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EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 0 EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 1 Apresentação ................................................................................................................................ 3 Aula 1: Noções básicas de epidemiologia ..................................................................................... 4 Introdução ............................................................................................................................. 4 Conteúdo ................................................................................................................................ 4 Conceituação e aplicações gerais da epidemiologia ................................................. 4 O método epidemiológico e seus tipos de abordagem............................................. 8 Referências........................................................................................................................... 14 Notas ........................................................................................................................................... 20 Chaves de resposta ..................................................................................................................... 21 Aula 1 ..................................................................................................................................... 21 Exercícios de fixação ....................................................................................................... 21 Aula 2: Medidas de saúde do trabalhador .................................................................................. 24 Introdução ........................................................................................................................... 24 Conteúdo .............................................................................................................................. 24 Conceituação básica ....................................................................................................... 24 Densidade de Incidência (Id) ......................................................................................... 37 Relações entre a prevalência e a incidência .............................................................. 39 Atividade proposta .......................................................................................................... 40 Atividade proposta .......................................................................................................... 43 Atividade proposta .......................................................................................................... 45 Referências........................................................................................................................... 47 Exercícios de fixação ......................................................................................................... 47 Notas ........................................................................................................................................... 53 Chaves de resposta ..................................................................................................................... 54 Aula 2 ..................................................................................................................................... 54 Exercícios de fixação ....................................................................................................... 54 Aula 3: Vigilância epidemiológica ................................................................................................ 59 Introdução ........................................................................................................................... 59 Conteúdo .............................................................................................................................. 59 A base conceitual da VE e suas aplicações................................................................. 59 Coleta de dados na VE .................................................................................................... 61 Lista de Notificação Compulsória (LNC) ..................................................................... 63 O diagrama de controle - primeiro passo .................................................................. 74 EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 2 O diagrama de controle – segundo passo ................................................................. 77 O diagrama de controle – finalização ......................................................................... 83 Atividade proposta .......................................................................................................... 84 Atividade proposta .......................................................................................................... 85 Referências........................................................................................................................... 90 Notas ........................................................................................................................................... 95 Chaves de resposta ..................................................................................................................... 95 Aula 3 ..................................................................................................................................... 95 Exercícios de fixação ....................................................................................................... 95 Aula 4: Investigação epidemiológica ........................................................................................... 99 Introdução ........................................................................................................................... 99 Conteúdo ............................................................................................................................ 100 Etapa 1. Confirmar a ocorrência de um surto .......................................................... 100 Etapa 5. Caracterizar o surto em tempo, pessoa e lugar ....................................... 110 Etapa 5. Caracterizar o surto em tempo, pessoa e lugar ....................................... 111 Etapa 6. Formulação de hipóteses .............................................................................. 117 Notas ......................................................................................................................................... 136 Chaves de resposta ................................................................................................................... 137 Aula 4 ................................................................................................................................... 137 Exercícios de fixação ..................................................................................................... 137 Conteudista ............................................................................................................................... 143 file://webaula.local/bh/CDC/Projetos/emandamento/Estacio%20de%20Sa/Pós_Graduação/2º%20semestre%202014/15%20-%20Epidemiologia%20em%20Saúde%20do%20Trabalhador/Pedagogia/Material%20Bruto/Apostila/Apostilas%20produzidas%20171014/Apostila_apresentação.doc%23_Toc401649891 EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 3 Esta disciplina visa apresentar os principais fundamentos da epidemiologia, desenvolvendo um raciocínio epidemiológico aplicado à saúde do trabalhador. Todos os conteúdos estão interligados, de modo que, ao final, você possa aplicar a vigilância e a investigação epidemiológica no cotidiano de sua atuação como especialista em Enfermagem do Trabalho. Por se tratar de uma disciplina que envolve fundamentos da estatística, o cerne do método utilizadoestá nas atividades e nos exercícios propostos durante as aulas. Hipotéticos ou reais, o intuito desses problemas é subsidiar a construção de seu raciocínio epidemiológico. Além disso, a estatística é apenas uma das ferramentas da epidemiologia. Por isso, este estudo busca simplificar ao máximo as formas de cálculo, fornecendo a você, em algumas ocasiões, tabelas automáticas para esse fim. O foco é permitir que você reflita sobre os resultados estatísticos e aplique esse conhecimento na prática e produção de saúde do trabalhador. Sendo assim, esta disciplina tem como objetivos: 1. Praticar o raciocínio clínico-epidemiológico para fins de intervenções individuais e coletivas em saúde do trabalhador; 2. Empregar medidas da saúde coletiva ao trabalhador; 3. Definir os conceitos de vigilância epidemiológica e monitoramento de eventos e agravos em saúde para o processo de tomada de decisões em saúde do trabalhador; 4. Investigar a epidemiologia em nível comunitário, mapeando os riscos e riscos em potencial para fins de intervenções estratégicas nesse sentido. EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 4 Introdução Nesta aula, você estudará noções básicas de epidemiologia, discutindo os conceitos fundamentais para a compreensão do método epidemiológico em aulas futuras. Trataremos primeiramente da conceituação dessa ciência, trançando um paralelo com a necessidade do conhecimento biológico e clínico. Faremos um debate inicial sobre a conceituação das formas de abordagem da epidemiologia, a saber: descritiva e analítica. Posteriormente, aprofundaremos um pouco nos conhecimentos da abordagem descritiva da epidemiologia, estudaremos as variáveis circunstanciadas – tempo, lugar/espaço e pessoas. Neste momento, trataremos das variações no tempo e no espaço, traçando paralelos entre a necessidade de observação dessas características populacionais e o reconhecimento dos riscos. Discutiremos também a necessidade de reconhecimento das características pessoais, a fim de identificar grupos vulneráveis ao adoecimento. Objetivo: 1. Discutir os principais conceitos, abordagens e aplicações gerais da epidemiologia; 2. Refletir sobre as variáveis circunstanciadas – tempo, lugar/espaço e pessoas – no uso e aplicação da epidemiologia descritiva. Conteúdo Conceituação e aplicações gerais da epidemiologia Acredita-se que o conhecimento biológico e clínico, que os profissionais de saúde tanto se interessam, gere a possibilidade de entendimento sobre genes, moléculas, células e seus transmissores, sobre o desenvolvimento de fármacos e das terapias em pacientes, olhando-os sob a ótica individual. Mas questiona- se: EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 5 Seria esse conhecimento o suficiente para controlar fenômenos ou doenças em nível populacional? Por exemplo, se somente olharmos para o nível individual do ser humano, por uma perspectiva especializada, como faríamos para obter respostas sobre um possível surto da mesma doença naquela comunidade? E como evidenciar as causas e tratá-las? Corroborando para esses questionamentos, cita-se Minayo (2010), segundo a autora, “[...] a doença, a saúde e a morte não se reduzem a uma evidência orgânica, natural, objetiva, mas estão intimamente relacionadas com as características de cada sociedade [...] a doença é uma realidade construída e [...] o doente é um personagem social”. Nessa perspectiva, tratar o indivíduo é o que se espera como profissional de saúde, mas também é de extrema relevância a identificação das causas e relações contextuais para o efetivo controle dos fenômenos. Assim, acredita-se que o olhar epidemiológico possa contribuir para tal investigação. Conceituação e aplicações gerais da epidemiologia Acredita-se que o conhecimento biológico e clínico, que os profissionais de saúde tanto se interessam, gere a possibilidade de entendimento sobre genes, moléculas, células e seus transmissores, sobre o desenvolvimento de fármacos e das terapias em pacientes, olhando-os sob a ótica individual. Mas questiona- se: Seria esse conhecimento o suficiente para controlar fenômenos ou doenças em nível populacional? Por exemplo, se somente olharmos para o nível individual do ser humano, por uma perspectiva especializada, como faríamos para obter respostas sobre um possível surto da mesma doença naquela comunidade? E como evidenciar as causas e tratá-las? Corroborando para esses questionamentos, cita-se Minayo (2010), segundo a autora, “[...] a doença, a saúde e a morte não se reduzem a uma evidência EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 6 orgânica, natural, objetiva, mas estão intimamente relacionadas com as características de cada sociedade [...] a doença é uma realidade construída e [...] o doente é um personagem social”. Nessa perspectiva, tratar o indivíduo é o que se espera como profissional de saúde, mas também é de extrema relevância a identificação das causas e relações contextuais para o efetivo controle dos fenômenos. Assim, acredita-se que o olhar epidemiológico possa contribuir para tal investigação. Epidemiologia Você sabe o que é epidemiologia? O termo epidemiologia deriva de três vocábulos gregos que significam: Epi: sobre; Demos: população; Logos: estudo. Ou seja, são estudos sobre as populações. A definição dessa ciência passou por inúmeras transformações ao longo dos tempos. Antigamente, debruçava-se quase que exclusivamente sobre as investigações de doenças infecciosas e parasitárias. Hoje, de uma maneira mais moderna, pode ser conceituada, segundo a leitura do Foundations of Epidemiology (LILIENFELD; STOLLEY, 1994), como sendo a ciência destinada ao estudo da distribuição e determinantes de saúde relacionados aos estados, eventos ou doenças em populações humanas, bem como a aplicação dos estudos de prevenção e controle dos problemas de saúde. Nesse sentido, a epidemiologia se debruça sobre a distribuição de doenças, as condições fisiológicas e/ou eventos de interesse de saúde em populações, bem como dos fatores socioambientais que influenciam essas distribuições (LILIENFELD; STOLLEY, 1994). EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 7 Premissas A epidemiologia tem como premissas básicas que (HENNEKENS; BURING, 1987): As doenças / fenômenos não ocorrem ao acaso; As doenças / fenômenos possuem fatores de causação e, por sua vez, passíveis de prevenção; Os fatores causais e preventivos podem ser rastreados por meio de investigação sistemática, entendido aqui como método epidemiológico; As ações para serem consideradas legítimas devem estar pautadas em resultados sólidos obtidos por meio de tais investigações. Atenção Assim, é possível perceber que o uso e a aplicação dos conhecimentos da epidemiologia estão, ou ao menos deveriam estar, diretamente relacionados à atuação em saúde, independente da área de concentração do trabalho, uma vez que abarcam desde o esclarecimento etiológico até as intervenções propriamente ditas, perpassando por: • Avaliação da frequência de ocorrência; • Monitoramento do comportamento e desenvolvimento dos eventos; • Avaliação de riscos individuais e coletivos; • Validação da capacidade diagnóstica; • Realização de diagnósticos situacionais em diferentes grupos populacionais; e • Mensuração da efetividade terapêutica. EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 8 O método epidemiológico e seus tipos de abordagem Sobre o método epidemiológico, há dois tipos de abordagem: a descritiva e a analítica. A epidemiologia descritiva se debruça sobre o exame da distribuição de frequência das doenças/fenômenos considerando a tríade: tempo, lugar e pessoas. Ela responde a questões do tipo “quando”, “onde” e “em quem” aconteceu o evento na população de estudo. Tal aplicação permite o detalhamento do perfil epidemiológicoe, por sua vez, a adoção de medidas de controle e prevenção com vistas à saúde populacional. A Figura 1 ilustra uma análise descritiva realizada sobre os acidentes de trabalho fatais, segundo a idade da vítima e a fonte de informação, nos Estados de São Paulo e Minas Gerais. Figura 1. Acidentes de trabalho fatais nos Estados de São Paulo e Minas Gerais – 2006 a 2008. Fonte: Fundacentro. Vinculação de banco de dados de EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 9 acidentes de trabalho fatais dos Estados de São Paulo e Minas Gerais – 2006- 2008: Relatório Técnico. São Paulo: Fundacentro, 2012. É possível perceber que esse tipo de análise é realizado considerando a exposição e o desfecho ao mesmo tempo, sem mecanismos de controle, e, por isso, são mais utilizados na primeira fase do método epidemiológico para a formulação de hipóteses explicativas sobre o fenômeno. Em outras palavras, a descrição não pretende descobrir as causas dos problemas, mas possibilita (re)conhecer o objeto da investigação. Sobre os dados apontados no Gráfico, especificamente, é possível observar que a maior parte dos acidentes ocorre na faixa de 20 a 29 anos. Outro dado relevante, apontado pelo estudo, foi a divergência entre as faixas etárias das Comunicações de Acidente de Trabalho (CAT) e das Declarações de Óbito (DO). Perceba que embora este momento do método epidemiológico busque a descrição do problema, ele traz informações úteis na tomada de decisões. Não seria importante refletir sobre as estratégias empregadas para a prevenção de acidentes de trabalho nessas localidades? Seria especialmente importante focar a faixa etária de maior ocorrência no momento da aplicação das ações/intervenções preventivas. Outro ponto que mereceria revisão aprofundada é a dissonância entre as informações das CAT e DO. Pensar na possibilidade de capacitação sobre o preenchimento da CAT parece ser uma ação necessária nesses Estados. Conhecer os riscos e as causas dos fenômenos também parece ser um ponto importante no momento da tomada de decisões clínicas e estratégicas. Para isso, tomam-se os conhecimentos da epidemiologia analítica, como segunda fase do método. Ela se debruça na busca pelos determinantes dos fenômenos/doenças, respondendo às questões “como” e “por que” da ocorrência. EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 10 A fim de ilustrar a segunda fase do método epidemiológico, trazemos uma tabela, adaptada de um estudo que objetivou analisar a distribuição dos riscos de acidente de trabalho em uma cidade de São Paulo (ZANGIROLANI, 2008). Acidentes de trabalho Tabela. Resultados selecionados do estudo “Topologia do risco de acidentes de trabalho em Piracicaba, SP”, 2008. Fonte: ZANGIROLANI, L. T. O; et al. Topologia do risco de acidentes do trabalho em Piracicaba, SP. Rev. Saúde Pública [online]. 2008, v.42, n. 2, p. 287-293. Embora no futuro ainda discutiremos esse assunto, é importante saber, preliminarmente, que o Odds Ratio (OR) acima de 1,0 aponta para a presença de um fator de risco, enquanto valores abaixo de 1,0 apontam para fatores de proteção. Dito isso, já somos capazes de discutir alguns pontos da Tabela. Perceba que o vínculo empregatício pode ser um fator causal para acidentes de trabalho. Indivíduos que praticam os famosos “bicos” possuem 3,62 chances a mais de se acidentar, enquanto os trabalhadores autônomos, domésticos e os estagiários possuem menores chances. Quanto ao tipo de ocupação é possível concluir que os trabalhadores da área de manutenção e os operários estão especialmente mais susceptíveis aos acidentes, bem como o tipo de esforço empregado também poderá contribuir para os acidentes. EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 11 Percebeu a aplicação da epidemiologia analítica? Ela é capaz de subsidiar o processo decisório com informações sobre as causas, tornando as estratégias mais aplicadas. Nesse sentido, se o conhecimento biológico da doença/fenômeno e a caracterização realizada na fase descritiva do método epidemiológico produzem hipóteses explicativas, será na epidemiologia analítica que as hipóteses serão testadas. O conhecimento gerado deverá ser individualizado, levando-se em consideração os aspectos particulares do meio e do sujeito e, posteriormente, aplicados com base em conhecimentos clínico- epidemiológicos (FLETCHER, 2007). Abordagem descritiva na epidemiologia Conforme discutido até agora, a abordagem descritiva é a primeira fase do método epidemiológico e que norteará a abordagem analítica no futuro da investigação. Portanto, grande parte do conteúdo deste Curso de Epidemiologia será destinada a essa fase do processo. O conhecimento das variáveis circunstanciadas – tempo, lugar e pessoas - sob as quais um determinado evento ocorre é fundamental para o diagnóstico e o refinamento das informações sobre o problema. Esta seção se debruçará sob a discussão dessas variáveis. Variáveis relacionadas ao tempo (quando?) No início da abordagem descritiva dos casos, é imprescindível observar a distribuição cronológica do evento, ou seja, a sequência de marcos cronológicos (anos ou meses) e a sua relação com a frequência de casos. Para a construção dessas distribuições, levantam-se as informações sobre a ocorrência do fenômeno (ex. CAT, registros hospitalares e ambulatoriais, etc) e/ou das declarações de óbitos. A frequência pode ser expressa em número absoluto (ex.: 2 casos, 10 casos, 53 casos) ou frequências relativas (percentuais, taxas, razões). A distribuição cronológica permite ao profissional ao menos dois aspectos: EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 12 Acompanhar a história do evento ao longo de um intervalo de tempo, observando os comportamentos de ascensão ou decréscimo. Identificar o tipo de variação do evento estudado, evidenciando se ele é regular ou errático. Como você viu até aqui, a distribuição cronológica permite ao profissional ao menos dois aspectos: Acompanhar a história do evento ao longo de um intervalo de tempo, observando os comportamentos de ascensão ou decréscimo. (Figura 2). Figura 2. Taxa de Mortalidade por acidente de trabalho da população ocupada, Brasil, Região Sul e Santa Catarina, 2000 a 2011. Fonte: MAGAJEWSKI, F.R.L.; CONCEIÇÃO, M.B.M.; SILVA, M. Morbimortalidade por acidente de trabalho em Santa Catarina: a evolução de 1996 a 2012. Informativo epidemiológico “barriga verde”. 2014, n. 2, v. 12. É possível perceber que esse tipo monitoramento, por meio de série histórica, permite verificar todas as flutuações do evento ao longo do tempo. Com isso, o profissional é capaz de avaliar o impacto das ações, crescimento ou decréscimo do problema, bem como observar o comportamento histórico do mesmo. Na EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 13 Figura 2, é possível observar que a mortalidade por acidentes de trabalho em Santa Catarina, além de maior do que no Estado e no país, não acompanhou os picos de incidência. Talvez fosse importante investigar melhor o que ocorreu nos anos com maiores taxas, bem como os momentos de redução. Será que as estratégias implementadas em 1997, 2001 e 2005 não poderiam ser repetidas? Nota-se ainda que o término da série histórica aponta para a tendência de aumento em anos subsequentes, diferente do que se observa no Brasil. Identificar o tipo de variação do evento estudado, evidenciando se ele é regular ou errático (Figura 3). Figura 3. Distribuição mensal de casos de acidentes ofídicos. Paraná, 1994 a 1996. Fonte: Brasil. Curso básico de vigilância epidemiológica. Brasília: Ministério da Saúde, 2003. Perceba que a Figura 3 traz um fenômeno que, no período estudado (1994 a 1996), apresenta regularidade no seu comportamento. É possível evidenciar que os picos da frequência ocorreram sempre próximos aomês de fevereiro. Neste sentido, você concorda que a identificação dessas características poderá auxiliar o profissional a estabelecer medidas preventivas quando o período de EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 14 maior ocorrência se aproxima? Com isso, não seria necessário esperar o adoecimento das pessoas para que a tomada de decisão e as intervenções ocorressem. Essas variações podem ser de dois tipos: regulares – cíclicas e sazonais – ou irregulares / erráticas. Abordaremos cada uma delas a partir deste momento. Material complementar Para saber mais sobre as bases históricas da epidemiologia, leia os artigos: Cadernos de Saúde Pública e Determinantes Sociais em Saúde, disponíveis em nossa biblioteca virtual. Referências Básicas: FLECTCHER, R.H; FLETCHER, S.W. Epidemiologia clínica: elementos essenciais. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014. ROUQUAYROL, M.Z.; ALMEIDA FILHO, N. Epidemiologia & Saúde. 6. ed. Rio de Janeiro: Medsi, 2003. Complementares: HENNEKENS, C.H. & BURING, J. E. Epidemiology in Medicine. Boston/Toronto: Little, Brown and Company, 1987. LILIENFELD, D.E.; STOLLEY, P.D. Foundations of Epidemiology. 3. ed. New York: Oxford University, 1994. p.348. MINAYO, M.C.S. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 12. ed. São Paulo: Hucitec, 2010. Exercícios de fixação Questão 1 EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 15 (Especialista em Epidemiologia - PREFEITURA MUNICIPAL DE FLORIANÓPOLIS, 2010) Assinale a alternativa CORRETA. Na definição da Epidemiologia como “O estudo da: (I) frequência (II) distribuição e (III) dos determinantes das doenças na população”, a) (I) e (III) se referem à epidemiologia descritiva e (II) à epidemiologia analítica. b) (I) e (II) se referem à epidemiologia descritiva e (III) à epidemiologia analítica. c) (I), (II) e (III) se referem à epidemiologia descritiva. d) (I) e (III) se referem à epidemiologia analítica e (II) à epidemiologia descritiva. Questão 2 (Medicina - NCE, 2007) A medida de associação denominada Odds Ratio (OR) expressa: a) Quanto maior ou menor é a chance de desenvolver a doença no grupo de expostos do que no grupo de não expostos. b) O efeito da exposição no excesso de risco da doença no grupo de expostos em relação ao grupo de não expostos. c) Quantas vezes é maior o risco de desenvolver uma doença entre os indivíduos expostos em relação aos não expostos. d) Quantas vezes a taxa de prevalência da doença foi maior no grupo de expostos em relação ao grupo de não expostos. Questão 3 As alternativas abaixo ilustram a primeira etapa do método epidemiológico, ou seja, a utilização de ferramentas da epidemiologia descritiva, EXCETO: EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 16 a) A prevalência de coerção sexual ao longo da trajetória da vida, em três grandes centros urbanos brasileiros, foi estimada em 15.5% para as mulheres e 11.1% para homens (MORAES; CABRAL; HEILBORN, 2006). b) O medo relacionado ao resultado do exame de Papanicolaou (39.8%) e ao profissional examinador (31.3%) e o esquecimento relacionado ao agendamento do exame (25.5%) foram referidos como as principais barreiras impeditivas do acesso para o rastreio do câncer do colo do útero em mulheres cobertas pela Saúde da Família de Nova Iguaçu (RAFAEL; MOURA, 2010). c) Pacientes portadores de Diabetes Mellitus que frequentam regularmente as consultas de enfermagem possuem menos chances de amputações de membros inferiores - OR 0,06 (GAMBA et al, 2004). d) Observando os indicadores de mortalidade e de distribuição de renda populacional, foi possível constatar que quanto maior as iniquidades sociais da região, maior também será a taxa de mortalidade (KENNEDY; KAWACHI; PROTHROW-STITH, 1996). Questão 4 Em 1990, em Camaçari, dois funcionários que trabalhavam em um Polo Petroquímico evoluíram a óbito. Um faleceu com diagnóstico de aplasia medular e o outro com Leucemia Mieloide Crônica. Como a empresa processava benzeno, suspeitou-se de doença ocupacional estimulada por bezenismo. Após avaliar 7356 trabalhadores, afastou-se 216 funcionários devido a alterações hematológicas. Dos funcionários afastados, 49.5% trabalhavam em setores de produção, 34.7% na manutenção e 15.8% em setores administrativos. Fundamentados pela lotação funcional dos trabalhadores, concluiu-se que os casos se tratavam de contaminação ambiental, mas tarde confirmado por meio de testes específicos. Baseado no caso, analise as afirmativas: I. Trata-se de um estudo epidemiológico de abordagem descritiva, somente. EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 17 II. Como somente houve uma investigação por método descritivo, a contaminação ambiental trata-se apenas de uma hipótese explicativa. III. Trata-se de um estudo epidemiológico de abordagem descritiva e analítica, pela investigação da exposição. Assinale a alternativa correspondente: a) Somente a afirmativa I está correta. b) Somente a afirmativa II está correta. c) A afirmativa II está incorreta. d) A afirmativa III está incorreta. Questão 5 O monitoramento epidemiológico consiste em um estudo realizado a partir de casos, de preferência a partir de uma série histórica, com o objetivo de avaliar a ocorrência e suas implicações para a saúde da coletividade. Sendo assim, a finalidade do monitoramento é: I. Prever o padrão e o comportamento do fenômeno/doença, adotando medidas preventivas antes mesmo que ele ocorra. II. Traçar estratégias específicas quando da ocorrência dos casos. III. Determinar o impacto do fenômeno sobre a população alvo do estudo. IV. Investigar se a ocorrência do fenômeno se deve ao acaso ou se existe algum fator contextual que esteja colaborando para o seu desenvolvimento. Dessa forma, assinale a alternativa correspondente: a) A afirmativa I está incorreta. b) A afirmativa II está incorreta. c) A afirmativa III está incorreta. d) A afirmativa IV está incorreta. EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 18 Questão 6 (Medicina - NCE, 2007) Caso autóctone de uma doença e caso alóctone de uma doença são, respectivamente: a) Casos oriundos do mesmo local onde ocorreram as doenças em períodos de tempo distintos. b) Caso importado de outra localidade de uma doença e a proporção temporal dessa mesma doença. c) Casos importados de outra localidade onde ocorreram as doenças em períodos de tempo distintos d) Caso oriundo do mesmo local onde ocorreu a doença e caso importado de outra localidade onde ocorreu a doença. Questão 7 Na região centro-sul, a colheita e moagem da cana-de-açúcar acontecem entre abril e novembro. Já no norte e nordeste, o período de safra acontece entre novembro e abril. Os períodos em que não há colheita, denominados entressafras, são destinados ao plantio e à reforma dos canaviais. Sabe-se ainda que muitos campos, embora não seja recomendado, utilizam exclusivamente o método mecânico para a realização do corte da cana. Os trabalhadores são expostos ao sol, por longos períodos, com poucas condições de trabalho e, muitas vezes, sem os equipamentos de proteção necessários. Profissionais que atendem acidentes de trabalho decorrentes dos campos percebem claramente o aumento de tais ocorrências nesses períodos. Sabendo disso, assinale o tipo de variação relacionada a esse tipo de acidente: a) Cíclica b) Sazonal c) Errática EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 19 d) Alóctone Questão 8 Um estudo retrospectivo conduzido com dados do Departamento de Endemias Rurais investigou casos de peste humana no nordeste brasileiro, no período de 1935 a 1967. O trabalho revelou que a doença possui picos a cada 6 a 12 anos, tendo como hipóteses explicativas as questões geográficas. Baseado nisso, assinale a alternativa que corresponde ao tipo de variação da doença. a) Cíclica b)Sazonal c) Errática d) Autóctone Questão 9 O serviço de saúde ocupacional de uma empresa identificou que um operário apresentava sinais compatíveis com doença meningocócica e prontamente o encaminhou a uma unidade de saúde de referência. Após exames específicos, a doença foi confirmada no trabalhador. Baseado nisso, analise as afirmativas abaixo: I. A doença meningocócica possui uma elevação da frequência nos períodos de inverno e, por isso, pode ser assumida como uma doença de variação sazonal; II. O caso do trabalhador é considerado autóctone, uma vez que se manifestou dentro da empresa; III. A equipe de saúde da empresa deverá monitorar os profissionais que entraram em contato direto com o caso índice (o trabalhador que adoeceu), bem como iniciar o esquema preventivo, evitando o surgimento de novos casos autóctones. Mediante ao exposto, assinale a alternativa correspondente EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 20 a) As afirmativas I e II estão corretas. b) As afirmativas I e III estão corretas. c) As afirmativas II e III estão corretas. d) Somente a afirmativa III está correta. Questão 10 Uma empresa de grande porte, após calcular a série histórica de acidentes de trabalho nos últimos 10 anos de funcionamento, esperava ter o máximo de 10 eventos no mês de abril de determinado ano, assim como 8 eventos no mês de maio e 6 no mês seguinte do mesmo ano. Todavia, observou que o número de acidentes foi de 14, 16 e 18, respectivamente, para os meses supramencionados. Baseado nisso, assinale a alternativa que corresponde ao tipo de variação da doença. a) Cíclica b) Sazonal c) Errática d) Autóctone Odds Ratio (OR): Também denominado de razão de chances e razão de prevalências. É a razão entre as chances de um evento ocorrer em grupo de expostos e em um grupo de não expostos. Quando o resultado é superior a 1, indica que a exposição que está sendo investigada é um fator de risco. Quando o resultado é inferior a 1, significa que a exposição trata de um fator de proteção. EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 21 Aula 1 Exercícios de fixação Questão 1 - B Justificativa: A questão avalia o item cognitivo, observando meramente o conceito da epidemiologia. Perceba que nos itens I e II o conceito aborda a epidemiologia descritiva, uma vez que trata da descrição da frequência e da distribuição (no tempo, espaço e pessoas). Questão 2 - B Justificativa: O OR ou razão de chances mede tanto os fatores de risco (quando o resultado é superior a 1) e os fatores de proteção (quando o resultado é inferior a 1) de desenvolvimento da doença entre os grupos. Questão 3 - C Justificativa: Embora a questão traga termos ainda não discutidos ao longo da aula, espera-se que seja desenvolvido um raciocínio epidemiológico baseado nas inferências. Nesse caso, percebe-se que todas as questões apenas descrevem os problemas e suas associações, caracterizando uma abordagem descritiva. Todavia, a opção C aborda uma situação de análise, na qual a exposição (frequentar consultas de enfermagem) é fator protetor (OR abaixo de 1) para o desfecho (amputação de membros inferiores). Nesse caso, trata-se de uma abordagem analítica. Questão 4 - B Justificativa: Não houve controle com grupos de expostos e não expostos e, por isso, não foram utilizadas as técnicas da abordagem analítica. Como somente foram utilizados os conhecimentos da epidemiologia descritiva, gerou-se apenas uma hipótese explicativa. O teste utilizado para confirmar contaminação ambiental não é caracterizado como técnica epidemiológica. EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 22 Questão 5 - D Justificativa: Todas as afirmativas estão corretas, exceto o item IV. Responde- se inexatidão dessa afirmativa observando as premissas básicas da epidemiologia, a saber: “As doenças / fenômenos não ocorrem ao acaso; e os fatores causais e preventivos podem ser rastreados por meio de investigação sistemática, entendido aqui como método epidemiológico”. Questão 6 - D Justificativa: Os casos autóctones são aqueles gerados no próprio território. Por exemplo, uma infecção por dengue no Estado do Rio de Janeiro onde sabidamente existe a infestação pelo Aedes aegypti será considerado como caso autóctone, a menos que ele informe viagem compatível com o período de incubação da doença. Já um caso alóctone é aquele que foi importado de outro território, ou seja, o indivíduo não contraiu a doença no local de diagnóstico. Um caso de malária ou febre amarela no Rio de Janeiro, provavelmente, será considerado como caso importado, observado o registro de viagem do indivíduo. Questão 7 - B Justificativa: Como os acidentes estão relacionados à colheita da cana e ela está atrelada a questões climáticas, não resta dúvida de que se trata de uma variação sazonal. Uma modificação na estrutura climática desses locais poderia facilmente modificar o período de colheita e, por sua vez, a elevação dos acidentes. Questão 8 - A Justificativa: Tendo em vista que os picos ocorrem em ciclos anuais de 6 a 12 anos, resta comprovado que a doença se manifestava com variação cíclica no território. Questão 9 - B EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 23 Justificativa: Tendo em vista que o paciente foi considerado o caso índice, ou seja, o primeiro dentro da empresa; não resta dúvida de que se trata de um caso importado – autóctone. Portanto, a segunda afirmativa está incorreta. Questão 10 - C Justificativa: A variação errática ocorre quando o comportamento é irregular ao esperado para determinado período. É o tipo de variação presente nas epidemias. Perceba que em todos os meses houve um crescimento do número de acidentes em relação ao que era esperado. Nesse caso, mereceria uma investigação apurada pela equipe de saúde do trabalhador do local. EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 24 Introdução O entendimento sobre o processo saúde-doença varia conforme a historicidade e a cultura dos povos, sendo influenciado diretamente pelos Determinantes Sociais em Saúde. Nesse sentido, compreender essas mudanças e evoluções, confrontando com as características contextuais e atributos pessoais do meio é meta a ser constantemente perseguida pela Epidemiologia. Nesta aula, discutiremos as medidas em saúde sob o foco da epidemiologia descritiva, a fim de refletir sobre o processo avaliativo dos níveis de saúde das populações. Acredita-se que esse conhecimento auxiliará na proposição de medidas específicas de prevenção, controle e/ou de intervenções terapêuticas pelo profissional de saúde. Primeiramente, iniciaremos o debate com a conceituação das medidas/indicadores, passando por uma breve contextualização estatística. A posteriori, serão discutidas as medidas de morbidade, mortalidade e letalidade, bem como suas aplicações e limitações. Objetivo: 1. Relacionar as medidas de magnitude dos eventos ao processo de trabalho em saúde do trabalhador; 2. Introduzir os indicadores de saúde que medem o risco de adoecimento, morte e gravidade dos eventos no debate da saúde do trabalhador. Conteúdo Conceituação básica As estatísticas sobre a saúde surgiram, no passado, como uma forma de registro dos problemas de saúde das comunidades. Esta prática servia para basicamente controlar a organização das cidades, a produção econômica e o EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 25 monitoramento das classes mais pobres. A identificação dos grupos de maior vulnerabilidade — ou grupos de risco — acabava por gerar exclusão social, como por exemplo, as práticas higienistas realizadas com pacientes portadores de tuberculose e hanseníase. Com o passar dos anos e a evolução do conceito de saúde e da epidemiologia, essas estatísticas passaram a traduzir parâmetros sobre o estado de saúde daspopulações, o que representa a possibilidade de adoção de medidas específicas – preventivas promotoras da saúde e intervenções terapêuticas. É possível perceber que o clínico realiza baseado em um conjunto de instrumentais, o diagnóstico fundamentado em sinais e sintomas. De forma análoga, a epidemiologia busca estas expressões/manifestações (medidas em saúde/indicadores de saúde) por meio da contagem dos eventos. Esta contagem é realizada por meio de valores absolutos e relativos. Valores absolutos Os valores absolutos são frequências representadas pelos valores numéricos reais, como por exemplo, o número de acidentes de trabalho em uma empresa ou o número de gestantes portadoras do HIV em uma comunidade. Todavia, questiona-se: Cinco casos de acidentes de trabalho em uma empresa podem ser considerados como um valor elevado ou baixo? Esse valor pode ser considerado grave? Perceba que na epidemiologia os valores precisam ser comparados temporalmente no mesmo cenário ou em cenários distintos e no mesmo tempo. Toma-se como exemplo os cinco casos de acidentes de trabalho da empresa fictícia ao longo de uma linha temporal aqui representada. EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 26 É possível inferir que, em valores absolutos, a empresa apresenta o mesmo número de casos nos últimos 3 anos. Contudo, seria possível afirmar que o problema está estável? A resposta seria não, pois não se conhece a população exposta, ou seja, o quantitativo de trabalhadores da empresa em cada ano. Analise as informações abaixo sobre a mesma empresa do exemplo: Ano Casos de Acidentes População de trabalhadores 2012 5 20 2013 5 10 2014 5 5 Fica claro que o problema (casos de acidentes de trabalho) foi agravando conforme o tempo, chegando ao extremo, em 2014, de todos os trabalhadores terem se acidentado. Com isso, conclui-se que os valores absolutos traduzem apenas uma realidade pontual e restrita, não permitindo comparações temporais e/ou geográficas e territoriais. Nestes casos, aplicam-se os valores relativos. Valores relativos São construídos por meio da relação estatística entre dois eventos/fatores, possibilitando comparações. Na epidemiologia, utilizam-se, principalmente, mas não exclusivamente, as medidas de proporção e taxas/coeficientes. No caso das proporções, o numerador está contido no denominador, ou seja, um é subconjunto do outro. Voltaremos ao exemplo dos acidentes da empresa fictícia. Neste caso, teríamos: EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 27 As proporções da representação vista são expressas em porcentagem, variando de 0 a 100%. Observe abaixo duas formas de cálculo para os acidentes na empresa fictícia no ano de 2014. Observando os três anos do exemplo visto anteriormente, percebemos claramente a evolução dos acidentes de trabalho, tendo: A) Em 2012, 25% de acidentes; B) Em 2013, 50%; e C) Em 2014, 100%. Percebeu como o problema não estava estável? Só que este tipo de conclusão só é possível com a análise de valores relativos, principalmente quando se trata de grandes populações. Outra forma bastante utilizada em epidemiologia, os coeficientes ou taxas, utiliza a ideia de população sob risco de adoecimento, fato este que discutiremos mais adiante. Medidas de morbidade EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 28 Medem o risco de adoecimento o qual uma pessoa está exposta (incidência) e expressam a presença de uma doença/fenômeno na população investigada (prevalência). São medidas extremante úteis para descrever os problemas que acometem as pessoas e definir as prioridades, fornecendo subsídios ao planejamento estratégico em saúde. Podem ser divididas em medidas de prevalência e de incidência, sendo referidas necessariamente em relação ao tempo, espaço e população (pessoas). A seguir, conheça melhor cada uma dessas medidas. Prevalência É utilizada para medir a frequência de casos existentes de doenças, agravos e demais eventos relacionados à saúde. É como uma fotografia do cenário. É uma medida estática que representa os casos existentes em uma única observação. O método de cálculo é definido pelo número de casos existentes de determinado evento e em determinado tempo e espaço dividido pela população do mesmo espaço e tempo. O resultado deve ser sempre multiplicado por 100. P = Casos existentes do evento em determinado local e tempo x 100 População total no mesmo local e tempo O caso daquela empresa fictícia ilustra o cálculo da prevalência: Acidentes de trabalho em uma empresa fictícia EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 29 Vamos a uma atividade para que as dúvidas surjam? Atividade proposta Supondo que uma Instituição de Ensino Superior (IES) apresente um quadro de funcionários composto por: 400 professores e 600 servidores de outras áreas (administrativos, funcionários da limpeza, manutenção etc.). Após uma análise pela equipe de saúde do trabalhador do local, constatou-se 50 casos de distúrbios de voz relacionados ao trabalho. Todos os casos eram de professores da instituição. Após análise da carga horária de trabalho relacionada aos casos, construiu-se a seguinte tabela: Carga horária semanal docente na IES Casos de distúrbios da voz Número de professores Até 10 horas 0 30 Até 20 horas 2 200 Até 30 horas 17 100 Até 40 horas 31 70 TOTAL 50 400 Analisando o caso apresentado, responda: EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 30 A. Qual a prevalência de distúrbios da voz relacionados ao trabalho na Instituição de Ensino? B. Qual a prevalência de distúrbios da voz relacionados ao trabalho entre os professores da IES? C. Qual a relação entre a carga horária semanal dos docentes e a magnitude do problema (distúrbios da voz)? Chave de resposta: A. Para responder este item é importante considerar o total de casos existentes na Instituição (n=50) e a população total (n=1000). Feito isto, é necessário apenas aplicar o método de cálculo de prevalência, a saber: P = Casos existentes do evento em determinado local e tempo x 100 População total no mesmo local e tempo Analisando o caso apresentado, responda: Qual a prevalência de distúrbios da voz relacionados ao trabalho entre os professores da IES? Chave de resposta: B. O padrão de resposta é similar ao item anterior, onde se deve conhecer o total de casos (n=50) e a população de interesse da investigação, desta vez somente o total de professores (n=400). O cálculo deverá ser realizado da seguinte forma: P = (50 ÷ 400) . 100 P = 0,125 . 100 P = 12,5% Como discutimos ao longo desta primeira seção da aula, perceba que a prevalência é mutável de acordo com a população de interesse, neste caso sendo diferente a observação de toda a IES e somente o grupo de professores. EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 31 Analisando o caso apresentado, responda: Qual a relação entre a carga horária semanal dos docentes e a magnitude do problema (distúrbios da voz)? Chave de resposta: C. Para responder este item é necessário calcular a prevalência dos distúrbios de voz para cada grupo de professores em relação à sua carga horária semanal de trabalho na IES. Logo: Carga horária semanal docente na IES Casos de distúrbios da voz Número de professores Prevalência (P) Até 10 horas 0 30 0 Até 20 horas 2 200 1,0% Até 30 horas 17 100 17,0% Até 40 horas 31 70 44,3% TOTAL 50 400 12,5% Nesse sentido, é possível observar que quanto maior a carga horária semanal desse grupo de professores nessa IES, maior também a quantidade de casos de distúrbios de voz. Essa informação pode ser utilizada pela equipe de saúde de trabalhador para iniciar o processo de investigação, definir prioridades no grupo prioritário para intervenções, bem comoauxiliar no processo de tomada de decisões. Fatores influenciadores da prevalência É importante considerar que a prevalência pode ser influenciada por cinco fatores, a saber: casos novos, duração da doença, curas, migração e óbitos, conforme você pode conferir no esquema abaixo: Ainda no exemplo visto anteriormente, a prevalência reflete a quantidade de casos existentes, quanto maior a quantidade de novos casos de um evento, EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 32 maior será a prevalência. Por exemplo, em uma coorte fixa de 20 trabalhadores tem-se: Quanto à duração da doença, é importante lembrar que a prevalência é uma medida estática, como em uma fotografia. Assim, doenças/eventos de longa duração tendem a ter uma prevalência maior, quando comparados com eventos de curta duração. Exemplo Hoje em dia está na moda “bater fotos” para postar nas redes sociais, não é? Supondo que você ganhe bilhetes de entrada para uma corrida de Fórmula 1, não vai querer perder a oportunidade de uma boa fotografia, correto? Agora, qual a probabilidade de você conseguir fotografar o exato instante em que o piloto passa por você? Mínima, eu respondo! De forma análoga são as medidas de prevalência em doenças de curta duração (Baixa prevalência). As curas e óbitos também são fatores que influenciam essa medida. Quanto maior, menos casos existentes e, por sua vez, menor será a prevalência. O inverso também se aplica. Por fim, a migração é considerada como fator de influência, uma vez que a prevalência considera os limites geográficos e territoriais. Nesse sentido, se um caso imigra para o espaço de observação, ele passará a ser contado. EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 33 Melhor trabalharmos um pouco mais, não é? Faça mais uma atividade. Atividade proposta Uma empresa localizada em um município hipotético apresentava, em agosto de 2006, 425 trabalhadores. Durante o período descrito na questão não houveram admissões ou demissões de funcionários. Durante os meses de agosto e setembro de 2006, ocorreram 100 casos de uma doença transmissível entre os trabalhadores. Considerando que: dos 100 trabalhadores identificados com a doença abrangiam a totalidade dos casos dessa doença ocorridos naquela empresa, sendo que 45 eram do sexo masculino; ocorreram, entre a segunda e a última semana de setembro, 10 óbitos da doença entre os trabalhadores que adoeceram na empresa; durante a primeira semana de setembro (1/9 a 5/9), ocorreram 20 casos novos da doença na referida empresa. No mês anterior, 40 trabalhadores haviam ficado doentes, 25 dos quais apresentavam-se ainda na fase aguda, em 1º de setembro. No mês de outubro, não houveram casos novos, pois a equipe de saúde do trabalhador conseguiu conter o problema. Porém, ainda na primeira semana, existiam 34 trabalhadores doentes. Observando o exposto, responda: A. Existe predomínio por sexo do trabalhador em relação a esta doença? Justifique. B. Qual a prevalência da doença entre os trabalhadores da empresa no período de agosto até a primeira semana de setembro? C. Qual a prevalência da doença entre os trabalhadores da empresa na primeira semana de setembro? EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 34 D. Qual a prevalência da doença entre os trabalhadores desta empresa no mês de outubro? Chave de resposta: A. Para responder o primeiro item é necessário conhecer a proporção de doentes por sexo. Neste caso, sabe-se que dos 100 doentes da empresa, 45 eram do sexo masculino. Logo: P = (45 ÷ 100). 100 P = 45.0%. Se 45.0% dos doentes eram do sexo masculino, facilmente se percebe que 55.0% eram do sexo feminino (Pfeminino = 100 – 45 Pfeminino = 55.0%). Portanto, a resposta correta é: Sim, uma vez que a doença ocorreu mais em mulheres do que em homens. B. Para conhecer a prevalência no período de observação, basta saber o total de casos (n = 100) e a população (n = 425). Com isso, tem-se: P = (100 ÷ 425) . 100 P = 0,235 . 100 P = 23,5% C. De todos os itens desta questão talvez este seja o que demanda mais atenção no momento de se preparar para o cálculo. Mas, também pode se considerar um item simples de ser resolvido. Vamos lá? Sabe-se que a prevalência é o total de casos existentes de um evento em determinada população. Portanto, sabe-se que antes da primeira semana de setembro existiam 40 doentes, dos quais 25 ainda estavam doentes no período solicitado pela questão (1ª semana). Estes casos devem ser contados. Além disso, foram observados 20 casos novos da doença no período. Logo, na 1ª semana de setembro ocorreram 45 casos em uma população de 425 trabalhadores. Agora é só realizar o cálculo. P = (45 ÷ 425) . 100 P = 0,106 . 100 P = 10,6% EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 35 D. O item é simples, mas também demanda atenção. Se conhece o número de casos existentes da doença no mês de outubro (n = 34), sabendo também que não houveram casos novos do evento. Todavia, é importante lembrar que os óbitos influenciam na prevalência. Reflita que a empresa possuía 425 trabalhadores e que não houve movimentação (admissão ou demissão) no período. Porém, na segunda semana de setembro ocorreram 10 óbitos, o que aponta que em outubro a população de trabalhadores era de 415. Sabendo isso, calcula-se: P = (34 ÷ 415) . 100 P = 0,82 . 100 P = 8,2% Incidência A incidência mede a frequência de casos novos de um determinado evento em um espaço de tempo definido. Considera-se como caso novo ou incidente quando um indivíduo sadio tornou-se doente ao longo do tempo de observação. Assim, é fácil perceber que, diferente da prevalência, a medida de incidência necessita de ao menos duas observações. A incidência é dinâmica como em um filme e representa o conceito de risco: probabilidade de um indivíduo adoecer. EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 36 Atenção A fim de exemplificar a ideia de risco, suponha que você trabalhe em uma sala com 15 pessoas e que você esteja sadio. No primeiro dia de observação chega um de seus colegas de sala com um quadro de gripe. No segundo dia, mais dois colegas estão gripados (2 casos novos e 3 existentes). No terceiro, 7 pessoas já estão gripadas (4 casos novos em relação ao anterior). No quarto dia, temos 13 pessoas gripadas (6 casos novos em relação ao dia anterior). Perceba que seu risco de adoecimento cresceu em relação ao primeiro dia. Se continuar assim, você também ficará gripado. Este é o verdadeiro objetivo de monitorar a incidência, ou seja, medir os riscos que uma população está exposta. Incidência Cumulativa (Ic) A incidência cumulativa fornece a estimativa da probabilidade de adoecimento (risco) durante um período de tempo específico. Calcula-se do seguinte modo: Ic = Número de casos novos detectados no período de tempo Total de indivíduos em risco de adoecimento no início do período de tempo Atenção Exemplo Em uma empresa hipotética, com 150 trabalhadores, ocorreram 50 casos de uma doença ocupacional X em 1 ano. Assim, temos: Ic = 50 ÷ 150 → Ic = 0,3 ou 30,0%. Pode-se dizer que o risco de adoecimento para a doença X a que essa população está exposta nesse período é de 30,0%. EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 37 Note que a Ic é uma medida de proporção e, portanto, seu resultado deve ser multiplicado por 100 e expresso em porcentagem. Outra consideração relevante é que sua aplicação deve ocorrer em populações fixas, nas quais não há entrada de novos casos no período de observação. Densidade de Incidência (Id) É a medida mais utilizada para a incidência. É especialmente aplicada em estudos epidemiológicos (ex.: estudos de coortes), nos quais os indivíduos são acompanhados por um período de tempo, mas quando não se pode garantiro seguimento uniforme devido a mortes, perdas etc. A medida considera o número de novos casos do evento e o somatório de tempo em que cada indivíduo viveu sem a doença. O método de cálculo é representado pela fórmula: Id = Número de casos novos no período de tempo x 10n Soma total de pessoas-tempo em risco Geralmente, é utilizado em taxas e, na epidemiologia, no cálculo da Id. É chamado também de base do indicador. Cada profissional pode eleger a base conforme o tamanho de sua população. Porém, é importante lembrar que todo valor na epidemiologia deve ser comparado e, por isso, é especialmente importante informar qual é a base indicada. A inobservância dessa recomendação gera impossibilidade de comparações. A taxa de incidência (TI) como indicador de saúde Para fins de utilização desta taxa como indicador de saúde em nível populacional (e na maior parte dos casos na saúde do trabalhador), o cálculo acaba sendo mais simples, uma vez que se convenciona a medida anualmente EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 38 e, por isso, o tempo em risco acaba sendo 1. A base do indicador, na maior parte dos casos, é 100 mil. Logo, o método de cálculo será: TI = Número de casos novos no período de tempo em determinada população x 10n Soma total de pessoas no mesmo tempo Portanto, se o desejo é calcular a taxa de incidência de tuberculose em uma região X do país no ano de 2013, considerando que ocorreram 1000 novos casos da doença em uma população de 200.000 habitantes, teríamos: Ti = o resultado da Ti seria de 500 casos novos por 100.000 habitantes-ano. Agora, vamos trabalhar um pouco? Faça uma atividade. Atividade proposta Visando à implementação de medidas de controle de doenças em uma empresa que trabalha com alimentos e onde os funcionários são todos residentes de uma mesma localidade, a equipe de saúde do trabalhador resolveu monitorar a incidência da doença x (de veiculação por alimentos) na cidade dos trabalhadores. Observou-se que: a. no ano de 2011 ocorreram 300 casos novos, em uma população de 22350 habitantes; b. no ano de 2012, ocorreram 350 casos novos, em uma população de 24585 habitantes; c. no ano de 2013, ocorreram 360 casos novos, em uma população de 27043. Sabendo disso, calcule as taxas de incidência para os respectivos anos e interprete os resultados. Chave de resposta: Tendo em vista que o cálculo da incidência se dá como um indicador de saúde e em uma população fixa no mesmo ano calendário, utilizaremos a seguinte base de cálculo: EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 39 Id = Número de casos novos no período de tempo x 10n Soma total de pessoas em risco O 10n será 100 000, uma vez que se trata de um município, permitindo comparações com outras localidades no futuro. Lembre-se de que isto é uma convenção. A menos que não se deseje comparar com outras cidades, a base do indicador deverá ser sempre 100.000. Dito isto, calcula-se: TI2011 = (300 ÷ 22350) . 100 000 TI2011 = 0,0134228 . 100 000 TI2011 = 1342,3 casos novos por 100 000 habitantes / ano TI2012 = (350 ÷ 24585) . 100 000 TI2012 = 0,0142363 . 100 000 TI2012 = 1423,6 casos novos por 100000 habitantes / ano TI2013 = (360 ÷ 27043) . 100 000 TI2012 = 0,0133121 TI2012 = 1331,2 casos novos por 100000 habitantes / ano Analisando os três anos, é possível observar que a incidência teve uma elevação de 2011 para 2012, caindo no último ano de observação (2013). Perceba que embora o número absoluto de casos tenha subido discretamente (de 350 para 360), houve também um crescimento populacional de 10%, o que colaborou para a redução da taxa de incidência. Nesse sentido, é possível inferir que em 2013 o risco dessa doença caiu em relação aos dois anos anteriores de observação. Relações entre a prevalência e a incidência Como visto anteriormente, a prevalência de um evento é diretamente influenciada pela incidência e duração da doença. Portanto, pode-se afirmar que a prevalência é igual ao produto entre a incidência e a duração, EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 40 representado por: P = I x D. Não vamos utilizar esta informação para formulação de cálculos, mas de modo a ampliar o raciocínio sobre o evento. Uma atividade prática valerá mais que o texto! Atividade proposta A História Natural da Doença Ocupacional X está representada abaixo: Considerando um grupo fixo de trabalhadores, responda: o que acontecerá... a) Com a incidência e a prevalência da doença se medidas preventivas eficazes forem adotadas, dilatando o período de tempo t0-t1, ou seja, se as pessoas passarem mais tempo sem adoecer? b) Com a incidência e a prevalência da doença se um tratamento eficaz for adotado, dilatando assim o período t1-t2, ou seja, as pessoas vivendo mais tempo com a doença (sobrevida)? É importante considerar que o raciocínio desta questão está pautado na relação expressa pela fórmula: Prevalência (P) = Incidência (I) x Duração da Doença (D). Chave de resposta: A. Tendo em vista que os trabalhadores passarão a ficar sadios durante mais tempo, as pessoas adoecerão em menor velocidade, ou seja, menos casos novos ocorrerão. Portanto, a incidência da doença tende a reduzir. Com o mesmo raciocínio, responde-se a prevalência. Se P=I x D, tendo Sadio Doente Morto T0 T1 T2 Tempo EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 41 menor incidência, teremos também uma menor prevalência. Coloquemos números para auxiliar a compreensão! No exemplo que daremos, antes da adoção das medidas preventivas tinha-se a Taxa de Incidência de 3 casos novos por 100 000 habitantes / ano e a duração média estimada em 5 meses. Portanto, o cálculo se daria da seguinte forma: P = 3 x 5 → P = 15,0%. Se a incidência reduzir para 2,0, como resultado das medidas preventivas adotadas antes do adoecimento dos trabalhadores, teríamos: P = 2,0 x 5 → P = 10,0%. Se a incidência reduzir, a prevalência também irá cair! B. Como o tratamento somente ocorre depois que as pessoas estão doentes, a incidência não irá alterar. Lembre-se de que a incidência são os casos novos da doença e, por isso, somente será alterada por medidas que antecedem o evento. Já em relação à prevalência, é importante considerar que adotando-se um tratamento eficaz as pessoas viverão mais tempo e, por isso, a duração da doença, ou seja, o tempo de sobrevida aumentará. Se a duração da doença eleva, a prevalência também elevará, sem que isto denote piora do quadro. O que na verdade está ocorrendo é que as pessoas estão morrendo menos daquela doença. Algo similar vem ocorrendo com AIDS no Brasil e na maior parte do mundo, devido à introdução de novos medicamentos. Mas vamos retomar um exemplo com números para simplificar a compreensão! No exemplo que daremos na letra da questão, consideramos que a Prevalência era de 15,0% com a Incidência de 3 casos novos ao ano e a duração estimada da doença de 5 meses. Se introduzirmos um tratamento que eleve a duração de 5 para 12 meses, teremos o seguinte: P = I x D → P = 3 x 12 → P = 36,0%. Vejam que a prevalência deu um salto, passando de 15,0 para 36,0%. Medidas de mortalidade e letalidade Os indicadores de mortalidade constituem a maneira mais antiga de medir os níveis de saúde de uma população, datando do século XVI, em Londres. Existem inúmeras formas de medir a mortalidade, porém nesta aula EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 42 abordaremos somente os métodos mais utilizados na abordagem da saúde dos trabalhadores. Serão pontos de debate: a mortalidade geral e específica. De maneira similar à incidência, os indicadores de mortalidade medem o risco, porém o risco de adoecer e de morrer que uma população está exposta. Coeficiente de Mortalidade Geral O cálculo do coeficiente de mortalidade geral estimao risco de morrer, considerando-se todas as formas/causas de óbito a que uma pessoa está sujeita em determinada região e em determinado período de tempo. O método de cálculo se dá: CGM = Número total de óbitos (todas as causas) em determinada população e em um período de tempo x 10n Soma total de pessoas do local e no mesmo tempo Adota-se, na maioria dos casos, a base do indicador como 100 mil. Para ilustrar o caso vamos calcular a Mortalidade Geral no Brasil para o ano de 2012. Em consulta ao DATASUS (http://www2.datasus.gov.br/), é possível observar que o país apresentou 1181166 óbitos neste período, tendo uma população estimada de 195227583 habitantes. Com isso, o indicador seria calculado da seguinte maneira: CGM = (1181166÷195227583) . 100000 CGM = 0,00605 . 100000 CGM = 605,02 óbitos por 100000 mil habitantes/ano. Destaca-se que deve-se ter cautela no momento de realizar comparações do CGM em relação a distintos espaços e períodos de tempo. Isto ocorre uma vez que este indicador tende a ser influenciado pela distribuição etária da população. Pergunta-se: pela história natural da vida, qual a maior probabilidade de morte: em jovens ou idosos? Resposta, em idosos! Populações mais velhas tendem a apresentar um maior CGM sem que isso revele pior nível de saúde. Aliás, é importante considerar que populações com EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 43 maior desenvolvimento socioeconômico tendem a ter uma demografia com crescente população idosa. Nesse sentido, quando se pretende comparar o CGM entre duas ou mais populações ou períodos de tempo distintos, caso a distribuição etária seja diferente, é necessário realizar uma padronização. Vamos a uma atividade? Atividade proposta Em continuidade a análise da mortalidade geral no Brasil, aponte a região do país cujo CGM é o maior e explique o que provavelmente influenciou este resultado. Lembre-se de utilizar a base do indicador como 100000 habitantes / ano. Abaixo seguem os valores absolutos dos óbitos e a população estimada para cada região. Região Óbitos População Estimada CGM / 100 mil hab. / ano Região Norte 70666 16533217 Região Nordeste 305746 54203653 Região Sudeste 543383 82037573 Região Sul 183528 27858277 Região Centro-Oeste 77843 14594863 Total 1181166 195227583 605,02 Fonte: MS/SVS/DASIS - Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM; interpolação intercensitária e projeções utilizadas no Saúde no Brasil – 2012. Chave de resposta: Tomando como base o método de cálculo da mortalidade e utilizando a base do indicador como 105, ou seja, 100000, teríamos: EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 44 Região Óbitos População Estimada CGM / 100 mil hab. / ano Região Norte 70666 16533217 427,4 Região Nordeste 305746 54203653 564,1 Região Sudeste 543383 82037573 662,4 Região Sul 183528 27858277 658,8 Região Centro-Oeste 77843 14594863 533,4 Total 1181166 195227583 605,0 Fonte: MS/SVS/DASIS - Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM; interpolação intercensitária e projeções utilizadas no Saúde no Brasil – 2012. Desta forma, a região com maior CGM é a Sudeste, seguida do Sul e Nordeste. As regiões Sudeste e Sul são as zonas de maior desenvolvimento socioeconômico do país e, provavelmente, são estas também as localidades que a distribuição etária da população tende ao envelhecimento. Como o CGM é um indicador influenciado pela distribuição etária, ele apresentou-se mais elevado. Todavia, isto não significa que os níveis de saúde são piores nestas áreas. Coeficiente de Mortalidade Específica Se no CGM a medida representa o risco de morrer por qualquer causa, a mortalidade específica representa o risco de morrer por uma doença/evento. Seu cálculo é representado da seguinte forma: CGM = Número total de óbitos por uma causa específica em determinada população e em um período de tempo x 10n Soma total de pessoas do local e no mesmo tempo Onde a base do indicador (10n) é geralmente igual a 100 000. Tomemos como exemplo o caso sobre asbesto trabalhando na seção sobre incidência. Naquela empresa tivemos 10 pacientes acompanhados, tendo três evoluído ao óbito. Logo, o cálculo de Mortalidade Específica de Câncer de Pulmão provocado por asbesto seria: CME = (3 ÷ 10) . 10n CME = 0,3 . 10n. Como a população do exemplo é pequena, tomemos a base do indicador como EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 45 100. Logo teríamos o CME = 30 óbitos por câncer de pulmão provocados por asbesto para 100 pessoas ano. Por fim, a letalidade é o indicador capaz de medir a severidade/gravidade de um evento, indicando não só os aspectos biomédicos do evento, mas a qualidade da assistência, o acesso aos serviços, etc. É um indicador de proporção representado pelo seguinte método: L = Total de óbitos por uma causa x 100 Total de doentes pela mesma causa Atividade proposta Tomemos um caso já conhecido para trabalhar este item. Uma empresa localizada em um município hipotético apresentava, em agosto de 2006, 425 trabalhadores. Durante o período descrito na questão, não houve admissões ou demissões de funcionários. Durante os meses de agosto e setembro de 2006, ocorreram 100 casos de uma doença transmissível entre os trabalhadores. Considerando que: • os 100 trabalhadores identificados com a doença abrangiam a totalidade dos casos dessa doença ocorridos naquela empresa, sendo que 45 eram do sexo masculino; • ocorreram, entre a segunda e a última semana de setembro, 10 óbitos da doença entre os trabalhadores que adoeceram na empresa; • durante a primeira semana de setembro (1/9 a 5/9), ocorreram 20 casos novos da doença na referida empresa. No mês anterior, 40 trabalhadores haviam ficado doentes, 25 dos quais apresentavam-se ainda na fase aguda, em 1º de setembro. • no mês de outubro, não houve casos novos, pois a equipe de saúde do trabalhador conseguiu conter o problema. Porém, ainda na primeira semana, existiam 34 trabalhadores doentes. EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 46 Observando o exposto, responda: a) Calcule a mortalidade específica da doença nessa empresa, considerando a base do indicador com 100. b) Calcule a letalidade da doença nessa empresa. c) Qual o significado prático dessas informações para dia a dia da equipe de saúde do trabalhador dessa empresa? Chave de resposta: A. O cálculo se dará utilizando as informações sobre o número de óbitos ocorridos no período (n=10) e a população estudada (n=425). Desta forma, tem-se: CME = (10 ÷ 425) . 100 CME = 0,023 . 100 CME = 2,3 óbitos por 100 habitantes B. No cálculo da letalidade, são necessárias as informações sobre o número de óbitos ocorridos pela doença (n=10) e o número total de doentes no período (n=100). Portanto, calcula-se: L = (10/100) L = 0,1. Lembra-se que a Letalidade é uma medida de proporção e, por isso, seu resultado obrigatoriamente é multiplicado por 100. Logo: L = 0,1 . 100 L = 10% C. A mortalidade específica produzirá a informação sobre o risco de adoecer e morrer na população, trazendo à tona a discussão sobre a importância de medidas preventivas e, principalmente, sobre a determinação de prioridades, quando se conhece a mortalidade específica de outras doenças do local. Já a letalidade, é um indicador de gravidade. Ela mede a severidade da doença na localidade, bem como a qualidade assistencial. Portanto, se a letalidade está elevada em uma doença que tradicionalmente esta medida é baixa, pode ser necessário refletir sobre a forma que a assistência à saúde está sendo prestada. EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 47 Material complementar Para saber mais sobre a medição de ocorrência da doença, leia as matérias em: Jornal de Pediatria e Determinantes Sociais em Saúde, disponíveis em nossa bibliotecavirtual. Referências MEDRONHO, R.A. Epidemiologia. 2 ed. São Paulo: Atheneu, 2009. PEREIRA, M.G. Epidemiologia: teoria e prática. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2000. ROUQUAYROL, M.Z.; ALMEIDA FILHO, N. Epidemiologia & Saúde. 6. ed. Rio de Janeiro: Medsi, 2003. MINAYO, M.C.S. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 12. ed. São Paulo: Hucitec, 2010. Exercícios de fixação Questão 1 Considerando o quadro abaixo, assinale a opção que define o ano de prioridade, pela magnitude, de dengue no município hipotético: Ano População Dengue Casos Novos Casos existentes 2003 7093 410 1890 2004 7143 380 2000 2005 7193 470 1500 2006 7290 470 1500 a) 2003 EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 48 b) 2004 c) 2005 d) 2006 Questão 2 Uma empresa de 500 trabalhadores vem apresentando elevado número de funcionários afastados com distúrbios depressivos. “Iniciamos o ano passado com 12 afastamentos por esse motivo e ao longo do referido ano tivemos mais 38 funcionários afastados com depressão”, diz o gerente. Com vistas a monitorar a ocorrência desse evento, a equipe de saúde do trabalhador resolveu então iniciar o acompanhamento neste ano. Assinale a opção que corresponde à prevalência: a) 2,4% b) 7,6% c) 10,0% d) 13,1% Questão 3 A doença y, que tem duração de 7 meses, vem acometendo trabalhadores da empresa X, que possui um quadro fixo de 50 funcionários. Com vistas ao monitoramento do caso, a equipe de saúde do trabalhador resolveu montar uma representação esquemática (abaixo). Representação esquemática da distribuição dos casos da doença Y ao longo dos meses na empresa X EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 49 Nesse sentido, assinale a alternativa correta: a) Os quatro casos ocorridos no primeiro mês são necessariamente casos novos. b) No mês 2, a prevalência foi de 2,5%. c) A prevalência no período analisado (5 meses) foi de 18,0%. d) A prevalência no período analisado (5 meses) foi de 64,0%. Questão 4 Em 1990, em Camaçari, dois funcionários que trabalhavam em um Polo Petroquímico evoluíram a óbito. Um faleceu com diagnóstico de aplasia medular e o outro com Leucemia Mieloide Crônica. Como a empresa processava benzeno, suspeitou-se de doença ocupacional estimulada por bezenismo. Após avaliar 7356 trabalhadores, afastou-se 216 funcionários devido a alterações hematológicas. Baseado no caso aponte a prevalência de alterações hematológicas entre os avaliados: a) 97,1% b) 27,0% c) 2,9 % d) 0,03 % 4 1 5 4 2 4 7 4 9 7 4 3 7 4 4 7 4 4 7 4 Tempo (meses) Número de casos 6 4 EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 50 Questão 5 Uma empresa com 1000 funcionários, situada no município de nome “Epidemiologia Feliz”, sofreu, no ano de 2009, com uma estranha doença que acometeu as pessoas da cidade. Neste ano, 400 funcionários adoeceram da tal patologia e 39 morreram. Com a redução da demanda de compra, ocorreu ainda a demissão de 150 trabalhadores no ano de 2009. No ano seguinte (2010), ainda existiam 30 pessoas com a doença, porém não houve mortes ou demissões. Baseado no caso assinale a resposta correta: a) As prevalências foram de 40,0% e 3,7%, respectivamente, em 2009 e 2010. b) As prevalências foram de 25,0% e 3,0%, respectivamente, em 2009 e 2010. c) As prevalências foram de 21,1% e 3,0%, respectivamente, em 2009 e 2010. d) As prevalências foram de 18,1% e 3,7%, respectivamente, em 2009 e 2010. Questão 6 (FUNDEPES, 2012) O cálculo da incidência de uma doença refere-se: a) Ao número de casos existentes de uma determinada doença num período de tempo definido. b) À análise de cura de uma doença em determinado período de tempo. c) Ao número de casos novos de uma determinada doença num intervalo de tempo definido. d) Ao número de casos novos e existentes de uma determinada doença num período de tempo definido. EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 51 Questão 7 (Adaptado do livro de exercício do Medronho – 2008) Considerando um grupo fixo de indivíduos portadores de HIV, infectados ao longo de um mesmo ano- calendário, através da mesma via. A figura abaixo representa, resumidamente, a história natural da AIDS nesse grupo e sem interferência medicamentosa. Tomando como referência o grupo acima, analise os possíveis impactos na Prevalência do HIV, na Incidência da AIDS, na Prevalência da AIDS e na Mortalidade da AIDS de um antirretroviral que aumente o período de incubação (T₀ - T₁) sem alterar a sobrevida (T₁ - T₂). A seguir, assinale a alternativa correta: a) O medicamento reduzirá a incidência da AIDS, todavia aumentará a prevalência da doença e, por sua vez, a mortalidade da mesma. b) O medicamento reduzirá a incidência, a prevalência e a mortalidade da AIDS. c) O medicamento reduzirá a prevalência do HIV e, por sua vez, a incidência e a mortalidade por AIDS. d) O medicamento reduzirá a prevalência do HIV. Questão 8 A fim de avaliar o comportamento das infecções por dengue em um município hipotético, construiu-se o quadro abaixo. Ano População Dengue Infecção AIDS Óbito T0 T1 T2 EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 52 Casos Novos Casos existentes Óbitos 2003 709340 1600 2800 37 2004 714305 38 200 67 2005 719306 47 150 30 Mediante a análise, é possível inferir corretamente que: a) No ano de 2003, a doença apresentou-se mais grave, uma vez que houve uma explosão no número de casos. b) No ano de 2003, a prevalência da doença foi a maior, uma vez que o número de óbitos foi o menor de todo o período observado. c) A população da saúde apresentou o maior risco de morte no ano de 2004, uma vez que o indicador de letalidade apresentou o maior valor de todo o período de observação. d) Em 2004, a gravidade da doença foi a maior de todo o período observado. Este indicador pode refletir a significação de perda de qualidade da assistência ou de mudanças nas propriedades do agente infeccioso. Questão 9 (FUNDEPES, 2012) A que se refere o termo letalidade em epidemiologia? a) Incidência de mortes entre portadores de uma determinada doença, em um certo período de tempo, dividida pela população de doentes. b) Prevalência de mortes entre portadores de uma determinada doença, em um certo período de tempo, dividida pela população de doentes. c) Incidência de mortes entre portadores de uma determinada doença, em um certo período de tempo, dividida pela população em geral. d) Prevalência de mortes entre portadores de uma determinada doença, em um certo período de tempo, dividida pela população em geral. EPIDEMIOLOGIA EM SAÚDE DO TRABALHADOR 53 Questão 10 (UFSC, 2008) A letalidade da meningite meningocócica num surto da doença foi de 8% no ano. Morreram 56 pessoas; quantos foram os casos da doença? a) 550 b) 600 c) 700 d) 750 10n ou base do indicador: Note que o 10n representa uma potência de 10 (ex.: 102, 103, 104 ou 100, 1000, 10000). Geralmente é utilizado em taxas e, na epidemiologia, no cálculo da Id. É chamado também de base do indicador. Cada profissional pode eleger a base conforme o tamanho de sua população. Porém, é importante lembrar que todo valor na epidemiologia deve ser comparado e, por isso, é especialmente importante informar qual é a base indicada. A inobservância desta recomendação gera impossibilidade de comparações. No caso de cálculo realizados em populações grandes (bairros, municípios, estados e no país), geralmente, se utiliza a base como 105, ou seja, 100 000. Estudos de coorte: São estudos epidemiológicos nos quais as pessoas são alocadas / classificadas em dois grupos distintos, sendo um de expostos a determinado evento – objeto de investigação – e um de não expostos. Depois disso, os grupos
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