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Introdução à Física Clássica I Prof. Neemias Alves de Lima 28 de julho de 2021 Escola de Ciências e Tecnologia, UFRN 13 - Sistema de partículas. Centro de massa. Na Aula 7 vimos que segunda lei de Newton do movimento pode ser escrita na forma ~Fres = d~p dt (1) onde ~p = m~v (2) é o momento linear de uma partícula de massa m e velocidade ~v. Nesta aula generalizaremos esta lei para um sistema de N partí- culas e aplicaremos o resultado em problemas que estão além do alcance da aplicação da versão ~Fres = m~a básica da segunda lei de Newton e do formalismo de trabalho e energia. 1 Sistema de partículas Considere um sistema de partículas de N (k = 1, 2, ...,N ) par- tículas e M (λ = 1, 2, ...,M ) partículas externas a este sistema, como ilustra a Figura abaixo. k λ A segunda lei de Newton para a k-ésima partícula do sistema de partículas é ~Fres,k = d~pk dt (3) 2 Podemos escrever a força resultante na partícula k como uma soma de dois termos: ~Fres,k = ~Fres,int,k + ~Fres,ext,k = d~pk dt (4) onde ~Fres,int,k = N∑ l( 6=k)=1 ~Fk,l (5) ~Fres,ext,k = M∑ λ=1 ~Fk,λ (6) k l λ ~Fk,l ~Fl,k ~Fk,λ ~Fλ,k k λ 3 Definimos como a força resultante sobre o sistema como a soma das forças sobre todas as k partículas do sistema: ~Fres = ~Fres,int + ~Fres,ext = d~P dt (7) onde ~Fres,int = N∑ k=1 ~Fres,int,k (8) ~Fres,ext = N∑ k=1 ~Fres,ext,k (9) ~P = N∑ k=1 ~pk (10) 4 Pela terceira lei de Newton para cada força interna ~Fk,l existe outra força interna ~Fl,k de mesmo módulo e direção oposta, como ilustra a Figura, isto é, ~Fl,k = −~Fk,l (11) portanto, ~Fres,int = N∑ k=1 ~Fres,int,k = N∑ k=1 N∑ l(6=k)=1 ~Fk,l = 0 (12) Assim, a segunda lei de Newton para um sistema de partículas é ~Fres,ext = d~P dt (13) 5 Centro de massa Conhecida as posições ~rk das N partículas de um sistema, qual ponto do espaço podemos chamar de posição do sistema de par- tículas? Seja M a massa do sistema de partículas M = N∑ k=1 mk (14) O momento linear do sistema em termos das massas e posições das partículas é ~P = N∑ k=1 ~pk = N∑ k=1 mk~vk = N∑ k=1 mk d~rk dt = d dt N∑ k=1 mk~rk (15) 6 Vamos chamar de centro de massa (CM) o ponto ~rCM no espaço que descreve a posição do sistema de partículas. Podemos escre- ver o momento linear do sistema como um produto de sua massa M pela velocidade do seu CM, ou seja, ~P = M~vCM = M d~rCM dt = d dt M~rCM (16) Igualando (15) com (16), segue que a posição do CM de um sistema de partículas é ~rCM = 1 M N∑ k=1 mk~rk (17) E, tomando a derivada de (17), a velocidade do CM é ~vCM = 1 M N∑ k=1 mk~vk (18) 7 Para sistemas contínuos, como um corpo rígido, a posição do CM é dada pela integral a ~rCM = 1 M ∫ ~rdm (19) Este cálculo pode ser complexo, porém podemos fazer algumas afirmações gerais se levarmos em conta a simetria e a distribuição de massa em um corpo: se a distribuição de massa é homogênea, o CM coincide com o centro geométrico (CG) do corpo; se existe um eixo de simetria, o CM está situado sobre esse eixo. Saber a localização do CM de um objeto é muito importante na engenharia, o cálculo errado pode levar a um desastre! (Por quê?) 8 CM de alguns sólidos geométricos: CM CM CM CM de alguns objetos: CM CM CM 9 Movimento do centro de massa Substituindo (16) em (13): ~Fres,ext = d dt M~vCM (20) Se a massa M do sistema de partículas é constante, temos ~Fres,ext = M~aCM (21) Este resultado mostra que embora o movimento de um sistema de partículas possa ser complexo, o movimento do seu CM pode ser bem simples. 10 Por exemplo, quando um lançamos um graveto, o movimento do seu CM, desprezando os efeitos da resistência do ar, é igual ao de um projétil pois a única força externa que age nele é a força peso ~P = m~g, e portanto ~aCM = ~g. y x CM v0 g CM v1 g CM v2 g 11 Exemplo 13.1 - Um projétil lançado no ar ao nível do solo apresenta um alcance de 55 m. No ponto mais alto de sua tra- jetória ele explode, fragmentando-se em duas partes de massas idênticas. Imediatamente após a explosão um de seus fragmen- tos apresenta uma velocidade instantânea nula, e cai em linha reta em direção ao solo. Onde o outro fragmento cairá? Des- preze a resistência do ar. 12 A Figura abaixo ilustra a trajetória do CM do projétil, com al- cance horizontal de 55 m, e as posições das partes 1 e 2 ao longo do eixo x e altura y = 0 quando caem no solo. y xCM xCM = 55 m m1 = M/2 x1 = 55/2 m m2 = M/2 x2 A relação entre as posições xCM , x1 e x2 é dada por xCM = 1 M N∑ k=1 mkxk 13 Substituindo os valores dados no problema, temos: 55 = 1 ��M [ ��M 2 55 2 + ��M 2 x2] 55 = 55 4 + x2 2 x2 = 2(55 − 55 4 ) = 82, 5 Logo o pedaço 2 caiu a uma distância de 82,5 m do ponto de lançamento! 14 Exemplo 13.2 - Sofia tem 50,0 kg e está em uma canoa de 60,0 kg e 4,0 m que repousa na superfície de uma calma lagoa. Ela caminha a partir de um ponto situado a 1,0 m de uma das extremidades da canoa até atingir a outra extremidade da canoa. Desprezando a resistência da água ao movimento da canoa, que distância a canoa se move? 15 A Figura abaixo ilustra as situações inicial (i) e final (f ) da canoa e de Sofia. Supomos que ~Fres,ext = 0, então a posição xCM do CM do sistema (Sofia e canoa) permanece no mesmo lugar quando Sofia se move de uma posição para outra na canoa. Escolhemos o referencial fixo na terra com x = 0 no CM da canoa, tal que xC ,i = 0. x y 0 mC xC ,i mS xS,i Situação inicial x mC xC ,f mS xS,f xCM Situação final 16 Se Sofia está do lado direito da canoa, onde a extremidade da canoa está inicialmente em x = 2, 0 m, então Sofia está em xS,i = 2, 0 − 1, 0 = 1, 0 m. O CM do sistema (de massa M = 50, 0 + 60, 0 = 110, 0 kg) está em xCM = 1 110, 0 [50, 0(1, 0) + 60, 0(0)] = 50, 0 110, 0 m Quando Sofia se desloca para a outra extremidade da canoa, o CM da canoa se move por um deslocamento ∆x = xC ,f −�� 0 xC ,i = xC ,f , como ilustra a Figura. Como consequência disso, a posição da extremidade esquerda da canoa para onde Sofia vai é xS,f = −2, 0 +∆x. 17 Como o CM do sistema de partículas (canoa e Sofia) não muda, então xCM = 1 110, 0 [50, 0(−2, 0 +∆x) + 60, 0(∆x)] = 50, 0 110, 0 Resolvendo para ∆x: −100, 0 + 110, 0∆x = 50, 0 ∆x = 150, 0 110, 0 = 1, 36 m Portanto, a canoa se moveu de 1,36 m no sentido contrário ao movimento de Sofia. 18 Exemplo 13.3 - Um canhão de massa igual a 580 kg quando está rigidamente aparafusado à Terra dispara horizontalmente uma bola de 90 kg com uma velocidade inicial de 500 m/s. Su- ponha que o canhão seja desparafusado da Terra, e que nenhuma força externa se oponha ao seu recuo, qual seria a velocidade da bala nesta circunstância? E a velocidade de recuo do canhão? (Dica: Em ambos casos, suponha que a pólvora queimada trans- mite a mesma energia cinética ao sistema). 19 Supondo que o canhão está desparafusado da Terra, e que ne- nhuma força externa se oponha ao seu recuo, então a força re- sultante externa sobre o sistema canhão + bola é desprezível no intervalo de tempo em que ocorre o disparo. Assim, aplicando a segunda lei de Newton ao sistema, temos para um disparo hori- zontal (ao longo do eixo x): ��� 0 F res,ext,x = MaCM ,x aCM ,x = 0 vCM ,x = constante Como o sistema estava inicialmente em repouso, para os estados inicial (i) (imediatamente antes do disparo) e final (f) (imediata- mente após o disparo) temos vCM ,fx = vCM ,ix = 0 (1) 20 A Figura a seguir ilustra os estados inicial (i) e final (f) do sis- tema. x mc mb vc,ix = vb,ix = 0 Situação inicial (i) x mc mbvc,fx vb,fx Situação final (f) De (1) temos vCM ,fx = 1 M (mbvb,fx + mcvc,fx) = 0 mbvb,f − mcvc,f = 0 portanto, vc,f = mb mc vb,f (2) 21 Se a pólvora queimada transfere a mesma energia cinética ao sistema independente do canhão estar parafusado (p) ou despa- rafusado (d), temos que Kd,f = Kp 1 2 mcv2c,f + 1 2 mbv2b,f = 1 2 mbv2b,p (3) onde vb,p é a velocidade da bola quando o canhão está parafusado. Substituindo(2) em (3) e resolvendo para vb,f : mc( mb mc vb,f )2 + mbv2b,f = mbv2b,p 22 ��mb( mb mc + 1)v2b,f =��mbv2b,p vb,f = vb,p√ 1 + mb/mc Portanto: vb,f = 500√ 1 + 90/580 = 465 m/s e, por (2), vc,f = 90 580 465 = 72 m/s 23 Exercícios 13.1 Um projétil de 1,56 kg é disparado diretamente para cima com velocidade inicial de 31 m/s em uma vasta planície plana. Ele explode no pico de sua trajetória, partindo-se em três partes de massas diferentes. Uma parte de 0,78 kg chega à terra a 212 m a norte do morteiro, e outra parte de 0,26 kg chega à terra a 68 m a leste do morteiro. Desprezando-se as forças de atrito e a velocidade do vento, onde chegará à terra a terceira parte? 24 13.2 Romeu (77,0 kg) entretém Julieta (55,0 kg) tocando sua guitarra na parte traseira de seu barco (80,0 kg) que está em re- pouso em água parada, 2,70 m afastado de Julieta, que está na parte da frente do barco. Depois da serenata, Julieta se move cuidadosamente para a traseira do barco para dar um beijo em Romeu. Que distância o barco se move em relação a um referen- cial fixo na terra? 25 13.3 Um pequeno bloco de massa m1 = 0, 500 kg é liberado do repouso no topo de uma cunha de forma curva, sem atrito, de massa m2 = 3, 00 kg, que está em uma superfície horizon- tal também sem atrito, como mostrado na Figura. (a) Qual é a velocidade da cunha depois que o bloco atinge a superfície hori- zontal com uma velocidade v1 = 4, 0 m/s? (b) Qual é altura h da cunha? m2h m1 Situação inicial m2 v2 m1 v1 Situação final 26 Respostas 13.1 320 m do ponto de lançamento, 84◦ do oeste para o sul. 13.2 O barco se move de 0,70 m em relação a um referencial fixo na terra, e na direção e sentido oposto ao movimento de Julieta. 13.3 (a) 0,67 m/s; (b) 95 cm. 27 13 - Sistema de partículas. Centro de massa.