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Direito Constitucional Prof.ª Claudia Carvalho Avaliação 1 Nome: Valor: 30 pts Prazo: 23/4/2021 a 30/4/2021 Questão 1: A Proposta de Emenda Constitucional da chamada Reforma Administrativa (PEC 32/2020) prevê, entre outras mudanças, a incorporação ao art. 37, caput, da CF/1988, de novos princípios da Administração Pública. Entre eles está o chamado princípio da subsidiariedade, o qual dispõe que o Estado deve assumir o papel de intervir em questões sociais e econômicas somente quando a atuação da iniciativa privada for insuficiente. Em texto sobre a relação entre o Constituição e a governabilidade, Manoel Gonçalves Ferreira Filho defendeu o princípio da subsidiariedade e o definiu nos seguintes termos: “Somente cabe ao Estado fazer aquilo que não possa ser feito, ou não possa ser feito de modo adequado, pelo individuo e pelos grupos sociais. Igualmente não se deve fazer em nível mais alto o que puder ser feito em nível mais baixo, o que vale em relação ao cidadão, à família e às organizações intermediárias. Isso é válido quer no plano econômico, quer no plano social. Neste último, num País de contrastes e de miséria como o Brasil, deve-se até abrir um campo razoável para uma atuação assistencial do Estado, mas onde não possa isso ser realizado pela comunidade, sozinha, ou, mesmo, amparada por recursos públicos.” Tendo em vista o paradigma do constitucionalismo social e a consagração de direitos sociais no texto da Constituição de 1988, avalie em que medida o principio da subsidiariedade se mostra compatível com o modelo constitucional adotado no Brasil. Resposta: A proteção do Estado a áreas como educação, saúde e à direitos sociais em geral é garantida na Constituição Federal de 1988, caracterizando o que chamamos de constitucionalismo social. Esse tipo de constitucionalismo defende que o indivíduo não possui grande autonomia em uma sociedade, sendo vulnerável à estímulos externos e necessitando de assistência estatal para garantir sua existência básica, dando atenção especial à grupos que sofrem discriminação, que são ainda mais vulneráveis. Assim, esses direitos sociais existem e são garantidos na lei para estabelecer níveis mínimos de dignidade para uma vida plena, objetivo principal desse constitucionalismo social, que é a base da nossa Constituição. Porém, como ela é passível de mudanças através de emendas constitucionais, governos que sejam contrários a esses princípios tentam, na medida do possível, reverter esse papel do estado social, aprovando medidas como esta do enunciado, que vão de encontro aos ideais constitucionais do nosso país. O princípio da subsidiariedade tem como objetivo afastar o Estado de suas responsabilidades perante os cidadãos, atribuindo a tarefa de protegê-los à empresas privadas que visam primeiramente ao lucro, deixando a população à deriva e ainda mais vulnerável a abusos e explorações. Dessa forma, esse princípio não é compatível com os direitos fundamentais presentes na Constituição e do constitucionalismo social que a fundamenta. Questão 2: Considere o seguinte caso julgado pelo Supremo Tribunal Federal em 2011: “Em decisão unânime (8 votos), o Supremo Tribunal Federal (STF) liberou a realização dos eventos chamados “marcha da maconha”, que reúnem manifestantes favoráveis à descriminalização da droga. Para os ministros, os direitos constitucionais de reunião e de livre expressão do pensamento garantem a realização dessas marchas. Muitos ressaltaram que a liberdade de expressão e de manifestação somente pode ser proibida quando for dirigida a incitar ou provocar ações ilegais e iminentes. Pela decisão, tomada no julgamento de ação (ADPF 187) ajuizada pela Procuradoria-Geral da República (PGR), o artigo 287 do Código Penal deve ser interpretado conforme a Constituição de forma a não impedir manifestações públicas em defesa da legalização de drogas. O dispositivo tipifica como crime fazer apologia de "fato criminoso" ou de "autor do crime". O voto do decano da Corte, ministro Celso de Mello, foi seguido integralmente pelos colegas. Segundo ele, a “marcha da maconha” é um movimento social espontâneo que reivindica, por meio da livre manifestação do pensamento, “a possibilidade da discussão democrática do modelo proibicionista (do consumo de drogas) e dos efeitos que (esse modelo) produziu em termos de incremento da violência”. Além disso, o ministro considerou que o evento possui caráter nitidamente cultural, já que nele são realizadas atividades musicais, teatrais e performáticas, e cria espaço para o debate do tema por meio de palestras, seminários e exibições de documentários relacionados às políticas públicas ligadas às drogas, sejam elas lícitas ou ilícitas. Celso de Mello explicou que a mera proposta de descriminalização de determinado ilícito penal não se confunde com o ato de incitação à prática do delito nem com o de apologia de fato criminoso. “O debate sobre abolição penal de determinadas condutas puníveis pode ser realizado de forma racional, com respeito entre interlocutores, ainda que a ideia, para a maioria, possa ser eventualmente considerada estranha, extravagante, inaceitável ou perigosa”, ponderou.” (Fonte: “STF libera “marcha da maconha””. Notícias STF. 15 de junho de 2011) Com base no caso, responda: (i) Quais direitos foram garantidos pela decisão do STF de autorizar a “marcha da maconha”? São direitos pertencentes à qual “geração”? O que se exige do Estado? (ii) Com base nos argumentos apresentados no caso e na doutrina dos direitos fundamentais, manifestações que preguem o fechamento das instituições e incitem seus participantes a agir contra elas devem ser consideradas igualmente legítimas? Fundamente sua resposta. Resposta: (i) Os direitos de liberdade de expressão e de associação, englobados nos direitos civis e políticos de primeira geração. Quanto à esses direitos, entende-se que é necessário uma certa distância do Estado, visto que essas liberdades são imprescindíveis para a uma vida individual completa. Dessa forma, é obrigação do Estado não intervir e respeitar esses direitos, que têm como objetivo criar um distanciamento entre a esfera estatal e a esfera social, privilegiando as liberdades do indivíduo e afastando-o da interferência e atuação do Estado. (ii) Não, pois o uso das liberdades individuais contra a ordem que os garante é interpretado, pela corrente dos limites internos, como um abuso do que garante aquele direito, considerando assim um uso ilegítimo do mesmo. Dessa forma, incitar o fechamento de instituições democráticas não é entendido como liberdade de expressão, mas sim um abuso dessa liberdade, caracterizando essa manifestação como ilegítima. Questão 3: Em setembro de 2020, o Magazine Luiza abriu uma seleção para seu programa de trainee com vagas exclusivas para pessoas negras. A medida chegou a ser criticada, até mesmo sob a acusação de “racismo reverso”, uma vez que estaria supostamente discriminando ou impedindo a contratação de brancos. O Ministério Público do Trabalho (MPT) recebeu, inclusive, denúncias nesse sentido. Com base nas categorias de discriminação trabalhadas por Adilson Moreira (especialmente discriminação inconsciente, organizacional, institucional e estrutural) analise a legitimidade da política adotada pela empresa dentro dos marcos do direito antidiscriminatório e de uma compreensão constitucionalmente adequada do principio da igualdade. Resposta: O princípio da igualdade prega, como diz o nome, a igualdade de todos os indivíduos, perante a lei e na lei. Ou seja, ele defende que tanto as leis quanto os aplicadores dessas leis defendam e protejam essa igualdade. Para além dessa conceituação, o princípio da igualdade dá atenção especial aos indivíduos que sofrem discriminação ou tratamento desigual na sociedade. Mesmo que os ideais de igualdade sejam protegidos pela lei, esse princípio preza a importância de tratar os indivíduos de acordo com as suas características que os diferem e os colocam em posição inferior perante à sociedade, de maneira a tentar corrigir isso.Considerando o que prega esse princípio, a atitude tomada pelo Magazine Luiza não é de forma alguma discriminatória. Muito pelo contrário, ela é fundamentada na premissa fundamentada pela discriminação estrutural de que grupos de pessoas que sofrem discriminações já há muito tempo tem sua posição na sociedade atual pré-definida por conta do passado que suas características carregam. Sendo assim, o programa de trainee do Magtazine Luiza destinado apenas à pessoas negras é uma forma do que se chama “reparação histórica”, ou seja, uma maneira de tentar reverter séculos de racismo estrutural e de ajudar jovens negros marginalizados a conseguir ocupar um lugar de prestígio na nossa sociedade. Sendo assim, essa atitude é compatível com o que prega o princípio da igualdade, que defende atitudes específicas em relação a grupos discriminados para poder promover ideais de igualdade verdadeiramente emancipatórios.
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