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Dificuldades de Aprendizagem Transtorno do Neurodesenvolvimento da Criança em Idade Escolar Os distúrbios do neurodesenvolvimento são problemas neurológicos que podem interferir com a aquisição, retenção, ou aplicação de habilidades ou conjuntos de informações específicos. Eles podem envolver disfunção da atenção, da memória, da percepção, da linguagem, da solução de problemas ou da interação social. A função do neurodesenvolvimento é um processo cerebral básico necessário para o aprendizado e a produtividade. A variação do neurodesenvolvimento se refere às diferenças no funcionamento do neurodesenvolvimento. Amplas variações nessas funções existem internamente e entre indivíduos. Essas diferenças podem sofrer alterações com o tempo e não representam necessariamente uma patologia ou anormalidade. Os transtornos do neurodesenvolvimento refletem distúrbios na estrutura neuroanatômica ou na função psicofisiológica e colocam uma criança em risco de passar por desafios de desenvolvimento, cognitivos, emocionais, comportamentais, psicológicos e adaptativos. Para as crianças em idade escolar, uma área que merece uma atenção especial é o desenvolvimento da capacidade acadêmica. As deficiências acadêmicas foram classificadas diagnosticamente como Transtornos Específicos de Aprendizagem (TEATEAs). A Classificação Internacional de Doenças (CID) categoriza como Transtornos Específicos de Desenvolvimento das Habilidades Escolares incluindo Transtorno Específico de Leitura, Transtorno Específico de Soletração, Transtorno Específico da Habilidade em Aritmética e Transtorno Misto de Habilidades Escolares. A dislexia (transtorno de leitura) está incluída na CID-10 em uma categoria separada de disfunção simbólica. As terminologias Discalculia (dificuldade de aprender matemática) e Disgrafia (dificuldade de aprender linguagem escrita) são também usadas pelos pesquisadores e médicos, mas sua inclusão nos sistemas de classificação diagnóstica tem sido inconsistente e uma fonte de divergência entre os especialistas. ETIOLOGIA E PATOGÊNESE A disfunção do neurodesenvolvimento pode se manifestar por várias razões. Podem incluir influência pré- /perinatal, genética, médica, psicológica, ambiental e sociocultural. Os genes que contribuem para a disfunção do neurodesenvolvimento já foram identificados. Os transtornos de leitura podem ser familiares ou hereditários, e os estudos ligaram alguns transtornos de leitura com loci genéticos nos cromossomos 6 e 15. Os fatores de risco perinatal que estão associados à disfunção do neurodesenvolvimento incluem peso de nascimento muito baixo, restrição de crescimento intrauterino grave, encefalopatia hipóxica-isquêmica perinatal e exposição pré-natal a substâncias, tais como álcool e drogas. O risco elevado de transtornos do lobo frontal e de aprendizagem também está associado a toxinas ambientais, incluindo chumbo; drogas, tais como a cocaína; infecções, tais como a meningite e o HIV; e lesão cerebral secundária à hemorragia intraventricular, leucomalácia periventricular ou trauma cerebral. O trauma psicológico precoce pode resultar tanto em alterações estruturais como neuroquímicas no desenvolvimento do cérebro, podendo contribuir com a disfunção do neurodesenvolvimento. Os achados sugerem que os efeitos da exposição ao trauma e/ou abuso no início do desenvolvimento podem induzir a interrupção do sistema regulador do cérebro com conexões no córtex órbito-frontal, e podem influenciar na função do hemisfério direito com risco associado a problemas com o processamento de informação, memória e operações relacionadas ao lobo frontal (ex. foco e autorregulação). A privação sociocultural e ambiental pode levar, ou potencializar, a disfunção do neurodesenvolvimento, que na maioria das vezes é o resultado de uma combinação de fatores determinantes, ao invés de uma única causa. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS As crianças em idade escolar com transtornos do neurodesenvolvimento variam muito no que diz respeito aos quadros clínicos. Seus padrões específicos de desempenho escolar e comportamento representam as vias finais mais comuns, a convergência de muitas forças, incluindo a interação de pontos fortes e deficiências cognitivas; fatores ambientais, sociais ou culturais; temperamento; experiência educacional; e resistência intrínseca. Os sintomas de transtornos escolares diferem com a idade. Crianças na pré- escola ou no ensino infantil podem apresentar atraso no desenvolvimento da linguagem, incluindo problemas de articulação, desenvolvimento do vocabulário, aprendizado da palavra e rima. Elas geralmente experimentam seus primeiros desafios com o aprendizado de cores, formas, letras e números, o alfabeto e os dias da semana. A dificuldade em seguir instruções, superatividade e distratibilidade podem ser os primeiros sintomas de início de transtornos de atenção e no controle inibitório. Dificuldades com o desenvolvimento motor fino (ex. segurar lápis de cor e lápis, colorir ou desenhar) e interação social não são incomuns. Quando essas crianças ingressam no ensino fundamental podem demonstrar problemas integrando e associando letras e sons e com o conhecimento semântico, tais como misturar palavras (como ir e comer). Enquanto aprendem a ler e soletrar, os desafios com as reversões (b/d), inversões (m/w), transposições (amor/roma) e substituições (casa/lar) podem persistir. Crianças com os primeiros sinais de deficiência com matemática pode apresentar dificuldade com conceitos de quantidade ou com adição e subtração sem aplicar a representação correta (ex. seus dedos enquanto estão calculando). Dificuldade em aprender conceitos de tempo e confusão com a orientação (direita/esquerda) podem também se manifestar. Problemas de sequenciamento são observados na leitura, ortografia e escrita e matemática. O ensino fundamental traz consigo uma mudança significativa nas demandas cognitivas, acadêmicas e de regras. Na leitura e na escrita, as crianças no ensino fundamental podem apresentar dificuldades com erros de transposição e sequenciamento; dificuldades com étimos, prefixos e sufixos; dificuldades com a expressão escrita; e evitar completamente a leitura e a escrita. Os desafios para completar problemas de palavras em matemática são comuns. Embora observável tanto em graus menores como maiores, as dificuldades comportamentais, emocionais e/ou sociais tendem a se tornar mais marcantes com crianças no ensino fundamental que experimentam problemas cognitivos e/ou acadêmicos. Muitos desses desafios costumam avançar até o ensino médio. Estudantes do ensino médio podem manifestar problemas com compreensão de texto, expressão escrita e eficiência lenta de processamento. Problemas respondendo questões abertas, lidando com informação abstrata e produzindo controle executivo (p. ex., monitoramento, organização, planejamento e de iniciativa própria) são frequentemente relatados. Leitura Transtornos de leitura, conhecido como dislexia, podem resultar de uma série de deficiências de desenvolvimento neurológico. De modo mais frequente, as deficiências no processamento auditivo e/ou da linguagem estão presentes. Desafios com o processamento fonológico geralmente resultam em deficiências no nível da decodificação individual das palavras e, consequentemente, um atraso na automaticidade que faz com que a leitura se torne lenta, trabalhosa e frustrante. Sem uma identificação e intervenção eficazes, a compreensão de texto e, por fim, a aquisição de conhecimento podem ficar seriamente comprometidas. Déficits em outros domínios do neurodesenvolvimento também podem estar presentes. A memória de trabalho fraca pode dificultar a capacidade da criança de reter sons e/ou símbolos na mente enquanto separa as palavrasem componentes de sons, ou gerar problemas na compreensão de texto. Embora relativamente raros como uma causa de dificuldade de leitura, os problemas com a função visual-espacial (ou seja, a percepção visual) podem fazer com que as crianças tenham problemas reconhecendo as letras. Não é raro que crianças com problemas de leitura evitem a prática de ler, e um atraso na proficiência em leitura se torna cada vez mais evidente e difícil de remediar. Soletração e Escrita Deficiências em soletração e escrita dividem muitos déficits fundamentalmente relacionados com a leitura, portanto não é de se surpreender que os dois transtornos ocorram com frequência de forma simultânea em crianças na idade escolar. As principais fraquezas do neurodesenvolvimento podem incluir dificuldades fonológicas e de decodificação, problemas ortográficos (codificação de letras e palavras na memória) e déficits morfológicos (uso de sufixos, prefixos e étimos). Problemas nessas áreas podem se manifestar como foneticamente fracos, porém com aproximações visualmente comparáveis à palavra exata (cauda por calda), que soletrando soa foneticamente correto, mas visualmente incorreto (saldar por saudar), e padrões inadequados de soletração (recrear ao invés de recriar). Crianças com déficits de memória podem soletrar palavras de forma incorreta devido a limitações na codificação. Outras soletram errado por causa da memória de trabalho auditiva debilitada que interfere na sua capacidade de processar as letras. As dificuldades na escrita foram classificadas como transtorno da expressão escrita, ou disgrafia. Embora muitos dos mesmos distúrbios descritos para a leitura e a soletração possam contribuir com problemas na escrita, a expressão escrita é a mais complexa do estudo da linguagem, porque exige a síntese de muitas funções do neurodesenvolvimento (auditiva, visual-espacial, de memória, executiva). Déficits em qualquer um desses domínios pode ser problemáticos. Em muitos casos, a escrita se torna trabalhosa devido à disfunção grafomotora subjacente (ex. a fluência não mantém o ritmo com a concepção e produção da linguagem). Os pensamentos podem também ser esquecidos ou subdesenvolvidos durante a escrita porque o esforço mecânico se torna muito penoso. Matemática Os atrasos na habilidade com a matemática, conhecidos como transtorno da matemática ou discalculia, podem ser especialmente refratários à correção, parcialmente devido ao fato de a matemática envolver a assimilação tanto do conhecimento procedural (ex. cálculos) e como dos processos cognitivos de alto grau (ex. memória de trabalho). Um estudo realizado em escolas revelou que nenhum estudante que estivesse atrasado em matemática por mais de 6 meses na 6ª série jamais se recuperou; outro estudo descobriu deficiência aritmética grave persistente em metade das crianças pré-adolescentes afetadas. Fatores associados à persistência das dificuldades incluíam a gravidade e a hereditariedade dos transtornos. Deficiências matemáticas significativas podem se tornar virtualmente insuperáveis porque a matéria é muito cumulativa na sua estrutura. Algumas crianças sofrem a experiência do fracasso em matemática devido às deficiências de raciocínio e resolução de problemas (ex. funcionamento mental). Pode ser difícil para elas entender e aplicar conceitos de forma eficaz e/ou sistemática. Crianças com transtornos de linguagem têm dificuldade com a matemática porque elas não conseguem compreender as explicações verbais dos professores sobre conceitos quantitativos e operações, e com isso são propensas a se sentirem frustradas ao resolver problemas com as palavras e com o processamento de uma vasta rede de vocabulário técnico que envolve a matemática. A matemática depende também da visualização. Crianças com dificuldade em formar e relembrar a imagética visual podem ter desvantagens em adquirir habilidades matemáticas. Quando o sistema de memória da criança é fraco, ela pode ter dificuldade em lembrar procedimentos apropriados e dados matemáticos automatizados (ex. tabelas de multiplicação). Além disso, não é raro que crianças com déficits em matemática sofram de fobias sobrepostas pela dificuldade. A ansiedade gerada pela matemática pode ser especialmente debilitante. Problemas Extraescolares Os transtornos do neurodesenvolvimento frequentemente geram efeitos que vão muito além do desempenho escolar. Esses efeitos podem estar relacionados aos próprios transtornos ou a sequelas secundárias (ex. fracasso persistente e frustração). A impulsividade e a falta de autocontrole eficaz em crianças com déficit de atenção e de controle da impulsividade podem levar atitudes inaceitáveis que se manifestam de forma não intencional. Crianças com transtornos do neurodesenvolvimento podem sofrer ansiedade excessiva com o desempenho ou depressão clínica, com comentários tristes e autodepreciativos, queda da autoestima, fadiga crônica, falta de interesse e, inclusive, acarretar tendência suicida. Essas crianças são induzidas com facilidade a ter relações interpessoais disfuncionais, comportamentos nocivos e o desenvolvimento de transtornos de personalidade e de saúde mental, tais como transtorno de humor ou transtorno de personalidade antissocial. AVALIAÇÃO E DIAGNÓSTICO O pediatra da atenção básica tem um papel importante em identificar e avaliar a criança com um transtorno escolar. Deve incluir um sistema de triagem e vigilância nas visitas de rotina ao consultório para que consiga chegar a uma identificação precoce quanto às dificuldades escolares. O pediatra deve estar familiarizado com o histórico médico familiar que inclua um dos pais que ainda tenha problemas de leitura ou com a gestão do tempo, ou um irmão ou irmã que tenha se saído mal na escola. Fatores relacionados ao histórico médico da criança devem ser registrados, tais como prematuridade extrema ou condições médicas crônicas. Crianças com peso baixo ao nascer e aquelas nascidas prematuramente que aparentam não ter tido sérios problemas neurológicos, poderão manifestar problemas escolares somente mais tarde em seus currículos escolares e deverão receber uma atenção especial. Crianças que se encaixam nessas categorias de alto risco devem ser registradas para manter um grau de controle elevado nas visitas de rotina ao consultório, como também nas visitas de cuidados intensivos, especialmente se houver queixas físicas não específicas. Os pais podem estar preocupados com o progresso escolar da criança, mas se mostrarem relutantes em partilhá- los com o pediatra, a menos que sejam motivados, tais como completando um questionário de triagem do padrão comportamental ou questionamento direto com os pais relacionados às possíveis preocupações quanto ao desempenho escolar da criança. A inconsistência relatada de um grau para o outro pode ser às vezes causada pela diferença nos estilos de ensinamento ou nas demandas na sala de aula. Revisar os boletins escolares pode fornecer dicas úteis sobre os padrões de transtorno no neurodesenvolvimento. Além dos padrões dos graus de várias matérias escolares, é importante observar também as avaliações do comportamento na sala de aula, às vezes indicados como postura, comportamento, conduta, esforço/hábitos com as tarefas ou cidadania. A revisão do teste padronizado é útil, e as notas baixas podem ser o resultado de um transtorno de aprendizado, TDAH, ansiedade, falta de motivação ou alguma combinação desses fatores. Por outro lado, notas acima da média tendem a descartar problemas de aprendizado ou de atenção, mas a motivação ou assuntos relacionados à adaptação podem então explicar a discrepância entre os testes padronizados e o desempenho na sala de aula. Recomenda-se comparar quanto tempo deveria se levar parase fazer a lição de casa e quanto tempo a criança leva para realizá-la. Crianças com TDAH, transtornos de aprendizado ou com problemas emocionais/comportamentais frequentemente acham a lição de casa uma atividade problemática. Exames da visão e audição são componentes críticos da avaliação médica e qualquer suspeita de dificuldade sensorial deve justificar o encaminhamento para mais testes definitivos. Deve-se levar em conta a influência de problemas médicos crônicos ou de efeitos colaterais em potencial de medicamentos. A privação de sono vem sendo cada vez mais reconhecida como um fator que contribui para problemas escolares e a possibilidade de abuso de drogas deve sempre ser levada em consideração, especialmente no caso de o adolescente que antes tinha bons resultados na escola e passou a manifestar um rápido declínio no desempenho escolar. O médico deve se manter atento quanto às características físicas dismórficas, anomalias congênitas mínimas ou formações de achados clínicos (tais como, anomalias cardíacas e anomalias palatinas na síndrome velocardiofacial) e realizar um exame neurológico detalhado. Os médicos com interesse particular em transtornos de aprendizado podem ampliar sua participação no processo de avaliação. Eles podem coletar os dados da função do neurodesenvolvimento usando questionários preenchidos pelos pais, escola e (caso com idade suficiente) a criança, fornecendo informações sobre a adaptação comportamental, padrões de desempenho escolar e traços associados com transtornos de desenvolvimento específicos. Instrumentos de triagem, tais como a Lista de Sintomas Pediátricos e questionários padronizados de comportamento, incluindo a Lista de Verificação de Comportamento Infantil e a Escala de Avaliação Comportamental para Crianças podem auxiliar na avaliação. O médico também pode realizar uma avaliação neurológica e de desenvolvimento mais extensa. Os instrumentos disponíveis para o exame pediátrico do neurodesenvolvimento que facilitam a amostragem direta de várias funções do neurodesenvolvimento, tais como atenção, memória e linguagem, incluem o Exame Pediátrico do Ensino Fundamental e o Exame Pediátrico de Aptidão na Infância Intermediária. Os exames desse tipo incluem observações diretas comportamentais e avaliação de indicadores neurológicos mínimos (às vezes chamados de sinais leves). Essa última avaliação inclui vários movimentos relacionados e outros fenômenos frequentemente associados ao transtorno do neurodesenvolvimento. Uma criança com resultados insatisfatórios durante os anos escolares geralmente requer uma avaliação multidisciplinar, incluindo pediatra, psicólogo e, se possível, um especialista psicoeducacional (às vezes chamado de diagnosticador educacional) que se encarregará da análise detalhada das habilidades e sub-habilidades escolares. Deve haver também o envolvimento de outros profissionais, quando necessário, como um patologista de linguagem e fala, um terapeuta ocupacional, um neurologista e um assistente social. Em alguns casos, é necessário realizar um exame mais aprofundado sobre o estado neurocognitivo da criança. Isso vale especialmente para crianças com dificuldades cognitivas e de desenvolvimento na presença de uma condição médica (ex. epilepsia, lesão cerebral traumática, cânceres/tumores cerebrais na infância, condições genéticas). A análise neuropsicológica envolve a avaliação abrangente da função cerebral como meio de compreender essa função entre os domínios. O objetivo da avaliação neuropsicológica é compreender a função cerebral identificando o perfil dos pontos fortes e fraquezas cognitivas da criança. Os dados neuropsicológicos são geralmente analisados em conjunto com outros testes como RM funcionais, em busca de evidências que apontem para quaisquer áreas de dificuldade (ex. fraquezas de memória com anomalias do lobo temporal). O teste psicoeducacional pode gerar dados relevantes, especialmente quando tais avaliações incluem análises minuciosas que localizam onde os problemas estão ocorrendo nos processos de leitura, soletração, escrita e matemática. A inclusão de múltiplas fontes pode ser usada para formular as recomendações específicas para os professores regulares ou de educação especial e para as intervenções que podem ser implementadas no ambiente doméstico. Um especialista em saúde mental pode ser valioso para identificar as questões familiares ou transtornos psiquiátricos que possam estar complicando ou agravando os transtornos de neurodesenvolvimento. TRATAMENTO Existem várias abordagens padronizadas que podem ser incorporadas em qualquer plano de manejo de um estudante que esteja tendo problemas escolares. O médico da criança pode desempenhar um papel importante como responsável pela supervisão e monitoramento desses passos. Desmistificação: Muitas crianças com transtornos do neurodesenvolvimento têm pouca ou nenhuma compreensão da natureza ou fontes de suas dificuldades escolares. Depois de realizada uma avaliação descritiva adequada, é importante explicar à criança a natureza do transtorno enquanto definem os pontos fortes da criança. Estratégias de Inclusão (Acomodações): Várias técnicas podem ajudar a criança a lidar com os transtornos do neurodesenvolvimento. Tais estratégias de inclusão são normalmente usadas na sala de aula comum. Exemplos de estratégias de inclusão incluem o uso da calculadora para resolver problemas de matemática, escrever redações com processador de texto, apresentação de relatórios orais em vez de escritos, resolver menos problemas matemáticos, sentar próximo ao professor para reduzir a distração, apresentar visualmente os problemas matemáticos resolvidos e fazer os testes padronizados com tempo ilimitado. Essas estratégias de inclusão não curam os transtornos do neurodesenvolvimento, mas ajudam a diminuir os efeitos escolares e extraescolares e servem como uma plataforma para que se atinja um maior êxito escolar. Intervenções (Remediação das Habilidades): As intervenções podem ser implementadas em casa e na escola para fortalecer os elos fracos das habilidades escolares. A remediação não precisa focar exclusivamente em matérias escolares específicas. Muitos estudantes precisam de ajuda para adquirir as habilidades de estudo, estratégias cognitivas e hábitos organizacionais produtivos. A identificação precoce é crucial para que as intervenções instrucionais apropriadas possam ser introduzidas em um esforço para minimizar os efeitos de longo prazo de transtornos escolares. A remediação pode ocorrer em uma sala de recursos ou centro de aprendizagem na escola e é geralmente limitada às crianças que preenchem os critérios educacionais para os serviços de recursos de educação especial como descritos anteriormente. As intervenções que podem ser implantadas em casa podem incluir treinos para ajudar na automatização das sub- habilidades, tais como dados aritméticos ou formação de letras, ou o uso de programas de leitura com base fonológica. Há uma gama disponível de abordagens de tratamento/intervenção para fortalecer a função executiva que tem demonstrado resultados positivos. Entre essas incluem os programas computadorizado de treinamento tais como o CogMed (Pearson) que tem demonstrado o fortalecimento das habilidades da memória de trabalho em crianças usando modelos de jogos de computador. Os programas de sala de aula com base no currículo, como o Tools of the Mind (Tools) e PATHS (Promoting Alternative Thinking Strategies – Promovendo Estratégias de Pensamento Alternativo) estão também ganhando crescente apoio. Esses programas aplicam abordagens, tais como jogos sociais, e áreas de meta, tais como autocontrole e resolução de problemas para ensinar e fortalecer as funções executivas. Exercícios aeróbicose artes marciais, tais como TaeKwon-Do, que focam na disciplina e enfatizam o desenvolvimento do autocontrole (p. ex., o controle do impulso), têm demonstrado melhorias que generalizam em muitos aspectos das funções executivas e atenção. Terapia do Desenvolvimento: Existe controvérsia em torno da eficácia de tratamentos que visam realçar as funções de desenvolvimento mais fracas. No entanto, outras formas de terapia do desenvolvimento são amplamente aceitas. Os patologistas da linguagem e de fala normalmente oferecem intervenção para crianças com várias formas de transtorno de linguagem. Os terapeutas ocupacionais lutam para melhorar as capacidades motoras de determinados estudantes com problemas de leitura, e os fisioterapeutas focam nos problemas motores principais. Modificações Curriculares: Muitas crianças com transtornos do neurodesenvolvimento requerem alterações no currículo escolar para que possam obter êxito, especialmente à medida que avançam para o ensino médio. Estudantes com déficits de memória podem precisar ter seus cursos selecionados para eles, para que não tenham uma carga de memória cumulativa excessiva em um único semestre. O tempo para a aquisição de língua estrangeira, a seleção do currículo de matemática e a escolha dos cursos de ciências são questões críticas para muitos desses adolescentes que sofrem com esses problemas. Fortalecendo os Pontos Fortes: As crianças afetadas precisam encontrar suas afinidades, potenciais e talentos identificados claramente e explorados da forma mais ampla possível. Potenciais atléticos, inclinações artísticas, talentos criativos e habilidades mecânicas estão entre os recursos potenciais de determinados estudantes que não desempenham bem no âmbito escolar. Os pais e os educadores precisam criar oportunidades para que esses estudantes construam seus próprios recursos e alcancem o respeito e o elogio merecido quanto aos seus esforços Aconselhamento Individual e Familiar: Quando as dificuldades escolares são complicadas com problemas familiares ou com transtornos psiquiátricos identificáveis, deve-se indicar a psicoterapia. Os psicólogos clínicos ou psiquiatras pediátricos podem oferecer terapias de longo ou de médio prazo. Tal intervenção pode envolver somente a criança ou toda a família. Terapias Controversas: Uma variedade de métodos de tratamento para transtornos do neurodesenvolvimento foi proposta, mas que atualmente não há evidência científica comprovada sobre a sua eficácia. Isso inclui intervenções dietéticas (vitaminas, eliminação de aditivos alimentares ou alergênicos potenciais), programas ou medicamentos neuromotores para lidar com o transtorno vestibular, exercícios óticos, filtros, lentes coloridas e vários aparelhos tecnológicos. Medicamento: Os agentes psicofarmacológicos podem ser especialmente úteis para aliviar o peso dos transtornos do neurodesenvolvimento. De forma mais frequente, os medicamentos estimulantes são usados no tratamento de crianças com déficits de atenção. Embora a maioria das crianças com déficits de atenção tenham outros transtornos associados (tais como transtorno de linguagem, problemas de memória, deficiências motoras ou déficits de habilidade social), os medicamentos, tais como metilfenidato, dextroanfetamina, lisdexanfetamina, misturas com sais de anfetaminas e atomoxetina podem ser importantes suplementos para o tratamento para ajudar algumas crianças a focar de forma mais seletiva e controlar sua impulsividade. Quando a depressão ou a ansiedade excessiva se tornam um componente significativo do quadro clínico, os medicamentos antidepressivos ou para combater a ansiedade se tornam úteis. As crianças que recebem medicamentos precisam de acompanhamento médico regular que inclua o histórico e a lista dos efeitos colaterais, uma revisão na lista comportamental atual, um exame físico completo e modificações apropriadas na dose do medicamento. Testes periódicos sem o medicamento são recomendados para estabelecer se este é ainda necessário. Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade O transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (TDAH) é o distúrbio neurocomportamental mais comum na infância e uma das condições crônicas de saúde mais prevalentes que afetam crianças em idade escolar. O TDAH é caracterizado pela desatenção, incluindo aumento da distratibilidade e dificuldade em manter a atenção; fraco controle do impulso e capacidade autoinibitória reduzida; e agitação motora e hiperatividade motora. As crianças afetadas geralmente enfrentam baixo rendimento escolar, problemas nas relações interpessoais com familiares e seus pares, e baixa autoestima. O TDAH frequentemente ocorre junto com outros transtornos emocionais, comportamentais, de fala e de aprendizado. Em 40-50% das crianças afetadas, o transtorno parece avançar até a fase adulta com manifestações variadas, gerando problemas significativos como subdesemprego ou desemprego, disfunção social e aumento no risco de comportamentos antissociais, incluindo abuso de drogas, dificuldades em manter relacionamentos e problemas com a lei. Mães de crianças com TDAH são mais propensas a enfrentar complicações no parto, tais como toxemia, trabalho de parto demorado e complicado. O consumo de drogas, álcool e tabaco pela mãe durante a gestação, exposição ao chumbo ou ao mercúrio (pré-natal e pós-natal) estão frequentemente ligados a dificuldades de atenção relacionados ao desenvolvimento do TDAH. Estudos genéticos identificaram principalmente 2 genes candidatos envolvidos, o gene do transportador de dopamina (DAT1) e uma forma específica do gene para os receptores de dopamina do tipo 4 (DRD4), no desenvolvimento do TDAH. Genes adicionais que podem contribuir para o TDAH incluem DOCK2 associado a uma inversão pericêntrica do 46N in(3) (p14:q21) que está envolvido na regulação de citocinas, um gene do trocador de sódio-hidrogênio, outros genes dopaminérgicos (DRD5), genes serotonérgicos (5HTT, HTR1B) e a proteína associada a sinaptossoma, SNAP-25. Estruturas cerebrais anormais estão relacionadas ao aumento no risco de TDAH; foi relatado que 20% das crianças com lesão cerebral traumática grave apresentam início subsequente de sintomas significativos de impulsividade e falta de atenção. Crianças com lesão craniana ou outro tipo de lesão que foram posteriormente diagnosticadas com TDAH podem apresentar equilíbrio prejudicado ou comportamento impulsivo como parte do TDAH, consequentemente predispondo-as à lesão. Foram identificadas anomalias estruturais e funcionais em crianças com TDAH sem lesão cerebral pré-existente identificável. Entre elas incluem desregulação dos circuitos fronto-subcorticais, pequenos volumes corticais nessa região, redução de pequenos volumes difundidos por todo o cérebro e anomalias no cerebelo, especialmente nos elementos medianos/vermianos. Estressores psicossociais familiares podem também contribuir para ou exacerbar os sintomas do TDAH, incluindo pobreza, exposição à violência e malnutrição ou subnutrição. PATOGÊNESE Os estudos com MRI indicam que é possível observar uma perda de assimetria normal no cérebro, além de pequenos volumes cerebrais de estruturas específicas, tais como o córtex pré-frontal e gânglios basais, em cérebros de crianças com TDAH. Crianças com TDAH apresentam aproximadamente 5-10% de redução no volume dessas estruturas cerebrais. Os achados com MRI funcional evidenciam baixo fluxo sanguíneo no corpo estriado. Os dados da MRI funcional também sugerem déficits em redes funcionais abrangentes para a atenção seletiva e atividade tônica no TDAH, que incluem o corpo estriado, as regiões pré- frontais, o lobo parietal e o lobo temporal. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Segundo a DSM-IV, o diagnóstico de TDAH ocorreuprincipalmente nos testes de campo com crianças de 5-12 anos de idade. De acordo com os critérios atualizados do DSM- 5, o comportamento deve ser de desenvolvimento inapropriado (substancialmente diferente daquele de outras crianças com a mesma idade e nível de desenvolvimento), deve ter início antes dos 12 anos de idade, deve estar presente por pelo menos 6 meses, deve se manifestar em 2 ou mais ambientes e relatado como tal por observadores independentes e não deve ser secundário a outro transtorno. O DSM-5 identifica 3 subtipos de TDAH. O primeiro subtipo, TDAH, predominantemente o tipo falta de atenção, geralmente inclui o comprometimento cognitivo e é mais comum no sexo feminino. Os outros 2 subtipos, TDAH, predominantemente o tipo hiperativoimpulsivo, e TDAH, tipo combinado, são diagnosticados com maior frequência no sexo masculino. As manifestações clínicas do TDAH podem sofrer alterações com a idade. Os sintomas podem variar de agitação psicomotora e comportamento agressivo e disruptivo, que são comuns em crianças na fase pré-escolar, até sintomas desordenados, distraídos e com falta de atenção, que são mais típicos no final da adolescência e na fase adulta. Em geral, o TDAH é difícil de ser diagnosticado em crianças na fase pré- escolar porque a distratibilidade e a falta de atenção podem ser consideradas normais do desenvolvimento durante esse período. DIAGNÓSTICO Entrevista Clínica e Histórico: A entrevista clínica permite que se chegue a uma compreensão abrangente de como os sintomas se encaixam nos critérios de diagnóstico para o TDAH. Durante a entrevista, o médico deve coletar as informações relacionadas ao histórico dos problemas em questão, ao desenvolvimento e saúde geral da criança e ao histórico social e familiar. A entrevista deve focar os fatores que possam afetar o desenvolvimento ou a integridade do sistema nervoso central ou revelar uma doença crônica, deficiências sensoriais ou uso de medicamentos que possam afetar o aspecto funcional da criança. Os fatores sociais disruptivos, tais como discórdia familiar, estresse situacional e abuso ou negligência, podem resultar em comportamentos hiperativos ou ansiedade. Um histórico familiar de parentes de primeiro grau com TDAH, transtornos de humor ou de ansiedade, dificuldade de aprendizagem, transtorno antissocial ou abuso de drogas ou álcool pode indicar um risco elevado de TDAH e/ou de condições comórbidas. Escalas de Classificação Comportamental: As escalas de classificação comportamental são úteis para se estabelecer a magnitude e abrangência dos sintomas, mas sozinhas não são suficientes para se chegar a um diagnóstico de TDAH. Há uma gama de escalas de classificação comportamental bem estabelecidas que atingiu bons resultados para discriminar entre crianças com TDAH e indivíduos controle. Essas avaliações incluem, mas não se limitam, às Escalas de Classificação de Diagnóstico de TDAH de Vanderbilt; Escalas de Classificação de Conner (pais e professores); Índice de TDAH; a Checklist de Swanson, Nolan e Pelham (SNAP); e a ADD-H: Escala de Classificação Abrangente de Professores (ACTeRS). Outras checklists de cobertura mais ampla, tais como a Checklist de Comportamento Infantil de Achenbach (CBCL) ou a Escala de Avaliação Comportamental para Crianças (BASC), são úteis, especialmente em casos em que a criança pode estar sofrendo com problemas concomitantes em outras áreas (ansiedade, depressão, problemas de conduta). Exame Físico e Achados Laboratoriais: Não há testes laboratoriais padronizados disponíveis para identificar o TDAH em crianças. A presença de hipertensão, ataxia ou um distúrbio da tireoide deve alertar para mais exames de diagnóstico. Deficiências no movimento motor fino e má coordenação, e outros sinais neurológicos motores sutis (dificuldade ao bater os dedos, com movimentos de alternância, na prova dedo-nariz, para traçar um labirinto, para cortar papel), são comuns, mas não são suficientemente específicos para se chegar a um diagnóstico de TDAH. O médico deve considerar o exame para níveis elevados de chumbo em crianças que apresentam alguns ou todos os critérios de diagnóstico, caso essas crianças tenham sido expostas a fatores ambientais que possam ter contribuído a esse risco (moradia precária, tinta antiga nas paredes, proximidade a rodovias que levaram ao depósito de chumbo na superfície dos escapamentos de automóveis nos anos anteriores). O comportamento no ambiente laboratorial estruturado não irá necessariamente refletir o comportamento típico da criança no ambiente escolar ou doméstico. Portanto, depender apenas no comportamento observado em um ambiente médico pode resultar em um diagnóstico incorreto. Testes computadorizados de atenção e avaliações eletroencefalográficas não são necessários para fazer o diagnóstico. No entanto, a FDA aprovou o sistema de Auxílio de Avaliação Neuropsiquiátrica Baseada no EEG, capaz de identificar uma onda teta anormal: relação da onda beta associada ao TDAH. Diagnóstico Diferencial: Doenças crônicas, tais como cefaleias, enxaqueca, crises convulsivas de ausência, asma e alergias, distúrbios hematológicos, diabetes, câncer infantil, afetam até 20% das crianças nos Estados Unidos e podem comprometer a atenção e o desempenho escolar da criança, tanto devido à própria doença ou por causa dos medicamentos usados para tratar ou controlar a doença subjacente. Os movimentos periódicos das pernas causados pela síndrome das pernas inquietas estão associados aos sintomas de atenção, e o questionamento em relação a isso deve ser feito durante o levantamento do histórico. Distúrbios comportamentais e emocionais também podem gerar padrões de transtornos do sono. A depressão e os transtornos de ansiedade podem causar muitos dos mesmos sintomas do TDAH (falta de atenção, agitação, incapacidade de focar e se concentrar no trabalho, desorganização, esquecimento), como podem também se tratar de condições comórbidas. O transtorno obsessivo-compulsivo pode imitar o TDAH, especialmente quando os pensamentos recorrentes e persistentes, impulsos ou imagens se tornam intrusivas, interferindo nas atividades diárias normais. Os transtornos de adaptação secundários aos principais estresses da vida (morte de um familiar próximo, divórcio dos pais, violência doméstica, abuso de drogas dos pais e, um trauma comovente partilhado socialmente, tais como atentados com bombas e outros ataques) ou transtornos na relação de pais e filhos envolvendo conflitos quanto à disciplina, abuso infantil explícito e/ou abandono, ou superproteção podem resultar em sintomas similares aos do TDAH. Embora, acredite-se que o TDAH seja o resultado de uma deficiência primária de atenção, controle do impulso e atividade motora, ocorre uma prevalência elevada de comorbidade com outros transtornos neuropsiquiátricos. Dos casos de crianças com TDAH, 15-25% sofrem com dificuldades de aprendizagem, 30-35% têm transtornos no desenvolvimento da fala, 15-20% foram diagnosticadas com transtornos de humor e 20-25% apresentam transtornos coexistentes de ansiedade. Crianças com TDAH podem também manifestar diagnósticos concomitantes de transtornos do sono, de memória e capacidades motoras reduzidas. TRATAMENTO Tratamentos Psicossociais: Assim que o diagnóstico de TDAH for confirmado, o médico deve dialogar com os pais e a criança para mostrar de que forma o TDAH pode afetar o aprendizado, o comportamento, a autoestima, as competências sociais e as funções familiares. O médico deve estabelecer objetivos para que a família ajude a melhorar as relações interpessoais da criança, desenvolver técnicas de estudo e diminuir os comportamentos disruptivos. Os grupos de apoio aos pais, com consulta profissional apropriada para taisfinalidades, podem ser muito úteis. Tratamentos de Orientação Comportamental: Os tratamentos voltados para o manejo comportamental transcorrem com frequência no período de 8-12 sessões. O objetivo de tal tratamento serve para que o médico identifique os comportamentos específicos que desencadeiam o transtorno na vida da criança (comportamento disruptivos, dificuldade em concluir a lição de casa, incapacidade de obedecer a regras em casa e na escola), e para que a criança consiga desempenhar de forma progressiva e melhorar suas habilidades nessas áreas. O médico deve orientar os pais e professores para que apliquem regras, consequências e recompensas que estimulem os comportamentos desejados. Medicamentos: Os medicamentos mais utilizados para o tratamento de TDAH e o tratamento de escolha são os agonistas dopaminérgicos pré-sinápticos, normalmente conhecidos como medicamentos psicoestimulantes, incluindo metilfenidato (Ritalina, Concerta, Metadate, Focalin, Daytrana), anfetamina e/ou várias fórmulas com anfetamina e dextroanfetamina (Dexedrina, Adderall, Vyvanse). Ao longo das primeiras 4 semanas de tratamento, o médico deve aumentar a dose do medicamento ao nível tolerável (mantendo os efeitos colaterais no mínimo ou ausentes) para obter a maior benefício possível. Caso essa estratégia não alcance resultados satisfatórios, ou se os efeitos colaterais não permitirem maiores ajustes da dosagem na presença de sintomas persistentes, o médico deve recorrer uma classe de estimulantes alternativos que não tenha sido usada previamente. Caso o composto com metilfenidato não tenha obtido êxito, o médico deve mudar para a anfetamina. Se não conseguir obter resultados satisfatórios no tratamento com o segundo estimulante, os médicos podem optar por prescrever atomoxetina, um inibidor de receptação não adrenérgico que é superior ao placebo no tratamento do TDAH em crianças, adolescentes e adultos e que foi aprovado pela FDA para essa indicação. A atomoxetina deve ser iniciada na dosagem de 0,3 mg/kg/dia e titulada durante 1-3 semanas para a dosagem total máxima de 1,2-1,8 mg/kg/dia. A dose deve ser dividida em duas porções diárias. A dosagem diária única parece estar associada à alta incidência de fracasso no tratamento. A guanfacina, desenvolvida originalmente como um agente anti-hipertensivo, foi também aprovada pela FDA para o tratamento do TDAH, embora não tenha demonstrado muito êxito em caso de hiperatividade e ajudado melhor com a impulsividade. Serve também para tratar tiques motores e vocais e, portanto, pode ser uma opção razoável para crianças com um transtorno de tique comórbido. Quando os médicos prescrevem medicamentos para o tratamento de TDAH, tendem a usar doses abaixo do ideal. O tratamento ideal geralmente requer doses relativamente mais elevadas do que as tipicamente prescritas em cenários da prática normal de rotina. Somente o medicamento nem sempre será suficiente para tratar o TDAH em crianças, especialmente em situações em que as crianças apresentam múltiplos transtornos psiquiátricos ou sofrem com ambientes domésticos estressantes. Quando as crianças não reagem ao medicamento, talvez se torne necessário encaminhá-las a um especialista em saúde mental. A consulta com um psiquiatra ou psicólogo infantil pode também ser benéfica para determinar os próximos passos que devem ser tomados para o tratamento, incluindo acrescentar outros componentes e apoio ao programa geral do tratamento. Evidências sugerem que crianças que receberam manejo medicamentoso minucioso, com acompanhamento frequente do tratamento, todas dentro de um contexto educativo, relacionamento de apoio com os provedores de cuidados primários, são propensas a passar por experiência comportamental positiva em até 24 meses. Os estimulantes usados para tratar o TDAH podem estar associados ao risco elevado de eventos cardiovasculares adversos, incluindo morte cardíaca súbita, infarto do miocárdio e acidente vascular cerebral em jovens adultos e raramente em crianças. Crianças com histórico familiar pessoal ou positivo de cardiomiopatia, ou arritmias, ou síncope requerem um eletrocardiograma e possivelmente consulta cardiológica antes de prescrever um estimulante. PROGNÓSTICO Um diagnóstico infantil de TDAH geralmente leva à persistência do TDAH pelo resto da vida. Sessenta a oitenta por cento das crianças com TDAH continuam com os sintomas na adolescência, e até 60% dos adolescentes carregam os sintomas de TDAH para a fase adulta. Em crianças com TDAH, uma queda do comportamento hiperativo geralmente ocorre com a idade. Outros sintomas associados ao TDAH podem se tornar mais proeminentes com a idade, tais como falta de atenção, impulsividade e desorganização, e isso precisamente acarretará em um fardo enorme no desenvolvimento de jovens adultos. Uma variedade de fatores de risco pode afetar as crianças com TDAH não tratadas, à medida que se tornam adultas. Entre esses fatores de risco incluem o envolvimento em comportamentos inconsequentes de risco (atividade sexual, comportamentos delinquentes, abuso de drogas), insucesso educacional, dificuldades de emprego e relacionamentos interpessoais problemáticos. Com o tratamento adequado, os riscos associados ao transtorno podem ser reduzidos de forma significativa. Prevenção A capacitação dos pais pode ajudar a melhorar de forma significativa as crianças com sintomas de TDAH em idade pré-escolar, e o treinamento dos pais para orientar os jovens com TDAH ajuda a reduzir o comportamento de oposição. Na medida em que os pais, professores, médicos e elaboradores de políticas públicas aumentam seus esforços para se chegar a uma detecção precoce, diagnóstico e tratamento, a profilaxia contra os efeitos adversos do TDAH em longo prazo nas vidas das crianças deve ser reconsiderada à luz da prevenção. Dislexia É definida como uma dificuldade inesperada na leitura, isto é, inesperada em relação à inteligência, à idade cronológica/nível escolar, à educação ou ao status profissional. Em leitores típicos, o desenvolvimento da leitura e o QI são dinamicamente ligados ao longo do tempo, mas nos leitores disléxicos há um desajuste de desenvolvimento entre a leitura e o QI. ETIOLOGIA E PATOGÊNESE A dislexia pode ser familiar ou hereditária. É observada em 50% das crianças que têm um dos pais com dislexia; 50% dos irmãos de pessoas disléxicas; e 50% dos pais de disléxicos. A dislexia reflete um modelo multifatorial da interação de fatores genéticos com fatores ambientais. Vários genes podem influenciar o distúrbio, com cada gene contribuindo de forma específica com uma pequena quantidade de variância e com um único fator etiológico insuficiente para causar ou explicar a dislexia. As evidências provenientes de uma série de linhas de investigação indicam que a dislexia reflete déficits dentro do sistema de linguagem e, mais especificamente, dentro do componente fonológico do sistema de linguagem envolvido no processamento dos sons da fala. Os indivíduos disléxicos têm dificuldade para desenvolver uma consciência de que as palavras faladas podem ser segmentadas em unidades elementares de som menores (fonemas). Os exames de imagem funcional cerebral em crianças com dislexia e em leitores disléxicos adultos demonstram um funcionamento ineficiente dos sistemas cerebrais posteriores do hemisfério esquerdo, um padrão denominado de assinatura neural da dislexia. No entanto, embora a ressonância magnética funcional demonstrar diferenças entre grupos de disléxicos em comparação com leitores típicos, os exames de imagem do cérebro não conseguem diferenciar um caso específico de leitor disléxico de um leitor típico e, assim, exames de imagem do cérebro não são úteis no diagnósticoda dislexia. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Refletindo a fraqueza fonológica subjacente, crianças e adultos com dislexia exibem problemas tanto na linguagem falada quanto na escrita. As dificuldades na linguagem falada se manifestam tipicamente por erros de pronúncia, falta de loquacidade, fala que carece de fluência, com muitas pausas ou hesitações e “hums”, dificuldade em achar palavras, tendo a necessidade de tempo para evocar uma resposta oral e a incapacidade de produzir rapidamente uma resposta verbal quando questionado; isso reflete dificuldades baseadas no som, e não baseadas na semântica ou no conhecimento. A compreensão auditiva normalmente é eficaz. As crianças mais velhas apresentam melhora na precisão da leitura ao longo do tempo, embora sem ganhos comensuráveis na fluência de leitura; elas continuam a ser leitores lentos. As dificuldades de soletração refletem, de forma típica, as dificuldades fonológicas observadas na leitura oral. A caligrafia costuma ser afetada também. A história geralmente revela dificuldades precoces sutis de linguagem nas crianças disléxicas. Durante os anos de pré-escolar e jardim de infância, as crianças com risco apresentam dificuldades com jogos de rima e no aprendizado dos nomes das letras e números. Avaliações durante o jardim de infância dessas competências linguísticas podem ajudar a identificar crianças com risco de dislexia. A dislexia pode ocorrer simultânea com o déficit de atenção/transtorno de hiperatividade. DIAGNÓSTICO A dislexia é um diagnóstico clínico e a anamnese é especialmente crucial. O médico busca determinar através da anamnese, observação e avaliação psicométrica, se existem dificuldades inesperadas na leitura (com base na inteligência da pessoa, nível cronológico de escolaridade, nível de educação ou status profissional) e problemas de linguagem associados ao nível do processamento fonológico. Não há um teste único que seja patognomônico da dislexia. O diagnóstico da dislexia deve refletir uma síntese cuidadosa de todos os dados clínicos disponíveis. História familiar, observação do professor na sala de aula e testes de linguagem (especialmente de fonologia) e de leitura, incluindo fluência e soletração, representam uma avaliação muito importante para o diagnóstico de dislexia em crianças; testes adicionais de capacidade intelectual, atenção, memória, competências linguísticas gerais e matemática podem ser administrados como parte de uma avaliação mais abrangente das funções cognitiva, linguística e acadêmica. Uma vez que o diagnóstico tenha sido feito, a dislexia é um diagnóstico permanente e não precisa ser reconfirmado por novas avaliações. Para uma triagem informal, além de um histórico cuidadoso, o clínico geral, durante o atendimento em consultório, pode ouvir a criança ler em voz alta de seu próprio livro escolar de leitura, correspondente ao seu nível escolar. O sinal mais consistente e revelador de uma deficiência de leitura em um jovem adulto proficiente é a leitura e escrita lentas e laboriosas. Ao tentar ler em voz alta, a maioria das crianças e adultos com dislexia apresenta uma abordagem trabalhosa ao decodificar e reconhecer palavras isoladas, uma abordagem que em crianças se caracteriza por hesitações, erros de pronúncia e repetidas tentativas para pronunciar palavras desconhecidas. Em contraste com as dificuldades que vivenciam na decodificação de palavras isoladas, as pessoas com dislexia geralmente possuem o vocabulário, a sintaxe e outras habilidades de nível superior envolvidas na compreensão. Testes que dependem apenas da precisão da identificação de palavras são inadequados para o uso no diagnóstico da dislexia porque mostram pouco ou nada de sua dificuldade para ler. Os testes mais importantes são aqueles que são cronometrados; eles são os mais sensíveis na detecção da dislexia em um adulto inteligente. O útil Teste de Eficiência de Leitura de Palavras examina a leitura de palavras simples em condições cronometradas. TRATAMENTO O tratamento da dislexia exige uma perspectiva de curso de vida. Logo no início, o foco está na correção do problema de leitura. À medida que a criança amadurece e entra no contexto da escola secundária, a qual demanda cada vez mais tempo, a ênfase muda para o importante papel de se fornecer adaptações. São identificados métodos e programas de intervenção em leitura com base em evidências. Programas eficazes de intervenção fornecem instrução sistemática em 5 áreas chave: consciência fonêmica, instrução fônica, fluência, vocabulário e estratégias de compreensão. Estes programas também oferecem amplas oportunidades para escrever, ler e discutir literatura. Ao abordar cada um dos componentes do processo de leitura por vez, as intervenções eficazes melhoram a consciência fonêmica: a capacidade de se concentrar e manipular os fonemas (sons da fala) em sílabas e palavras faladas. Os programas eficazes de intervenção incluem o ensino pela abordagem fônica, ou certificar-se de que o leitor iniciante compreende como as letras estão ligadas aos sons (fonemas) para formar as correspondências letra- som e padrões de ortografia. As intervenções para o desenvolvimento do vocabulário e compreensão de leitura não estão bem estabelecidas. Os métodos mais eficazes de ensino da compreensão de leitura envolvem o ensino de vocabulário e estratégias que estimulem a interação ativa entre o leitor e o texto. Novos conhecimentos científicos indicam que não é apenas o conhecimento de conteúdo do professor, mas a habilidade deste em envolver o aluno e em concentrar a atenção do aluno na tarefa de leitura que é necessária para a instrução eficaz. Muitos alunos adolescentes e adultos conseguem melhorar sua precisão de leitura, mas sem ganhos comensuráveis na velocidade de leitura. A possibilidade de oferecer tempo extra concilia a frequente capacidade cognitiva alta do indivíduo e a leitura lenta, de modo que o teste é uma medida da capacidade dessa pessoa, e não de sua deficiência. Outra acomodação importante é ensinar o aluno disléxico a ouvir os textos. Programas como o Kurzweil, WYNN, Learning Ally e Bookshare estão disponíveis, assim como programas como Dragon Dictate que fornecem conversão de voz para texto. Outras acomodações úteis incluem o uso de computadores portáteis com verificadores ortográficos, acesso a notas de aula, serviços de tutoria, e uma sala tranquila, em separado, para a realização de testes. Além disso, o impacto da deficiência fonológica primária exige atenção especial durante provas orais, de modo que os alunos não sejam avaliados por sua falta de loquacidade ou hesitações de fala, mas por seu conhecimento do conteúdo. Infelizmente, as hesitações na fala ou as dificuldades na identificação de palavras são, muitas vezes, indevidamente confundidas com o conhecimento inadequado do conteúdo. PROGNÓSTICO A aplicação de métodos baseados em evidências para crianças pequenas (do jardim de infância à 3ª série), quando estes são fornecidos com uma intensidade e duração suficientes, pode resultar em melhorias na precisão de leitura e, em uma medida muito menor, na fluência. Em crianças mais velhas e adultos, as intervenções resultam em maior precisão, mas não em um progresso perceptível na fluência.