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TUTORIA 4 - UC 13 Karolina Cabral Machado - P5 2021.2 fonte:Cap. 64 (Dor:Princípios e práticas), Cap. 14 (Farmacologia ilustrada), Cap. 31 (Katzung) TEMA: DOR ONCOLÓGICA 1- DISCUTIR OS ASPECTOS FISIOPATOLÓGICOS DA DOR ONCOLÓGICA (CLASSIFICAÇÃO, QUADRO CLÍNICO); Das síndromes dolorosas relacionadas ao câncer, refere que entre 62 e 78% são devidas ao tumor, por infiltração ou invasão tumoral direta ou por metástases; 19 a 28% são devidas ao diagnóstico e tratamentos do câncer, por iatrogenia e complicações inerentes aos métodos diagnósticos e terapêuticos; e 3 a 10% não estariam relacionadas ao tumor, nem ao tratamento instituído. A etiologia da dor crônica relacionada ao câncer pode ser difícil de ser caracterizada, pois muitos pacientes, principalmente aqueles com doença avançada, possuem múltiplas etiologias e várias fontes de dor. ● Etiologias: - Causadas pelo tumor: A infiltração óssea tumoral é a causa mais comum de dor no câncer, podendo manifestar-se localmente ou à distância, pelo mecanismo de dor referida. A dor óssea ocorre por conta de estimulação nociva nos nociceptores no periósteo e se manifesta com sensação de dolorimento constante, profundo, às vezes contínuo, e surge com os movimentos (dor incidental). A infiltração ou com pressão de troncos, plexos e/ou raízes nervosas pelo tumor, linfonodos e/ou fraturas ósseas metastáticas pode determinar dor aguda de forte intensidade, resultando em plexopatia, radiculopatia ou neuropatia, ou seja, dor na distribuição da estrutura nervosa acometida, com apresentação de dor em queimação, contínua, hiperestesia, disestesia e perda progressiva da sensibilidade. Pode ocorrer dor por invasão tumoral na medula espinal, no encéfalo e em suas meninges. A dor radicular surge por compressão ou infiltração da medula espinal, com alteração motora, sensitiva e autonômica distais ao local da lesão. As células tumorais podem infiltrar e/ou ocluir os vasos sanguíneos e linfáticos, ocasionando vasospasmo, linfangite e possível irritação nos nervos aferentes perivasculares. O crescimento tumoral nas proximidades dos vasos sanguíneos leva à oclusão desses vasos parcial ou totalmente, produzindo estase venosa ou isquemia arterial, ou ambos. A isquemia causa dor e claudicação. A estase venosa produz edema nas estruturas supridas por esses vasos. A oclusão arterial produz isquemia e hipóxia com destruição celular. Esses mecanismos causam dor normalmente difusa, cuja intensidade aumenta com a progressão do processo. A oclusão de órgãos dos sistemas digestório, urinário e reprodutivo produz obstrução do esvaziamento visceral e determina contratura da musculatura lisa, espasmo muscular e isquemia, produzindo dor visceral difusa (tipo cólica) constante, com sensação de peso ou pobremente localizada, referida nas áreas de inervação da víscera comprometida. Órgãos como linfonodos, fígado, pâncreas e supra-renais podem vir a apresentar dor devido à isquemia ou distensão de suas cápsulas. Nos tumores de cabeça e pescoço (boca, orofaringe, lábio e face), tumores do TGI e geniturinário, podem ocorrer ulceração das membranas mucosas, infecção e necrose, e ulceração determinando dor intensa. TUTORIA 4 - UC 13 Karolina Cabral Machado - P5 2021.2 - Causadas pelo tratamento do tumor: Cerca de 19% dos pacientes com câncer apresentam dor secundária ao tratamento. Na fase aguda pós-cirúrgica, a dor decorre do processo inflamatório traumático de cirurgias, como toracotomias, esternotomias, amputações e mastectomias. Na fase crônica, a dor ocorre devido ao câncer recidivado localmente. O trauma ocasionado em estruturas nervosas, durante o procedimento cirúrgico, resulta, com um ente, em dor persistente além do normal, chamada neuralgia pós-cirúrgica. A dor pós-radioterapia apresenta-se como exacerbação aguda de dor crônica relacionada ao posicionamento para a terapia, queimaduras cutâneas, neuropatia actínica, produção de tumores primários de nervos periféricos secundários à radiação, entre outros. Após a radioterapia, pode ocorrer fibrose de forma lenta e progressiva, ocasionando lesão nas adjacências dos nervos, com dor em queimação e disfunção do sistema somatossensorial. A dor pós-quimioterapia pode ocorrer por polineuropatias periféricas, causadas por drogas imunossupressoras podendo ser de caráter transitório ou definitivo. Existem as mucosites (oral, faríngea, gastroduodenal e nasal) induzidas por leucopenia ou irradiação. - Não relacionadas ao tumor: Representam 3% do total e possuem as causas mais variadas possíveis que não tenham relação direta com o câncer. ● Tipos: A dor no câncer tem as características da dor crônica ou persistente, sendo decorrente de processo patológico crônico, podendo envolver estruturas somáticas ou viscerais, bem como estruturas nervosas periféricas e/ou centrais, isoladas ou em associações, cursando com dor contínua ou recorrente por meses ou anos. A intensidade da dor relaciona-se geralmente ao estágio da doença. A natureza da dor nociceptiva somática é descrita como dolorosa, latejante, pulsátil ou opressiva. A dor por excesso de nocicepção (nociceptiva) é a mais comum no câncer. É causada por estímulos aferentes de grande intensidade, nocivos ou lesivos, produzidos por processo inflamatório ou infiltração de tecidos pelo tumor, capazes de atingir o alto limiar de excitabilidade do nociceptor e gerar a dor. A dor nociceptiva ocorre como resultado da ativação e sensibilização dos nociceptores em tecidos cutâneos e profundos. A dor é neuropática se a avaliação sugerir que é mantida por processos somatossensoriais anormais no SNP ou SNC. Ela surge quando há disfunção do SNP e/ou do SNC, por invasão tumoral ou pelo tratamento do câncer (cirurgia, radioterapia e/ou quimioterapia). O que ocorre é um a disfunção das vias que transmitem dor, levando a um a transmissão crônica dos sinais dolorosos. Como a dor por desaferentação não aparece em todos os pacientes com lesões similares, admite-se que haja fatores genéticos envolvidos em sua ocorrência. Pode ser descrita pelos pacientes com ardor, formigamento ou choque elétrico. A dor pode ser psicogênica se houver evidência positiva de que os fatores psicológicos predominam na manutenção do sintoma sem nenhuma evidência de causa orgânica. A dor visceral é do tipo cãibra ou cólica, aperto ou latejante. A dor pode ser um dos primeiros sinais da doença, não sendo necessário aguardar o diagnóstico definitivo, como resultado histopatológico de uma biópsia já realizada para dar início à terapia antálgica. TUTORIA 4 - UC 13 Karolina Cabral Machado - P5 2021.2 Em virtude de sua vasta etiologia, a dor no câncer geralmente é mista, podendo estar presente os dois mecanismos básicos de produção da dor: excesso de nocicepção (dor nociceptiva) e desaferentação (dor neuropática). A dor incidental ocorre quando o controle da dor basal é alcançado, e, ainda assim, o paciente apresenta episódios de dor em picos, de início súbito e agudo. Pode ocorrer espontaneamente ou estar relacionado aos movimentos (pacientes com infiltração óssea), com o também pode ocorrer em consequência de prescrição analgésica com doses e intervalos inadequados. 2- CONHECER O USO DE ESCADA ANALGÉSICA DA DOR DA OMS; Como a dor é uma experiência subjetiva e referida pelo paciente, não pode ser objetivamente quantificada, sendo acessada, indiretamente, por instrumentos de medida padronizados. Diversas escalas têm sido desenvolvidas para auxiliar na mensuração da intensidade da dor. Dentre elas, destacam-se a escala visual analógica (EAV), que consiste em uma linha reta, não numerada, com indicação de “sem dor” e “pior dor imaginável” nas extremidades, e a escala numérica visual (EVN), graduada de 0 a 10, onde zero significa “sem dor” e 10 significa “pior dor imaginável”. Existe também a escala descritiva verbal de intensidade da dor, com a seguinte graduação: 0 = sem dor; 1, 2, 3 = dor fraca; 4, 5, 6 = dor moderada; 7, 8, 9 = dor intensa; e 10 = dor insuportável. O 1º degrau da escada analgésica preconizada pela OMS sugerea utilização de medicamentos não-opióides associados aos coadjuvantes para dores de fraca intensidade. O 2º degrau recomenda a utilização de analgésicos opióides fracos associados ou não aos medicamentos não-opióides e aos coadjuvantes para as dores de moderada intensidade. O 3º degrau sugere a utilização de opióides fortes associados ou não aos medicamentos não-opióides e aos coadjuvantes para dores de forte intensidade. Os três degraus da escada analgésica sugerem classes de medicamentos e não drogas específicas, oferecendo ao clínico a liberdade para sua utilização. Os opióides parenterais podem ser administrados por via intravenosa (IV), subcutânea (SC) ou intramuscular (IM). A via IM deve ser evitada, por ser irritante, dolorosa, poder causar necrose tecidual, sendo, portanto, desaconselhável a sua utilização. Se a IV não estiver disponível, a administração subcutânea (hipodermóclise) de opióides é satisfatória, apesar de os níveis séricos não serem estáveis e de depender da absorção e perfusão local. TUTORIA 4 - UC 13 Karolina Cabral Machado - P5 2021.2 3- DEFINIR ANESTESIA E SUAS CLASSIFICAÇÕES (BLOQUEIO NEUROLÍTICO); Anestesia é definida como a perda da função sensitiva. Desse modo, os anestésicos são fármacos capazes de bloquear as capacidades sensitivas do organismo, sendo utilizados no alívio da dor e bloqueio de outras funções sensitivas para realização de procedimentos médicos invasivos. A anestesia geral é utilizada quando se deseja provocar depressão global do SNC, levando a perda da percepção e resposta aos estímulos externos, cursando com perda da consciência, amnésia anterógrada, analgesia, inibição dos reflexos autônomos e relaxamento da musculatura esquelética. Anestesia do neuro-eixo (bloqueio segmentar): - Raquianestesia: Administração direta do anestésico no espaço subaracnóideo (via intratecal). Deve ser feita a partir de L3/L4 para que não haja comprometimento da cauda equina. - Peridural: A anestesia peridural (ou epidural) é um tipo de anestesia aplicada no espaço peridural da coluna vertebral onde estão as raízes nervosas, sem perfurar a dura máter e, portanto, sem atingir o líquor. Não atinge o líquor e, por isso, não é sistêmico e não vai se disseminar. - Bloqueios periféricos: Infiltração do nervo periférico com anestésico local para que haja atenuação de respostas motoras e sensitivas além de fornecer analgesia. Pode ser feito com auxílio da USG e estimulador de nervo periférico. - Local: Injeção do anestésico local na pele ou subcutâneo. Existem procedimentos que podem ser utilizados nos pacientes com dor oncológica. Esses procedimentos têm sido considerados como o 4º degrau da escada analgésica; sendo procedimentos invasivos, devem ser bem avaliados quanto aos benefícios e efeitos adversos. Existem os bloqueios nervosos temporários e os definitivos, bloqueio neural simpático, administração de radiofármacos e radioterapia paliativa. Os bloqueios temporários são importantes na decisão de um bloqueio definitivo, no implante de cateter peridural ou no diagnóstico de prova. Quando indicado o bloqueio definitivo, essa neurólise (destruição da estrutura nervosa) pode ser realizada através de substâncias químicas (álcool ou fenol), termoablação (radiofrequência com laser) ou destruição neurocirúrgica. A neurólise do plexo celíaco é indicada para dor nos casos de câncer de estômago, pâncreas, intestino delgado, fígado, supra-renais e rins. A dor do câncer pélvico pode ser abordada pelo bloqueio hipogástrico superior (reto, próstata e útero). O bloqueio do gânglio estrelado (cérvicotorácio) beneficia dores nos membros superiores; o bloqueio de gânglio trigeminal é indicado na inervação trigeminal. A neurólise intratecal e epidural está em desuso pela grande ocorrência de efeitos como disfunção dos esfíncteres, paralisias e parestesias. A maioria desses bloqueios é apenas um paliativo, pois existe falha do procedimento (taxa de sucesso de 70 a 80%), o reagrupamento neural. No geral, pode-se reduzir em 30% a dose dos analgésicos com melhora no quadro doloroso do paciente. 4- ENTENDER O MECANISMO DE AÇÃO DOS OPIOIDES (relacionado à dor neoplásica); Todos os opioides agem ligando-se a receptores opioides específicos no SNC para produzir efeitos que imitam a ação de neurotransmissores peptídeos endógenos (p. TUTORIA 4 - UC 13 Karolina Cabral Machado - P5 2021.2 ex., endorfinas, encefalinas e dinorfinas). Os efeitos mais importantes dos opioides são mediados por três famílias de receptores, designadas comumente µ (mi), κ (capa) e δ (delta). A propriedade analgésica dos opioides é mediada primariamente pelos receptores μ, que modulam respostas nociceptivas térmicas, mecânicas e químicas. Os receptores κ no corno dorsal também contribuem para a analgesia modulando a resposta à nocicepção química e térmica. As encefalinas interagem mais seletivamente com os receptores δ na periferia. Os três receptores opioides são membros da família de receptores acoplados à proteína G e inibem a adenililciclase. Eles também estão associados a canais iônicos, aumentando o efluxo pós-sináptico de K+ (hiperpolarização) ou reduzindo o influxo pré-sináptico de Ca2+, impedindo, assim, o disparo neuronal e a liberação do transmissor. A morfina é o principal fármaco analgésico presente no ópio bruto, sendo o protótipo do agonista μ potente. Atua também em receptores κ na lâmina I e II do corno dorsal da medula espinal. Ela diminui a liberação de substância P que modula a percepção da dor na medula espinal. A morfina também parece inibir a liberação de vários transmissores excitatórios dos terminais nervosos (dolorosos). Devido à sua eficácia, disponibilidade em todo o mundo e baixo custo, a OMS considera a morfina como droga-padrão para o tratamento da dor no câncer. - TOLERÂNCIA x DEPENDÊNCIA NO USO DE OPIOIDES: A tolerância é a necessidade de doses maiores de opióides para manter a analgesia inicial devido a um estado de adaptação dos receptores expostos à dose contínua; existem pacientes que recebem a mesma dose de morfina por longos períodos;. Clinicamente, tem sido descrita como uma necessidade de doses crescentes de opioides para obter a analgesia observada no início da administração de opioides. A tolerância desenvolve-se mais rapidamente quando são administradas grandes doses a intervalos TUTORIA 4 - UC 13 Karolina Cabral Machado - P5 2021.2 curtos, enquanto é minimizada pela administração de pequenas doses a intervalos maiores. A tolerância cruzada constitui uma característica extremamente importante dos opioides, isto é, pacientes com tolerância à morfina com frequência exibem redução da resposta analgésica a outros opioides agonistas. Isto é particularmente verdadeiro no caso de fármacos com atividade agonista, sobretudo nos receptores mi. Entretanto, a tolerância cruzada observada entre os agonistas dos receptores mi pode ser parcial ou incompleta. Os opióides podem também possuir tolerância cruzada incompleta, como a morfina e a metadona, devido aos mecanismos de ação e afinidade de receptores diferentes. Essa observação clínica levou ao conceito de “revezamento de opioides”, que tem sido utilizado durante muitos anos no tratamento da dor causada pelo câncer. A dependência é um estado de adaptação ao uso crônico de determinado fármaco ou substância, que se manifesta por um quadro de abstinência após a interrupção aguda, rápida redução da dose, diminuição dos níveis séricos sanguíneos ou administração de um antagonista desta substância. Os sinais e sintomas de abstinência consistem em rinorreia, lacrimejamento, bocejos, calafrios, arrepios (piloereção), hiperventilação, hipertermia, midríase, dores musculares, vômitos, diarreia, ansiedade e hostilidade. O vício é uma doença neurobiológica crônica primária. Sofre influência considerável de fatores genéticos, psicossociais e ambientais. Caracteriza-se por comportamento: falta de controle sobre o uso de determinada substância (compulsão), uso contínuo da mesma apesar de prejuízos à saúde e à vida social, profissionale familiar e ânsia, craving (noia), pelo efeito desta substância. Uma hipótese para o desenvolvimento de tolerância e dependência aos opioides baseia-se no conceito de reciclagem do receptor. Normalmente, a ativação dos receptores mi por ligantes endógenos resulta em endocitose, seguida de ressensibilização e reciclagem do receptor para a membrana plasmática. Estudos demonstram que a incapacidade da morfina de induzir a endocitose do receptor opioide mi constitui um importante componente da tolerância e da dependência. Há, também, hipóteses de que a tolerância resulta de uma disfunção das interações estruturais entre o receptor mi e as proteínas G, os sistemas de segundos mensageiros e seus canais iônicos-alvo.
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