitido, da atribuição de tarefas de acordo com as capacidades demonstradas, da gestão e circulação do co- nhecimento disponível e do incentivo e apoio prestados pela organização. Snyder e Cummings (1998, p. 875) realizaram uma síntese da relação entre a aprendizagem individual e a aprendizagem organizacional: os indivíduos aprendem em organizações, mas esta aprendizagem pode ou não contribuir para a aprendizagem organizacional. A aprendizagem é organizacional na medida em que: (1) é realizada para alcançar propósitos organizacionais; (2) é compartilhada ou distribuída entre os membros da organização (grupos); e (3) os resultados da aprendizagem são incorporados em sistemas, estrutura e cultura organizacionais. Pode-se, então, sublinhar que a aprendizagem organizacional é um fenômeno coletivo, dado que a organização só pode aprender através dos seus membros. 128 | Aprendizagem organizacional Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 129|Aprendizagem organizacional Atividades 1. Qual a importância do estudo das formas de socialização dentro das organizações para a teoria da aprendizagem organizacional? 2. Segundo Sainsaulieu, quais os fatores que facilitam a aprendizagem nas empresas? 3. Quais os tipos de atores sociais que resultam dessas aprendizagensculturais no ambiente de tra- balho? Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Gabarito 1. Os estudos das diferentes formas de socialização dentro da empresa demonstram a construção de relações sociais profundas e duráveis nas quais se dá o aprendizado organizacional. A empre- sa é um lugar central de socialização, da definição de identidades e de representações do mundo. Ela organiza as relações entre os indivíduos de forma intensa, com exigências cognitivas e afetivas e, portanto, é também identificada como uma fonte de aprendizagem. 2. As relações cotidianas de trabalho, que podem produzir crescimento ou regressões com rela-:::: ção às culturas já existentes na empresa. O enfrentamento de circunstâncias que impliquem um movimento do empregado no contex-:::: to da empresa. As transformações de tecnologia ou de pessoal impostas pela administração ou por necessi-:::: dades de adaptação a momentos de crise. 3. O ator de massa – corresponde às identidades de caráter fusional. É um tipo de ação sustentada :::: pelas ações de reivindicação coletiva sob direção sindical. Expressão que resta aos que não podem controlar, nem saber fazer, nem têm liberdade de manobra, nem oportunidades de iniciativa. O ator estrategista – refere-se ao universo dos poderes profissionais operários ou dos grupos :::: reconhecidos em suas organizações que participam da cultura e da negociação. O ator de si – é aquele cujas energias pessoais estão centradas na conquista de uma integração :::: social e de um reconhecimento pessoal. Aparece em uma cultura muito diferente, a das afini- dades, onde há mobilidade e promoção técnica e hierárquica. O ator externo – ocupa uma posição muito importante na vida das organizações, pois traduz a :::: realidade humana fundamental das pertenças múltiplas em várias cenas sociais. Característico das mulheres, dos imigrados, dos jovens e dos operários rurais. 130 | Aprendizagem organizacional Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Inovação tecnológica e organizacional As transformações impulsionadas pela implementação de novas tecnologias na empresa Um dos fatores mais importantes que impulsionam o desenvolvimento das empresas desde o fi- nal dos anos 1980, e permanece até hoje, é o surgimento de uma nova gama de inovações tecnológicas que transformam profundamente o funcionamento das empresas e sua cultura. Um período de apro- fundamento de mudanças tecnológicas, perpetrado principalmente pelo aparecimento de tecnologias informacionais e telemáticas, da produção assessorada por computadores e robótica, enfim das chama- das “novas tecnologias”, que modificam profundamente as profissões e as relações sociais nas empre- sas. A assimilação acelerada destas tecnologias é mais do que nunca decisiva para o sucesso das em- presas, pois em um curto espaço de tempo muitos destes avanços tecnológicos tornaram-se funda- mentais em nossas vidas. O desenvolvimento da pesquisa nas áreas da informática, da eletrônica e da telecomunicação e a aceleração da concorrência econômica internacional obrigam assim as empresas a mudar as suas táticas de produção. Trata-se de um novo período de articulação entre tecnologia, orga- nização e dinâmica social da produção. Podemos considerar esta fase como uma nova revolução industrial, agora na área da eletrônica e da informática, que é acompanhada pelo nascimento de uma nova categoria de trabalhadores: agentes técnicos encarregados particularmente da reconversão da eletromecânica, ou da gestão informatizada da informação. Todas estas transformações que atingem as empresas refletem também no capital hu- mano das organizações, que é posto à prova com estas mudanças econômicas globais complexas. Para Charles Perrow (1972) é importante definir a diferença entre técnica e tecnologia ressaltando a impor- tância do fator humano na aplicação das mesmas nas empresas. O autor então ressalta que: Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br As organizações destinam-se à realização de algum tipo de trabalho para o que necessitam de técnicas e tecnologia. Essas técnicas aplicam-se a uma certa espécie de “matéria-prima”, que a organização transforma em produto negociá- vel. E o produto tanto pode ser delinquentes reabilitados, como programas de TV; símbolos de propaganda ou decisões governamentais, ou até o aço. Porém, a tecnologia é necessária não só para o processo de produção em si, mas também para a aquisição de material, capital e mão de obra, para a distribuição da produção entre outras organizações ou con- sumidores, e para a coordenação das três “funções” ou “etapas” de compra-transformação-venda. E como é que se estabelece o conceito de tecnologia, de modo a poder analisá-la desta forma, isto é, como um meio de transformar matéria-prima (humana, simbólica ou material) em mercadorias ou serviços vendáveis? Neste enfoque da tecnologia, as máquinas e equipamentos são apenas instrumentos e não a tecnologia em si. Na verdade, o elemento do setor de pessoal usa uma tecnologia que pouco tem a ver com ferramentas ou instrumentos. Tampouco podemos utilizar as técnicas como aparecem nos manuais de produção, pois são muito específicas para a organização em pauta. Ao invés disso consideramos o indivíduo designado para executar determinado trabalho. Este indivíduo recebe estímulos (ordens, sinais) aos quais deve reagir. Mesmo a posição de ignorar os estímulos, ou mesmo de não “vê-los” é uma reação, é uma resposta. (PERROW, 1972, p. 101-102) A influência da tecnologia para uma boa organização Inúmeras pesquisas realizadas nos Estados Unidos e na Inglaterra (WOODWARD; PERROW apud SAINSAULIEU, 2006), preocuparam-se em demonstrar que as empresas eram também passíveis de ser delimitadas como objeto da Sociologia e que um fator determinante sobre a estrutura das empresas vem da tecnologia e de suas variações. Partindo de questões bem pragmáticas, como por exemplo: há uma associação entre a aplicação de regras gerais de estruturas das empresas – distribuição hierárquica de poder, especialização das funções, formalismo na gestão de pessoal e controle das informações – e o sucesso econômico? Joan Woodward, em suas pesquisas, não conseguiu observar uma relação positiva direta entre estas duas variáveis. Ou seja, a mera aplicação de um conjunto de regras gerais de organi- zação na empresa não garante o sucesso da mesma. Porém, depois de agrupados os dados por tipos de empresas, de acordo com a modalidade de produção, surgiram outras ligações interessantes que fizeram aparecer alguns elos entre organização e tecnologia. Os sistemas de produção formam três tipos: produção unitária ou pequenas séries::::: unidades simples segundo exigências do cliente;:::: protótipos;:::: equipamentos;:::: pequenas séries em função das demandas do cliente.:::: produção em grande série e produção em massa::::: grande série;:::: grande série em cadeia;:::: massa.:::: produção em contínuo::::: contínuo: produtos químicos;:::: contínuo: produtos líquidos, gás. (SAINSAULIEU, 2006, p. 350):::: 132 | Inovação tecnológica e organizacional Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 133|Inovação tecnológica e organizacional O primeiro grupo de produção unitária corresponde aos itens feitos sob encomenda. O segun- do é o da produção em grande escala, como no caso das confecções, equipamentos industriais e auto- móveis produzidos em grande série. E o último é o de produção processual (há uma continuidade na produção), como por exemplo, a produção de petróleo, produtos químicos e farmacêuticos. Depois de examinar os tipos de conflitos e problemas destes três grupos, Woodward concluiu que, na medida em que cresce a complexidade na fabricação, cresce também a necessidade de prever e aperfeiçoar os con- troles da produção.Para Charles Perrow, ao abordar a relação entre tecnologia e organização devem-se levar em con- ta os seguintes aspectos: o grau de variabilidade na rotina das empresas que dependem do tipo de trabalho que execu-:::: tam levando-se em conta as exceções; se é possível analisar o comportamento das organizações através de pesquisa científica, para :::: tratar as exceções de maneira lógica e sistemática, ou vaga, intuitiva. Perrow, considerando a organização como um todo, põe em destaque as exceções e todo o esfor- ço que o domínio de tais variações acarreta ao nível de toda a estrutura da organização. Para ele, as em- presas se distinguem em sua própria estrutura de acordo com o tipo de trabalho que executam. Percebe-se assim que a tecnologia pode intervir muitas vezes como um problema central da em- presa, mas não há uma única forma dessa intervenção acontecer. Os problemas acarretados pela inter- venção de novas tecnologias na empresa podem variar dependendo do tipo de produção, do tamanho, dos clientes e do tipo de tecnologia empregada estando estas causas, por vezes, relacionadas umas com as outras. Portanto, a noção de tecnologia deve ser pensada de maneira mais aprofundada e a medida dos parâmetros (tecnologia, tamanho, estrutura) só tem sentido ao ser analisada em movimento, quando estes parâmetros se relacionam. Com estes resultados, a pesquisa sobre as transformações acarretadas pela introdução de tecno- logias nas empresas foi lentamente deslocada de estudos deterministas para uma compreensão mais aprofundada, onde a variável tecnológica é percebida em sua inserção complexa de influências sobre as relações sociais de trabalho. Os trabalhos de pesquisa em Sociologia se preocupam então em demons- trar a interação profunda entre sistema técnico e sistema social. As relações entre tecnologia e estrutura A análise das organizações, que estão em constante busca de maior eficiência e equilíbrio, permi- te perceber que, intencionalmente ou não, as mesmas tentam aumentar o entrosamento entre sua tec- nologia e sua estrutura. Pesquisas sociológicas da década de 1960 questionaram a ideologia tecnocrática da época quan- do, ao relacionar o tamanho de empresas e a tecnologia com diferentes dimensões características de sua estrutura como as atividades, a concentração da autoridade, a especialização, a formalização, a cen- tralização etc., bem como medidas relativas ao pessoal, concluíram que: Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br quanto mais a tecnologia está integrada, mais as atividades são formalizadas, a especialização :::: elevada e os procedimentos padronizados, o que confirma uma ligação entre tecnologia e es- trutura; o efeito do tamanho da organização tem papel mais importante sobre os indicadores de es-:::: trutura de organização. Ou seja, a relação tecnologia/estrutura, em tamanho constante, é mui- to menos evidente. Resumindo, os resultados destes estudos contribuíram no sentido de pensar a noção de tecnolo- gia a partir de suas relações com outros parâmetros – tecnologia, tamanho da organização e estrutura, pois estes só têm sentido no contexto de suas relações. Com base nestas análises, Sainsaulieu pergunta-se então se haveria uma correlação direta entre as transformações tecnológicas na empresa e melhorias na organização e na produtividade de seus membros. O diagnóstico sociológico resultante de uma corrente de pesquisa muito importante nos anos 1960 sobre o que então se chamava de mudança técnica, questionou de novo a ideologia tecnocrática da época. De fato, nunca foi possível ti- rar a prova de uma equação como esta: Economia + Tecnologia = organização melhor Em compensação, as mudanças tecnológicas produzem simultaneamente efeitos organizacionais e comportamentais. (SAINSAULIEU, 2006, p. 353) Todo o conjunto da empresa reage às novas tecnologias pondo-as em ação, rejeitando-as ou adaptando-as em função das circunstâncias particulares de cada contexto sociotécnico. Constata-se uma movimentação quase certa de toda a regulação social e cultural da empresa. Estudos psicossociais dos comportamentos de trabalhadores que passam por estas transformações mostram que os representantes do trabalho, dos colegas, dos ofícios, dos chefes etc., podem crescer se- gundo processo de aprendizagem cultural do trabalho, mas não conduzem necessariamente a transfor- mações na estrutura e no sistema hierárquico das relações sociais dentro da empresa. Os membros das organizações podem sentir-se ameaçados e por isso oferecer resistência em suas zonas de atuação. Observa-se, no entanto, que em relação ao impacto de chegada da informática nas empresas foi diferente. Neste caso, evidenciou-se o caráter sociopolítico das mudanças organizacionais ligadas a ela. Por um lado, havia a possibilidade de deslocamento do centro de poder da empresa que poderia em- poderar os técnicos e profissionais especialistas nas áreas de informática, quando esta ainda era uma “caixa preta” para a maioria dos trabalhadores e inclusive para gestores, ou, ao contrário, favorecer uma descentralização do poder, isso porque todas as decisões dos dirigentes da empresa deveriam passar pelo processo de informatização. Estas constatações de mudanças ligadas à implementação de novas tecnologias foram retoma- das a partir dos anos 1980 com a chegada das chamadas “novas tecnologias” (informacionais, de rede e telemáticas). Uma verdadeira revolução na forma de lidar com informações e na comunicação dentro da em- presa revela um impressionante desenvolvimento de técnicas de tratamento e de transmissão destas informações que influenciam grandemente a estrutura produtiva das empresas. As transformações são inúmeras e de alcance considerável: o tratamento de texto por memória, a realização de cálculos, a pro- gramação, o telecopiador (fax), a audioconferência, a videoconferência (estas últimas permitindo ligar atividades descentralizadas em sedes distantes da mesma empresa), entre outras. 134 | Inovação tecnológica e organizacional Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 135|Inovação tecnológica e organizacional Segundo Norbert Alter (1985 apud SAINSAULIEU, 2006, p. 355), a prática de aplicação destas téc- nicas introduz modificações profundas na forma como vinha sendo feito o trabalho administrativo, até então. Essas modificações se dão principalmente em três níveis: ao nível técnico:::: – modificado pela incrível capacidade de tratamento e transmissão de infor- mação, de interconexão de matérias e articulação entre textos, dados, imagens e voz; ao nível econômico:::: – com a queda do custo médio dos componentes tornando-os aces- síveis ao consumidor comum, aparelhos antes reservados apenas às administrações dos Estados nacionais ou a grandes empresas. Como consequência ocorre o aumento do valor do trabalho intelectual e da capacidade das organizações de utilização dessas técnicas em relação ao custo de sua produção. Hoje é mais difícil saber utilizar a tecnologia do que con- seguir comprá-la; ao nível social:::: – os trabalhos na área de informática atingem mais da metade da população ativa em um país desenvolvido. Portanto, estas mudanças de tecnologia em curso no trabalho de escritório atingem todas as di- mensões de uma empresa: a organização, o emprego, a qualificação, as condições de trabalho e a admi- nistração com consequências também na elevação das qualificações profissionais, no crescimento da interdependência das funções, na polivalência do trabalhador que percorre diversos postos dentro da empresa e na estrutura hierárquica menos verticalizada; enfim, ao ser mais autônomo em seu trabalho, também se é mais dependente dos outros e da máquina como um todo. A previsão das mudanças nas organizações A possibilidade de prever as mudanças ocasionadas pela implementação de novas tecnologias facilita a elaboração de um diagnóstico de prevenção organizacionalcom relação à organização social do trabalho. Muitas antecipações de mudanças podem ser previstas por efeitos nas estruturas, forçando a vá- rias mudanças sócio-organizacionais, a saber: a clássica separação entre a concepção do trabalho e a realização do mesmo perde impor-:::: tância. A programação, agora, se aproxima da execução, o trabalho cotidiano incorpora mais dados informativos e, portanto, mais processos cognitivos e mentais. As tarefas repetitivas e simplificadas são realizadas pelas máquinas ou diminuídas no tempo de trabalho em empresa; atinge a esfera decisória e executiva da empresa. Caracterizado pela concentração das deci-:::: sões no esquema hierárquico da empresa a introdução da telemática e da informática nas ro- tinas das empresas pode trazer, segundo Sainsaulieu, três tipos de resultados: a) diminui as oportunidades de decidir e de executar um poder suprimindo tarefas de controle, de escolha de informações, de intervenções na transmissão das informações, permitindo planejar mais o trabalho antecipadamente; b) mas aumenta a capacidade de autocontrole de seu próprio tra- balho pelo acesso rápido às informações desejadas. c) e também aumenta a autoavaliação e a possibilidade de corrigir-se nas tarefas de execução; Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br atinge também a hierarquia da empresa. A quantidade de formas de transmissão de informa-:::: ção escrita e oral aumenta a transversalidade das relações de trabalho sobre distâncias às ve- zes consideráveis. A estrutura hierárquica piramidal, mais presente nas empresas, é substituída por uma teia de relações reguladas por uma espécie de “matriz informacional” que exige mais trabalho em equipe e troca entre produtores e funcionários; está relacionada com a formação escolar :::: versus formação contínua. Todas estas mudanças exi- gem aprendizagens muito numerosas e frequentes que envolvem grandes esforços teóricos e práticos para se chegar novamente ao andamento produtivo da empresa. É necessário ter capa- cidade de evoluir, de aprender e de novamente questionar suas técnicas, além de reorganizar sis- tematicamente seus esquemas culturais e suas concepções do trabalho, seu papel e o dos outros e as relações de poder, neles embutidos. Portanto, a formação continuada deve estar agregada ao trabalho. Uma formação constante e integrada ao ato de produção, exigência de um trabalho mais abstrato e mais racional, e a capacidade de aprendizagem ou de orientação permanente estão assim no cerne da definição das novas tarefas provenientes dessas novas tecnologias. Porém, Sainsaulieu ressalta que, apesar de todas estas mudanças advindas da introdução das no- vas tecnologias, estas não constituem uma nova forma de empresa. E aconselha que uma organização do futuro deva ser inventada, partindo-se de uma formação que qualifique e propicie a participação em equipes de trabalho. O que, no entanto, se percebe é que a automatização abre muitas possibilidades, mas estas não são fixas e englobam posições extremas. Isso porque, hoje, vemos organizações que controlam ain- da mais seus trabalhadores com tarefas mais coercitivas e, ao contrário, trabalhos realizados por robôs inteiramente integrados ao processo produtivo. Existem também operários mais autônomos que de- finem sua própria produção, os seus próprios programas e que vão eles mesmos formar-se com os cons- trutores de novas possibilidades. Assim Sainsaulieu conclui que: [...] com as novas tecnologias, a organização do trabalho é, assim, bruscamente situada na encruzilhada dos caminhos entre a volta a estruturas bem conhecidas, após um movimento de adaptação e a invenção real de um novo tipo de organização. Mas nada está decidido. Evoluções podem fixar as coisas muito rapidamente e por longo tempo, dada a amplidão das instalações e do material empenhado. A diferença é, então, questão de homens e sua compreensão das mudanças em curso e de suas capacidades de intervir sobre o seu próprio sistema social. (SAINSAULIEU, 2006, p. 358) Novas tecnologias, novos horizontes O movimento de assimilação de novas tecnologias nas organizações que sacode as certezas e as rotinas das empresas não nos trouxe ainda uma nova empresa, pronta e estruturada, por enquanto limi- ta-se a mexer em suas estruturas, suas hierarquias e suas rotinas fazendo reagir os atores sociais envol- vidos. Sainsaulieu aponta para um possível surgimento de novos atores sociais que talvez tornem estas transformações mais duráveis em termos de relações sociais nas organizações. Desenvolvem-se tam- bém nesta conjuntura, uma cultura de inovação, ou seja, um interesse pelo novo e a percepção positiva da amplitude desses fenômenos de mudança, que contribui para uma concepção experimental, mais arriscada, da organização das empresas. Mas há outras possibilidades, as transformações das novas tecnologias podem marcar também o surgimento de uma nova classe industrial empreendedora no contexto do futuro do trabalho. 136 | Inovação tecnológica e organizacional Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 137|Inovação tecnológica e organizacional Sainsaulieu nos fala dessa possibilidade com exemplos de como ocorreu em países da Europa Central. O autor aponta as soluções adotadas na Alemanha, onde os operários qualificados receberam uma formação específica para programadores dentro da empresa, passando a trabalhar nesta área e atuar também nos consertos, na manutenção e até na escolha de novas máquinas adquiridas, segundo a frequência imposta pelo surgimento constante de atualizações no mercado. Já na França a contratação de novos trabalhadores especialistas nas novas tecnologias foi a so- lução adotada para acompanhar as moderinzações do setor. Assim, a reação do operário frente ao sur- gimento de novas tarefas ligadas a aquisições de novas tecnologias gera bastante instabilidade nos grupos de trabalhadores. Isso porque ela produz clivagens de poder em setores técnicos dividindo-os naqueles que dominam e os que não dominam o uso da tecnologia. Na Grã-Bretanha, ao contrário, os novos técnicos, agora também programadores, permanecem na situação de operário. Conhecedor mais aprofundado da realidade francesa, Sainsaulieu alerta que em seu país esta ques- tão permanece em aberto. As novas tecnologias implementadas nas rotinas das empresas tanto podem incentivar a profissionalização e a formação de seus trabalhadores como podem desestimular a outros. No entanto, há um dado novo nesta realidade mutante, as novas tecnologias também possibilitam o surgimento de um novo tipo de trabalhador, novos “atores organizacionais ou profissionais”. Mas isso não ocorre de maneira direta, não se pode esperar que os programas de modernização e aperfeiçoamento imple- mentados pelas empresas formem de maneira determinista estes novos atores de que nos fala Sainsaulieu. O autor não visualiza o surgimento coletivo de novos atores, formando uma nova classe dentro da estrutura da empresa, mas sim a atuação de indivíduos especializados, responsáveis por utilizar e es- palhar as inovações em um ambiente ainda de poucos e, portanto, fragmentado por diferenças de sa- beres associado a poderes. Para Sainsaulieu (2006, p. 361): [...] um jogo a três corre o risco de aparecer um pouco por toda a parte entre gestionários do existente que buscam preservar suas posições resistindo à inovação e uma dupla qualidade de atores da inovação: aqueles que já no traba- lho, querem apropriar-se do posto, confiscá-lo, e os que aproveitando oportunidades assim abertas, querem conquis- tar uma posição social nova. Assim, as novas tecnologias ameaçam de fato as estruturas sociais da empresa, pois correm o ris- co de criar de novo uma elite de técnicos como foi o caso das primeiras gerações de computadores. Hoje temos visto os profissionais mais qualificados com mais segurança e flexibilidade, com uma cultu- ra geral maiore especializada, o que gera um poder diferencial. Por outro lado, há os sem qualificação, com menos possibilidades no mercado de trabalho, sem segurança, presa fácil do desemprego e por isso passivos e desprovidos de qualquer poder de barganha. Percebemos que se a prática de uma ex- periência de empresa mais democrática e participativa é ainda pouco provável, isso se deve ao fato da existência de pressões econômicas muito grandes provindas dessa mesma conjuntura. Novas perspectivas para a inovação nas organizações O resultado mais significativo deste período de surgimento e implementação das novas tecnolo- gias, que a partir da década de 1980 revolucionaram a rotina das empresas, foi o de ter aberto espaço para inovações. Abordadas de uma perspectiva menos cristalizada em modelos convencionais e con- sagrados de organização do trabalho, as empresas agora se aventuram em zonas ainda pouco conhe- Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br cidas, impulsionadas pela necessidade de absorver as novidades tecnológicas que permanecem em ascendência. Como nos diz Sainsaulieu, “uma cultura da inovação pode ser vista como a consequência e chance deste período” (SAINSAULIEU, 2006, p. 361). A inovação passa a fazer parte da cultura da empresa e implementá-la é objetivo dela. Para tanto a cultura da inovação deve aparecer nas três esferas fundamentais de uma organização: na esfera técni- ca, na humana e na administrativa. A técnica é importante em função da movimentação que se faz necessária para recebê-la, das mudanças organizacionais que provoca quando é instituída dentro da empresa. São movimentos de adaptação e transformação de antigos modos de produzir que devem ser revistos para que funcionem as novas tecnologias. A possibilidade do surgimento de atores sociais mais abertos e participativos é uma grande no- vidade dessa cultura de inovação. Esta mudança passa pela transformação do “trabalhador-ferramenta” para o “trabalhador-ator” e passa por novas concepções nas relações sociais de trabalho onde a criativi- dade, a formação continuada e a relativização da relação piramidal da estrutura de poder são compo- nentes essenciais. Na esfera administrativa, Sainsaulieu (2006, p. 362) acredita que todas estas transformações pelas quais passam as empresas, acarretem ou possam acarretar um processo de “desburocratização” que pa- rece possível através da contribuição das novas tecnologias. O desenvolvimento social não pode ser pensado sem uma concepção organizacional da inovação. [...] O interesse das novas tecnologias é que a ampliação de investimentos feitos em um contexto de crise da concorrência econômica mundial obriga as empresas a sair do isolamento, inventando outras estruturas e outras relações de trabalho. Portanto, o desenvolvimento social das empresas, de que fala o autor, aparece aqui impulsiona- do pelo surgimento das novas tecnologias que ampliam as possibilidades de organizar a estrutura in- terna da empresa de uma forma totalmente nova, inclusive com maior participação de seus membros. Políticas de modernização das organizações devem preocupar-se em aproveitar estas oportunidades e efetivamente crescer levando em consideração todas as esferas que estruturam as empresas. Texto complementar Restrições de natureza cultural, impostas à tecnologia (PERROW, 1972) As normas e valores culturais de uma sociedade impõem restrições ao que de melhor se pode fazer com a “matéria-prima” das organizações. Em geral, tais limitações referem-se ao trato com as pessoas. Quando pela primeira vez, fez-se possível realizar lobotomias, com segurança, sugeriu-se que os prisioneiros de instituições penais fossem submetidos a essa operação. Foram feitas muitas lobotomias em doentes mentais, e provavelmente a prática continua, mas após algumas reclama- 138 | Inovação tecnológica e organizacional Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 139|Inovação tecnológica e organizacional ções os prisioneiros foram poupados e o número de intervenções em doentes mentais decresceu. Há estados em que se tentaram fazer leis determinando a esterilização de mulheres que tivessem filhos ilegítimos [...]. As restrições culturais impostas à tecnologia industrial são menos conhecidas, e nossos exem- plos são bastante diferentes e quiçá únicos, mas dão-nos uma visão incomum do papel dos fatores ambientais em uma nação1 que se orgulha de possuir abertura total para com as inovações tecno- lógicas e de dedicar-se totalmente a atingir sempre mais eficiência. No fim da década de cinquenta, um psicofarmacologista, de uma das maiores indústrias farma- cêuticas do país, teve ocasião de observar mais ou menos 70 mulheres ocupadas na inspeção visual das cápsulas de drogas saídas de máquinas enormes e complexas, com capacidade de produção de 20 milhões de cápsulas diárias. O trabalho era rotineiro e monótono, mas exigia grande acuidade vi- sual e capacidade de distinguir cores. Não era necessária destreza manual, mas seria extremamente difícil automatizar a função, sendo pois despendida ali grande parcela da folha de pagamento. O cientista cuja função na firma relacionava-se com a pesquisa de técnicas para análise dos efeitos das drogas sobre animais, propôs a um colega a adoção de um dispositivo orgânico para exe- cução do serviço, o qual apresentava as seguintes vantagens: durava de 10 a 15 anos, tinha grande capacidade de aprendizado; acuidade visual e visão para cores tão boas quanto as do olho humano; custo inicial baixo (mais ou menos um dólar e cinquenta) e custo de manutenção especial: “comida de galinha”. O dispositivo, naturalmente, era um pombo. E assim chegou-se à conclusão de que a empresa vinha despendendo grandes quantias para examinar as cápsulas à procura de eventuais defeitos que os olhos humanos dificilmente conse- guiam detectar. Infelizmente, porém o dispositivo não funcionou. Após discussões e muitas piadas em torno do assunto, o cientista prosseguiu projetando um local para os pombos executarem seu trabalho de inspeção e treinou alguns deles. Esta primeira etapa deu bons resultados e ficou claro então que o projeto era inteiramente factível. Baseando-se na teoria do “condicionamento atuante”, do psicólogo B. F. Skinner – uma variação importante e um refinamento da teoria de estímulo-res- posta – os pássaros eram treinados e ensinados a provocar o aparecimento da cápsula e apertar um botão, com o bico, caso essa estivesse defeituosa, e um outro, se não houvesse defeito. A cada atua- ção correta, eram recompensados com milho. Trabalhavam rapidamente, sem precisar de intervalos para descanso e pondo-se dois pombos a examinar a mesma cápsula; o resultado era uma exatidão muito maior do que a atingida por seres humanos. Não obstante, o projeto foi abandonado por determinação do presidente do conselho diretor e de seu irmão, ambos antigos estadistas. Durante uma visita que fizeram ao local de treinamento e demonstração do trabalho dos pombos, ambos teriam argumentado que os vendedores das fir- mas concorrentes poderiam perguntar aos médicos: “quem vai confiar em remédio examinado por pombos?”. Ao que o autor, Tom Verhave, teria respondido: “os pombos foram escolhidos inicialmen- te, poderiam ter sido gaviões e, afinal, o que pode haver mais agudo do que o olho do gavião?” Tal comentário provocou um sorriso apagado. Outro problema aventado foi que os concorrentes po- deriam sugerir, veladamente, que os pombos separavam “manualmente” as cápsulas boas das más. Naturalmente houve também a Sociedade Humana a interferir, embora, aparentemente, não fosse difícil demonstrar que os pombos adoravam o trabalho. Em resumo, o conselho diretor votou contra o projeto num total de 11 contra 1. 1 Charles Perrow se refere aqui a seu país de origem, os Estados Unidos. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.brEm outro caso, um engenheiro queixava-se para um cientista, do problema comum na indús- tria: o das máquinas de montagens altamente seguras e de grande produtividade, as quais funcio- nam maravilhosamente contanto que não se coloque nelas, para montagem, uma peça defeituosa. Quando isto acontece, a máquina para e os mecânicos têm de vasculhá-la a fim de retirar a peça. Quando a montagem era manual, uma ou duas marteladas resolveriam o problema da peça defeitu- osa, ou então, essa seria simplesmente posta de lado. Uma vez que são incontáveis os tipos de defei- tos que uma peça pode apresentar, seria difícil e extremamente dispendioso ter locais de inspeção automática para todas as peças, e caso se decidisse manter operários para fazer a inspeção, o núme- ro deles e seu custo anulariam todas as vantagens econômicas da automatização. O cientista sugeriu que não se desperdiçassem operários nem máquinas num problema tão sim- ples como o da inspeção visual; uma vez que simples animais poderiam ser treinados para a tarefa, por que não usá-los? E foi assim que utilizando pombos, ele construiu um dispositivo para examinar peque- nas peças eletrônicas chamadas diódios. Mais uma vez o sistema funcionou perfeitamente. Para exem- plificar, há o fato de que uma das aves, após o treinamento, teve uma percentagem de erro de apenas 1%, na inspeção de defeitos mínimos, a um ritmo de mais de mil peças por hora. Quando se coloca- vam dois pombos juntos, na mesma peça, a percentagem de erro era insignificante. Mas mesmo assim, o projeto foi barrado pela alta administração. Além dos eventuais problemas com os defensores dos pombos, a reação dos sindicatos trabalhistas tinha de ser levada em conta. Provavelmente, o fator que mais influiu na decisão foi a atitude cultural com referência ao trabalho de animais e a incongruência da utilização desse tipo de trabalho, ou melhor, de mão de obra, num setor tecnológico tão avançado. A “Zenith”, quando quer associar a seus televisores um sentido de alta qualidade, refere-se aos mesmos como feitos à mão, para distingui-los dos sistemas de utilização de circuitos impressos e dispositivos automáticos. Seria contraproducente, talvez, sob o aspecto de confiança no produto, dizer que o mes- mo foi “inspecionado por pombos”. Apesar disso, não nos opomos à utilização de bois e cavalos para tração de carros e pessoas. Evidentemente, as maneiras antigas de utilizar o trabalho animal não são tão incongruentes como as que as firmas da indústria química e eletrônica pretendem adotar. Atividades 1. Por que podemos dizer que a assimilação acelerada das novas tecnologias é decisiva para o su- cesso das empresas? 140 | Inovação tecnológica e organizacional Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 141|Inovação tecnológica e organizacional 2. Segundo Charles Perrow, qual a diferença entre técnica e tecnologia? 3. Quais as contribuições das novas tecnologias para o desenvolvimento social das empresas? Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Gabarito 1. O desenvolvimento da pesquisa nas áreas da informática, da eletrônica e da telecomunicação e a aceleração da concorrência econômica internacional obrigam as empresas a mudar as suas tá- ticas de produção. Trata-se de um novo período de articulação entre tecnologia, organização e dinâmica social da produção, pois em um curto espaço de tempo muitos desses avanços tecno- lógicos tornaram-se fundamentais em nossas vidas. 2. As técnicas “aplicam-se a uma certa espécie de ‘matéria-prima’, que a organização transforma em produto negociável.” Já a tecnologia é considerada por ele “como um meio de transformar ma- téria-prima (humana, simbólica ou material) em mercadorias ou serviços vendáveis. Neste enfo- que da tecnologia, as máquinas e equipamentos são apenas instrumentos e não a tecnologia.” (PERROW, 1972, p. 101) 3. O resultado mais significativo desse período de surgimento e implementação das novas tecno- logias foi o de ter aberto espaço para inovações. Abordadas de uma perspectiva menos cristali- zada em modelos convencionais e consagrados de organização do trabalho, as empresas agora se aventuram em zonas ainda pouco conhecidas impulsionadas pela necessidade de absorver as novidades tecnológicas que permanecem em ascendência. Através das novas tecnologias a ino- vação passa a fazer parte da cultura da empresa e implementá-la é seu objetivo. 142 | Inovação tecnológica e organizacional Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br A globalização e as organizações Atualmente, acontecimentos políticos e econômicos de alcance mundial alimentam a noção de que estamos aproximando o planeta e transformando-o em uma “grande aldeia global”. A informática e a telemática têm possibilitado a relativização dos conceitos de tempo e espaço como conhecíamos até então. O fato de que informações e contatos com as pessoas podem ser feitos através das tecnologias da informação e da comunicação vem revolucionando o nosso modo de vida como um todo e as orga- nizações em particular. Os processos globalizantes que são gerados por essas tecnologias são também a força motriz que está por trás delas. Isso significa dizer que as organizações não são simplesmente afetadas por esta con- juntura, mas suas atividades combinadas estimulam, facilitam, sustentam e expandem a globalização transformando a estrutura de muitas delas e, mais imediatamente, daquelas que devem competir no mercado mundial. A dissolução de fronteiras tornou confusas distinções que antes pareciam mais claras: entender o que é real e o que é virtual não é tão fácil. As organizações de hoje, por exemplo, parecem não estar em nenhum lugar, isso porque a comunicação entre as pessoas acontece de forma virtual, atravessando o mundo de forma imediata e também pela importância da informação, em substituição aos bens físi- cos, que molda a nossa existência social. Os locais e os bens físicos podem não ocupar o mesmo espa- ço, mas as informações em forma de sinais eletrônicos podem. Como nos exemplifica Anthony Giddens (2005, p. 298): [...] a Bolsa de Valores não é mais, assim como os mercados o foram um dia, um local físico para compra de títulos e ações. Pode-se dizer que ela fica em todos os lugares e em nenhum lugar. A Bolsa de Valores consiste em um gran- de número de negociantes, muitos dos quais trabalham diante de uma tela de computador, em escritórios e ambien- tes diversos, estabelecendo contato contínuo por todo o mundo com seus semelhantes em Nova York, Paris, Tóquio e Frankfurt. Assim, a busca por rapidez e eficiência no mercado mundial traz consigo novas ideias a respeito da criação de riqueza, os clientes que utilizam os serviços da empresa geralmente não estão preocupados com a localização física da mesma, desde que ela lhe sirva. Em qualquer ponto do globo culturas e ideo- logias se cruzam para satisfazer as necessidades desse mercado mundial e esses parâmetros ampliados com que lidamos hoje tornam muito mais difícil qualquer possibilidade de controle antes existente. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br No entanto, a capacidade de envolver-se em atividades globais não é apenas das grandes corpo- rações. Diferentes tipos de organizações estão se tornando globais. Os Estados têm conseguido cada vez menos conter ou controlar os fluxos de informações, recursos e dinheiro que atravessam as suas fronteiras. Isso porque o conhecimento e as finanças podem ser transferidos pelo mundo afora, na for- ma de sinais eletrônicos que se movem à velocidade da luz através das modernas tecnologias de co- municação e informação. Para exemplificar essa dificuldade das nações e seus governos Parker nos dá o exemplo da tentativa dos governos em controlar a entrada de dólares em seus países através da atua- ção de seus BancosCentrais, com a fala de um importante membro do governo do Canadá: [...] como disse um alto funcionário canadense, participando de uma reunião do G-7 em 1994: “com um trilhão de dó- lares fluindo pelos mercados financeiros diariamente, há pouco que os governos possam fazer com exceção de pa- rar o movimento por um dia, por uma hora – ou talvez por apenas dez minutos” (GUMBEL; DAVIS, 1994). (PARKER In: Handbook de Estudos Organizacionais, 1998a, p. 411-412) Isso sinaliza para um enfraquecimento da atuação dos Estados nacionais em um mundo com fronteiras muito mais permeáveis do que aquelas que conhecemos e que dividia Estados-nações que envolviam espaços geográficos e culturais delimitados e independentes. Mais do que nunca a quantidade de inovações tecnológicas como a informática, a telemática, a eletrônica digital, a miniaturização, a robótica, a inteligência artificial, satélites e condutores a laser são exemplos das mais avançadas tecnologias que revolucionam nosso cotidiano. O sucesso das empresas hoje depende da assimilação acelerada dessas tecnologias. Novas descobertas médicas, de produtos e de processos produtivos, alteram constantemente a natureza do trabalho trazendo pessoas para o mercado e excluindo outras. Na revolução da informa- ção, o conhecimento é um recurso organizacional muito importante quando compartilhado, criando um potencial para uma maior equidade ou, ao inverso, aumentando a desigualdade. As organizações se encontram assim diante de novos desafios e oportunidades para as quais pro- cedimentos utilizados anteriormente parecem ultrapassados ou irrelevantes. Hoje é mais difícil saber quais ferramentas e técnicas devem ser utilizadas para gerenciar a empresa global, isso porque a globa- lização possibilita que organizações de qualquer porte, tipo ou localização geográfica participem deste processo. Possibilidades múltiplas de escolha e processos organizacionais mais complexos, híbridos e que envolvem um novo conjunto de tarefas fundamentais, como a comunicação com parceiros de ne- gócios, os pedidos aos fornecedores e os produtos de marketing estão sendo transformados pelo po- tencial das novas tecnologias. As novas formas de organização Vários autores apontam para o fim das organizações burocráticas, no entanto, existem evidências de que seus princípios estão ainda em evidência, porém parecem coexistir com novas formas de orga- nização mais complexas. Hoje, com toda esta estrutura da telemática à disposição das empresas, estas não funcionam mais como unidades fechadas, como delineou Max Weber em sua época, e é cada vez maior o número de organizações a descobrirem que suas operações funcionam melhor quando estão ligadas a uma rede de relações complexas com outras organizações e empresas. Não existe mais uma linha divisória clara 144 | A globalização e as organizações Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 145|A globalização e as organizações entre empresas nacionais ou empresas internacionais de capital externo. Até mesmo um considerável número de pequenas e médias empresas está deixando de ser apenas nacional e globalizando-se. Como ressalta Parker (1998, p. 408): [...] empresas de pequeno e médio porte também aumentam sua importância ao investir fora de seus países. Exemplos dos países desenvolvidos mostram que, em 1992, o IDE (Investimento Direto Externo) das empresas de pequeno e mé- dio porte contribuiu com $43 bilhões ou cerca de 7,5% do total de investimentos diretos das nações desenvolvidas europeias, $40 bilhões (15%) do total dos investimentos diretos exteriores do Japão, e $15 bilhões em IDE (3%) do to- tal dos IDE realizados pelos Estados Unidos. Olhando por outro prisma, cerca de 28% das PMEs [Empresas de Pequeno e Médio Porte] americanas têm algum investimento direto externo, porém cerca de 60% das empresas japonesas do mesmo tamanho participam de alguma forma de investimentos no exterior, mesmo sem ser majoritárias (BLEAKLEY, 1993). Empresas familiares das Américas do Sul e Central, de Portugal, Espanha, Ásia e Índia também estão procuran- do o crescimento global. Essas empresas, com suas gestões típicas e muitas vezes familiares, contribuem para diversificar e enriquecer as formas gerenciais na esfera global. As organizações em rede Com a globalização, a tecnologia da informação e as novas tendências nos padrões ocupacionais, os limites das empresas são hoje mais abertos e variáveis do que o foram no passado. Em A Era da Informação (1999), Manuel Castells afirma que: [...] a experiência histórica recente já oferece algumas das respostas sobre as novas formas organizacionais da econo- mia informacional. Sob diferentes sistemas organizacionais e por intermédio de expressões culturais diversas todas elas baseiam-se em redes. As redes são e serão os componentes fundamentais das organizações. E são capazes de formar- -se e expandir-se por todas as avenidas e becos da economia global porque contam com o poder da informação propi- ciado pelo novo paradigma tecnológico. (CASTELLS, 1999, p. 188) Este autor define empresa em rede como: “aquela forma específica de empresa cujo sistema de meios é constituído pela intersecção de segmentos de sistemas autônomos de objetivos” (CASTELLS, 1999, p. 191). E explica: [...] porque a empresa em rede é a forma organizacional da economia informacional/global? [...] Essa atuação parece es- tar de acordo com as características da economia informacional: organizações bem-sucedidas são aquelas capazes de gerar conhecimentos e processar informações com eficiência; adaptar-se à geometria variável da economia global; por ser flexível o suficiente para transformar seus meios tão rapidamente quanto mudam os objetivos sob o impacto da rá- pida transformação cultural, tecnológica e institucional; e inovar, já que a inovação torna-se a principal arma competi- tiva. [...] Neste sentido a empresa em rede concretiza a cultura da economia informacional/global: transforma sinais em commodities, processando conhecimentos. (CASTELLS, 1999, p. 191-192) Castells ressalta, portanto, que se torna praticamente impossível para as organizações, sejam elas grandes corporações ou pequenas empresas, sobreviver sem fazer parte de uma rede. O que possibi- lita o estabelecimento de uma rede de contatos é o crescimento da tecnologia da informação: organi- zações espalhadas pelo mundo conseguem entrar em contato de forma imediata e realizar atividades conjuntas através de um meio eletrônico. O autor exemplifica várias empresas que trabalham através de redes organizacionais de contato, de origens e fortemente influenciadas por contextos culturais di- versos (Estados Unidos, Itália, Japão, Coreia, China etc.), que para ele representam aquilo que conside- ra fundamental nesse processo, ou seja, a desintegração da burocracia tradicional. Utiliza o modelo da Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br malharia italiana Benneton, que virou um exemplo nesta área justamente por estar estruturada em um princípio de rede. Esta organização surgiu de uma empresa familiar no norte da Itália e opera com fran- quias comerciais servidas pela central na Itália, que subcontrata fabricantes para executarem pedidos de produtos de suas mais de cinco mil lojas em todo o globo. Os diversos componentes da rede são as- sim conectados por computadores. Outro exemplo de organizações em rede pode ser percebido nas grandes e poderosas alianças estra- tégicas formadas pelas empresas de ponta. As grandes corporações estão cada vez mais se tornando redes de empreendimentos através da união de suas centrais com empresas menores. A gigante Times-Warner dos Estados Unidos, em processo de fusão com a AOL-Internet é um bom exemplo deste processo. Assim a “descentralização” é um processo que contribui para que as organizações funcionem em redes. O nível mais acelerado do ritmo das mudanças hoje torna as burocraciasextremamente centrali- zadas lentas ou quase inertes dificultando a adaptação mais veloz necessária às empresas globais. A organização pós-moderna Alguns sociólogos sustentam que as mudanças que ocorreram dentro das burocracias estão dan- do origem a um tipo de organização que chamam de “organização pós-moderna”. Os que defendem a ideia da pós-modernidade alegam que a noção de progresso entrou em colapso e proclamam que vi- vemos em uma sociedade pós-moderna permeada pela diversidade de valores e culturas. Esta visão dentro da Sociologia das organizações está centrada na forte influência dos contextos culturais sobre as formas organizacionais. Valores e estilos de vida pertencentes a culturas específicas afetam o modo de funcionamento das organizações, podendo impedir o domínio por parte de estruturas burocráticas de larga escala. Um bom exemplo utilizado por Anthony Giddens é o caso da produção de pão francês que ainda é produzido artesanalmente em grande escala, como única forma de atender as exigências de pão sempre fresco tão importante na cultura desse país. Outro aspecto das organizações pós-modernas é a tendência ao abandono de tarefas especia- lizadas pelo desenvolvimento de habilidades genéricas, ou seja, mais diversas dentro da empresa. A chamada flexibilização do trabalho, pioneiramente aplicada pelas gestões japonesas baseadas no toyo- tismo, são formas de produção baseadas no envolvimento de trabalhadores em um número bem maior de estágios do processo de produção. A competência em muitas áreas de um emprego é bem mais im- portante do que o desenvolvimento de especialista em uma área apenas. Como vimos, nem todos os estudiosos das teorias das organizações concordam que nossa so- ciedade e suas organizações tenham suplantado as formas burocráticas de estruturação das empresas. Apesar de algumas tendências terem flexibilizado o processo produtivo de suas empresas percebe-se que a existência de regras rígidas e ordenadas são ainda bastante valorizadas. George Ritzer chama essa tendência de processo de “mcdonaldização da sociedade”. Para demonstrar a atualidade das formas bu- rocráticas de organização, Giddens, citando Ritzer explica que: [...] a mcdonaldização, segundo Ritzer, é “o processo pelo qual os princípios dos restaurantes de fast-food vêm domi- nando um número crescente de setores da sociedade norte-americana, assim como o resto do mundo”. Ritzer utiliza os quatro princípios que orientam os restaurantes McDonald’s – eficiência, calculabilidade, uniformidade e controle da automação – para demonstrar que, com o passar do tempo a nossa sociedade está se tornando cada vez mais raciona- lizada. (GIDDENS, 2005, p. 301) 146 | A globalização e as organizações Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 147|A globalização e as organizações A forma como as franquias dos restaurantes McDonald’s são administradas padronizam ambien- tes, atendimento, estratégias de marketing e principalmente o processo produtivo de seus lanches. Todas as tarefas são construídas para minimizar a participação da mão de obra humana e maximizar a eficiência em todo o processo. As funções são extremamente automatizadas, controladas por tempos e termostatos das próprias máquinas. Assim, Ritzer acredita que a sociedade como um todo está se deslocando em direção a esse mo- delo altamente padronizado e regulado para a realização das coisas e dá como exemplo disso, o fato de que muitas das nossas tarefas cotidianas estão sendo realizadas por sistemas automatizados e com- putadores. Muitos aspectos do nosso cotidiano, por exemplo, agora envolvem interações com sistemas automatizados e computadores em vez de seres humanos. Porém, assim como Max Weber em seu tem- po, Ritzer, preocupa-se com os efeitos prejudiciais da racionalização sobre a criatividade e a humanida- de dos indivíduos. E concluiu que a vida em sociedade está se tornando cada vez mais “mcdonaldizada”, o que significa dizer, mais rígida, ordenada e menos pessoal. No entanto, esta visão pessimista pede cautela porque o que se percebe hoje são sistemas per- meados por estruturas menos homogêneas e adaptáveis fazendo coexistir mais de uma forma de or- ganização da produção dentro das empresas, o que permite acreditar que as burocracias não estão em fase de extinção completa. A responsabilidade social Hoje, difunde-se a ideia de que nenhuma organização econômica, qualquer que seja sua natu- reza, pode ficar indiferente diante do contexto social e natural em que está inserida. Surgem códigos e princípios provindos de governos e líderes empresariais sobre o aumento da responsabilidade social das empresas pelo mundo afora. Há uma demanda de um maior compromisso com a melhora do ambiente em que as organiza- ções operam. Isso porque acredita-se que hoje, além de criar riqueza para todos os seus membros, a em- presa deve também contribuir para a melhoria das condições de vida das sociedades onde atua. E mais que isso, atender as demandas sociais está se tornando uma vantagem competitiva e fonte de recursos para os indivíduos e organizações que estão de algum modo relacionados com a empresa. À medida que se constitui, uma organização se estrutura configurando e construindo o seu am- biente e também provoca mudanças no seu ambiente externo. Consideramos ambiente organizacional aquilo que é significativo para a organização, assim ele está diretamente relacionado com uma organi- zação em particular. Nos ambientes organizacionais vários aspectos da realidade social e natural podem afetar a or- ganização e podem ser afetados por ela. Questões econômicas, ecológicas, tecnológicas, culturais, polí- ticas, legais, climáticas, entre outras fazem parte desta conjuntura que se relaciona com a organização. Mesmo não tendo influência direta sobre estas questões a empresa pode ser afetada por elas e ao mes- mo tempo afetá-las. As reflexões sobre essas relações entre empresas e sociedade deram origem ao conceito de res- ponsabilidade social organizacional. Segundo Dias, a responsabilidade social organizacional (RSO), ou corporativa, ou ainda empresarial “promove um comportamento empresarial que integra elementos Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br sociais e ambientais que não necessariamente estão contidos na legislação, mas que atendem às expec- tativas da sociedade em relação à empresa.” (ARAYA, apud DIAS, 2008, p. 242). Neste trecho, Dias observa a importância de destacar que as iniciativas de RSO devem ir além da obrigação imposta por lei. O autor destaca ainda a diferença entre doações filantrópicas e responsabilidade social: [...] responsabilidade social da empresa vai além da filantropia. Na maioria das definições se descreve como as medidas constitutivas pelas quais as empresas integram preocupações da sociedade em suas políticas e operações comerciais, em particular, preocupações ambientais, econômicas e sociais. A observância da lei é o requisito mínimo que deverão de cumprir as empresas. (UNCTAD apud DIAS, 2008, p. 242) E aí sim define as ações de responsabilidade social corporativa: [...] são estratégias pensadas para orientar as ações das empresas em consonância com as necessidades sociais, de modo que a empresa garanta, além do lucro e da satisfação de seus clientes, o bem estar da sociedade. A empresa está inserida nela e seus negócios dependerão de seu desenvolvimento e, portanto, esse envolvimento deverá ser duradou- ro. É um comprometimento. (TOLDO apud DIAS, 2008, p. 242) Essa tendência reforça a concepção de que a empresa seria responsável pelos impactos sociais e ambientais que provoca com sua atividade e vai mais longe comprometendo-se a participar de forma a transformar estas realidades. Assim, a retomada dessa concepção de responsabilidade social nos anos 1990, encontra as em- presas muito mais permeáveis às pressões sociais, por exemplo, como no caso da pressão feita pelosconsumidores que atuaram junto a empresas como IKEA (sueca) e Nike (norte-americana) nas questões de direitos humanos e trabalho infantil. Ao longo destes anos, organizações supranacionais como a Organização das Nações Unidas – ONU e a Organização Internacional do Trabalho – OIT tentam participar no sentido de transcender as políticas nacionais na promoção de sociedades mais democráticas organizadas globalmente através de valores comuns. Em 1999 uma manifestação do secretário geral da ONU, Kofi Annan pedia por uma glo- balização mais humanitária e foi neste mesmo ano que sugeriu um Pacto Global pelas Nações Unidas que apresentava dez princípios universais: Princípios dos Direitos Humanos::::: respeitar e proteger os direitos humanos;:::: impedir violações de direitos humanos.:::: Princípios de Direitos do Trabalho::::: apoiar a liberdade de associação no trabalho;:::: abolir o trabalho forçado;:::: abolir o trabalho infantil;:::: eliminar a discriminação no ambiente de trabalho.:::: Princípios de Proteção Ambiental::::: apoiar uma abordagem preventiva aos desafios ambientais;:::: promover a responsabilidade ambiental;:::: encorajar tecnologias que não agridem o meio ambiente.:::: Princípios contra a Corrupção::::: combater a cor:::: rupção em todas as suas formas, inclusive extorsão e propina.” (Disponível em: <www.pactoglo- bal.org.br> apud DIAS, 2008, p. 246) 148 | A globalização e as organizações Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 149|A globalização e as organizações Assim, espera-se que este pacto sirva de referência para a construção de novas atitudes e valores mundiais que devam ser assumidos por todos os indivíduos, sociedades e organizações, com o objetivo de construir uma sociedade mais justa e responsável. Com a globalização dos capitais, as políticas das empresas são, cada vez mais, construídas inde- pendentemente de seus contextos locais, o que acarreta uma série de consequências sociais que deses- tabilizam as próprias organizações. Talvez, a regulação social de que nos fala Sainsaulieu (2006), venha da questão prática da busca pelo “emprego para todos”, ou seja, de novas necessidades geradoras de no- vas possibilidades, advindas das próprias relações de produção. Falta ainda desenvolver um modelo de desenvolvimento que articule “reação econômica” com a exigência de uma “Democracia Civilizatória”. Texto complementar Televisão e globalização: o caso da Índia (GIDDENS, 2005) Os efeitos da globalização da mídia podem ser percebidos claramente no caso da Índia, onde, na última década, houve um crescimento exponencial na transmissão de programas de TV. Em 1991, a Índia possuía um canal de TV controlado pelo Estado, mas até 1998 já contava com quase 70 canais – incluindo a maior rede de televisão asiática do mundo, a Zee TV. Nos últimos anos, o programa da mídia tem apresentado mudanças profundas na Índia, país cuja enorme classe média (composta por 250 milhões de pessoas) de falantes de inglês o transforma em um dos mercados mundiais da mídia em que se verifica um crescimento mais acelerado (THUS- SU, 1999). Atualmente, a Índia é vista por muitas empresas internacionais do setor com um mercado vibrante, já que o volume imenso da população e a diversidade de culturas e de línguas traduzem- se em uma ampla demanda de programa e canal. Enquanto era um Estado pós-colonial com altos índices de analfabetismo e um frágil senso de identidade, a Índia foi dominada pela radiodifusora nacional Doordarshan. Para o governo indiano, a Doordarshan representava um meio de construir a unidade nacional, promover certos objetivos de “desenvolvimento” entre a população e educar os cidadãos coletivamente. Apesar da histórica li- berdade da mídia impressa na Índia, a Doordarshan era submetida a uma censura e a um controle rigorosos. Um dos momentos decisivos da radiodifusão indiana ocorreu durante a liderança de In- dira Gandhi (1967-1978 e 1980-1984), que considerava a televisão um instrumento crucial para pro- mover as ideias de construção da nação entre o povo. Ela supervisionou a expansão no número de estações emissoras de televisão, além de introduzir aparelhos de TV em cores no país. Em 1991, o governo indiano liberalizou o setor da mídia, abrindo a porta para que corporações estrangeiras dessa área transmitissem uma programação dentro de um sistema anteriormente fe- chado. A rádiodifusão via-satélite – como a que é realizada pela STAR TV de Hong Kong e pela CNN dos Estados Unidos – ganhou bastante popularidade entre a elite culta urbana, induzindo a um rá- Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br pido crescimento das conexões a cabo e das antenas de satélite. Ainda que no início da década de 1990 esses modos de exibição estivessem restritos a uma pequena minoria rica, os anunciantes in- teressaram-se por essa minoria, enxergando na transmissão de programas de televisão na Índia um caminho excelente para promover seus produtos. Até o ano de 1998, todos os principais canais mundiais de TV a cabo – incluindo a BBC, a CNN, o Discovery, a STAR, a MTV e a CNBC – estavam transmitindo seus programas na Índia ao lado de em- presa indianas. Embora essas empresas de mídia transmitissem um material cujo conteúdo era pra- ticamente todo estrangeiro, elas muitas vezes “situavam” os programas acrescentando legendas em híndi, ou colocando no ar programas que tratassem de tópicos de interesse específico para o país. A Zee TV foi o maior e mais bem sucedido canal de TV indiana a surgir ao lado do Door- darshan. Lançado em 1992, o primeiro canal de TV privado da Índia em língua híndi conseguiu superar a Doordarshan até 1996, com seus 37% de audiência, contra 28% da estadual (HERMAN; MCCHESNEY, 1997). A popularidade da Zee TV parece estar relacionada a uma combinação de fato- res, entre eles, uma programação inovadora que é novidade para os telespectadores indianos além do amplo uso do “hinglês” (uma mistura do híndi com o inglês que caiu na preferência dos jovens urbanos). A programação da Zee TV conseguiu adaptar com sucesso os formatos dessas atrações ocidentais para um público especificamente indiano (THUSSU, 1999). À medida que as forças globais firmaram-se na área de transmissão de programas de TV na Ín- dia, a Doordarshan se viu obrigada a reagir à concorrência ampliando a própria oferta. A exemplo da mudança que ocorreu em múltiplos países, a missão da Doordarshan, de comprometimento com a prestação de um serviço público, foi gradualmente substituída por políticas voltadas para o lucro e o mercado. Além de oferecer um conteúdo educacional, a Doordarshan começou a incluir progra- mas de entretenimento em sua programação para reforçar seus índices de audiência. Essa mudança em direção à privatização da mídia na Índia – a maior democracia no mundo – foi criticada por mui- tos observadores que afirmam que a TV indiana está se transformando em uma corporação e seu controle está sendo assumido pelas gigantes da mídia ocidental. Essa discussão chega a alegar que quando o jornalismo, a produção de notícias e o conteúdo da TV são impulsionados por interesses de mercado, cai a qualidade do conteúdo e a programação passa a ser dominada pelas necessida- des e pelas visões dos anunciantes (THUSSU, 1999). Outros afirmam que a globalização da mídia na Índia foi importante para quebrar o contro- le do Estado na área da transmissão de programas de TV e para expandir a esfera pública. A Zee TV, por exemplo, dedica uma atenção bem maior às opiniões dos políticos da oposição do que a Doordarshan, forçando esta última a liberalizar a cobertura política (HERMAN; MCCHESNEY, 1997). Neste aspecto, o aparecimento de novos radiodifusores comerciais serviu para ampliar e revitalizar a esfera pública indiana. 150 | A globalização e as organizações Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br151|A globalização e as organizações Atividades 1. De que forma as organizações são afetadas pela globalização? 2. Quais as transformações que as novas tecnologias, principalmente a informática e a telemática, têm realizado em nossas noções de tempo e espaço? Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 3. Como podemos definir responsabilidade social das empresas? Gabarito 1. As atividades combinadas das organizações estimulam, facilitam, sustentam e expandem a glo- balização, transformando a estrutura de muitas delas, e mais imediatamente daquelas que de- vem competir no mercado mundial. 2. As novas tecnologias têm possibilitado a relativização dos conceitos de tempo e espaço como conhecíamos até então. O fato de que informações e contatos com as pessoas podem ser feitos através das tecnologias da informação e da comunicação vem revolucionando o nosso modo de vida como um todo, e as organizações em particular. 3. “São estratégias pensadas para orientar as ações das empresas em consonância com as neces- sidades sociais, de modo que a empresa garanta, além do lucro e da satisfação de seus clientes, o bem-estar da sociedade. A empresa está inserida nela e seus negócios dependerão de seu de- senvolvimento e, portanto, esse envolvimento deverá ser duradouro. É um comprometimento” (TOLDO, 2002, p. 84, apud DIAS, 2008, p. 242). 152 | A globalização e as organizações Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br Referências ALBORNOZ, Suzana. O que É Trabalho? São Paulo: Brasiliense, 1994. ARAYA, Mônica. Negociaciones de Inversión y Responsabilidad Social Corporativa: explorando un vínculo en las Américas. 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