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1 ANA LÚCIA OLEGÁRIO SARAIVA A FORMAÇÃO PROFISSIONAL DO GUIA DE TURISMO: oportunidades de inovação no âmbito dos planos de cursos técnicos no Brasil Balneário Camboriú 2017 2 ANA LÚCIA OLEGÁRIO SARAIVA A FORMAÇÃO PROFISSIONAL DO GUIA DE TURISMO: oportunidades de inovação no âmbito dos planos de cursos técnicos no Brasil Tese apresentada ao colegiado do PPGTH como requisito parcial à obtenção do grau de Doutor em Turismo e Hotelaria – Área de concentração: Planejamento e Gestão do Turismo e da Hotelaria – (Linha de pesquisa: Educação Turística) Orientador: Prof. Dr. Francisco Antônio dos Anjos Co-orientadora: Prof.ª Dr.ª Yára Christina Cesário Pereira Balneário Camboriú 2017 UNIVALI UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ Vice-Reitoria de Pós-Graduação, Pesquisa, Extensão e Cultura Programa de Pós-Graduação em Turismo e Hotelaria - PPGTH Curso de Doutorado em Turismo e Hotelaria 3 4 DEDICATÓRIA Aos meus pais, Clodoaldo e Teresinha, que sempre me incentivaram na busca pelo conhecimento. Ao meu filho Klaus, que com seu amor me faz sorrir diante dos obstáculos. 5 AGRADECIMENTOS A realização desta tese de doutorado, contou com importantes e imprescindíveis apoios e incentivos. Ao meu orientador, Prof. Dr. Francisco Antônio dos Anjos e co-orientadora: Prof.ª Dr.ª Yára Christina Cesário Pereira, pela disponibilidade, atenção dispensada, dedicação e profissionalismo. Aos demais membros do corpo docente e técnico administrativo da Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI), em especial, aos colaboradores do programa de Programa de Pós-Graduação em Turismo e Hotelaria que estiveram presentes e contribuíram para com a minha jornada. Aos professores membros das bancas de qualificação e defesa de tese Prof. Dr. Paulo dos Santos Pires; Prof. Dr. Mário Carlos Beni; Prof.ª Dr.ª Dóris van de Meene Ruschmann, Prof. Dr. Luiz Antônio Gloger Maroneze e Prof. Dr. Luís Miguel Brito. À Coordenação de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e ao Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul (IFRS), que me permitiram a dedicação aos estudos em tempo integral. A todos participantes da pesquisa, às Instituições de Ensino públicas e privadas, aos profissionais e docentes que colaboraram no desenvolvimento da Tese. Aos profissionais revisores e formatadores, que com muita dedicação e responsabilidade auxiliaram na organização do trabalho. Finalmente, dirijo um agradecimento especial a minha família, em particular, aos meus pais, pelo modelo de profissionais educadores, aos meus irmãos, meu filho Klaus e amigos, pelo apoio incondicional durante este processo de construção do estudo. 6 No momento em que se enfrenta o futuro é necessário estar aberto ao incerto, ao inesperado. É necessário estar sensível às minúcias, às surpresas escondidas por trás de cada acontecimento; é preciso estar preparado para repensar constantemente a forma de estar do mundo e no mundo. (Francesco Morace, 2013). 7 RESUMO O Estudo da formação do profissional do Guia de Turismo tem sido um assunto amplo e complexo para as organizações empresariais e educacionais que requerem inovação, criatividade e qualidade. A reformulação curricular nos cursos técnicos de Guia de Turismo, recriando os saberes constituídos, requerem competências inovadoras. O presente estudo busca problematizar como tornar o curso técnico de Guia de Turismo determinante da competência profissional na contemporaneidade. Neste sentido, o objetivo geral do estudo é desenvolver uma proposta de desenho curricular para os planos dos cursos técnicos de Guia de Turismo, para subsidiar as Instituições de Ensino Técnico no Brasil. A trajetória metodológica do estudo tem características de uma pesquisa qualitativa, de natureza aplicada, conforme os objetivos, é exploratória e descritiva. A delimitação amostral como Estudo de Casos Múltiplos foi apropriada para a pesquisa, de natureza científica, de dez Instituições de Ensino escolhidas no Brasil, que ofertam cursos Técnicos de Guia de Turismo. Foram analisadas diversas legislações na área da Educação e do Turismo que regem a oferta dos referidos cursos, identificados os múltiplos papéis e a atuação profissional do Guia de Turismo. Foram mapeadas as competências e as estruturas das matrizes curriculares dos planos de cursos técnicos eleitos para a pesquisa. O fenômeno em estudo encontrou respaldo na Análise Textual Discursiva para a análise dos planos de curso selecionados, bem como da legislação, normas e regras pertinentes. Para validar o estudo, aplicou-se um questionário com professores e especialistas no Turismo que subsidiaram a elaboração de uma proposta de redesenho curricular articulando os conhecimentos acadêmicos e os saberes relativos ao mercado profissional. Considerada como inovadora e de vanguarda, caracterizando-se como o primeiro estudo, no Brasil, para as Instituições de Ensino Técnico no Turismo. Palavras-chave: Formação do Guia de Turismo. Planos de curso. Competências. Desenho curricular. 8 ABSTRACT The study of Tour Guide professional formation has been a wide and complex subject to entrepreneur and educational organizations that needs innovation, creativity and quality. The guideline reformulation in Tour Guide technique courses, remaking the composed knowledges, apply for innovative competences. This study aims to ask how to become Tour Guide technician course as determinant of professional competence nowadays. So, the general objective is to develop a guideline frame proposal to Tour Guide technique courses plans, to help the Technique Teaching Institutions in Brazil. The study methodologic way has qualitative research characteristics, with applied nature, according to the objective, it is exploratory and described. The sample delimitation as Multiple Cases Study was appropriated for the research, with scientific nature, from ten Teaching Institution chosen in Brazil, that offers Guide Tourist Technique courses. It was analyzed many legislations in Education and Tourism areas which rule the offer of the referred courses, it was identified the Tour Guide multiple roles and professional actuation. It was mapped the competences and the structures of curricular source from technique courses plan elected for the research. The phenomenon in study found support in Discursive Textual Analyze to analyze the plans of the selected courses, as well as the legislation and pertinent norms and rules. To validate the study, it was applied a questionary with the Tourism teachers and specialists who helped in the elaboration of a proposal and curriculum design joining the academic knowledge and learning related to professional market. Considered as innovative and forefront, it was characterized as the first study, in Brazil, for Tour Technique Teaching Institutions. Key-Words: Tour Guide Formation. Courses Plans. Competences. Curricular Design. 9 LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Construto do perfil do GT 55 Figura 2 - Estrutura dos cursos da EPTNM 115 Figura 3 - Distribuição de matrículas por Estado 121 Figura 4 – Competências como fonte de valor para os indivíduos e para as organizações. 137 Figura 5 – Estrutura de valores 138 Figura 6 - Análise Textual Discursiva 164 Figura 7 - Etapas da Pesquisa 165 Figura 8 – Design da pesquisa 168 Figura 9 - Constructo dos Componentes Curriculares das IE 208 Figura 10 - Múltiplos papéis do GT na contemporaneidade 226 Figura 11– Competências para o GT contemporâneo 227 Figura 12 – Habilitações de GT no Brasil 229 Figura 13 – Conhecimentos necessários para um desenho curricular do curso de GT 230 Figura 14 – Componentes Curriculares para uma formação do GT 231 Figura 15 – Design Curricular proposto para o curso técnico de GT – Regional 232 Gráfico 1 - Oferta de cursos de GT no Brasil 118 Gráfico 2 - Oferta de cursos GT por tipo de IE 119 Gráfico 3 - Oferta de cursos de GT por região 119 Gráfico 4 - Alunos matriculados por tipo de IE 120 Gráfico 5 - Avaliação da proposta por especialistas 237 10 LISTA DE QUADROS Quadro 1 - Os papéis do GT 54 Quadro 2 - Principais componentes dos papéis do GT 56 Quadro 3 - Papéis atribuídos ao GT baseado no Turismo de Natureza 59 Quadro 4 - As três esferas principais e os papéis de um GT contemporâneo 61 Quadro 5 - Tipologias de GT 63 Quadro 6 - Representação da atividade do GT no Brasil 64 Quadro 7 - GT com registro no CADASTUR 83 Quadro 8 - Sindicatos de GT 86 Quadro 9 – Educação no Brasil até a década de 90 91 Quadro 10 – EP no Brasil, a partir da década de 90 96 Quadro 11 - Eixos Tecnológicos 110 Quadro 12 - Cursos Técnicos ofertados no ET Turismo, Hospitalidade e Lazer 113 Quadro 13 - Curso Técnico em GT 123 Quadro 14 - Certificação intermediária, formação continuada e verticalização 123 Quadro 15 - Disciplinas básicas/CH de acordo com a DN 427/2001 132 Quadro 16 - Competências do GT 140 Quadro 17 - Competências, habilidades e bases tecnológicas do GT 146 Quadro 18 - Perfil ocupacional do GT e competências 148 Quadro 19 - Corpus da pesquisa – planos de cursos das IE 171 Quadro 20 - Perfil do GT no CNCT – 2014 e 2012 174 Quadro 21 - Competências do GT: IE “A–1” 178 Quadro 22 – Competências do GT: IE “B–1” 179 Quadro 23 – Competências do GT: IE “C–1” 180 Quadro 24 – Competências do GT: IE “D–2” 181 Quadro 25 – Competências do GT: IE “E–2” 181 Quadro 26 – Competências do GT: IE “F–2” 182 Quadro 27 – Competências do GT: IE “G–3” 183 Quadro 28 – Competências do GT: IE “H–4” 183 11 Quadro 29 – Competências do GT: IE “I-4” 184 Quadro 30 – Competências do GT: IE “J–4” 184 Quadro 31 - Análise contextualizada das orientações para elaboração das matrizes curriculares 188 Quadro 32 - Disciplinas básicas/CH de acordo com DN 427/2001 190 Quadro 33 – Matriz curricular – IE “A-1” 191 Quadro 34 – Matriz curricular – IE “B-1” 192 Quadro 35 – Matriz curricular – IE “C-1” 193 Quadro 36 – Matriz curricular – IE “C-1” 194 Quadro 37 – Matriz curricular – IE “E-2” 195 Quadro 38 – Matriz curricular - IE “F-2” 196 Quadro 39 – Matriz curricular – IE “G-3” 197 Quadro 40 – Matriz curricular – IE “H-4” 198 Quadro 41 – Matriz curricular – IE “I-4” 199 Quadro 42 – Matriz curricular – IE “J-4” 200 Quadro 43 – Bloco de Conhecimentos – Componentes Curriculares e carga horária correspondente 201 Quadro 44 – Proposta de Matriz Curricular – GT Regional 235 12 LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Oferta de cursos GT por tipo de IE nas regiões do Brasil 118 13 LISTA DE SIGLAS E ABREVIAÇÕES ABGTUR Associação Brasileira dos Guias de Turismo AGCTUR-LC Associação dos Guias de Turismo e Condutores Ambientais de Ubatuba, Litoral Norte e Cone Leste Paulista AGTB Associação dos Guias de Turismo de Bonito AGTUR Associação dos Guias de Turismo do Rio Grande AGTURB Associação de Guias de Turismo de Gramado AGUIATURS Associação Gaúcha dos Prestadores de Serviços de Guiamentos Turístico AGUITUR Associação dos Guias de Turismo de Balneário Camboriú e Vale do Itajaí Açu AS Aula Semana AP Aula Prática AT Aula Teórica ATD Análise Textual Discursiva BC Bloco de Conhecimentos BDTD Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações BID Banco Mundial e Interamericano de Desenvolvimento BIRD Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento CADASTUR Cadastro dos Prestadores de Serviços Turísticos CAPES Coordenação de Pessoal de Nível Superior CBO Classificação Brasileira de Ocupações CC Componente Curricular CEB Câmara da Educação Básica CEFAPIT Confederacion Espanhola de Federaciones y Asociasones Profesionales de Guía de Turismo CEFET´s Centros Federais de Educação Tecnológica CEPAL Comissão de Estudos Econômicos para a América Latina CH Carga Horária CHD Carga Horária da Disciplina 14 CHT Carga Horária Total CINTERFOR Centro Interamericano para o Desenvolvimento da Formação Profissional CNC Catálogo Nacional dos Cursos CNCT Catálogo Nacional de Cursos Técnicos CNE Conselho Nacional de Educação CNT Conselho Nacional do Turismo CNTA China National Tourism Administration CNTur Conselho Nacional de Turismo COMTUR Conselho Municipal de Turismo CONAC Comissão Executiva Nacional de Avaliação do Catálogo Nacional de Cursos Técnicos CONPEP Comitê Nacional de Políticas de Educação Profissional e Tecnológica DC Disciplina DCN Diretrizes Curriculares Nacionais DCN-EB Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica DCN-EM Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio DCN-EPTNM Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Profissional Técnica de Nível Médio DCN-NM Diretrizes Curriculares Nacionais Nível Médio DCN-TNM Diretrizes Curriculares Nacionais Técnico Nível Médio EaD Educação a Distância EB Educação Básica EJA Educação de Jovens e Adultos EM Ensino Médio EMBRATUR Empresa Brasileira de Turismo EP Educação Profissional EPT Educação Profissional Tecnológica EPTNM Educação Profissional Técnica de Nível Médio ET Eixo Tecnológico FENAGTUR Federação Nacional dos Guias de Turismo GT Grupo de Trabalho 15 GT Guia de Turismo HR Hora Relógio HSA Hora Sala de Aula IE Instituições de Ensino IFRS Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira INP Instituto e Novas Profissões ISLA Instituto Superior de Línguas e Administração LDBEN Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional MEC Ministério da Educação e Cultura MEI Microempreendedor Individual MTE Ministério do Trabalho e Emprego MTur Ministério do Turismo NE Norma Europeia OIT Organização Internacional do Trabalho OMT Organização Mundial de Turismo PNE Plano Nacional de Educação PNT Política Nacional de Turismo PPA Plano Pluri Anual PPI Projeto Pedagógico Institucional PPP Projetos Político-Pedagógicos PR Pré-Requisito PROEJA Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade PROEP Programa de Expansão da Educação Profissional PROFUNCIONÁRIO Programa de Formação Profissional em Serviço dos Funcionários da Educação PRONATEC Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego QUALIS Classificação da Produção Intelectual RBTUR Revista Brasileira de Pesquisa em Turismo REUNA Revista de Economia, Administração e Turismo 16 RFEPCT Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica RG Registro Geral SEBRAE Serviço de Apoio à Pequena e Média Empresa SENAC Serviço Nacional de Aprendizagem do Comércio SENAI Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial SENAR Serviço Nacional de Aprendizagem Rural SENAT Serviço Nacional de Aprendizagem de Transportes SESC Serviço Social do Comércio SESCOOP Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo SESI Serviço Social da Indústria SEST Serviço Social de Transporte SETEC Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica SGL Savannah Guides Ltd. SINDEGTUR/MA Sindicato Estadual dos Guias de Turismo do Maranhão SINDEGTUR/RS Sindicato Estadual dos Guias de Turismo do Rio Grande do Sul SINDEGTUR/SP Sindicato Estadual dos Guias de Turismo de São Paulo SINGTUR/AC Sindicato dos Guias de Turismo do AcreSINGTUR/AL Sindicato dos Guias de Turismo de Alagoas SINGTUR/AP Sindicato dos Guias de Turismo do Amapá SINGTUR/BA Sindicato dos Guias de Turismo da Bahia SINGTUR/COSTA OESTE Sindicato dos Guias de Turismo da Foz do Iguaçu - Paraná SINGTUR/ES Sindicato dos Guias de Turismo do Espirito Santo SINGTUR/EXTREMO SUL BAHIA Sindicato dos Guias de Turismo do Extremo Sul Bahia SINGTUR/MG Sindicato dos Guias de Turismo de Minas Gerais SINGTUR/MS Sindicato dos Guias de Turismo do Mato Grosso do Sul SINGTUR/MT Sindicato dos Guias de Turismo do Mato Grosso SINGTUR/PB Sindicato dos Guias de Turismo da Paraíba SINGTUR/PE Sindicato dos Guias de Turismo de Pernambuco 17 SINGTUR/PR Sindicato dos Guias de Turismo do Paraná SINGTUR/RN Sindicato dos Guias de Turismo do Rio Grande do Norte SINGTUR/SE Sindicato dos Guias de Turismo de Sergipe SISTEC Sistema Nacional de Informações da Educação Profissional e Tecnológica SISTUR Sistema de Turismo SM Semestral SN Semanal SNA Serviços Nacionais de Aprendizagem SNET Sistema Nacional de Educação Tecnológica TCU Tribunal de Contas da União TGS Teoria Geral de Sistemas UC Unidade Curricular UNEDs Unidades Descentralizadas de Ensino UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura UNIVALI Universidade do Vale do Itajaí UNWTO Word Tour Organization WFTGA World Federation of Tourist Guide Associations 18 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO 21 1.1 Definição do problema e pressupostos 21 1.2 Objetivos 25 1.2.1 Objetivo geral 25 1.2.2 Objetivos específicos 25 1.3 Relevância e oportunidade do estudo 26 1.4 Pesquisa bibliométrica 27 1.5 Organização do estudo 30 2 TURISMO E A ATIVIDADE DO GUIAMENTO NA CONTEMPORANEIDADE 32 2.1 Turismo e contemporaneidade 32 2.1.1 Guia de Turismo 40 2.1.1.1 Origem do guiamento 41 2.1.1.2 Os papéis do Guia de Turismo 52 2.1.1.3 Os múltiplos papéis do Guia de Turismo 55 2.1.1.3.1 O modelo de Cohen 55 2.1.1.3.2 O modelo de Weiler e Davis 58 2.1.1.3.3 Questões sobre os modelos 59 2.1.1.3.4 A alternativa de Weiler e Black 61 2.1.2 Os tipos de Guia de Turismo 62 2.1.3 Contextualizando a formação do Guia de Turismo 64 2.1.3.1 Cenário mundial 64 2.1.3.2 Cenário brasileiro 69 2.1.4 Entidades representativas dos Guias de Turismo 84 2.1.4.1 Associação Brasileira dos Guias de Turismo 85 2.1.4.2 Sindicatos 85 2.1.4.3 Federação Nacional dos Guias de Turismo (FENAGTUR) 86 2.1.4.4 World Federation of Tourist Guide Associations (WFTGA) 87 3 A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NO BRASIL 90 3.1 Percurso histórico 90 3.2 A orientação para estruturação dos cursos técnicos 103 3.2.1 Catálogo Nacional de cursos técnicos 106 19 3.2.2 Eixos Tecnológicos 109 3.2.3 Cursos ofertados a partir ET de Turismo, Hospitalidade e Lazer 111 3.3 Organização e planejamento dos cursos técnicos 114 3.4 O curso técnico em Guia de Turismo no Brasil 117 3.4.1 Cenário da oferta dos cursos de Guia de Turismo 118 3.4.2 A organização curricular do curso de Guia de Turismo 121 3.4.2.1 O currículo 124 3.4.2.2 Matriz curricular 130 3.4.2.3 Perfil, competências e habilidades 133 3.4.2.4 A formação geral e específica 149 4 PROCESSO DA INVESTIGAÇÃO 155 4.1 Abordagem sistêmica 156 4.2 Trajetória metodológica 158 4.2.1 Estudo de Casos Múltiplos 161 4.2.2 Análise Textual Discursiva 162 4.2.3 Etapas da pesquisa 164 4.2.4 Sujeitos da pesquisa 166 4.2.5 Coleta de dados 167 4.2.6 Design da pesquisa 167 5 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS 169 5.1 Procedimentos para análise do estudo 169 5.1.1 Análise do Corpus da pesquisa 170 5.1.2 Mapeamento das competências do Perfil do GT propostas pelos cursos 172 5.1.2.1 As Diretrizes Curriculares 172 5.1.2.2 O Catálogo Nacional 173 5.1.2.3 A Deliberação Normativa 174 5.1.2.4 As competências das Instituições de Ensino 177 5.1.2.5 Análise das competências 185 5.1.3 Mapeamento das matrizes curriculares dos cursos de GT 187 5.1.3.1 As Diretrizes Curriculares 189 5.1.3.2 O Catálogo Nacional 189 5.1.3.3 A Deliberação Normativa 190 20 5.1.3.4 As matrizes propostas pelas Instituições de Ensino 191 5.1.3.5 Análise das matrizes curriculares 205 5.2 Discussão dos resultados 210 6 A PROPOSTA DO DESENHO CURRICULAR 225 6.1 Validação da proposta 236 7 RECOMENDAÇÕES E CONSIDERAÇÕES FINAIS 241 7.1 Atendimento aos pressupostos 241 7.2 Limitações do estudo 245 7.3 Contribuições e inovações do estudo 246 7.4 Oportunidades de novas pesquisas 247 7.5 Considerações Finais 247 REFERÊNCIAS 249 APÊNDICE A - Cursos Técnicos ofertados na 1ª edição do CNCT no ET Turismo, Hospitalidade e Lazer 275 APÊNDICE B – Descrição dos Cursos Técnicos no ET Turismo, Hospitalidade e Lazer na 3ª edição do CNCT 277 APÊNDICE C – Instrumento de pesquisa 281 21 1 INTRODUÇÃO 1.1 Definição do problema e pressupostos O Estudo da formação1 do profissional Guia de Turismo (GT) tem sido um assunto amplo e de vanguarda para as organizações empresariais e educacionais que requerem inovação, criatividade e qualidade. Conforme Gesser (2013, p. 168), “[...] os desafios dizem respeito às mudanças e adaptações que vem sendo exigidas das pessoas e das organizações empresarias e educativas”. A educação no Turismo, para Trigo (2008, p. 12) encontra-se em um momento que se faz necessário, de forma urgente, “[...] rever conceitos, métodos e procedimentos para incrementar a qualidade e a competência de milhares de profissionais [...]. Todos precisam entender as mudanças profundas que a economia, a cultura e a política provam no mundo todo”. O mercado de trabalho globalizado está exigindo profissionais com competências inovadoras, que contemplem o perfil do GT, cujo aprimoramento é um desafio para as Instituições de Ensino (IE). As IE que, a cada dia, devem estar atentas para os processos de mudanças que envolvem não só a legislação e as demandas do mercado altamente competitivo, mas também os planos de cursos técnicos e os múltiplos papéis da atuação do profissional, contribuindo para o aperfeiçoamento do perfil dos profissionais GT. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), n.º 9.394/96 (BRASIL, 1996) preconiza no seu artigo 39 – “A educação profissional, integrada às diferentes formas de educação, ao trabalho, à ciência e à tecnologia, conduz ao permanente desenvolvimento de aptidões para a vida produtiva”. Souza e Silva (1997) comentam que a Educação Profissional (EP) redefine as novas exigências do sistema produtivo, profundamente, referenciadas pelo conhecimento científico e tecnológico dos agentes da produção – os gerentes e os trabalhadores. Em consonância com os fundamentos legais da LDBEN, a Meta 11 do Plano Nacional de Educação - PNE - (BRASIL, 2014a), prevê triplicar as matrículas da 1 O termo formação apresenta diversas interpretações para o senso comum, de acordo Dias Sobrinho (2007). Com relação ao mundo das atividades práticas e intelectuais, significa capacitação, treinamento, preparação de mão-de-obra, aquisição de conhecimentos disciplinares, graus escolares, etc. Já em termos escolares indica um processo de instrução formal a que alguém se submete e que culmina num diploma e no direito ao exercício de uma profissão. 22 Educação Profissional Técnica de Nível Médio (EPTNM), assegurando a qualidade da oferta e pelo menos 50% (cinquenta por cento) da expansão no segmento público (PNE 2014-2024), tendo como uma das principais estratégias previstas a seguinte deliberação: “estruturar o sistema nacional de informação profissional, articulando a oferta de formação das instituições especializadas em educação profissional aos dados do mercado de trabalho e as consultas promovidas em entidades empresariais e de trabalhadores” (BRASIL, 2014a, p. 71). No Brasil, a realizaçãode um curso de formação técnica de nível médio para o cadastramento como GT é condição fundamentada em legislação do Ministério do Turismo (MTur). Os requisitos e critérios para o exercício da atividade de GT são estabelecidos pelo Ministério do Turismo, pela Lei n.º 8.623/93, (BRASIL, 1993a), no Decreto n.º 946/93 (BRASIL, 1993b) e mais recentemente pela Portaria n.º 27, de 30 de janeiro de 2014 (BRASIL, 2014b). Atualmente, o curso de GT é considerado um curso da Educação Profissional Técnica de Nível Médio, constante no Catálogo Nacional de Cursos Técnicos (CNCT), no Eixo Tecnológico (ET) de Turismo, Hospitalidade e Lazer. As IE para elaboração dos planos de curso, devem orientar-se de forma especifica pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Profissional Técnica de Nível Médio (DCN-EPTNM/2012) (BRASIL, 2012a). Para Beni (2006) a atividade turística no setor de serviços exige altos índices de especialização, uma crescente modernização e uma apurada implementação tecnológica, pois enfrenta um mercado em expansão cada vez mais exigente. Enquanto atividade complexa, o Turismo engloba uma gama de serviços que viabilizam o atendimento do turista. Dentre os serviços turísticos, o GT é um importante profissional de relevância ímpar para atender os anseios do Turista que deseja um atendimento diferenciado e serviços de alta qualidade. As autoras Weiler e Black (2015), postulam que o Turismo está evoluindo de uma economia baseada no serviço para uma economia baseada na experiência. Ou seja, o Turismo está mais aproximado do Turista. Afirmam as autoras que os visitantes e os turistas são agora bem mais informados, possuem imagens diferenciadas de suas experiências e estão mais interessados, tendo altas expectativas de seus guias; e, como consequência, os GT são obrigados a buscar mais capacidade de transmitir informações e comunicações, desenvolvendo outras habilidades, para o desempenho de seus múltiplos papéis. 23 Segundo Morace (2009, p. 121), “para um número cada vez maior de pessoas viajar será, brevemente, a principal experiência, não só para diversão ou férias, mas acima de tudo para ampliar a própria experiência de vida”. De acordo com Gesser (2013) tanto a educação quanto o mundo contemporâneo estão passando por transformações estruturais significativas, decorrentes do avanço da ciência. E afirma “O processo histórico do desenvolvimento da ciência e da tecnologia universalizou as formas de vida do homem moderno, proporcionando-lhe situações objetivas de experiências, simultaneamente, universal e local” (2013, p. 161). Conforme Mota e Anjos (2012), essas mudanças atingem diretamente o setor de serviços, vasta e complexa teia de ofertas e redes que cobrem o planeta. Desta forma, a educação deve possibilitar a formação adequada e necessária de recursos humanos que atendam o mundo do trabalho, em especial no setor do Turismo, especificamente o GT. De acordo com Weiler e Black (2015), o mercado turístico espera por um GT que execute diversas funções e, muitos pesquisadores argumentam que a formação e a educação são cruciais para a aquisição de conhecimentos e competências. Partiu-se, assim, dos pressupostos, que têm forte conotação para a área que envolve os Guias de Turismo: a) A legislação que rege a oferta dos cursos técnicos atende de forma imprecisa às demandas dos múltiplos papéis do GT; b) os planos de cursos técnicos precisam inovar e reorganizar seus componentes curriculares, visando à sintonia com as necessidades da sociedade contemporânea; c) as competências do GT precisam ser focalizadas em valores para um saber fazer e um saber ser mais humano. O GT tem um papel importante no Trade do Turismo, devendo ter competências para o desenvolvimento do ser e do fazer mais humano. A reformulação curricular nos cursos técnicos de GT, recriando os saberes constituídos, requerem competências inovadoras. Neste contexto, o presente estudo busca problematizar: como tornar o curso técnico de GT determinante da excelência profissional na contemporaneidade? 24 Para responder a esse instigante questionamento, delineou-se o objetivo geral que consiste em desenvolver uma proposta de desenho curricular para os planos dos cursos técnicos de GT, subsidiando as instituições de ensino no Brasil. Recentemente, as mudanças no Turismo têm enfatizado que o GT tenha a capacidade de transmitir não só a informação factual, mas também desenvolver competências, tais como: a interpretação e a comunicação interculturais, a capacidade de contextualizar informações, a transmissão de emoções, a mediação entre a comunidade local, os visitantes, a sustentabilidade com o monitoramento e gerenciamento do comportamento dos visitantes. Weiler (2016) afirma que a adoção mais fortemente de um modelo de Turismo Sustentável, em muitas destinações, tem destacado a importância do GT, dentro do seu âmbito de atuação, em auxiliar os visitantes a compreender, a cuidar e valorizar a herança cultural e a natureza. Conforme Pires (2005) os visitantes devem ser preparados para a visita em ambientes naturais e com manifestações ou aspectos culturais dos espaços visitados. Também, a interpretação ambiental, a percepção e assimilação de conhecimentos influenciarão na formação de uma consciência ecológica. Brito (2011) afirma que os guias se relacionam com os turistas, com o patrimônio, com os estabelecimentos hoteleiros, de restauração e demais intervenientes do Turismo. A formação com competências dos recursos humanos pode ser usada como meio para alcançar resultados de garantia de qualidade, como o aumento de percepção e apreciação dos impactos positivos da atividade de guiamento, através da aplicação de normas mínimas de orientação (WEILER; BLACK, 2015). [...] As leis do mercado exigem competências técnicas, e as organizações são movidas por pessoas com experiências técnicas e comportamentos que geram um saber, e o saber conhecer; a ética é a dimensão que não pode ser dissociada do bloco de competências na formação do cidadão que se prepara para o mercado de trabalho, num mundo globalizado. (BRASIL, 2016, p. 131). Perrenoud (2000) considera que a competência serve para uma orientação dos planos e programas para as instituições e também aos coordenadores para avaliar os professores. Desde a década de 1960, autores já observaram a falta ou a necessidade de uma formação adequada para o GT, objetivando melhorar o desempenho, elevar os 25 padrões para o guiamento e avançar no profissionalismo da atividade. Weiler e Black (2015) citam os estudos de De Kadt (1979); Brockelman e Dearden (1990); Weiler e Davis (1993); Hughes (1994); Weiler, et al (1997); Ap e Wong (2001); Mason e Christie (2003) que também identificaram tal necessidade. Conforme Carvalho (2005 p. 251), “é no momento que nos aproximamos do significado de seu trabalho que se percebe que o guia tem sob sua responsabilidade muito mais que mostrar às pessoas aquilo que ainda não conhecem – é necessário que cuidem delas”. De acordo com Ap e Wong (2001) os Guias de Turismo, através do seu conhecimento e do entendimento das atrações culturais e naturais de um destino, e de suas habilidades de comunicação, têm privilégio de transformar as visitas dos turistas em experiências turísticas. Portanto, a atuação profissional do GT é sustentada pela trajetória de desenvolvimento da sua formação, que perpassa os caminhos que levam aos cursos técnicos. Há necessidade de se olhar para o futuro, buscando atender a sociedade contemporânea, surgida num contexto de globalização, de inovações tecnológicas, em que as formas de se “fazer” Turismo são reinventadas a cada dia. 1.2 Objetivos Por meio dos objetivos, indica-se a pretensão da pesquisa e os resultados que se busca alcançar. Para Marconi e Lakatos, as especificações dos objetivos deuma pesquisa respondem às questões “Por quê? Para quê? Para quem?” (2010, p. 141). 1.2.1 Objetivo geral Desenvolver uma proposta de desenho curricular para os planos dos cursos técnicos de Guia de Turismo, subsidiando as Instituições de Ensino no Brasil. 1.2.2 Objetivos específicos Analisar a legislação em Educação e em Turismo que rege a oferta dos cursos técnicos de GT; 26 Levantar os cursos técnicos de GT oferecidos pelas instituições de ensino técnico no Brasil; Identificar os múltiplos papéis e a atuação profissional do GT; Mapear as competências que contemplam o perfil do egresso proposto nos planos de cursos técnicos de GT; Verificar a estrutura das matrizes curriculares dos cursos técnicos de GT no Brasil. 1.3 Relevância e oportunidade do estudo A relevância e a oportunidade de um estudo sobre a formação do Guia de Turismo (GT) envolvem diversas possibilidades relacionadas ao seu papel, as suas competências, ao seu perfil, à regulamentação profissional. Nesta orientação, Weiler e Black (2015) afirmam que é necessário o desenvolvimento de níveis avançados no desempenho dos papéis do GT, que tem como base fundamental a sua formação. Em nível mundial, há diferentes maneiras de interpretar a necessidade de formação do GT. Há países que exigem a realização de cursos, como é o caso do Brasil. Outros solicitam que se realizem exames para recebimento de autorização para o guiamento. Ainda há casos em que um país apresenta regulamentações distintas em suas províncias, comunidades autônomas ou estados, como é o caso da Espanha. E, em outros, não há exigência alguma, em termos de formação. Mesmo na Comunidade Europeia, a profissão de GT é regulamentada de forma diferente em seus Estados-membros. Alguns não têm regulamento, outros prescrevem qualificações. Outros aceitam guias de outros Estados Membros, desde que tenha o título de "Guia de Turismo". Por outro lado, há Estados em que a atividade só pode ser exercida por aqueles com qualificações profissionais, tendo passado os exames exigidos do país a ser realizado o guiamento (FOSMAN, 2005). Nesse âmbito, o Turismo sem fronteiras leva à oferta de serviços com diferentes métodos de trabalho e também, sem métodos. Ou seja, com qualificações diferenciadas para o atendimento do turista contemporâneo. Muito se espera para avançar na área do guiamento, e, em momentos de crise econômica como está vivendo, a busca por melhores oportunidades na área do desenvolvimento do trabalho, e educacional no Turismo é constante. Se os cursos de GT postergarem o seu desenvolvimento, o caos gerado contribuirá para o atraso 27 das mudanças exigidas não só pela área, mas também pelo que espera a sociedade contemporânea. Neste sentido, aprofundar os estudos sobre a formação do GT no Brasil, Conforme Carvalho (2005), implica na busca pelo estabelecimento de um atendimento de qualidade diferenciada a passageiros/turistas/visitantes, que optaram por realizar suas viagens por variados motivos (lazer, negócios, aventura, etc.) acompanhados por um GT, não somente por que tenham dificuldades, mas porque têm chances maior de atingir seus objetivos na viagem. As IE precisam buscar alternativas para inovação da oferta formativa dos profissionais que atuam no Turismo, em especial, para os Guias de Turismo. A contribuição deste estudo está na possibilidade de discutir, de forma teórica, as questões relativas à formação profissional do GT, bem como as exigências legais que envolvem tanto a atividade como a oferta dos cursos de formação, com aprofundamento na realidade brasileira. Além disso, conhecer a realidade nacional sobre a oferta dos cursos de GT, em especial os planos de curso sob os quais os guias são formados, também se configurou como uma contribuição para a pesquisa em torno da Educação e Turismo. Para Cohen (1985) o GT, além de localizar caminhos, facilitar acessos, presta informações, orienta o turista em direção à percepção, a iluminação ou qualquer outro estado espiritual exaltado, ou seja, a experiência vivida. Carvalho (2005, p. 251) argumenta que “quando alguém viaja na companhia de um guia, e se torna seu passageiro, significa que escolheu aventurar-se no desconhecido com a proteção e orientação de um profissional [...] que dedica 24 horas do seu dia no cuidado com os outros”. 1.4 Pesquisa bibliométrica A pesquisa bibliométrica feita pela autora evidenciou que os estudos, em nível mundial sobre o objeto “Guia de Turismo” (GT), ainda é tímido, visto que há pequena produção científica disponível sobre o tema. Estudos sobre a conceituação, a construção de modelos, as teorias, ou a aplicação de métodos de outros campos vem sendo estudados, principalmente nos últimos 20 anos, o que tem contribuído para a formação e qualificação do GT, mesmo que ainda se encontre desafios. 28 O levantamento das fontes na literatura acadêmica internacional sobre o GT, ou seja, o Tour guide ou Tour guiding para a tese foi realizado considerando, principalmente, os estudos de Weiler e Black (2015), numa pesquisa que possibilitou ter uma visão geral sobre a produção acadêmica na temática nos últimos 50 anos2. De acordo com a pesquisa, os focos dos estudos estão concentrados na geografia humana; nos estudos ambientais; negócios, marketing e gestão; sociologia; antropologia; comunicação e estudos de linguagem, psicologia e educação ambiental. Interessante citar que há concentração de investigações originárias em alguns países: Austrália (um terço dos estudos); Estados Unidos e Reino Unido (em torno de 10%), Europa (outros) e China/Hong Kong/Taiwan. Tudo indica que esta concentração de pesquisas na Austrália está relacionado a importância do Turismo para e economia – na sua contribuição para o produto interno e para a geração de empregos. Conforme Weiler (2016) a Austrália é o país que mais tem acumulado pesquisas na área, tornando suas publicações relevantes para os estudiosos do GT. Do total dos trabalhos pesquisados, menos de dez trabalhos são de autoria de pesquisadores de outros países, como África, América Latina e América do Sul. Weiler e Black (2015), afirmam que é um grupo seleto de pesquisadores que realizam estudos sobre o GT, pois 40% dos artigos levantados são produzidos por 25 autores. Destacam-se entre os estudos realizados em nível mundial, as pesquisas de Holloway (1981); Cohen (1985); Weiler e Davis (1993); Pond (1993); Ap e Wong (2001); Weiler e Ham (2001); Black e Weiler (2005); Cruz (2008), Brito (2011); Wong e Lee (2012); Weiler e Black (2015) e Weiler (2016). Complementando a busca dos dados para o presente estudo, foi realizada uma pesquisa no período de 2014 a 20173, junto às bases de dados Science Diret e EBSCO host, acrescentando 13 artigos com a temática em estudo. 2 Weiler e Black (2015) realizaram a pesquisa usando fontes, como o Google Scholar, e as bases de dados de bibliotecas (CAB Abstracts e leisuretourism.com), procurando por artigos em língua inglesa, revisados por pares, em jornais e capítulos de livros focados em guias de turismo. Alguns trabalhos de conferência revisados por pares, livros didáticos, teses de nível de doutorado e outras publicações, como relatórios governamentais, foram identificados nas pesquisas e, se acessíveis, foram incluídos. Neste estudo, foram levantados 280 artigos, agrupados em temáticas, através de uma pesquisa de cunho teórico e de cunho empírico. 3 Pesquisada realizada pela autora na literatura acadêmica com o objetivo de complementar a pesquisa de Weiler e Black no período de 2014 a 2017. Foram procurados artigos em língua inglesa, 29 A produção científica brasileira foi realizada considerando as publicações dos programas de pós-graduação do Brasil, registrados na Classificação da Produção Intelectual/Coordenaçãode Pessoal de Nível Superior (Qualis/CAPES)4; as produções de teses de cursos de doutorado; e por fim, as dissertações de cursos de mestrado. A busca nos programas de pós-graduação do Brasil, registrados no Qualis/CAPES, estratificados como “A1, A2, B1 e/ou B2”, localizou quatro artigos que tratam especificamente do GT. Canani (1999) elaborou um dos primeiros estudos no Brasil, abordando o mérito da profissão. Nascimento; Silva e Grechi (2014) tratam da atuação do Guia, em um caso de estudo. Finalizando, dois artigos apresentam uma abordagem legal da profissão: Lohmann, et al (2009) e ainda, Zettermann e Vergara (2017). Na pesquisa realizada junto ao banco de dados da Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD) e no Banco de Teses e Dissertações da CAPES5, identificou-se três teses de doutorado. As teses são de autoria de Abreu (2015), que objetivou analisar a formação do profissional GT relativa ao Plano de Curso 2012 da Faculdade Senac Porto Alegre; a tese de Montes (2013), que procurou compreender como os guias mobilizam seus saberes e os recontextualizam na prática profissional e que significados associam a tais conhecimentos e a tese de Kosow (2015), que objetivou levar os alunos a desenvolverem a expressão escrita na língua espanhola por meio do uso consciente dos elementos constitutivos do gênero textual narrativa pessoal. Com relação às dissertações de mestrado, levantou-se 38 documentos no Banco de Teses e Dissertações da CAPES e no BDTD, dentre as quais oito se aproximam, de alguma maneira, da temática do estudo. revisados por pares, em jornais e capítulos de livros focados em guias de turismo. Os termos tour guide e tour guiding foram pesquisados nas bases de dados da EBSCO host e da Science Direct, no título, resumo e nas palavras-chave dos artigos. 4 Qualis é o conjunto de procedimentos utilizados no Brasil pela CAPES para estratificação da qualidade da produção intelectual dos programas de pós-graduação. São enquadrados em estratos indicativos da qualidade (A1, o mais elevado; A2; B1; B2; B3; B4; B5; C - com peso zero). Os periódicos brasileiros pesquisados em 20 de abril de 2017 foram: Revista Brasileira de Pesquisa em Turismo (RBTUR) (B1); Revista Turismo em Análise (B1); Revista Turismo: Visão e Ação (B1); Revista de Economia, Administração e Turismo (REUNA) (B2); Revista Acadêmica Observatório de Inovação do Turismo (B2); e Revista Hospitalidade (B2). 5 Levantamento realizado junto ao banco de dados da BDTD e do Banco de Teses e Dissertações da CAPES, em 7 de abril de 2017, utilizando-se da palavra chave “Guia de Turismo”, produzidas no Brasil. 30 Quanto à literatura específica, foram encontradas, obras didáticas, livros técnicos ou manuais escritos para auxiliar o GT na execução de suas atividades profissionais. Nestas obras, também foram encontrados relatos de experiências. Autores brasileiros, tais como: Carvalho (2003); Raposo (2004); Chimenti e Tavares (2007); Hintze (2007) e Campos e Cerpa (2010) são frequentemente citados nas obras em referência. Destacam-se os estudos de Carvalho (2005) que discute em especial, a formação do GT em sua produção. Livros que abordam conceptualizações, discussões, construção de teorias sobre o GT são poucos. Dentre as raras obras editadas com enfoque, para este estudo, destacam-se: Pond (1993); Pastorelli (2003); Weiler e Black (2003; 2015); Cruz (2008) e Brito (2011). Versando sobre a história do guiamento, destacam-se os estudos de Picazo (1996) e Oliveira e Cymbron (1994). Especificamente no Brasil sobre o tema, Carvalho (2005) e Chimenti e Tavares (2007) também corroboram no sentido da negligência na produção e qualificação do GT. 1.5 Organização do estudo O estudo está organizado em seis capítulos. O primeiro capítulo é a Introdução, onde são definidos: a pesquisa e apresentados os pressupostos, os objetivos geral e específicos, a relevância e a oportunidade do estudo, a pesquisa bibliométrica, além de apresentar a organização do trabalho. A fundamentação teórica é apresentada no segundo e terceiros capítulos. O segundo capítulo apresenta as características do Turismo na contemporaneidade, contextualizando a atividade de guiamento numa visão histórica, sua origem, as funções e as propostas contidas na literatura sobre os múltiplos papéis do Guia de Turismo (GT). Finalizando são apresentadas as tipologias numa visão global e a necessidade de formação do GT. O terceiro capítulo, também de fundamentação teórica, apresenta a evolução histórica da Educação Profissional no Brasil, enfocando, as diretrizes para organização e planejamento dos cursos técnicos. Discorre sobre o curso de GT no Brasil, o cenário da oferta, as orientações contidas nas normativas da Educação e do Turismo para organização do referido curso. E finalmente, há uma abordagem sobre as questões de organização curricular, contextualizando o currículo, a matriz 31 curricular, o perfil, e as competências, discutindo-se a formação geral e específica para o GT. O quarto capítulo apresenta o processo investigatório do estudo: a abordagem do estudo, a trajetória metodológica definida, contendo as etapas da pesquisa, o Estudo de Casos Múltiplos, a metodologia de análise dos dados, os sujeitos da pesquisa e a coleta de dados. No quinto capítulo, são apresentadas a análise e interpretação dos resultados da pesquisa, com os procedimentos para a análise, o mapeamento das competências do perfil dos Guias de Turismo e a estrutura das matrizes curriculares, identificadas nos sujeitos pesquisados. No sexto capítulo, é apresentada a proposta de desenho curricular para os cursos técnicos em GT e a sua validação por especialistas. No sétimo capítulo, são traçadas as considerações finais, os resultados e as recomendações resultantes da pesquisa, que se constituiu nas contribuições do estudo, assim como as limitações e as possibilidades de novos campos de pesquisa. 32 2 TURISMO E A ATIVIDADE DO GUIAMENTO NA CONTEMPORANEIDADE 2.1 Turismo e contemporaneidade O Turismo é um dos grandes fenômenos sociais do século XXI. Para Tomelin e Ruschmann (2013, p. 219), “o turismo caracteriza-se pelo deslocamento de pessoas para fora do seu ambiente no qual habitualmente vivem, em busca de recuperação psicofísica provocada pelas agitações da vida moderna”. Morace (2009, p. 122) afirma que “A viagem hoje é realmente a experiência mais importante nas aspirações e nos desejos das pessoas: dá sentido à experiência individual, familiar e de consumo, em que por sentido se entende direção, significado e gratificação emocional”. Tomelin e Ruschmann (2013 p. 225) consideram que o profissional do Turismo “[...] tem em suas mãos uma parcela da felicidade das pessoas, isto é, seus lazeres e suas férias, um tempo mágico, fora do local e das tarefas da existência habitual”. Porém, há um processo de mudanças em andamento, que afeta a vida do homem moderno. Compreender esse processo “[...] significa lançar luz às transformações e crises sociais decorrentes da dissolução da comunidade feudal e da emergência da sociedade capitalista sob diferentes matizes, quer no plano teórico, quer no plano político” (VALLE, 2013, p. 337). Para Ianini (2011) nesse transcurso, há uma mistura de sentimentos - do fascínio e do espanto, pois ao mesmo tempo em que o progresso é enaltecido pela ciência, ele traz em si a transitoriedade histórica que aponta para futuros incertos. São movimentos e contradições oriundos de uma totalidade emergente: a modernidade-mundo e sua sociedade global que “[...] constituem, movem, tensionam, integram e rompem as nações e as nacionalidades, os povos e as raças, as regiões eas línguas, as fronteiras e as cartografias, as culturas e as civilizações” (IANINI, 2011, p.276). E nessa direção, o desenvolvimento da ciência e da tecnologia vem universalizando as formas de vida do homem moderno, oportunizando-lhes situações objetivas de experiências, ao mesmo, global e local (GESSER, 2013). Neste sentido, a contemporaneidade instiga a uma reflexão: 33 [...] no trabalho, o profissional transforma seu mundo pela produção, e consumo de bens e tecnologias à disposição, num mercado que não é mais local, em que a globalização já ultrapassa as fronteiras do planeta e os meios de capital oferecem, a valores bilionários, a gestão de uma viagem interplanetária (BRASIL, 2016, p. 23). A autora em referência (ibid.) postula que num futuro não muito distante, as relações profissionais, a gestão das empresas, não serão mais pensadas como global, mas sim como “planetária”. Tomelin e Ruschmann (2013) explicam que o desenvolvimento de novas tecnologias da comunicação e da informação fomentaram as mudanças, que potencializam as condições de comunicação entre as pessoas e as organizações empresariais ou educativas, nos mais diversos setores do contexto global e local. Os ganhos que as novas tecnologias estão orientando são evidentes, atrativos, significativos e também desafiadores. Conforme Gesser (2013, p. 168), “[...] os desafios dizem respeito às mudanças e adaptações que vem sendo exigidas das pessoas e das organizações empresariais e educativas”. Ainda, nesse processo de mudanças, dentre as megatendências de consumo apresentadas por Morace (2009), destaca-se a de Consumo Arquetípico e a de Consumo como Memória Vital, em que o Turismo se insere como um dos resultados de novos comportamentos e estilos de vida. Na megatendência de Consumo Arquetípico, o Turismo está fundamentado sobre a qualidade dos lugares, as experiências locais excelentes, a enogastronomia como experiência de unicidade e a tipicidade como qualidade múltipla que atravessa diferentes dimensões (Turismo, vestuário, alimentação, dentre outras). Na megatendência do Consumo como Memória Vital, a revitalização do Turismo através da gestão sistemática da memória, a regeneração dos estilos do passado e a capacidade de contar através da memória estão diretamente ligadas à prospecção do Turismo. Morace (2013), explica que: Atualmente emerge uma aceleração inesperada de comportamentos hereges e ecléticos para além de qualquer intenção vanguardista, que consolidam uma visão criativa difundida na nova classe média em todo o mundo, não mais apenas nos nichos intelectuais e experimentais que, ao contrário, contradizem-se até desaparecer (MORACE, 2013, p. 67). Dentre as tendências previstas por Bhargava (2017), o Turismo aparece como uma alternativa para as pessoas desconectarem-se de suas redes sociais e telefones com o objetivo de proporcionar viagens para descansar e “desintoxicarem” 34 suas mentes sem a interrupção da tecnologia. Agências de viagens já estão percebendo esta oportunidade e estão lançando roteiros Digital Detox. De acordo com o autor em referência, a tendência de Desperate Detox, origina-se do excesso da tecnologia ativa, que causa, muitas vezes, a desordem na vida das pessoas, o que leva a uma busca por mais simplicidade em lugares distintos. Outra tendência, ainda de acordo com o autor é o uso da tecnologia como uma maneira de preservar a história - Preserd Past - que altera o modo como as pessoas poderão reviver sua história, gravar a própria vida, suas experiências, ou seja, suas viagens, suas memórias. Neste sentido, asseveram Tomelin e Ruschmann (2013, p. 224) “O profissional envolvido na atividade proporciona ao cliente a oportunidade de viver uma experiência”, e a “[...] a prestação de serviços turísticos é intangível”. Para esses autores, a responsabilidade do profissional moderno ganhou outras dimensões: As responsabilidades do profissional moderno, além daquelas que abrange o conhecimento pleno da sua atividade, envolvem questões referentes à reciclagem constante, à adaptação e até tomada de decisões pioneiras. Uma delas reside na aplicação das técnicas do planejamento e da administração das suas potencialidades e das possibilidades no mercado de trabalho, visando a um retorno que proporcione a realização profissional e a remuneração adequada (2013, p. 225). Os mesmos autores consideram que há expansão dos campos de atuação no setor de serviços, diante dos avanços tecnológicos. Afirmam ainda que as consequentes mudanças nas necessidades humanas levam às especializações: Estudos realizados na França e nos Estados Unidos, demostraram que os empregos que se desenvolverão mais intensamente nos próximos anos não serão mais aqueles que se exigirão pouca qualificação profissional, e sim aqueles que necessitam de uma formação específica, isto é, o domínio do conhecimento de todos aspectos da atividade em questão (2013, p. 225). Tais mudanças atingem frontalmente o setor de serviços, na sua complexidade de ofertas e de demandas que cobrem o planeta. Com relação à oferta, Trigo (2008, p.12) postula que: [...] para planejar as próximas décadas, em que hotéis submersos, arquipélagos artificiais, voos suborbitais, redes cada vez mais rápidas e com capacidades de processamento sempre maiores estarão no cotidiano das pessoas, é preciso que a educação crie consciência nas pessoas de forma intensiva e capilar. 35 Para o referido o autor (Ibid.), o Turismo depende cada vez mais de modelos educacionais críticos e competentes que atendam as novas exigências regionais e globais. Conforme Tomelin e Ruschmann (2013) há uma acentuada heterogeneidade da demanda turística, em diversos aspectos: na nacionalidade, nos idiomas, nas culturas, nos gostos e necessidades, como nas diferenças sociais, de idade, por exemplo, precisando satisfazer os vários interesses, tanto dos clientes quanto das empresas, que devem manter um padrão elevado de serviços prestados. Dentre a acentuada heterogeneidade de demanda turística, segundo Morace (2009), os idosos são um dos grandes desafios do futuro. A mudança demográfica profunda que incide sobre a estrutura da sociedade nas suas articulações vitais, incidirá também nas novas articulações do trabalho, do tempo livre, da comunicação e da distribuição de bens. De acordo com o autor, os idosos “[...] tem o gosto puro, o gosto pelo conhecimento e pela experiência, da avaliação, da seleção e da profundidade, que se contrapõem aos gostos superficiais da discrição entendida como capacidade de discernir, na alimentação, assim como no vestuário, no luxo e na viagem” (2009, p. 22). Ainda com relação à demanda, aplicando os conhecimentos em quatro gerações e de suas respectivas faixas etárias, Morace (2009) verifica que na dimensão do Turismo, filhos, pais, avós e netos estão espontaneamente redefinindo suas expectativas e suas percepções relativas ao Turismo, pensando em família ao menos uma vez ao ano. A viagem e o Turismo tornam-se, assim, oportunidades especiais de ampliar as relações familiares e intergeracionais, onde são cultivados: a adesão emotiva, a surpresa da descoberta, o compartilhamento do percurso de exploração. Morace explica que “É desta forma que estas tendências geracionais convergem e dialogam: é assim que a família se torna protagonista de uma experiência „poliglota‟, multifacetada, multidisciplinar, e num certo sentido, transicional” (2009, p. 122). Conforme Tomelin e Ruschmann (2013), para trabalhar no Turismo é necessário que o profissional tenha inclinação, propensão e vocação para lidar com os sentimentos das pessoas. E Morace (2009, p. 122) afirma que: Através de novas formas e experiências turísticas – das novas dimensões da felicidade cotidiana que, [...] enfatizam para todas as gerações a dimensão do compartilhamento, da extraordinariedade cotidiana,do conhecimento não acadêmico e da experiência emocional e aventurosa. 36 Enfim, ainda conforme o autor há uma relação circular entre consumidor, o “novo protagonista criativo” e as novas linguagens estéticas de design, de experiências pessoais reconduzível ao mindsit de vanguarda. E a viagem representa um dos laboratórios intergeracionais mais importantes para compreender melhor as dinâmicas do novo “consumidor-autor”, que busca “escrever” sua própria necessidade e realizar seus desejos. Gesser (2013) postula que, tanto a educação quanto o mundo contemporâneo estão passando por transformações estruturais significativas, decorrentes do avanço da ciência e explica que “O processo histórico do desenvolvimento da ciência e da tecnologia universalizou as formas de vida do homem moderno, proporcionando-lhe situações objetivas de experiências, simultaneamente, universal e local” (2013, p. 161). Quanto a isso, Morace (2013) discorre sobre o papel que a escola deve ter neste novo desafio educacional é ensinar por meio do conhecimento empático, sem desvincular do contexto cotidiano e presente, imerso num mundo de relações humanas, e investir em plataformas estimulantes, evitando sempre a especialização excessiva e trabalhando sobre conexões e transversalidades. Gesser (2013, p. 168), afirma que “não há dúvidas de que este novo cenário mundial provocará transformações significativas para a humanidade”. Tais transformações se estendem também para as questões de educação e formação em Turismo. E, para Buratto, Tomelin e Hostins (2013. p. 158), a educação, especificamente em Turismo, enfrenta dois principais riscos: [...] o de restringir-se a práticas profissionalizantes e reflexões sobre o mundo do trabalho, e o de ignorar suas conexões com o setor turístico. Curiosamente, a despeito de sua origem empresarial, voltada ao treinamento profissionalizante, observa-se, na contemporaneidade, uma lacuna existente entre universidade e as empresas, lacuna esta que tem sido objeto de preocupação dos diversos estudiosos do Turismo. Tomelin e Ruschmann (2013) explicam que a capacitação profissional específica em Turismo é hoje, uma condição básica para execução de tarefas complexas na prestação de serviços turísticos, pois envolve além da criação de atividades, programas ou facilidades, a experiência turística, o planejamento e a venda dos produtos turísticos. 37 Buratto, Tomelin, Hostins afirmam que, dentre os desafios para as Instituições de Ensino, está “[...] prover estruturas curriculares e métodos de aprendizagem que possam responder as rápidas transformações da sociedade”. (2013. p. 159). Enquanto que para Trigo (2008, p. 12-13) as [...] questões referentes à cidadania, inclusão e meio ambiente; os desafios empresariais, as neuroses administrativas que afetam as corporações; os projetos acadêmicos e as propostas políticas de todos os setores, exigem planejadores, gestores e profissionais cada vez mais preparados e eficientes. Na mesma linha Mota e Anjos (2012) postulam que a educação em Turismo no Brasil, de forma geral, ainda tem muitos desafios a serem vencidos, como por exemplo, o “[...] dimensionamento da quantidade de pessoal qualificado requerida pelo mercado a curto e médio prazos para que, a partir daí se possam oferecer cursos de qualidade e profissionais adequados ao mercado de trabalho e à sociedade onde estão inseridos” (2012, p. 61). Conforme Trigo (2008), o Brasil está na sua terceira fase de desenvolvimento do Turismo. E explica “A primeira fase foi no início da década de 70 em plena Ditadura Militar. A segunda fase aconteceu entre meados da década 90 e início do século XXI. A década de 90 viu o crescimento sistemático do turismo global” (2008, p. 11). E que o reflexo deste crescimento foi percebido, visto os investimentos públicos e privados e o crescimento da oferta de cursos na área do Turismo, enfim, uma onda de entusiasmo pairava sobre o país. Porém, destaca o autor (Ibid.) que no final do século XX, as crises econômicas mundiais, os ataques terroristas, foram sentidos pelo setor do Turismo. E, aliado a isso, no Brasil, o descaso por parte dos órgãos governamentais para com a infraestrutura necessária ao desenvolvimento turístico, e a carência do fomento como um todo resultou no que o autor chama de “colapso”, ente os anos de 2006 e 2007. Continua Trigo (2008) assegurando que se iniciou a terceira da fase que necessita de investimentos em infraestrutura, aliado à necessidade de qualificação da oferta dos serviços turísticos, e afirma que “Há um crescimento constante do Turismo no país, e a sociedade precisa suprir a demanda de novos e melhores profissionais. Nesta nova fase, as exigências primordiais são qualidade, competitividade e compreensão da segmentação” (2008, p. 11). 38 Neste sentido, Mota e Anjos (2012, p. 60) descrevem as políticas norteadoras da educação em Turismo no Brasil: Destaque-se que as políticas norteadoras da educação em turismo e áreas afins têm um papel fundamental no equilíbrio do sistema social e na própria sustentabilidade do setor turístico. Para que o Brasil possa competir no mercado internacional, com um produto turístico de qualidade, é preciso uma clara política destinada aos recursos naturais, aos histórico-culturais, aos recursos humanos e à qualificação de pessoas, o que envolve diretamente a educação. Desta forma, o Brasil precisa buscar meios de melhorar seu desempenho no cenário turístico mundial. Conforme dados divulgados pela Organização Mundial do Turismo (OMT), o Brasil ocupa o 44º lugar na lista dos países mais visitados no mundo, ou seja, recebeu 6.306 milhões de visitantes em 2015, ou seja, houve uma redução de 1,9% com relação ao ano anterior, quando recebeu 6.430 milhões de visitantes (UNWTO, 2016). Os principais destinos turísticos no mundo, de acordo com as estatísticas publicadas pela OMT são: os Estados Unidos, a China, a Espanha e a França. Os quatro países seguem alternando sua posição no ranking de ingresso de Turismo Internacional e no ranking de chegadas de Turismo Internacional. No ranking de Competitividade de Viagens e Turismo, o Brasil ocupa a 27ª posição. São classificados 136 países, avaliados em 14 dimensões separadas, revelando de que forma os países podem gerar benefícios econômicos, sociais sustentáveis através das viagens e do Turismo. De acordo com o levantamento, o Brasil aparece na 27º colocação, sendo o primeiro da América do Sul (BRASIL, 2017). O país mantém a liderança no quesito de recursos naturais, manteve o 8º lugar na dimensão cultural melhorando em itens como infraestrutura para atendimento ao turista, preços e portos. Por outro lado, em dimensões como ambiente de negócios, priorização do Turismo por parte do Governo, abertura internacional e segurança, recursos humanos, o país recuou. Destaca-se, ainda, que na dimensão de recursos humanos o Brasil perdeu posições, de 66º em 2015 para 93º em 2017 (BRASIL, 2017). Diante deste cenário, o Brasil precisa observar as prospecções futuras, enxergar suas fragilidades e buscar, na qualificação dos serviços e produtos turísticos, patamares para concorrer em nível internacional à captação de novas demandas. 39 Conforme Weiler e Black (2015), a tendência por uma busca por qualidade no Turismo, aliada a um perfil de consumidores que estão cada vez mais exigentes na sua escolha por experiências de Turismo, resulta em uma série de mecanismos que estão sendo desenvolvidos e implementados na tentativa elevar os padrões de qualidade no Turismo, destacando-se, principalmente, todos os tipos de experiências de visitas guiadas. Dentre estes mecanismos, está a qualificação do guiamento. Weiler e Black (2015) afirmam que o papel do guia ganhou destaque como fator de importância na facilitação de uma experiência qualificada para o visitante.Brito (2008) afirma que uma das maneiras de diferenciar e de humanizar a oferta dos pacotes turísticos, que de uma forma geral são muitos semelhantes uns aos outros, é a de escolher adequadamente os profissionais que irão atuar no receptivo dos visitantes, onde se incluem os Guias de Turismo. E, para a garantia de um serviço de guiamento de qualidade, segundo Weiler (2016), há um conjunto de instrumentos que podem auxiliar neste processo, e merecem reconhecimento, como: as associações profissionais, a certificação profissional, o licenciamento, os códigos de ética e prática, os prêmios de excelência, o treinamento e a formação. Conforme a autora, todos apresentam sua importância em termos de conscientização, apreciação e garantia de um padrão mínimo de prática. As mudanças no Turismo têm enfatizado, cada vez mais, a necessidade em se ter Guias de Turismo bem formados e treinados. Diante deste cenário, Weiler (2016) destaca alguns aspectos que devem ser considerados, como a evolução do Turismo para uma economia fundamentada na experiência. Em segundo lugar, os visitantes estão mais informados, mais interessados e têm grandes expectativas no que se refere a guias. Finalmente, esperam que os Guias de Turismo não apenas forneçam comentários factuais, mas que desenvolvam outras habilidades, como a da interpretação e da interculturalidade. Estratégias devem ser definidas para garantir um melhor desempenho pelos profissionais do Turismo, em especial dos Guias de Turismo. Salienta Morace (2013) que a educação é a busca permanente do esforço positivo e propositivo em direção à realização do bem possível e inerente a cada um 40 de nós. E, conhecer a origem desse profissional, seus múltiplos papeis, é condição para poder trabalhar a formação do GT. O autor em referência (Ibid.) explica que é possível identificar e elaborar, a médio e longo prazos, as principais direções de transformação da sociedade contemporânea. Trabalhar de forma permanente sobre o futuro, observar o presente e identificar os paradigmas, as tendências que se consolidam ao longo dos tempos, que permitem a construção de um futuro. Acredita-se que isso se aplica ao fenômeno do Turismo, em especial, neste estudo ao buscar uma formação inovadora para o Guia de Turismo. 2.1.1 Guia de Turismo O ato de guiar significa “encaminhar, dirigir, conduzir, aconselhar, ir, levar, ser caminho (para alguma parte), dirigir-se, regular-se” (DICIONÁRIO Aurélio, 2017). O profissional que conduz grupos de turistas por destinos, roteiros ou atrativos turísticos – o Guia de Turismo recebeu e ainda recebe distintas denominações. Desde a década de 1980, quando Holloway (1981) dizia que não havia consenso sobre a sua “titulação”, guia de turismo, guia turístico, tour leader, guia intérprete, tour guide são algumas das nomenclaturas espalhadas pelo mundo. Porém guiar não é um conceito simples; trata-se de algo complexo, conforme demonstrado na história dessa atividade, o conceito e seus papéis foram evoluindo, mesclando-se, complementando-se, alterando-se ao longo dos tempos. A sua complexidade foi crescendo ao mesmo tempo em que foi se desenvolvendo a atividade turística. O GT desempenha um papel de destaque no cenário turístico, seja atuando em grupos ou em tours privados. Fosman (2005) explica que é quase impossível pensar em um passeio organizado sem a presença de um guia. Ao mesmo tempo, de acordo com o autor, em que as visitas turísticas individuais organizadas pelo próprio turista, além do uso dos aplicativos de viagens e guias impressos, também procura o serviço de um GT, pois deseja uma informação mais qualificada. E ainda, os viajantes a negócios, em muitos casos buscam os serviços desse profissional ou em Sightseeing Bus em que na maioria dos casos, há presença do guia. O GT, conforme Chimenti e Tavares (2007) representa a principal ligação entre o turista e os prestadores de serviços. Além da agência de viagens (local de venda do produto), as operadoras, seja emissiva ou receptiva, meios de 41 hospedagem, empresas transportadoras, serviços de restauração, atrativos culturais e/ou naturais, comércio em geral Inclui-se, ainda, as relações com o ambiente onde se desenvolve a atividade turística e a comunidade local. Trata-se de um profissional polivalente, o qual participa da parte final – da execução – do longo processo pelo qual passa o produto turístico (TRIGO, 1999). Hoje, os GT são profissionais que desempenham diversos papéis6, classificados em várias categorias, com distintas habilitações, exigências legais e que necessitam desenvolver diferentes competências para realizar um serviço de qualidade, de acordo com o espaço em que estão atuando. 2.1.1.1 Origem do guiamento As viagens da humanidade começaram para garantia da sobrevivência da espécie. Os homens procuravam alimentos, ou mudavam-se em virtude das alterações climáticas. Um líder, com entendimentos geográficos e climáticos conduzia os grupos. Salienta Pond (1993), no decorrer dos tempos, as viagens tiveram outros significados: defesa do seu espaço, necessidade de explorar e de conhecer novos lugares, entender as questões filosóficas e religiosas, e por fim, descobrir o prazer que lhe traz a descoberta desses novos caminhos. No percurso da história mundial, a profissão de GT antecede o período de Cristo. Na Idade Antiga (440 a.C.), o historiador e geógrafo grego Heródoto, considerado como o primeiro turista, ou um dos maiores viajantes da Grécia já citava, em seus relatos, a figura do GT. Muitas vezes, em seus registros, Heródoto ironizava as narrativas dos GT na descrição dos monumentos. Também, o filósofo Plutarco tinha uma postura crítica perante os guias da época. De acordo com Pond, (1993) a profissão de guia encontra-se entre as mais antigas do mundo. É evidente que não é o GT atual, e sim o que conduzia, num primeiro momento, os exércitos na época. Pode-se dizer que algumas das funções do GT permanecem até hoje, pois orientavam os exércitos em terrenos estrangeiros, serviam de intérprete, arranjavam acomodações, comida e transporte, mas os fins 6 Significado de papel: atribuições, funções. Função é o exercício de atribuições. Atribuição: derivação fem. sing. de Atribuir. Conceder atribuição a. Imputar. Referir; conferir. Rogar-se. Para o presente estudo, serão utilizados tais vocábulos com o mesmo sentido para o GT: papel ou atribuição ou função. (DICIONÁRIO Aurélio, 2017). https://dicionariodoaurelio.com/atribuir 42 eram outros, conforme já citado por Pond (1993), e não o do Turismo como nos dias de hoje. Para o desenvolvimento das atividades comerciais, os fenícios, inventores da moeda e do comércio, objetivavam buscar melhores oportunidades para os negócios. Portanto, viagens a novos destinos eram necessárias e exigiam a presença do guia, pois necessitavam de orientação e proteção durante os deslocamentos. Neste sentido, o guia além de orientar, atuava como um “protetor de pessoas e bens” (BRITO, 2011). Neste período, se identificam dois tipos de GT que duraram até o século XVIII, com papéis distintos: os pathfinder (guias geográficos) e os mentores. Os guias geográficos forneciam as orientações sobre os caminhos. Já os mentores eram cultos, serviam como tutores pessoais ou conselheiros espirituais (COHEN, 1985; POND, 1993). Neste sentido, o guia geográfico, na falta de mapas, guias impressos, sinalização e outros mecanismos de orientação, era a figura essencial para o avanço das tropas e para o desbravamento de novos lugares, no caso dos exploradores, para liderar e manter o contato com populações novas e/ou desconhecidas. Muitos eram moradores locais, com conhecimento da sua região, mas sem treinamento especializado. Já o mentor, ou tutor pessoal ou conselheiro espiritual, serviacomo um "guru" para o novato, adepto ou buscador, guiando-o para sua iluminação, ou qualquer outro estado espiritual (COHEN, 1985). Costa (2005) acrescenta que, além dos motivos citados para a realização das viagens e a necessidade de um guia, outro fator é identificado na Babilônia e Crescente Fértil: contato com equipamentos urbanos. Assim, Brito (2011) acrescenta um terceiro papel aos já citados por Pond (1993) e Cohen (1985), ou seja, o de intérprete do patrimônio, o que interpreta as obras monumentais. Na era dos grandes impérios, os antigos persas, assírios e egípcios viajavam de forma organizada. Durante a era do Império Grego o Turismo floresceu. Os festivais e os shows, entre eles os Jogos Olímpicos que começaram em 776 a.C. eram motivo para deslocamentos (CRUZ, 2008). As famílias com maior poder aquisitivo viajavam para assistir aos jogos, às corridas, às lutas de gladiadores e aos espetáculos dos coliseus. 43 Os romanos se tornam adeptos do Turismo. A estrutura das estradas no Império Romano e a segurança despertaram na população o desejo e o prazer de viajar. Além disso, a Grécia, o Egito e a Ásia Menor começaram a ser procurados como destino para o Turismo Cultural. Nesta época, havia guias locais para receber os visitantes e lhes mostrar as belezas artísticas e naturais da região (OLIVEIRA; CYMBRON, 1994). O período entre a queda de Roma e a Renascença, conhecido como a Idade Média, ocorreu entre 476 d.C. a 1453, ou seja, do século V ao XV. A queda de Roma levou ao declínio do comércio e da economia em geral e diminuição de viagens. E, as boas estradas do Império Romano entraram em decadência; interromperam os grandes cursos do comércio e da economia em geral e perderam o desejo de viajar. Há falta de segurança, devido às invasões (POND, 1993). Assim, as motivações de viagens ficaram limitadas a dois fatores, os religiosos, principalmente, e os comerciais, estes ligados aos descobrimentos. Com relação aos fatores religiosos, o fortalecimento da religião cristã fez com que o movimento das peregrinações ganhasse força. Costa (2005) cita que, na Grécia Antiga, um dos fatores principais para o deslocamento das pessoas estava associado à necessidade de interação em lugares que fosse possível a contemplação, introspecção e desenvolvimento intelectual. Eram uma mescla de devoções, cultura e lazer (URRY, 2001). O guia, neste momento, era responsável por dar informações sobre as cidades que os peregrinos iriam visitar e os tipos de abrigo que poderiam encontrar ao longo das estradas. Destacam-se as peregrinações à Terra Santa, considerada a mais importante para os cristãos, Santiago de Compostela e Roma. Meca era destino para os adeptos da religião muçulmana (OLIVEIRA; CYMBRON, 1994). E Cohen (1985), nesse cenário o descreve como líder, visto que agora marca o perfil com duas “orientações” de um guia, pois atende às questões de orientação, tanto geográfica como espiritual. Com relação aos fatores comerciais, que impulsionavam as viagens à época, os descobrimentos de novas terras e a procura por comércio de especiarias, ouro, prata e outros valores, de acordo com Pond (1993) fez-se necessário o uso de guias geográficos locais, por questões de segurança, que os protegiam contra os ladrões. Na linguagem grega, algumas denominações foram dadas aos guias. Eles tinham funções variadas de acordo com as situações: os periegitai, que tinham como 44 função principal orientar os viajantes ao redor de sítios visitados, a exemplo do papel que desempenham os Guias de Turismo numa excursão ou num passeio pela cidade; e os exegetai, que eram especialistas e conselheiros em assuntos religiosos e rituais, tendo como missão prestar orientações religiosas aos visitantes (HOLLOYWAY, 1981; CRUZ, 2008). Além das denominações apresentadas, Cruz (2008) acrescenta mais uma: os proxernos cuja função era ajudar os cidadãos em viagens ao exterior. Complementa dizendo que alguns cidadãos gregos eram designados pelo Estado para receber os visitantes estrangeiros, orientá-los, e caso surgissem complicações, ajudá-los a regressar às suas cidades de origem. Seria o papel de um cônsul na atualidade. Tais dados históricos fazem perceber que os guias que surgiram na antiguidade são bastante diversificados e remontam à mitologia, à literatura, à religião, à história e às explorações geográficas. Segundo alguns pesquisadores como Coltman (1989), há o registro de venda de pacotes turísticos já neste período. Os primeiros pacotes eram organizados em viagens para peregrinação, em navio de Veneza à Terra Santa, com alimentação, hospedagem, transporte terrestre e proteção pessoal, que somavam altos valores. Urry (2001) afirma que já havia uma “indústria” crescente de redes de hospedarias para viajantes, mantidas por religiosos e por manuais de indulgência produzidos em massa. Na Era Moderna, século XV a XVIII, com a expansão comercial da Europa e com o uso da bússola, os europeus tiveram interesse em conhecer lugares diferentes, e assim, iniciou-se uma intensa atividade relacionada com viagens, negócios e aprendizagem. Nesse período, durante o Renascimento, os jovens da classe alta, filhos dos nobres, burgueses e comerciantes ingleses viajaram da Grã-Bretanha para o Grand Tour, uma rota prescrita da Inglaterra para a França, Alemanha, Áustria, Suíça e Itália. As famílias buscavam subsidiar seus filhos com conhecimentos de outros continentes, outras culturas e idiomas, para auxiliar na condução de suas vidas e de seus negócios (HOLLOWAY, 1981; COHEN, 1985). Era uma viagem restrita aos filhos homens, com idade em torno de 25 anos, e muitas vezes duravam até três anos. 45 Pond (1993) explica que há uma mudança no entendimento sobre o guia: passa a ser um “tutor de viagem”, também chamado antiquarii ou cicerone7. Esse, de acordo com o autor acompanhava a viagem, devia ser versátil, multilingue e conhecedor de diversas matérias, como história, literatura, arquitetura e assuntos da atualidade. Devia, também, vigiar a moral e religião do pupilo. O GT moderno, para Holloway (1981), teve origem direta nos Grand Tours dos séculos XVII e XVIII. E, segundo Cohen (1982), o papel do GT moderno combina e expande elementos agregando as funções do guia pesquisador e o do guia mentor. Esta confluência é claramente expressa no termo hebraico more- derech, ou seja, “professor do caminho”. No entanto, há incongruências e tensões entre estes dois modelos principais de guia, que explicam o desenvolvimento da atividade e as suas diferenciações. Na Itália, Brito (2011) explica que surge outro tipo de guia, os chamados vetturini, que tinham como atividade vender os seus serviços, transportar os ingleses e seus tutores em veículos de quatro rodas, e protegê-los. E, já neste período, se constatou a presença de falsos guias, os quais tinham como objetivo se apropriar dos bens referidos. Montejano (2001) traça o seguinte cenário e explica que os Grand Tours foram realizados até a metade do século XIX, quando foram superados pelas facilidades de viagem a partir dessa época. São considerados os antecedentes dos atuais intercâmbios. E, em meados do século XVIII (Idade Contemporânea), o Turismo já era reconhecido pelo seu potencial econômico, inclusive atuando como fomentador de outras atividades. Já, no século XIX, muitos foram os fatores que contribuíram para o desenvolvimento do Turismo, como o processo provocado pela Revolução Industrial, o desenvolvimento da estrada de ferro e da navegação a vapor. A transformação da economia e da sociedade e a intensificação dos avanços científicos e tecnológicos, aliados a esses fatores ainda ocorreram alterações no modo de produção, nas relações de trabalho e ganhos sociais como a redução da 7 A etimologia da palavra cicerone
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