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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA CENTRO DE EDUCAÇÃO CURSO DE PEDAGOGIA - LICENCIATURA PLENA NOTURNO DISCIPLINA DE DIREITOS HUMANOS E GÊNERO Bianca Rios de Camargo MAPA CONCEITUAL DA DISCIPLINA DE “DIREITOS HUMANOS E GÊNERO” Santa Maria 2021 1. DIREITO A disciplina de Direitos Humanos e Gênero inicia-se com um breve contexto histórico para que possamos nos situar e tentar entender em quais momentos esse tema tão importante se tornou pauta também dos representantes políticos da época. É significativo salientar, que antes do Golpe de 64, esse tema tinha apenas uma dimensão jurídica. Foram décadas de construção mas também renegação de uma série de direitos que hoje os indivíduos possuem, resultado de lutas daqueles que buscavam e ainda buscam dignidade perante à sociedade e aos crimes cometidos por ditadores e corruptos. Direito é um conceito amplo e histórico que pode ser ampliado (ou renegado) levando em conta as necessidades do contexto. Por isso, é importante salientar a questão da Ditadura - esse conceito se fortaleceu na resistência aos atos cometidos nela - junto aos outros momentos históricos de precederam e sucederam o momento, como no governo Getúlio Vargas, período o qual envolveu conquistas sociais apesar da falta de liberdade política. Com a ditadura chegando ao seu final, apresentou-se a transição democrática, período de construção do que futuramente charemamos de neoliberalismo. Para que essa democracia fosse de fato impulsionada, a Constituição Cidadã de 1988, de Ulysses Guimarães, foi elaborada. Esta levou em conta e inclusive utilizou documentos da Declaração Universal de Direitos Humanos, de 1948, para pautar seus fundamentos. São dois documentos jurídicos magnos, um internacional e outro nacional, que têm em comum o fato de haverem sido elaborados em momentos pós-ruptura (Arendt, 1989; Lafer & Fonseca Júnior, 1994). Pode-se dizer então, que é impossível construir um conceito de Direito sem perpassar pela história. Esse conceito, então, é nada menos que uma conquista: histórica e social. Foi adquirido pela resistência das minorias em busca da dignidade de seus corpos e mentes. A capacidade de ir e vir, de questionar, interrogar e propor debates, é direito. De uma mulher, de poder fazer o que bem entender com seu corpo, sem ser questionada, julgada e interrompida, também é direito. De uma criança, de poder ter acesso à educação, ao lazer, ao respeito para que se construa como um ser digno, é direito. É mais do que um conjunto de leis, é a oportunidade de interferir na sociedade e construir o próprio caminho, dentro das leis, mas sem ser subjugado. 2. DIGNIDADE Abre-se espaço então, para o conceito de Dignidade. O que é ser digno? Muito se confunde esse conceito com a ideia de ser “correto” “respeitado”, além disso, é um termo muito complicado de se explicar. Todavia, ele faz parte do Artigo I da Declaração Universal de Direitos Humanos: “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos”. Dignidade, apesar de fazer parte da primeira página desse importante documento, é um conceito que foi construído na essência do ser e depois obteve valor jurídico. Trata-se de um valor que todos devem obter, seja qual for o seu caminho. É a união de todos os Direitos. Direitos estes que sendo cumpridos, haverá dignidade. Por exemplo: uma pessoa não perde (ou não deveria perder) sua dignidade ao cometer um crime e ser restrita à liberdade na prisão. O indivíduo descumpriu uma lei, foi julgado, irá para uma cela e lá cumprirá seus dias durante o tempo definido. Na teoria, não deveria ser restrito de respeito, de alimentar-se apropriadamente, ter higiene adequada, poder ver sua família dentro das regras, porque isso tiraria sua dignidade. Porém, é o que acontece e constrói o cenário que hoje vemos nos presídios e na sociedade como um todo. Toda vez que questionarmos isso, ou quando ouvimos que “direitos humanos são para humanos direitos” devemos lembrar que direitos humanos são para humanos e a dignidade destes jamais deverá ser retirada. 3. DIVERSIDADE Acredito que não há exemplo melhor para ilustrar o conceito de diversidade como o Brasil. Há diversidade de etnias, de cultura, religiosa, de gênero, de orientação sexual, classe social, entre outros. Nosso primeiro contato com a diversidade, é, sem dúvidas, na escola. Lá convivemos com histórias únicas e diferentes umas das outras e durante anos, vamos moldando essa convivência. É completamente normal, para uma criança, que ainda não possui sua personalidade totalmente definida, questionar o que lhe é “estranho”. É dever dos pais e educadores ensinar a conviver harmoniosamente com essa, para que possamos aprender que a “estranheza” é apenas algo diferente do nosso mundo.É por isso também, que a escola tem o dever de ensinar sobre religiões além do catolicismo, sobre preconceito e respeito. “Faz-se necessário a adoção de currículos e metodologias de ensino que levem em consideração as diferenças regionais, culturais, de gênero, étnicas, raciais e religiosas, os perfis populacionais etários e os contextos onde as aprendizagens se realizam.” (DIAS, 2007). Diversidade, então, é a pluralidade em convivência. A convivência harmoniosa entre essas diversidades é o que ilustra uma nação próspera. 4. DESAFIOS DA EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS De início, é importante salientar que o maior desafio da Educação em Direitos Humanos consiste em promover o respeito à diversidade supracitada. É preciso criar um ambiente pedagógico onde haja uma integração entre todos e superam-se as diferenças. Criar um currículo onde são debatidas essas diversidades, ensine sobre religião, cultura, histórias e variedades. Promover um ambiente acolhedor onde todos se sintam livres para contar e trilhar o próprio caminho e fazer as próprias escolhas, na busca de se tornar um indivíduo que promova o respeito e aceite as diferenças (suas e dos outros). A flexibilização do currículo escolar então faz-se necessária para que se possa ao menos tentar satisfazer as necessidades do aluno, na busca de uma educação inclusiva. Candan (2007) cita no livro “Educação em Direitos Humanos” que articular igualdade e diferença é um dos desafios da atualidade. De fato, uma democracia só se edifica no respeito à pluralidade e à superação das desigualdades. Em 2007, foi elaborado o Plano Nacional de Educação e Direitos Humanos (PNEDH). O PNEDH “está apoiado em documentos internacionais e nacionais, demarcando a inserção do Estado brasileiro na história da afirmação dos direitos humanos e na Década da Educação em Direitos Humanos” (PNEDH, 2007, p. 24). A partir desse momento, articular um ensino que insira e respeite a dignidade do indivíduo tornou-se um preceito fundamental e incentivou os movimentos que fortaleciam essa ideia. É necessário então, por todas essas concepções em prática. “É fundamental diminuir a distância entre o que se diz e o que se faz, de tal forma que, num dado momento, a tua fala seja a tua prática.” Freire (2003, p.61). 5. GÊNERO O conceito de gênero vai muito além de ser homem ou mulher. Engloba uma concepção que envolve todo o contexto histórico e o papel do indivíduo na sociedade. É importante diferenciar de sexo, que é biológico. Gênero é cultural. A sociedade define certos comportamentos sendo “femininos” ou “masculinos”. Em alguns lugares e para algumas pessoas, nem mesmo o fato de possuir sistema reprodutor feminino ou masculino define o gênero, porque este, como já dito, é definido socialmente. Mas na maioria das vezes, uma mulher que decida jogar futebol, por exemplo, é lida como “masculina”, “mulher-macho”. Porque socialmente, o futebol é considerado um esporte masculino. De homens, feito para homens. Mulheres devem ser "femininas", praticar atividades delicadas, porque assim foi definido o que elas são. Manter a casa limpa, organizada. Ajeitar a mesa, receber o marido que volta cansado do trabalho e satisfazê-lo. Em troca, recebe proteção - porque assim foi definido o papel do homem: proteger - e cuidar da parte financeira.Qualquer mulher que ousou superar esses papéis definidos e lutar numa guerra, por exemplo, é vista como masculina. Aqui, é importante lembrar de Simone de Beauvoir, que escreveu “O Segundo Sexo” (1949) e debatia exatamente essas questões em sua obra. Dizia que essas definições eram limitantes e criadas na intenção de subjugar a mulher. Nascemos como uma folha em branco, mas através da socialização, esses conceitos vão sendo inseridos quase que automaticamente. É por isso que ela contraria todas essas definições na sua célebre frase “Não se nasce mulher, torna-se mulher”. Ou seja, cada uma pode construir e desenhar sua história sem subjugar-se a conceitos pré-definidos pela sociedade. Michelle Perrot, em “Minha História das Mulheres”, também explica esse papel de as mulheres terem sido historicamente sujeitadas a papéis determinados pelo homem. Dizia-se que a sedentariedade era uma virtude feminina. "Uma mulher em público está sempre fora de lugar", diz Pitágoras."Toda mulher que se mostra se desonra", escreve Rousseau à D'Alembert. O que se teme: as mulheres em público, as mulheres em movimento. (PERROT, 2006). É importante lembrar que para homens, a ideia também é válida. Este deve prover o sustento da família, jamais demonstrar fraqueza, jamais sujeitar-se às mulheres. Outro grupo social e historicamente renegado que deve ser enfatizado são os indivíduos transgênero. E quem são eles? Uma pessoa pode ter sexo biológico masculino e entender-se como mulher, ou vice-versa. Quem nasceu com o sexo biológico feminino e se identifica com ele, é considerada cisgênero. Pessoas transgênero são frequentemente vítimas da violência ou do descaso, do preconceito e do ódio. Em alguns lugares, essas pessoas sequer têm sua identidade reconhecida. Ainda há muito a buscar quando se trata de respeito e igualdade com o indivíduo transgênero, já que nem mesmo as instituições que deveriam promover a igualdade entre os demais respeita a lei. 6. FEMINISMO NEGRO Se falar sobre feminismo já é dificil na sociedade, falar de feminismo negro é mais ainda. Simone de Beauvoir citava que a mulher era o “outro”, que o ser social valorizado era o homem. A mulher negra, então, é o “outro do outro”. Ou seja, a mulher branca cisgênero, apesar de ser o “outro” do homem, ainda é mais valorizada socialmente. Impossível não citar que a escravidão deixou cicatrizes na sociedade que até hoje não se fecharam e interferem na vida da mulher negra, principalmente quando esta é periférica. A luta do feminismo negro nasce para superar essas desigualdades deixadas pela história. Essas mulheres não se viam representadas pelo feminismo que se dizia universal e foram então, lutar pelos seus direitos. Assim foram nascendo os coletivos e encontros a partir da década de 80, e nomes como Núbia Moreira e Luiza Bairros se destacam na busca por um feminismo negro no Brasil. Nas escolas e universidades, principalmente nas décadas passadas, a representatividade faltava. Não se viam bonecas e super heroínas negras com cabelos crespos ou filmes hollywoodianos com protagonistas negras conquistando o mundo. Era um espaço não preenchido que deixava e deixa marcas quando se trata de representatividade. Elas queriam se ver em papéis predominantemente brancos. Então, era necessário lutar. No século atual, a política de inclusão e a política de cotas do governo federal da época abriu espaço para que o feminismo negro ocupasse um espaço quase que totalmente branco: as universidades. Foi possível levar para o âmbito acadêmico e espalhar a busca pela equidade e combate ao racismo, abrir debates e dialogar de igual para igual com aqueles que não sofrem as mesmas lutas. Na UNIFESP, Djamila Ribeiro, uma expoente do feminismo negro, faz parte do Mapô – Núcleo de Estudos Interdisciplinar em Raça, Gênero e Sexualidade da UNIFESP. São espaços importantíssimos para que se possa inserir no cotidiano e tornar cada vez mais amplo um diálogo que busca a superação de desigualdades ainda tão marcantes num país tão plural. Ainda sobre Djamila, em sua obra “Quem tem medo do feminismo negro?”, conta sobre sua infância e convida para o debate quem ainda pensa que o feminismo deveria ser universal, e não separado. Pauta sobre a invisibilidade de mulheres negras sofrida quando esse feminismo universal é debatido, usa de grandes mulheres negras para traçar suas ideias e propõe questionamentos importantíssimos sobre a questão racial e feminina. A leitura, portanto, não é apenas necessária, como obrigatória, para ao menos tentar entender a luta. 7. IDENTIDADE SEXUAL Identidade sexual também é um conceito construído. Não é possível estabelecer quando esta é definida, ou seja, quando alguém se define como hétero, homo ou bissexual. Tem a ver com desejo e é mutável, volátil. Não se usa mais o termo “opção” pois não se trata de uma escolha e abria espaço para a ideia de que pais e instituições (principalmente religiosas) conseguiriam mudar o fato de que o indivíduo deixaria de ser aquilo que sempre foi para agradar um sistema e se tornar heterossexual. A mudança do termo apesar de importante, não exclui o fato de que muitas pessoas ainda acreditam que há uma “cura” para a identidade sexual do indivíduo. Assim, fazem esses se submeterem a tratamentos com profissionais sem credibilidade, à curas através de orações em igrejas, instituição essa que deveria acolher e aceitar, afinal, promove o amor. Na leitura da monografia "Gênero e Sexualidade na Educação: uma discussão da gestão escolar, a partir da autobiografia e análise documental”, em especial o subtítulo “identidades sexuais”, a autora Bruna Stock cita Sabrina Aparecida de Lima, que define que a heterossexualidade é uma construção histórica que teve diferentes significados ao longo da história.(STOCK, 2018). O conceito de identidade sexual então, também pode ser definido como mutável, pois a cada momento e de acordo com o contexto histórico, ele é adaptado.
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