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Favelas e tragédias

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1 Laís Kist de Almeida – ATM 2024/2 
FAVELAS E TRAGÉDIAS 
 
FAVELA 
• A modernização da produção agrícola torna o campo pouco atrativo para o pequeno 
produtor e contribui para a migração para as cidades; 
• Características do trabalho urbano: baixa qualificação, maior informalidade e menor 
remuneração; 
• Políticas de habitação pouco inclusivas; 
• As metrópoles brasileiras marginalizam, apesar das políticas públicas de inclusão social, um 
amplo conjunto de populações ainda excluídas do trabalho, renda e seguridade social. 
• FAVELAS: processos marginais de ocupação irregular que formam vastos territórios; 
• Favelização das cidades é uma realidade nos países em desenvolvimento; expansão das 
favelas. 
• A expansão das favelas tem sido observada tanto em momentos de crescimento econômico 
quanto nos de recessão, queda salarial e desemprego, corroborando que a favela parece 
ser um acontecimento inerente à desigualdade social. 
 
FAVELA, PROBLEMA OU SOLUÇAÕ? 
• O termo favela em geral é usado para destacar tais territórios do restante da cidade, 
atribuindo significados variados; 
• Caráter depreciador: problema urbano, aglomerado de miséria, violência, atividades 
marginais e desordem; → Por outro lado: espaço de identidade popular urbana, riqueza 
cultural e rede de apoio e solidariedade comunitárias; 
• Locais onde emergem novos movimentos sociais em busca de cidadania e direitos, 
principalmente através de ações políticas que envolvem a juventude em diversos 
movimentos culturais, como a literatura, a música e as artes audiovisuais; 
• Dependendo da perspectiva do ator social, a favela pode ser considerada tanto um 
problema a ser enfrentado como uma solução urbana adaptativa às dificuldades de 
sobrevivência em sociedades caracterizadas pela desigualdade social. 
 
CARACTERÍSTICAS: 
População e localização: 
• Região Sudeste: maior concentração de favelas; 
• 59,3% da população residente (6.780.071 pessoas) está concentrada nas regiões 
metropolitanas de São Paulo, Rio de Janeiro, Belém, Salvador e Recife. 
 
Estrutura: 
• Quase 50% das favelas são formadas em áreas de aclive – dificuldade de circulação de 
pessoas e risco de deslizamentos de terra; 
• Domicílios em geral com pouco espaço entre si, alta umidade e baixa ventilação, cômodos 
pequenos, de pouca privacidade e maior vulnerabilidade à alternância de temperatura; 
• A falta de planejamento nos bairros predispõe a uma maior vulnerabilidade a adversidades 
climáticas, a incêndios e a acidentes elétricos. 
• Falta de espaços abertos para crianças brincarem em segurança, para a prática de esporte 
e para o lazer; 
 
2 Laís Kist de Almeida – ATM 2024/2 
• Programas de renovação de bairros pobres costumam desconsiderar as necessidades dos 
moradores, são desatreladas de ações intersetoriais e se limitam a pequenas áreas – pouco 
impacto na saúde. 
 
Idade e sexo: 
 
 
Cor: 
• A população residente de favelas é composta predominantemente por pretos e pardos. 
 
Emprego, renda e escolaridade: 
 
SAÚDE NA FAVELA: 
• Muitos fatores com impacto no padrão de distribuição de doenças, favorecendo a 
emergência de novas doenças e a reemergência de antigas endemias (dengue, covid, 
chagas), e na menor expectativa de vida, entre eles: 
 Falta de saneamento básico e estruturas habitacionais; 
 Consumo de drogas e mortes por acidentes e violência urbana; 
 Crescente vulnerabilidade social e ampliação da segregação social aliada a racismo, 
desemprego, dificuldade de acesso a computador, ensino. 
 Fatores determinantes de saúde → condições aliadas aos fatores de vida. Da pra perceber 
melhor nessa população principalmente por causa da menor expectativa de vida deles. 
 
 
3 Laís Kist de Almeida – ATM 2024/2 
 
Violência: 
• O convívio cotidiano com a violência influencia toda a sua dinâmica social e as relações 
interpessoais: 
 Não é incomum ser observada uma maneira afrontosa no trato com os outros, muitas vezes 
repercutindo na relação com as equipes de saúde; 
 Violência representa sofrimento emocional, medo, impotência e adoecimento; 
 O sofrimento pela incapacidade proteger a si e à família está relacionado à alta prevalência de 
transtornos de ansiedade e depressivos e ao aumento de atendimentos por somatizações durante 
períodos de maior tensão ou repressão. 
 
A Lei dos Cuidados Inversos 
Tudor Hart, 1971: “A disponibilidade de recursos em saúde é inversamente proporcional às 
necessidades de saúde de uma população.” 
Em geral, as populações menos vulneráveis tem melhores condições, melhores expectativa e 
qualidade de vida. Disponibilidade de recursos é imensa. Populações mais vulneráveis tem 
determinantes sociais muito piores, que influenciam muito negativamente em suas vidas, elas 
precisariam de melhores recursos de saúde com mais acesso → mas são os que menos tem esse 
acesso. 
 
A PRÁTICA MÉDICA NA FAVELA: 
• A demanda por cuidado em contexto de favela é marcada por precariedade do território e 
vulnerabilidade social, produzindo angústia nas equipes, sensação de impotência e 
adoecimento pessoal; 
• Exige um trabalho de compreensão dos processos de determinação social da saúde e o 
exercício contínuo da Medicina Centrada na Pessoa; 
• Histórias clínicas marcadas por um enredo de opressão, exclusão e violência não são 
incomuns e produzem efeitos na relação entre profissionais de saúde e pacientes e na 
própria dinâmica de funcionamento da equipe; 
• Necessidade de construção de vínculos de confiança; dinamismo e para manejar a intensa 
imprevisibilidade e a pluralidade de situações vividas no cotidiano da favela; habilidades 
para lidar com famílias com estruturas diversas, com a cultura e a história do território, a 
religiosidade, e a violência enquanto fator de sofrimento e adoecimento; 
• Praticar a Medicina com o propósito de promoção da autonomia, evitar culpabilizar a vítima. 
• O trabalho do médico na favela demanda uma análise ampliada da compreensão da 
realidade brasileira, e as competências essenciais exigidas do profissional vão além do 
conhecimento biomédico tradicional; 
 
4 Laís Kist de Almeida – ATM 2024/2 
• As complexas camadas de vulnerabilidades e condicionantes sobrepostas muitas vezes 
exigem ações distantes da realidade da equipe de saúde, mas possíveis de serem 
alcançadas com eficácia e sustentabilidade quando articuladas em rede intersetorial; 
• Parece ser uma boa estratégia manter uma rede de contatos operante, que estimule o 
diálogo com as organizações e lideranças comunitárias, instituições religiosas, filantrópicas, 
empresas, centros de cultura, esporte e lazer de todas as naturezas, além das escolas e 
dos centros assistenciais do Estado; 
• Consultórios na rua: há pessoas que vivem nas comunidades em situação de rua, muitas 
vezes sem domicílio fixo, em uma conjuntura de extrema vulnerabilidade, que inclui o uso 
problemático de drogas; 
• A exposição a um contexto de necessidades e potencialidades permite desenvolver 
sensibilidade ímpar, aprendizado pessoal e profissional, compromisso e parceria com as 
dualidades do modo de vida de uma população desfavorecida e inventiva, excluída e 
resiliente. 
 
Organização do trabalho: 
• Desafio: Pressão assistencial, complexidade dos casos, grande vulnerabilidade da 
população e dificuldades de apoio de uma rede de saúde ainda pouco estruturada; 
• No complexo contexto do cuidado na favela, facilitar o acesso é essencial para o 
estabelecimento do cuidado: não são recomendadas medidas como fragmentação de 
turnos de agendas por grupos/ações prioritárias e estratégias de acolhimento em grupo. 
 
 
Segurança da equipe de saúde: 
• Efeito da violência armada nos territórios de favela afeta o funcionamento dos serviços de 
saúde e põe em risco a segurança dos trabalhadores e usuários; 
• Ferramenta de estratificação de risco “Acesso Seguro”, do Comitê Internacional da Cruz 
Vermelha:5 Laís Kist de Almeida – ATM 2024/2 
 
 
TRAGÉDIAS: 
 
CONCEITOS: 
• Sinistrologia: área do conhecimento humano que se preocupa com os desastres; 
• Medicina dos desastres: área do conhecimento médico que se ocupa da prevenção, do 
atendimento imediato, da recuperação e da reabilitação de pessoas com patologias 
adquiridas em circunstâncias de desastre - atividade multidisciplinar, relacionada com 
atendimento pré-hospitalar, planejamento hospitalar e dos serviços de saúde, medicina de 
urgência, medicina do trabalho, infectologia, nutrição, serviço social, saúde mental, saúde 
pública, vigilância sanitária, vigilância epidemiológica e ecologia humana; 
• Desastre: situação que resulta de eventos adversos sobre um ecossistema vulnerável. Tais 
eventos podem ser naturais e/ou provocados pelo homem, causando grave perturbação ao 
funcionamento de uma comunidade ou sociedade, envolvendo extensivas perdas e danos 
humanos, materiais, econômicos ou ambientais, que excede a sua capacidade de lidar com 
o problema usando meios próprios; 
• No entanto, de acordo com a concepção social, desastre é um processo que está inserido 
em uma sociedade em transformação e o produto de um modelo global de desenvolvimento 
que expõe as pessoas a situações de vulnerabilidade. 
 
TRAGÉDIA E VULNERABILIDADE: 
• Em grande parte, o aumento dos desastres pode ser explicado pelo processo de 
urbanização descontrolado de nossa sociedade: 
 
• Mais de 90% das mortes por desastre em todo o mundo ocorrem nos países mais pobres - 
a intensidade dos desastres depende muito mais do grau de vulnerabilidade do território e 
das comunidades afetadas do que da magnitude do evento adverso. Um terremoto de 6,5 
 
6 Laís Kist de Almeida – ATM 2024/2 
graus na escala Richter provoca diferentes impactos: cinco óbitos na Califórnia, 20 mil no 
Cairo e 40 mil na Armênia. 
 
CLASSIFICAÇÃO DOS DESASTRES: 
 
 
EPIDEMIOLOGIA NACIONAL DOS DESASTRES: 
• No Brasil, em 2013, foram oficialmente reportados 493 desastres naturais, os quais 
causaram 183 óbitos e afetaram 18.557.233 pessoas; 
• Quanto aos municípios, 4.433 foram afetados, sendo que 70,99% deles devido à 
seca/estiagem; 
• Terremotos ocorrem menos que nos países andinos, e há dificuldades de medir desastres 
biológicos (epidemias); 
• Região Sudeste: deslizamentos e as inundações - maior porcentagem de óbitos (121 - 12% 
do total nacional), tendo sido assolada por 158 desastres; 
• Região Nordeste: secas - maior porcentagem de afetados (64,37% do total nacional), 
poucos óbitos; 
• Região Norte: incêndios florestais e inundações; Região Centro-Oeste: incêndios florestais; 
e Região Sul: inundações, vendavais, chuvas de granizo, deslizamentos e estiagem; 
• Desastres, como enchentes do Sul e Sudeste e desnutrição devido as estiagens no 
Nordeste, têm caráter cíclico: descaso governamental pela ausência de políticas que 
possam prevenir novos eventos ou diminuir o seu impacto. 
 
FORÇAS ENVOLVIDAS NO ATENDIMENTO AOS DESASTRES: 
• A Defesa Civil é o órgão responsável por promover a defesa permanente contra desastres, 
prevenir ou minimizar danos, socorrer e assistir populações; 
• Os municípios devem estar preparados para atender imediatamente a população atingida, 
reduzindo perdas materiais e humanas: campanha “Construindo Cidades Resilientes”; 
 
7 Laís Kist de Almeida – ATM 2024/2 
municípios assinam o acordo mas não colocam em pratica, eles apenas reconhecem a 
possibilidade de ocorrência do desastre, mas não tomam medidas efetivas para se preparar 
para essas situações. 
• Em situações de desastres, vários setores devem fazer parte da estratégia de ajuda às 
pessoas: Forças Armadas, Corpo de Bombeiros, governos municipal, estadual e federal, 
ONGs, voluntários, moradores, profissionais locais e universidades; 
• Capacitar pessoas “comuns” da comunidade para que sejam efetivas em uma tragédia é 
uma necessidade para todas as faixas etárias, não apenas como medida preventiva, mas 
também na vigência do evento; no entanto, cabe lembrar que essas pessoas também são 
atingidas e estão fragilizadas - é preciso valorizar os saberes dos sujeitos que, 
costumeiramente, são desprezados por profissionais da saúde; 
• A fragmentação de esforços, todos válidos e necessários, já é uma característica 
institucional, que acaba por permanecer em situações de emergências; 
• É preciso oportunizar a todos uma mudança cultural, sabendo-se que um deficiente senso 
de percepção de riscos é a mais grave vulnerabilidade social das populações no que diz 
respeito à intensificação dos desastres - as atividades de educação em saúde podem 
começar na escola; 
• No entanto, no Brasil, apesar de se conhecer a importância de agir nos riscos, as ações 
ainda estão focadas para o momento da tragédia, viabilizando de forma precária os serviços 
de emergência e fornecimento de donativos, com pouca inserção de pessoal local. 
Mudança cultural → deficiência em perceber as situações dos riscos – atividade de 
educação em saúde para desastres devia começar nas escolas. Medidas de prevenção e 
de como se portar diante de situações de desastre. Maneira precária quando acontece o 
desastre. 
 
DESASTRES E A PRÁTICA MÉDICA: 
• O aumento dos registros e o impacto dos desastres no Brasil nos faz refletir acerca da 
necessidade de aprofundar a discussão sobre a atuação dos médicos para a intervenção na 
prevenção, na fase aguda e no pós-desastre, por meio de equipes multiprofissionais que 
possam atuar na complexidade do evento traumático; 
• Além disso, é importante que esses profissionais possam contribuir na construção de 
políticas públicas voltadas para a prevenção de desastres e gestão de riscos, o que envolve 
investimentos no saneamento básico, nas condições de moradia, na educação e no meio 
ambiente; 
• É importante salientar que o desastre cria novos cenários e vulnerabilidades, demandando 
uma ação continuada dos poderes públicos na gestão dos riscos de desastre baixando o 
risco para níveis aceitáveis e manejáveis; 
• Os profissionais da saúde, além de enfrentarem os desastres intensivos, são desafiados ao 
enfrentamento diário dos desastres de longa duração – extensivos, tão importantes quanto 
as tragédias agudas, mas que não ganham destaque na mídia, fazendo com que passem 
despercebidas - é importante que as mazelas do dia a dia não sejam banalizadas e sejam 
entendidas como fazendo parte de tragédias por vezes maiores do que as alertadas nos 
meios de comunicação. 
 
A ATUAÇÃO DO MÉDICO EM DESASTRES EXTENSIVOS: 
SECA: tipo mais comum no brasil; elevado impacto histórico-social e problema complexo; 
 
8 Laís Kist de Almeida – ATM 2024/2 
• Apesar de ser considerado um desastre extensivo e, em princípio, natural e climatológico, o 
fenômeno da seca no Nordeste do Brasil extrapola classificações - desde a existência de 
registros, sabe-se que a seca vem afetando milhões de pessoas por séculos, contribuindo 
para a fome, a pobreza e a desnutrição, causando surtos de doenças e influenciando no 
processo de migração de populações para grandes centros urbanos – e acabam se 
constituindo em território de favela. 
• Assim, os efeitos da estiagem e da seca são de difícil mensuração, sendo complexo definir 
quando tais desastres começam, quanto tempo durarão e que outros territórios distantes do 
evento podem impactar. 
• Localmente, a situação pode extrapolar a normalidade da rotina dos serviços e das 
infraestruturas de saúde. Alguns efeitos na saúde podem ser diretos, sentidos em curto 
prazo, a exemplo de doenças infecciosas gastrintestinais. Outros impactos são indiretos e 
com efeitos em longo prazo, a exemplo da desnutrição e dos transtornos psicossociais, 
dificultando as medidas de prevenção. Os efeitos crônicos impactam em outros fatores 
determinantes da saúde, resultando na alteração do perfil de morbimortalidade. 
• A naturalização do desastre, que faz parte do cotidianode serviços e usuários, contribui 
para a debilidade das respostas, bem como a insuficiência de registros de eventos e, por 
assim dizer, a formulação de estratégias que diagnostiquem efetivamente os impactos da 
estiagem e da seca. 
• Em 2014, a Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS) publicou o Plano de Contingência 
para Emergência em Saúde Pública por Seca e Estiagem: 
 Análise de situação de saúde local e regional, considerando o contexto e o perfil epidemiológico 
da população. 
 Levantamento e avaliação dos recursos disponíveis no setor saúde e identificação das 
necessidades. 
 Articulação com os principais atores envolvidos em situações de seca e estiagem, intersetorial e 
interinstitucional, local e regional. 
 Elaboração do Plano de Contingência local para resposta à emergência em saúde pública por 
estiagem e seca. 
 Capacitação e treinamento das equipes de saúde tanto da vigilância quanto da assistência. 
 Definição de estratégias de educação em saúde para profissionais e população vulnerável, 
valorizando a troca e os saberes locais. 
 Promoção de ações de segurança alimentar e nutricional, contribuindo com a garantia do direito 
humano à alimentação adequada e saudável e com as ações e metas de redução da pobreza. 
 
 
MIGRAÇÕES: tentativas de populações buscando em outros territórios melhores condições de vida 
→ pobreza e muito especialmente conflitos bélicos são responsáveis pelos atuais movimentos 
migratórios - um desastre não ocorre de forma isolada, e sim em resposta a outro desastre. 
• Guerras provocam fugas arriscadas com mortes em naufrágios e, no território de refúgio, 
condições que ferem os Direitos Humanos. No continente europeu, os migrantes tendem, 
em geral, a concentrar-se por origem étnica, em bairros ilegais ou zonas degradadas, com 
precárias condições de habitabilidade, em alojamentos superlotados, partilhando idênticas 
condições de vida e fatores de exclusão social. 
• As frágeis redes sociais, a instabilidade profissional-econômica e as dificuldades com o 
idioma (para alguns) constituem elementos que agravam as dificuldades de integração e 
conduzem a situações de isolamento e gueto. A estigmatização, as intolerâncias e as 
 
9 Laís Kist de Almeida – ATM 2024/2 
discriminações são elementos que, somados aos anteriores e ao distanciamento de entes 
queridos, podem gerar sofrimento emocional importante. 
• No Brasil, ONGs, serviços acadêmicos e outras iniciativas da sociedade civil, ancorados em 
princípios de defesa de direitos e apoio a migrantes e refugiados, vêm desenvolvendo 
ações relevantes de acompanhamento sem ainda muito registro específico no que diz 
respeito ao SUS. No entanto, as recentes experiências devem servir como base para 
estratégias de atenção dessas populações. 
 
 
ATUAÇÃO DO MÉDICO ANTES DO DESASTRE: 
• O médico, com a equipe de saúde na qual está inserido, deve ter um olhar para as 
fragilidades do território em que atua, a fim de agir preventivamente na ocorrência de 
desastres - mapear as microáreas de risco com maior vulnerabilidade para a ocorrência de 
tragédias; 
• Para o fortalecimento das ações, é importante a articulação com demais profissionais da 
rede e com os recursos comunitários, como escolas, associações de moradores, igrejas e 
demais organizações sociais e espaços de controle social, sendo relevante valorizar os 
saberes locais em todas as etapas e movimentos; 
• Um estudo nacional mostrou que os brasileiros ainda não possuem conhecimento suficiente 
para nortear suas decisões e escolhas na área ambiental - educação permanente é uma 
estratégia importante tanto para a equipe como para a comunidade, com o objetivo de 
promover uma cultura de redução de desastres; 
• Para a melhoria na qualidade de vida, os municípios devem ter uma avaliação de risco 
prévia e um plano de ação intersetorial, envolvendo infraestrutura urbana, saneamento 
básico, preservação do meio ambiente, saúde e educação; 
• Políticas públicas devem garantir educação e direitos sociais para a formação de uma 
cultura contra os desastres. 
 
ATUAÇÃO DO MÉDICO DURANTE E APÓS O DESASTRE INTENSIVO: 
• Os órgãos de Defesa Civil municipal e estadual devem coordenar as ações locais em 
parceria com o governo federal e órgãos internacionais, dependendo da extensão do 
desastre intensivo. 
 
10 Laís Kist de Almeida – ATM 2024/2 
• O plano de ação deve conter todo o cuidado voltado à assistência da população, assim 
como deve prever a inserção dos profissionais, dos voluntários e da comunidade no seu 
planejamento e execução. 
• O cadastro das famílias é iniciado logo em seguida, a fim de obter os dados para avaliar a 
necessidade de abrigo, alimento, vestimentas e necessidades em geral. 
• Por fim, cabe também aos gestores a garantia de segurança para os moradores e 
trabalhadores, pois sem ela não será possível realizar uma ação local. 
• Logo após os desastres, as necessidades da população atingida são avaliadas conforme o 
tipo de evento e sua magnitude. 
• Nesse momento, deve-se questionar quais os profissionais são essenciais na formação da 
força de socorro imediato em curto, médio e longo prazo. 
• O momento ideal da atuação, tanto dos médicos de que estão em missão como daqueles 
em serviço no município atingido, depende de uma série de fatores específicos que dizem 
respeito ao próprio evento e à organização prévia da comunidade e do sistema de saúde; 
• Para os profissionais em missão, voluntários ou trabalhadores locais, é preciso conhecer o 
plano de ação local, as normas técnicas e os fluxos de atendimento e se inserir neles, 
mantendo a crítica para identificar ações oportunistas e pouco efetivas; 
• Na ausência do plano, o profissional deve participar da construção das estratégias em 
parceria com a comunidade, a gestão e os profissionais já envolvidos; 
• Os profissionais de saúde da rede local têm um importante papel devido ao conhecimento 
do contexto cultural local e também pelo vínculo com a comunidade atingida; 
• A equipe local pode estar muito empenhada na fase aguda, mas, depois, entra em 
sofrimento devido ao luto e às consequências das perdas - além disso, devido ao aumento 
da demanda de saúde uma grande sobrecarga física e mental pode ser observada na 
equipe de saúde. 
• Antes de iniciar o trabalho, o médico deve receber todo o equipamento de proteção 
necessário e estar informado do fluxograma, tanto de atendimento, diagnóstico e 
tratamento, quanto de referenciamento para outros serviços, quando se fizer necessário; 
• Após se apropriar do plano de ação e fluxograma, é importante entrar em contato com a 
rede de serviços que é referência para a região para fortalecer a parceria e melhorar a 
comunicação; 
• É importante que se estabeleça uma coordenação para as ações, algo que pode ser feito 
por um profissional de saúde já treinado e com experiência em situações de tragédia – o 
mais comum é que sejam consultores do Ministério da Saúde ou profissionais do próprio 
município; 
• O registro diário de todas as ações é fundamental, e sugere-se que as percepções pessoais 
sejam consideradas: é importante registrar o número de consultas, a vigilância de doenças 
endêmicas e epidêmicas, as ações de grupo, a busca ativa e a identificação de grupos mais 
vulneráveis, como crianças desnutridas e populações em áreas de difícil acesso; 
• O grupo deve manter reuniões periódicas para troca de informações do campo, divulgação 
dos dados epidemiológicos e atualização do plano de ação, pois as estratégias são 
reconfiguradas a cada mudança de cenário; 
• Além dos registros de campo, os profissionais necessitam apropriar-se do sistema de 
informações local, não só para o incremento das notificações, mas também para a 
apropriação de dados, vigilância em saúde e análise contínua da situação. 
 
 
 
11 Laís Kist de Almeida – ATM 2024/2 
ATUAÇÃO DO MÉDICO DURANTE O DESASTRE – MISSÃO DE AJUDA• O médico e a equipe em missão são enviados de outros municípios, Estados ou países 
para compor o quadro de profissionais que ajudarão no atendimento das pessoas atingidas 
direta ou indiretamente pelo desastre; 
• Como integrante do grupo de ajuda, o médico será integrado ao plano de ação local, 
articulando tanto com os profissionais locais como com a rede intersetorial; 
• Vale ressaltar que os locais que sofreram desastres estão desorganizados, pois parte da 
rede de atenção à saúde pode estar destruída e/ou desarticulada e o município pode não 
ter um plano claro de ação. Por isso, o médico deve ter uma postura ativa, não se imobilizar 
diante das situações, estar atento às propostas oportunistas e ser propositivo na sugestão 
de estratégias; 
• A equipe que vai a campo deve ter seu equipamento individual de segurança fornecido pela 
coordenação, bem como um mínimo de segurança para executar a tarefa - quando há um 
risco de vida real ao grupo de trabalho, a ação deve ser suspensa e a coordenação 
informada. 
• O médico que vem de outra localidade deve estar atento às questões culturais, para não 
trazer mais sofrimento às pessoas fazendo julgamento de valores. 
 
Erros mais frequentes cometidos: 
• Fazer missão unicamente por espirito aventureiro, para conhecer pessoas ou lugares 
novos, sair da rotina, ter visibilidade institucional, pesquisa ou ganho financeiro sem a 
devida responsabilidade social. 
• Realizar julgamento de valor. 
• Não valorizar os saberes locais. 
• Fazer ações isoladas sem combinação prévia com sua equipe ou sem permissão da 
comunidade. 
• Mudar planos em relação ao trajeto, ação ou horários sem comunicar ao seu coordenador. 
• Propagar informações sobre as quais não tem certeza. 
• Compactuar com ações oportunistas ou negligentes que prejudiquem o grupo ou a 
comunidade. 
• Praticar “heroísmo” ou messianismo que coloque a sua vida ou a vida da equipe em risco 
desnecessariamente. 
 
12 Laís Kist de Almeida – ATM 2024/2 
• Fazer e/ou divulgar fotos ou registros, sem permissão, de situações que possam causar 
constrangimentos. 
 
Abrigos provisórios: 
• Os abrigos se constituem como um espaço de acolhimento a curto e médio prazo quando 
há vítimas desabrigadas. Na organização desse ambiente, prioriza-se manter os vínculos 
familiares e de vizinhança como uma forma de minimizar as perdas e manter a rede de 
apoio no cuidado das crianças, dos idosos e dos doentes. 
 
Critérios mínimos de instalação de um abrigo, conforme a Carta de Assistência Humanitária 
da ONU e Defesa Civil: 
• Deve estar em uma zona de segurança. 
• Ter infraestrutura como salas ou dormitórios, condições de higiene e número adequado de 
banheiros, com local separado para lavagem das roupas. 
• Ser protegido de vetores biológicos. 
• Garantir fornecimento de água, luz e local para preparo de alimentos. 
• Deve ter temperatura ambiente adequada. 
• Deve ser um local com possibilidade de delimitação de espaço físico, por família ou por 
pessoas. 
 
Vigilância à saúde: 
• O médico deve estar atento aos fatores que podem causar uma segunda tragédia, como a 
transmissão de doenças infectocontagiosas, a exemplo da epidemia de cólera após o 
terremoto no Haiti, que matou milhares de pessoas devido à precariedade das condições 
sanitárias; 
• Para o melhor controle da vigilância sanitária, a equipe deve observar os abrigos, as casas 
e os demais espaços onde estão as pessoas e suas condições de higiene: 
 Distribuição e armazenamento de água; 
 Armazenamento, preparo e fornecimento de alimentos; 
 Destino do lixo; 
 Banheiros; 
 Presença de insetos e animais domésticos; 
 Farmácia. 
 
Reassentamentos e realocações: 
• A literatura traz inúmeras referências a medidas de evacuação e remoção de áreas 
consideradas de risco, mas nenhuma especifica exatamente como proceder, como dialogar, 
como orientar, de que forma se faz essa mudança, para que local, por quanto tempo, 
questões muito comuns e raramente respondidas a curto e longo prazo; 
• O que não pode acontecer: desterritorializações múltiplas com fragmentações, 
instabilidades, precariedades e desrespeito aos Direitos Humanos; 
• A realocação, quando necessária, deve ser realizada com o menor impacto possível, para 
um território de preferência definitivo, respeitando-se as necessidades socioeconômicas e 
culturais da comunidade, para minimizar as perdas e se efetivar como uma estratégia 
permanente na redução dos riscos; 
• As realocações podem provocar a desintegração familiar e a desarticulação das 
comunidades; por isso, não são raros os conflitos de comunidades que resistem à saída de 
 
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locais condenados - a resistência a realocações se constitui em uma afirmação da 
identidade e defesa contra o colapso sociocultural. 
 
Saúde mental: 
• A ocorrência de uma tragédia mobiliza uma série de emoções, como luto, tristeza, revolta e 
raiva, que devem ser compreendidas para não seja medicalização de uma reação normal e 
esperada frente a uma tragédia; 
• Tradicionalmente, há um direcionamento necessário para a atenção médica imediata, não 
estando os serviços, na maior parte das vezes, preparados para uma assistência mais 
abrangente; 
• A intervenção de primeira instância refere-se à escuta sensível cujos principais objetivos 
são proporcionar apoio, reduzir o perigo de morte e aliar a pessoa em crise com os recursos 
disponíveis - realizado quando e onde surge a necessidade, e pode ser feito por alguns 
profissionais que não são da saúde, como policiais, padres e voluntários, na falta de 
disponibilidade de recursos humanos; 
• A intervenção de segunda instância exige profissionais capacitados e bem treinados; 
• A escuta é fundamental para ajudar as pessoas e o coletivo a falarem sobre essas emoções 
para que possam vislumbrar maneiras de lidar com elas, tanto de forma individual como em 
coletivo organizado; 
• A prevalência de transtornos emocionais em uma comunidade atingida por tragédias pode 
ser até quatro vezes maior do que na população em geral: os mais frequentes estresse pós-
traumático e depressão maior. Distúrbios do sono, irritabilidade e ansiedade também são 
queixas comuns. Os desastres também podem aumentar a evasão escolar, a prevalência 
de alcoolismo e de situações de violência doméstica. 
 
Instituições fechadas ou totais: 
• O ambiente penitenciário, os hospitais psiquiátricos (ainda na perspectiva dos manicômios), 
como também o correcional e de outras instituições fechadas ou totais não foram 
planejados para permitir práticas sociais com a intervenção direta de Defesa Civil junto à 
sua população (carcerária, menores infratores, doentes mentais) no caso de desastres; 
• Tragédias relacionadas a incêndios colocam em dúvida os quadros e a infraestrutura 
dessas instituições; 
• O estigma das populações envolvidas favorece, a priori, uma desproteção da população 
privada de liberdade não somente em situações internas de incêndios e desabamentos, 
mas também em momento de enchente; 
• Nesse sentido, profissionais de saúde envolvidos com essas populações devem estar em 
alerta para o agravamento das desproteções já existentes e a prevenção de desastres 
maiores do que essas populações já estão submetidas por suas condições de vida e saúde. 
 
Culpabilização das vítimas: 
• É frequente que, em meio à população dos atingidos, recrudesçam situações em que 
coexistam as parcelas da população que pertencem aos previamente “sem lugar” – 
moradores de rua, albergados, asilados ou encarcerados e atingidos de outros desastres; 
• Os conflitos entre os atingidos, bem como o juízo de valores sobre quem tem mais ou 
menos direito, são passíveis de negociação cuidadosa, mediação e compreensão de todas 
as faces, instâncias e discursos, tarefa nada fácil quando se sobrepõem ineficiências, 
negligências e abandonos - a tendência em culpabilizarvítimas é sempre presente; 
 
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• No desastre de Mariana, o julgamento dos atingidos aconteceu não somente pelo 
recebimento de indenizações consideradas por muitos injustas, mas também porque houve 
o fechamento da mineradora que empregava a maioria dos moradores, afetando a vida e a 
economia da região - foram relatados casos de brigas dentro de famílias, onde pessoas 
passaram a ser evitadas por amigos e parentes por terem criticado publicamente as 
mineradoras. 
 
Interesses político-financeiros: 
• Para além dos oportunismos político-partidários que envolvem os desastres intensivos e 
extensivos, há decisões sobre estratégias que permanecem no domínio de certos sujeitos e 
grupos que se utilizam desses poderes para lançar mão de recursos importantes, não 
quando são necessários, mas quando é mais conveniente; 
• Gestores também costumam submeter órgãos centralizando decisões, dificultando a 
autonomia de outras estratégias, impedindo o desenvolvimento da capacidade de 
mobilização da população, que fica refém e à mercê da ajuda do Estado; 
• Nestes contextos, podem emergir relações desiguais, desonestas e violentas: a atuação 
nesses campos exige cuidados por parte do médico, tanto para preservação de estratégias 
reais e efetivas de cuidado quanto para defesa dos direitos e da integridade dos sujeitos 
envolvidos; 
• É importante cuidar da proteção da própria integridade profissional, trabalhando sempre em 
equipe e solicitando, sempre que possível, o apoio de redes e instituições. 
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS SOBRE A PRÁTICA MÉDICA EM TRAGÉDIAS: 
• Ações mais dedicadas, contínuas e em longo prazo precisam ser centradas no combate a 
fatores subjacentes de risco de desastres - interferir nas consequências da pobreza e da 
desigualdade, nas mudanças e na variabilidade climática, nos questionamentos sobre a 
urbanização rápida e não planejada, na má gestão do solo e fatores como a mudança 
demográfica; 
• É importante também questionar arranjos institucionais fracos e políticas não informadas 
sobre riscos, bem como a falta de regulamentação e incentivos para o investimento privado 
na redução do risco de desastres; 
• Cabe questionar as cadeias de suprimentos complexas, a limitada disponibilidade de 
tecnologia, os usos insustentáveis de recursos naturais, os ecossistemas em declínio, as 
pandemias e as epidemias; 
• Isso é uma tarefa complexa para o médico, que, em situação de desastre intensivo e 
extensivo, precisa ter essas questões em mente e atuar para além da técnica e assistência, 
podendo fazer parte de comitês de apoio, proteção e prevenção.

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