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Psicologia da Educação Vila Velha (ES) 2018 Escola Superior Aberta do Brasil Diretor Geral Nildo Ferreira Coordenador do Curso de Administração EAD Almir da Cruz Sousa Coordenador do Curso de Administração Pública EAD Almir da Cruz Sousa Coordenador do Curso de Tecnologia em Gestão de Recursos Humanos EAD Almir da Cruz Sousa Coordenador do Curso de Pedagogia EAD Maria da Ressurreição da Silva Coqueiro - Marizinha Coordenador do Curso de Sistemas de Informação EAD Jadson do Prado Rasalfalski Coordenador do Curso de Ciências Contábeis EAD Fabrício Conceição das Neves Secretário Acadêmico Aleçandro Moreth Produção do Material Didático-Pedagógico Delinea Tecnologia Educacional / Escola Superior Aberta do Brasil Design Gráfico Rayron Rickson Cutis Tavares Felipe Silva Lopes Caliman Diagramação Rayron Rickson Cutis Tavares Felipe Silva Lopes Caliman Equipe Acadêmica da ESAB Coordenadores dos Cursos Docentes dos Cursos Copyright © Todos os direitos desta obra são da Escola Superior Aberta do Brasil. www.esab.edu.br Apresentação Caro estudante, Seja bem vindo à ESAB. A Escola Superior Aberta do Brasil, funda-se no princípio básico de atuar com educação a distância, utilizando como meio, tão somente, a internet. Em 2004,foi especialmente credenciada para ofertar cursos de pós-graduação a distância, via e-learning, utilizando-se de software próprio denominado Campus Online. Em 2009 foi credenciada com Instituição de Ensino Superior – IES, através da portaria MEC nº 1242/2009, de 30 de dezembro de 2009, ocasião em que também foi autorizada a ofertar o curso de pedagogia – licenciatura, na modalidade presencial, conforme portaria MEC nº 14/2010, de 9 de janeiro de 2010. Em outubro de 2012 recebeu o Prêmio Top Educação 2012, da Editora Segmento, sendo reconhecida como a Melhor Instituição de Ensino EAD para Docentes. Em 2013 é aprovada para a oferta dos cursos de: Administração (Bacharelado); Pedagogia (Licenciatura) e Sistemas de Informação (Bacharelado), todos na modalidade EAD, com avaliação máxima das comissões avaliadoras. Nós estamos familiarizados com o termo “Psicologia”, não é mesmo? Ela está no nosso dia a dia. Podemos, então, iniciar o estudo da Psicologia da Educação relacionando os nossos conhecimentos sobre a Psicologia, pois, de fato, foi a partir da história do surgimento da Psicologia, de seus conceitos básicos e de suas principais abordagens teóricas que se promoveram as bases para o nascimento da Psicologia Educacional, fazendo com que exista uma relação entre ambas. Ressalto que a Psicologia da Educação estuda o que acontece no ambiente educacional: quais suas intervenções e qual a influência dos métodos de ensino e as práticas gerais de seu entorno. Estuda, portanto, a dinâmica do ensino, ocupando-se especialmente dos problemas vividos nos processos de ensino-aprendizagem. O alvo de maior preocupação da Psicologia da Educação é auxiliar as pessoas, as crianças e, sobretudo, os escolares com dificuldades, problemas e outras especialidades (como é o caso dos denominados superdotados) a equilibrarem e a superarem tais condições na aprendizagem. Esse material utilizou como base teórica as obras dos autores Bock, Teixeira e Furtado (2009), Cool (1995) e Goulart (2009). Bom estudo! Equipe Acadêmica da ESAB Objetivo O nosso objetivo é introduzir o estudo das atuais abordagens da Psicologia da Educação e suas implicações mediante alguns pressupostos filosóficos, epistemológicos e teorias subjacentes. Competências e habilidades • Conhecer conceitos básicos de Psicologia da Educação, fundamentais para a atuação profissional, refletindo sobre a sua implicação na dinâmica do processo de ensino e aprendizagem. • Entender o desenvolvimento da Psicologia da Educação, interpretando e relacionando alguns de seus pressupostos filosóficos e teorias subjacentes com as atuais abordagens da educação, permitindo o desenvolvimento de respostas inéditas, criativas e eficazes para problemas novos. • Aplicar os fundamentos do processo de ensino e aprendizagem, levando em consideração suas implicações em atos, tendências, fenômenos ou movimentos da atualidade. • Articular o conhecimento de psicólogo da educação com os demais saberes para solucionar determinadas situações-problema e posicionar-se diante delas com outros profissionais que integram as equipes de trabalho. Ementa A disciplina visa oportunizar a compreensão dos fundamentos e dinâmica do processo de ensino e aprendizagem a partir das principais abordagens teóricas da Psicologia, acentuando a importância desta disciplina no curso de formação de educadores. Para tanto, inicia-se com uma introdução ao estudo da Psicologia de forma a permitir ao egresso conhecimento de conceitos básicos de Psicologia, fundamentais para o estudo e atuação do profissional da área de Educação escolar, refletindo sobre a natureza humana nas suas dimensões biopsicossocial. Sumário 1. Levantamento histórico ..................................................................................................7 2. Introdução ao estudo da Psicologia da Educação ..........................................................12 3. O âmbito da Psicologia da Educação .............................................................................17 4. Primeiras definições da Psicologia da Educação ............................................................21 5. Desenvolvimento de um papel ativo do Psicólogo em Educação no processo educacional ...............................................................................................25 6. As principais escolas de pensamento na área de Psicologia ...........................................29 7. Relação entre Psicologia da Educação e Desenvolvimento Infantil ................................36 8. Teorias de Freud sobre a constituição do aparelho psíquico ..........................................41 9. Contribuição da Psicanálise Freudiana à educação ........................................................50 10. Freud e a Psicanálise no contexto educacional ..............................................................55 11. Abordagem da Psicologia Humanista na Psicologia da Educação ..................................62 12. A Psicologia Analítica de Jung e a educação ..................................................................67 13. Novas escolas de pensamento e suas contribuições na Psicologia: as vertentes cognitivistas ..............................................................................................72 14. A Psicologia Educacional como uma área de pesquisa ...................................................78 15. A natureza da Psicologia Cognitiva ................................................................................83 16. Aspectos do desenvolvimento humano: físico, cognitivo e social ..................................88 17. Aspecto físico-motor .....................................................................................................94 18. Aspectos cognitivos e suas implicações no desenvolvimento humano .........................99 19. Aspectos socioculturais do desenvolvimento social humano .......................................106 20. O conhecimento social e o desenvolvimento de normas e valores entre dois e seis anos ......................................................................................111 21. Abordagens conceituais de desenvolvimento .............................................................116 22. As concepções inatista e apriorista de desenvolvimento humano ...............................122 23. A concepção ambientalista de desenvolvimento humano ...........................................126 24. A concepção interacionista de desenvolvimento humano ...........................................130 25. Relações entre aprendizagem e desenvolvimento ......................................................136 26. Teoria do desenvolvimento humano em Piaget ..........................................................14027. Teoria do desenvolvimento humano em Vygotsky ......................................................145 28. Teoria do desenvolvimento humano em Wallon..........................................................150 29. A teoria humanista de Carl Rogers e suas contribuições para o processo de ensino e aprendizagem ............................................................................154 30. Aspectos gerais da Teoria do Desenvolvimento Cognitivo Infantil ...............................158 31. Os princípios psicológicos da brincadeira e sua importância no desenvolvimento infantil .......................................................................................164 32. Teorias da Aprendizagem e suas características relevantes .........................................169 33. O cérebro humano e as atividades conscientes ............................................................174 34. Processos de socialização, atitudes, mudanças e motivações ......................................178 35. Desenvolvimento da personalidade sob a ótica da Teoria Psicanalítica, Teoria Humanista e Perspectiva Social/Cognitiva ...................................182 36. Recursos para a aprendizagem e a ênfase em atividades conscientes .........................186 37. Inteligência, afetividade e emoção .............................................................................192 38. Breve discussão sobre sexo, gênero, sexualidade e diversidade sexual ........................198 39. Diversidade étnica, identidade e ética no espaço escolar ...........................................203 40. O papel e o valor das interações sociais na escola ........................................................207 41. O papel e o valor da relação entre escola e família ......................................................211 42. Adolescência: características fundamentais, processos centrais no desenvolvimento e conexões elementares .............................................................215 43. O desenvolvimento dos relacionamentos sociais e as relações interpessoais no contexto escolar ..................................................................221 44. Desafios para a Psicologia da Educação: a interatividade e contribuições de outras áreas ......................................................................................225 45. Desenvolvimento atípico .............................................................................................230 46. Além da família: o impacto da cultura mais ampla no desenvolvimento social humano .................................................................................235 47. Tópicos atuais para especializações na área de Psicologia da Educação .......................240 48. Conclusões do módulo ................................................................................................244 Glossário ............................................................................................................................250 Referências ........................................................................................................................273 www.esab.edu.br 7 1 Levantamento histórico Objetivo Problematizar a constituição do desenvolvimento histórico da Psicologia como ciência e a introdução de seu estudo. Para darmos o clique de partida, serão necessários alguns sinalizadores importantes sobre a disciplina que você vai começar a estudar! Convido você a acompanhar um pouco do desenvolvimento histórico da Psicologia como ciência e a introdução ao estudo de seu objeto. Qual a importância de se conhecer a história da Psicologia? Ora, percorrer as interrogações feitas sobre a natureza humana, desde muitos séculos atrás, não só nos oferece a possibilidade de saber sua importância e, a partir do conhecimento de sua história, entender os processos históricos que redundaram na formulação de todas as teorias psicológicas, mas também termos a oportunidade de identificar o seu próprio objeto de estudo e adentrar no objetivo específico da Psicologia da Educação, que é o foco central deste material didático. Figura 1 – O ser humano sempre refletiu sobre si e sobre a vida. Fonte: <commons.wikimedia.org>. www.esab.edu.br 8 O ser humano sempre refletiu sobre si próprio, sobre a vida, o nascimento e a morte, a origem do medo e das emoções, o bem e o mal, o sono e os sonhos, o amor etc. Um dos temas mais apaixonantes com que a humanidade sempre conviveu é o “relacionamento entre a mente e o corpo”, assunto que, na filosofia da mente, é denominado dualismo. Esse conceito nos indica a suposição de que os fenômenos mentais, em alguns aspectos, são algo não físico, imateriais, existindo assim a completa separação entre mundo mental e mundo físico. É o mesmo que dizer: mente e corpo são duas coisas diferentes. Figura 2 – O dualismo cartesiano. Fonte: <commons.wikimedia.org>. Comecemos nosso estudo com um resumo das ideias dos considerados maiores pensadores que fecundaram as bases da Psicologia até esta atingir o status de ciência. Nesse caminho, não vou me ater à organização temporal do relato histórico, certo? As coisas que acontecem no mundo não são lineares, numa ordem como de 1 a 10. Elas acontecem o tempo todo e em todos os lugares! www.esab.edu.br 9 A Psicologia não surgiu como uma disciplina separada, até o final de 1800. Sua primeira história pode ser rastreada ao tempo dos gregos antigos, mas suas raízes estão lá no convencimento de que o ser humano das épocas primitivas tinha nele um certo espírito, pensamento que caracterizava o nó gerador do pensar sobre a noção de alma e corpo. Com o passar do tempo, veio a necessidade de se debruçar sobre o estudo da alma, considerada então uma substância material sutil, fluida, como a fumaça! Vejamos, a seguir, alguns dos mais importantes pensadores que tomaram para si essa árdua tarefa do pensar humano. • Hipócrates (Grécia, 460-370 a.C.): foi precursor da medicina, desenvolveu uma medicina baseada na experiência clínica, rompendo com a prática apoiada na magia e na religião. Buscou criar uma teoria que relacionasse o tipo físico com a personalidade das pessoas – corpo e mente. • Platão (Grécia, 428-348 a.C.): concebia o corpo como a matéria e a alma como o imaterial, o divino. A razão está acima do sensível, que só existe a partir do inteligível. Platão pensou no poder do espírito sobre a matéria: o ser humano é superior se dotado da razão. • Aristóteles (Grécia, 384-322 a.C.): para este pensador, as coisas sensíveis são objeto dos sentidos e as coisas inteligíveis são objeto do pensamento, da inteligência, da razão. A alma humana é o espírito, a racionalidade, a inteligência, o pensamento, e tem a atividade fundamental de conhecer. • Sócrates (Grécia, 469-399 a.C.): possui ideias muito próximas às de Platão. Entende corpo e alma separados, mas que interagem. A alma é indivisível, dotada de movimento próprio, pensante e conhecedora, semelhante ao divino, ao imortal; o corpo é material e se divide em partes; é mortal, sensível, em mudança constante, parecendo ao que é humano. • René Descartes (França, 1596-1650): marcou profundamente a vida humana. Introduziu uma versão moderna do pensar humano: o dualismo espírito-corpo. Para Descartes, mente e corpo são entidades distintas que interagem para formar a experiência humana. Mecanicista convicto e defensor do raciocínio calculativo, exclui todas as outras forças que não as mecânicas. O corpo, uma porção de www.esab.edu.br 10 matéria com a propriedade essencial de ser espacialmente estendida é uma máquina, cujas operações são explicadas pelos mesmos princípios e leis físicas aplicadas ao mundo inorgânico; o corpo é ligado à mente, uma propriedade essencial que pensa. • Outros notáveis pensadores que influenciaram a história da Psicologia – Thomas Hobbes (Inglaterra, 1588-1679), John Locke (Inglaterra, 1632-1704), David Hume (Reino Unido, 1711-1776)e Immanuel Kant (Prússia, 1724-1804): Criticaram a “Psicologia” metafísica vigente até então, defendendo que a alma é produto de nossa fantasia e a intervenção da experiência nos fornece, a rigor, apenas uma ou outra percepção; de forma alguma nos oferece a sensação de uma alma, na forma de uma substância especial. Ou seja, prevalece a pura razão. Psicologia vem do grego psykhé: psique, alma, espírito, mente; e de logos: palavra, razão ou estudo. A natureza não foi o único objeto das interrogações do homem. Este sempre refletiu sobre si próprio, sobre a vida humana. E é destas experiências vividas que nasceu a ideia de “alma”. Encarada como “sopro de vida”, como “força interior” que dirige e alimenta o corpo, a alma foi objeto das mais diversas reflexões. É importante ter essas informações para entender que, desde seus primórdios, o ser humano apresenta uma complexidade de comportamentos, emoções e sentimentos, e estudá-lo compete também à ciência Psicologia. Dessa forma, mediante o acesso a alguns dados sobre a história da Psicologia através dos tempos, melhor se compreende seu desenvolvimento até chegar à Psicologia da Educação. Veja bem, durante séculos, psicologia e filosofia foram indissociáveis! Sempre que forem colocadas “psicologia” e “filosofia” com iniciais minúsculas, estaremos nos referindo a ambas ainda não como ciências, mas como campos do conhecimento. Com a sistematização feita, por Platão e Aristóteles, da filosofia, que se tornou metódica, organizada, é que a psicologia vai ter alicerces para se constituir numa ciência e elaborar seus conceitos, chegando ao seu estatuto científico. O conceito “psicologia” somente surge no século XVI meio por acaso, ao organizar as obras de Aristóteles, com o filósofo, médico e físico alemão Rodolfo Goclenius (1547-1628), mas a composição do www.esab.edu.br 11 domínio de saberes desta ciência só se deu na contemporaneidade. No século XVIII ocorreu a divisão em psicologia racional e psicologia empírica: a primeira tinha seu método baseado na especulação (herança da metafísica) e a segunda na experiência, se ocupando dos fatos e em estabelecer a mesma relação com o método de estudo das ciências naturais, pois, até então, a psicologia estava no âmbito da filosofia. Como ciência mesmo, a psicologia só surge nos anos finais do século XIX, meados dos anos 1800, com o fisiologista alemão Wilhelm Wundt (1832-1920), cujo feito histórico foi a criação, em 1879, do primeiro laboratório experimental de Psicologia na Alemanha, destinado à investigação experimental de fenômenos da consciência, utilizando os mesmos métodos experimentais das ciências naturais, particularmente as técnicas utilizadas pelos fisiologistas. Wundt desenvolveu um sistema amplo da nova ciência, desde a Psicologia Experimental Fisiológica até a Psicologia dos Povos. Sua concepção de psicologia era orientada pela Física e, por essa razão, tal como o físico e o químico estudam os elementos fundamentais da matéria, ele aspirava encontrar os elementos e processos elementares da consciência (experiência imediata), suas combinações e relações, a partir dos quais pudesse ter as condições para construir a alma como um todo. Tudo como se fosse uma experiência, usando o método científico. Fizemos um rápido estudo sobre a origem e evolução histórica da psicologia. Finalmente, posso dizer que a conceituação da Psicologia como a ciência que trata do comportamento e dos processos mentais é ainda recente. A Psicologia, como tentativa de conhecer o comportamento humano, tem sido, através dos tempos, uma atividade natural do ser humano, praticada informal e assistematicamente no cotidiano das pessoas, nas situações mais curiosas e com vários sentidos. Muitas outras questões ainda são debatidas pelos psicólogos de hoje, enraizadas em antigas tradições filosóficas. Vamos fazer novas abordagens a respeito disso no decorrer das próximas unidades. www.esab.edu.br 12 2 Introdução ao estudo da Psicologia da Educação Objetivo Contextualizar as bases teóricas da Psicologia da Educação em suas diferentes correntes e respectivas implicações para a educação. Vimos, na unidade 1, que a mente, desde os tempos mais remotos, é considerada um enigma instigador de relevantes estudos ao longo do tempo, principalmente de filósofos e psicólogos. Com o passar dos anos, os avanços científicos trouxeram novas explicações e propostas para elucidar a natureza da mente, que foi ganhando contornos e questionamentos ainda mais desafiadores. Na segunda metade do século XIX, com o acesso a experimentos, surgiu a necessidade de estudos mais precisos dos fenômenos físicos e de utilizar na prática as leis teóricas da ciência. Estreando o método experimental, a Psicologia vai estudar todos os atos e as reações observáveis, os sentimentos, as emoções, as atitudes, as representações mentais, as fantasias, a personalidade, a memória, a inteligência, a comunicação interpessoal, o desenvolvimento, o comportamento sexual, a agressividade, o comportamento em grupo, os processos psicoterapêuticos, o sono e o sonho, o prazer, a dor, entre outros. Tendo em vista que sempre foi interesse de filósofos, políticos, educadores e psicólogos pela educação, entre outros, assim, a Psicologia estreitou também sua relação com a educação como as demais ciências humanas da época. Mas tínhamos, até então, uma psicologia científica. A história da origem e da evolução da Psicologia da Educação confunde- se por isso mesmo com a história da própria Psicologia científica de um modo ou e de outro com a evolução do pensamento educativo. Até o final do século XIX, as relações entre Psicologia e Educação eram mediadas pela Filosofia (e a Psicologia); não se falava de uma Psicologia da Educação, pelo menos até os idos de 1890. No final desse ano já se abrem várias perspectivas para essa ramificação e para as atuações profissionais. Nesse terreno fértil nasce a Psicologia da www.esab.edu.br 13 Educação, área que vai tratar dos estudos e das pesquisas que objetivam descrever os processos psicológicos implícitos na educação. A interação Psicologia-Educação surgiu da necessidade de avaliar e explicar aspectos relevantes do processo de aprendizagem e subsidiar o planejamento e desenvolvimento de estratégias e ações pedagógicas, no início do século XX, com as primeiras publicações e a fundação de institutos de pesquisa, que invocavam uma área específica de conhecimento psicológico para o tratamento e solução de problemas educacionais. Assim surgiu a Psicologia da Educação (COLL; MARCHESI; PALACIOS, 1987), assentada em três eixos: • teorias da aprendizagem; • psicologia da criança; e • medidas das diferenças individuais. Mas o rumo a ser dado, considerando-se a educação uma prática tão complexa, responsável pela formação de gerações, fez com que a Psicologia, em particular, a Psicologia da Educação, descesse de um pedestal em que era considerada, no dizer de Coll, Marchesi e Palacios (1995, p. 19), “[...] a rainha das ciências da educação” até o nível de uma disciplina que apenas buscasse regularizar as questões educacionais, para alguns psicólogos, psicologizar a educação. No campo da Psicologia da Educação, duas questões impactaram inicialmente: • como pensar separadamente as teorias do desenvolvimento e da pedagogia? • como os dois discursos, psicológico e pedagógico, poderiam se constituir mutuamente? Conhecer então as posições filosóficas envolvidas na evolução da Psicologia da Educação e suas relações com as abordagens atuais, sem perder de vista as implicações na educação, auxiliam na compreensão dessas questões e possibilitam competências de base também para identificar e avaliar conflitos contemporâneos. Analisemos agora algumas dessas posições, fundamentadas nos autores indicados como base desta disciplina. www.esab.edu.br 14 a) Naturalismo Enfatiza que a hereditariedade física e psicológica (natural) determina o comportamentode maneira similar ao que ocorre com os animais, motivo das inúmeras comparações entre humanos e animais. A vida interior é movida pelo instinto. O psicólogo naturalista estuda as atividades das crianças, fazendo observações sistemáticas sobre como elas se comportam espontaneamente no seu meio habitual. Quanto à educação, o professor é visto como um facilitador, um guia dos alunos. O objetivo da educação é educar crianças respeitando seu processo natural. O currículo escolar deve abranger atividades em contato com a natureza para desenvolver os sentidos e a curiosidade. Figura 3 – Visão naturalista. Fonte: <commons.wikimedia.org>. b) Realismo Tentativa de trazer a objetividade da ciência ao psiquismo, seguindo determinadas leis da realidade física. No realismo são considerados processos psicológicos básicos: • a memória; • a atenção; • a aprendizagem; e • a emoção. Educar é “transmitir” conhecimento. A psicologia realista enfatiza a crença na possibilidade de controlar e moldar o comportamento humano. O papel do professor é proporcionar experiências necessárias www.esab.edu.br 15 para desenvolver a capacidade dos alunos, transmitir conhecimentos e “prová-los”, organizar e apresentar o conteúdo de forma sistemática dentro de uma disciplina e demonstrar critérios na tomada de decisões. O currículo escolar deve enfatizar o mundo físico (ciências e matemática), incluindo, além do conhecimento, habilidades e atitudes para que os alunos demonstrem a capacidade de pensar criticamente e cientificamente por meio da observação e experimentação. Os métodos de ensino se concentram no domínio de fatos e habilidades básicas por meio de demonstração e recitação. c) Idealismo O objetivo da educação é descobrir e desenvolver as habilidades de cada indivíduo, a fim de melhor servir a sociedade. Como seres espirituais, os alunos devem alcançar a perfeição moral, que é o objetivo final da educação. O papel do professor é se tornar um modelo de caráter a ser seguido, devendo se esforçar para “transmitir” motivação ao aluno. A ênfase curricular está nos assuntos da mente, destacando-se a literatura, história, filosofia e religião. Intuição, introspecção, insight e toda a parte lógica são usados para trazer à consciência as formas ou os conceitos que estão latentes na mente. d) Pragmatismo (ou experimentalismo) Busca as consequências práticas do pensar. Nessa abordagem, somente as coisas que são vivenciadas ou observadas são reais. A escola deve desenvolver ativamente o pensamento crítico no aprendiz, que não pode ser um ser passivo no processo de educação e deve aprender a aprender. Essa instituição deve funcionar como um laboratório e o seu currículo preparar as crianças para a vida e os seus problemas, enriquecidas de conhecimento, habilidades, destrezas e valores que permitam reconstruir a existência. A rigidez deve ser evitada nas exigências escolares, e o método experimental deve ser flexível, exploratório, tolerante com o novo, com a curiosidade. O papel do professor durante os primeiros anos deve ser dar ênfase à natureza psicológica e sociológica. www.esab.edu.br 16 e) Existencialismo O ser humano é aquilo que tenta ser pelas escolhas que faz. O mundo físico não tem nenhum significado fora da existência humana. Educar é transformar o indivíduo num ser autêntico. Importa mais o desenvolvimento da capacidade afetiva do que o homem pensativo. A pergunta do existencialismo é: quem sou eu e o que devo fazer? O assunto da sala de aula deve ser uma questão de escolha pessoal. As respostas reais vêm de dentro do aluno e não da autoridade externa. Para isso, os alunos devem ser envolvidos em experiências de aprendizagem genuínas e os educadores devem se opor a pensar nos alunos como objetos a serem medidos, monitorados ou padronizados; ao contrário, devem iniciar o ensino a partir da vivência do estudante e não a partir do conteúdo curricular. Ressaltamos que essas importantes posições filosóficas estão na base do estudo da Psicologia da Educação, possibilitando o aparecimento de uma série de correntes e escolas de pensamentos que iremos estudar mais à frente. www.esab.edu.br 17 3 O âmbito da Psicologia da Educação Objetivo Definir os termos para situar a Psicologia da Educação em relação a outras disciplinas de Psicologia e de Ciências da Educação, esclarecendo o seu objeto de estudo, objetivos e domínio de intervenção. Para você se situar melhor quanto ao trabalho da Psicologia da Educação, vamos fazer algumas considerações sobre como esse ramo da psicologia foi se afirmando até compor seu estatuto teórico e delimitar seu objeto de estudo, seus objetivos e domínio de intervenção. Vimos que no século XIX a Psicologia começou a se distanciar e a ganhar autonomia em relação à Filosofia. Ora, o mesmo vai ocorrer com a teoria educativa, que passou a buscar uma fundamentação científica para si mesma. No caso da Psicologia da Educação, comumente relacionada a outros nomes, tais como Psicologia Educacional, Psicologia Escolar, Psicologia da Aprendizagem, Psicologia Pedagógica, e outros mais, aconteceu uma dificuldade na imprecisão em saber quais seus objetos de estudo, objetivos e domínio de intervenção. Vale dizer que tantas denominações não se trata apenas de uma semelhança de termos, mas são possibilidades que se sobrepõem, tendo cada uma dessas ramificações da psicologia suas próprias definições. Vamos entender isso? 3.1 Conceituação Até quase a década de 1950, a Psicologia da Educação era um ramo especial que se apresentava como a área de aplicação da Psicologia na Educação. Enfatizava o interesse por natureza, condições, resultados, avaliação e retenção da aprendizagem escolar, obstinada na perseguição de resultados, de meios, mergulhada numa visão bastante instrumental. Não era ainda uma disciplina autônoma, com sua própria teoria e metodologia. www.esab.edu.br 18 Durante essa mesma década, ocorreu uma mudança nesse cenário. Começou-se a duvidar da aplicabilidade educativa das grandes teorias da aprendizagem elaboradas durante a primeira metade do século XX. Prenunciavam-se crises sucessivas quando os psicólogos começaram a considerar que o comportamento do ser humano se desenvolve não apenas no âmbito do biológico, mas também no complexo contexto do ambiente social. Surge ainda certo desconforto perante a falta de independência entre a Psicologia e a Pedagogia, como se suas teorias fossem as mesmas. Fica também evidente que a Psicologia por si só não poderia fornecer diretamente as conclusões pedagógicas e vice-versa. Surgiram então novas disciplinas educativas tão importantes à educação quanto a Psicologia da Educação, e esta precisaria ceder espaço a outras áreas que buscariam examinar de outros modos os objetivos e as tarefas da educação, bem como a relação desta com a Psicologia, e ainda as condições para que os objetivos e as tarefas da educação pudessem realizar-se. Em decorrência disso, na década de 1970, a Psicologia da Educação assume o seu caráter multidisciplinar, o qual conserva até hoje, deixando de ser simplesmente considerada como a Psicologia aplicada à Educação. Atualmente, já é possível delinear uma conceituação para a Psicologia da Educação. Vemos nela uma distinção, ainda que tênue, do âmbito da denominada Psicologia Educacional, que nos parece mais preocupada com a relação processo educacional - processos de aprendizagem, seu alvo central de interesse. Segundo Coll, Marchesi e Palacios (1995), é ocupação da Psicologia da Educação estudar os processos de mudança que se produzem nas pessoas, resultantes de seu envolvimento em atividades educacionais; mas esse mesmo autor alerta para o fato de que essa afirmação sucinta requer algumas considerações adicionais que ajudem a compreender e a valorizar melhor seu alcance e suas implicações. Se ficou clara para você esta abordagem que foi feita, será bem mais fácil discernir o objeto de estudo da Psicologiada Educação e seu domínio de intervenção. Vamos ver? www.esab.edu.br 19 3.2 Objeto de estudo Foi o psicólogo americano John Broadus Watson (1878-1958) o fundador da corrente científica designada por Behaviorismo (behaviour, em inglês, significando também conduta, comportamento), que promoveu a emancipação definitiva da Psicologia em relação à Filosofia, colocando a Psicologia em seu próprio lugar. No sentido de alcançar a objetividade (atributo próprio das ciências) para a Psicologia, Watson propôs como seu objeto de estudo o comportamento, definido por meio de respostas e estímulos – e só o comportamento! Entenda por estímulo tudo o que vem de fora, do ambiente, que provoca um excitamento, uma reação, uma resposta! Assim é que, genericamente, a Psicologia como disciplina científica é definida como a ciência que estuda os comportamentos e os processos mentais, entendendo-se o comportamento como algo que fazemos, como uma ação que podemos observar. Decorre daí que os processos mentais serão vistos como experiências internas e subjetivas que deduzimos a partir do comportamento, como as sensações, as percepções, os sonhos, as lembranças, os pensamentos, as crenças etc. Desse modo, essas experiências constituirão objetos de estudo da Psicologia, conferindo a ela o estatuto de ciência e possibilitando o aparecimento de uma série de outras correntes que abordaremos na unidade 6, como o Estruturalismo, o Behaviorismo o Gestaltismo e outras mais. Mas e daí? Qual é mesmo o objeto de estudo específico da Psicologia da Educação? Estarão sua conceituação e seu objeto de estudo ainda sustentados na contribuição de Watson, de cunho essencialmente comportamentalista? Pense comigo: se a Psicologia da Educação representa um ramo da Psicologia e tem dela as características necessárias para atuar como uma ciência, uma psicologia da educação, é interessante saber que sua concepção avançou no sentido de tentar se desvincular das fortes “garras” behavioristas, como aconteceu com a própria Psicologia, a ponto de podermos hoje dizer que este campo tem por objeto de estudo todos os aspectos das situações da educação que estão sob a ótica psicológica, www.esab.edu.br 20 a exemplo da forma como os alunos aprendem e se desenvolvem e as condições mediante as quais o fazem, levando em conta, nessa atuação, os diferentes fatores que determinam a aprendizagem, o desenvolvimento e os modos possíveis de trabalhar com esses fatores, e até mesmo mudá-los. 3.3 Domínio de intervenção e objetivo O domínio da Psicologia da Educação é, assim, constituído pela análise psicológica de todas as facetas da realidade educativa e das possíveis intervenções sofridas por ela, e não apenas pela aplicação da psicologia à educação, como era entendido no princípio. O maior objetivo da Psicologia da Educação é constatar, compreender e explicar o que se passa no centro das relações existentes a partir das situações educacionais. Também cabe a esta disciplina contribuir para o desenvolvimento de uma teoria dos processos educacionais (seu desempenho teórico), bem como desenvolver modelos e programas de intervenção psico-educativa (seu nível técnico-tecnológico) e encaminhar a prática educativa coerente com o referencial teórico (seu ponto de vista prático). Feitas essas reflexões e ponderações, é possível reconhecer que tanto psicólogos quanto pedagogos podem possuir tal especialização profissional, uma vez que a Psicologia da Educação não mais se resume a um simples campo de emprego da Psicologia, devendo, ao contrário, atender simultaneamente ao trabalho de estreitamento de vínculos entre os processos psicológicos e as características das situações educativas, sendo a Psicologia da Educação um dos componentes específicos das ciências da Educação, tal como a Sociologia da Educação ou a Didática. Fórum Caro estudante, dirija-se ao Ambiente Virtual de Aprendizagem e participe do nosso Fórum de discussões. Lá você poderá interagir com seus colegas e com seu tutor de forma a ampliar, por meio da interação, a construção do seu conhecimento. Vamos lá? www.esab.edu.br 21 4 Primeiras definições da Psicologia da Educação Objetivo Considerar a natureza das primeiras definições da Psicologia da Educação, por serem explicativas da necessidade de seu desenvolvimento. Já vimos antes, nas unidades 2 e 3, que a Psicologia da Educação é claramente identificável como uma disciplina de caráter científico, com seus saberes teóricos e práticos, relacionando-se a outros ramos e a outras especialidades da Psicologia e das ciências da educação, mas sendo, ao mesmo tempo, distinta delas. Essas características têm sua origem na compreensão crescente de que a educação e o ensino podem aperfeiçoar- se e avançar sensivelmente com a utilização adequada dos conhecimentos psicológicos. Essa evolução foi objeto de múltiplas interpretações, abrangendo desde as primeiras definições da Psicologia da Educação, calcadas no behaviorismo, que prioriza as questões ligadas ao estudo do comportamento e à relação estímulo-resposta, até as definições mais recentes, como a conceituação que expusemos na unidade anterior. Chega-se ao reconhecimento da Psicologia da Educação como área, ramo ou especialidade da Psicologia, preocupada em estudar a relação entre os processos educacional e de aprendizagem e todos os fenômenos implicados, ocupando-se dos processos de mudança que se produzem nas pessoas, resultantes de seu envolvimento em atividades educacionais e, mais recentemente, além delas (família, outras instituições etc.). Percorrendo historicamente o caminho trilhado pela Psicologia da Educação, nos é mostrado com mais clareza que essas diferentes interpretações e definições marcaram e distinguiram momentos da evolução ao longo do século XX, contribuindo de forma bastante decisiva para sua configuração atual. Ressaltando os nomes de John Locke (1632-1704), William James (1842 -1910), Alfred Binet (1857- www.esab.edu.br 22 1911), John Dewey (1859 -1952), Jean Piaget (1896-1980) e Burrhus Frederic Skinner (1904-1990) como fi guras importantes na história da Psicologia Educacional e bases para as suas definições, indico alguns nomes e suas concepções sobre a Psicologia da Educação, com base em Coll, Marchesi e Palacios (1995). a. Edward Thorndike (1874-1949): a Psicologia da Educação tem como finalidade oferecer o conhecimento da natureza humana aos estudiosos da teoria da Educação. b. Charles Hubbard Judd (1873-1946): a Psicologia da Educação tem como fim tornar os professores cientes do necessário estudo do desenvolvimento mental com bases científicas. c. John D. Mayer (1846-1923): caberia à Psicologia da Educação relacionar a Psicologia com a responsabilidade de estudar como as pessoas aprendem e se desenvolvem, e a Educação, consistindo em essência a ajudar as pessoas a aprender e a desenvolver-se. d. Allport W. Gordon (1897-1967): a Psicologia da Educação é a aplicação dos métodos e dos fatos conhecidos da psicologia às questões que surgem em pedagogia. e. David Paul Ausubel (1918-2008): a Psicologia da Educação é certamente uma disciplina aplicada, mas não é uma Psicologia (Geral) aplicada a problemas de educação; as teorias da Psicologia da Educação são tão básicas como as teorias existentes na Psicologia Geral, mas são formuladas em um alcance de menor abrangência e têm relevância mais direta e mais aplicabilidade em relação aos problemas práticos em seus aspectos particulares. f. Cesar Coll: (1950-): a Psicologia da Educação se ocupa de estudar os processos de mudança produzidos nas pessoas, em consequência de sua participação em atividades educacionais. g. James, Dewey, Stanley Hall (1844-1924), Édouard Claparède (1873-1940), Binet, Charles Hubbard Judd (1873-1946), entre outros pensadores, concebiam a Psicologia da Educação como um resultado proveniente da tendência de dois âmbitos de discurso e tipos de problemáticas: 1) a necessidade de fixara identificação da ainda principiante Psicologia da Educação com o estudo do www.esab.edu.br 23 desenvolvimento, da aprendizagem e das diferenças individuais, reconhecidamente em bases científicas; 2) a vigência na época do reformismo social consolidado nos argumentos de preocupação com o bem-estar humano e com os campos de ação da política, da economia, da religião e da filosofia. Essas definições – e teriam muitas outras – correspondentes a diferentes formas de pensar também expressam momentos históricos que registram diferentes concepções, reações e posturas adotadas diante da Psicologia da Educação, as quais culminaram em uma gama de visões, muitas vezes contrapostas, como dizem Coll, Marchesi e Palacios (1995). Ainda, segundo estes autores (1995, p. 22), é válido assinalar que: Embora cada uma dessas oposições tenha sua própria história e matizes singulares, todas contribuem, em maior ou menor medida, conforme os casos, para perfilar as diferentes concepções da psicologia da educação, de certo modo acabam confluindo no que constitui o ponto crucial em torno do qual tal diferença se concretiza e mostra seu verdadeiro alcance e sua significação (Coll, 1988a; 1990a; 1998a; 1998b): a importância relativa atribuída aos componentes psicológicos no esforço para explicar e compreender os fenômenos educacionais. A Psicologia da Educação, que surgiu ora vista como um mero campo de aplicação da psicologia e ora como disciplina-ponte de natureza aplicada, situando-se no meio do caminho entre a psicologia e a educação (COLL; MARCHESI; PALACIOS), segue até seu no panorama atual, envolvendo o estudo de como as pessoas aprendem, incluindo temas como os resultados apresentados por alunos, seus processos de instrução e de aprendizagem, as diferenças individuais na aprendizagem, o trabalho com alunos talentosos e com dificuldades de aprendizagem. Este ramo da psicologia não ficou restrito apenas aos processos de aprendizagem da infância e adolescência, mas inclui ainda os processos sociais, emocionais e cognitivos que estão envolvidos na aprendizagem ao longo da vida inteira. O campo da psicologia educacional incorpora uma série de outras disciplinas, como a psicologia do desenvolvimento, a psicologia comportamental e a psicologia cognitiva. www.esab.edu.br 24 Importa dizer que a Psicologia e a Psicologia da Educação foram cada vez mais tentando se distanciar de suas raízes behavioristas, o que ainda é muito frequente na psicologia norte-americana, ainda bastante impregnada dessa tendência. Foi com a escola de pensamento cognitivista, que surgiu mais tarde, que essas áreas alçaram voo em direção a outros horizontes, mais para fora dos domínios da escola de pensamento comportamentalista, sobretudo da visão mecanicista. Agora que avançamos um pouco mais neste assunto, podemos seguir em frente. Na próxima unidade estudaremos melhor o papel do psicólogo da educação. www.esab.edu.br 25 5 Desenvolvimento de um papel ativo do Psicólogo em Educação no processo educacional Objetivo Identificar em que consiste o trabalho do psicólogo educacional para definir sua identidade como profissional, encontrando um sentido cada vez mais significativo para a melhor compreensão da sua atuação. Durante as três primeiras décadas do século XX, a psicologia aplicada à educação teve enorme desenvolvimento, como vimos nas últimas unidades. Exemplo disso é que nos Estados Unidos se manifestou a necessidade de um novo profissional, diferenciado, bem mais capacitado teoricamente para atuar como intermediário entre a Psicologia e a Educação. De outro modo, a Psicologia como ciência passa a abranger e a resolver mais e mais tarefas vinculadas à psicologia pedagógica por meio da experiência, assim como entrelaça cada vez mais suas raízes com as questões psicológicas envolvidas no ensino e na aprendizagem. Em virtude disso, três áreas muito significativas se destacaram e passaram a exigir mais atenção dos psicólogos da educação: a. as pesquisas experimentais da aprendizagem; b. o estudo e a dimensão das diferenças individuais; e c. a psicologia da criança. Psicologia e Educação, juntas, constituem um vasto campo de ação. Nesse contexto, situa-se a importância do psicólogo da educação, um profissional que passará a atuar na escola, na universidade, na sala de aula, contribuindo na formação de crianças, jovens e adultos, cada vez mais envolvidos com as questões pertinentes às relações entre as teorias psicológicas e as necessidades educativas. O psicólogo da educação atuará também como formador de professores nas licenciaturas, em formação de psicólogos, em capacitações e qualificações afins à Psicologia da Educação, na supervisão de estágios etc. www.esab.edu.br 26 Enfim, os psicólogos da educação vão estar nas instituições educacionais escolares, espaços de atividade profissional no qual confluem especialistas diversos como psicólogos, pedagogos, assistentes sociais etc., e que incorporam aportes de diferentes disciplinas, como a Didática, a Psicologia da Educação, a Psicologia Clínica Infantil, a Psicologia Social etc. Esses profissionais estarão ainda nos movimentos sociais, em todos os espaços educativos não formais, em todos os lugares onde se faz necessária a inserção de atividades de pesquisa e de elaboração teórica da Psicologia da Educação no esforço de inovar e de aperfeiçoar as práticas, pois o maior interesse do psicólogo da educação é a forma como os alunos aprendem e se desenvolvem. Assim é que, muitas vezes, ao atuarem trabalhando diretamente com alunos, pais, professores e gestores, eles aprendem e aprimoram os resultados esperados. A partir do aprendizado dos estudantes, os psicólogos da educação terão como papel: conhecer os processos educativos com o objetivo de contribuir para a elaboração de uma teoria explicativa desses processos; trabalhar na dimensão projetiva ou tecnológica, estudando os processos educativos com o objetivo de elaborar modelos e programas de intervenção voltados para a prática educativa; atuar na dimensão prática ou aplicada, estudando os processos educativos com o objetivo de colaborar para a construção de um desempenho educativo coerente com as propostas teóricas formuladas. Na escola, o papel do psicólogo da educação necessita ficar mais específico em relação ao do psicólogo em geral, mas uma coisa é certa: esse desempenho precisa ser diferenciado do modelo clínico encontrado nos consultórios, uma vez que na escola não é permitido fazer terapia, nem teria sentido; se assim o fosse, todos os objetivos do psicólogo da educação perderiam o seu foco. Em síntese, como buscam nos esclarecer a respeito Coll, Marchesi e Palacios (1995), os psicólogos da educação deixaram de se ver como cientistas e acadêmicos comprometidos exclusivamente com o desenvolvimento de sua disciplina, isolados no seu reduto, e começam a perceberem-se também como cientistas sociais com a responsabilidade www.esab.edu.br 27 de colaborar na busca de soluções para os problemas educacionais que se formulam na prática, aliando-se constantemente aos conhecimentos de outras áreas que se fizerem necessários. Concluímos esta unidade. Espero que você tenha percebido quão fundamental é a atuação do psicólogo da educação para a contribuição no desenvolvimento de recursos da personalidade das crianças e de sua aprendizagem, visando à formação de indivíduos autônomos, pensantes, solidários e mais senhores de seus atos. A presença do psicólogo da educação no dia a dia da escola pode criar espaços de diálogo e reflexão, a fim de contribuir para a construção de uma escola que atenda de uma forma mais efetiva, dinâmica e responsável às exigências da educação nestes novos tempos tão cheios de desafios ao educador, aos pais, aos administradores, às crianças e aos jovens. Na próxima unidade, estudaremos as principais escolas de pensamento da Psicologia. É relevante conectar o estudo que fizemos com o próximoque faremos por adiantarem novas possibilidades à construção do papel do psicólogo da educação. Este profissional, que desponta de uma especialização ainda recente, precisa ampliar e aprofundar constantemente suas referências teóricas e metodológicas para que compreenda as relações de extrema complexidade e contradição que envolvem o cotidiano da escola, pleno de tensões de todo tipo, a poderem intervir de forma mais competente e colaborativa junto a outros profissionais com os quais atuar. www.esab.edu.br 28 Figura 4 – Carl Gustav Jung. Fonte: <commons.wikimedia.org>. “Conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana” – Carl Jung (1875-1961). Estudo complementar Nesta unidade, estudamos a necessidade do desenvolvimento de um papel ativo do psicólogo em educação para bem atuar nessa área. Sobre essa abordagem, sugiro a leitura do texto “Relações entre a Educação e a Psicologia da Educação no Brasil”, clicando aqui. Boa Leitura. http://www.portaleducacao.com.br/psicologia/artigos/10521/psicologia-da-educacao https://revistas.ufpi.br/index.php/epeduc/article/view/10756/6200 www.esab.edu.br 29 6 As principais escolas de pensamento na área de Psicologia Objetivo Analisar a importância da influência das diferentes escolas de pensamento da Psicologia, em seu estatuto epistemológico, fundamentais à delimitação de sua metodologia específica de investigação e bases para o advento da própria Psicologia da Educação. Vamos ver agora algumas das principais escolas de pensamentos que influenciaram e ainda influenciam a Psicologia da Educação: estruturalismo, funcionalismo, associacionismo, gestaltismo ou psicologia da forma, psicanálise e behaviorismo ou comportamentalismo. Comentaremos de forma sintética seus métodos próprios, suas limitações e seus avanços. 6.1 Estruturalismo Surgiu com o inglês Edward Bradford Titchener (1867-1927), que foi discípulo de Wundt. • Objeto de estudo: experiência consciente (vivências, observação): tudo é melhor percebido pela pessoa que tem a experiência, a vivência. • Método: observação, introspecção (autoanálise) e uso da experimentação; envolve a observação, experimentação e medição; a questão é investigar “o quê”, o “como” e o “por que” das coisas para solucionar os problemas que aparecerem mediante conflitos (discussões para solucionar um problema). • Avanços: buscou a multidisciplinaridade; enfatizou a importância da comunicação e da auto-observação. • Limites: deu ênfase ao dualismo e ao método baseado na introspecção. www.esab.edu.br 30 6.2 Funcionalismo William James foi um de seus pioneiros, considerado ainda hoje por muitos como o maior psicólogo americano. • Objeto de estudo: a “utilidade” dos processos mentais para o organismo nas suas constantes tentativas de se adaptar ao meio (função do comportamento e função adaptativa da consciência, considerada como instrumento de adequação ao ambiente). • Método: combinação do método introspectivo com outras técnicas de obtenção de dados, como a pesquisa fisiológica, os testes mentais, questionários e descrições objetivas do comportamento. • Avanços: ênfase na aplicação dos métodos e das descobertas da Psicologia a problemas do mundo real; transferência da ênfase dada à estrutura para a função; uma das consequências deste aspecto foi a pesquisa sobre o comportamento animal, que não fazia parte da abordagem estruturalista e que veio a ser um elemento fundamental da Psicologia. • Limites: ambiente como um dos fatores mais importantes no desenvolvimento; ênfase ao caráter utilitário e funcional da consciência e do comportamento como meros instrumentos destinados a ajustar a ação, ou seja: consciência é um instrumento destinado à resolução de problemas. 6.3 Associacionismo O principal representante é Thorndike, cujas pesquisas prévias sobre o reflexo condicionado contribuíram para tornar a psicologia objetiva. Outro nome, Ivan Petrovich Pavlov (1849-1936), teve uma responsabilidade primordial na mudança: estudar a associação em termos de conexões entre “estímulo-resposta”, e não de “ideias”. O termo associacionismo originou-se da concepção de que a aprendizagem se dá por um processo de associação das ideias, das mais simples às mais complexas. www.esab.edu.br 31 • Objeto de estudo: o caráter utilitário do conhecimento, ou seja, de sempre servir para alguma coisa. • Avanços: formulação de uma primeira teoria de aprendizagem na Psicologia; desenvolvimento da explicação mais completa dos fenômenos psicológicos. • Método: ênfase à introspecção, na forma de observação interna, mas de um modo controlado. Observadores treinados deveriam descrever no laboratório as suas próprias experiências resultantes de uma situação experimental definida. Os dados eram depois relacionados e interpretados por uma equipe de psicólogos. • Limites: a produção de conhecimento pautada numa visão utilitária, de serventia do conhecimento; é pela lei de causa-efeito ou do estímulo-resposta que o organismo vai associando situações com outras semelhantes, o que é de grande utilidade para a Psicologia Comportamentalista. Exemplo: todo o comportamento de um ratinho tende a se repetir se nós o recompensarmos (causa) assim que ele o emitir. Por outro lado, tende a não acontecer se ele for castigado (efeito) após sua ocorrência. 6.4 Gestaltismo, ou Psicologia da Forma A psicologia da Gestalt foi uma escola de pensamento que olhou para a mente e o comportamento humano como um todo em vez de tentar quebrá-lo em partes menores. Ernst Mach (1838-1916) e Christian von Ehrenfels (1859-1932) podem ser considerados com os mais diretos antecessores da psicologia da Gestalt: o processo de “dar forma”, de “configurar” o que é colocado diante dos olhos. • Objeto de estudo: os processos psicológicos envolvidos na sensação e percepção do movimento; o aprendizado; o pensamento e a solução de problemas. • Método: fenomenológico. • Avanços: foi além da ênfase à percepção; expandiu suas teorias a várias áreas de conhecimento, revolucionando a psicologia e www.esab.edu.br 32 influenciando diretamente muitos pensadores; impactou as áreas da percepção e da aprendizagem e motivou o interesse pela experiência consciente. • Limites: não enfatiza a sequência estímulo-resposta, mas, em compensação, o faz com o contexto ou campo no qual o estímulo ocorre e o insight tem origem, quando a relação entre o estímulo (um brinquedo) e o campo (ambiente) é percebida pelo aprendiz; os gestaltistas não admitem a existência de um espírito, da alma; para eles, tudo se reduz à matéria bruta. 6.5 Psicanálise Sigmund Freud (1856-1939), considerado o precursor do movimento psicanalítico, trabalhou sozinho no desenvolvimento da psicanálise. Em 1906, juntaram-se a ele alguns colegas, sendo fundada a Associação Internacional Psicanalítica. A psicanálise nasceu com objetivos limitados, com o fim de compreender algo a respeito da natureza das enfermidades nervosas, chamadas “funcionais”. • Objeto de estudo: comportamento anormal, negligenciado por outras escolas de pensamento. • Método: observação clínica, auto-observação e observação dos pacientes. Usava técnicas livres (livre associação) e a análise dos sonhos. • Possibilidades: contribuições sobre o papel da motivação inconsciente; importância concedida às experiências infantis na plasmação do comportamento adulto e aos mecanismos de defesa; a ênfase no sexo ajudou a popularizar as concepções. • Limites: coletas de dados assistemáticas, incompletas, imprecisas e não controladas por método experimental; trabalho a partir de anotações, havendo desencontro entre elas; pressupostos obscuros sobre o comportamento humano mediante conceitos-chaves como o de id, ego e superego. www.esab.edu.br 33 6.6 Behaviorismo, Comportamentalismo ou Teoria Comportamental Surgiu por volta de 1913, com Watson (com o intuito de tornar a Psicologia umaciência empírica, estabelecendo como verdade científica aquilo que pudesse ser consensualmente observado). Pavlov o adotou em seus experimentos sobre o comportamento. Entre 1938 e 1945, Skinner, defensor do Behaviorismo radical, tentou desviar o behaviorismo da relação estímulo-resposta, sustentando a seleção de comportamentos pelas suas respectivas consequências e mantendo a relação causa-efeito, o que seria basicamente admitir apenas uma mudança de comportamento. Exemplo: depois de ensinar, o professor deveria pedir ao estudante para executar o que se ensinou e corrigi-lo imediatamente. A essa sequência de eventos, Skinner chamou de ‘contingências do reforço’. • Objeto de estudo: o comportamento observável, mensurável, calculável, que podia ser reproduzido em diferentes condições e em diferentes sujeitos. • Método: análise descritiva; análise experimental do comportamento; ensino programado, a clínica psicológica; publicidade e outros mais. • Avanços: controle e organização da situação de aprendizagem, bem como a elaboração de tecnologia de ensino. • Limites: ênfase no papel do ambiente sobre o comportamento e seus aspectos. Estes modos de descrever a história do conhecimento sobre o ser humano marcaram a constituição das abordagens teóricas, também chamadas sistemas da Psicologia. São, por isso, interessantes para o nosso estudo. As diferentes escolas de pensamento da Psicologia desenvolveram-se durante o curso de sua própria história, tendo sido cada escola uma forma de insurgir-se contra a anterior. Cada nova escola usava o seu antigo oponente como alvo das investidas para ganhar destaque, valendo salientar que elas criavam novos conceitos, mas também não deixavam de utilizar os conceitos da escola anterior com uma nova roupagem, uma nova proposta. www.esab.edu.br 34 Resumo Nas unidades de 1 a 6, o esperado é que você ganhe maior compreensão da história da Psicologia, entendendo melhor porque certas temáticas precisam ser estudadas, criando a necessidade do surgimento da Psicologia da Educação e especificando o papel do psicólogo da educação. A história inicial da Psicologia pode ser traçada de volta para os gregos antigos, e ela não surge como uma ciência separada até a segunda metade do século XIX. Descartes introduziu o conceito de dualismo, salientando corpo e mente como duas entidades separadas, o que afetou bastante a Filosofia e a psicologia que somente vai surgir como um campo separado com Wundt, em 1879; uma ciência independente, separada da Filosofia e da Fisiologia. Muitas das outras questões que ainda são debatidas por psicólogos ainda hoje estão profundamente enraizadas nesses primeiros conceitos filosóficos. Desde Wundt até hoje, a Psicologia sofreu mudanças dramáticas e transições, com inúmeros pontos de vista teóricos surgindo e lutando por domínio, colocando o seu estatuto teórico em confronto com uma série de questões difíceis, sendo que a primeira poderia ser definida como a delimitação do seu lugar em relação à Psicologia científica, e a segunda, a delimitação de seu objeto de estudo, objetivos e métodos. Pesquisadores e psicólogos têm muitas maneiras diferentes de olhar para questões e problemas em psicologia. As perspectivas em Psicologia oferecem inúmeras maneiras originais para explicar e predizer o comportamento humano, surgindo assim as principais escolas de pensamentos e as tentativas de estabelecer a síntese de seus métodos próprios, limitações e avanços. Estudos sobre o comportamento e o cérebro tiveram um impacto muito significativo sobre a Psicologia www.esab.edu.br 35 como é hoje, levando à aplicação de muitas metodologias científicas que estudam o comportamento humano e o pensamento. A Psicologia evoluiu dramaticamente durante o século XX e a escola de pensamento conhecida como behaviorismo tornou-se dominante, trazendo uma mudança muito grande em todas as perspectivas teóricas anteriores, se esforçando para fazer a disciplina uma forma mais científica, enfatizando o comportamento observável. Foi assim que surgiu a Psicologia da Educação voltada ao estudo de como as pessoas aprendem, incluindo temas como os processos de aprendizagem dos alunos, seus resultados, as diferenças individuais na aprendizagem, entre outros; como a educação, por sua natureza, recebe contribuições de diversas áreas de conhecimento humano. www.esab.edu.br 36 7 Relação entre Psicologia da Educação e Desenvolvimento Infantil Objetivo Reconhecer a importância da relação entre a psicologia escolar e a Educação Infantil, cuja vinculação é considerada como constituinte dos processos de desenvolvimento e aprendizagem da criança. Continuando nossa caminhada, abordemos agora a relação entre a Psicologia da Educação e o desenvolvimento infantil. Você vai encontrar muitos autores falando sobre isso, mesmo porque essa abordagem vem lá de longe, com base naqueles breves flashes das contribuições de filósofos que nós apresentamos nas unidades de 1 a 6, e que depois foram mais aprofundadas com autores mais modernos, só para destacar alguns: Rousseau, Freud, Montessori, Jung, Wallon, Freinet, Piaget, Vygotsky, John Dewey, Ausubel, Rogers, Freire e Feuerstein, expressivos pensadores em suas relações com a psicologia e a educação da criança. Guarde bem esses nomes, pois você irá recorrer a eles quando estudar a Educação Infantil. Mas já antecipamos que todos esses pensadores – e muitos mais que vieram após eles – viveram em acirrados debates sobre a dualidade natureza X cultura e natureza X homem, inato e adquirido, que já começaram desde Platão, com sua visão de mundo sensível (dos sentidos, o mundo concreto no qual vivemos) e mundo das ideias. Em Descartes temos a relação de oposição entre corpo-mente que muito vai afetar as próximas gerações. Enfim, trata-se de um impasse gerado por se querer saber o que determina a existência do ser humano: se as suas disposições naturais, genéticas, biológicas é que são determinantes, ou são os fatores do meio, o ambiente externo, a cultura, a educação. Isto respingou muito na Psicologia e na Educação, fazendo com que até hoje ambas ainda estejam procurando uma resposta, não tanto como antes, mas ainda encontramos esta inquietação em psicólogos e professores. www.esab.edu.br 37 Assinalamos que nos séculos XVIII e XIX se inicia um atendimento mais destacado às crianças pequenas. Seria esta uma ‘dádiva’ dada à criança? Com a Revolução Industrial na Inglaterra em meados do século XVIII, instaurou-se o modo de produção capitalista. Essa é uma velha história, mas agora precisamos dela aqui. O capitalismo proporcionou transformações muito profundas na sociedade, trazendo entre tantas mudanças radicais uma prática que foi marcante nesse sistema social: a utilização do trabalho infantil nas fábricas que, junto ao das mulheres, constituíam a mão de obra mais barata, com excessiva exploração do trabalho infantil. Ora, é fácil você entender que havia um interesse de que a criança fosse educada, controlada e protegida desde a mais tenra idade, dentro dos princípios que regiam a sociedade do trabalho exploratório, você não acha? Perfeito para as necessidades da nova sociedade! Naturalmente aceitável também que se consolidassem dois tipos de atendimento às crianças pequenas: a) um destinado às crianças da elite de melhor qualidade e que tinha como característica a “educação” e b) outro que servia de guarda, proteção e disciplina para as crianças pobres. Para essas últimas, o atendimento era de caráter assistencialista e controlador, pois por serem desfavorecidas, o argumento de que deveriam trabalhar era um indicativo de que assim superariam a pobreza, a negligência das famílias, estariam protegidas do crime e da marginalidade, além de ajudarem no orçamento familiar. Figura 5 - “A Hora da Infância Feliz”, da revista Harper mensal para agosto 1903. Fonte: <commons.wikimedia.org>. www.esab.edu.br 38 Não é difícil você pensar sobre oque vamos apresentar agora. Reportando-nos a essa forma de como a criança era tratada, será que havia uma compreensão de infância como hoje temos? Embora a história da infância não seja nosso objeto de análise aqui, uma coisa é certa: até então não existia a identidade pessoal da criança. É então perfeitamente compreensível que o vínculo inicial estabelecido entre a Psicologia e a Educação Infantil inculcasse a definição de normas de comportamento, estabelecimento de regras e parâmetros de classificação e condições bem delimitadas de normalidade com base no modelo de desenvolvimento biológico, tarefa esta que caberá à Psicologia como uma ciência detentora de um saber específico imprescindível à Educação. Rousseau, notável inatista que concebia uma “natureza boa, pura e livre” no ser humano “puro” (BOCK et al., 1999), foi o pensador de destaque a intervir na forma de pensar o desenvolvimento da criança, em meio àquela realidade dura de trabalhadora e explorada que vivia na era industrial. Rousseau (1712-1778) foi um importante filósofo, teórico político, escritor e compositor, considerado como o primeiro grande pensador a se preocupar com uma identidade da criança. Insurgiu com severas divergências quanto aos procedimentos adotados à época para a formação das crianças, abrindo um caminho novo para inúmeros outros intelectuais saudarem a infância como um período específico merecedor de um tratamento diferenciado. Delimitou- se a partir daí uma faceta nova no imenso território do objeto que a psicologia se propõe a analisar, comemorado de um modo pomposo por pedagogos, psicólogos e pela própria estrutura social. Dentro desse cenário, aumentou a discussão de como se deve educar as crianças. Ele idealiza uma educação natural para o desenvolvimento da infância: a criança está pronta, ela é um ser bom, inocente, plena de virtudes, o adulto é que a corrompe. Rousseau demarca o escolanovismo, assentado numa psicologia inicial de cunho inatista, que vem impregnada de uma ideia de criança e de seu desenvolvimento profundamente naturalizante, o que marcará sua educação dali para a frente de uma forma individualista e baseada no princípio minoritário ou elitista. Geram-se na sociedade características e atributos diferenciados, muito particulares e próprios no campo da educação e da psicologia, para explicarem o processo de desenvolvimento, difíceis de superar (até www.esab.edu.br 39 hoje), como, por exemplo: um amplo e complexo campo de símbolos, inclusive indicativos de condutas e comportamentos (atitudes, hábitos, aptidões, dons, talentos, habilidades, competências etc.); sotaques; gírias; estilos de vestimenta; atividades de lazer; cerimônias; rituais; habilidades; competências, entre outros. Assim é que aos poucos o atendimento infantil vai se tornando mais formal, como resposta a essa situação, surgindo instituições para o atendimento a crianças desfavorecidas ou crianças cujos pais trabalhavam. A concepção dominante propagada pela psicologia do desenvolvimento aliada à de Educação Infantil, caracterizada como naturalizante, reveste-se de uma ideia de infância fragilizada e, portanto, mostra uma criança sem possibilidades de exercitar sua autonomia. Observe bem a dimensão desse acontecimento, veja bem no que implica essa forma de pensar a criança: a visão naturalizada, por ver o desenvolvimento tal como se dá nos processos naturais de ordem biológica e que apresenta o desenvolvimento infantil em fases ou estágios como momentos de um processo esperado, previsto e natural; abre caminho para a concepção de aluno como um corpo vazio ou uma folha de papel em branco, a serem preenchidos e modelados. Isso vai trazer sérias consequências ao modo de conceber a infância, que será expresso em muitos pensadores e autores da educação e da psicologia. O processo educativo acaba sendo compreendido, nesse sentido, como um mero acompanhamento do desenvolvimento infantil. O papel do professor é relegado a um segundo plano, reduzido à tarefa de estimular que foi fundamental como base no behaviorismo (você pode rever este tema na unidade 6) e de facilitar esse desenvolvimento, respeitando as características de cada fase ou estágio do processo. O objeto da disciplina Psicologia do Desenvolvimento, que desempenhou historicamente um papel central nas relações entre psicologia e educação, e Psicologia da Educação e Educação Infantil, investigando sobre as leis que regem o desenvolvimento infantil, mostra-se mais como um receituário de passos a serem seguidos para classificar os estágios do desenvolvimento infantil do que como uma teoria científica consistente. www.esab.edu.br 40 Na busca da identidade da Educação Infantil e de sua relação com a Psicologia da Educação, o desafio tem sido afirmar a necessidade de se integrar educação e cuidados nas instituições, vistos como funções complementares e indissociáveis, mediante esforços no sentido de alcançar o desenvolvimento integral da criança num ambiente socializador. Considerando a infância em suas especificidades, suas tantas e incríveis mudanças físicas, mentais e sociais, aliam-se os estudos na Psicologia da Educação e sobre os processos de desenvolvimento infantil, a promoverem as modificações desejadas nas políticas educacionais públicas, no que diz respeito ao desenvolvimento infantil, que precisam ainda ser feitas para um salto de qualidade no ensino e na aprendizagem que combatam as ações assistencialistas. www.esab.edu.br 41 8 Teorias de Freud sobre a constituição do aparelho psíquico Objetivo Apreender as concepções existentes sobre o processo de desenvolvimento humano, seu conceito, os princípios que o regulamentam e suas implicações para a educação, a partir do olhar de Freud. Abrindo nosso diálogo, nesta unidade, já tendo feito algumas considerações importantes sobre os elos estreitados com o tempo entre a psicologia e a educação, relação que avançou muito na Educação Infantil, vamos estudar algumas contribuições teóricas de Freud, e sua Psicanálise, lembrando que estas abordagens se relacionam com a educação em geral mediante o estudo do funcionamento do aparelho psíquico e dos processos mentais, que nos interessam porque dizem respeito à aprendizagem, à organização do saber, a um outro modo de ver e entender a prática educativa. O termo psicanálise é usado para se referir a muitos aspectos da obra de Freud e de investigação, incluindo a terapia freudiana e a metodologia de pesquisa que ele usou para desenvolver suas teorias. Freud baseou- se fortemente em suas observações e estudos de casos de seus pacientes quando formou a sua teoria do desenvolvimento da personalidade. Foi muito criticado por isso, mas trabalhou assim. www.esab.edu.br 42 Figura 6 – Freud e o pequeno Hans (1905). Fonte: <commons.wikimedia.org>. Como teriam começado as investigações de Freud? Certamente, elas não surgiram do nada. Veja bem! No século XIX, certos temas gerais, como a vontade e o inconsciente, ocupavam grande parte dos países de língua alemã. Esses temas podem muito bem ter atingido o seu maior desenvolvimento em Freud, como muitos sugerem, mas não começaram com ele. Freud teve, na verdade, como fonte inspiradora de suas teorias dois grandes filósofos alemães: Nietzsche (1844-1900) e Schopenhauer (1788-1860). Observe a importância disso! Nietzsche, reservando o agir humano às pulsões instintivas (pulsões e instintos), será uma fonte relevante aos fundamentos de Freud. Para Nietzsche e outro grande pensador, Schopenhauer, criticam a ‘aspereza’ da razão (o racional cartesiano, o cálculo, o raciocínio, a prova, você lembra?), que é arbitrária, que mata as pulsões, o desejo, a sensibilidade, estirpando o natural corporal do ser humano. Ambos, Nietzsche e Schopenhauer, dão primazia à vontade da vida, às pulsões naturais, às sensações do ser humano. www.esab.edu.br 43 Foi a partir das ideias desses grandes críticos da razão e do consciente que Freudfoi alicerçando suas ideias e seus conhecimentos avançaram e culminaram na elaboração da psicologia do inconsciente aplicada às ciências mentais. Freud vai propor em sua teoria da psicanálise que os seres humanos são regidos por dois instintos básicos: os instintos de vida, que servem ao propósito da sobrevivência em que a fome, a sede e o sexo se enquadram; e os instintos de morte, ou destrutivos, pois supunha especificamente que a pessoa tinha um desejo inconsciente de morrer. São a vontade, o desejo, as pulsões. Trouxemos, nesta breve introdução sobre as origens dos trabalhos de Freud, alguns pontos interessantes para compreendermos a sua visão sobre a organização da mente. A Psicanálise surge como uma ciência que estuda o psiquismo, construída a partir de outras bases para fugir da racionalidade e da consciência. Agora, você tem uma ideia melhor sobre os fundamentos que Freud elaborou para o seu trabalho sobre a organização psíquica, que ele denominou de aparelho psíquico (ideia emprestada da Física, de uma espécie de ‘economia enérgica’, pressupondo algo que funciona), e sobre a importância da psicologia e da teoria psicanalítica da mente consciente e inconsciente para a Psicologia da Educação. No caso de Freud, suas teorias serviram de base para uma escola de Psicologia crescer rapidamente e tornar-se uma força dominante para o início da ciência da mente e do comportamento. www.esab.edu.br 44 Nos seus primeiros trabalhos, Freud sugeria a divisão da vida mental em duas partes: consciente e inconsciente. Sua teoria psicanalítica da mente consciente e inconsciente usava uma metáfora do iceberg. A polaridade consciente, caracterizada pela ponta visível do iceberg, seria pequena e insignificante, preservando apenas uma visão superficial de toda a personalidade. A imensa e poderosa polaridade inconsciente – assim como a parte submersa do iceberg – conteria os instintos, ou seja, as forças propulsoras de todo comportamento humano. Freud polariza a vida anímica entre “Eros” – instinto da vida – e “Thanatos” – instinto de destruição e morte. Superego e Ego contêm a ‘energia psíquica’ em imensa proporção, no Pré-inconsciente, como um bloco flutuante na água cujo maior volume – o inconsciente – fica submerso. Esta energia corresponde em sua maior parte ao ‘Ego’, impulsor cego regido pela busca do prazer. Em polo oposto está o ‘Superego’, em que estão a normas morais (basicamente repressoras). Inconsciente Consciente Pré-consciente Superego ID Ego Figura 7 – Metáfora do iceberg. Fonte: <commons.wikimedia.org>. Para Freud, existem duas teorias tópicas do aparelho psíquico (ou intelecto): a primeira faz intervir os sistemas inconsciente, pré- consciente e consciente; a segunda, as três instâncias, id, ego e superego. www.esab.edu.br 45 8.1 Teoria do aparelho psíquico dos sistemas inconsciente, pré-consciente e consciente É uma concepção mais passiva de funcionamento psíquico, abrangendo o inconsciente, o pré-consciente e o consciente. Vamos ver como operam estes três sistemas. • Consciente: Por ser a superfície do aparelho mental externo, corresponde à “percepção” de caráter mais imediato e certo que temos do mundo externo. É uma qualidade momentânea que caracteriza as percepções externas e internas no conjunto dos fenômenos psíquicos, incluindo tudo do que estamos cientes em um dado momento. As experiências que percebemos, incluindo as nossas lembranças e ações intencionais, em que a nossa consciência funciona de acordo com as regras do tempo e do espaço. Corresponde à relação direta com os fatores ambientais que nos influenciam! Exemplo: “Eu, para sair no frio, sei que vou precisar de um casaco”! • Inconsciente: Corresponde ao sistema situado mais “atrás”, mais “profundo”, como uma ideia latente, dinamicamente reprimida, como um conteúdo ausente em dado momento da consciência, mas capaz de se tornar consciente. Aí estão elementos instintivos (inatos) inacessíveis à consciência e também o material que foi excluído dela, que foi censurado e reprimido, não esquecido nem perdido, mas que não é “permitido” ser lembrado. Exemplo: a lembrança de sua infância, quando liberada à consciência, pode mostrar que não perdeu nada de sua força emocional. • Pré-consciente: Funciona como uma espécie de barreira de contato, uma peneira, que seleciona aquilo que pode, ou não, passar para o consciente, só tendo acesso a ele se passando pelo pré-consciente, submetendo-se a certas modificações. São porções da memória, lembranças, que podem ser trazidas à consciência. Exemplo: as minhas lembranças do dia de ontem, do meu segundo nome, das ruas onde morei, certas datas comemorativas importantes para você, seus alimentos prediletos, o cheiro de certos perfumes e muitas outras experiências passadas. www.esab.edu.br 46 Para sua reflexão Observe a figura abaixo e faça sua análise a respeito de como nossa mente é normalmente concebida pelos mecanicistas, equivalendo ao funcionamento de determinadas peças. Reflita sobre as implicações decorrentes de quando se pensa assim! Figura 8 - Ideia mecanicista de mente humana. Fonte: <commons.wikimedia.org>. www.esab.edu.br 47 8.2 Teoria do aparelho psíquico das instâncias id, ego e superego Se a Primeira Teoria compreende essencialmente a distinção entre o inconsciente, o pré-consciente e o consciente, a Segunda Teoria é um modelo estrutural mais ativo, dinâmico, de funcionamento psíquico. Este aparelho é formado por um conjunto de elementos distintos, que separadamente têm “funções” específicas, mas que não estão dissociados, interagindo permanentemente e influenciando-se reciprocamente. Essa concepção estruturalista consiste em uma divisão tripartida da mente em instâncias: o id, o ego e o superego. Id (ou Isso) É o único componente da personalidade que está presente desde o nascimento, incluindo os comportamentos instintivos e primitivos. O id é concebido como um conjunto de conteúdos de natureza pulsional e de ordem inconsciente, impulsionado pelo princípio do prazer, que se esforça para a gratificação imediata de todos os desejos, as vontades e necessidades e as paixões indomadas. Lembra-se daqueles desenhos animados em que aparece um “diabinho” sentado em um ombro e um “anjo” sentado em outro, quando alguém está tentando tomar uma decisão? Em termos mais simples, o id é o “diabinho”, ou seja, a necessidade de satisfação imediata, como quando uma criança bate os pés porque quer e quer alguma coisa ali, na hora. Ego (ou Eu) É a porção do id (biológico) que foi modificada pela influência direta do mundo externo (ambiente, meio), responsável por lidar com a realidade externa mediante a percepção consciente (o sujeito, o eu). Designa a pessoa humana como consciente de si e objeto do pensamento e que, sem a intervenção do ‘eu’ (ego), se tornaria um joguete das aspirações pulsionais, totalmente inconscientes. O princípio da realidade pesa em termos de custos e benefícios numa ação, antes de uma pessoa tomar a decisão de agir ou de abandonar seus impulsos. No exemplo dado antes, www.esab.edu.br 48 quando alguém está tentando tomar uma decisão, o Ego é o ‘anjo’, ou seja, basicamente o ‘cérebro’ tentando encontrar um objeto no mundo real que equilibre o que cada um está defendendo e mais objetivamente e logicamente, e se possa chegar a uma decisão. Superego (ou Supereu) Representando o resultado de dois fatores importantes, um de natureza biológica (como os instintos) e outro de natureza histórica (como a educação), o Superego é o aspecto da mente que contém todos os nossos padrões morais internalizados e ideais que adquirimos de nossos pais e da sociedade; equivale ao nosso senso de “certo” e de “errado”, mediante a busca por equilibrar as pulsões do id, as exigências do Superego e as do ambiente. No exemplo antes mencionado, o Superego é o ‘anjo’, agindo como um juiz que fornece orientações para que se possa fazer julgamentos. Essas breves
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