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Crucificar o Ego Para Viver Silvio Dutra Dez/2015 2 Sumário Introdução 3 Renúncias Necessárias 4 A Amputação Que É Necessária Para Entrar no Céu 12 “...quem neste mundo odeia a sua vida,” 17 Renúncia e Abnegação 21 O Verdadeiro Significado da Renúncia 25 Aquele que Não Renunciar a Tudo o Que Tem Não Pode Ser Meu Discípulo 35 Criado para Ser Espiritual e não Carnal 44 Porque a Vida Eterna Demanda a Morte do Nosso Ego 46 Aquele que Não Renunciar a Tudo o Que Tem Não Pode Ser Meu Discípulo 52 Se Não Perder Não Ganhará 61 Trazendo no Corpo a Mortificação de Jesus 66 Esvaziar-nos de nós Mesmos Para Sermos Úteis 70 Escrito na Mente e no Coração 77 O Governo Usurpador da Alma Sobre o Nosso Espírito 84 A real condição da natureza humana 106 O homem é inimigo de Deus 112 A Carnalidade é Inimiga de Deus 116 Despindo-se do Velho e Revestindo-se do Novo 122 Como e porque ser espiritual e não carnal 125 Não Mais na Carne 177 A Supremacia do Espírito Sobre o Corpo 186 Espiritual 201 A Natureza da Nova Criatura em Cristo Jesus 207 Natural e Espiritual 213 Curando a Doença e Não Aliviando Somente os Sintomas 221 Destruindo a Fábrica do Mal e Não Apenas os Seus Produtos 226 3 Introdução Watchman Nee costumava dizer que a primeira e principal lição que deveria ser ensinada aos novos convertidos era aquela que foi tão enfatizada por nosso Senhor Jesus Cristo em seu ministério terreno, de que deveríamos nos negar a nós mesmos, tomar a cruz diariamente e segui-lo para que pudéssemos ser de fato seus discípulos. Como há muita falta da devida compreensão do significado desta ordenança, resolvemos tratar do assunto neste livro, fundamentando nossas palavras no ensino bíblico e na forma como esta verdade declarada por nosso Senhor se aplica e se ajusta à realidade prática da vida. Com tal propósito em vista reunimos alguns dos vários artigos que escrevemos sobre este assunto e esperamos que eles sejam de alguma valia para os amados leitores. 4 Renúncias Necessárias Nós lemos no texto de Lucas 14.25-35 o seguinte: “25 Ora, iam com ele grandes multidões; e, voltando-se, disse-lhes: 26 Se alguém vier a mim, e não aborrecer a pai e mãe, a mulher e filhos, a irmãos e irmãs, e ainda também à própria vida, não pode ser meu discípulo. 27 Quem não leva a sua cruz e não me segue, não pode ser meu discípulo. 28 Pois qual de vós, querendo edificar uma torre, não se senta primeiro a calcular as despesas, para ver se tem com que a acabar? 29 Para não acontecer que, depois de haver posto os alicerces, e não a podendo acabar, todos os que a virem comecem a zombar dele, 5 30 dizendo: Este homem começou a edificar e não pode acabar. 31 Ou qual é o rei que, indo entrar em guerra contra outro rei, não se senta primeiro a consultar se com dez mil pode sair ao encontro do que vem contra ele com vinte mil? 32 No caso contrário, enquanto o outro ainda está longe, manda embaixadores, e pede condições de paz. 33 Assim, pois, todo aquele dentre vós que não renuncia a tudo quanto possui, não pode ser meu discípulo. 34 Bom é o sal; mas se o sal se tornar insípido, com que se há de restaurar-lhe o sabor? 35 Não presta nem para terra, nem para adubo; lançam-no fora. Quem tem ouvidos para ouvir, ouça.” 6 A obediência e serviço a Cristo são na verdade uma sequência de renúncias feitas por amor a Ele, e para que a Palavra de Deus se cumpra em nossas vidas. Por exemplo, há necessidade que os pais renunciem a seus filhos, e os filhos a seus pais, para que o propósito de Deus relativo ao casamento se consolide, pelo ato de deixar o homem pai e mãe, se unir à sua mulher, para que não sejam mais dois, mas uma só carne aos olhos do Senhor. Todavia, há uma renúncia suprema que se impõe ao próprio casal, de maneira que deverão aprender a renunciar-se mutuamente, para que o amor e serviço a Cristo, venham em primeiro lugar em suas vidas. Por isso, nosso Senhor enunciou claramente às multidões que O seguiam, as condições necessárias para o discipulado, porque ninguém poderá ser Seu discípulo se não renunciar a tudo quanto possui. 7 Quem quiser ser discípulo de Cristo terá que aprender a renunciar a tudo que lhe seja muito querido, e até à Sua própria vontade. Ninguém poderá guardar a palavra de perseverança do Senhor, que consiste em não negar o Seu nome e os Seus mandamentos, sejam quais forem as circunstâncias, caso não se tenha um sincero amor a Cristo que seja superior a tudo o mais que ame neste mundo, incluindo a sua própria vida. Isto porque nas situações práticas da vida, o serviço ao Senhor exigirá renúncias da parte de Seus discípulos. Eles terão que sacrificar os interesses de outras pessoas e até os seus próprios interesses, para que possam, não raras vezes, se dedicarem ao serviço do Senhor. Para melhor esclarecer o caráter da renúncia que se exige dos discípulos, nosso Senhor comparou tal renúncia como aquela que se faz necessária aos que se empenham numa guerra. 8 Eles terão que reunir recursos para a batalha e terão que deixar todas as demais coisas que eles amam para que possam se dedicar aos combates que terão que empreender na guerra em que estiverem empenhados. Para o mesmo propósito usou a ilustração de quem edifica uma torre. Ele não poderá concluir a construção caso não calcule o custo dos materiais e caso não se dedique totalmente ao projeto da torre que pretende construir. Isto lhe tomará tempo e dinheiro e não poderá estar mais dedicando a totalidade do seu tempo a outras atividades e interesses. O afeto natural pelas pessoas que amamos terá que ceder lugar muitas vezes ao afeto espiritual, que decorre do amor celestial divino, para o atendimento daqueles aos quais devemos servir pela vontade do Senhor, toda vez que tais afetos colidirem. 9 Servir ao Senhor é então comparado aos sacrifícios e renúncias que se exigem daqueles que se empenham numa guerra ou num projeto de construção. Quando o nosso afeto natural pelos nossos pais entrar em competição com o nosso dever evidente para com Cristo, nós temos que dar prova do nosso amor ao Senhor, cumprindo o que se exige de nós, conforme revelado na Sua Palavra, mesmo quando isto signifique contrariar aqueles que amamos, ou então que tal implique um grande sacrifício a ser feito por nós. Cristo deve ter a preferência em todas as coisas, se quisermos fazer a Sua vontade, e sermos agentes da sua bênção para muitas pessoas que necessitam do seu amor. Quantos interesses de amigos terão que ser deixados para trás para que possamos fazer a vontade de Deus, em relação a algum serviço prático que Ele nos tenha ordenado. 10 Não raras vezes, Deus colocará o nosso amor por Ele à prova, fazendo com que tenhamos a oportunidade de demonstrar na prática a nossa dependência dEle, e fidelidade a Ele e à Sua Palavra, em meio às tribulações que nos alcançam em forma de enfermidades, carências, perseguições, etc. Se não estivermos dispostos a fazer a renúncia total que Cristo exige de nós, é certo que o inferno se rirá, e muitas pessoas também rirão de modo escarnecedor por termos começado um relacionamento com o Senhor, e não termos permanecido de modo constante na realização e consumação do nosso amor a Ele, por Lhe termos voltado as nossas costas. Assim, todo verdadeiro cristão deve ter uma posição firme e definida contra todo tipo de apostasia e corrupção de mente e de espírito, porque tal apostasia e corrupção lhe tornarão inútil para os propósitos de Deus, e ele virá por fim a ser como o sal que perdendo o seu sabor, para nada 11 mais presta senão para ser lançado fora para ser pisado pelos homens,como disse Jesus. 12 A Amputação Que É Necessária Para Entrar no Céu “E, se tua mão te faz tropeçar, corta-a; pois é melhor entrares maneta na vida do que, tendo as duas mãos, ires para o inferno, para o fogo inextinguível onde não lhes morre o verme, nem o fogo se apaga. E, se teu pé te faz tropeçar, corta-o; é melhor entrares na vida aleijado do que, tendo os dois pés, seres lançado no inferno onde não lhes morre o verme, nem o fogo se apaga. E, se um dos teus olhos te faz tropeçar, arranca-o; é melhor entrares no reino de Deus com um só dos teus olhos do que, tendo os dois seres lançado no inferno, onde não lhes morre o verme, nem o fogo se apaga.” (Marcos 9.43-48) 13 Com este ensino, nosso Senhor Jesus Cristo enfatizou a vital importância da salvação da alma, pela demonstração que caso fosse necessário para obtê-la, deveríamos amputar partes importantes do nosso corpo físico, que por suposição, fossem a causa de nos manterem aprisionados ao pecado. É evidente que Ele não está recomendando uma prática de mutilações literais, porque nos é ordenado também por Deus o cuidado com a preservação do nosso corpo físico. Mas, para ilustrar que em não raros casos, a salvação será obtida por renúncias a práticas pecaminosas, que serão dolorosas para nós, e muitas vezes, que até mesmo colocarão em risco a nossa integridade física – quantos não foram e que têm ainda sido martirizados por conta da fé que abraçaram, ainda que não tivessem tropeçado, dando causa a isto - todavia, sofreram com paciência e voluntariamente o martírio sabendo que havia uma vida muito melhor e eterna lhes 14 aguardando, a qual, na verdade, já estavam experimentando desde que se converteram a Cristo. O ensino de nosso Senhor alude à mortificação do pecado, que deve ser feita por todos os cristãos. Este é um dever que deverão operar para a sua santificação, pelo corte de afeições pecaminosas e todo o tipo de inclinações carnais que os levem a pecar. Os que se entregam a este trabalho evidenciam em si mesmos que entraram no reino de Deus, e por conseguinte, jamais serão lançados no inferno eterno. A ilustração da amputação dos membros indica portanto que o trabalho de mortificação do pecado não é algo nocional, ou de mero caráter intelectual, mas algo que será realizado em nossa própria vida, atingindo o âmago do nosso ser, pelo despojamento do velho homem, da natureza terrena decaída no pecado que foi crucificada juntamente com Cristo, 15 recebendo a necessária sentença de morte para que possamos viver em novidade de vida. Nosso Senhor não fez portanto, uma aplicação relativa a um suposto castigo de pecados cometidos, mas uma alusão à remoção necessária do pecado, para que possamos entrar no reino de Deus. Assim, as concupiscências que combatem contra a alma devem ser removidas. Esta amputação de caráter espiritual não é para morte, assim como na ilustração apresentada por nosso Senhor não foi indicada a amputação de qualquer órgão vital. É uma remoção para vida e não para morte. Assim como quem amputa um órgão gangrenado para continuar vivendo, neste caso apresentado a retirada das inclinações e dos hábitos pecaminosos visam mais do que permitir que continuemos vivendo esta vida natural, senão que obtenhamos a vida espiritual eterna. 16 Outra parte importante do ensino de Jesus é o de que a alma embora esteja morta com suas partes gangrenadas pelo pecado, ela pode ainda ser recuperada, desde que nos apresentemos a Ele para a realização deste trabalho de remoção daquelas coisas que são para nós a causa do nosso tropeço, e que impedem a nossa entrada no reino de Deus. Assim, aqueles que carregam este corpo de morte do pecado em sua jornada terrena, mas do qual vão se despojando ao longo de sua caminhada, haverão de ter a sua entrada no reino de Deus, amplamente suprida. 17 “...quem neste mundo odeia a sua vida,” (Jo 12.25) O mesmo Jesus que disse em João 12.25.26: “Quem ama a sua vida, perdê-la-á; e quem neste mundo odeia a sua vida, guardá-la-á para a vida eterna. Se alguém me quiser servir, siga-me; e onde eu estiver, ali estará também o meu servo; se alguém me servir, o Pai o honrará.", também disse que veio a este mundo para que tivéssemos vida, e que a tivéssemos em abundância (Jo 10.10). Não há qualquer paradoxo entre as duas passagens bíblicas citadas; ao contrário, são idênticas e complementares mutuamente. O ponto a ser destacado é que nosso Senhor se refere a dois tipos de vida: a natural, relativa a este mundo cuja fonte reside na nossa natureza terrena pecaminosa, a qual deve ser perdida pelo trabalho da cruz, por odiarmos o pecado que em nós habita e que há no mundo; e a vida que é santa, espiritual 18 e celestial que recebemos por meio da fé em Jesus, pois é este o tipo de vida abundante que somente Ele pode nos dar. A manifestação desta vida celestial abundante independe de circunstâncias, se somos ou não afligidos por provações em forma de enfermidades, perseguições, pobreza, e até mesmo pelas tentações da carne, do mundo e do diabo. Aquele que tem carregado a sua cruz diariamente, e que tem crucificado o seu ego, seguindo o pendor do Espírito Santo por caminhar em santificação com Jesus, terá uma fonte de paz, alegria, gratidão, amor, jorrando em seu interior para a vida eterna. Não importa que esteja preso injustamente, por anos, como sucedeu com José no Egito, conforme o conselho e determinação de Deus, para bons propósitos definidos para o aperfeiçoamento de José na paciência e na santificação; enquanto o mordomo de faraó, que havia transgredido contra o 19 próprio rei, foi colocado por ele em liberdade em poucos dias. Os apóstolos foram também presos e duramente perseguidos, mas perseveraram na fé, na paciência e na esperança, enquanto aqueles que os oprimiam prosperavam materialmente neste mundo, e no entanto, não haviam alcançado a vida eterna abundante que eles possuíam. Deus corrige, repreende e disciplina apenas aqueles que são seus filhos, e esta é uma das razões porque são provados por Ele em circunstâncias em que os que os ímpios são livrados rapidamente, enquanto o crente permanece por maior período debaixo dos mesmos sofrimentos em que eles se encontravam. Nestas tribulações dos crentes estão sendo forjadas a fundamentação do caráter, a paciência, a perseverança, a fé e a esperança. É evidente que naqueles que amam o tipo de vida que o mundo tem a oferecer, ou seja, as coisas e os tipos de comportamentos que são contrários à 20 vontade e santidade de Deus; nenhuma destas graças está sendo forjada, até mesmo porque não as desejam ou conhecem; e como aqueles que amam o mundo permanecem como inimigos de Deus, jamais obterão a vida eterna que está em Jesus. 21 Renúncia e Abnegação Qual é o grande motivo da renúncia e abnegação que nos são exigidas por nosso Senhor Jesus Cristo? Creio que seja o compromisso total que é necessário ter com Ele e com o evangelho. Em várias passagens Ele ilustrou o caráter deste compromisso pleno quando citou, por exemplo, que quem lança mão do arado e olha pra trás não é apto para o reino de Deus (Lucas 9.61); que quem começa a construção de uma torre ou uma guerra deve concluí-las empenhando-se até o fim (Lucas 14.28- 32). O arar o campo, a construção da torre ; e a declaração de guerra devem ser minuciosamente calculados e não podem ser abandonados ou interrompidos de modo algum, sob pena de termos o nosso trabalho prejudicado e não concluído. 22 Fomos empregados como lavradores e construtores, e alistados como soldados de Cristo ao nos convertermos aEle, e para agradá-lo deveremos cuidar inteiramente dos interesses do seu reino. Em consequência teremos que renunciar a muitos projetos e desejos pessoais; teremos que priorizar o nosso tempo para Cristo e o reino, e isto certamente encurtará o tempo que dispendemos sobretudo com os nossos familiares e as pessoas que exigem muito da nossa atenção em nossos relacionamentos, e por isso Jesus disse que: “Se alguém vier a mim, e não aborrecer a pai e mãe, a mulher e filhos, a irmãos e irmãs, e ainda também à própria vida, não pode ser meu discípulo.” (Lucas 14.26) Como isto contraria os nossos sentimentos e vontade naturais, então necessitaremos colocar em prática o que Ele nos ensina: Primeiro, 23 “Então disse Jesus aos seus discípulos: Se alguém quer vir após mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz, e siga-me;” (Lucas 14.27) E em seguida, “Assim, pois, todo aquele dentre vós que não renuncia a tudo quanto possui, não pode ser meu discípulo.” (Lucas 14.33) Não há outra alternativa para vencer nossos afetos naturais que possam nos impedir de servir ao Senhor inteiramente senão a crucificação do nosso ego com todos os seus desejos. Teremos que contrariar nossos desejos e até a própria vida para que possamos servir a Cristo da maneira pela qual convém ser servido. Ele nos deu o exemplo supremo disto não fazendo a sua própria vontade, senão a do Pai, para que pudesse consumar a nossa salvação. De igual forma isto se aplica a nós, porque não podemos nos empenhar na obra de salvação de 24 almas, sem que se veja operando em nós, não a nossa, mas a vontade do Senhor. 25 O Verdadeiro Significado da Renúncia “26 Se alguém vier a mim, e não aborrecer a pai e mãe, a mulher e filhos, a irmãos e irmãs, e ainda também à própria vida, não pode ser meu discípulo. 27 Quem não leva a sua cruz e não me segue, não pode ser meu discípulo... 33 Assim, pois, todo aquele dentre vós que não renuncia a tudo quanto possui, não pode ser meu discípulo.” (Lc 14.26, 27, 33). O verdadeiro significado da renúncia cristã não diz respeito tanto ao que abandonamos e o esforço que realizamos, quanto por quem o fazemos, a saber, se por nós mesmos ou por Cristo. Este desapego às coisas que mais amamos, inclusive a nós mesmos, conforme nos é imposto pelo Senhor para segui-lO, é de caráter totalmente diferente das renúncias que as pessoas costumam fazer para atingirem seus objetivos, porque elas o fazem por si 26 mesmas e por aquilo que escolhem fazer, e não para Cristo, e segundo a Sua vontade divina. O cristão é portanto chamado a se auto negar e carregar a cruz que mortificará o seu ego, para poder seguir verdadeiramente a Cristo, de maneira que possa dizer de fato que tem feito a vontade de Deus neste mundo, e não a sua própria vontade. Nós selecionamos apenas três versículos da porção de Lucas 14.25-35 nos quais Jesus expôs as condições exigidas por Ele para o discipulado, de maneira que aqueles que pretendem segui-lO fazendo a Sua vontade estejam plenamente instruídos quanto ao que será exigido deles para tal, de maneira que possam se armar do pensamento das coisas que terão que fazer e ao que terão que renunciar se pretenderem fazer de fato a vontade de Deus. Todos os que pretenderem seguir a Cristo têm que contar com o pior, e se prepararem adequadamente. 27 É possível que muitos discípulos de Jesus pensassem que Ele lhes diria o seguinte: “Se qualquer homem vier a mim, e for meu discípulo, ele terá honras e riquezas em abundância neste mundo.”. Mas Ele lhes disse exatamente o contrário disto, e lhes revelou que deveriam se dispor a deixar tudo o que fosse querido a eles, e deveriam ser desmamados de tudo aquilo em que buscavam o seu conforto e segurança, e que teriam aflições. Eles deveriam morrer para tudo aquilo que lhes desse conforto e segurança no mundo e morrerem inclusive para si mesmos, não mais vivendo para fazer a vontade do eu, de maneira que pudessem conhecer e praticar a vontade de Deus. Assim ninguém pode ser discípulo de Cristo se não estiver disposto a contrariar a vontade de seus familiares (v. 26) quando esta vontade entrar em competição com a de Deus. E não somente isto, deve estar disposto a contrariar a sua própria vontade e vida. Se não for sincero nisto e se não o 28 fizer, não poderá ser constante e perseverante na obra de Deus, a não ser que ame mais a Cristo do que qualquer outra coisa neste mundo, e esteja disposto a se separar de tudo aquilo que ele possuir oferecendo-o como um sacrifício para Deus, de maneira que Cristo possa ser glorificado por esta nossa separação para nos consagrarmos inteiramente a Ele (tal como os mártires que não amaram as suas vidas diante da morte). É somente quando nos separamos dos afetos que nos prendem a este mundo, que somos capacitados a servir melhor a Cristo. Assim Abraão se separou do próprio país dele, e Moisés da corte de faraó. Não é feito nesta passagem de Lucas menção a casas e terras porque a filosofia ensinará a olhar para isto com desprezo; mas o cristão considera isto de uma maneira bem mais elevada, por saber que tudo o que o homem amar seja em seu relacionamento com pessoas ou bens, se ele for um 29 discípulo de Cristo, terá que amar menos estas coisas do que a Cristo, e estar disposto a se separar delas caso seja necessário para continuar seguindo ao Senhor. Não que as pessoas que amamos devam ser em algum grau desprezadas, mas deve ser perdido o conforto e satisfação que achamos nelas para que somente Cristo seja todo o conforto e sustentáculo de nossas vidas. E é a este tipo de renúncia a que o Senhor se refere ao dizer que é necessário renunciar a tudo para ser seu discípulo, isto é, aqueles que pretendem segui-lo não podem ter a razão da sua esperança e conforto em qualquer coisa ou pessoa deste mundo, porque terão que aprender a depender inteiramente do Senhor porque Deus os provará muitas vezes vendo falhar ou faltar estes confortos, e não raro, mesmo aqueles que muito amamos e prezamos se levantarão contra nós quando perceberem a nossa plena disposição de nos consagrarmos inteiramente a Deus. 30 Quando nosso dever para com nossos pais entrar em competição com nosso dever evidente para Cristo, nós temos que dar a preferência a Cristo. Se nós tivermos que negar a Cristo para não sermos banidos por nossos parentes, nós temos que perder a companhia deles e permanecer fiéis a Cristo. Todo homem ama a sua própria vida, mas nós não podemos ser discípulos de Cristo se nós não O amamos mais que nossas próprias vidas. A experiência dos prazeres da vida espiritual e a esperança da vida eterna farão com que esta dura declaração do Senhor se torne fácil. Quando a tribulação e a perseguição surgirem por causa da Palavra, então principalmente a tentação será superada se nós amarmos mais a Cristo. A tentação constante de buscarmos a Deus para que Ele faça a nossa vontade, em vez de nos inteirarmos qual seja a vontade dEle para conosco, para que nos empenhemos em fazê-la, só pode ser tratada pela cruz, que imporá sua sentença de morte sobre os 31 desejos carnais de nossa alma, de forma que sejamos conduzidos pelo Espírito Santo. Há um grande equívoco em se pensar que uma grande fé é aquela que consegue obter coisas de Deus para própria e exclusiva conveniência pessoal. Mas, ao contrário uma fé verdadeira em exercício nos capacitará a renunciar a tudo e a fazer com amor e paciência perseverante a obra que Deus nos tem designado, enquanto descansamos na Sua promessa de suprir aquilo que nos for necessário. Esta fé verdadeira em exercício fará muitas petições a Deus, mas somente daquilo que for da Sua vontade, paraque possamos continuar a Seu serviço neste mundo, que não devemos amar, e do qual devemos estar desmamados. A verdadeira fé nunca levará um cristão amadurecido e devidamente instruído a buscar o que seja da sua própria conveniência, mas somente aquilo que é aprovado e conveniente de ser pedido a Deus. 32 Ele saberá desfrutar o melhor desta vida, sem qualquer ascetismo, mas nada terá o domínio de sua vontade e coração, porque este domínio pertencerá ao Senhor, que sempre quer o melhor para nós. Os que são verdadeiramente discípulos de Cristo estão construindo uma torre que os aproxima cada vez mais das realidades do céu, e eles sabem que a construção desta torre lhes impõe o custo da mortificação dos seus pecados, da renúncia ao mundo e ao eu, e de tudo o mais que é necessário para permanecerem em sua obediência a Deus. Eles são também como reis empenhados numa grande guerra contra os poderes das trevas, contra o pecado, e contra as tentações do mundo. E a vitória nesta guerra lhes exigirá o custo da vigilância, da oração perseverante, de estarem equipados continuamente com toda a armadura de Deus, resistindo firmes na fé ao diabo, vivendo em sobriedade. 33 Enfim, o discipulado cobra o preço da consagração total a Deus, porque o homem de coração dobre não obterá nada do Senhor. Não se pode servir a dois senhores. Ou se serve a Deus ou às riquezas. Ao que é terreno ou ao que é celestial. Ao que é do Espírito Santo ou ao que é da carne. À luz ou às trevas. Não se pode ter um pouco de um e um pouco de outro nestas coisas citadas. Se tivermos um não teremos o outro. Porque onde estiver o nosso tesouro, ali estará também o nosso coração. Mas é comum que muitos se enganem pensando que estão seguindo a Cristo e fazendo uma obra verdadeira para Deus enquanto não renunciam a tudo quanto devem renunciar para que Cristo e somente Cristo seja o grande prazer e objetivo de suas vidas. A vida cristã é uma declaração de guerra contra o pecado, o diabo e o mundo, para que almas possam ser resgatadas das trevas para a luz de Jesus. E somente os que têm calculado o custo desta guerra 34 e pago efetivamente o preço necessário poderão desfrutar das grandes vitórias que obterão pelo auxílio da graça do Senhor. Sem esta renúncia que é imposta aos discípulos de Cristo eles não poderão ter sal em si mesmos para preservar este mundo da corrupção, e salgarem a vida de muitos com o testemunho de suas próprias vidas. Sem renúncia o sal perde o sabor e quando isto acontece é lançado fora e será pisado pelos homens, porque terá perdido a sua função de salgar para preservar. Isto ensina de modo muito claro que o Senhor somente pode usar aqueles que estiverem consagrando efetivamente suas vidas. 35 Aquele que Não Renunciar a Tudo o Que Tem Não Pode Ser Meu Discípulo Nosso Senhor Jesus Cristo foi quem proferiu as palavras do nosso título. Há muitos ensinamentos para nós quanto a isto, na chamada de Eliseu. Gostaríamos de enfocar o que lemos no texto de I Reis 19.19-21: “19 Partiu, pois, Elias dali e achou Eliseu, filho de Safate, que andava lavrando com doze juntas de bois adiante dele, estando ele com a duodécima; chegando-se Elias a Eliseu, lançou a sua capa sobre ele. 20 Então, deixando este os bois, correu após Elias, e disse: Deixa-me beijar a meu pai e a minha mãe, e então te seguirei. Respondeu-lhe Elias: Vai, volta; pois, que te fiz eu? 21 Voltou, pois, de o seguir, tomou a junta de bois, e os matou, e com os aparelhos dos bois cozeu a 36 carne, e a deu ao povo, e comeram. Então se levantou e seguiu a Elias, e o servia.” . Deus mesmo chamou Eliseu para ser profeta no lugar de Elias, conforme se vê no verso 16, quando lhe ordenou que ungisse a Jeú, rei de Israel, a Hazael, rei da Síria, e a Eliseu por profeta. Não foi numa escola de profetas, nem num templo, que Eliseu foi chamado, mas no seu local de trabalho, quando arava o campo com doze juntas de bois, sendo que ele próprio arava com uma destas juntas. E não tem sido assim o método comum com o qual muitos têm sido chamados pelo Senhor, para deixarem suas atividades seculares, para viverem do evangelho? Eliseu não deixou pouco para se consagrar à sua chamada, pois se diz que arava com doze juntas de bois. Ele ofereceu tudo o que tinha como um holocausto, nas mãos do Senhor, como símbolo da sua renúncia 37 ao seu antigo modo de vida, quando matou os seus bois e fez uma fogueira para assar a carne com os instrumentos com os quais arava a terra. Ele não seria mais agricultor dali por diante, porque se desfez dos meios que eram necessários para a realização do seu antigo sustento de vida. Um dos motivos de Deus ter chamado Eliseu para ser sucessor de Elias, foi o fato de apesar dele ser um homem importante, que tinha servos, era simples e trabalhador, porque se diz que ele também estava trabalhando no arado, quando podia deixar todo o serviço pesado a cargo dos seus empregados. Pessoas que buscam uma vida de mordomia neste mundo não serão chamadas por Deus para a Sua obra. O pedido de Eliseu para se despedir de seus pais, não foi uma desculpa para demorar a atender à chamada do Senhor, como a citada em Lucas 9.61. 38 Ele somente o fizera por uma questão de respeito e dever para com os seus pais. Elias não constrangeu Eliseu a segui-lo, mas lembrou-lhe somente que havia lançado o seu manto sobre ele, como uma indicação de que estava sendo chamado por Deus para ser preparado por ele, Elias, para o ministério, e isto estava representado no fato de que estaria debaixo das vestes de Elias, isto é, de sua proteção e cuidado. Eliseu se colocou humildemente na posição de servo de Elias, e era o servo que lavava as mãos do profeta como se vê em II Reis 3.11. Há renúncias impostas para o exercício do ministério Muitos que são chamados pelo Senhor, especialmente para a obra de missões, vivendo pela fé, custam a entender em princípio, qual é o caráter da chamada deles. Até o próprio Eliseu, aquele gigante espiritual, demonstrou estar ainda ligado a laços familiares de 39 sangue, quando o Senhor o chamou para o ministério profético através de Elias (I Rs 19.19-21). Muitos ficaram perplexos por grande tempo até entenderem que as perdas que sofreram em suas vidas, foram decorrentes desta chamada do Senhor para o exercício do ministério. O Senhor impõe renúncias àqueles aos quais chama, tal como fizera com todos os apóstolos, que tudo tiveram que deixar para poder segui-lO. A quantas coisas e pessoas estamos apegados, ainda que não estejamos devidamente conscientizados de tal realidade. E dificilmente entendemos que muitas perdas que sofremos, e guinadas violentas que são produzidas por Deus em nossas vidas, têm o propósito de nos tornar desimpedidos para a realização da Sua obra. Se não houver esta renúncia aprendida e recebida de modo voluntário, pela consagração de tudo o que somos e do que temos ao Senhor, não será possível trabalhar para Deus, porque o nosso 40 coração estará apegado àquelas coisas e pessoas das quais, o Senhor sabe que devemos nos desprender primeiro (não deixar de lhes assistir, nem abandoná-las, mas não ser presa de laços sentimentais e emocionais, ou de dependência financeira, psicológica ou de qualquer outra ordem), para que possamos então fazer a Sua vontade, sem que sejam tais coisas e pessoas a principal ocupação de nossos pensamentos, afeições e desejos. Quando Deus chamou Eliseu através do profeta Elias, este lançou a sua capa sobre Eliseu, indicando que a autoridade espiritual que estava sobre Elias, seria transferida por Deus, no tempo oportuno, para Eliseu. Mas desde já, ele teria que abandonar tudo para poder seguir Elias, para serpreparado para ser o seu sucessor. Quando Jesus lança sobre nós a sua capa concedendo-nos dons, capacitações, e Sua 41 autoridade, é para a realização da Sua obra, e não da nossa. Para fazermos a Sua vontade e não a nossa. Adeus amigos! Adeus prazeres carnais e mundanos! Adeus parentes! Adeus interesses particulares! Adeus sonhos seculares! É a atitude que devemos ter em nosso coração, tão logo identifiquemos que fomos chamados para a realização de uma obra específica para Deus. Aqueles que não se auto negarem não poderão tomar diariamente a sua cruz. E sem tomar a cruz é absolutamente impossível seguir a Jesus. Porque a cruz nos imporá renúncias, empenhos, deslocamentos, que a nossa carne não sente nenhum prazer neles. A cruz será um objeto de ofensa para aqueles que não se autonegarem primeiro. 42 Eles se escandalizarão com os sofrimentos e aflições que a cruz lhes trará quando estiverem empenhados na realização da obra do Senhor. Por isso, os apóstolos nos advertem quanto à necessidade de estarmos armados com o pensamento de que importa suportar todo tipo de tribulação e oposição, que nos possam sobrevir por causa da nossa consagração ao serviço de Deus. Assim, aqueles que têm sido chamados por Deus, em vez de ficarem perplexos e gemendo por causa das coisas que estão sofrendo, devem aprender, tal como Paulo, a se gloriarem nas tribulações que estiverem sofrendo, e nas renúncias que o próprio Deus lhes está impondo, porque estas aflições são a prova mesma de que estão empenhados numa obra que procede verdadeiramente de Deus, e isto é um motivo não para tristeza, mas para alegria, é uma grande honra, e não uma condição humilhante; uma grande vantagem, recompensa e riqueza espiritual, e nenhuma tragédia ou miséria. Afinal, deixaram de 43 confiar no cuidado dos homens, para viverem debaixo do cuidado do Deus Altíssimo e Onipotente. Gloriemo-nos portanto somente no Senhor, nas tribulações e na Sua cruz, porque, por meio de todas estas coisas, somos capacitados a sermos bem sucedidos na obra que realizamos para a glória do Seu nome, e por meio das quais cessarão todos os nossos fracassos e vazio de vida. Eliseu que o diga! Tudo o que ele realizou para Deus se tornou um grande exemplo para nós, de que vale muito a pena tudo deixar para podermos seguir a Jesus. 44 Criado para Ser Espiritual e não Carnal Está declarada de modo muito claro e direto na Bíblia, desde o seu primeiro livro de Gênesis, a verdade relativa à condição natural de todo ser humano de se inclinar para a sua natureza terrena carnal pecaminosa, e por ela ser dirigido, em vez de se inclinar para a natureza celestial e espiritual divina, para a qual fora criado, para viver por meio dela eternamente. O próprio Deus expôs esta verdade no motivo declarado do dilúvio que traria sobre toda a Terra: “Então, disse o SENHOR: O meu Espírito não agirá para sempre no homem, pois este é carnal; e os seus dias serão cento e vinte anos.” (Gênesis 6.3) Veja a comprovação desta verdade, porque no meio de toda uma geração que se inclinava e se movia 45 apenas pelo que era carnal, somente um homem (Noé) havia se voltado para Deus, pela fé, e obtido pela justificação, a coparticipação da natureza divina, pela qual recebeu o testemunho de ser homem justo, temente a Deus e que se desviava do mal. Viver na carne, segundo a lição que nos foi deixada no dilúvio, opera a morte e a destruição. E deste viver todos compartilham, em razão da natureza que possuímos, até que sejamos libertados e justificados pela fé em Cristo, para recebermos uma nova natureza, na qual se cumpre o propósito eterno de Deus na nossa criação. Afinal, Deus é espírito, e importa que também o sejamos para termos comunhão com Ele e participação da sua vida divina. 46 Porque a Vida Eterna Demanda a Morte do Nosso Ego Paulo poderia ter começado o 4º capítulo de 2 Coríntios com as palavras do verso 5: “Porque não nos pregamos a nós mesmos, mas a Cristo Jesus, o Senhor; e nós mesmos somos vossos servos por amor de Jesus.”. Porque para não pregarmos a nós mesmos, mas a Cristo é preciso trazer o morrer de Jesus em nosso corpo, em nosso ego, e em tudo que se refira à nossa própria vontade e desejos, que devem ser levados à morte na cruz, para que a vida de Jesus possa se manifestar através de nós (v. 10). Esta mortificação progressiva de todas as áreas de nossas vidas há de ocorrer se tivermos uma chamada para o ministério, tal como Paulo a tivera, porque o ministério consiste em manifestar não a nós mesmos, mas o que é relativo à vida de Cristo. 47 E para isto o velho homem tem que ser despojado, para que a nova criatura se manifeste em poder nestes vasos de barro que são os nossos corpos mortais. São vasos de barro porque têm a ver com o que herdamos da natureza terrena de Adão, que foi criada a partir do barro, dos elementos naturais deste mundo, que passa. Todavia, a nova vida em Cristo é do céu, e o seu poder excelente pode se manifestar somente se a casca do velho homem com suas vontades e desejos for completamente quebrada através das tribulações, perplexidades, perseguições, e abatimentos, ao mesmo tempo que somos consolados e amparados pelo Senhor pela manifestação do Seu poder e amor, para que não sejamos angustiados, desanimados, desamparados e destruídos (v. 8, 9). 48 Esta será a experiência de todos aqueles que consagrarem efetivamente suas vidas ao serviço do Senhor. Tal como Paulo, saberão, por experiência, o que significa trazer diariamente no corpo o morrer de Jesus para que a Sua vida possa se manifestar em nós. Eles saberão por experiência que toda a mortificação que é operada neles, sobretudo no seu ego, tem o propósito de gerar a vida de Cristo nos seus ouvintes (v. 12). Eles saberão que todo o seu dever é anunciar a fé em Cristo, e a Sua morte e ressurreição, para a nossa própria ressurreição, de modo que ministrando por amor aos homens, possam todos abundar em ações de graças, para a glória de Deus, por causa da multiplicação da graça em muitos corações (v. 13 a 15). Eles saberão que um cristão em seu posto de trabalho, operando fielmente no Espírito, não 49 desfalece e suportará e sofrerá tudo por amor a Cristo, ainda que o homem exterior se corrompa, isto é, que enfraqueça, enferme, envelheça, porque o homem interior, a saber, o Espírito é renovado gradual e diariamente por Deus, segundo o Seu próprio poder e glória (v. 16). Assim saberá também que toda tribulação traz em si mesma um propósito de nos tornar mais íntimos e participantes da glória de Deus, e que se tornam leves e momentâneas comparadas ao peso das consolações e operações poderosas do Senhor no nosso corpo, alma e espírito. Um cristão experimentado, como Paulo, saberá discernir a vida espiritual que não se experimenta por vista, mas por fé, que se firma não nas coisas visíveis que são temporais, mas nas invisíveis que são eternas. Portanto, à luz de todas estas afirmações que o apóstolo faz nos últimos versos deste 4º capítulo, 50 nós podemos entender melhor o que ele pretendia dizer nos seus quatro primeiros versículos. Os que são de Cristo podem entender as palavras de Paulo, a saber, o evangelho da cruz de Cristo, mas não os incrédulos, porque seus entendimentos foram cegados pelo Inimigo, de modo que não podem enxergar a glória que há no evangelho, que produz a sua vida ressurreta à medida que nosso velho homem vai sendo despojado, progressivamente, pela mortificação operada pela cruz. Para o mundo isto não é glória, quando muito, masoquismo, porque não pode experimentar o poder da vida do Espírito que se manifesta naqueles que permitem a mortificação dosfeitos do corpo pelo poder de Deus. Eles não podem entender que a cruz não é carregada para nos aniquilar, mas para gerar a vida eterna de Cristo, porque Ele veio a este mundo não 51 para nos matar, mas para que tivéssemos vida, e vida em abundância. Mas esta vida não pode ser experimentada, a não ser na nova criatura, gerada em nós pelo Espírito, e isto demanda a morte e despojamento progressivo dos atos pecaminosos do velho homem, trabalho este que é feito pela cruz que carregamos diariamente, para que o Espírito não somente mortifique o nosso pecado, como também manifeste a vida poderosa de Cristo em nós. Enquanto o que prevalece é o eu, eu, eu ... posso, não posso; quero, não quero, jamais conheceremos o significado de ser conduzido pela vontade de Deus, e ser por ela capacitado a fazer voluntariamente e com amor o que seja necessário e contrário ao nosso querer, ao nosso sentir, e até mesmo tudo que não haja em nós habilidade e poder para fazer. 52 Aquele que Não Renunciar a Tudo o Que Tem Não Pode Ser Meu Discípulo Nosso Senhor Jesus Cristo foi quem proferiu as palavras do nosso título. Há muitos ensinamentos para nós quanto a isto, na chamada de Eliseu. Gostaríamos de enfocar o que lemos no texto de I Reis 19.19-21: “19 Partiu, pois, Elias dali e achou Eliseu, filho de Safate, que andava lavrando com doze juntas de bois adiante dele, estando ele com a duodécima; chegando-se Elias a Eliseu, lançou a sua capa sobre ele. 20 Então, deixando este os bois, correu após Elias, e disse: Deixa-me beijar a meu pai e a minha mãe, e então te seguirei. Respondeu-lhe Elias: Vai, volta; pois, que te fiz eu? 21 Voltou, pois, de o seguir, tomou a junta de bois, e os matou, e com os aparelhos dos bois cozeu a 53 carne, e a deu ao povo, e comeram. Então se levantou e seguiu a Elias, e o servia.” . Deus mesmo chamou Eliseu para ser profeta no lugar de Elias, conforme se vê no verso 16, quando lhe ordenou que ungisse a Jeú, rei de Israel, a Hazael, rei da Síria, e a Eliseu por profeta. Não foi numa escola de profetas, nem num templo, que Eliseu foi chamado, mas no seu local de trabalho, quando arava o campo com doze juntas de bois, sendo que ele próprio arava com uma destas juntas. E não tem sido assim o método comum com o qual muitos têm sido chamados pelo Senhor, para deixarem suas atividades seculares, para viverem do evangelho? Eliseu não deixou pouco para se consagrar à sua chamada, pois se diz que arava com doze juntas de bois. Ele ofereceu tudo o que tinha como um holocausto, nas mãos do Senhor, como símbolo da sua renúncia 54 ao seu antigo modo de vida, quando matou os seus bois e fez uma fogueira para assar a carne com os instrumentos com os quais arava a terra. Ele não seria mais agricultor dali por diante, porque se desfez dos meios que eram necessários para a realização do seu antigo sustento de vida. Um dos motivos de Deus ter chamado Eliseu para ser sucessor de Elias, foi o fato de apesar dele ser um homem importante, que tinha servos, era simples e trabalhador, porque se diz que ele também estava trabalhando no arado, quando podia deixar todo o serviço pesado a cargo dos seus empregados. Pessoas que buscam uma vida de mordomia neste mundo não serão chamadas por Deus para a Sua obra. O pedido de Eliseu para se despedir de seus pais, não foi uma desculpa para demorar a atender à chamada do Senhor, como a citada em Lucas 9.61. 55 Ele somente o fizera por uma questão de respeito e dever para com os seus pais. Elias não constrangeu Eliseu a segui-lo, mas lembrou-lhe somente que havia lançado o seu manto sobre ele, como uma indicação de que estava sendo chamado por Deus para ser preparado por ele, Elias, para o ministério, e isto estava representado no fato de que estaria debaixo das vestes de Elias, isto é, de sua proteção e cuidado. Eliseu se colocou humildemente na posição de servo de Elias, e era o servo que lavava as mãos do profeta como se vê em II Reis 3.11. Há renúncias impostas para o exercício do ministério Muitos que são chamados pelo Senhor, especialmente para a obra de missões, vivendo pela fé, custam a entender em princípio, qual é o caráter da chamada deles. Até o próprio Eliseu, aquele gigante espiritual, demonstrou estar ainda ligado a laços familiares de 56 sangue, quando o Senhor o chamou para o ministério profético através de Elias (I Rs 19.19-21). Muitos ficaram perplexos por grande tempo até entenderem que as perdas que sofreram em suas vidas, foram decorrentes desta chamada do Senhor para o exercício do ministério. O Senhor impõe renúncias àqueles aos quais chama, tal como fizera com todos os apóstolos, que tudo tiveram que deixar para poder segui-lO. A quantas coisas e pessoas estamos apegados, ainda que não estejamos devidamente conscientizados de tal realidade. E dificilmente entendemos que muitas perdas que sofremos, e guinadas violentas que são produzidas por Deus em nossas vidas, têm o propósito de nos tornar desimpedidos para a realização da Sua obra. Se não houver esta renúncia aprendida e recebida de modo voluntário, pela consagração de tudo o que somos e do que temos ao Senhor, não será possível trabalhar para Deus, porque o nosso 57 coração estará apegado àquelas coisas e pessoas das quais, o Senhor sabe que devemos nos desprender primeiro (não deixar de lhes assistir, nem abandoná-las, mas não ser presa de laços sentimentais e emocionais, ou de dependência financeira, psicológica ou de qualquer outra ordem), para que possamos então fazer a Sua vontade, sem que sejam tais coisas e pessoas a principal ocupação de nossos pensamentos, afeições e desejos. Quando Deus chamou Eliseu através do profeta Elias, este lançou a sua capa sobre Eliseu, indicando que a autoridade espiritual que estava sobre Elias, seria transferida por Deus, no tempo oportuno, para Eliseu. Mas desde já, ele teria que abandonar tudo para poder seguir Elias, para ser preparado para ser o seu sucessor. Quando Jesus lança sobre nós a sua capa concedendo-nos dons, capacitações, e Sua 58 autoridade, é para a realização da Sua obra, e não da nossa. Para fazermos a Sua vontade e não a nossa. Adeus amigos! Adeus prazeres carnais e mundanos! Adeus parentes! Adeus interesses particulares! Adeus sonhos seculares! É a atitude que devemos ter em nosso coração, tão logo identifiquemos que fomos chamados para a realização de uma obra específica para Deus. Aqueles que não se auto negarem não poderão tomar diariamente a sua cruz. E sem tomar a cruz é absolutamente impossível seguir a Jesus. Porque a cruz nos imporá renúncias, empenhos, deslocamentos, que a nossa carne não sente nenhum prazer neles. A cruz será um objeto de ofensa para aqueles que não se autonegarem primeiro. 59 Eles se escandalizarão com os sofrimentos e aflições que a cruz lhes trará quando estiverem empenhados na realização da obra do Senhor. Por isso, os apóstolos nos advertem quanto à necessidade de estarmos armados com o pensamento de que importa suportar todo tipo de tribulação e oposição, que nos possam sobrevir por causa da nossa consagração ao serviço de Deus. Assim, aqueles que têm sido chamados por Deus, em vez de ficarem perplexos e gemendo por causa das coisas que estão sofrendo, devem aprender, tal como Paulo, a se gloriarem nas tribulações que estiverem sofrendo, e nas renúncias que o próprio Deus lhes está impondo, porque estas aflições são a prova mesma de que estão empenhados numa obra que procede verdadeiramente de Deus, e isto é um motivo não para tristeza, mas para alegria, é uma grande honra, e não uma condição humilhante; uma grande vantagem, recompensa e riqueza espiritual, e nenhuma tragédia ou miséria. Afinal,deixaram de 60 confiar no cuidado dos homens, para viverem debaixo do cuidado do Deus Altíssimo e Onipotente. Gloriemo-nos portanto somente no Senhor, nas tribulações e na Sua cruz, porque, por meio de todas estas coisas, somos capacitados a sermos bem sucedidos na obra que realizamos para a glória do Seu nome, e por meio das quais cessarão todos os nossos fracassos e vazio de vida. Eliseu que o diga! Tudo o que ele realizou para Deus se tornou um grande exemplo para nós, de que vale muito a pena tudo deixar para podermos seguir a Jesus. 61 Se Não Perder Não Ganhará “João 12:24 Em verdade, em verdade vos digo: se o grão de trigo, caindo na terra, não morrer, fica ele só; mas, se morrer, produz muito fruto. João 12:25 Quem ama a sua vida perde-a; mas aquele que odeia a sua vida neste mundo preservá- la-á para a vida eterna.” Se formos interpretar de modo literal a verdade proferida nas palavras de nosso Senhor Jesus Cristo - de que quem ama a vida a perde, e de que quem a odeia a preserva para a vida eterna – poderemos pensar que está sendo afirmado algum tipo de absurdo, e na verdade o seria caso o sentido destas palavras fosse interpretado segundo a razão natural e comum do mundo; todavia elas expressam de forma resumida o grande segredo de se alcançar a vida eterna não somente para este mundo quanto 62 para o vindouro. Porque importa que sejam interpretadas em seu significado espiritual, com a ajuda da iluminação do Espírito Santo, que é o único que pode nos tornar capazes de discernir espiritualmente as realidades que são espirituais. Primeiro, Jesus aplicou este ensino do céu ao seu próprio caso, pois não viveu para fazer a sua própria vontade, senão a de Deus Pai que o enviou para morrer no nosso lugar. Ele se esvaziou completamente e tomou a forma humana e de servo, não sendo dirigido pelo seu próprio ego, mas pelo Espírito Santo que o guiava em tudo. Jesus não é somente a vida eterna, a sua fonte, como também o caminho e a verdade que nos conduzem também à vida eterna, pelo mesmo caminho que ele seguiu. O morrer para o eu, para se viver pela vontade e poder de Deus é o grande segredo disto, que Jesus veio revelar em si mesmo. Por isso ele venceu a 63 morte, e não pôde a sua vida ser retida pelo sepulcro, e se encontra agora assentado em glória à destra do Pai no céu, intercedendo continuamente por nós, para que alcancemos a vida eterna e que a vivamos do modo digno pelo qual importa ser vivida. Agora, em relação a nós, quão indispostos somos a fazer morrer o modo de viver pelo nosso ego, quão apegados somos à nossa vontade e ao mundo, e então necessitamos - diferentemente do Senhor Jesus que não tinha qualquer pecado – de mortificar a nossa natureza terrena pecaminosa, para que tendo a nossa mente renovada, possamos conhecer de modo experimental a boa, perfeita e agradável vontade de Deus, pela qual somos santificados. Perdas de entes queridos e coisas que amamos nos causam grande sofrimento, e por isso tememos abandonar esta coisa que é a primeira em ordem a amarmos mais do que tudo, a saber, o nosso modo de viver neste mundo, ao qual nosso Senhor se 64 refere como algo que devemos aprender a odiar, porque está cheio de hábitos e desejos que são contrários à justiça e santidade de Deus. Então, se não odiarmos esta vida pecaminosa mundana, a nossa condição espiritual permanece sendo de morte, que por fim virá a ser morte eterna, e não vida eterna, conforme é prometido àqueles que a odiarem, por amarem o modo de vida celestial, espiritual e divino. Em muitos outros textos da Bíblia vemos esta verdade de João 12.24,25, sendo reafirmada, e para nossa apreciação, estamos destacando alguns deles a seguir: Mateus 16:25 Porquanto, quem quiser salvar a sua vida perdê-la-á; e quem perder a vida por minha causa achá-la-á. 65 Mateus 10:39 Quem acha a sua vida perdê-la-á; quem, todavia, perde a vida por minha causa achá- la-á. Lucas 14:26 Se alguém vem a mim e não aborrece a seu pai, e mãe, e mulher, e filhos, e irmãos, e irmãs e ainda a sua própria vida, não pode ser meu discípulo. Lucas 17:33 Quem quiser preservar a sua vida perdê-la-á; e quem a perder de fato a salvará. 66 Trazendo no Corpo a Mortificação de Jesus “Porque não nos pregamos a nós mesmos, mas a Cristo Jesus, o Senhor; e nós mesmos somos vossos servos por amor de Jesus.” (II Coríntios 4.5) Para não pregarmos a nós mesmos, mas a Cristo é preciso trazer o morrer de Jesus em nosso corpo (II Cor 4.10), em nosso ego, e em tudo que se refira à nossa própria vontade e desejos, que devem ser levados à morte na cruz, para que a vida de Jesus possa se manifestar através de nós. Aquele que não traz o seu ego mortificado pela cruz não está habilitado a pregar e a ensinar o evangelho da cruz. Aquele que não renunciou a tudo quanto tem não pode pedir aos seus ouvintes que renunciem a si mesmos para confiarem suas almas ao Salvador. 67 É por isso que o nosso velho homem tem que ser despojado, para que a nova criatura se manifeste em poder nestes vasos de barro que são os nossos corpos mortais. São vasos de barro porque têm a ver com o que herdamos da natureza terrena de Adão, que foi criada a partir do barro, dos elementos naturais deste mundo, que passa. Todavia, a nova vida em Cristo é do céu, e o seu poder excelente pode se manifestar somente se a casca do velho homem com suas vontades e desejos for completamente quebrada através das tribulações, perplexidades, perseguições, e abatimentos, ao mesmo tempo que somos consolados e amparados pelo Senhor pela manifestação do Seu poder e amor, para que não sejamos angustiados, desanimados, desamparados e destruídos (II Cor 4.8,9). 68 Esta será a experiência de todos aqueles que consagrarem efetivamente suas vidas ao serviço de Deus. Tal como Paulo, saberão, por experiência, o que significa trazer diariamente no corpo o morrer de Jesus para que a Sua vida possa se manifestar em nós. Eles saberão por experiência que toda a mortificação que é operada neles, sobretudo no seu ego, tem o propósito de gerar a vida de Cristo nos seus ouvintes (II Cor 4.12). Eles saberão que todo o seu dever é anunciar a fé em Cristo, e a Sua morte e ressurreição, de modo que ministrando por amor aos homens, possam abundar as ações de graças, para a glória de Deus, por causa da multiplicação da graça em muitos corações (v. 13 a 15). Eles saberão que um cristão em seu posto de trabalho, operando fielmente no Espírito, não desfalecerá e suportará e sofrerá tudo por amor a 69 Cristo, ainda que o homem exterior se corrompa, isto é, que enfraqueça, enferme, envelheça, porque o homem interior, a saber, o espírito é renovado gradual e diariamente por Deus, segundo o Seu próprio poder e glória (v. 16). Assim reconhecerão também que toda tribulação traz em si mesma um propósito de nos tornar mais íntimos e participantes da glória de Deus, e que se tornam leves e momentâneas comparadas ao peso das consolações e operações poderosas do Senhor no nosso corpo, alma e espírito. Um cristão experimentado, como Paulo, saberá discernir a vida espiritual que não se experimenta por vista, mas por fé, que se firma não nas coisas visíveis que são temporais, mas nas invisíveis que são eternas. 70 Esvaziar-nos de nós Mesmos Para Sermos Úteis "5 Tende em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus, 6 o qual, subsistindo em forma de Deus, não considerou o ser igual a Deus coisa a que se devia aferrar, 7 mas esvaziou-se a si mesmo, tomando a forma de servo, tornando-se semelhante aos homens; 8 e, achado na forma de homem, humilhou-se a si mesmo,tornando-se obediente até a morte, e morte de cruz. 9 Pelo que também Deus o exaltou soberanamente, e lhe deu o nome que é sobre todo nome; 10 para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho dos que estão nos céus, e na terra, e debaixo da terra, 11 e toda língua confesse que Jesus Cristo é Senhor, para glória de Deus Pai." (Filipenses 2.5-11) 71 Ninguém jamais poderá se humilhar tanto quanto Cristo se humilhou, pois não era um homem pecador; porém se fez homem, sendo Deus, exaltado à destra do Pai, coroado de honra e glória diante dos serafins, querubins, arcanjos e anjos no céu. Foi desta altura infinita de glória que Ele desceu até nós humilhando-se a si mesmo, esvaziando-se e tomando a forma de servo, assumindo a natureza do homem, apesar de ser Deus. Ele fez isto, porque era governado completamente por um sentimento de humildade e não de orgulho. É este mesmo sentimento de Cristo que todos os cristãos devem possuir. Cristo não considerou uma desonra o fato de ter sido feito menor do que os anjos, ainda que por um determinado período, a saber, enquanto viveu em carne neste mundo esvaziado da Sua glória divina, como vemos em Hb 2.9, porque considerou maior 72 coisa fazer a vontade do Pai, relativamente à salvação dos pecadores. Os cristãos têm um serviço a fazer para Deus, que é a continuidade do mesmo serviço de Cristo, e para tanto necessitam ter o mesmo sentimento de humildade que houve em Cristo Jesus. Nosso Senhor comprovou Sua humildade através da Sua obediência ao Pai, e é do mesmo modo que nossa humildade é comprovada diante de Deus, a saber, na nossa obediência a Ele. Jesus se manifestou também, para o propósito de nos ensinar qual é o modo correto de se viver para Deus. Este modo que nos revelou é em completa submissão e serviço, mediante a Sua Palavra, escolhendo fazer a vontade de Deus, em vez da nossa vontade, gastando-se inteiramente na Sua obra, porque afinal, nos deu vida para que trabalhássemos para Ele. 73 Fomos colocados neste mundo para este propósito. Bem-aventurados são todos aqueles que não somente descobrem isto, como também se aplicam a isto. A humilhação voluntária de Jesus se comprova também, no fato de que Ele tem o nome que é sobre todo o nome. Por isso, ao nome de Jesus se dobra e se dobrará todo joelho dos que estão nos céus, na terra e debaixo da terra, e toda língua confessa e confessará que Jesus é Senhor, porque Ele sempre foi e será o Senhor de tudo e de todos. Este que é o Senhor foi achado em Seu ministério terreno na forma de servo e em completa humildade. Servo na verdadeira acepção da palavra, ou seja, servindo de fato tanto a Deus quanto aos homens criados à Sua imagem e semelhança. Como devem ser e andar então, os cristãos, os quais não estavam na glória do céu antes de serem 74 gerados, e que nunca tiveram e jamais terão a mesma intensidade de glória do seu Senhor? Caberia, se deixarem dominar por qualquer forma de orgulho ou vanglória? Jesus viveu suportando pacientemente a maldade dos homens, em grande pobreza, a ponto de não ter onde reclinar a cabeça; viveu de ofertas e sabia o que era a aflição; não viveu em pompa externa e não buscou nenhuma posição que O exaltasse sobre os demais homens, buscando fama e honrarias deste mundo. Ele não deu somente Seu serviço aos homens, mas Sua própria vida; morrendo por eles na cruz. Ninguém nunca desceu tanto ou poderá descer tanto em humilhação, quanto nosso Senhor, porque Ele estava na glória do céu quando veio assumir nossa humanidade, ao ser gerado com um corpo humano no ventre de Maria. Ele passou a ter a natureza humana, além da natureza divina na qual Ele subsistia. E, consentiu, 75 apesar de sua perfeição gloriosa, em suportar conviver com pecadores falhos, impuros, imperfeitos e ignorantes como nós. Se Ele não tivesse feito isto, jamais poderíamos receber a natureza divina para estar em nós, além da nossa natureza humana. Para nós, receber a natureza divina é uma grande honra e glória. Mas para Cristo, assumir nossa natureza humana, sendo Deus, foi uma grande humilhação. A Palavra, porém nos afirma que Ele não se envergonhou disto, porque não se envergonha em nos chamar de irmãos, por ter-se feito semelhante a nós, como lemos em Hb 2.11 e 11.16. Nós não somos, por natureza humildes, ao contrário, somos governados pela carne. Por isso é preciso mortificar a carne para que possamos ser governados pelo Espírito Santo, e crescermos em humildade diante de Deus e dos 76 homens, para que Ele possa nos transformar segundo a semelhança de Cristo. A nossa vontade natural quer sempre fazer aquilo que seja do nosso próprio interesse egoísta, mas a vontade de Deus é santa, perfeita, boa, agradável. É esta vontade que o Espírito Santo quer implantar em nossa natureza. O Espírito Santo não nos foi dado, portanto para fazermos o que seja da nossa própria vontade, mas aquilo que é da vontade de Deus, na transformação de nossas vidas. Quando o Espírito luta contra a carne, não é para fazer nossa vontade, mas para aplicar em nossa vida a vontade de Deus, como vemos em Gál 5.17. É a graça de Deus que inclina nossa vontade ao que é bom, e nos permite executar o bem. Não há nenhuma força, mérito ou capacidade em nós mesmos, que nos habilite a fazer a obra de Deus. 77 Escrito na Mente e no Coração Quando lemos o Sermão do Monte, em Mateus 5 a 7, costumamos pensar que estamos diante de um novo código de leis, que nos foram dadas por Jesus Cristo para cumprirmos em complemento aos mandamentos da Lei de Moisés. Todavia, a intenção de nosso Senhor Jesus Cristo não foi esta, mas a de revelar quais são as características pessoais e circunstâncias que acompanharão aqueles que foram tornados cidadãos do reino dos céus, por meio da fé nEle, e por terem nascido de novo do Espírito Santo. Ali está descrito sobretudo, quais são as atitudes, pensamentos, ações e o programa de vida de um cristão amadurecido. Dizemos amadurecido, porque ninguém amará seus inimigos, perdoará seus ofensores, orará pelo bem dos que lhe perseguem, e bendirá os que lhe amaldiçoam, ou ainda, não reclamará o que se 78 considera seus direitos legítimos quando sofrer injustiças, caso não tenha feito progresso no crescimento na fé, na graça e no conhecimento pessoal de Jesus Cristo, sendo e agindo como o Seu Mestre. A glória de Deus é ser amoroso, misericordioso, longânimo, bondoso, perdoador, para com todos, inclusive para com os piores pecadores. E assim como Ele é, importa que sejam aqueles que se tornaram seus filhos amados, por meio da fé em Cristo. Então o Senhor delineou no Sermão do Monte, quais são as características essenciais que estarão presentes naqueles que se converterem a Ele, como resultado do fruto do Espírito Santo, que operou neles a regeneração (novo nascimento espiritual) e a santificação (mortificação das obras da carne e revestimento das suas virtudes divinas). Cristãos amadurecidos não são dominados por amarguras, 79 iras, contendas, gritarias, glutonarias, e todas as demais obras da carne que são nomeadas na Bíblia. Cristãos amadurecidos são longânimos, como Deus é completamente longânimo. São amorosos, como Deus é amoroso. São misericordiosos, como Deus é misericordioso. Não são legalistas, moralistas, acusadores, mas promotores do amor, da paz, do perdão, da oferta da justiça de Cristo para a justificação dos que se encontram presos às amarras do pecado. São tardios para se irar e para falar, e prontos para ouvir, porque sabem que a ira do homem não promove a justiça de Deus, mesmo quando esta ira é motivada pela defesa dos princípios de Deus contra o pecado. A propósito, era justamente isto o que Tiago queria ensinar quandoescreveu a epístola que leva o Seu nome. Ele indicou a necessidade de se aprender a ser paciente e longânime, debaixo das mais variadas provações, porque estas visam ao aperfeiçoamento espiritual do cristão, para que seja conformado ao 80 caráter amoroso, longânime, bondoso e paciente do próprio Deus. Não estava portanto escrevendo uma cartilha de bons modos, ou de procedimentos sociológicos e psicológicos para sermos bem sucedidos em possíveis demandas e disputas com o nosso próximo, por nos mantermos serenos e calados. O que ele tinha em foco, tal como o Seu Senhor no Sermão do Monte, era muito mais profundo e significativo do que isto. A semelhança com Jesus Cristo em tudo. Este é o alvo principal. A vida de Cristo manifestada no comportamento do cristão. Este é o ponto central. E isto não é obtido por mero conhecimento intelectual da vontade revelada de Deus nas Escrituras. Tem a ver com experiências reais transformadoras da graça de Jesus, do poder do Espírito Santo, dando-nos um novo coração e um crescimento progressivo na obtenção das virtudes espirituais do próprio Deus. 81 Foi para esta exata imagem e semelhança com o caráter santo de Deus que o homem foi criado por Ele. De modo que saberemos que temos sido aperfeiçoados em tal caráter, quando virmos as realidades afirmadas no Novo Testamento, sendo implantadas no nosso viver diário, especialmente pela forma como agimos nas situações que nos são adversas. Então temos estas leis, se é assim que devemos considerá-las (porque são inscritas por Deus na nossa mente e coração, ou seja, farão parte da nova natureza recebida pela fé), como as leis principais que devemos observar e praticar: a do amor a Deus, à Sua Palavra e ao próximo; a da paciência na tribulação; a da longanimidade na provocação; a da fé e do ânimo constante nas aflições; a da mansidão, da paz de mente e coração nas perturbações. Na verdade, nada disto se obtém por uma simples vontade de cumprir a lei ou o mandamento, mas por 82 uma andar constante no Espírito Santo, debaixo de um temor e amor real a Cristo. Gál 5:16-25: Digo, porém: andai no Espírito e jamais satisfareis à concupiscência da carne. Porque a carne milita contra o Espírito, e o Espírito, contra a carne, porque são opostos entre si; para que não façais o que, porventura, seja do vosso querer. Mas, se sois guiados pelo Espírito, não estais sob a lei. Ora, as obras da carne são conhecidas e são: prostituição, impureza, lascívia, idolatria, feitiçarias, inimizades, porfias, ciúmes, iras, discórdias, dissensões, facções, invejas, bebedices, glutonarias e coisas semelhantes a estas, a respeito das quais eu vos declaro, como já, outrora, vos preveni, que não herdarão o reino de Deus os que tais coisas praticam. Mas o fruto do Espírito é: amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, domínio próprio. Contra estas coisas não há lei. E os que são de Cristo Jesus 83 crucificaram a carne, com as suas paixões e concupiscências. Se vivemos no Espírito, andemos também no Espírito. 84 O Governo Usurpador da Alma Sobre o Nosso Espírito Nós lemos em Hebreus 4.12: "...a Palavra de Deus é viva e eficaz, e mais cortante do que qualquer espada de dois gumes, e penetra até a divisão de alma e espírito, e de juntas e medulas, e é apta para discernir os pensamentos e intenções do coração". Este texto fala de separação de alma e espírito pela Palavra de Deus. Sabemos que o corpo, a alma e o espírito do homem formam uma grande unidade, e estão intimamente ligados, de modo que se pode dizer que são uma só coisa, assim como Deus é um, e no entanto são três pessoas: Deus Pai, Deus Filho e Deus Espírito Santo. Por isso, quando o espírito deixa este mundo, o corpo morre; se o corpo morre, sai o espírito e volta para Deus. 85 Quando o corpo e alma descansam no sono, também descansa o espírito. Todavia, há diferenças marcantes entre os três. Mas nos concentraremos neste artigo somente na alma e no espírito, porque a Bíblia fala de separação de alma e espírito, e o que se quer afirmar é a distinção das funções que competem respectivamente ao espírito e à alma. Com vistas a um melhor entendimento de tudo o que vai ser comentado, gostaríamos, antes, de explicar quais são as faculdades da alma, que não fazem parte do espírito humano. Entre estas faculdades estão nossos sentimentos, nossa mente, nossa vontade, nossas emoções e pensamentos, até mesmo a nossa razão. Alma tem a ver com o cérebro, de onde procedem todas estas faculdades referidas. Cérebro tem a ver com o que é natural, e não sobrenatural, como é o caso do espírito, que nos veio de Deus, e que volta para Ele, na nossa morte. 86 De maneira que ao falar em separação de alma e espírito, pela Palavra de Deus, a Bíblia quer nos mostrar que precisamos ser governados pelo espírito, e não meramente por nossos sentimentos, vontade, emoções, pensamentos e até mesmo pela nossa própria razão. Somente quando estamos santificados pelo Espírito Santo, mediante aplicação da Palavra de Deus em nossas vidas, a nossa alma entra automaticamente debaixo do governo do nosso espírito e passa a ser uma serva do espírito, ficando este portanto, livre das suas paixões irregulares e desordenadas que nos levam a pecar. Portanto, não é possível ser espiritual, conforme é do propósito de Deus na criação do homem, sem que se tenha a habitação do Espírito Santo. Entretanto, como o pecado continua operando na carne, há necessidade do trabalho da cruz para que sejamos as pessoas espirituais que Deus planejou desde antes da fundação do mundo. 87 Nós lemos em Gênesis 6.3 o seguinte: “Então disse o Senhor: O meu Espírito não permanecerá para sempre no homem, porquanto ele é carnal, mas os seus dias serão cento e vinte anos.” O que podemos deduzir desta passagem das Escrituras, senão que Deus não havia criado o homem para que ele vivesse pelo governo da sua alma natural? A palavra “carnal” no texto de Gên 6.3 reporta à inclinação da natureza decaída no pecado, e não propriamente ao fato de o homem também possuir um corpo físico. Deus é espírito, e criou o homem para ter comunhão com Ele em espírito, porque é somente este o modo possível de tal comunhão. Por isso Jesus destacou que não se pode adorar a Deus a não ser apenas em espírito e em verdade. 88 O propósito de Deus na criação do homem é que este fosse espiritual e não carnal, conforme veremos neste nosso estudo. E quando Deus diz que o homem se tornou carnal por causa do pecado é a isto que Ele quer principalmente se referir, porque não é governado pelo reino espiritual divino, mas pelo reino natural segundo a carne. Por isso se impõe o trabalho da cruz sobre o ego carnal, para que o Espírito Santo possa assumir o pleno governo, conforme Deus havia planejado desde antes da criação do mundo. Desde a Queda no Éden a alma deixou de estar em sujeição ao espírito e passou a assumir o governo do ser humano, tornando-se assim uma barreira para o conhecimento experimental da vida de Deus, que é espírito. Se Cristo não estabelecer o Seu governo no nosso coração, o que haverá será o governo usurpador da alma contra a vontade de Deus. 89 E este governo da alma é designado na Bíblia como um viver segundo a carne. Segundo o homem natural e não segundo o homem espiritual. Vale lembrar que a palavra constante de I Cor 2.14 para “natural”, quando Paulo diz que o homem natural não aceita as coisas do Espírito, tal palavra é no original grego psiquikós, que significa aquilo que é relativo à alma. Quando o homem é governado pelas faculdades da alma, e não pelas faculdades do espírito, ele agirá segundoa natureza terrena, Daí se afirmar que o homem natural, ou seja, aquele que é governado por um viver segundo a alma, e não segundo o espírito, não pode entender as coisas do Espírito Santo de Deus. Os cristãos carnais a que Paulo se refere em I Cor 3.1 em contraposição aos espirituais, são designados no original grego pela palavra sarkikós, para carnais, e os espirituais, pela palavra pneumatikós, que se refere ao espírito. 90 O trabalho da alma no cristão carnal é fazê-lo viver pela sua própria vida natural e tentar trabalhar e servir a Deus pela sua própria habilidade natural. Com isto, ele não chega a ter um conhecimento verdadeiro e progressivo de Deus, porque este conhecimento decorre de uma comunhão e de experiências reais com o Espírito Santo de Deus, em espírito. A carne não pode ter tal comunhão e experiência com o Espírito Santo de Deus. Por isso nosso Senhor Jesus Cristo afirmou que a carne para nada aproveita, e que o que tudo é gerado pela carne é carnal. Nossos pensamentos, emoções, sentimentos e vontade, e razão, que são faculdades que emanam do nosso cérebro, devem ser submetidos ao governo do Espírito Santo de Deus, e por conseguinte do nosso próprio espírito. E a Bíblia afirma que isto é operado pela Palavra de Deus, em Hb 4.12. 91 Chegará o dia em que não haverá mais esta dependência do cérebro, ou da alma, quando sairmos deste mundo pela morte, porque somente o espírito subirá à presença do Senhor, libertado completamente dos desejos e das paixões da alma. Então o espírito terá vida e expressão independentemente do nosso cérebro. E não há nenhum outro modo para subjugar o governo usurpador da alma, senão somente pela crucificação do ego pela nossa cruz, que deve ser carregada voluntária e diariamente. Nos quatro Evangelhos, nós vemos que Jesus chamou os seus discípulos para renunciarem ao modo de viver pelo governo das suas almas, submetendo-o à morte na cruz, para que pudessem segui-lO. O Senhor sabia que renunciar ao modo de viver pela alma é uma exigência absolutamente indispensável, para que os cristãos possam segui- lO. 92 Em Mt 10:38 e 39 o Senhor Jesus disse: "38 E quem não toma a sua cruz, e não segue após mim, não é digno de mim. 39 Quem achar a sua vida perdê-la- á, e quem perder a sua vida por amor de mim achá- la-á.". Neste texto, a palavra para vida no original grego é psiquê, que significa alma. Não se trata propriamente de se matar a alma, mas o modo de viver pela alma, para que se possa viver pelo espírito. É isto que Jesus quis dizer com suas palavras. Este modo de viver pela alma somente pode ser morto pela cruz. É por isso que em outras passagens do Evangelho, como em Lc 14.26,27 por exemplo, Jesus associou a perda da vida da alma ao ato voluntário de se carregar a cruz e de se auto negar, para poder segui- lO. Estes versos nos chamam a perder o viver pela alma por causa do Senhor, entregando este viver à cruz, 93 para que seja crucificado, e Ele ensinou que isto deve ser feito diariamente. De acordo com nosso viver pela alma, nós fazemos a vontade daqueles a quem amamos, ainda que isto contrarie a vontade de Deus, por isso se impõe a morte deste viver pela alma. Nada há de errado em demonstrar sentimentos e emoções, mas quando nossos sentimentos, emoções e vontade são irregulares e são a causa de não nos submetermos à Palavra e vontade de Deus, é porque estamos sendo pessoas carnais e não espirituais. Quando Deus está em conflito com o desejo do homem, embora aquela pessoa seja a que nós mais amamos, importa antes amar mais a Deus. Por isso nosso Senhor disse em Mt 10.37: "Quem ama o pai ou a mãe mais do que a mim não é digno de mim; e quem ama o filho ou a filha mais do que a mim não é digno de mim.". 94 Em Lucas 14:26 e 27 está escrito: "26 Se alguém vier a mim, e não aborrecer a pai e mãe, a mulher e filhos, a irmãos e irmãs, e ainda também à própria vida, não pode ser meu discípulo. 27 Quem não leva a sua cruz e não me segue, não pode ser meu discípulo.". É proibido pelo Senhor que eu ame somente aqueles a quem eu amo naturalmente. O próprio Jesus nos deixou este exemplo quando definiu a sua família como sendo a que é composta por aqueles que conhecem a Deus e fazem a Sua vontade. O Senhor Jesus quer nos libertar deste tipo de domínio do afeto natural, de modo que possamos ser cheios do seu amor sobrenatural, que é um amor por todos os homens, e que não faz qualquer tipo de acepção de pessoas. O afeto natural é muito importante, mas convém se dar um passo além e se amar com o amor ágape, sobrenatural de Deus. 95 O amor ágape nos vem do alto, e o amor filéo, de mera amizade, é terreno e inerente à nossa própria natureza. Este amor ágape, que é o amor derramado pelo Espírito Santo nos nossos corações, é o amor de comunhão entre espíritos, que capacita a tudo sofrer, perdoar, suportar, e não ficarmos irados com as injustiças e ofensas que sofremos, de modo que é um amor que habilita a amar até mesmo inimigos. A espada referida no texto de Hb 4.12 é uma alusão à que era usada pelo sumo sacerdote para dividir o holocausto em partes. Esta espada representa a Palavra que é usada por Cristo através do trabalho do Espírito Santo para separar espírito e alma nos cristãos, de maneira que possam ser verdadeiramente espirituais. A espada do Espírito é a Palavra de Deus. É portanto a palavra do evangelho de Cristo, que aplicada à mente e ao coração, traz à tona o viver na dimensão 96 do que é espiritual e celestial, prevalecendo sobre tudo o que se refere ao homem exterior com suas cobiças e paixões. Veja o que o apóstolo nos ensina sobre a luta que existe permanentemente entre a carne e o Espírito, e vice- versa: "Porque a carne luta contra o Espírito, e o Espírito contra a carne; e estes se opõem um ao outro, para que não façais o que quereis." (Gál 5.17). Observe que ele afirma que a carne e o Espírito se opõem mutuamente para que não façamos o que seja do nosso querer. O que ele quis dizer com isto? É que na verdade tanto a carne quanto o Espírito lutam contra a lei natural da nossa mente, e contra as disposições da nossa alma. e, tanto um quanto o outro pretendem ter o domínio da nossa vontade e de todo o nosso ser. A carne pretende nos levar a pecar ainda que não o queiramos; e o Espírito Santo pretende nos 97 santificar e nos levar a viver não pelo que é propriamente da nossa vontade, mas por aquilo que é da vontade de Deus. Então o Espírito não luta contra a carne para que seja feito o que seja do nosso querer, mas para que a vontade de Deus possa se cumprir em nós. O Espírito procurará nos levar portanto à cruz para que a carne possa ser crucificada com as suas paixões e desejos (Gál 5.24). Como estas paixões e desejos da carne operam principalmente na mente, então é fundamental que a mente seja renovada. Uma mente renovada pelo Espírito coopera e muito para que tenhamos comunhão com Deus, porque ajudará o espírito nesta comunhão, porque a mente renovada e guiada não pela carne, mas pelo Espírito Santo. E o Espírito poderá então comunicar à nossa mente renovada o conhecimento da vontade de Deus revelada na Sua Palavra. 98 Para entendermos melhor a distinção entre alma e espírito, podemos nos valer de uma análise do que há no comportamento dos animais, porque sabidamente eles não são dotados de espírito como os homens, senão somente de corpo e alma. Nós podemos, em certo grau, entender o que é relativo à nossa alma pelo que observamos no comportamento dos animais, porque tudo o que eles sentem se refere aos poderes da alma, porque como já dissemos, eles não possuem espírito. Há afeto
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