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Breve Histórico do Espaço Urbano como Campo Disciplinar (KOHLSDORf M E , 1985)

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Série Textos de Arquitetura 
Editor Vicente Wissenbacli 
Capa: Charles IVlayer 
Revisão: Maria Luiza Favret, Pedro N. Duarte 
Arte final: Ronald Chira 
Composição: Santo Alberto Artes Gráficas 
Fotolitos: Cyrnil 
Impressão: Editora Parma Ltda. 
Copyright: © Ricardo L. Farret 
Maria Elaine Kohlsdorf 
Suely Gonzales 
Frederico de Holanda 
Impresso no Brasil 
Abril de 1985 
Projeto Editores Associados Ltda. 
Avenida Doutor Arnaldo 1947 
Telefone (011) 864 7477 
01255/São Paulo 
Universidade Estadual de Lond' lna 
Sistema de Bibliotecas 
0000125087 
C U * . 
Procedi c S í ^ 
Cftntfo Q l ^ L J Dcpt», 
M l 
o espaço da cidade — contribuição à análise urba-
E77 na (por) Suely Franco Netto Gonzales, Frederico de 
Holanda, Maria Elaine Kohlsdorf; introdução Ricardo 
Libanez Farret; apresentação Nestor Goulart Reis Filho. 
São Paulo, Projeto, 1985. 
1. Planejamento urbano. I. Reis Filho, Nestor Gou-
lart. II. Farret, Ricardo Libanez. III. Gonzales, Suely 
Franco Netto. IV. Holanda, Frederico de. V. Kohlsdorf, 
Maria Elaine. 
CDD 711.4 
CDU 711.4 
índice para o catálogo sistemático: 
1. Planejamento urbano 711.4 
Sumário 
5 Notas sobre os autores 
7 Apresentação 
9 Introdução 
Ricardo L. Farret 
15 Breve Histórico do Espaço Urbano como Campo 
Disciplinar 
Maria Elaine Kohlsdorf 
73 Paradigmas da Estruturação do Espaço Residencial 
Intra-Urbano 
Ricardo L. Farret 
91 A Renda do Solo Urbano: Hipóteses de Explicação de 
seu Papel na Evolução da Cidade 
Suely Gonzales . 
t15 Arquitetura como Estruturação Social 
Frederico de Holanda 
Notas sobre os autores 
Ricardo Libanez Farret Arquiteto, graduado pela UFRGS em 1962; 
Doutorado em Planejamento Urbano pela Uni-
versidade da Califórnia, Berkeley. Atuaimente 
é Professor Adjunto do Departamento de Ur-
banismo da Universidade de Brasília. 
Suely Franco Netto Gonzales Arquiteta, graduada pela UFRGS em 1954; 
Mestrado em Planejamento Urbano pela 
UFRGS; Curso de Especialização em Habita-
ção no PIAPUR-OEA, em Lima, Peru. Atuai-
mente é Professora Assistente do Departa-
mento de Urbanismo da Universidade de Bra-
sília. 
Frederico de Holanda Arquiteto, graduado pela UFPE em 1966; 
Doutorado em Planejamento Urbano pelo Uni-
versity Coliege, Londres. Atuaimente é Pro-
fessor Assistente do Departamento de Ur-
banismo da Universidade de Brasília. 
Maria Elaine Kohlsdorf Arquiteta, graduada pela UFRJ em 1967; 
Mestrado em Planejamento Urbano pela Uni-
versidade de Brasília e Curso de Especiali-
zação em Configuração Urbana na Universi-
dade de Stuttgart, Alemanha. Atuaimente é 
Professora Assistente do Departamento de 
Urbanismo da Universidade de Brasília. 
5 
r 
« 
L 
Apresentação 
Nestor Goulart Reis Filho 
Pretender apresentar cada um desses quatro estudos e cada um desses 
autores, todos eles professores da Universidade de Brasília, não teria 
sentido. São todos bem conhecidos entre os arquitetos. Mas tem sen-
tido — e multo — escrever sobre esses trabalhos e seus autores 
como um conjunto, que não surgiu por acaso. Tem sentido escrever 
sobre as especificidades do curso de Arquitetura e Urbanismo da UnB, 
cujos docentes produzem esses trabalhos, e procurar as raízes de sua 
condição de atuação. 
Em primeiro lugar, lembrando a forma como foi organizada, no seu 
início, a Universidade de Brasília. A ênfase no regime de tempo inte-
gral e na pesquisa, a maior Integração entre as diferentes áreas, no 
curso de Arquitetura, a presença dos trabalhos de atellê como parte 
das pesquisas dos docentes. Essa concepção de universidade e essa 
estrutura eram, sem dúvida, as mais adequadas para articular o en-
sino e a pesquisa ao estudo dos problemas contemporâneos da socie-
dade brasileira. Tal foi a Importância dessas Inovações, que mesmo 
as terríveis pressões externas posteriores não puderam anulá-las in-
teiramente. Devemos lembrar também a forma como foi organizada a 
reestruturação do Instituto de Arquitetura e Urbanismo — então ins-
tituto Central de Artes e Arquitetura — a partir de fins de 1969, após 
o seu lamentável fechamento (que ocorreu um ano antes). Reagin-
do ao fechamento do curso de Arquitetura, a DIretoria Nacional do 
lAB, os alunos do próprio curso e muitos arquitetos de todo o país 
realizaram um esforço para a sua reorganização, cujo significado não 
pode ser esquecido. Como participante direto dessa etapa, creio poder 
testemunhar sua Importância. Como professor de outra universi-
dade, posso avaliar com tranquilidade os resultados. 
7 
Podemos reconhecer, nesses quatro estudos, os resultados altamente 
positivos de um projeto cultural amadurecido ao longo de 15 anos 
de trabalho, cuja formulação remonta aos fins de 1969. O projeto 
elaborado naquele momento procurava Incorporar as experiências en-
tão mais significativas e restabelecer, para o curso de Arquitetura 
na UnB, uma posição de vanguarda, como a que o caracterizava em 
sua etapa Inicial. Deste se recuperava o regime de tempo integral 
para todo o corpo docente e a prática do projeto pelos professores 
no recinto da faculdade, como parte da preocupação com a articula-
ção entre a teoria e a prática. Da experiência que vinha se reallzanao 
em São Paulo, desde 1962, incorporava-se o trabalho teórico sistemá-
tico e a preocupação com a pesquisa e os estudos dos problemas 
que eram elaborados pela prática social, em todas as escalas do país. 
O que chama a atenção nesses trabalhos é o seu caráter teórico e o 
fato de serem elaborados por profissionais com experiência signifi-
cativa na prática de planejamento e projeto de edificações. Essa linha 
de atuação é relativamente nova no Brasil. Até os anos 60, com exce-
ção de personalidades incomuns, como a do mestre Lúcio Costa, a 
elaboração teórica esteve pouco presente nas atividades dos arqui-
tetos brasileiros. A elaboração de conhecimentos sobre a prática do 
projeto se restringia a uma crítica, em princípio subjetlva, que era 
elaborada quase sempre por estudiosos de outras áreas. Não por 
acaso, logo no início deste livro, o trabalho de Elaine Kohlsdorf des-
taca o fato de que no Brasil, até há alguns anos, a pesquisa estava 
totalmente ausente da formação dos arquitetos. 
Trabalhos como estes virão, sem dúvida, oferecer suporte a atlvlda-
des didáticas de graduação. Servirão sobretudo à pós-graduação e à 
pesquisa em geral, Integrando-se à bibliografia dos teóricos brasilei-
ros, que vêm ganhando importância nas últimas décadas. De certa 
forma essa bibliografia, se não nega, atenua o tom de pessimismo 
da parte final do trabalho de Kholsdorf, no que se refere às contri-
buições teóricas no Brasil, e justificaria, para uma outra etapa, o le-
vantamento crítico da produção intelectual no país nas últimas déca-
das, sobre os temas em questão. 
Ao constatar agora a abertura ao público de uma parte da produção 
intelectual dos colegas da UnB, com e s s e s quatro estudos, não posso 
deixar de reconhecer, com satisfação, o êxito de um projeto univer-
sitário cujo nascimento acompanhei. O leitor verá a seguir que, como 
sempre, entre arquitetos, o projeto é um elo, um momento de arti-
culação entre a teoria e a prática. 
8 
Introdução 
Ricardo Libanez Farret 
Qualquer ação prática se estabelece sobre um determinado objeto concreto. 
No entanto, para que esta ação seja realista e consequente, ela deverá estar 
apoiada sobre o conhecimento que se tem deste objeto. 
Esse conhecimento, no entanto, não se baseia apenas nas manifestações vi-
síveis do objeto. Pelo contrário, é necessário conhecê-lo "por dentro" atra-
vés das leis gerais do seu comportamento e de suas formas de vigência 
nas mais diversas condições concretas. Somente assim é possível prever e, 
portanto, organizar uma ação prática sobre um objeto concreto, pois, como 
afirma Gonzales (1981:1), "somente é possível planejar uma intervenção 
quando é possível prever o comportamento, o movimento de um determinado 
fenómeno". 
No caso específicodo planejamento urbano, entendido como uma forma de 
ação sobre um objeto concreto, a cidade, não raramente observamos a sua 
ineficácia, quando não resultados socialmente perversos. Isto decorre, em 
grande parte, do conhecimento limitado que se tem sobre este objeto, 
complexo, multidisciplinar e ainda carente de um corpo teórico próprio. Em 
outras palavras, o conhecimento da cidade, como objeto concreto, é condi-
ção necessária, embora não suficiente, para melhor atingir os objetivos do 
planejamento urbano, em todas as suas dimensões. 
Em uma destas dimensões, a espacial, ip planejamento urbano pode ser 
entendido como uma tentativa de, em forma sistemática, prever e, portanto, 
controlar o desenvolvimento físico da cidade. Para um planejamento es-
paclaf consequente, este controle deve ser consistente com e/ou dirigido 
para a manipulação adequada dos determinantes sociais, económicos, políti-
cos e tecnológicos para os fins sociais almejados^/A interação destes deter-
minantes, na medida em que todo o social se realiza no espaço, resulta em 
ordens ou padrões de uso do solo que representam, em cada momento, o 
efeito cumulativo de decisões, ações (e omissões) de um grande número de 
agentes individuais e institucionais. O conhecimento destes processos e pa-
drões constitul-se, portanto, num suporte teórico-conceitual fundamental às 
ações sobre o espaço urbano. Esta, a razão primeira deste trabalho. 
11 
Além disso, a importância do estudo da estrutura espacial urbana pode ser 
Identificada a partir de diversos ângulos. Primeiro, ela constitui uma tradi-
cional preocupação académica de diversas disciplinas: sociologia, geografia, 
economia, arquitetura, engenharia, antropologia e ecologia; segundo, a estru-
tura espacial urbana está claramente relacionada a processos de redistribui-
ção da riqueza (Harvey, 1973); terceiro, como visto anteriormente, devido 
aos seus vínculos com o planejamento do uso do solo urbano, a análise da 
estrutura espacial urbana pode levar a um melhor entendimento de quais, 
como e por que certas configurações melhor propiciam a consecução de 
objetivos sociais determinados; quarto, permite o entendimento do papel do 
Estado, visto que os processos e padrões de estruturação do espaço urbano 
são principalmente determinados (ou pelo menos influenciados) por uma va-
riedade de ações do setor público, que tanto podem atuar no sentido das 
forças do mercado como podem, também, implícita ou explicitamente, opor-
se a elas; finalmente, dada a atual conjuntura energética, a estruturação do 
espaço urbano pode representar, a médio e longo prazos, uma alternativa 
conservacionista de largo alcance social e económico (Farret e Pareto, 1981). 
A origem da análise científica da estrutura espacial urbana é objeto de 
controvérsia. Se, por um lado, é prática comum entre os estudiosos do 
assunto o argumento de que tudo se iniciou com o trabalho da chamada 
"Escola de Chicago de Sociologia Urbana", por outro, alguns teóricos vão 
multo mais longe. Harris (1961), por exemplo, afirma que "os mestres-
planejadores e arquitetos possuíam... algum nível de entendimento analítico 
e científico da estrutura urbana" (p. 670). Em outras palavras, eles afirmam 
que, através da vinculação da estrutura espacial urbana (via desenho ur-
bano) com as forças macrossocials predominantes nas sociedades pré-
industrials (por exemplo, defesa e religião), aqueles profissionais estavam 
fisicamente reproduzindo e hierarquizando relações sociais. Isto só era 
possível pela identificação destas com aquelas. 
Enquanto não é nosso propósito discutir, aqui, o que seja o "conhecimento 
científico" da estrutura espacial urbana, é suficiente afirmar, a exemplo de 
Post (1962), que há uma forte convergência entre as necessidades dos 
Formuladores de políticas urbanas e o interesse dos cientistas urbanos na 
explicação do processo de estruturação das cidades 1. Portanto, mudanças 
em tecnologia, crescente complexidade no processo de tomada de decisão 
e controle e a consequente ampliação do poder do Estado e seu distancia-
mento da sociedade civil, têm estimulado, compreensivelmente, o desen-
1. Por exemplo, com a Intensificação do programa de vias expressas nos 
EEUU, após a Segunda Guerra Mundial, a Investigação urbana concentrou-se 
na análise das relações entre a localização destas vias e a expansão urbana, 
dando, portanto, origem a vários modelos de estruturação do espaço urbano 
(Post, 1962). 
12 
volvimento do estudo da estrutura espacial urbana. Este desenvolvimento 
visa não somente a descrever os arranjos ou localização relativa dos usos 
do solo, mas, principalmente, a explicar — portanto prever — mudanças 
na estruturação do espaço urbano. 
Dentre outras, o espaço urbano constitui uma das áreas de estudo do 
Instituto de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília. Os traba-
lhos aqui apresentados foram produzidos por vários de seus professores e 
constituem material didático para os cursos de graduação em Arquitetura 
e Urbanismo e pós-graduação em Planejamento Urbano. Têm, portanto, um 
endereço eminentemente didático que, esperamos, possa ser útil aos demais 
programas nacionais de graduação e pós-graduação em arquitetura, plane-
jamento urbano, sociologia urbana, geografia urbana e economia urbana. 
Em seu trabalho, Maria Elaine Kohlsdorf propõe-se a investigar o estabele-
cimento do espaço urbano como disciplina académica, partindo de algumas-
hlpóteses. Primeira, a de que o espaço urbano define-se como espaço físico 
transformado com certas intenções por processos sociais de produção; 
por isto, inscreve-se dentro do campo de conhecimento da arquitetura; 
segunda, a de que uma disciplina só se estabelece quando explicitada tanto 
sua componente profissionalizante quanto a especulativa; àquela caberia 
fornecer um conjunto de regras de ação e a esta, proceder ao conhecimento 
de seu objeto; finalmente, existe para a arquitetura uma longa história de 
práticas sobre o espaço, mas a pesquisa do mesmo não se tem desenvol-
vido com a mesma ênfase; logo, a teoria da prática arquitetõnica ainda não 
se consolidou. A investigação de tal trabalho delimita-se pelo marco histó-
rico Iniciado com a Revolução Industrial, e centra-se, desde então, nas 
diversas maneiras de abordar o espaço urbano; entretanto, não se descartam 
as contribuições ou teorias a tal conhecimento; procura-se apenas a rede-
finição da arquitetura e do arquiteto que ocorre a partir da emergência da 
sociedade industrial. 
Ricardo Farret faz uma análise crítica dos grandes paradigmas explicativos 
da localização residencial intra-urbana. Partindo-se da Importância do setor 
residencial na cidade, tanto em termos quantitativos (cerca de 80% da 
área urbana tem uso residencial) quanto qualitativos (o setor é determi-
nante no dimensionamento e localização de outros setores), pode-se cons-
tatar, sem dificuldades, o seu papel determinante na estruturação do 
espaço urbano. Sem analisar modelos Individualmente, o estudo procura 
abordá-los em termos dos principais paradigmas aos quais se vinculam: o 
do equilibrio e o do conflito. 
Em a Renda do Solo Urbano, Suely Gonzales formula hipóteses explicativas 
sobre a estruturação do espaço urbano sob as determinações da renda 
fundiária urbana. Partindo das formulações iniciais sobre a renda fundiária 
agrícola, o estudo analisa as diversas formas que ela assume no contexto 
13 
urbano, bem, como as implicações de cada uma delas na configuração 
espacial das cidades. 
Finalmente, em seu estudo, Frederico de Holanda mostra que o espaço, a 
exemplo de outras manifestações do social, não "reflete" o social: ele 
constitui uma de suas inúmeras dimensões. A organização espacial, se-
gundo Holanda, não deve ser entendida como simples locus de outras 
práticas, mas ela própria, isto sim, como estruturadora de processos pro-
dutivos, simbólicos e de representação. 
Sem a pretensão de esgotar o tema, temos certeza de que a obra aqui 
apresentada contribuirá para reativaros debates sobre a organização es-
pacial das cidades e suas profundas relações com os processos sociais 
mais gerais. 
Bibliografia 
FARRET, R. e PARETO, V. (1981). "A Configuração Espacial do Modelo 
Energético". Brasília: Revista Brasileira de Tecnologia, 12 (2). 
GONZALES, S. (1981). Planejamento Urbano: Uma Introdução à Disciplina. 
Brasília: URB/UnB (mimeo). 
HARRIS, B. (1961). "Some Problems in the Theory of Intraurban Research". 
Operations Research, 9 (5). 
HARVEY, D. (1973). Social Justice and the City. Baltimore: J . Hopkins. 
POST, R. (1962). Criteria for Theories of Urban Spatiel Structure. Chapei 
Hlll, NC: Tese de Mestrado, U. of North Carolina. 
14 
Breve Histórico do Espaço Urbano 
como Campo Disciplinar 
Maria Elaine Kohlsdorf 
Introdução 
O espaço urbano é, hoje, uma área com longa história de prática profissio-
nal. Pode-se, por exemplo, considerar uma atitude de projeto aquela ex-
pressa no espaço das antigas cidades gregas e romanas, ou nas cidades da 
Europa medieval, ou ainda nas cidades renascentistas e barrocas. O mesmo 
gesto de prefiguração encontra-se nas definições de sítio e espaço con-
tidas nas Leyes de las índias, intermediárias na estratégia de coloniza-
ção hispânica na América Latina. A projetação está, também, presente 
nas cidades de colónias portuguesas, como o Brasil: sabe-se que, embora 
sem o apoio de um complexo legal explícito como o espanhol, os antigos 
núcleos urbanos brasileiros foram constituídos segundo o modelo das cida-
des do Medievo português. A atitude de projeto a nível urbano é ainda 
melhor visualizada quando lembramos as primeiras cidades novas (como 
Planta baixa da cidade de Mileto, Grécia, 470 a.C. 
16 
Planta de Sforzinda, cidade ideal de Fiiarete, 1460. 
Planta baixa de Turim, após duas expansões urbanas, em 1682. 
Karisruhe e Bath), e os processos pioneiros da renovação urbana (da Roma 
papal, de Londres e Lisboa após incêndios e cataclismas, ou de Paris frente 
à Comuna de 1848). Daí, até os dias atuais, projetar assentamentos de na-
tureza urbana tende a assumir características de rotina profissional, seja 
sob a forma de novas cidades, planos de expansão territorial, ou conjuntos 
habitacionais, seja como remanejamentos de espaços urbanos preexistentes. 
A teoria desta prática, entretanto, ainda está em vias de estabelecimento 
paradigmático; o pensamento que a tem alimentado caracterizou-se, até 
princípios do século XIX, por não ser nem reflexivo, nem crítico, atributos 
estes que ainda marcam grande parte dos estudos urbanos. São, via de 
regra, conjuntos de normas de composição arquitetõnica, baseados em cri-
térios estéticos, funcionais ou construtivos e, entre estes, encontram-se 
autores (Vitrúvio, Hipódamo) e méritos que vêm sendo, hoje em dia, redes-
cobertos. Entretanto, estas arfes urbanas não se propunham a explicar a 
cidade enquanto fenómeno espacial; entender e explicar são atividades que 
se têm quase restringido a historiadores, filósofos e outros estudiosos que 
não fazem do espaço urbano sua preocupação central. 
Há quase dois séculos, entretanto, a Revolução Industrial propiciou o surgl-~ 
mento de investigações sobre o espaço urbano, que se distinguiram nitida-
mente de tudo quanto se vinha estudando sobre o mesmo, pelas suas.. 
18 
Plano de Lima, Peru, 1683. 
[tentativas de lograr explicações!" Ocorreu uma produção maciça de obras 
sobre a cidade, que lançaram a base de estudos que se estendem até os 
nossos dias. Autores como Choay (1965), Benévolo (1967) e Reissmann 
(1970) afirmam que foram, então, colocadas certas ideologias ao tratar o 
espaço urbano, que permanecem subjacentes a reflexões e práticas em 
nossos dias; é o caso do progressismo e do culturalismo, congregando uma 
série de postulados por vezes antagónicos, por vezes paralelos, e que são 
hoje objeto de longas polémicas quanto a suas definições e validade como 
critério de classificação. É o caso ainda do marxismo científico, que conse-
guiu superar certos dilemas comuns aos dois outros pensamentos, mas 
que colocou outros impasses epistemológicos, dos quais o maior talvez seja , 
a ausência da visão espacial ao abordar a questão urbana. Contudo, ãT 
cidade configurada pela Revolução Industrial dá origem a um modo de pen-
sar o espaço urbano que é totalmente distinto dos anteriormente existentes, 
porque a sociedade urbana que então emerge é completamente nova. ~" 
A sociedade industrial, ao nascer, vê-se frente a problemas propostos pelo 
processo de urbanização crescente; a resolução de tais contradições passa 
a se comprometer com o equilíbrio dos próprios processos urbanos,| para 
permitir. Inicialmente, a consolidação, e depois a perpetuação da ordem 
social que o originou. Em outras palavras, o estudo do espaço urbano pas-
19 
sou predominantemente a se comprometer com as classes sociais urbanas, 
e sua característica inerente de dominação sobre as classes sociais rurais; 
comunicou, decorrentemente, a seus autores, o compromisso com o pacto 
social assente sobre o poder da cidade sobre o meio rural. Através deste 
fato, poder-se-iam explicar, por exemplo, as reiteradas abordagens da ques-
tão urbana por caminhos que conduziram à colocação de falsos problemas, 
e desviaram a pesquisa das relações essenciais do fenómeno. 
-rDe tais definições tem participado o arquiteto, porque a cidade faz parte 
de seu campo de atuação e porque possui, na compreensão do processo 
J-urbano, a responsabilidade das questões físico-espaciais. Entretanto, além 
de estar Inserido nos rumos da sociedade Industrial, o arquiteto trabalha em 
uma área de conhecimento abalada pela deficiência de paradigmas estabele-
cidos. Enquanto a prática arquitetõnica é antiga e competente para transmitir 
certas normas de projetação, a pesquisa sobre o seu espaço — onde se inse-
re a entidade urbana — não possui tradição e é, ainda, incapaz de gerar teo-
rias. Sem a contrapartida de pesquisas que conduzam a explicações, a com-
ponente profissionalizante não consegue estabelecer a arquitetura como 
disciplina. Na verdade, a atividade assumida pelos arquitetos, tanto pré-
urbanistas quanto urbanistas, não pode ser entendida como de investigação, 
mas apenas como de reflexão; por outro lado é, precisamente, quançlo se 
desenvolvem pesquisas urbanas, a partir da sociologia e da geografia, que 
Projeto de renovação urbana para Paris, de Haussmann, representado por Jean 
Alpiíand em 1867. 
20 
se minimiza a contribuição da arquitetura ao entendimento da cidade.(Nossas 
cidades, hoje e no passado, não têm sido explicadas pelo seu espaço; 
quando ocorrem esforços neste sentido, é comum proceder-se à maneira 
urbanista (refletindo) ou à maneira das artes urbanas (formulando normas 
de projeto sem base teóricar| 
2^0 caso do Brasil, a prática do urbanismo e do planejamento urbano já é, 
hoje, substancial (Kohlsdorf, 1976), mas expressa, na atuação dos arquitetos, 
uma formação eminentemente profissionalizante, onde a ausência de pesqui-
sa era total até pouco tempo atrás. Ao se Inserir na "sociedade do planeja-
mento", em função das condições de industrialização que atingem o país, 
desenvolyem-se metodologias de abordagem para nossos processos urbanos 
que têm, via de regra, reforçado o papel definido para a nação, como parte 
articulada no sistema de produção capitalistaTj Além disto, tem-se Incorrido 
na mera transposição de tecnologia (seja intelectual), revelando-se esta 
Incapaz de explicar os processos dos espaços urbanos brasileiros, porque 
não se procede ao conhecimento de fenómenos do mundo real senão a 
partir de seus próprios atributos específicos. A característica de prática 
sem apoio de pesquisa, e nem sequer de reflexão, que prepondera no 
trabalho que nós, arquitetos, desenvolvemos atuaimente no Brasil, só tem 
feito agravar as consequências da Importação de instrumental científico. 
O trabalho que aqui se Inicia possui, entretanto. Intenções muito modestas; 
trata-se apenas de colocar à disposição um pequeno ensaio, onde foramreunidas as linhas gerais dos principais movimentos académicos que tentam 
sistematizar as especulações em torno do espaço urbano. É a partir dos 
mesmos que desenvolvemos este trabalho, tendo havido, evidentemente, 
uma seleção que descarta várias obras importantes, mas que é Inevitável, 
seja pelo acesso que se tenha tido, até a presente data, à tal bibliografia, 
seja por um processo natural de Identificação com o ponto de vista de 
alguns autores. 
F IJ t L 
BIBLIOTECA CENTRAI 
o espaço da cidade industrial e a nova ordem social: 
progressismo e culturalismo 
O espaço das cidades europeias à época da Revolução Industrial pode ser 
caracterizado pelo impacto de novas estruturas sobre processos urbanos 
que se vinham desenvolvendo com certa continuidade, flexíveis que eram 
às mudanças da sociedade anterior. 
Assim como a Revolução Industrial consegue alterar totalmente a consti-
tuição da sociedade europeia em poucas décadas, logra, simultaneamente, 
mudar a estrutura do processo de organização do território europeu e do 
espaço das cidades daquele continente. Nasce, juntamente com a sociedade 
industrial, uma nova ordem do espaço urbano, e ambos o fazem de maneira 
a romper abruptamente com seus antecedentes. Como se sabe, há um esva-
ziamento das áreas rurais e uma aceleração fantástica do crescimento demo-
gráfico das cidades, iniciando o processo de urbanização, com a inversão 
das relações de dominação entre cidade e campo, em um movimento de 
^concentração necessário à realização do modo de produção capitalista. 
Observa-se, na organização do espaço intra-urbano, a substituição de mor-
fologias que vinham, desde a Idade Médiaj^çpn\wendo com estruturas de 
épocas posteriores (como o Renascimento e o Barroco). A transformação 
dos meios de produção, corresponde o advento de novas atividades urbanas, 
a desestruturação dos sistemas funcionais remanescentes de outras épocas, 
e uma alteração radical nas necessidades e possibilidades de locomoção; 
coerentemente, a configuração de cidades como Londres, Paris e Berlim 
altera-se radicalmente como jamais até então, e isto, tanto pela velocidade 
do processo de renovação de seus espaços quanto pela natureza destas 
transformações. 
Poder-se-la associar a estas drásticas mudanças na sociedade e no espaço 
sob o impacto da industrialização uma revolução no modo de pensar a 
cidade. É preciso, entretanto, não esquecer que esta última ocorre não 
apenas a partir do estímulo ocasionado pelos processos de transformação 
sofridos pelas cidades europeias na época, mas também imgosta pela 
ordem social emergente, que passa a se valer visceralmente da entidade 
urbana. E, portanto, passa a ser necessário que ela seja acompanhada,-
controlada e dirigida no sentido de possibilitar e garantir o desenvolvi-
mento das novas relações sociais que virão a caracterizar a maior parte 
da população do mundo contemporâneo. Entretanto, à exceção, talvez, da 
crítica marxista, o quadro da Revolução Industrial não foi senão entendido 
como uma desordem. Sem ser devidamente compreendida pelos seus 
22 
contemporâneos, a cidade europeia do século XIX não pode ser, então, 
definida por suas reais características; não se desenvolveram soluções a pro-
blemas entendidos dentro de uma nova lógica, mas contestou-se esta, por s e ^ 
acreditar que a mesma constituía-se no problema. As reflexões apoiaram-se 
sobre uma situação idealizada, e orientaram-se ora para o futuro [progressis-
mo] ora para o passado [culturalismo). As duas atitudes originaram-se 
da observação da Revolução Industrial a partir de duas posições extremas: 
de forma a aceitá-la como a chave dos tempos modernos onde todas as 
contradições estariam resolvidas, ou de forma a negá-la, por ser respon-
sável pelo desaparecimento de um mundo melhor. As propostas decor-
rentes destas atitudes foram, evidentemente, incorretas: o progressismo é 
descritivo e acrítico em relação à realidade; o culturalismo é crítico, 
porém nostálgico. 
Tanto o culturalismo quanto o progressismo compareceram de formas 
diferenciadas, conforme situem-se nos primeiros tempos de existência da 
sociedade industrial, ou perteriçam às primeiras décadas do século XX, 
Neste sentido, Choay (ibid.) chama de pré-urbanistas e Benévolo (Ibid.) 
de utopistas os pensadores que constituem o primeiro momento de reflexão 
sobre a cidade industrial, no século XIX; estes estabeleceram as bases do 
pensamento culturalista, como Arnold, Carlyle, Pugin, Ruskin, William Morris, 
ou iniciaram a visão provressista, como Cabet, Fourrler, Owen, Proudhom, 
Richardson. Em ambas as abordagens, entretanto, existem características 
comuns, que fazem das obras realizadas pelos utopistas produtos essen-
cialmente hipotéticos, pois não foram levados à prática; entretanto, suas 
colocações são geralmente imbudas de caráter politico. A concepção pré-
urbanlsta da cidade é global, pois assim também o é a visão que os 
mesmos têm da sociedade. Concorre para tal o fato de que os pré-urbanistas 
ou utopistas provinham de diversas áreas de conhecimento, e não apenas 
de uma, como será o caso dos urbanistas. 
Edifício central do projeto de Falanstério, Fourrler, 1847, 
23 
A partir do final do século XIX, começou a configurar-se o urbanismo, 
com pretensões expressamente científicas, porém colocadas de forma 
bastante peculiar: há uma despolitização de enfoque, simultânea a uma 
especialização dos urbanistas. IA concepção da sociedade perde, assim, 
seu sentido global, e a cidade passa a ser encarada como uma entidade 
autónoma, quase sempre física ou funcional, sendo, portanto, definida em 
bases insuficientes. Os urbanistas são, geralmente, arquitetos e contra-
põem, ao caráter utopista dos estudos anteriores, a prática de transfor-
mações de espaços urbanos ou da construção de cidades totalmente novasj 
forma urbanista do culturalismo surgiu cronologicamente primeiro, entre 
1880 e 1890, na obra de Camillo Sitte; limitou-se, então aos países anglo-
saxônicos, onde predomina durante a maior parte deste século. 
t> O progressismo teve sua primeira expressão urbanista no século XX, 
através de Tony Garnier; Choay (ibid., p. 31) fala em uma primeira geração 
de arquitetos racionalistas, definindo-os como aqueles que participaram 
do movimento em favor das formas puras, contra a ornamentação dos 
edifícios e pela exploração dos recursos técnicos no urbanismo. Desta 
geração participaram Le Corbusier, Ozenfant, Gropius, Oud, Rietveit e Van 
Eesteren; foi, entretanto, principalmente a partir do Congresso Internacional 
de Arquitetura Moderna (CIAM), em 1928, que o modelo de cidade racio-
nalista passou a ser desenvolvido na prática, em diversos pontos do mundo.'] 
Planta baixa do projeto para a parte oeste do Anel de Viena, Camillo Sitte, 1889. 
24 
Seus princípios geraram os planos de sucessivas reformulações de espaços 
das cidades europeias atingidas por duas grandes guerras; mais tarde, 
o racionalismo do CIAM criou cidades novas na Euroma e também no Ter-
ceiro Mundo (Chandigahr e Brasília) e novos bairros residenciais no Velho 
Mundo e nas Américas.|Âté a segunda metade do século XX, o progressismo 
entendeu a cidade contemporânea como fruto de um movimento que produzia 
uma ruptura radical na História, e não como uma etapa de um processo 
histórico. Aceitando como positivas as ideias de progresso e modernidade, 
deslocou o interesse dos urbanistas dos aspectos sociais e económicos para 
as estruturas técnicas, funcionais e estéticas. A ausência de crítica produziu 
distorções na realidade, e passou-se a trabalhar com valores supostamente 
universais, com um espaço Idealmente indiferenciado e com metas de alcan-
çar a eficiência em todos os sentidos. 
Esquema da Cidade Industrial. Tony Garnier, 1899/1901, 
25 
Runcorn, 1967. 
I 
Com o fim da Segunda Guerra l\/lundial, o pensamento progressista adquire 
novas feições na chamada tecnotopia, onde a questão urbana define-se a 
partir de parâmetros físico-construtivos: as cidades futuristas, projetosde 
profissionais eminentemente técnicos (em gerai arquitetos e engenheiros), 
respondem a uma concepção urbana fundada nas novas tecnologias constru-
tivas, estas consideradas como capazes de responder a necessidades sociais 
tipificadas. jà segunda geração racionalista propôs-se a uma relação realista 
com a técnica, a qual não havia sido plenamente assumida anteriormente; 
entretanto, ocorre agora uma nova negação da cidade, na medida em que 
a definem como um objeto acabado e indiferenciado, com o qual os habi-
tantes relacionam-se utilitariamente. A maioria das propostas futuristas não 
se concretiza pela grandeza dos investimentos requeridos, mas seus planos 
são difundidos extensivamente, através do sistema de comunicação que já 
então congrega o mundo moderno. As cidades propostas por Fitzgibbon, 
Maymont, Kikutake. Xenakis e outros caVacterizam-se por responder com 
estruturas altamente complexas e amplo emprego de materiais, técnicas de 
construção e conforto ambiental industrializados a uma sociedade capitalista 
que se afasta de condições existenciais integradas à natureza. Finalmente, 
a cidade concebida por este novo progressismo é, equivocadamente, um 
grande edifício.^ 
Conglomerado habitacional aéreo, Isosaki, s.d. 
28 
A manifestação do pensamento culturalista no urbanismo é bem mais 
restrita, mas caracterizou-se igualmente por colocar em prática suas ideias. 
Isto ocorre, entretanto, na maioria das vezes, sob a forma de planos par-
ciais, e frequentemente de maneira indireta. Por exemplo, há influências 
culturalistas em algumas cidades novas inglesas, pela sua delimitação 
precisa tanto em termos de tetos populacionais quanto de sua extensão 
física, ou ainda pela individualidade e identidade intencionais de cada 
espaço urbano. As várias reformas urbanas por que passam cidades da 
Europa Central nos últimos trinta anos expressam valores culturalistas na 
busca de pequenas escalas e efeitos pitorescos, da mesma forma que o 
fazem, mais recentemente, centros turísticos do Mediterrâneo. Entretanto, 
Cidade móvel, Herron, s.d. 
PInno para o futuro, para Tóquio, Kurokaiwa, 1961. 
29 
a obra dos três maiores representantes do urbanismo culturalista, desen-
volvida em fins do século passado e princípios do atual, é suficientemente 
profunda para embasar toda uma concepção de cidade que se opõe ao 
modelo progressista, Choay (ibid., p. 45) afirma que, nos trabalhos de 
Camillo Sitte, Ebenézer l-íoward e Raymond Unwin, existe a constatação 
de que o espaço das cidades pré-industriais ofereceu possibilidades, através 
de suas qualidades, à realização plena de uma cultura urbana. Assim, a 
cidade do século XX é vista, pelos culturalistas, em processo de dete-
rioração de suas qualidades espaciais, no sentido de perda de valores 
historicamente aceitos. Propõem então que, recuperando-se qualidades 
espaciais, lograr-se-ia a retomada de relações sócio-culturais qualitativamen-
te superiores, e que isto seria possível adotando-se modelos de espaços 
pré-industriais, em vez de se procurar novos arranjos tipológicos. 
OARDEN C I T Y AND RURAL BELT 
Diagrama da Cidade Jardim, Howard, 1898. 
30 
O urbanismo culturalista contrapôs a noção de orgânico à de racionai, 
preconizada pelo progressismo, mas, tanto quanto o pensamento que rebatia, 
foi incapaz de representar as relações reais, que ocorrem entre espaços e 
História, nos fenómenos sociais urbanos. Reagindo em função do passado, 
considerou o tempo com a mesma capacidade de reversão própria ao espaço. 
jPorém o culturalismo introduziu certos avanços metodológicos importantes, 
que~seriam retomados na década de sessenta pelos estudiosos do espaço 
urbano, como a ênfase na abordagem histórica, tanto como forma de com-
preender a cidade quanto como método de análise de seus espaços^ 
A nova realidade capitaiista-Industrial suscitou, entretanto, dois outros Im-
portantes enfoques da cidade do século XIX: o marxista e o antiurbanista. 
Marx e Engels colocaram, diferentemente dos utopistas que lhes são con-
temporâneos, a realidade histórica como ponto de partida de seus estudos, 
procurando entender a cid âde industrial como expressão de uma nova ordem,, 
e nãô de uma desordem. Não propuseram, porém, um novo modelo físico-
espaclaí, pois somente a partir de transformações das estruturas sociais 
seria possível haver transformação nas estruturas urbanas. Neste sentido, a 
atitude crítica foi apoiada na realidade concreta, e a cidade apareceu como 
o lugar da História: a cidade capitalista do século XIX é vista como a 
expressão de uma certa ordem de que foi, em tempo, criadora, e que será 
ultrapassada. O pré-urbanismo marxista interpretou o espaço urbano como 
Fununma de Cidade com Satélites, Unwin, 1922. 
31 
uma externalidade de um fenómeno eminentemente social, e propôs, então, 
a explicação daquele através da sociedade real que o assumiu. Seus con-
temporâneos e seguidores imediatos não deixaram projetos, e alguns, como 
Kropotkine, Boukharine e Preobajensky, radicalizaram a ponto de negar qual-
quer previsão e ordenação. Mas, ao contrário das teorias utopistas, a mar-
xista submeteu-se à prática no século XX, na URSS e na China, através 
de programas de construções de cidades novas. Nestas observa-se, no 
entanto, a retomada de certas atitudes criticadas pelos teóricos marxistas 
como, por exemplo, modelos e tipologias espaciais racionalistas. 
O antiurbanismo representa a contribuição americana mais importante aos 
estudos urbanos do século XIX e primeiras décadas deste século, e o fez 
justamente pela negação do modo de vida urbano. Neste sentido, o anti-
urbanismo de Thomas Jefferson, Henry Adam e Louis Sullivan precedeu à 
obra mais acabada, no século XX, de Frank Lloyd Wright, mas em ambos 
está contida a ideia de retomada da natureza, perdida pela Revolução Indus-
trial. Embora, como no caso de Wright, se proponha a utilização dos meios 
industriais, mais uma vez a questão urbana e o espaço das cidades 
contemporâneas viram-se definidos em bases falsas, porque a proposta de 
volta à natureza coloca-se sem a compreensão do processo histórico ge-
rador da sociedade Industrial. 
i 
O espaço como um aspecto do processo urbano: 
a multidisciplinaridade 
A colocação em prática das Ideias progressistas e culturalistas provocou 
um movimento de crítica ao urbanismo, quase simultaneamente à própria 
realização de suas proposições. Já em 1910, discutla-se a obra de Patrick 
Geddes, C/f;es in Evolution, que significa o marco de uma nova maneira de 
considerar a problemática urbana, e reagia-se à arbitrariedade dos postulados 
urbanistas e ao distanciamento da realidade em que vinha Incidindo, sis-
tematicamente, o progressismo. Os países anglo-saxônicos haviam concre-
tizado, diversas vezes, o modelo racionalista em bairros residenciais e em 
cidades novas, e é aí que se desenvolve a maioria das tentativas de reto-
mar a visão global do fenómeno urbano. | é da Inglaterra e dos Estados 
Unidos que vem a expressão planejamento urbano, traduzindo certos prin-
cípios que caracterizam esta crítica ao urbanismo. A área de conhecimen-
to da cidade passou a identificar-se pelo pianning, ou seja, a constltulr-
se de procedimentos racionais que têm como finalidade a preparação da 
tomada de decisões, estas no sentido de conduzir os processos urbanos 
para metas e objetivos previamente estabelecIdos^lNò final da década de 
trinta, os trabalhos de Lewis Munford continuaram a obra de Geddes, 
introduzindo certas posturas que se afirmam contra o urbanismo: um 
contato direto com a realidade, em estudos teóricos de observação dos 
processos "in loco", mas visando, principalmente, à predominância da prática. 
Os conceitos de tempo e História referem-se a criações permanentes, e 
considera-se a cidade como ponto crítico das relações sociais de nosso 
século. Desta maneira, caíram por terra alguns sofismas tanto do urbanismo 
progressista quanto do culturalista: não se especulou, então, com caracteres 
típicos e universais, e a cidadeIndustrial começa a ser considerada am-
plamente como uma etapa do processo histórico, ligada tanto à era pré-
Industrial quanto ao futuro; a perspectiva histórica passa, portanto, a ser 
caracterizada como Irreversível e a significar uma transformação do passado. 
Associada à definição da cidade a partir de uma realidade histórica, a 
abordagem dq contexto urbano passa a ser realizada segundo uma visão 
processual, onde aparecem com destaque os aspectos dinâmicos daquele. 
Esta atitude, por um lado, conduziu a uma avaliação mais precisa da 
cidade Industrial, revelando certas qualidades da mesma; por outro lado, 
permitiu o desenvolvimento de uma metodologia de Investigação da questão 
urbana fundada sobre conhecimentos sociológicos, tecnológicos, económicos 
e mesmo físico-espaclals, que se apoiam na própria História. Entretanto, 
33 
não se deve esquecer que o conhecimento do fenómeno urbano passa 
também, com o planejamento, a estar em função de ações de intervenção 
na realidade, abandonando, quase sempre, as pretensões científicas colo-
cadas pelo urbanismo. A cidade tornou-se uma entidade observada à luz 
de raciocínios que se voltam a definir problemas na mesma, e a propor 
soluções para eles, compondo um movimento de controle dos processos 
urbanos. Esta característica foi fazendo com que o planejamento urbano 
se afirmasse como instituição intimamente associada ao poder público e, 
obviamente, com ele comprometida. . 
Enquanto contribuição ao conhecimento das cidades contemporâneas, a 
característica mais peculiar do planejamento urbano reside na entrada em 
cena de várias disciplinas; contrapõs-se, desta forma, ao papel especializado 
que o urbanismo assumiu diante da organização da sociedade industrial. 
Bournville, 1879: Cadbury Chocolate Works. 
34 i 
Entretanto, a forte herança positivista do mundo ocidental coloca vários 
entraves a que se assuma plenamente a globalidade da questão urbana, 
principalmente porque tal implica contradizer a própria divisão profissional 
e académica vigente. A multidisciplinaridade no planejamento urbano tem, 
talvez, procedido exatamente no sentido oposto à busca do enfoque da 
cidade como uma entidade global, pois tem feito com que a problemática 
urbana seja objeto de várias disciplinas. Porém, ao receber a colaboração 
de sociólogos, historiadores, economistas, juristas, geógrafos, psicólogos 
etc, a definição da cidade realizada pela arquitetura entrou, talvez, na 
maior crise de toda a história desta última. Predominando sobre as tradi-
cionais abordagens defarquitetos, engenheiros e técnicos, comunicaram 
seus métodos e procedimentos aos profissionais do melo físico-espacial. 
Entre o finai da Segunda Guerra Mundial e da década de sessenta, a par-
ticipação do arquiteto no planejamento urbano é ambígua, como se, aban-
donando as posturas que o caracterizaram na era pré-lndus^rlal e no 
urbanismo, não conseguisse redefinir seu enfoque do fenómeno urbano, 
ante a maciça contribuição de outras disciplinas frente ao mesmo objeto 
teórico. Este fato trouxe como conseqíjêncla uma paralisação no estabele-
cimento das bases paradigmáticas da arquitetura; em contrapartida, 
avançou-se na explicação da questão urbana enquanto fato sociológico, 
económico e geográfico, onde o espaço é abordado, coerentemente, como 
um objeto sujeito àquelas disciplinas. Em outras palavras, estas contribui-
ções locallzam-se mais em relação à compreensão da cidade como processo 
onde o espaço é o reflexo, o resultado ou o residual, e não onde o mesmo 
é o próprio corte epistemológico. 
A sociologia e o espaço urbano 
As Interpretações sociológicas da cidade surgiram nos Estados Unidos, 
contemporaneamente ao trabalho de Geddes: em 1916, Parle publicou a obra 
inicial da escola ecológica ou de Chicago, cuja produção de pesquisa abas-
teceu grandemente a sociologia urbana. Há dois momentos no grupo dos 
ecóiogos: o primeiro é representado pela escola de Chicago e o segundo, 
que se desenvolve a partir dos anos cinquenta, é conhecido como neo-
ecologia. Em ambos, foram transpostos princípios da ecologia para explicar 
as organizações sociais urbanas, e teve-se como objeto de estudo as relações 
entre o melo (e não entre o espaço) e a sociedade. A escola de Chicago 
foi culturalista ao retomar indicadores típicos e ao se vincular à teoria 
evolucionista das culturas; tais características estão contidas na obra 
daqueles que são os nomes mais expressivos do movimento: Park, Burgess 
e Mc Kenzie. A neo-ecologia tem seu marco na obra de Hawiey, mas 
Influenciou estudos sociológicos de caráter comportamentalista, principal-
mente através de Duncan e Schnore. Castells (1974, p. 148-149) refere-se 
a tais trabalhos como Introduzindo aspectos psicossociológicos nos estudos 
35 
de sociologia urbana, porém de maneira abstraía, sem considerar estrutura 
de classes ou divisão social do trabalho, e identificando população com 
organização social. 
Paralelamente a estas duas tendências ecológicas na sociologia, desenvoi-
veu-se o empirismo quantitativo, exercendo influência na Europa e Estados 
Unidos nos anos cinquenta. Este grupo de estudiosos caracterizou-se por 
analisar a questão urbana a partir de indicadores mensuráveis e sob uma 
ótica eminentemente prática; não se obteve, como resultado, produções 
teóricas de sociologia da cidade, mas apenas classificações baseadas em 
certos indicadores (por exemplo, tamanho do espaço ocupado por deter-
minado grupo social). Segundo Reissman (ibid., p. 104), as classificações 
empiristas oferecem a vantagem apenas de se poder medir, objetivamente, 
os indicadores que lhes serviram de base, pois se apresentam Incapazes 
de estabelecer claramente a aplicabilidade do indicador aos fatores funda-
mentais da sociedade urbana. 
Ao empirismo dos ecóiogos e quantitativos, contrapõem-se diversos cientistas 
sociais, em esforços por lograr uma teoria sociológica urbana. A estes, 
chamados por Reissman (Ibid., p. 139) de teóricos da cidade na sociologia. 
coube a preocupação em definir o fato urbano pelo seu contrário, o meio 
rural, destacando-se as proposições de Durkheim, Weber, Toennies, Spencer, 
e as teorias dedutivas de Simmel, Davis e Louis Wirth. De uma maneira 
geral, o estudar-se as relações entre o rural e o urbano como veículo de 
explicação deste último possibilitou a Inserção do fato urbano na globa-
lidade dos próprios processos sociais, porém tais relações não têm sido 
definidas sem alguma ambigijidade. Existem, nestes trabalhos, certas ten-
dências diferentes e básicas de análise das relações entre o melo rural e 
o urbano, mas, segundo Velho (1976), em qualquer destas, o aspecto 
diferenciador entre o rural e o urbano é o aspecto ambiental, e se recai 
em determinismos ecológicos. Na verdade, seria necessário entender o 
melo ambiente como natureza historicamente redefinida para determinada 
sociedade, a fim de que o mesmo pudesse conduzir à compreensão das 
diferenças entre rural e urbano. 
Os estudos teóricos sobre o espaço urbano, realizados peia sociologia, 
são, na opinião, de Castells (ibid., p. 152), uma simples translação e 
especificação da teoria da estrutura social, de modo a explicar as carac-
terísticas de uma forma social particular — o espaço — e sua articulação 
com outras formas e processos historicamente dados. Neste sentido, mesmo 
nos estudos atuais da sociologia urbana, comparece uma dicotomia entre 
espaço e sociedade, na qual prevalece o determinismo das instâncias ana-
lítica dos modos de produção e, geralmente, da economia. O próprio 
Castells (Ibid., Ibid.) propõe que se proceda à análise do espaço urbano a 
partir de sua definição como expressão da estrutura social e através do 
36 
estudo da sua produção pelos elementos dos sistemas económico, politico 
e ideológico bem como pela combinação de tais elementos e das práticas 
sociais derivadas. 
A economia e o espaço urbano 
O pensamento económico em relação à cidade expllcita-se posteriormente 
às abordagens da escola de Chicago, mas suasraízes estão em tempos 
longínquos, nos próprios clássicos da economia (Adam Smith, Ricardo) e 
na interpretação marxista. Tal explicitação representa um movimento de 
aproximação ao espaço no plano teórico, podendo-se registrar, nas origens, 
uma Interpretação abstrata do mesmo, quando não uma franca Indiferença. 
Desenvolvem-se dois níveis de abordagem, correspondentes à macro e à 
microeconomia, os quais revelam um Impasse disciplinar na medida em 
que existe, tal como nestas duas últimas, um abismo a separá-los. 
A macroeconomia apresenta-se através das teorias regionais, transposições 
das teorias de relações internacionais; podem-se citar três grupos teóricos 
dentro daquelas: um primeiro formado pelas teorias neoclássicas; um se-
gundo composto pelas teorias keynesianas (onde encontram-se a Teoria 
da Base de Exportação e a regionalização do modelo de Harrod-Domar); e 
um terceiro grupo representado pela teoria do ciclo do produto de Vernon 
(tendo como hipótese básica a igualdade de condições, entre os países de-
senvolvidos, no acesso aos conhecimentos tecnológicos, e a fraca importân-
cia do problema das transferências de capitais). Esta última teoria representa 
um avanço sobre as anteriormente citadas, pois, enquanto aquelas não 
possuíam especificidade espacial, a de Vernon coloca diferenças espaciais 
nos elementos de análise (como níveis de renda, fontes de informações, 
reservas de mão-de-obra, etc). 
É, entretanto, segundo LIpletz (1977, p. 104), a nível microeconômico que 
se situam as elaborações capazes de Inscrever a economia de forma 
material no espaço; desenvolvem-se várias teorias de raízes clássicas e, 
mais modernamente, algumas críticas às mesmas sob a forma de propos-
tas de novos paradigmas. As teorias clássicas são conhecidas, a nível 
microeconômico, como teorias de localização, e possuem dois momentos 
fundamentais de interpretação da economia ocidental. O primeiro situa-se 
em relação ao capitalismo concorrencial, tomando como dados um sistema 
de preços sobre o qual o agente privado não se distingue por suas 
decisões, ao contrário do segundo momento, monopolista, onde a divisão 
social do trabalho tem seu desdobramento determinado pelas decisões 
dos agentes das firmas que detêm os monopólios. As teorias de locali-
zação elaboradas em função do capitalismo concorrencial partiram da 
teoria microeconômica marginalista de Walras e Pareto, e foram incor-
porando a noção de espaço de formas diversas. Como um espaço de 
37 
localização, o elemento básico de análise são relações de distância entre 
os componentes da produção, e suas consequências de custos económicos; 
o espaço é reduzido a suas coordenadas geográficas (Launhardt, Alfred 
Weber), Interpretado segundo efeitos devidos ao cruzamento de processos 
de produção e de valorização (Isard e as "economias de aglomeração") 
ou, reagindo aos pressupostos marginalistas, sendo abordado fora de seus 
aspectos estruturais (Hotelling e o "jogo do oligopólio"). Estes desenvol-
vimentos da teoria walraslana foram criticados por Von Boeventer (1962) 
e por Koopmans e Beckmann (1967), concluindo-se que os modelos de 
Inspiração marginalista não levam em conta a constituição do espaço 
social, por ser justamente no desdobramento espacial que se manifesta 
mais claramente a contradição soclal-privado, esta própria ao modo de 
produção capitalista (LIpletz, Ibid., p. 112-113). 
Outra maneira de abordar a questão de localização, na fase concorrencial 
do modo de produção capitalista, define o espaço como um campo de 
tensões, Isto é, não apenas sob o ponto de vista das distâncias, mas 
como um "continuum" de duas dimensões, onde cada ponto é afetado por 
um número ou por um quadro de números, como é o caso, por exemplo, 
dos campos magnéticos. Retomando os antigos estudos de von Thuenen 
sobre renda do solo agrário, Alonso (1967, 1971) apresenta um elemento 
novo na explicação dos processos sociais de produção em meios urbanos 
e, ao fazê-lo, introduz de forma explícita a abordagem económica do espaço 
urbano. Este autor sugere que se adicione, aos já classicamente aceitos 
"custos de transportes", o "preço do solo". O modelo de Alonso é criticado 
na obra de LIpietz (1974, 1977), onde se aprofundam os aspectos de renda 
fundiária urbana: os principais pontos objetos de crítica são os próprios 
fundamentos epistemológicos, que não levaram então em consideração o 
fato de que as modificações no processo de divisão económica do espaço 
são, em cada momento, efeito da totalidade de Instâncias da formação 
social. 
As teorias de localização no capitalismo monopolista adquiriram uma ní-
tida apreensão social, mas não estão libertas de uma atitude funclona-
lista que supõe, por detrás do desenvolvimento espacial, uma racionalidade 
mal definida em relação a seus agentes. Baseiam-se em uma abordagem do 
espaço como sistema, como é o caso da teoria do lugar central, de Losch, 
Christaller e da escola de Jena. Afirmam estes que o espaço geográfico 
humano, é estruturado pelas próprias caracterizações económicas, em uma 
"rede de sistemas" que qualifica o espaço de maneira funcional e pouco 
concreta. Esta teoria tem tido ampla aplicação, em que pesem, por um 
lado, a especificidade dos espaços com que especula (o que implica sérios 
problemas de generalização) ê por outro lado, uma contradição explícita 
entre suas pretensões explicativas (LIpletz, ibid., p. 118-119) e seus 
resultados classificativos. Outra conhecida teoria de localização é a dos 
38 
pólos de desenvolvimento, criada por Perroux e desenvolvida por Paelinck. 
Ao primeiro deve-se a concepção de um espaço abstrato, na medida em 
que o conceito de espaço deva ser, sempre, relativo aos tipos de proble-
mas propostos; nessa teoria colocam-se com maior clareza as finalidades 
de compromisso com um equilíbrio social a partir de uma situação eco-
nómica "harmónica", razões estas suficientes para que a mesma tivesse 
ampla penetração no planejamento urbano. Entretanto, em parte nas suas 
bases, mas principalmente em seus desdobramentos, a teoria dos pólos de 
desenvolvimento construiu representações Idealistas da realidade. 
O enfoque do espaço urbano pela economia comprometeu-se, em resumo, 
com um conceito matemático, e portanto abstrato, do mesmo: as aborda-
gens do espaço enquanto natureza física limitam-se a duas dimensões e 
portanto a um plano, ou definem-se como atitudes empiristas. A obra de 
LIpletz (ibid., Ibid.) assume o processo de conhecimento do espaço como 
genealogia (Ibid., Ibid., p. 116), determinada por efeitos da totalidade das 
Instâncias da formação social e, desta forma, é de cunho explicativo. Po-
rém, sua concepção de espaço prende-se a um " . . . espaço sóclo-econômico 
concreto (que se apresenta) como a articulação dos espaços analisados, 
como um produto, um reflexo da articulação das relações sociais". ÍLipietz, 
ibid., p. 22). 
Por um lado, tais formulações Inserem o conceito de espaço na dimensão 
global da realidade, e o fazem, através deste movimento, um objeto con-
creto de conhecimento; por outro lado, entretanto, o corte epistemológico, 
localizado na sócio-economia, distancia tal conceituação de toda a natureza 
física que é própria ao espaço urbano. 
A geografia e o espaço urbano 
Cabe à moderna geografia a busca de paradigmas que irão contribuir, de 
maneira direta, ao esclarecimento do espaço urbano como área de conhe-
cimento. Até meados da década de cinquenta predominava, entretanto, 
uma abordagem da cidade pela geografia que a considerava de forma 
Isolada, sem preocupar-se necessariamente em estabelecer suas relações 
com a região que a contém ou com o melo rural. São estudos eminen-
temente descritivos, sob a influência de Monbeig, onde comparecem coor-
denadas de sítio físico, dados sobre a evolução histórica do assentamento 
e sua estrutura Interna. Refletem uma ausência total de preocupações teó-
ricas ou explicativas, e são produtos de uma filosofia funclonallsta, que 
caracteriza a cidade através das atividadesque nela se desenvolvem (as 
chamadas "funções urbanas"), sem contudo Indagar sobre a génese das 
mesmas nem sobre sua estrutura social. Uma primeira mudança nesse 
39 
quadro disciplinar começa a ocorrer sob a influência da teoria do lugar cen-
tral desenvolvida na área económica, e liga-se aos nomes de Tricart e 
Rochefort, deslocando o enfoque do âmbito intra-urbano para o regional. 
Este último passa, então, a ser entendido como um conjunto de assenta-
mentos urbanos e de áreas rurais, onde os primeiros constituem os pontos 
de amarração da estrutura de ocupação do território. Estudam-se certas 
relações entre as cidades, baseadas nos princípios da referida teoria, e 
estabelecem-se áreas de influência e hierarquia funcional urbanas. Ocorre, 
então, uma clara separação entre os dois níveis de abordagem, o intra-
urbano e o interurbano, a exemplo da dicotomia verificada no caso da 
macro e da microeconomia, preponderando, nesta fase, os estudos de redes 
urbanas. Ainda que já expressem um referencial teórico, sua conceituação 
^ilui-se em torno a características abstratas que se afastam progressiva-
mente da natureza física do objeto geográfico. Essa tendência prossegue 
quando se introduzem técnicas de análise quantitativa, como a teoria dos 
grafos, análise de regressão, análise fatorial e de grupamento, recaindo-se 
em posturas normativas, em detrimento de atitudes explicativas. Tais técni-
cas nasceram nos Estados Unidos e Inglaterra, através de Cole, Gauthier 
e Brian Berry, mas logo espalharam-se por todo o mundo ocidental. Con-
tudo, passa também a haver um desenvolvimento paralelo de esforços no 
sentido de tomar conhecimento de teorias urbanas, bem como de desen-
volver um corpo teórico próprio; esses, porém, não chegam a caracterizar 
esta fase tanto quanto o seu sentido prático, ou, segundo alguns autores, 
pragmático. Dentre estes últimos, Corrêa (s/d] considera que houve então, 
realmente, um abandono do campo académico para enfatizar estudos dire-
tamente aplicáveis ao planejamento urbano e regional. 
A crítica aos estudos clássicos de geografia urbana tem-se pautado tanto 
em termos de denunciar uma abordagem empirista e, depois, idealista 
(Walton e Masotti, 1976) quanto de Indagar sobre o papel efetivo do espaço 
nas abordagens geográficas. Neste sentido. Santos (1979, 1979) refere-se 
a que a geografia, na maioria dos casos, se limitou a considerar o espaço 
como cenário de ações humanas (Fébvre e Pahl comentam que esta disci-
plina parte do solo e não do espaço) e a interessar-se predominantemente 
pela forma dos objetos do conhecimento do que pela sua formação (Bou-
devllle, Rodwin, Friedman). Contrariamente, aquele autor procura um marco 
teórico para o espaço urbano, através de suas características sociais: 
"Se a Geografia deseja interpretar o espaço humano como o fato histórico 
que ele é, somente a história da sociedade mundial, aliada à da sociedade 
local, pode servir como fundamento à compreensão da realidade espacial, 
e permitir a sua transformação a serviço do homem. Pois a História não se 
escreve fora do espaço e não há sociedade a-espaclal. O espaço, ele mesmo, 
é social". [Santos, Ibid., p. 9-10). 
40 
O espaço como meio ambiente de vivência: 
bases psicológics^ para normas de desenho urbano 
• í . • • ; 
A ideologia de planning trouxe certos problemas para a caracteriza-
ção da disciplina do espaço. Vimos que, sob o planejamento urbano, o 
espaço das cidades é considerado um objeto principalmente de prática e 
não de especulação, e as propostas físico-espaciais são formuladas a partir 
de diretrizes ou planos socioeconómicos e institucionais. Por conseguinte, 
o espaço urbano é prefigurado através de outros campos disciplinares — 
quando não é totalmente omitido: por exemplo, a maioria dos trabalhos 
de planejamento urbano realizados no Brasil é de caráter predominante 
ou exclusivamente económico. Quando existem propostas físico-espaclals, 
estas se têm constituído em tarefa de uma área que surge nos países 
anglo-saxónicos, a partir do término da Segunda Guerra Mundial, e que 
se conhece como urban design. Trata-se de um campo que envolve geral-
mente conhecimentos técnicos e artísticos, onde se desenvolvem atividades 
cognitivas de cunho normativo. Em outras palavras, os esforços têm sido 
aí direcionados visando ao estabelecimento de normas de projeto físico^ 
espacial. As etapas analíticas do processo de projetação, onde se deveriam | 
ter desenvolvido os aspectos explicativos, continuam dependentes de ou-
tras áreas de conhecimento, e o espaço, explicado através da sociologia, 
da economia ou, mais recentemente, da psicologia, e antropologia. As 
realizações práticas são Inumeráveis, no mundo Inteiro, e abrangem desde 
cidades Inteiramente novas, bairros residenciais, conjuntos habitacionais, 
reformas e "cirurgias" nos tecidos urbanos. O compromisso do desig-
ner moderno não tem sido outro que aquele do urbanista, e se expressa, 
às vezes, de forma mais contundente, ao consolidar a alteração radical de 
estruturas sócio-espaciais, como, por exemplo, na segregação de popula-
ções de baixa renda através da produção de conjuntos habitacionais. En-
itretantoW^ urban design caracterizahS£_j[e_fpxm.a^^ dq urbanismoT 
na mediSa èm ~que~W do encontro ^^multidlscipilnarp 
pelõ"píãnejanrientq urbâ ^̂ o espaço não^é mais um objeto 
Isólãdd, mas integrado aos demais aspectos da realidade urbana.iProcurã~ 
se^Tíõrêm, Investigá-lo, cõmõ~"Ta" fõF cõíõĉ ^̂ suas relaçõfes com 
outros planos analíticos. É neste momento que entram em cena contribui-
ções de outras áreas de conhecimento até então desvinculadas da abordagem 
físico-espaciaiji 
41 
A década de cinquenta assinala a presença da reflexão e das atitudes 
analíticas para com o espaço urbano, e o envolvimento com o mesmo por 
parte da psicologia, da antropologia e da ecologia. Isto ocorre através de 
uma produção maciça de pesquisas que consideram o espaço em função de 
sua relação com os indivíduos; Choay (ibid., p. 58-73) caracteriza a postura 
tomada por estas Investigações segundo três pontos. Primeiramente, é uma 
postura humanista, que coloca em crítica permanente os princípios racio-
nalistas mas que Implica, muitas vezes, uma tomada de posição cultura-
lista; em segundo lugar, contrapõe, à construção de modelos, o enfoque 
metodológico, este caracterizado pela participação dos usuários na análise 
e na configuração dos espaços onde vivem. Finalmente, é característica 
presente, em quase todos os estudos, uma perseguição de relações de 
causa e efeitos; só recentemente, e em alguns poucos trabalhos, proce-
de-se de forma mais dialética. Contudo, autores como Rapoport (1971), 
Hllller (1972, 1976) e Hillier, Musgrave e OSullivan (1972) afirmam que na-
queles está latente, mas ainda não compreendido, o problema dos agentes de 
configuração do espaço social e, neste processo, como se situa o desig-
ner. Entre a década de clnqUenta e meados da década de sessenta, as 
Investigações realizadas não explicitaram esta questão, mas voltaramse 
predominantemente sobre as relações estabelecidas entre os usuários e o 
espaço urbano de consumo; oculta-se de tais, quase sempre, o processo 
de produção social que os oriflinou. Desta forma, chega-se quase sempre 
a resultados insuficientes, para a explicação tanto das relações de uso do 
espaço urbano pelos seus usuários, quanto para a real definição da proble-
mática dos seus agentes de configuração. 
Podem-se agrupar algumas tendências desenvolvidas neste período em 
torno de dois grandes pensamentos: o comportamentalismo e o psiquismo. 
\ c o m p o r t a m e n t a l i s m i ^ 
IBob esta denominação, estamos agrupando os estudos que toram realiza-
dos a partir de supostos efeitos da cidade, enquanto espaço, sobre o com-
portamento humano. De uma maneira geral, estes estudos reduziram a 
realidade a situações típicas, tanto em termos físico-espaclals quanto como 
'categorias psicológicas, e não se preocuparam em esclarecer o conceito 
de espaço,o qual, não raro, dllui-se na noção de meio ambientí] Choay 
(Ibid., p. 65) fala de vários autores comportamentalistas como urbanistas 
da higiene mental, em virtude de sua preocupação com elementos como 
segurança emocional, que não coincidem necessariamente com condições 
físicas de higiene, e que seriam fornecidos ou não pelo espaço das 
cidades aos que o utIllzamjO ponto de partida desta tendência são os 
trabalhos publicados no final da Segunda Guerra, sobre psicologia da pri-
42 
meira infância, ou sobre psicologia social, como os de Anna Freud e J . 
Bowlby, onde se demonstra que a integração do comportamento humano 
no meio urbano está ligada à presença de um certo clima existencial. 
No estudo da relação homem-meio ambiente urbano, a partir dos compor-
tamentos sociais, os produtos mais sistematizados localizam-se nos anos 
sessenta, ainda que seus precursores estejam na década anterior. Tais 
trabalhos utilizam-se geralmente de bases empíricas e desenvolvem-se 
tendo como laboratório cidades norte-americanas: são de 1950 os traba-
lhos de Festinger e Capiow, onde o meio ambiente físico tem grande 
relevância no estudo de grupos sociais; em 1951, Barker e Wright concluem 
que o meio ambiente ecológico não apenas solicita comportamentos, mas 
é permissivo, aceitativo ou restritivo. Aparecem estudos voltados a con-
ceitos de território físico, a partir dos seus usuários: é o caso de Blumen-
feld, em 1953, procurando chegar a uma conceituação de bairro, e o tra-
balho de Wenner, em 1954, versando sobre a área expressiva e de signifi-
cações simbólicas na interação homem-meio ambiente. Podem ser citados 
ainda, nesta década, Gullahorn, em 1952; Byrne, em 1955; Black em 1956 
e Sommer e Ross, em 1958. Os resultados a que se chegou até então são, 
entretanto, pouco precisos. A metodologia de pesquisa procurou, em geral, 
adaptar procedimentos da psicologia experimental, voltada incisivamente 
para os campos fechados, e houve certa insistência dos estudiosos nos 
princípios do determinismo. Buscaram-se estabelecer relações de causa e 
efeito, entre espaço físico e indivíduos, a partir de posturas assentes no 
hipotético papel predominante das condições ambientais sobre um sistema 
neurovegetativo supostarnente autónomo em relação à consciência, e típico 
em relação às estruturas sociais. 
É somente nos anos sessenta que se concentra uma quantidade razoável 
de estudos comportamentalistas, atingindo-se resultados a permitirem, pelo 
menos, discussões mais concretas. A influência determinista fez-se ainda 
sentir nos primeiros trabalhos, mas foi sendo relativizada por outras filo-
sofias. A primeira atitude neste sentido substituiu as determinações pelas 
influências do meio ambiente sobre seus usuários; o chamado environmen-
talismo (a partir de environment = meio ambiente) constitui-se, na ver-
dade, em uma variação do determinismo, porque acreditou que os fenóme-
nos físicos, tomados como base das pesquisas, condicionavam o compor-
tamento humano. A segunda atitude representou uma reação ao environ-
mentalismo e à teoria evolucionista de Spencer; considerou o meio am-
biente como um conjunto de possibilidades e limitações ao homem, o 
qual possuiria a capacidade de transformar a natureza conforme seus obje-
tivos e conforme as condições oferecidas pela ciência e pela técnica. 
Este enfoque, conhecido como possibilista ou pragmático, tem suas raízes 
no século passado (March, 1860), na ideologia progressista que fez a 
apologia da sociedade industrial científico-tecnológica. 
44 
Em todas estas tendências, há simplificações evidentes nos modelos utiliza-
dos, porque não se trabalha com estruturas sociais ou culturais, e porque 
não se definem os usuários das situações estudadas através de suas 
características reais, as quais compreenderiam o conceito de classe social. 
Os elementos de análise são sempre tipificados, e este atributo estende-
se. Igualmente, aos Indivíduos, que passam a pertencer, como homens-tipo, 
a categorias ideais. Os condicionantes da ação humana sobre a natureza 
aparecem sob a forma de custos gerais. Impostos por um sistema que não 
é caracterizado pelos seus aspectos essenciais, mas pelos fenómenos apa-
rentes. Dykman e Rossow, em 1961, foram pioneiros nestas linhas de estu-
do, às quais segulu-se a crítica de cientistas sociais como Weber, Broady 
e Ganz, na segunda metade da década de sessenta. Estas críticas ao deter-
minismo exercido pelas Influências do meio ambiente sobre o comporta-
mento humano foram confirmadas por outros sociólogos e alguns psicólogos, 
através de experiências realizadas, primeiro em campo fechado (RIchards, 
Wells), e, mais ao final da década, em campo aberto (Aronof, Michelson). 
Os resultados constatam algumas Influências, especificamente, da configu-
ração do melo ambiente sobre o comportamento de seus usuários, mas não 
existem ainda condições de aceitá-los como paradigma científico. 
Os trabalhos de Jane Jacobs, a partir de 1961, causaram então grande im-
pacto, em parte devido ao seu tom polémico, mas principalmente por nega-
rem os princípios ascéticos do urbanismo através do elogio à megalópole. 
Paris, a cidade das três personalidades, segundo o Atlas von Braun, 1575. 
45 
às ruas e à aglomeração; sua jirincipal virtude, no entanto, é haver baseado 
as teses formuladas em informações sociológicas profundas. Porém, foi nos 
últimos dois anos da década de sessenta que se estabeleceram constatações 
suficientemente claras e generalizáveis nos estudos comportamentalistas, 
primeiro através de Lee (1969), e depois em outros trabalhos que concluem 
ser o melo ambiente físico multo determinante no comportamento humano. 
Em 1969, Alexander relativizou bastante esta determinação e permitiu a 
formulação de uma síntese do desenvolvimento do pensamento comporta-
mentalista até então: "Todo efeito do melo ambiente sobre o comportamento 
humano é complexo e envolve Influências sociais e psicológicas tanto quanto 
as do meio ambiente físico'. 
O psiquismo 
A conclusão formulada anteriormente introduziu, ao final dos anos sessenta, 
outras direções ao pensamento que se vinha desenvolvendo sobre o espaço 
urbano como melo de relações humanas. A nova tendência tem sido conhe-
cida como psiquismo, porque aborda estritamente os aspectos psicológicos 
das relações entre os Indivíduos e o espaço urbano. É verdade que este 
enfoque existiu subjacente a vários estudos comportamentalistas, porém o 
psiquismo caracterizou-se, por um lado, por situar seus objetivos na área 
psicológica e, por outro, por haver diluído consideravelmente as Influências 
deterministas. Trabalha-se freqiJentemente com categorias e correlações, 
deslocando sempre o centro de gravidade do objeto de estudo para o eixo 
da relação, em contrapartida aos elementos desta relação. O melo ambiente 
é definido como melo ambiente psíquico, ou como melo ambiente percebido; 
considera-se, portanto, a realidade a partir de sua decodificação pelos 
indivíduos. A relação entre estes e o meio ambiente é entendida como 
uma Interação entre ambos os elementos, estabelecida a partir dos sinais 
de comunicação do meio ambiente e os receptores sensoriais humanos. Em 
termos metodológicos, têm-se colocado duas alternativas, ambas discutíveis, 
pois, ou se atuam em campos extremamente empíricos, ou se perseguem 
resultados generalizáveis através de modelos típicos. Quando trabalhou 
sobre esta segunda hipótese, o psiquismo recaiu em características do 
comportamentalismo, e Identificou-se com o probabilismo, atitude que parte 
de modelos previsíveis de comportamento. Chega-se, desta forma, apenas a 
esquemas como resultado das pesquisas, abastecendo a filosofia do ajuste 
do mundo e da sociedade a padrões fornecidos por elementos típicos. 
Dentro do psiquismo, desenvolveu-se o chamado ecologísmo, que se mani-
festou como uma tendência dentro daquele sempre que utilizou métodos 
46 
probablllstas, mas que, outras vezes, Inseriu-se francamente dentro do ponto 
de vista comportamentalista.Os primeiros trabalhos ecologistas, no início 
i dos anos cinquenta (Barker e Wright, Ibid.), apresentam esta última caracte-
rística, e segulu-se a eles um Qeríodo sem outras contribuições no caminho 
proposto. Foi na década seguinte que se introduziram noções claramente 
ecológicas no estudo das relações entre os indivíduos e o meio ambiente, 
através de Rosegren e Devault (1963), Wecker (1964) e Berger (1966), entre 
outros. Passou-se a considerar o edifício ou a cidade como um meio, que 
interage com outros fatores e que Influencia outras interações; tornam-se 
então correntes noções como de seleção de habitat, de território etc. Em 
1968, Lawton introduziu a hipótese de docilidade do meio ambiente, escla-
recendo o impasse do comportamentalismo frente aos diversos modelos de 
análise utilizados. 
A concepção de competência abriu caminho a investigações sobre a estru-
tura humana e relativizou bastante a influência da Ideia de "homem-tipo"; 
porém, vários anos antes, Ittelson (1960) já colocara que o efeito do meio 
ambiente sobre os indivíduos seria uma interação complexa e ecológica, e 
havia Introduzido em seus estudos a teoria de sistemas. A abrangência dos 
trabalhos de Ittelson é enorme, ainda que haja recaído em algumas contra-
dições; promoveu uma classificação de sete áreas de Interação homem-meio 
ambiente que contém a maior parte dos trabalhos ecologistas. 
A grande maioria das pesquisas sobre as relações entre indivíduos e meio 
ambiente, desenvolveu-se na área integrável (sexta na classificação de Ittel-
son). Durante os anos sessenta, houve grande número de trabalhos, rea-
lizados sobre temas específicos, mas que partiram de supostas necessi-
dades comuns e essenciais aos Indivíduos. Por exemplo, pode-se citar uma 
série de estudos sobre privacidade, a partir de observações em espaços fe-
chados ou em pequenas frações urbanas: Ittelson e Proshansky (1966), 
Hall (1959, 1966), Bracey (1964), Kuper (1967), Duffy (1969) e Pastalan 
(1968) . Ou ainda vários estudos sobre a noção de território, onde se 
observaram principalmente grupos psicopatas ou idosos. Roos (1969), Altman 
e Hawthome (1967). Madge (1950), Lowenthai e Prince (1965) e Rainwater 
(1969) dedicaram-se ads aspectos topológicos fundamentais, pesquisando 
sempre com grupos homogéneos, tais como escolares, baixas rendas, 
pessoas idosas. 
Entretanto, as Investigações que trouxeram maiores subsídios para a prática 
de projeto de espaços urbanos foram as que se preocuparam com os 
efeitos da aglomeração e com as chamadas qualidades ambientais. Nos 
primeiros, formam-se duas opiniões frontalmente diversas: por um lado. 
De Lauwe (1967) fixa limites absolutos para densidades e populações, e 
Levine (1962) acredita que a aglomeração gera comportamentos agressivos. 
47 
no que é seguido por outros autores nos próximos anos. De outro lado, 
Jacobs (1961), Schmitt (1966), Lee (1968), Wllmott (1962) e Rapoport 
(1969) Iniciam proclamando a relação direta e positiva entre aglomeração e 
urbanidade, e acabam relativizando a afirmação. Há, ainda, toda uma série 
de estudos sobre conceitos como promiscuidade, amizade e interação, 
com resultados Igualmente pouco homogéneos. As qualidades ambientais 
comparecem como um conceito ainda mais flexível; variam de qualidades 
essencialmente estéticas aos chamados aspectos sensoriais do meio am-
biente, pesquisados em rodovias por Tunnard, Pushkarev (1963). Carr e 
Schissler (1969). 
Deve-se qualificar a maioria dos trabalhos ecologistas como tentativas 
profundas em detectar a real Influência do melo ambiente físico sobre o 
comportamento humano. Embora sua contribuição ao psiquismo se tenha 
dado através de vias situadas em outra tendência, e ainda que este fato 
demonstre o quanto comportamentalismo e psiquismo apresentam áreas 
comuns, as conclusões deixadas pelo ecologísmo representam um avanço 
na discussão comportamentalista, em termos de relatividade e flexibilidade: 
"O homem não é Infinitamente adaptável, há limites ambientais à sua 
adaptação, porém estes limites não são fixos nem universais. Os conceitos 
que servem de base ao estudo dos efeitos do melo ambiente sobre o 
comportamento humano, como privacidade, orlentabilldade, noção de ter-
ritório, longe de serem simples e absolutos, são sempre complexos e 
relativos, vinculados ao momento histórico' (Rapoport, 1971, p. 7). 
Dnminho de Gordon Cullen, caracterizando efeitos visuais em Trowbridge, 1961. 
49 
Dentro ainda do psiquismo, delineou-se, há quase trinta anos, uma tendência 
a enfatizar os aspectos visuais do meio ambiente urbano, reagindo às 
ideias dominantes que, tanto no urbanismo quanto no planejamento urbano, 
limitaram as estruturas espaciais urbanas a requisitos funcionais, cons-
trutivos e económicos. Os trabalhos desta tendência procuravam recolocar 
a questão estética de forma diferente dos culturalistas, como atitude 
necessariamente existente, em toda relação do homem com a natureza, 
seja esta a primitiva, ou a socialmente transformada. Não se especulou, 
então, com parâmetros estéticos universalmente aceitos, mas procurou-se 
investigar sobre qualidades espaciais, partindo do ponto de vista dos 
usuários de situaçóes urbanas reais. Continua subjacente, entretanto, a 
preocupação com dimensóes psicológicas, colocando-se, não raro, necessi-
dades típicas neste plano, como, por exemplo, necessidade de orientação 
ou de sentimento de lar. Nesta tendência, pode-se reconhecer uma certa 
bifurcação de caminhos, estabelecida a partir de metodologias e das rela-
ções entre teoria e prática: tem-se, por um lado, o caminho das escolas 
de bom desenho e, por outro, aquele das escolas de análise de percepção. 
As escolas de bom desenho são também chamadas de pragmáticas; sur-
giram e se concentraram na Inglaterra na década de cinquenta, retomando 
a herança do espaço anglo-saxõnico que havia sido historicamente diluída 
por duas guerras e pelo urbanismo racionalista. Gordon Cullen e seu livro 
Townscape (1961] são conhecidos mundialmente, participando da polémica 
entre a teoria de desenho clássica (que propunha a clareza como qualidade-
síntese] e a teoria de desenho pictórica, que propunha a complexidade. 
Mais tarde, esta discussão seria redefinida em bases objetivas, em termos 
de monotonia e caos, Iluminada por subsídios trazidos pela aplicação da 
psicologia social aos estudos ambientais. Seria, também, enriquecida, 
colocando-se os significados Investigados como dependentes de caracteres 
de grupo social. De qualquer forma, mesmo os precursores ingleses deste 
pragmatismo efetuaram uma análise morfológica detalhada de sítios antigos, 
e um estudo crítico das realizações tecnocratas como a versão atual do 
progressismo, chegando à formulação de novos princípios de projeto basea-
dos na análise histórica dos espaços. Seu trabalho conseguiu detectar as 
qualidades espaciais dgs antigas cidades, e codificá-las sob novos tipos de 
espaços, ao contrário, portanto, dos antigos culturalistas, que propunham a 
retomada de configurações medievais ou barrocas. A principal crítica que se 
poderia colocar aos seguidores da escola pragmática é que, quase sempre, 
seus princípios são colocados como normas de boa qualidade do espaço 
urbano universalmente aceitas; ignoram-se, neste procedimento, especifi-
cidades sociais e culturais, minimizando as potencialidades analíticas do 
método. Por outro lado, entende-se o arquiteto como aquele que possui 
poderes de avaliar qualidades espaciais, independentemente de códigos 
sociais, e de expressar, por síntese sem participação, os anseios dos 
futuros usuários. 
50 
As escolas de análise de percepção surgiram simultaneamente às prag-
máticas, mas locallzavam-se Inicialmente nos Estados Unidos, e só mais 
tarde atingiram a Europa Central e a Inglaterra. Através daquelas, come-
çou-se a considerar a percepção como elemento mediador Importante entre 
o homem e o melo ambiente urbano e a reformular-se o enfoque até 
então posto em prática: as qualidades e as necessidades

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