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CASO DA EXPLOSÃO DA FÁBRICA DE FOGOS DE ARTIFÍCIO: A FUNÇÃO DOS ÓRGÃOS MONITORADORES DA APLICAÇÃO DAS CONVENÇÕES E TRATADOS DE DIREITOS HUMANOS NO BRASIL

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CASO DA EXPLOSÃO DA FÁBRICA DE FOGOS DE ARTIFÍCIO: A FUNÇÃO DOS ÓRGÃOS MONITORADORES DA APLICAÇÃO DAS CONVENÇÕES E TRATADOS DE DIREITOS HUMANOS NO BRASIL
Autor
introdução
As atrocidades causadas durante a Segunda Guerra Mundial consolidaram o ideal de direito inato e natural, denominado hoje internacionalmente como direitos humanos. A partir dessa ideia, a Declaração dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas criou um vínculo entre os países calcado na luta em conjunto contra a violação dos direitos básicos do homem. 
Nesse sentido, entretanto, para que os pactos, tratados e convenções internacionais sejam devidamente seguidos por seus signatários, é importante que mecanismos de controle e monitoramento sejam criados, haja vista a responsabilidade jurídica que os Estados assumem ao fazer parte desses tipos de acordos. 
O objetivo desse trabalho é tratar sobre a efetividade desses meios de controle, associando os meios de controle regionais da Organização Americana dos Direitos Humanos com um caso emblemático de violação ocorrido no Brasil. Para isso, será feita uma explicação breve sobre os direitos humanos, seu conceito e seu surgimento, bem como a noção de responsabilização jurídica a respeito das normas jurídicas que vinculam os signatários ao dever de cumprir o convencionado. 
os direitos humanos: CONCEITO E RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL DOS ESTADOS
Segundo Alfonso Júlio Campuzano, os direitos humanos são uma matéria tida como “escorregadia”, já que grande dificuldade se aflora quando abordada do ponto de vista teórico[footnoteRef:1]. Tal dificuldade, segundo o autor, se deve à ambiguidade conceitual e ao desacordo geral em torno de seus fundamentos e extensão. Nesse sentido, o conceito de direitos humanos é extensa, sendo abordado sob diversas perspectivas a partir do contexto em que são estudados. [1: CAMPUZANO, Afonso de Julis, 1988. p. 161. ] 
Assim,
Trata-se de expressão múltipla, por vezes genérica, ambígua, fluída e cuja delimitação conceitual aceita variações de natureza filosófica, histórica, social, cultural, política ou mesmo linguística. O ponto de partida do intérprete (filósofo, jurista, sociólogo etc.) é decisivo para uma proposta de definição ou conceituação de direitos humanos. Por isso, definir os direitos humanos pode significar um resultado insatisfatório, pela imprecisão e vaguidade que a expressão pode assumir.[footnoteRef:2] [2: de, O.F.M. G, 2016. p1] 
De maneira geral, o conceito de direitos humanos se baseia intimamente ao direito internacional público, uma vez que são direitos garantidos por leis de natureza internacional através de tratados ou declarações celebrados entre Estados[footnoteRef:3]. São direitos que se baseiam na dignidade da pessoa humana e, haja vista são afirmados historicamente em face do poder estatal, devem ser reconhecidos em todas as esferas sociais, públicas e privadas[footnoteRef:4]. [3: Oliveira, M.V. D. , 2019. p.20 ] [4: de, O.F.M. G., 2016. p1] 
Segundo as Nações Unidas, os direitos humanos são definidos como garantias jurídicas de caráter universal responsáveis pela proteção dos indivíduos contra ações ou omissões estatais que atentem contra a dignidade da pessoa humana[footnoteRef:5]. Já segundo André de Carvalho, os direitos humanos são um conjunto mínimo de direitos essenciais para que a vida do ser humano seja garantida, baseados na liberdade e da igualdade entre as pessoas[footnoteRef:6]. [5: TAVARES, Raquel., 2012.] [6: RAMOS, André de Carvalho, 2013. p. 32.] 
Não obstante essas definições, ainda se ressalta que:
Em síntese, são direitos decorrentes do processo histórico de afirmação da dignidade da pessoa humana, aprumados nos valores da liberdade, da igualdade e da solidariedade, em uma noção integral e interdependente. Esses direitos asseguram as condições de sobrevivência e constituem possibilidade emancipatória para a plena realização do projeto de vida da pessoa e, em última análise, do sujeito coletivo[footnoteRef:7]. [7: de, O.F.M. G. Direitos Humanos, 2016. ] 
A Declaração Universal dos Direitos Humanos, criada em 1948, determinou a concretização de uma noção contemporânea acerca do tema, reiterada pela Declaração de Direitos Humanos de Viena de 1933[footnoteRef:8]. Essa noção vem de uma série de movimentações populares e teóricas que nasceram após a II Guerra Mundial, em vista das atrocidades causadas, responsáveis pela morte de milhões de pessoas por seus próprios governantes. Destaca-se, nesse contexto, o governo nazista: [8: PIOVESAN, Flávia, 2014] 
Para Ignacy Sachs (1998a, p. 149), o século XX foi marcado por duas guerras mundiais e pelo horror absoluto do genocídio concebido como projeto político e industrial.[footnoteRef:9] [9: Idem.] 
Sendo os direitos humanos integrantes de pactos e declarações internacionais, a assinatura destes, automaticamente, vincula os Estados-partes a responsabilidade jurídica de se adotar medidas que assegurem efetivamente as premissas determinadas por esses documentos. Tal responsabilidade é instituto jurídico de caráter internacional, e tem como objetivo responsabilizar o Estado soberano por alguma prática que atente contra os direitos convencionados[footnoteRef:10]. A finalidade desse instituto se traduz, portanto, na coação dos Estados para que respeitem os direitos humanos de maneira obrigatória e reparar devidamente o indivíduo lesado pela violação dos direitos convencionados[footnoteRef:11]. [10: OLIVEIRA, M. V. D., 2019, p. 33] [11: Idem.] 
Nesse sentido, 
A responsabilidade internacional do Estado, no caso de violação de direitos humanos, por exemplo, estaria diretamente relacionada à ideia de proteção internacional de direitos. A “negação dessa responsabilidade acarreta a negação do caráter jurídico da norma internacional” (CARVALHO RAMOS, 2005; ACCIOLY; CASELLA, 2010), de modo que qualquer medida usada para a prevenção de violações ou que busque responsabilizar o Estado infrator garantiria uma maior proteção dos direitos humanos, consolidando a “juridicidade das normas internacionais [...] e o desenvolvimento das relações entre os Estados” (CARVALHO RAMOS, 2005).[footnoteRef:12] [12: BUCCI, Daniela; KOCH, Camila de Oliveira, 2014] 
Tal compromisso é explícito na maioria dos Tratados Internacionais de direitos humanos, de modo a garantir que o Estado não se evada da responsabilização nos casos de violação. A título de exemplificação, nota-se o artigo 2º do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, o qual estabelece que cada Estado Parte:
 [...] comprometem-se a garantir a todos os indivíduos que se encontrem em seu território e que estejam sujeitos à sua jurisdição os direitos reconhecidos ... no presente Pacto, sem discriminação alguma por motivo de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de qualquer outra natureza, origem nacional ou social, propriedade, nascimento ou outra situação.
Há, portanto, o dever legal de se assegurar que as medidas propostas pelos tratados sejam devidamente aplicadas, através de modificações em leis internas e sua aplicação voltada a promoção dos direitos humanos[footnoteRef:13]. [13: CNJ, 2018] 
Isso porque,
A supervisão dos compromissos não cabe discricionariamente ao Estado-parte, mas sim a órgãos internacionais, que agem em defesa de valores comuns superiores ao conceito e interesse do Estado[footnoteRef:14]. [14: CASTANHEIRA, GIANNELLA, 2018] 
Para que os Estados sejam responsabilizados pelas violações aos direitos humanos, portanto, foram criados diversos mecanismos garantidores do cumprimento das obrigações convencionadas, de modo a monitorar, prevenir e punir quando necessário. A estrutura normativa da proteção internacional e/ou global dos direitos humanos, como a Declaração universal dos Direitos Humanos, o Pacto Internacional sobre direitos Civis e políticos e o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos Sociais e Culturais, portanto, são também criadores de instrumentos de proteção com alcance tanto geral quanto regional[footnoteRef:15]. [15: RUGGIO, RodrigoAlves Pinto, 2017] 
os mecanismos de garantia dos direitos humanos e seu alcance
 
Cada tratado possui um sistema de implementação próprio, variando entre procedimentos de comunicação gerais e específicos a procedimentos de julgamento de representações feitas por indivíduos ou grupos de indivíduos ou outros Estados. 
Os procedimentos de comunicação têm a função de criar uma espécie de ponte entre o Estado parte e o órgão de monitoramento pertinente responsável pela aplicação de determinado tratado através de relatórios e de comunicações internas que podem levar à denúncia e à responsabilização do Estado-parte. 
Os procedimentos de julgamento são feitos na segunda parte, quando a denúncia é realizada e o Estado começa a responder pela violação dos direitos humanos convencionados. Seu objetivo é, então, remediar juridicamente as violações denunciadas, de modo a orientar mudanças legislativas ou comportamentais que visem a dirimirão do problema[footnoteRef:16]. [16: CNJ, 2018] 
Importante ressaltar, novamente, que cada tratado possui seu próprio mecanismo de controle e implementação. Importa, portanto, citar alguns deles.
Os dois Pactos considerados mais relevantes no cenário internacional, devido ao seu alcance e sua rigorosidade no que tange ao monitoramento são o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. Estes foram criados pela Comissão de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas. Cada um deles, por sua vez, possui métodos próprios de implementação.
O Pacto Internacional sobre Direitos Civil e Políticos, de 1966, reconhece explicitamente a competência do Comitê responsável em receber e examinar as comunicações enviadas pelos particulares à Corte Monitoradora da implementação do estabelecido[footnoteRef:17]. Tal Comitê tem a autoridade para a examinar os relatórios feitos pelos Estados partes, votar os Comentários Gerais sobre as interpretações acerca do disposto no Pacto e tratar das comunicações entre os Estados, além de receber comunicações individuais. Depreende-se, então, que o Pacto realiza o monitoramento a partir de três formas: através de relatórios periódicos (artigo. 40), comunicações interestados (artigo 41) e comunicações individuais. [17: Tal reconhecimento é feito através do Protocolo Facultativo do Pacto, votados em Assembleia Geral em 1966. ] 
O Pacto Internacional sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, de 1966, também optaram por adotar um sistema de relatórios periódicos (art. 16)[footnoteRef:18], os quais deveriam conter os progressos realizados pelos Estados no que tange aos direitos humanos, com o objetivo de monitorar a implementação dos direitos humanos pactuados. Cada um dos Estados parte: [18: “Os Estados partem se comprometem a apresentar relatórios sobre as medidas que tenham adotado e sobre o progresso realizado com o objetivo de assegurar a observância dos direitos reconhecidos.” (Art. 16, Pacto Internacional Sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais)] 
[...] compromete-se a adotar medidas, tanto por esforço próprio como pela assistência e cooperação internacionais, principalmente nos planos econômico e técnico, até o máximo de seus recursos disponíveis, que visem a assegurar, progressivamente, por todos os meios apropriados, o pleno exercício dos direitos reconhecidos no Pacto, incluindo, em particular, a adoção de medidas legislativas[footnoteRef:19]. [19: Art. 2º Pacto Internacional sobre os Direitos Econômicos] 
Este pacto também criou um Comitê responsável pela análise sistemática dos relatórios enviados, feita a partir de debates públicos com a presença dos Estados parte.
A Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra Mulheres foi estabelecido em 1979, adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas. O fim principal da Comissão foi a eliminação da discriminação contra as mulheres, estabelecendo diversas medidas legislativas que buscavam esse objetivo. Assim,
A proibição da discriminação contra a mulher, portanto, não se limita às categorias tradicionais dos direitos humanos, mas estende-se mais além, abarcando outros campos em que a discriminação possa ocorrer. Além disso, não está limitada ao campo público, compreendendo também áreas da vida privada[footnoteRef:20]. [20: CNJ, 2018] 
Os mecanismos de monitoramento estabelecidos por essa convenção envolvem o procedimento de relatórios periódicos e as comunicações individuais.
Tal recorte temático é um dos mais importantes para a análise deste trabalho. A partir dele, faremos, mais a frente, colocações a respeito da atuação do Brasil na luta contra a discriminação das mulheres como signatário de convenções que tem como fim a extinção dessa prática ao redor do mundo. 
Outro recorte importante para o estudo abordado é a respeito da Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, de 1965. De maneira geral, os Estados-parte dessa convenção condenam a discriminação racial, se comprometendo a adotar, por todos os meios apropriados e sem dilações, uma política destinada a eliminar tal prática em todas as suas formas e a encorajar a promoção de entendimento entre todas as raças[footnoteRef:21]. Os mecanismos de monitoramento dessa Convenção também adotam o sistema de relatórios e comunicações individuais, sendo o seu diferencial a possibilidade de denúncias entre os próprios Estados-Parte. [21: Art. 2° da Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial] 
Após o exposto, depreende-se que a implementação dos direitos humanos deve ser feita a partir da cooperação entre os Estados e a comunidade internacional, tanto no que tange às medidas de prevenção e punição quanto no que tange às denúncias levadas às cortes para que os casos de violação dos direitos humanos sejam devidamente julgados. Entretanto, é notável que essas medidas de proteção, por mais eficiente que sejam, não são o suficiente para garantir que os direitos humanos sejam respeitados pelos Estados-parte.
Adiante, analisaremos um caso de extrema importância para o estudo dos direitos humanos no país. Para isso, faremos, primeiro, uma delimitação legal sobre como os Tratados Internacionais que tratam dessa matéria são juridicamente aceitos no país. 
os tratados internacionais de direitos humanos no ordenamento juridico brasileiro: um breve panorama
De maneira geral, os tratados, após aceitos, podem tanto agir como normas de direito interno dentro do país quanto influenciar a alteração ou criação de regulamentação nacional. 
Segundo a Constituição da República Federativa do Brasil, os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais[footnoteRef:22].    [22: Art. 5°, §2°, da Constituição Federal] 
O Brasil está ligado à jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos, logo, a eficácia plena dos direitos humanos na esfera regional depende da adesão brasileira ao Pacto São José da Costa Rica[footnoteRef:23]. [23: CASTANHEIRA, GIANNELLA, 2018] 
É justamente esta incorporação, sua medida e seus limites, que refletem a realidade ou padrão de proteção jurídica que um determinado Estado estende aos indivíduos, sendo o grau máximo conferido pela aceitação do direito de petição individual e a da jurisdição das Cortes internacionais[footnoteRef:24]. [24: Idem.] 
A Corte Interamericana dos Direitos Humanos faz parte de uma organização regional de medidas relativas à implementação dos Direitos Humanos, criada pela Convenção Interamericana dos Direitos Humanos, cuja área de abrangência é toda a América. Ela tem a competência para resolver conflitos relativos a qualquer acusação de violação dos direitos humanos por parte dos Estados, bem como para interpretar os dispositivos postos na Convenção Interamericana sobre a matéria[footnoteRef:25]. [25: CASTANHEIRA,GIANNELLA, 2018] 
Feita essa delimitação, faz-se agora a análise do caso da explosão de uma fábrica de fogos de artifício clandestina, que envolveu a Interseccionalidade de dois fatores de opressão tratadas pelas convenções internacionais das quais o Brasil faz parte: a raça e o gênero.
análise de caso – a fábrica de fogos de artifícios
Esse caso envolve uma explosão ocorrida em uma fábrica de fogos localizada no Recôncavo Baiano, a qual causou a morte de 64 pessoas, sendo 40 delas mulheres e 20 delas, crianças. Como elemento discutível nessa situação, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos levantou a possibilidade de responsabilizar o Estado brasileiro pela violação dos direitos à vida, à integridade pessoal, ao trabalho, à igualdade e não discriminação, às garantias judiciais e dos direitos referentes às crianças, mesmo a empresa causadora do acidente sendo privada.
A vulnerabilidade das pessoas envolvidas nesse caso se revela a partir do contexto da tragédia ocorrida, caracterizado pela pobreza, pela baixa escolaridade dos moradores da região e pelo acesso restrito ao emprego, uma vez que as pessoas não tinham muitas escolhas além de trabalhar nas fábricas de fogos de artifícios. Além disso, a racialização e feminização do acidente é evidente quando se considera as características das vítimas da explosão: mulheres majoritariamente negras e crianças. 
A partir daqui, surge o questionamento de quão válida e extensa é a aplicação dos direitos humanos no Brasil. Será que são aplicadas de maneira uniforme para todos os grupos sociais? 
A resposta é não. Observe:
A confiabilidade na universalidade e neutralidade dos direitos humanos foi acompanhada pelo desenvolvimento de modelos econômico-políticos estruturados na desigualdade e no distanciamento das condições do bem viver para a zona do não ser. A crença compartilhada de que uma atividade legislativa “neutra” ofereceria o caminho para promoção de uma sociedade equitativa, justa e democrática transformou-se em uma “verdade” bastante eficiente para legitimar uma realidade desigual e racialmente seletiva.[footnoteRef:26] [26: PIRES, 2018] 
Ressalta-se, também, o passado histórico da região, marcado pela escravidão e pela servidão, o que deixou fortes traços da estratificação social, discriminação e marginalização da população que ali nasceu. Ou seja, a opressão está ligada a história da cidade, e a ideia de direitos humanos para esse grupo populacional é extremamente reduzida, haja vista a continuidade da violência direcionada a eles.
A fábrica em questão, Vardo dos Fogos, funcionava em condições extremamente insalubres e sem nenhum tipo de fiscalização, sendo composta por tendas sem espaços específicos destinados a períodos de descanso ou de alimentação, nem banheiros. Tal situação caracteriza uma clara violação não apenas ao que estabelece a Convenção Americana, mas também ao estabelecido pela legislação brasileira em seu Código Civil, bem como nas Consolidações das Leis Trabalhistas e na própria Constituição Federal.
 Quando em julgamento, a Corte considerou determinante o fator da inobservância do Estado com relação ao que acontecia nesse local, uma vez que a fiscalização permitiria que este tomasse providência com respeito às condições desumanas às quais as trabalhadoras eram submetidas, bem como com respeito ao trabalho infantil que ali ocorria. Uma vez que foi constatado o saber “notório e geral” sobre as condições da fábrica, bem como a permissão estatal para que a fábrica funcionasse (através de alvará concedido pelo Ministério do Exército), a Corte considerou o Estado brasileiro responsável pelas violações aos artigos 4.1, 5.1, 19, 24 e 26 da Convenção, os quais se referem ao direito à vida, à integridade pessoal e aos direitos das crianças, às condições equitativas e satisfatórias que garantam a segurança, a saúde e a higiene no trabalho, aos direitos das crianças e ao direito à igualdade e à proibição de discriminação, mesmo a fábrica sendo de domínio privado. A Corte ressaltou, ainda, o dever do Estado de regulamentar, supervisionar e fiscalizar a prática de atividades perigosas, uma vez concedida a licença para a realização delas, apontando a negligência do Estado brasileiro para com esse dever, o que levou à morte das trabalhadoras e crianças da fábrica Vardo dos Fogos. A Comissão, por sua vez, conclui que “o Estado não só não cumpria seus deveres, mas foi tolerante e aquiescente com o ocorrido”. Isso não só porque medidas contra o funcionamento da fábrica não foram tomadas, mas também porque outras formas de mitigação e controle da vulnerabilidade da população local, como o fornecimento de empregos e educação adequada, também não foram devidamente tomadas pelo Estado, violando o disposto na Convenção Americana de Direitos Humanos.
Além disso, o Estado brasileiro também foi considerado responsável pela violação do direito às garantias e proteções judiciais, uma vez que o processo penal ineficaz e ineficiente do Estado com relação a esse caso dificultou o acesso à justiça de grande parte das famílias afetadas pela explosão.
CONCLUSÃO
Como lição, o caso nos deixou a clara ideia de que o Estado brasileiro é negligente no que tange ao cumprimento no estabelecido na Convenção Interamericana dos Direitos Humanos. Ainda, pode-se dizer que o Brasil ainda viola diversos outros tratados, como a própria Declaração dos Direitos Humanos da ONU, uma vez que casos como esses não são isolados, e trazem como característica como a discriminação contra grupos minoritários, como negros e mulheres.
Destaca-se, aqui, a seguinte citação:
O direito não consegue resolver o significado da igualdade para aqueles definidos como diferentes pela sociedade[footnoteRef:27]. [27: MINOW, Martha, 1990, p 9] 
Dessa citação, depreende-se dois fatores: a) o direito não pode ser aplicado sozinho, de maneira punitiva; e b) é preciso que sejam criados mecanismos que vão além da mera aplicação normativa e sim abranger o caráter educativo e social das normas. 
Não é novidade que tais premissas são explícitas nas convenções de direitos humanos das quais o Brasil é signatário. Mas, também se nota que as medidas legislativas tomadas não estão surtindo efeito, uma vez que ainda há descriminação tanto de gênero quanto de raça, bem como casos de tortura, agressão policial e outras atrocidades formalmente proibidas por tais tratados.
Sob essa perspectiva, entende-se que a extensão dos direitos humanos é limitada a um grupo privilegiado de pessoas brancas e do gênero masculino, o que era justamente o que as Convenções de Direitos Humanos queriam abolir do planeta. Os mecanismos de proteção aplicados não são e não serão suficientes caso não sejam mais rígidos e não abranjam novas formas de controle sobre as atitudes tomadas pelos Estados. Isso, entretanto, feriria o princípio da soberania estatal, o que significa que a principal forma de mudar tal cenário é o próprio Estado decidir se esforçar para que novas mudanças sejam feitas.
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BUCCI, Daniela; KOCH, Camila de Oliveira. A responsabilidade internacional do Estado por violação de direitos humanos por ato de particular: o caso Maria da Penha. Arecê, Direitos Humanos em Revista. Ano 1. Número 1. Junho de 2014.
BRASIL, Conselho Nacional de Justiça. Manual de Direitos Humanos, 2018. Disponível em: < https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2011/11/capitulo%203%20-%20human%20rights%20in%20the%20administration%20of%20justice%20portuguese.pdf>. Acesso em 19 de jun. de 2021
CASTANHEIRA, Beatriz Rizzo; GIANNELLA, Berenice Maria. Mecanismos de implementação dos direitos humanos no âmbito da ONU e da OEA, 2018. Disponível em: < http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/direitos/tratado2.htm> Acesso em 19 de junho de 2021
CAMPUZANO, Afonso de Julis. Los Derechos en la era del capitalismo internacional. O Poder das Metáforas – homenagem aos 35 anos de docência de Luiz Alberto Warat. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1988. p. 161. 
de, O.F.M. G. Direitos Humanos. São Paulo]: Grupo GEN,2016. 9788530968908. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788530968908/. Acesso em: 18 Jun. 2021 p1
MINOW, Martha. Making all the difference inclusion exclusion and American law. Nova Iorque, Cornell University Press, 1990
Oliveira, M.V. D. Curso de Direitos Humanos. São Paulo: Grupo GEN, 2019. 9788530988852. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788530988852/. Acesso em: 18 Jun 2021 p.20 
RAMOS, André de Carvalho. Teoria Geral dos Direitos Humanos na Ordem Internacional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 32.
RUGGIO, Rodrigo Alvez Pinto. Os Mecanismos de proteção dos direitos humanos e do direito internacional humanitário no tratado sobre comércio de armas. Disponível em: <http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=ca508b71f8e81b9b> Acesso em 19 de junho de 2021
TAVARES, Raquel. Direitos Humanos - De onde vêm, o que são e para que servem? Lisboa: INCM, 2012.
PIOVESAN, Flávia. Poder Judiciário e os Direitos Humanos. Revista USP. São Paulo, 2014. N. 101. P. 99-112.
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