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Sumário II Samuel 1 1 II Samuel 2 7 II Samuel 3 14 II Samuel 4 22 II Samuel 5 26 II Samuel 6 36 II Samuel 7 44 II Samuel 8 49 II Samuel 9 56 II Samuel 10 60 II Samuel 11 64 II Samuel 12 70 II Samuel 13 80 II Samuel 14 86 II Samuel 15 93 II Samuel 16 100 II Samuel 17 104 II Samuel 18 113 II Samuel 19 120 II Samuel 20 129 II Samuel 21 134 II Samuel 22 140 II Samuel 23 144 II Samuel 24 152 II Samuel 1 1 A Notícia da Morte de Saul Nós vemos no primeiro capítulo de 2 Samuel, que Davi havia retornado da batalha que empreendera contra os amalequitas para recuperar as esposas, filhos e bens, dele e dos seiscentos homens que o acompanhavam, e no terceiro dia em que se encontrava em Ziclague, veio ao seu encontro um jovem amalequita trazendo notícias da morte de Saul e de Jônatas. No relato de I Sm 31.3-6 sobre a morte de Saul, o escritor dá como fato exato e certo que ele havia sido ferido gravemente por flechas, que lhe foram lançadas, e que diante da morte iminente nas mãos dos filisteus, se lançou sobre a sua espada, e que o seu escudeiro fez o mesmo, mas depois de ter se certificado que Saul já havia morrido. Assim, tudo indica que era falso o relato que o amalequita fizera sobre os detalhes da forma como Saul fora morto por ele, pois disse a Davi que Saul estava apoiado sobre a sua lança (v. 6), e que lhe pedira que se lançasse sobre ele, porque a penetração da lança não foi capaz de produzir um golpe mortal (v.9). É até possível que o escudeiro de Saul tivesse feito uma avaliação incorreta sobre o momento exato da sua morte, e que tenha também se suicidado enquanto Saul ainda estivesse com vida e solicitado ao amalequita que o matasse. É também possível, que na hora de relatar o fato a Davi, que tenha se equivocado ou alterado propositalmente com qual instrumento Saul estava atravessado, pois em vez de dizer espada hereb, ele disse lança, hanit. Ao que tudo indica o amalequita estivera de fato com Saul nos primeiros momentos da sua morte, pois pegou sua coroa e bracelete e os trouxe à presença de Davi, como prova de que estava lhe dizendo a verdade. Em todo caso, se o relato do amalequita era falso ou verdadeiro, não é relevante, pois o que há de importante para se aprender neste capítulo é o modo como Davi recebeu as notícias, e como agiu em II Samuel 1 2 seguida, e que nem sempre o oportunismo interesseiro será bem sucedido, mesmo neste mundo. O amalequita pensava que seria regiamente recompensado com a notícia da morte de Saul, e mais ainda, pelo fato de ter dito que havia contribuído para que fosse morto, pois sabia o quanto ele vinha perseguindo Davi, a ponto deste ter que se refugiar numa terra estranha. No seu modo de julgar as coisas, segundo o seu padrão de valores, as notícias relativas à ruína dos inimigos é um motivo de grande alegria, e especialmente no caso de Davi, isto significava liberdade, cessação de ser perseguido, e caminho livre para assumir o trono de Israel. Considerando tudo isto, o amalequita pensou ser alvo do seu favor e ganhar um lugar de destaque no seu reino, e escapar, além de tudo, do juízo de extermínio total do seu povo, que havia sido ordenado por Deus, o qual fora desobedecido frontalmente pelo próprio Saul, que não por ironia do destino, mas por obra da providência, caso seja fidedigno o relato do amalequita, veio a ser morto pelas mãos de um daqueles que ele deixara viver, em desobediência à ordem divina. Aqueles que se alegram com a queda de um inimigo costumam medir os outros por si mesmos, pensando que terão a mesma alegria deles. E foi este o erro do amalequita que veio ter com Davi, porque em vez de se alegrar, ele se abateu profundamente com aquela notícia, não somente por Jônatas, como pelo próprio Saul, e por todos os israelitas que haviam caído no campo de batalha. Aquela não era uma notícia para ser festejada, mas para ser lamentada, e foi por causa disto que Davi e todos os israelitas, que estavam com ele rasgaram as suas vestes, em sinal de luto e tristeza, diante de Deus. Os filisteus deviam estar festejando aquele feito de modo muito ofensivo ao Deus de Israel, pois certamente estavam tributando toda a glória da vitória obtida sobre os israelitas, ao deus deles, Dagom; e como Davi poderia ficar alegre com a notícia da morte de Saul e da derrota do exército israelita? II Samuel 1 3 A queda do povo de Deus nunca será um motivo de alegria para um verdadeiro cristão. E tal foi a consternação produzida pela notícia da morte de Saul e Jônatas, e da derrota do exército de Israel, que nós lemos o seguinte nos versos 11 e 12: “11 Então pegou Davi nas suas vestes e as rasgou; e assim fizeram também todos os homens que estavam com ele; 12 e prantearam, e choraram, e jejuaram até a tarde por Saul, e por Jônatas, seu filho, e pelo povo do Senhor, e pela casa de Israel, porque tinham caído à espada.”. Houve não somente o ato de rasgar as vestes, como pranto e jejum por parte de Davi e seus homens. Quem tem o temor de Deus não se alegra sequer pela ruína dos seus inimigos, quanto mais por aqueles que fazem parte do seu próprio povo. Davi sabia muito bem separar os problemas pessoais que tinha que viver por causa das perseguições injustas de Saul, da honra que lhe devia na condição de ser o seu rei, escolhido pelo próprio Deus para reinar em Israel. Antes de começarem as perseguições de Saul, ele já havia sido ungido para ser o futuro rei de Israel, mas enquanto Saul vivesse, sabia que era a ele que o reino pertencia de fato, apesar de ter sido rejeitado por Deus, não somente para ser removido do reino, no momento que Ele determinasse, como também para não mais operar sobre ele, com a boa direção do Espírito Santo. Davi havia colocado a sua vida nas mãos do Senhor, e não teve por usurpação o fato de ter sido ungido para ser rei tal como fora Saul. Ele não estava portanto, torcendo para que Deus desse logo cabo da vida de Saul, para que pudesse tomar o seu lugar. Ele não se conduzia desta forma, porque tinha o temor do Senhor e era guiado pelo Espírito Santo, de forma que esperava tão somente no Senhor e na Sua vontade. Ele aguardava a hora do Senhor. Os seus olhos estavam continuamente no Seu Deus e não em Saul. E assim, a par de todo o mal que Saul lhe fizera, jamais veria na sua morte um motivo de II Samuel 1 4 alegria, senão de tristeza, porque fora ungido pelo Senhor, para estar à testa do Seu povo. Foi por este motivo que Davi ordenou a morte do amalequita, pois dissera que havia matado Saul, e demonstrava em sua presença que tivera regozijo no ato de fazê-lo, como se tivesse feito um grande favor a Davi, que deveria agora dar-lhe a justa recompensa. E ele foi recompensado de fato de modo justo, com a morte, porque assim como ele não temeu matar a Saul na condição de rei e ungido de Deus, também não teria o menor temor em matar o próprio Davi, se achasse oportunidade para fazê-lo. Quando o amalequita viu a reação de Davi e seus homens com o ato de rasgarem suas vestes, prantearem e jejuarem até à tarde, ele deve ter temido muito por sua vida, pois viu que aquela tristeza era sincera e não falsa, ou com motivações políticas, para ganhar a simpatia do povo. Entretanto, pelo que conhecemos do caráter de Davi, sabemos que não fora por este tipo de motivação que ele foi movido quando manifestou o seu pesar, e quando compôs o cântico em memória de Saul e Jônatas, e que mandou ser ensinado em Judá, para ser cantado em honra deles. A elegia que Davi compôs foi registrada no chamado livro de Jasar, da palavra hebraica iasar, que significa justo, e por isso temos em algumas versões livro dos Justos em vez de Jasar. Este livro é o mesmo citado em Josué 10.13. Esta palavra hebraica iasar é usada em inúmeras passagens do Velho Testamento, como por exemplo em Êx 15.26; Nm 23.10; Dt 6.18; Jos 9.25; Jz 17.6;I Sm 12.23; Sl 7.10; 11.7, 19.8, dentre outras, onde é traduzida por reto, bom, justo. O cântico de Davi não cita uma única nota de lamento sobre quaisquer dos muitos erros que Saul havia cometido ao longo de todo o seu reinado. Com isto nós aprendemos que não devemos falar mal daqueles em quem não podemos achar o bem. É naquilo que é louvável que devemos concentrar a nossa atenção, seguindo a norma bíblica: II Samuel 1 5 “Quanto ao mais, irmãos, tudo o que é verdadeiro, tudo o que é honesto, tudo o que é justo, tudo o que é puro, tudo o que é amável, tudo o que é de boa fama, se há alguma virtude, e se há algum louvor, nisso pensai.” (Fp 4.8). Davi celebra a Saul como o homem de guerra que havia sido e que tinha dado a Israel muitas vitórias sobre as nações inimigas, e nisto a sua morte era algo para se lamentar. Mas sobre Jônatas havia muito mais do que isto para ser cantado em sua honra, pois dele Davi disse o que lemos no verso 26: “Angustiado estou por ti, meu irmão Jônatas; muito querido me eras! Maravilhoso me era o teu amor, ultrapassando o amor de mulheres.”. A morte de todos os guerreiros de Israel, que haviam tombado na batalha contra os filisteus é lamentada especialmente no último verso (27): “Como caíram os valorosos, e pereceram as armas de guerra!”. O sentimento de Davi pode ser muito bem definido pelas palavras do apóstolo: “De maneira que, se um membro padece, todos os membros padecem com ele; e, se um membro é honrado, todos os membros se regozijam com ele.” (I Cor 12.26). O Israel de Deus é um só corpo, apesar de ter muitos membros. E todo aquele que faz parte do corpo de Cristo há de se sentir como Davi se sentiu quando vir qualquer parte deste corpo sendo vencida pelo Inimigo, em algumas das muitas batalhas que deve empreender contra os poderes das trevas. A perda de um só membro é sentida por todo o corpo e jamais será motivo de alegria, senão de tristeza e algo para se lamentar, tal como fizera Davi. ”1 Depois da morte de Saul, tendo Davi voltado da derrota dos amalequitas e estando há dois dias em Ziclague, 2 ao terceiro dia veio um homem do arraial de Saul, com as vestes rasgadas e a cabeça coberta de terra; e, chegando ele a Davi, prostrou-se em terra e lhe fez reverência. II Samuel 1 6 3 Perguntou-lhe Davi: Donde vens? Ele lhe respondeu: Escapei do arraial de Israel. 4 Davi ainda lhe indagou: Como foi lá isso? Dize-mo. Ao que ele lhe respondeu: O povo fugiu da batalha, e muitos do povo caíram, e morreram; também Saul e Jônatas, seu filho, foram mortos. 5 Perguntou Davi ao mancebo que lhe trazia as novas: Como sabes que Saul e Jônatas, seu filho, são mortos? 6 Então disse o mancebo que lhe dava a notícia: Achava-me por acaso no monte Gilboa, e eis que Saul se encostava sobre a sua lança; os carros e os cavaleiros apertavam com ele. 7 Nisso, olhando ele para trás, viu-me e me chamou; e eu disse: Eis- me aqui. 8 Ao que ele me perguntou: Quem és tu? E eu lhe respondi: Sou amalequita. 9 Então ele me disse: Chega-te a mim, e mata-me, porque uma vertigem se apoderou de mim, e toda a minha vida está ainda em mim. 10 Cheguei-me, pois, a ele, e o matei, porque bem sabia eu que ele não viveria depois de ter caído; e tomei a coroa que ele tinha na cabeça, e o bracelete que trazia no braço, e os trouxe aqui a meu senhor. 11 Então pegou Davi nas suas vestes e as rasgou; e assim fizeram também todos os homens que estavam com ele; 12 e prantearam, e choraram, e jejuaram até a tarde por Saul, e por Jônatas, seu filho, e pelo povo do Senhor, e pela casa de Israel, porque tinham caída à espada. 13 Perguntou então Davi ao mancebo que lhe trouxera a nova: Donde és tu? Respondeu ele: Sou filho de um peregrino amalequita. 14 Davi ainda lhe perguntou: Como não temeste estender a mão para matares o ungido do Senhor? 15 Então Davi, chamando um dos mancebos, disse-lhe: chega-te, e lança-te sobre ele. E o mancebo o feriu, de sorte que morreu. 16 Pois Davi lhe dissera: O teu sangue seja sobre a tua cabeça, porque a tua própria boca testificou contra ti, dizendo: Eu matei o ungido do Senhor. II Samuel 1 7 17 Lamentou Davi a Saul e a Jônatas, seu filho, com esta lamentação, 18 mandando que fosse ensinada aos filhos de Judá; eis que está escrita no livro de Jasar: 19 Tua glória, ó Israel, foi morta sobre os teus altos! Como caíram os valorosos! 20 Não o noticieis em Gate, nem o publiqueis nas ruas de Asquelom; para que não se alegrem as filhas dos filisteus, para que não exultem as filhas dos incircuncisos. 21 Vós, montes de Gilboa, nem orvalho, nem chuva caia sobre vós, ó campos de morte; pois ali desprezivelmente foi arrojado o escudo dos valorosos, o escudo de Saul, ungido com óleo. 22 Do sangue dos feridos, da gordura dos valorosos, nunca recuou o arco de Jônatas, nem voltou vazia a espada de Saul. 23 Saul e Jônatas, tão queridos e amáveis na sua vida, também na sua morte não se separaram; eram mais ligeiros do que as águias, mais fortes do que os leões. 24 Vós, filhas de Israel, chorai por Saul, que vos vestia deliciosamente de escarlata, que vos punha sobre os vestidos adornos de ouro. 25 Como caíram os valorosos no meio da peleja! 26 Angustiado estou por ti, meu irmão Jônatas; muito querido me eras! Maravilhoso me era o teu amor, ultrapassando o amor de mulheres. 27 Como caíram os valorosos, e pereceram as armas de guerra!” (II Sm 1.1-27). II Samuel 2 Um Reino que É Tomado por Esforço Nós vemos no segundo capítulo de 2 Samuel, que tendo Saul morrido, Davi perguntou ao Senhor se deveria retornar de Ziclague para alguma das cidades de Judá. E o Senhor respondeu afirmativamente. II Samuel 2 8 No entanto, Davi não se aventurou, por tudo que havia aprendido, a escolher a cidade para a qual deveria retornar por sua própria conta, e nem entregaria esta decisão à deliberação dos anciãos das diversas cidades de Judá. Melhor do que qualquer pessoa somente o Senhor sabia qual seria a cidade que lhe seria mais propícia ao seu retorno, e por isso voltou a consultar ao Senhor pedindo-lhe que dissesse para qual cidade ele deveria ir. E como resposta o Senhor lhe apontou a cidade de Hebrom, que era uma cidade de refúgio e sacerdotal, e como todas as cidades de refúgio, ficava localizada numa região montanhosa. Quando foi para Hebrom, Davi levou consigo suas duas esposas, Ainoã e Abigail (v.2), e na ocasião não tinha filhos. No período de sete anos e seis meses, que permaneceu em Hebrom, tomaria mais quatro mulheres por esposas, e com estas e com Ainoã e Abigail gerou seis filhos, sendo um de cada uma destas seis mulheres, cujos nomes, e dos respectivos filhos, são citados no início do capítulo seguinte. Quando chegou a Hebrom os homens de Judá ungiram Davi rei sobre toda a casa de Judá, enquanto as demais tribos permaneceram seguindo a casa de Saul, porque Abner, seu tio, e general do seu exército, agiu rapidamente para constituir Is-Bosete, filho de Saul, como rei sobre Israel, inclusive sobre as tribos de Rúben, Gade e Manassés, na Transjordânia. Davi havia se congratulado com os gileaditas, quando soube o bem que eles haviam feito à honra de Saul e Jônatas, resgatando os seus corpos do território dos filisteus, para serem sepultados em Gileade. E antes que tomassem qualquer iniciativa no sentido de se aliarem a Davi, Abner se apressou em lhes apresentar Is-Bosete, que escapara da morte, por não ter subido à guerra contra os filisteus, e certamente sob a alegação de que era o legítimo herdeiro do trono, por ser filho de Saul, e por isso se diz que Abner fez passar Is- Bosete por Maanaim, uma das principais regiões da Transjordânia, constituindo-o rei sobre Gileade. II Samuel 2 9 Foi também para Maanaim que Davi se dirigiu, quando fugiu de Absalão, e onde permaneceu um longo período, até que a rebelião de seu filho fosse completamente dissolvida. Maanaim ficava ao Sul do rio Jaboque, e na fronteiradas tribos de Gade e Manassés, e pertencia à tribo de Gade. Judá havia se acostumado a agir separadamente, e nós vemos esta tribo sendo numerada à parte para a guerra, desde os dias de Saul (I Sm 15.4). A divisão de Israel em Reino do Norte, e do Sul, depois de Salomão, já vinha deitando raízes desde há muito, e era pela Providência divina que ela não se consumara antes da época determinada. Mas esta divisão de reinos prevaleceu nos sete anos e meio que Davi reinou sobre Judá em Hebrom, período em que houve guerra entre Judá e as demais tribos de Israel, que estavam debaixo do governo de Is-Bosete, e mais propriamente do general Abner, que era o homem forte do reino, pois este Is-Bosete era fraco, conforme o demonstra o relato bíblico, e não é de se estranhar portanto, que não tivesse subido à guerra contra os filisteus com seu pai e seus dois irmãos, que haviam morrido em batalha. Abner se opôs ao reinado de Davi, provavelmente em seu zelo pela sucessão linear em que a coroa tem que passar de pai para filho, e também por motivo de afeto à sua própria família, porque era tio avô de Is-Bosete, e ainda, porque ele sabia que dificilmente seria nomeado por Davi general de todo o seu exército, honra que até aquele momento fora dada aos sobrinhos de Davi, Joabe, Abisai e Asael, filhos de Zeruia, que era irmã de Davi (I Crôn 2.15,16). Os quais eram homens poderosos e influentes em Judá. Não podemos esquecer que a família de Jessé era descendente do primeiro príncipe e general do exército de Judá, nos dias de Moisés, chamado Naassom (I Crôn 2.10-12), e assim a família de Jessé desfrutava de um grande prestígio na tribo de Judá. Provavelmente, Is-Bosete jamais protestaria qualquer direito à coroa, fraco que era, caso o orgulho de Abner não lhe tivesse levado a agir para a consecução dos seus próprios objetivos. II Samuel 2 10 Todavia, Deus permitiu tudo isto para que a fé de Davi fosse provada na paciência e luta que teria que travar para que a promessa de que seria rei sobre todo Israel fosse cumprida. Nisto há um grande exemplo para a Igreja de Cristo, porque ainda que seja fiel a promessa de que reinaremos com Ele, entretanto esta promessa é alcançada mediante o nosso esforço e fé, sofrendo com Ele neste mundo, para que sejamos achados dignos de também reinar com Ele quando todas as coisas Lhe estiverem sujeitas. Foi através de graus que o reino de Davi se estabeleceu, e nisto, vem a ser tipo do reino do próprio Cristo, que está sendo também estabelecido em graus, pois ainda não se veem ainda todas as coisas a Ele sujeitas (Hb 2.8). Mas é garantido e certo que Ele reinará sobre todos bem como todos os que estiverem com Ele, tal como se deu com Davi, que apesar de ter sido ungido por Deus para ser o sucessor de Saul, teve que lutar contra todos os poderes que se levantaram contra ele, até que se cumprisse cabalmente a promessa do Senhor, que de nenhum modo poderia falhar, pois tudo o que a boca do Senhor tem dito, cumprir-se-á. E o primeiro confronto entre os homens de Davi e os de Abner se deu junto ao açude de Gibeão, estando as tropas separadas pelas margens opostas do referido açude. E Abner desafiou as forças de Judá, propondo a Joabe que os valentes de ambos os lados se enfrentassem, para que através daquele jogo militar ficasse demonstrado quem de fato estava melhor preparado para a guerra. Sendo escolhidos doze homens valorosos de ambos os lados, lutou cada um com o seu oponente, e o resultado foi que se mataram simultaneamente, não saindo vencedor nenhum dos lados. É bem provável que isto foi permitido por Deus, para que Abner soubesse que aquela guerra civil deveria ser evitada e deveria reconhecer que Davi fora ungido para ser o rei de todo Israel. Contudo, a luta prosseguiu e os homens de Abner foram derrotados, tendo morrido vinte da parte de Davi (v. 30), e trezentos e sessenta da parte de Abner (v. 31). II Samuel 2 11 Não poderia haver um recado mais claro da parte de Deus para as tribos de Israel de que Ele era com Davi e não com Is-Bosete, e seu tio Abner. Nesta batalha foi morto o sobrinho de Davi, Asael, irmão de Joabe e de Abisai, que obstinadamente se colocou em perseguição a Abner com o intuito de pôr logo um fim àquela guerra. De fato, se lograsse atingir o seu objetivo, matando Abner, Is-Bosete não teria força suficiente para reter os israelitas, e estes teriam seguido a Davi. Mas, como isto se deu logo no início do reinado de Davi em Hebrom, sete anos estavam determinados para que Davi viesse finalmente triunfar, e importava que Abner permanecesse em vida neste período, para que Israel aprendesse que é inútil lutar contra aquilo que foi determinado por Deus, mesmo quando se tem ao nosso lado um general experiente e valoroso como Abner e uma superioridade numérica, como tinham as demais tribos de Israel, em relação a Judá. Tal era a supremacia das forças de Davi sobre as de Abner, que a destruição teria sido muito maior caso o próprio Abner não tivesse rogado a Joabe por uma trégua, para que não houvesse um grande enfraquecimento das forças de Israel pela espada dos seus próprios irmãos (v. 26,27). Depois desta batalha Abner retornou a Maanaim onde Is-Bosete fora entronizado, e Joabe e seus homens voltaram a Hebrom. “1 Sucedeu depois disto que Davi consultou ao Senhor, dizendo: Subirei a alguma das cidades de Judá? Respondeu-lhe o Senhor: Sobe. Ainda perguntou Davi: Para onde subirei? Respondeu o Senhor: Para Hebrom. 2 Subiu, pois, Davi para lá, e também as suas duas mulheres, Ainoã, a jizreelita, e Abigail, que fora mulher de Nabal, e carmelita. 3 Davi fez subir também os homens que estavam com ele, cada um com sua família; e habitaram nas cidades de Hebrom. 4 Então vieram os homens de Judá, e ali ungiram Davi rei sobre a casa de Judá. Depois informaram a Davi, dizendo: Foram os homens de Jabes-Gileade que sepultaram a Saul. II Samuel 2 12 5 Pelo que Davi enviou mensageiros aos homens de Jabes-Gileade, a dizer-lhes: Benditos do Senhor sejais vós, que fizestes tal benevolência, sepultando a Saul, vosso senhor! 6 Agora, pois, o Senhor use convosco de benevolência e fidelidade; e eu também vos retribuirei esse bem que fizestes. 7 Esforcem-se, pois, agora as vossas mãos, e sede homens valorosos; porque Saul, vosso senhor, é morto, e a casa de Judá me ungiu por seu rei. 8 Ora, Abner, filho de Ner, chefe do exército de Saul, tomou a Is- Bosete, filho de Saul, e o fez passar a Maanaim, 9 e o constituiu rei sobre Gileade, sobre os asuritas, sobre Jizreel, sobre Efraim, sobre Benjamim e sobre todo o Israel. 10 Quarenta anos tinha Is-Bosete, filho de Saul, quando começou a reinar sobre Israel, e reinou dois anos, A casa de Judá, porém, seguia a Davi. 11 E foi o tempo que Davi reinou em Hebrom, sobre a casa de Judá, sete anos e seis meses. 12 Depois Abner, filho de Ner, com os servos de Is-Bosete, filho de Saul, saiu de Maanaim para Gibeão. 13 Saíram também Joabe, filho de Zeruia, e os servos de Davi, e se encontraram com eles perto do tanque de Gibeão; e pararam uns de um lado do tanque, e os outros do outro lado. 14 Então disse Abner a Joabe: Levantem-se os mancebos, e se batam diante de nós. Respondeu Joabe: Levantem-se. 15 Levantaram-se, pois, e passaram, em número de doze por Benjamim e por Is-Bosete, filho de Saul, e doze dos servos de Davi. 16 E cada um lançou mão da cabeça de seu contendor, e meteu-lhe a espada pela ilharga; assim caíram juntos; pelo que se chamou àquele lugar, que está junto a Gibeão, Helcate-Hazurim. 17 Seguiu-se naquele dia uma crua peleja; e Abner e os homens de Israel foram derrotados diante dos servos de Davi. 18 Ora, estavam ali os três filhos de Zeruia: Joabe, Abisai, e Asael; e Asael era ligeiro de pés, como as gazelas do campo. 19 Perseguiu, pois, Asael a Abner, seguindo-o sem se desviar nem para a direita nem para a esquerda. II Samuel 2 13 20 Nisso Abner, olhando para trás, perguntou:És tu Asael? Respondeu ele: Sou eu. 21 Ao que lhe disse Abner: Desvia-te para a direita, ou para a esquerda, e lança mão de um dos mancebos, e toma os seus despojos. Asael, porém, não quis desviar-se de seguí-lo. 22 Então Abner tornou a dizer a Asael: Desvia-te de detrás de mim; porque hei de ferir-te e dar contigo em terra? e como levantaria eu o meu rosto diante de Joabe, teu irmão? 23 Todavia ele recusou desviar-se; pelo que Abner o feriu com o conto da lança pelo ventre, de modo que a lança lhe saiu por detrás; e ele caiu ali, e morreu naquele mesmo lugar. E sucedeu que, todos os que chegavam ao lugar onde Asael caíra morto, paravam. 24 Mas Joabe e Abisai perseguiram a Abner; e pôs-se o sol ao chegarem eles ao outeiro de Amá, que está diante de Giá, junto ao caminho do deserto de Gibeão. 25 E os filhos de Benjamim se ajuntaram atrás de Abner e, formando-se num batalhão, puseram-se no cume dum outeiro. 26 Então Abner gritou a Joabe, e disse: Devorará a espada para sempre? não sabes que por fim haverá amargura? até quando te demorarás em ordenar ao povo que deixe de perseguir a seus irmãos? 27 Respondeu Joabe: Vive Deus, que, se não tivesses falado, só amanhã cedo teria o povo cessado, cada um, de perseguir a seu irmão. 28 Então Joabe tocou a buzina, e todo o povo parou; e não perseguiram mais a Israel, e tampouco pelejaram mais. 29 E caminharam Abner e os seus homens toda aquela noite pela Arabá; e, passando o Jordão, caminharam por todo o Bitrom, e vieram a Maanaim. 30 Voltou, pois, Joabe de seguir a Abner; e quando ajuntou todo o povo, faltavam dos servos de Davi dezenove homens, e Asael. 31 Mas os servos de Davi tinham ferido dentre os de Benjamim, e dentre os homens de Abner, a trezentos e sessenta homens, de tal maneira que morreram. II Samuel 2 14 32 E levantaram a Asael, e o sepultaram no sepulcro de seu pai, que estava em Belém. E Joabe e seus homens caminharam toda aquela noite, e amanheceu-lhes o dia em Hebrom.” (II Sm 2.1-32). II Samuel 3 Deus Abaterá os Que Lhe Resistem É afirmado no início do terceiro capítulo de 2 Samuel, que durou muito tempo a guerra entre a casa de Saul e a casa de Davi, mas havia uma diferença, pois se diz também que a casa de Davi ia se fortalecendo, mas a de Saul se enfraquecendo (v.1). Nisto aprendemos que por mais tempo que dure a nossa luta contra a carne, o mundo e Satanás, se temos Deus por nós e ao nosso lado, a graça ficará mais forte e os nossos inimigos cada vez mais fracos. A competição entre a graça e o pecado nos corações dos cristãos é muito longa, mas pode ser comparada ao que é dito aqui, porque a vitória final será da graça e não da corrupção, ainda que dure muito tempo a guerra entre a casa da graça e a casa do pecado. Nos versos 2 a 5 nós temos um relato do aumento da própria casa de Davi com os seis filhos que ele teve em Hebrom, sendo o primogênito Amnom, que era o sucessor natural à coroa, mas que viria a ser morto por Absalão, por ter abusado de Tamar, sua irmã. O segundo foi Quileabe, que tivera de Abigail (v.2). Este nome Quileabe, no hebraico significa o retrato do seu pai, isto é, a cara do seu pai. E é possível que sendo filho da viúva de Nabal, podem ter feito mofa em Judá com o seu nome, referindo-se a Nabal, e talvez por isto tenham lhe dado o apelido de Daniel, como aparece em I Crôn 3.1, que significa Deus é meu Juiz. O terceiro filho a nascer a Davi foi Absalão, que era neto de um rei pagão chamado Talmai (de Gesur), pois sua mãe, Maaca, era filha deste rei (v.3). O quarto filho de Davi chamava-se Adonias, o qual foi morto por Salomão, e o quinto Sefatias (v.4), e o sexto e último que lhe nascera em Hebrom chamava-se Itreão (v.5). II Samuel 3 15 Tendo multiplicado mulheres para si, contrariamente ao que era ordenado na lei (Dt 17.17) Davi deixou um mau exemplo para os seus sucessores, e causou muitas dores a si mesmo, como veremos adiante, especialmente com três destes filhos que foram abomináveis: Amnom, Absalão e Adonias. Nos versos 6 a 21 nós lemos sobre o abandono de Is-Bosete por Abner, e da aliança proposta por este a Davi. E o motivo disto foi certamente o ato de Is-Bosete ter-se enchido de inveja de Abner, seu tio, que era a pessoa que de fato governava, como se pode inferir das palavras do verso 6: “Enquanto havia guerra entre a casa de Saul e a casa de Davi, Abner ia se tornando poderoso na casa de Saul.”. Não se diz que Abner se tornava poderoso em Israel, mas na casa de Saul, isto é, ele era o homem forte do reino e não Is-Bosete. Este tentou enfraquecer Abner sob a acusação de traição à memória de Saul, por ter se deitado com Rispa, uma concubina de Saul (v. 7). Se a acusação era fundada não podemos saber, mas há razão para se suspeitar que tenha sido, porque Abner não a negou expressamente. Ele somente se ressentiu da exposição pública a que foi submetido por Is-Bosete, como se fosse um animal desprezível e sem valor (v.8), e protestou contra a falta de gratidão pelos serviços que havia prestado à casa de Saul. Nós aprendemos desta reação de Abner que os homens orgulhosos não suportam serem repreendidos, especialmente por aqueles que pensam que lhes são devedores de favores. E se isto acontece, a saber, se são repreendidos, se julgam no direito de se vingarem, tal como fizera Abner em relação a Is-Bosete, declarando-lhe que o abandonaria e se aliaria a Davi (v. 9, 10). Ele sabia que o reino fora prometido por Deus a Davi e assim mesmo se opôs a isto, apoiando a casa de Saul, por causa da sua ambição, e agora ele se sujeita à ordenança de Deus, não por obediência voluntária, mas por vingança e indignação. Is-Bosete não respondeu palavra à arrogância e insolência de Abner (v.11), não por ter entendido que ele estava com a razão, mas por causa da sua própria fraqueza, e por temer que se era ruim ser a II Samuel 3 16 sombra de Abner no trono, seria muito pior ficar sem ele, que era o seu sustentáculo. Abner enviou mensageiro a Davi em Hebrom dizendo-lhe que estava disposto a torná-lo rei sobre todo Israel, e Davi o aceitou sob a condição de que lhe devolvesse Mical, sua esposa, filha de Saul, ao mesmo tempo que enviou mensageiros a Is-Bosete, para que lha entregasse. Foi sob a permissão de Is-Bosete que ela foi retirada por Abner de Paltiel, a quem Saul lha havia dado por esposa, em represália a Davi (v.12-16). Mical foi a primeira esposa de Davi e era filha de um rei de Israel, e seria certamente a primeira rainha, e a sua presença no trono seria uma forma de agradar politicamente os partidários de Saul. Depois disto, Abner foi ter com os anciãos de Israel, para convencê- los a fazer de Davi o seu rei (v. 17). E as palavras que ele dirigiu a eles “de há muito procuráveis que Davi reinasse sobre vós”, denunciavam claramente que sabia que a sua luta contra Davi não prosperaria, porque os corações dos príncipes de Israel se inclinavam de há muito para ele, mas eram forçados a lutar contra ele, por causa da força opressiva que era mantida pelo próprio Abner. Ele usou como argumento a promessa de Deus relativa a Davi como sendo o rei por cujas mãos ele livraria Israel da mão dos filisteus e de todos os seus inimigos (v.18). Certamente não fizera isto por um verdadeiro temor e obediência à vontade de Deus, que era bem conhecida dele de há muito, senão por ter visto que estava sendo enfraquecido mais e mais, enquanto o oposto se dava em relação a Davi. A acusação de Is-Bosete contra ele, produziria de certa forma um clima de suspeita contra ele, que fatalmente o enfraqueceria no conceito do povo, e então estava procurando na verdade se poupar de uma derrota certa, e por este motivo estava se apressando em fazer uma aliança com Davi. II Samuel 3 17 Como Saul e toda a sua casa eram benjamitas, ele apresentou separadamente aos líderes de Benjamim argumentos para convencê-los em favor de Davi (v.19). Assim, Abner estava agindo politicamente,traçando os meios necessários para pôr um fim nos conflitos entre Israel e Judá, e não traiçoeiramente, conforme Joabe o acusou perante Davi, quando soube que Abner viera ter com ele em Hebrom, com uma comitiva de vinte homens, aos quais Davi havia oferecido um banquete, em sinal de celebração da aliança que havia feito com eles (v.20). Joabe, movido pelo simples desejo de vingar a morte de Asael, seu irmão (v. 30), viria a agir de modo traiçoeiro, pois sem que Davi o soubesse, enviou mensageiros a Abner pedindo que retornasse a Hebrom, provavelmente, fazendo-o falsamente em nome do rei, e mal este entrara à porta daquela cidade fortificada, Joabe veio ter com ele e o feriu mortalmente no abdômen. Quem poderá aplacar o desejo de vingança caso aquele que abriga tal desejo não permita ser tratado por Deus? Joabe se fez culpado aos olhos de Deus pelo crime covarde que cometera, mas ao mesmo tempo o próprio Abner foi submetido a um juízo que lhe sobreveio por ter resistido à ordenança de Deus e não ter agido, como fizera agora, em relação a Davi. Ele cometeu a loucura de se opor à vontade de Deus, e agora estava pagando por tê-lo feito. É interessante observar que Abner procurou uma aliança com Davi como que o sucesso deste dependesse das suas ações para conduzi- lo a reinar sobre todo Israel. Os homens orgulhosos são iludidos em pensarem que estão de pé e que tudo e todos dependem deles, mesmo quando percebem que estão caindo. E isto se infere do que Abner disse a Davi no verso 21. Asael, irmão de Joabe havia sido morto por Abner, por causa da sua própria obstinação, porque Abner lhe alertou para que se desviasse dele, quando o perseguia no primeiro combate empreendido entre as forças de Davi e de Is-Bosete, pois não pretendia matá-lo, por ser irmão de Joabe, e serem muito estimados a Davi. II Samuel 3 18 Ele disse a Asael que caso o matasse isto o deixaria mal com seu irmão Joabe (2.22), mas Asael não lhe deu ouvido e acabou sendo morto por ele, em legítima defesa. Não havia então nenhum sangue a ser vingado neste caso, porque não houve nenhum assassinato doloso ou crime de guerra, senão legítima defesa. Mas Joabe e seu irmão Abisai chamaram a si o dever de serem os vingadores do sangue de seu irmão Asael. Na verdade se fingiram vingadores do sangue, porque, como vimos antes, não havia nenhuma vingança amparada pela lei, neste caso. E o próprio Joabe e seu irmão, matando traiçoeira e friamente a Abner, se fizeram culpados de sangue, e golpearam não apenas Abner, mas o próprio Davi e o seu reino, pois havia feito uma aliança com Abner, e esta deveria ser respeitada, porque sem que se pese as verdadeiras intenções e interesses de Abner, ele havia se colocado de fato debaixo da autoridade de Davi, e não somente isto, reconheceu que era seu dever conduzir todos os líderes de Israel a estarem debaixo da autoridade que havia sido conferida a Davi pelo próprio Deus. Por isso, em seu funeral, Davi o pranteou (v. 32) e declarou que havia caído em Israel um príncipe e um grande homem (v. 38). Somente pelos serviços que ele havia prestado a Israel sob Saul, já lhe caberia tal elogio. Ainda que não se pudesse dizer dele que era um santo e um bom homem, o que ele não era na verdade, entretanto, como político em Israel ele fora um príncipe e um grande homem, porque lutava bravamente como um patriota, em Israel, contra os inimigos da nação. Assim, Davi lamentou não poder justiçar os assassinos porque o seu reinado havia sido inaugurado recentemente e um pequeno tremor poderia abalar profundamente o reino, com a morte de Joabe e Abisai, que eram os principais no reino depois do próprio Davi. Assim ele transferiu o julgamento de ambos ao cuidado de Deus para que a justiça fosse feita. II Samuel 3 19 Joabe tinha grande força e influência em Judá, e Davi teve que suportá-lo como auxiliar, mas não inteiramente leal e submisso a ele. Ele não podia confiar-se inteiramente a Joabe. E isto sucede a todos que são líderes na casa de Deus. Terão que aprender a trabalhar com muitas pessoas com as quais não possam confiarem a si mesmos. E não é propósito de Deus livrar os seus servos fiéis de pessoas do mesmo caráter de um Joabe, para que possam aprender a confiar inteiramente nEle, e a serem exercitados em disciplina, justiça e paciência, como em tantas outras coisas que de outro modo não poderiam aprender, caso não tivessem que suportar aqueles que lhes são necessários e úteis, mas não sem lhes causarem muitas aflições, por conta do caráter que possuem. Não apoiando o ato insano de Joabe, e demonstrando a sua tristeza pela morte de Abner, Davi subiu no conceito do povo, pois viram que ali estava diante deles um rei que amava a justiça e não o que era da sua conveniência pessoal. Um homem público que não agia por caprichos, mas por meio daquilo que era bom para toda a nação. Assim, Deus pode tirar do mal o bem, quando perseveramos na prática do bem. “1 Ora, houve uma longa guerra entre a casa de Saul e a casa de Davi; porém Davi se fortalecia cada vez mais, enquanto a casa de Saul cada vez mais se enfraquecia. 2 Nasceram filhos a Davi em Hebrom. Seu primogênito foi Amnom, de Ainoã, a jizreelita; 3 o segundo Quileabe, de Abigail, que fôra mulher de Nabal, o carmelita; o terceiro Absalão, filho de Maacá, filha de Talmai, rei de Gesur; 4 o quarto Adonias, filho de Hagite, o quinto Sefatias, filho de Abital; 5 e o sexto Itreão, de Eglá, também mulher de Davi; estes nasceram a Davi em Hebrom. II Samuel 3 20 6 Enquanto havia guerra entre a casa de Saul e a casa de Davi, Abner ia se tornando poderoso na casa de Saul: 7 Ora, Saul tivera uma concubina, cujo nome era Rispa, filha de Aías. Perguntou, pois, Is-Bosete a Abner: Por que entraste à concubina de meu pai? 8 Então Abner, irando-se muito pelas palavras de Is-Bosete, disse: Sou eu cabeça de cão, que pertença a Judá? Ainda hoje uso de benevolência para com a casa de Saul, teu pai, e para com seus irmãos e seus amigos, e não te entreguei nas mãos de Davi; contudo tu hoje queres culpar-me no tocante a essa mulher. 9 Assim faça Deus a Abner, e outro tanto, se, como o Senhor jurou a Davi, assim eu não lhe fizer, 10 transferindo o reino da casa de Saul, e estabelecendo o trono de Davi sobre Israel, e sobre Judá, desde Dã até Berseba. 11 E Is-Bosete não pôde responder a Abner mais uma palavra, porque o temia. 12 Então enviou Abner da sua parte mensageiros a Davi, dizendo: De quem é a terra? Comigo faze a tua aliança, e eis que a minha mão será contigo, para fazer tornar a ti todo o Israel. 13 Respondeu Davi: Está bem; farei aliança contigo; mas uma coisa te exijo; não verás a minha face, se primeiro não me trouxeres Mical, filha de Saul, quando vieres ver a minha face. 14 Também enviou Davi mensageiros a Is-Bosete, filho de Saul, dizendo: Entrega-me minha mulher Mical, que eu desposei por cem prepúcios de filisteus. 15 Enviou, pois, Is-Bosete, e a tirou a seu marido, a Paltiel, filho de Laís, 16 que a seguia, chorando atrás dela até Baurim. Então lhe disse Abner: Vai-te; volta! E ele voltou. 17 Falou Abner com os anciãos de Israel, dizendo: De há muito procurais fazer com que Davi reine sobre vós; 18 fazei-o, pois, agora, porque o Senhor falou de Davi, dizendo: Pela mão do meu servo Davi livrarei o meu povo da mão dos filisteus e da mão de todos os seus inimigos. II Samuel 3 21 19 Do mesmo modo falou Abner a Benjamim, e foi também dizer a Davi, em Hebrom, tudo o que Israel e toda a casa de Benjamim tinham resolvido. 20 Abner foi ter com Davi, em Hebrom, com vinte homens; e Davi fez um banquete a Abner e aos homens que com ele estavam. 21 Então disse Abner a Davi: Eu me levantarei, e irei ajuntar ao rei meu senhor todo o Israel, para que faça aliança contigo; e tu reinarás sobre tudo o que desejar a sua alma: Assim despediu Davi a Abner, e ele se foi em paz. 22 Eis que os servos de Davi e Joabe voltaramde uma sortida, e traziam consigo grande despojo; mas Abner já não estava com Davi em Hebrom, porque este o tinha despedido, e ele se fora em paz. 23 Quando, pois, chegaram Joabe e todo o exército que vinha com ele, disseram-lhe: Abner, filho de Ner, veio ter com o rei; e o rei o despediu, e ele se foi em paz. 24 Então Joabe foi ao rei, e disse: Que fizeste? Eis que Abner veio ter contigo; por que, pois, o despediste, de maneira que se fosse assim livremente? 25 Bem conheces a Abner, filho de Ner; ele te veio enganar, e saber a tua saída e a tua entrada, e conhecer tudo quanto fazes. 26 E Joabe, retirando-se de Davi, enviou mensageiros atrás de Abner, que o fizeram voltar do poço de Sira, sem que Davi o soubesse. 27 Quando Abner voltou a Hebrom, Joabe o tomou à parte, à entrada da porta, para lhe falar em segredo; e ali, por causa do sangue de Asael, seu irmão, o feriu no ventre, de modo que ele morreu. 28 Depois Davi, quando o soube, disse: Inocente para sempre sou eu, e o meu reino, para com o Senhor, no tocante ao sangue de Abner, filho de Ner. 29 Caia ele sobre a cabeça de Joabe e sobre toda a casa de seu pai, e nunca falte na casa de Joabe quem tenha fluxo, ou quem seja leproso, ou quem se atenha a bordão, ou quem caia à espada, ou quem necessite de pão. II Samuel 3 22 30 Joabe, pois, e Abisai, seu irmão, mataram Abner, por ter ele morto a Asael, irmão deles, na peleja em Gibeão. 31 Disse Davi a Joabe e a todo o povo que com ele estava: Rasgai as vossas vestes, cingi-vos de sacos e ide pranteando diante de Abner. E o rei Davi ia seguindo o féretro. 32 Sepultaram Abner em Hebrom; e o rei, levantando a sua voz, chorou junto da sepultura de Abner; chorou também todo o povo. 33 Pranteou o rei a Abner, dizendo: Devia Abner, porventura, morrer como morre o vilão? 34 As tuas mãos não estavam atadas, nem os teus pés carregados de grilhões; mas caíste como quem cai diante dos filhos da iniquidade. Então todo o povo tornou a chorar por ele. 35 Depois todo o povo veio fazer com que Davi comesse pão, sendo ainda dia; porém Davi jurou, dizendo: Assim Deus me faça e outro tanto, se, antes que o sol se ponha, eu provar pão ou qualquer outra coisa. 36 Todo o povo notou isso, e pareceu-lhe bem; assim como tudo quanto o rei fez pareceu bem a todo o povo. 37 Assim todo o povo e todo o Israel entenderam naquele mesmo dia que não fora a vontade do rei que matassem a Abner, filho de Ner. 38 Então disse o rei aos seus servos: Não sabeis que hoje caiu em Israel um príncipe, um grande homem? 39 E quanto a mim, hoje estou fraco, embora ungido rei; estes homens, filhos de Zeruia, são duros demais para mim. Retribua o Senhor ao malfeitor conforme a sua maldade.” (II Sm 3.1-39). II Samuel 4 Não Há Justiça Negociando com o Mal Nós vemos no quarto capitulo de 2 Samuel que, quando Is-Bosete soube que Abner havia morrido, caiu em sua fraqueza, porque apesar de Abner tê-lo abandonado em relação à sua confirmação no reino, certamente esperava, em razão do seu parentesco com II Samuel 4 23 ele, que fizesse com Davi uma negociação política que o preservasse quando da passagem do reino para as suas mãos. Mas agora, com a morte de Abner, ficou desnorteado e sem esperanças, especialmente porque foi abandonado pelos israelitas, nem tanto porque quisessem de fato servir a Davi voluntariamente, mas para não serem prejudicados em seus interesses, vendo que agora, estando Abner morto, que ele tomaria as rédeas de toda a nação, e o melhor que eles fariam em sua própria causa, era apoiar o novo rei. Assim, diante da fraqueza de Is-Bosete, dois de seus próprios servos, chamados Baaná e Recabe, que deveriam lutar em sua defesa, se sentiram incentivados pelas condições do momento, a tirar-lhe a vida, pensando com isso, agradarem a Davi, e conseguirem um lugar de destaque junto a ele, pela avaliação da sua ação ousada, como sendo digna de uma recompensa. Quando eles levaram a cabeça de Is-Bosete a Davi, foram surpreendidos com a decisão do rei, que em vez de aprovar o assassinato deles, deu ordens para que fossem executados, por tal ato covarde contra um homem justo, no dizer de Davi, pois de fato a Bíblia não relata nenhum ato vil que tivesse sido praticado por Is- Bosete, prevalecendo-se da condição de ser rei, e o fato de ser um homem fraco não demandaria que fosse assassinado de modo tão covarde, quando estava dormindo em sua cama, à hora da sesta, em pleno calor do dia. No verso quarto há um breve relato sobre a causa da deficiência física a que ficou sujeito o filho de Jônatas, chamado Mefibosete, como forma de introdução do que será dito dele adiante no nono capítulo, e talvez para revelar que o desespero que havia invadido a alma de Is-Bosete, quando soube da morte de Abner, era do mesmo tipo e grau do desespero que havia sentido a ama de Mefibosete quando ele tinha apenas cinco anos, e que tomou a iniciativa de fugir apressadamente para escondê-lo de um possível extermínio que os filisteus poderiam intentar contra toda a descendência de Saul, quando ela soube que este e seu filho Jônatas haviam morrido na batalha que empreenderam contra os filisteus. II Samuel 4 24 Na pressa em fugir ela o deixou cair e Mefibosete ficou coxo para sempre. Este temor de ser morto por ordem de Davi deve ter se apoderado de Is-Bosete, mas ele acabou sendo morto pelos seus próprios servos. Quando Davi pronunciou sua sentença de morte sobre Baaná e Recabe, ele introduziu suas palavras com a expressão: “Vive o Senhor, que remiu a minha alma de toda a angústia!”, indicando com isto a eles que continuaria dependendo exclusivamente de Deus para ser posto sob o governo de todo Israel, e não precisava da ajuda de homens ímpios como eles para ser poupado de seus problemas e tribulações. Davi pretendeu dizer que o Senhor que lhe havia livrado de muitas angústias até ali, certamente lhe continuaria livrando, e de fato foi o que ocorreu ao longo de toda a sua vida. Davi lhes disse que assim como ele não havia poupado da morte aquele que lhe trouxera a coroa de Saul, gabando-se de tê-lo morto, muito menos pouparia aqueles que lhe trouxeram a cabeça de seu filho. Ele agiria como o vingador do sangue daquele assassinato doloso, na condição de magistrado supremo da nação, e nenhuma intercessão em favor deles seria ouvida, porque pronunciara a sua sentença sobre eles com a introdução que fizera em nome do Deus vivo, que testemunhou aquele crime que haviam confessado com suas próprias bocas. Um rei justo como Davi estava capacitado a fazer uma avaliação de tal caso como lhe sendo desfavorável e completamente injusto, e não como uma ação justa que tivesse sido praticada em seu benefício. Se tivesse se alegrado e poupado aqueles homens, cairia no descrédito de muitos israelitas, especialmente dos da tribo de Benjamim à qual pertencia Is-Bosete, e seria lançada uma suspeita sobre ele como sendo o mandante daquele assassinato covarde. E assim, nas vidas dos servos de Deus, muitas tentações e facilidades ser-lhe-ão apresentadas pelo Inimigo de suas almas, disfarçando-se de amigo e cooperador, que poderão ser discernidas II Samuel 4 25 somente no Senhor, e que devem ser rejeitadas de forma decidida, porque não se pode ser bem sucedido e ser agradável a Deus a não ser somente pela prática daquilo que é justo aos Seus olhos. E para serem expostos como um monumento da justiça, que havia no trono de Davi, foi ordenado que se cortassem as mãos e os pés daqueles assassinos para que se assinalasse qual é o destino de todos aqueles que pensem em servir os interesses do Filho de Davi por meio de práticas imorais, de violência, de fraude, roubo, ou por quaisquer outros meios que são usados por aqueles que têm procurado se estabelecer através da prática da injustiça, pensando estarem fazendo um bom serviço a Deus. Davi citou neste capitulo, como vimos antes, os sofrimentos angustiososque estava sofrendo, e isto certamente, por causa do seu amor à justiça. “1 Quando Is-Bosete, filho de Saul, soube que Abner morrera em Hebrom, esvaíram-se-lhe as forças, e todo o Israel ficou perturbado. 2 Tinha Is-Bosete, filho de Saul, dois homens chefes de guerrilheiros; um deles se chamava Baaná, e o outro Recabe, filhos de Rimom, o beerotita, dos filhos de Benjamim (porque também Beerote era contado de Benjamim, 3 tendo os beerotitas fugido para Jitaim, onde têm peregrinado até o dia de hoje). 4 Ora, Jônatas, filho de Saul, tinha um filho aleijado dos pés. Este era da idade de cinco anos quando chegaram de Jizreel as novas a respeito de Saul e Jônatas; pelo que sua ama o tomou, e fugiu; e sucedeu que, apressando-se ela a fugir, ele caiu, e ficou coxo. O seu nome era Mefibosete. 5 Foram os filhos de Rimom, o beerotita, Recabe e Baanã, no maior calor do dia, e entraram em casa de Is-Bosete, estando ele deitado a dormir a sesta. 6 Entraram ali até o meio da casa, como que vindo apanhar trigo, e o feriram no ventre; e Recabe e Baaná, seu irmão, escaparam. II Samuel 4 26 7 Porque entraram na sua casa, estando ele deitado na cama, no seu quarto de dormir, e o feriram e mataram, e cortando-lhe a cabeça, tomaram-na e andaram a noite toda pelo caminho da Arabá. 8 Assim trouxeram a cabeça de Is-Bosete a Davi em Hebrom, e disseram ao rei: Eis aqui a cabeça de Is-Bosete, filho de Saul, teu inimigo, que procurava a tua morte; assim o Senhor vingou hoje ao rei meu Senhor, de Saul e da sua descendência. 9 Mas Davi, respondendo a Recabe e a Baaná, seu irmão, filhos de Rimom, e beerotita, disse-lhes: Vive o Senhor, que remiu a minha alma de toda a angústia! 10 Se àquele que me trouxe novas, dizendo: Eis que Saul é morto, cuidando que trazia boas novas, eu logo lancei mão dele, e o matei em Ziclague, sendo essa a recompensa que lhe dei pelas novas, 11 quanto mais quando homens cruéis mataram um homem justo em sua casa, sobre a sua cama, não requererei eu o seu sangue de vossas mãos, e não vos exterminarei da terra? 12 E Davi deu ordem aos seus mancebos; e eles os mataram e, cortando-lhes as mãos e os pés, os penduraram junto ao tanque em Hebrom. Tomaram, porém, a cabeça de Is-Bosete, e a sepultaram na sepultura de Abner, em Hebrom.” (II Sm 4.1-12). II Samuel 5 Estratégias para Derrotar o Mal No quinto capítulo de 2 Samuel, vemos Davi sendo ungido rei pela terceira vez (v. 3), agora sobre todo Israel. Antes, havia sido ungido por Samuel quando era ainda muito jovem, e depois foi ungido em Hebrom como rei sobre Judá, e agora, finalmente, dando-se pleno cumprimento à promessa de Deus, ele é ungido rei sobre todo Israel. Ele tinha trinta anos quando começou a reinar (v. 4), mas não se diz, se sobre Judá, ou sobre todo Israel. II Samuel 5 27 Se o início do seu governo com trinta anos foi computado a partir do reinado apenas sobre Judá, podemos concluir que Davi morreu com setenta anos de idade, pois isto se obtêm somando os trinta anos de idade que tinha na ocasião com os quarenta anos totais de governo. Mas se esta citação se refere à data do início do seu governo sobre todo Israel, então deve-se somar os trinta anos de idade aos trinta e três anos restantes do seu governo, e neste caso, teria morrido aos sessenta e três anos de idade. A vida atribulada de Davi fez com que envelhecesse precocemente. Não foram os muitos problemas de estado que o envelheceram de tal modo, a ponto de não poder se aquecer nos seus últimos dias de vida, senão com o auxílio de uma jovem que foi designada para isto, chamada Abisague. Certamente foram os problemas familiares e as muitas traições e perseguições que ele sofreu, que o conduziram a tal estado. Moisés por exemplo morreu aos cento e vinte anos em pleno vigor, tendo peregrinado no deserto durante os últimos quarenta anos de sua vida. Entretanto, ele foi protegido por um viver fiel em toda a casa de Deus, não tendo por conseguinte os muitos conflitos de consciência que afligiram Davi, especialmente o de ter contraído matrimônio com várias mulheres, e de ter tido várias concubinas, e sobretudo o seu pecado de adultério com Bate-Seba e o assassinato de seu marido Urias. Neste sentido Davi também se tornou um exemplo para muitos do povo de Deus, de modo a não imitarem estas suas obras que acabaram em se lhe tornando um laço, no qual ele se emaranhou a si mesmo, e que lhe trouxe muitas angústias e dores, a par de toda a graça que lhe foi exibida por Deus, em razão do seu caminhar humilde em Sua presença. Em I Crôn 12.23-40 nós temos um detalhamento de quantos de Israel vieram ter com Davi em Hebrom, na ocasião que foi aclamado rei sobre todo Israel, e os três dias que permaneceram com ele. II Samuel 5 28 Nos versos 6 a 9 é relatado o modo como Jerusalém foi conquistada por Davi. Informações adicionais sobre a conquista de Jerusalém se encontram em I Crôn 11.4-9, e ali se diz que Davi disse que aquele que subisse primeiro aos jebuseus seria feito chefe do seu exército. E foi Joabe quem se dispôs a isto, e foi a partir de então que se tornou general, não apenas sobre o exército de Judá, mas de todo o exército de Israel. Os jebuseus eram tão confiantes na fortaleza da sua cidade de Jebus, cujo nome foi mudado para Jerusalém, que provavelmente colocavam os cegos e coxos sobre os seus muros para ridicularizarem aqueles que intentavam tomar a cidade, e talvez foi por isso que os seus habitantes disseram a Davi que os coxos e os cegos da cidade o repeliriam, e de Davi ter dito a seus homens que ferissem aos cegos e os coxos daquela cidade que a sua alma aborrecia. Depois da tomada de Jerusalém, em razão disto, passou a ser comum em Israel o ditado que nem cego nem coxo entrarão na casa. Tendo conquistado Jerusalém, Davi se transferiu de Hebrom para lá (v. 9). E se diz no verso 10 que “Davi ia-se engrandecendo cada vez mais, porque o Senhor Deus dos exércitos era com ele.”. Isto não significa que todo aquele com o qual for o Senhor Deus dos exércitos será engrandecido por Ele neste mundo, mas que, no caso específico da grandeza de Davi, a causa dela era Deus mesmo quem a estava produzindo. Ele determinara engrandecer a Davi por amor do Seu nome, como determinara fazer o mesmo no passado com Abraão, Moisés e Josué, conforme afirmara com Sua própria boca, que o faria em relação a eles. Assim engrandece a quem quer, e abate a quem quer, humilha a quem quer, e exalta a quem quer, e faz o mesmo em relação à misericórdia e ao endurecimento. II Samuel 5 29 Ele manifesta através destes atos soberanos que Ele é Senhor sobre tudo e todos, e não é dado ao homem dirigir o seu próprio destino. “O Senhor empobrece e enriquece; abate e também exalta.” (I Sm 2.7). “Os olhos altivos do homem serão abatidos, e a altivez dos varões será humilhada, e só o Senhor será exaltado naquele dia. Pois o Senhor dos exércitos tem um dia contra todo soberbo e altivo, e contra todo o que se exalta, para que seja abatido;” (Is 2.11,12). “Qualquer, pois, que a si mesmo se exaltar, será humilhado; e qualquer que a si mesmo se humilhar, será exaltado.” (Mt 23.12). Assim, a glória do reino de Davi estava sendo acrescentada por Deus, e não era decorrente da sua própria iniciativa, e uma das grandes provas disto é que o rei Hirão de Tiro se dispôs a construir um palácio para Davi, enviando-lhe tanto o material de construção como os artífices (v.11). Davi reconheceu sabiamente que era a mão de Deus que estava em tudo isto, conforme se depreende da palavras do verso 12: “Entendeu, pois, Davi que o Senhor o confirmara rei sobre Israel, e que exaltara o reino dele por amor do seu povo Israel.”. Saul foi feito rei mas o seu reinado não foi confirmado por Deus, ao contrário, foi rejeitado, mas Davi não foi feito somente rei, como também o seu reino foi estabelecido e confirmado por Deus, e nisto o seu reinado foi um tipo do reinado de Cristo,conforme se vê no Salmo 89. Foi por amor do seu povo, Israel, que Deus engrandeceu o reino de Davi e o confirmou como rei sobre o seu povo. Era para o bem do povo e não para a exclusiva exaltação de Davi. Ministros são engrandecidos por amor da Igreja, e não propriamente para que exibam a si mesmos como troféus de um alegado favor divino que é dado exclusivamente a eles. Os talentos que são recebidos são para serem aplicados no favor de outros em amor. O que se tem recebido é para ser dado e não entesourado. Não é para o próprio bem exclusivo que somos enriquecidos pela graça, mas para promover o bem de outros. II Samuel 5 30 Foi por isso que Deus engrandeceu o reino de Davi. Para que Israel pudesse desfrutar das bênçãos do Senhor sob o Seu reinado. Assim como a grande glória do reino de Jesus está em que Ele manifeste toda a bondade e justiça de Deus em favor dos pecadores penitentes, tanto quanto nos juízos que Ele trará sobre os perversos e incrédulos, dando-lhes a justa paga pelas suas más obras. Davi foi engrandecido portanto, para ser não somente instrumento da bondade de Deus para com Israel, como também para manifestar a Sua justiça, julgando o povo segundo a Sua Lei. Entretanto, o que se diz logo no verso seguinte (v. 13) não procedia de Deus para o engrandecimento de Davi, porque Ele não agiria contra a Sua própria determinação de que os reis de Israel não ajuntassem mulheres para si. “Davi tomou ainda para si concubinas e mulheres de Jerusalém, depois que viera de Hebrom; e nasceram a Davi mais filhos e filhas.” (v.13). E com estas ele gerou em Jerusalém mais onze filhos, além dos seis que havia gerado em Hebrom, chegando a dezessete o número de filhos que tivera, sem contar o que tivera com Bate-Seba e que havia morrido. No lugar deste foi-lhe dado Salomão, que é contado dentre os onze que são nomeados nos versos 14 a 16. Davi havia sido levantado como rei para derrotar definitivamente os filisteus, e fazer com que Israel dominasse o território que eles ocupavam, e que foi dado por promessa aos israelitas juntamente com todas as demais terras de Canaã até o extremo norte do rio Eufrates. Então nós temos nos versos 17 a 25 as circunstâncias e o modo com que se deu tal conquista. Os filisteus vieram contra Israel porque souberam que Davi havia conquistado Jerusalém e que havia sido feito rei sobre todo Israel e não apenas sobre Judá. E intentaram destruí-lo antes que se fortalecesse no trono, porque se lhes fizera tantos danos enquanto vivia Saul, ferindo aos seus dez milhares, sendo apenas um dos seus capitães, o que não poderia lhes fazer agora como rei de todo Israel? II Samuel 5 31 Então marcharam em grande número contra ele e se acamparam perto e defronte de Jerusalém no vale de Refaim (v. 18). . Mas Davi não se precipitou logo sobre eles sem que antes consultasse ao Senhor para saber se deveria enfrentá-los num combate frontal em campo aberto, tropas contra tropas, e por motivo de prudência perguntou também ao Senhor se Ele entregaria os filisteus em suas mãos (v. 19). Foi somente depois de ter recebido uma resposta afirmativa da parte de Deus, que Davi subiu para pelejar contra eles, e os derrotou no lugar que passou a ser chamado Baal-Perazim, que significa que Baal foi rompido, isto é, as forças que lutavam em seu nome foram rompidas, pois Davi viu aquela derrota como sendo o resultado do braço forte do Senhor, que rompeu seus inimigos diante dele como as águas de uma represa rompem as suas barreiras, depois que é feita uma brecha numa de suas paredes. Afinal, fora o Senhor que o enviou à luta debaixo de uma promessa de vitória, e se Deus nos enviar, Ele nos confirmará e se levantará por nós. A garantia da vitória que Deus nos deu sobre os nossos inimigos espirituais, repousa na promessa que Ele fez de que esmagará brevemente Satanás debaixo dos nossos pés. Então, isto deveria nos animar em nossos conflitos espirituais. Nós não lutamos debaixo da incerteza da vitória, e esta não depende da nossa superioridade numérica e nem mesmo da nossa própria força, porque poderoso e fiel é Aquele que fez a promessa, e assim, não lutamos confiando na nossa própria força e capacidade, mas na promessa do Senhor que é a nossa força. Davi tributou toda glória daquela vitória a Deus, quando disse que fora Ele quem havia rompido os seus inimigos diante dEle. E não fizera isto por mera expressão verbal, mas para expressar uma grande realidade que ele havia presenciado, porque Deus não fez apenas a parte principal do trabalho, mas fizera tudo. Deus fez tudo e Davi e seus homens fizeram tudo porque foram capacitados e protegidos pelo Senhor para fazê-lo. II Samuel 5 32 É por este motivo que nós veremos adiante, que Davi destruiu centenas de carruagens e inutilizou centenas de cavalos que havia conquistado aos sírios, porque a sua confiança não estava em carruagens e cavalos, para obter vitória nas batalhas contra os seus inimigos, mas no Senhor. Os ídolos que os filisteus trouxeram para o campo de batalha e que representavam os seus deuses foram deixados para trás para vergonha deles porque não puderam livrá-los. E haviam se transformado numa grande carga para os seus cavalos cansados (Is 46.1,2). E Davi e seus homens pegaram estas imagens para serem queimadas, conforme determinado pela lei de Moisés (Dt 7.5). Não para recuperarem seus deuses, e nem mesmo para vingarem o ato de suas imagens terem sido queimadas pelos israelitas, mas para darem cumprimento ao intento inicial deles de impedir que Davi se estabelecesse e se fortalecesse como rei sobre todo Israel, eles voltaram a se espalhar no mesmo vale de Refaim para uma segunda batalha (v. 22). E Davi havia amadurecido na fé o suficiente nas experiências que tivera antes, principalmente naquelas em que havia falhado por não ter consultado antes ao Senhor, que importa ter uma completa dependência dEle, e assim havia aprendido que não deveria ousar agir com base na ordem do Senhor relativa à primeira batalha. Para cada luta a sua respectiva oração e dependência do Senhor. A bênção de ontem não deve ser motivo para a negligência de se buscar a Deus hoje ou amanhã, pensando que podemos agir com base nas mesmas instruções que recebemos da parte dEle no passado. Basta a cada dia o seu próprio mal. Devemos orar pelo nosso pão material e espiritual em cada dia. Então Davi não se dispôs a atacar os filisteus subindo contra eles num ataque frontal, confiado na consulta que fizera na primeira batalha, antes voltou a consultar a Deus e desta vez recebeu como resposta que não deveria subir como da primeira vez, mas rodear os filisteus por detrás e vir sobre eles apressadamente quando ouvisse um ruído de marcha pelas copas das amoreiras, porque era II Samuel 5 33 o Senhor que saía adiante dele para ferir o arraial dos filisteus (v.23,24). O que Deus havia prometido a Davi desta vez é que Ele se encarregaria em ferir o exército dos filisteus com um exército invisível de anjos, que marchariam sobre as copas das amoreiras. Eles não seriam vistos, mas o estrondo da marcha deles seria ouvido, e isto seria um sinal para que Davi se apressasse a atacar também os filisteus. Aquelas amoreiras deviam estar enfileiradas como uma cerca viva, separando os dois exércitos, e é bem possível que os filisteus ouviram aquele grande estrondo de marcha de um exército vindo sobre eles e certamente ficaram confusos e começaram a bater em retirada exatamente pelas amoreiras nas quais se defrontaram com o exército de Davi e foram duramente golpeados desde Geba até Gezer (v. 25). Veja que embora Deus tenha prometido ir adiante de Davi para golpear os filisteus, contudo ele tem que se mover apressadamente e deve se empenhar para obter a vitória. Assim se dá com a pregação do evangelho. É Deus quem unge, é quem dá graça, é quem subjuga os poderes das trevas, é quem justifica, regenera, santifica, cura, restaura, masos que pregam devem se empenhar muito em fazê-lo com todas as suas forças, enquanto percebem que o exército celestial está operando em seu favor. O mesmo pode ser dito em relação aos que oram, que jejuam, que ensinam, que presidem, que exercem misericórdia, enfim, isto é um princípio a ser aprendido por todos os que se empenham na obra de Deus. Nós não fazemos a nossa parte e Deus faz a dEle. Ao contrário, nós devemos estar em completa sintonia com o Senhor, trabalhando com todo o empenho e esforço enquanto Ele tudo faz por meio de nós. Isto nos faz lembrar das palavras do grande Jonathan Edwards que disse o seguinte: “Na graça eficaz não somos meramente passivos, nem ainda Deus faz um pouco e nós fazemos o restante. Mas Deus II Samuel 5 34 faz tudo, e nós fazemos tudo. Deus produz tudo, e nós agimos em tudo. Pois é isso que ele produz, isto é, os nossos atos. Deus é o único verdadeiro autor e a única verdadeira fonte; nós somos tão- somente os verdadeiros agentes. Somos, em diferentes aspectos, totalmente passivos e totalmente ativos.”. Assim, se a graça de Deus está operando em nosso favor nós não devemos sentar e cruzar os braços, como quem não tem nada mais para fazer. Ao contrário é nosso dever nos apressarmos em agirmos e nos esforçarmos muito em oração e em todos os deveres que Ele nos tem ordenado, para que haja uma justa cooperação entre o poder que Ele libera para nós, e o trabalho que estivermos fazendo para Ele. Na primeira batalha foi ordenado que Davi se lançasse num combate frontal, e na segunda foi ordenado que aguardasse por um sinal para que atacasse os seus inimigos. Deus pode assim traçar várias estratégias de luta para colocar à prova a nossa dependência dEle e obediência à Sua vontade. E importa que o consultemos em todas as coisas, especialmente naquelas relativas às lutas que temos que empreender contra os poderes das trevas na realização da Sua obra. Este é o modo de sermos bem-sucedidos, por contarmos com a Sua ajuda e capacitação. Para a obra geral da Igreja já se ouviu o som da marcha sobre a copa das amoreiras quando o Espírito Santo foi derramado no dia de Pentecoste, quando os apóstolos ouviram um som vindo do céu como de um vento impetuoso (At 2.2) que era um sinal para eles do derramamento do Espírito Santo para revestir-lhes de poder para a obra que lhes havia sido designada. E no sentido particular para as necessidades de cada dia, deveríamos nos colocar em ação somente depois de percebermos que foi liberada a operação do Espírito Santo, através dos diversos sinais da Sua santa presença, que são manifestados a nós, quando nos colocamos na disposição correta de espírito daqueles que II Samuel 5 35 buscam de fato a Deus, tal como Davi fizera antes de entrar em combate contra os filisteus. Deus deve ser consultado para tudo, e algumas vezes Ele nos ordenará que aguardemos o som de marcha sobre a copa das amoreiras antes que comecemos a agir. “1 Então todas as tribos de Israel vieram a Davi em Hebrom e disseram: Eis-nos aqui, teus ossos e tua carne! 2 Além disso, outrora, quando Saul ainda reinava sobre nós, eras tu o que saías e entravas com Israel; e também o Senhor te disse: Tu apascentarás o meu povo de Israel, e tu serás chefe sobre Israel. 3 Assim, pois, todos os anciãos de Israel vieram ter com o rei em Hebrom; e o rei Davi fez aliança com eles em Hebrom, perante o Senhor; e ungiram a Davi rei sobre Israel. 4 Trinta anos tinha Davi quando começou a reinar, e reinou quarenta anos. 5 Em Hebrom reinou sete anos e seis meses sobre Judá, e em Jerusalém reinou trinta e três anos sobre todo o Israel e Judá. 6 Depois partiu o rei com os seus homens para Jerusalém, contra os jebuseus, que habitavam naquela terra, os quais disseram a Davi: Não entrarás aqui; os cegos e os coxos te repelirão; querendo dizer: Davi de maneira alguma entrará aqui. 7 Todavia Davi tomou a fortaleza de Sião; esta é a cidade de Davi. 8 Ora, Davi disse naquele dia: Todo o que ferir os jebuseus, suba ao canal, e fira a esses coxos e cegos, a quem a alma de Davi aborrece. Por isso se diz: Nem cego nem, coxo entrara na casa. 9 Assim habitou Davi na fortaleza, e chamou-a cidade de Davi; e foi levantando edifícios em redor, desde Milo para dentro. 10 Davi ia-se engrandecendo cada vez mais, porque o Senhor Deus dos exércitos era com ele. 11 Hirão, rei de Tiro, enviou mensageiros a Davi, e madeira de cedro, e carpinteiros e pedreiros, que edificaram para Davi uma casa. 12 Entendeu, pois, Davi que o Senhor o confirmara rei sobre Israel, e que exaltara o reino dele por amor do seu povo Israel. II Samuel 5 36 13 Davi tomou ainda para si concubinas e mulheres de Jerusalém, depois que viera de Hebrom; e nasceram a Davi mais filhos e filhas. 14 São estes os nomes dos que lhe nasceram em Jerusalém: Samua, Sobabe, Natã, Salomão, 15 Ibar, Elisua, Nefegue, Jafia, 16 Elisama, e Eliadá e Elifelete. 17 Quando os filisteus ouviram que Davi fora ungido rei sobre Israel, subiram todos em busca dele. Ouvindo isto, Davi desceu à fortaleza. 18 Os filisteus vieram, e se estenderam pelo vale de Refaim. 19 Pelo que Davi consultou ao Senhor, dizendo: Subirei contra os filisteus? entregar-mos-ás nas mãos? Respondeu o Senhor a Davi: Sobe, pois eu entregarei os filisteus nas tuas mãos. 20 Então foi Davi a Baal-Perazim, e ali os derrotou; e disse: O Senhor rompeu os meus inimigos diante de mim, como as águas rompem barreiras. Por isso chamou o nome daquele lugar Baal-Perazim. 21 Os filisteus deixaram lá os seus ídolos, e Davi e os seus homens os levaram. 22 Tornaram ainda os filisteus a subir, e se espalharam pelo vale de Refaim. 23 E Davi consultou ao Senhor, que respondeu: Não subirás; mas rodeia-os por detrás, e virás sobre eles por defronte das amoreiras. 24 E há de ser que, ouvindo tu o ruído de marcha pelas copas das amoreiras, então te apressarás, porque é o Senhor que sai diante de ti, a ferir o arraial dos filisteus. 25 Fez, pois, Davi como o Senhor lhe havia ordenado; e feriu os filisteus desde Geba, até chegar a Gezer.” (II Sm 5.1-25). II Samuel 6 A Honra Devida ao Senhor O décimo terceiro capítulo de I Crônicas é paralelo aos versos 1 a 11 deste sexto capítulo de II Samuel, que estaremos comentando. A arca havia ficado em Quiriate-Jearim desde o seu retorno do cativeiro entre os filisteus (I Sm 7.1,2). II Samuel 6 37 A cidade de Baalim, mencionada no verso 2 é Quiriate-Jearim, como se vê no texto paralelo de I Crônicas de 13.6. Para empreender a remoção da arca de Quiriate-Jearim para Jerusalém, Davi reuniu uma comitiva de 30.000 pessoas da nobreza de Israel, de modo a produzir em todos os israelitas a convicção da importância e da deferência que era devida à arca, em face da solene reunião de tantos líderes escolhidos, que estariam acompanhando a sua transferência para Jerusalém. E tal era a envergadura do cortejo que a forma singela de se transportar a arca pelos seus varais, pelos levitas, foi desprezada, e se mandou construir um carro novo de bois para efetuar o seu transporte. Havia certamente da parte de Deus a intenção de transmitir um ensino didático na forma de se transportar a arca, porque o transporte pelos varais impedia que a arca propriamente dita fosse tocada por mãos humanas, ensinando-se assim a reverência e respeito que são devidos ao Senhor, e que Ele não pode ser conduzido pelos homens, tanto que o ato de se tocar na arca, seria punido com a morte. Talvez tenha sido este um dos motivos de não ter havido anteriormente um interesse em se remover a arca de Quiriate- Jearim, em razão do temor das mortes que poderia causar um transporte indevido de objeto tão sagrado. E ao que tudo indica Davi talvez tenha intentado se prevenir destes juízos divinos, por meio da grandiosa solenidade que ele planejou juntamente com os líderes de Israel para trazê-la a Jerusalém. Cânticos de louvor eram entoados com acompanhamentode toda sorte de instrumentos musicais, e havia grandes manifestações de alegria, mas nada disso foi capaz de impedir que Deus matasse Uzá, pela sua falta de reverência, quando ele tocou a arca quando os bois que a transportavam tropeçaram (v. 6,7). Deus nunca prestigiará a grandiosidade das solenidades que realizemos para cultuá-lo, pela suspensão dos seus juízos determinados sobre tudo o que tem definido como transgressão da Sua vontade. II Samuel 6 38 Ele manterá o que tem prometido fazer e cumprirá tudo o que a Sua boca tem proferido, independentemente do fato se a Sua atuação poderá ou não frustrar as nossas expectativas, tal como Ele sabia que sucederia com Davi, e com todo o cortejo que o acompanhava, quando a Sua ira se acendeu contra Uzá, e produziu a cessação de toda a atmosfera festiva da ocasião. Ainda que toda aquela alegria pública estivesse sendo manifestada na presença de Deus, de forma que não havia o risco de que se transformasse numa alegria carnal e sensual, como costuma ocorrer com toda alegria pública, que não é manifestada na Sua presença, Ele não deixou, nem mesmo por isso, de castigar a irreverência de Uzá. E nem mesmo levou em conta o fato de ser ele um levita, tal como o seu irmão Aiô, e nem ainda o de a arca ter ficado na casa deles durante a sua permanência em Quiriate-Jearim, ou seja, na casa de Abinadabe, que era pai de Aiô e Uzá. Uzá tinha sido traído pela sua familiaridade com a arca, julgando que possuía direitos sobre ela, que não eram permitidos aos demais. Ele pode ter desejado manifestar publicamente que tinha um certo privilégio em relação àquele objeto sagrado, colocando-se ao lado dela, quando estava sendo transportada pelos carros de bois, enquanto seu irmão Aiô ia adiante deles. Foi talvez por isso que não teve qualquer constrangimento em estender sua mão para segurar a arca quando os bois tropeçaram, sendo o seu gesto considerado por Deus como uma irreverência, que despertou a Sua ira, conforme é dito diretamente na Bíblia. Note que não se diz que a arca estava caindo quando ele a segurou, e poderoso é o Senhor para impedir que ela caísse. Aquele gesto irreverente à vista de todos os líderes e de muitos do povo de Israel, não passaria impune, e o Senhor vindicou a Sua santidade em Uzá, e todos temeram e tremeram, inclusive o próprio Davi. II Samuel 6 39 Ele não somente se desgostou (v.8), como também temeu ao Senhor naquele dia (v.9) a ponto de desistir de trazer a arca para junto de si em Jerusalém (v.10), e providenciou para que ela ficasse na casa de Obede-Edom, que ficava nas cercanias do lugar onde ocorreu a morte de Uzá. Ele deve ter cogitado que Uzá não era mais pecador do que ele, para que Deus o matasse daquele modo. Ele temeu que Deus o matasse da mesma maneira. Ele temeu que Deus poderia matá-lo tal como fizera com Uzá. E a arca permaneceu três meses na casa de Obede-Edom, mas nenhum mal lhe fizera, ao contrário, tanto ele quanto a sua casa foram abençoados pelo Senhor (v. 11). A mesma mão que castigou a presunção de Uzá abençoou a coragem humilde de Obede-Edom, e se a arca foi cheiro de morte para a morte para o primeiro, ela foi aroma de vida para a vida, para o segundo, tal como Cristo é em relação a toda a humanidade. Cristo é o mesmo, mas Ele é tanto motivo de ruína para os que se perdem, quanto é de bênção para os que se salvam. Quando Davi soube que Obede-Edom e a sua casa haviam sido abençoados por Deus (v. 12), ele se dispôs novamente a trazer a arca para Jerusalém, porque se a presença da arca havia abençoado sua casa, todo Israel poderia ser abençoado por ela. E o fato de Obede-Edom ter sido abençoado significava que a ira do Senhor havia cessado. Em I Crôn 15.1-15; 25-28, nós encontramos informações adicionais ao texto de II Sm 6.12-23, que descreve a remoção da arca da casa de Obede-Edom para Jerusalém. Desta vez Davi reconheceu que havia errado em não transportar a arca segundo o que estava prescrito na Lei, e não somente separou os levitas para isto, como também estes se santificaram antes, e quando a arca começou a ser transportada pelos varais, foram oferecidos sacrifícios de bois e carneiros cevados (v. 13), provavelmente como forma de reparação dos erros cometidos anteriormente. II Samuel 6 40 E holocaustos e ofertas pacíficas foram trazidos quando a arca foi colocada na tenda que havia sido preparada para ela (v. 17,18). Estas ofertas simbolizavam a consagração, a comunhão e a gratidão por Deus ter-se mostrado propício a eles. Tal era a alegria de Davi que ele dançava com todas as suas forças diante do Senhor, e se despojou dos seus trajes reais, para se cingir de uma estola sacerdotal de linho v. 14), como símbolo de sua consagração ao serviço de Deus e de sua inteira devoção a Ele. Assim, ele acompanhou o cortejo não como um rei, mas como um simples servo de Deus, que é o verdadeiro e eterno rei de Israel. Era de tal ordem a humildade, simplicidade e alegria com que Davi entrou na cidade de Jerusalém, que sua mulher Mical, contemplando o que ele fazia, através da janela do palácio, desprezou-o em seu coração (v. 16). Mas mesmo que Davi soubesse disto, certamente não se intimidaria e continuaria com sua alegria, prestando as homenagens públicas, que entendia serem devidas por ele ao Senhor, por todo o bem que estava fazendo a ele e a todo o povo de Israel. Foi por este motivo que ele pretendeu que todo o povo que acompanhara o transporte da arca, participasse das ofertas pacíficas que foram apresentadas a Deus, e por isso ele abençoou o povo em nome do Senhor, e repartiu a todos eles um bolo de pão, um pedaço de carne e passas (v. 18,19). Foi quando chegou em sua casa, depois de ter despedido o povo, para abençoar os seus, que Mical veio ao seu encontro, repreendendo-o com as seguintes palavras: “Que bela figura fez o rei de Israel, descobrindo-se hoje aos olhos das servas de seus servos, como sem pejo se descobre um vadio qualquer.” (v. 20). Foi o orgulho de Mical que a levou a agir de tal maneira. Ela pensava que Davi havia se rebaixado muito diante dos olhos das servas dos seus oficiais, nivelando-se a elas, e isto faria com que elas não o respeitassem mais e não lhe dessem a devida honra, uma vez que, segundo ela, Davi não havia respeitado a sua elevada posição de rei diante deles. II Samuel 6 41 A devoção religiosa daqueles que são sinceros diante de Deus sempre soa mal aos ouvidos e fere os olhos daqueles que não Lhe são devotados. Este era o problema com Mical. Ela não conhecia a alegria de quem derrama a sua alma na presença do Senhor. Mas Davi defendeu a honra de Deus quando justificou o seu comportamento com as seguintes palavras: “Perante o Senhor, que escolheu a mim de preferência a teu pai e a toda a sua casa, estabelecendo-me por chefe sobre o povo do Senhor, sobre Israel, sim, foi perante o Senhor que dancei; e perante ele ainda hei de dançar. Também ainda mais do que isso me envilecerei, e me humilharei aos meus olhos; mas das servas, de quem falaste, delas serei honrado.”. O teor destas palavras indica que não foi dos seus servos que recebeu a honra de ser escolhido rei sobre Israel, mas foi do próprio Deus que a recebeu. Se Mical havia repreendido Davi, pensando que foram seu pai e sua casa que emprestaram a verdadeira dignidade e honra à realeza, Davi lhe fez recordar que Saul e toda a sua casa haviam sido rejeitados por Deus para não reinarem sobre Israel, e que lhe havia escolhido para ser o rei do Seu povo. Como poderia então ser desonrado pelas servas dos seus servos por ter dado a honra devida a Deus, que o pai de Mical, Saul, negou a Ele durante toda a sua vida? Como Deus desprezaria aqueles que não O desprezam? Como permitiria que não fossem honrados aqueles que O estavam honrando? Se alguma serva de Davi não lhe estivesse honrando tal como Mical, pelo fato dele estar se alegrando na presença de Deus, certamente