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14.1
ECONOMIA DO HIDROGÊNIO
JOSÉ ROBERTO SIMÕES MOREIRA
Laboratório de Sistemas Energéticos Alternativos (SISEA)
Departamento de Engenharia Mecânica da Escola Politécnica da USP
JULIA DA ROSA HOWAT RODRIGUES
Laboratório de Sistemas Energéticos Alternativos (SISEA)
Departamento de Engenharia Mecânica da Escola Politécnica da USP
TIAGO GONÇALVES GOTO
Laboratório de Sistemas Energéticos Alternativos (SISEA)
Departamento de Engenharia Mecânica da Escola Politécnica da USP
VINICIUS EDUARDO RIBAS
Laboratório de Sistemas Energéticos Alternativos (SISEA)
Departamento de Engenharia Mecânica da Escola Politécnica da USP
Hidrogênio: um futuro promissor
As energias renováveis vão desempenhar um contínuo, crescente e relevante papel no futuro próximo nas matrizes
energéticas das nações. Suas diversas formas e seu uso são o objeto deste livro. Contudo, em adição às energias
renováveis, há muito esforço também da comunidade científica e de engenharia em direção ao, assim chamado,
futuro sem carbono, ou seja, uma matriz energética não baseada no átomo do carbono, mas em outro elemento
químico: o hidrogênio. Em primeiro lugar, o hidrogênio é o elemento químico mais abundante do Universo,
constituindo 75 % de sua massa total. No nosso planeta, o hidrogênio está presente em 70 % da superfície terrestre,
seja na forma de água ou de compostos orgânicos. Em segundo lugar, o hidrogênio pode ser obtido por meio de
diferentes processos plenamente dominados pela nossa tecnologia, e tem grande flexibilidade de produção. Por
último, não é tóxico e nem poluente; isso faz dele uma excelente fonte energética (Souza, 2009). Segundo as
previsões do Departamento de Energia dos Estados Unidos, o hidrogênio deve contribuir com cerca de 8 a 10 % no
mercado total de energia em 2025, e essa participação deve atingir 35 % em 2050.
Além dos fatores já citados, que indicam o hidrogênio como a melhor alternativa para suprir a crescente
demanda energética do planeta, historicamente é possível constatar que a humanidade já está caminhando no sentido
da descarbonização de seus combustíveis, ou seja, caminhando para o aumento do uso de hidrogênio e a diminuição
do uso do carbono. A substituição do carvão pelo petróleo ao longo do século XX e, atualmente, a crescente
participação do gás natural na matriz energética mundial comprovam essa tendência.
14.1.1
O gás hidrogênio, no entanto, não é uma fonte de energia primária, já que não existe livremente na natureza. É
chamado de fonte de energia secundária, ou portador de energia, a exemplo da própria eletricidade, como discutido
na Seção 1.2 do Capítulo 1. Contudo, o fato de poder ser armazenado e transportado aumenta substancialmente seu
campo de possíveis aplicações, em comparação até com outras fontes de energias renováveis, como a solar ou
eólica, que são sazonais, intermitentes e diluídas.
O termo economia do hidrogênio foi cunhado pela primeira vez na década de 1970, por engenheiros da General
Motors, nos EUA, durante a crise do petróleo. Naquela época, o aumento do preço do petróleo e a preocupação com
uma possível falta de combustível fez com que governos e indústrias desenvolvessem planos de aplicação do
hidrogênio em um sistema energético mundial para armazenamento, distribuição e utilização do mesmo como vetor
energético (Souza, 2009).
Apesar de se tratar de uma tecnologia conhecida há algumas décadas, a economia do hidrogênio não se
estabeleceu por completo até hoje, em razão do alto custo de produção do gás hidrogênio e da eletricidade gerada a
partir das células de combustível, e ainda devido à escassa infraestrutura para o seu transporte e armazenamento.
Isso porque a hegemonia do petróleo e gás natural nos últimos anos reduziu os interesses dos investimentos públicos
e privados em pesquisas de novas fontes energéticas. A transição para a economia do hidrogênio depende, em
grande parte, do quão valorizadas serão as questões ambientais no futuro, tanto por consumidores quanto por
produtores, e da disponibilidade dos combustíveis fósseis para abastecer a crescente demanda energética do planeta
para manter o padrão de vida da humanidade.
O gás hidrogênio pode ser produzido por diversas formas a partir de combustíveis fósseis, energia nuclear e
energias renováveis, por processos como a eletrólise da água, a reforma de gás natural, a gaseificação de carvão ou
biomassa, a decomposição térmica da água sob altas temperaturas (termólise), a fotoeletrólise e os processos
biológicos. De acordo com a Agência Internacional de Energia (IEA) em 2005, da produção total de 5 × 1018 J
anual, 40 % é usado em processos químicos, 40 % em refinarias e 20 % para outros fins. A maior parte desse
hidrogênio é produzida in loco, em refinarias e plantas químicas, para uso próprio. Atualmente, os combustíveis
fósseis representam, sem dúvida, a principal matéria-prima para a produção de hidrogênio, sendo que o gás natural
responde por 48 % da produção mundial, o petróleo por 30 % e o carvão por 18 %. Dessa forma, a preocupação
ambiental é pertinente, já que o CO2 é um importante subproduto do processo e se supõe que seja o principal
causador do chamado efeito estufa. Dentre os combustíveis fósseis, o gás natural é o mais adequado para a produção
de hidrogênio devido ao seu maior conteúdo relativo de átomos de hidrogênio por molécula, e também porque as
reservas mundiais comprovadas de gás natural já excedem as de petróleo.
A eletrólise da água e a reforma de gás natural apontam como as tecnologias mais promissoras para iniciar o
processo de transição para o hidrogênio como bem energético. No entanto, a eletrólise é um processo de elevado
custo e, por isso, usado, em geral, apenas para a produção de hidrogênio de alta pureza. Atualmente, essa tecnologia
responde por apenas 4 % da capacidade mundial de produção de H2. Já o processo de reforma de gás natural é mais
eficiente e barato e, por isso, é utilizado para a produção em grande escala quando a qualidade não é um fator
limitante. Em longo prazo, a fotoeletrólise e a hidrólise a partir da energia solar ou de processos biológicos devem
surgir como alternativas renováveis. A biomassa também pode ser usada diretamente para a produção de hidrogênio,
a partir de processos de gaseificação ou de reforma, ou para geração da eletricidade que será utilizada na eletrólise
da água. Essas tecnologias ainda são incipientes, mas despontam como promissoras em futuro próximo.
Decomposição da molécula de água
A decomposição da molécula de água é uma reação química altamente endotérmica. A partir apenas da água,
produz-se gás hidrogênio (um combustível de elevada densidade energética) e gás oxigênio. Essa equação
balanceada é apresentada a seguir:
As fontes de energia para ativação dessa reação e os cenários nos quais a decomposição da água pode ocorrer
são diversos, e os processos mais utilizados e estudados recebem nomes específicos. A fonte de energia pode ser a
eletricidade, na eletrólise; a direta irradiação de luz solar, no caso da fotoeletrólise; e, por último, a termólise, que se
https://jigsaw.minhabiblioteca.com.br/books/9788521633785/epub/OEBPS/Text/chapter1.html
14.1.2
utiliza de calor em elevadas temperaturas para fornecer energia suficiente para a quebra da molécula de água, calor
esse que pode ser obtido por meio de energia nuclear, energia solar concentrada ou pela combustão de algum
combustível. Na sequência, são detalhados cada um desses processos, apresentando o uso atual dessas tecnologias e
mostrando também aquilo que os estudos em desenvolvimento preveem para o futuro.
O desenvolvimento de técnicas eficientes e economicamente viáveis para a decomposição da molécula de água é
um passo-chave para a implantação e o sucesso da economia do hidrogênio. Como mencionado por Steinfeld
(2005), esse é um objetivo de médio e longo prazo que demanda esforços e investimentos desde já.
Eletrólise
A eletrólise é um processo amplamente conhecido que converte a água nos gases hidrogênio e oxigênio por
intermédio da eletricidade. Na eletrólise convencional,a molécula de água é quebrada por meio de reações químicas
ativadas por uma fonte de tensão elétrica externa. O fornecimento de corrente elétrica é feito através de eletrodos,
entre os quais existe um meio condutor iônico que pode ser líquido (solução eletrolítica ou sal fundido) ou sólido
(membranas poliméricas ou óxidos cerâmicos). O processo de produção de hidrogênio por eletrólise é empregado há
mais de cinquenta anos, tendo recebido um rápido desenvolvimento a partir dos anos 1960, com a introdução do
conceito de eletrólise avançada. Hoje, esse processo é responsável por aproximadamente 4 % da produção global de
hidrogênio. Independentemente do tipo de eletrólise utilizado, os produtos finais do processo de eletrólise são
exclusivamente os gases hidrogênio e oxigênio, ou seja, o balanço das reações químicas resulta unicamente na
decomposição da água.
A técnica mais madura de eletrólise utiliza como meio condutor líquido uma solução aquosa alcalina de
hidróxido de potássio (KOH), na faixa de concentração de 25 a 30 %, pois, entre os meios básicos economicamente
interessantes, esse é o que demanda menos eletricidade em função de sua baixa resistência ôhmica. Em geral,
operam entre 70 e 80 °C e apresentam rendimento de 70 a 80 %.
No caso de um meio condutor básico, as reações são:
No catodo: 2H2O(l) + 2e– → H2(g) + 2OH–(aq)
No anodo: 2OH–(aq) → 1/2O2(g) + H2O(l) + 2e–
Total: H2O(l) → H2(g) + 1/2O2(g)
O aço-carbono é o material mais utilizado para a confecção dos eletrodos, sendo sua área exposta dimensionada
levando-se em conta a corrente a ser conduzida para cada célula. Para o anodo — no qual há produção de O2 — é
necessária uma proteção contra a oxidação. Em geral, essa proteção é feita pelo processo de niquelação das
superfícies do mesmo. Como é interessante que o anodo possua alta razão entre área e volume, são comumente
empregadas superfícies rugosas ou porosas para esses eletrodos. Ligas à base de níquel, tanto amorfas quanto
cristalinas, têm sido utilizadas com sucesso como catodos para a eletrólise da água, em virtude da alta atividade
eletrocatalítica em relação à reação de evolução de H2: 2H+ + 2e– → H2.
Existem ainda os eletrolisadores de membrana eletrolítica polimérica que correspondem a uma tecnologia menos
avançada, porém promissora. Esses eletrolisadores são, simplificadamente, células-combustíveis que operam em
modo reverso. Nessa eletrólise, a membrana polimérica ácida e sólida dispensa eletrólitos líquidos. As maiores
vantagens são a ausência de eletrólito corrosivo de KOH, o tamanho reduzido, a alta densidade de corrente e as altas
pressões de operação. Detecta-se, ainda, a necessidade de melhorias e de novos materiais para os quesitos de
eficiência, custo, capacidade e, em especial, tempo de vida da membrana.
Como o consumo de eletricidade representa o maior custo da eletrólise, é essencial a redução do consumo dessa
forma nobre de energia requerida pelo processo e a busca por fontes de energia mais econômicas. Isso pode ser
alcançado por meio do desenvolvimento de novos materiais eletrocatalíticos para os eletrodos, por exemplo. Esses
materiais devem exibir alta estabilidade eletroquímica e boas propriedades eletrocatalíticas, além de serem
relativamente abundantes, baratos, fáceis de manipular e não poluentes.
Além disso, o uso da energia solar como fonte de eletricidade para ativação da reação química também constitui
uma alternativa bem atrativa para a redução do custo da eletrólise. Isso é possível pelo acionamento direto de um
eletrolisador alcalino de água por meio de um painel fotovoltaico. Por intermédio da fotoeletrólise, o gás hidrogênio
14.1.3
14.1.4
pode inclusive ser usado para armazenamento da energia solar na forma de ligações químicas e posterior conversão
para atendimento da demanda energética no horário de ponta. As principais usinas de produção de hidrogênio a
partir da energia solar fotovoltaica atualmente em operação no mundo são exclusivamente para fins de pesquisa da
viabilidade técnica e econômica da alternativa e estão majoritariamente localizadas na Europa. Esses sistemas têm
como objetivo estudar os fluxos de energia e eficiências das transformações envolvidas na fotoeletrólise.
A eficiência máxima teórica da eletrólise é de aproximadamente 85 %, mas os eletrolisadores atuais são
consideravelmente menos eficientes. A eficiência atual de eletrolisadores alcalinos descentralizados, excluindo-se a
pressurização do hidrogênio, é por volta de 40 %, enquanto sistemas de larga escala alcançam até 50 %.
Há ainda a chamada eletrólise avançada, que se caracteriza por utilizar eletrolisadores extremamente compactos,
com altas densidades de corrente e uso de eletrólitos sólidos e catalisadores de metais nobres nos eletrodos.
Consequentemente, apresentam maior eficiência de conversão da energia elétrica em hidrogênio. Em geral, operam
em temperaturas de 80 a 120 °C e apresentam rendimentos de 80 a 90 %.
Como o eletrólito é sólido, funciona também como uma membrana separadora, permitindo grande proximidade
de eletrodos, além de necessitar apenas de circulação de água deionizada no interior da célula, que fornece a água
para a eletrólise, umedece a membrana, retira os gases e mantém a temperatura constante. Nesse caso, as reações do
processo ocorrem em meio condutor ácido:
No catodo: 4H+ + 4e– → 2H2(g)
No anodo: 2H2O(l) → O2(g) + 4H+ + 4e–
Total: 2H2O(l) → 2H2(g) + O2(g)
Termólise
A termólise é a quebra da molécula de água devido à sua exposição a elevadas temperaturas (acima de 2000 °C). A
fonte de calor para o processo pode ser a energia nuclear, a energia solar concentrada ou a combustão de algum
combustível.
A combustão, que teoricamente representa uma alternativa para o fornecimento de altas temperaturas, é
praticamente descartada pelos pesquisadores, uma vez que o alto consumo de combustível nesse nível de
temperatura inviabiliza o balanço energético e econômico do processo, ou seja, a quantidade de combustíveis fósseis
ou biomassa a ser queimada para a obtenção dessas temperaturas seria tão elevada que o hidrogênio produzido não
seria energeticamente vantajoso. Sendo assim, as alternativas mais estudadas são a energia nuclear e a energia solar
concentrada. A primeira possui alta densidade energética e produz calor de maneira relativamente limpa (se os
subprodutos forem adequadamente coletados). Já o Sol é uma fonte renovável e inesgotável; portanto, com a
utilização e o aperfeiçoamento das técnicas de concentração solar, é possível obterem-se altas temperaturas para o
processo de termólise, sem o custo adicional de uma fonte de calor.
A termólise solar representa um método absolutamente renovável e livre de emissões de carbono e, por isso,
mostra-se como a técnica mais promissora para o estabelecimento de uma matriz energética limpa e descarbonizada.
O aperfeiçoamento desse processo para utilização em escala comercial é uma meta ambiciosa que deve ser buscada
em longo prazo. Porém, atualmente, ainda há demanda por melhorias nos equipamentos de concentração de energia.
Além disso, a principal dificuldade do processo de termólise da água é que os gases hidrogênio e oxigênio são
altamente reativos e explosivos. Dessa forma, precisa-se separar esses dois gases imediatamente após a quebra da
molécula da água, ainda em altas temperaturas, para evitar sua rápida recombinação de forma explosiva. Outro
problema operacional se dá devido à necessidade de temperaturas de processo acima de 2000 °C, já que nesse nível
de temperatura os materiais capazes de suportar o aquecimento são limitados e custosos. Por fim, vale mencionar
que a intermitência solar é um inconveniente para o estabelecimento de uma produção contínua de hidrogênio.
Buscando contornar as barreiras mencionadas, diversas linhas de pesquisa visam ao aproveitamento solar para a
produção de hidrogênio por meio de rotas alternativas, como ciclos termoquímicos, metalúrgicos e de gaseificação
solar. Essas técnicas serão abordadas nas seções subsequentes.
Ciclos metalúrgicos
Os ciclostermoquímicos de decomposição da água produzem o hidrogênio por meio de uma série de etapas de
processos de reação química endotérmica e exotérmica, tendo como resultado final a reação global dada pela
Equação (14.2), produzindo os gases hidrogênio e oxigênio e consumindo apenas água e energia térmica.
Reações de uma única etapa perfazem o processo de termólise, comentado anteriormente na Seção 14.1.3. Esse
processo demanda uma fonte de energia térmica de alta temperatura, acima de 2000 °C (em torno de 2300 °C), para
se obter uma taxa de reação razoável, ao custo de um ambiente altamente explosivo devido à mistura de H2 e O2 em
altas temperaturas (Steinfeld, 2005).
Os ciclos metalúrgicos, por outro lado, são compostos de duas ou mais etapas de reação e operam a temperaturas
pouco menores. As etapas são basicamente a redução de um óxido metálico e a oxidação, também chamada de
hidrólise, sendo uma reação endotérmica e outra exotérmica, respectivamente. Nas reações da Equação (14.3),
apresentam-se os ciclos de duas etapas, considerados os mais simples, enquanto as Equações (14.4) e (14.5)
representam as reações químicas generalizadas de três etapas que utilizam outro elemento como catalisador.
De forma geral, na primeira etapa de reação da Equação (14.3), dá-se a reação endotérmica, que é a etapa de
redução, em que um óxido metálico MOx é reduzido a metal puro, M, ou em óxido metálico de valência menor,
MOx–y, produzindo o gás oxigênio, O2. Já na segunda etapa, o metal, M, (ou óxido metálico) MOx–y produzido, reage
com vapor de água, do que resulta uma separação do gás hidrogênio concomitantemente à regeneração do óxido
metálico original, MOx, ou do metal puro, M, fechando o ciclo, conforme apresentado no esquema da Figura 14.1.
Como podemos observar na figura, a produção de O2 e H2 acontece em etapas distintas, não ocorrendo, portanto, a
sua mistura, eliminando-se a necessidade de separação de gases e os riscos de explosão.
Figura 14.1 Fluxograma de ciclo termoquímico de decomposição da água em duas etapas.
Como regra geral, quanto maior a quantidade de etapas, menores são as temperaturas de reação, mas, em
contrapartida, aumenta-se a complexidade dos ciclos e seus custos. Outra desvantagem dos ciclos de maior número
de etapas é a redução da eficiência global do processo, devido às perdas de cada uma das etapas. Além disso, quanto
menor a quantidade de etapas, maior será a facilidade de reciclagem do material (Abanades et al., 2006; Silva,
1991).
As pesquisas de produção de hidrogênio por decomposição termoquímica da água por ciclos metalúrgicos
surgiram com a crise do petróleo na década de 1970, até o início da década de 1980, quando começou uma
preocupação com a dependência excessiva do petróleo. Segundo Abanades et al. (2006), a maior parte das pesquisas
foi desenvolvida e continuada no Japão. Foram propostas algumas centenas de ciclos, mas apenas alguns foram
estudados com mais detalhes e de forma experimental. Abanades et al. (2006) realizaram uma ampla pesquisa e
compilaram um banco de dados com 280 ciclos. A partir desse banco de dados, os autores propuseram alguns
critérios de seleção, sendo que descreveram 30 ciclos como os mais favoráveis à utilização com energia solar
concentrada.
Como descrito anteriormente, todos os ciclos possuem uma etapa de reação endotérmica que consome grandes
quantidades de energia térmica e que justifica o uso da energia solar com concentrador, como fonte de calor de alta
temperatura nos ciclos (Steinfeld, 2005).
Nigro (2015) selecionou alguns dos ciclos mais promissores a ser implementados, tendo como fonte de calor a
energia solar concentrada. A energia solar concentrada como fonte de energia é detalhadamente discutida na Seção
14.1.8. Foram levantados os prós e contras de cada ciclo metalúrgico, conforme apresentado na Tabela 14.1. De
maneira geral, os ciclos propostos para utilização com energia solar seguem o fluxograma da Figura 14.2, na qual os
blocos indicados mostram os processos significativos, desde a concentração da energia solar em uma cavidade negra
na qual ocorre a etapa de redução, seguida da etapa de oxidação até um exemplo de uso final do hidrogênio em uma
célula a combustível. É evidente que o gás hidrogênio produzido pode ser empregado para outras finalidades, ou
mesmo armazenado para uso posterior. Dos ciclos metalúrgicos, alguns possuem particularidades, como o ciclo
ZnO/Zn, e necessitam ser resfriados após a etapa de redução para evitar a recombinação do O2 com Zn.
Tabela 14.1 Comparação entres os ciclos metalúrgicos favoráveis à utilização com energia solar concentrada (Nigro,
2015)
Nomes dos
ciclos Reações
Temperatura de
reação Vantagens Desvantagens
Fe3O4/FeO Fe3O4 → 3FeO + 0,5O2
H2O + 3FeO → Fe3O4 + H2
(2200 °C)
(400 °C)
Produção de hidrogênio
relativamente alta; evita
reações de recombinação e
irreversibilidades associadas ao
resfriamento.Óxidos.
Maior temperatura para etapa de
redução; rápido desgaste das
partículas ao longo de vários
ciclos; sinterização e fusão
severas durante a
decomposição térmica do
Fe3O4; é necessário moagem ou
granulação para obtenção de
taxas razoáveis de conversão
para FeO.
ZnO/Zn ZnO → Zn(g) + 0,5O2
Zn + H2O → ZnO + H2
(2000 °C)
(1100 °C)
Potencial alta e�ciência exegética
de conversão.
Relativa alta temperatura para
dissociação térmica; é preciso
haver rápido resfriamento para
evitar recombinação de Zn com
oxigênio; é necessário haver
técnica de separação de Zn e
oxigênio e�ciente; limitada
taxa de reação de hidrólises
graças à formação de camada
de ZnO sólido.
SnO2/SnO SnO2 → SnO + 0,5O2
SnO + H2O → SnO2 + H2
(1600 °C)
(550 °C)
Relativa baixa temperatura de
redução; alta taxa de
conversão química (e menos
dependente da taxa de
resfriamento que o ZnO); não
há vaporização de SnO2
durante a redução; rápida
cinética de reação (não há
fenômenos de passivação
ocorrendo na superfície de
nanopartículas).
Baixo calor exotérmico (–49
kJ/mol a 500 ºC) que
desfavorece o
autoaquecimento da reação;
reação oposta inibe o processo
de hidrólise a baixas
temperaturas.
CeO2/Ce3O4 2CeO2(s) → Ce2O3(s) + 0,5O2
H2O(g) + Ce2O3(s) → CeO2 + H2(g)
(2000 °C)
(400-600 °C)
Sem reação reversa durante o
resfriamento dos produtos;
reatividade alta do Ce2O3 com
vapor de água, resultando em
altas taxas de produção de
hidrogênio; pode ser usado em
produção no local de demanda
de H2 sob demanda; evita
Alta temperatura necessária para
redução de óxido de Ce(IV)
para Ce(III); redução não
observada a pressões mais
altas; vaporização parcial de
CeO2 durante redução.
14.1.5
complicações associadas a
transportes longos e
armazenamento de H2.
W/WO3 2WO3(s) → 2W(s) + 3O2(g)
Decomposição da água:
W(s) + 3H2O(g) → WO3(s) + 3H2(g)
Decomposição do dióxido de
carbono:
W(s) + 3CO2(g) → WO3(s) + 3CO(g)
(900 °C)
(700 °C)
(800 °C)
Relativa baixa temperatura de
redução; sem reação reversa
durante o resfriamento dos
produtos; maior produtividade
comparada com outros pares
redox.
Volatização do tungstênio e dados
sobre o comportamento físico-
químico da reação foram
desenvolvidos apenas em
caráter teórico necessitando de
mais estudos em laboratório.
Há um grande número de pesquisadores estudando ciclos e desenvolvendo a tecnologia do hidrogênio solar, mas
ainda não há plantas comerciais em operação. Desse modo, os ciclos metalúrgicos, por enquanto, estão restritos
somente a experimentos em escala laboratorial. Há, por outro lado, comprovadamente, grande potencial
investigativo e de pesquisa inovadora nesse campo.
Figura 14.2 Fluxograma geral dos ciclos metalúrgicos utilizando energia solar concentrada para a produção de hidrogênio com
exemplo de aplicação em célula de combustível. É claro que o gás hidrogênio pode ser empregado em outras finalidades.
Reforma de metano
A reação de reforma do gás natural formado basicamente por metano é, atualmente, a técnica mais utilizada para
obtenção de hidrogênio, responsável pela produção de 48 % de todomontante desse gás. Como outros processos, a
reforma de metano não produz hidrogênio puro, e sim uma mistura de hidrogênio e monóxido de carbono conhecida
como gás de síntese (syngas). A reação principal do processo de reforma de metano, que ocorre entre 700 e 850 °C e
entre 3 e 25 bar, é dada pela seguinte equação:
O syngas é uma matéria-prima importante na indústria química. Por isso, muitas vezes não se faz necessária a
separação dos gases finais para a obtenção de hidrogênio puro. Para aplicações que requerem maior pureza, o
processo utilizado é a reação de mudança de vapor de água, em que o gás de síntese reage com o vapor, gerando
uma mistura de hidrogênio e gás carbônico que é facilmente separada. Essa etapa é dada pela Equação (14.7):
14.1.6
14.1.7
Gasei�cação
O processo de gaseificação consiste no enriquecimento energético de um combustível sólido ou líquido e rico em
carbono, transformando-o em uma mistura de gases com maior poder calorífico. Dentre outras vantagens, destacam-
se a logística de uso final e a qualidade superior e versatilidade do combustível obtido. O gás obtido por meio desse
processo, assim como na reforma de metano, é o gás de síntese (syngas), que possui um bom poder calorífico, além
de grande aplicabilidade em diversos processos industriais. Trata-se de um processo endotérmico que requer altas
temperaturas de ativação, e no qual o combustível é aquecido na ausência de oxigênio e na presença de um agente
oxidante.
Nos processos tradicionais de gaseificação, a fonte de calor é o processo de combustão de um combustível que
pode ser interno ou externo ao reator. No caso da combustão externa, a eficiência térmica é menor em função das
irreversibilidades associadas à transferência indireta de calor dos produtos de combustão aquecidos para o leito de
gaseificação. Por outro lado, a combustão interna, mais utilizada atualmente, é iniciada por meio da queima de uma
fração dos reagentes no reator, na presença de oxigênio, em quantidades inferiores à estequiométrica. Apesar de ter
uma maior eficiência energética, segundo Zedtwitz e Steinfeld (2003), esse método consome até 30 % do
combustível introduzido, gerando a contaminação dos produtos gasosos pelo gás carbônico e outros particulados.
Carvão, petróleo e biomassa são os compostos carbônicos mais empregados no processo de gaseificação. Dentre
essas substâncias, há um destaque maior para a gaseificação do carvão (fonte da produção de 18 % do hidrogênio).
O petróleo, por ser líquido, apresenta aplicações mais nobres na indústria de energia. Em geral, o coque de petróleo,
um de seus subprodutos, é destinado à gaseificação. Há um grande interesse em aprimorar a gaseificação de
biomassa, pois isso viabilizaria o aproveitamento energético de muitos rejeitos da indústria agrícola, de madeira e de
resíduos sólidos urbanos, como bem discutido no Capítulo 11.
No caso da gaseificação solar, o vapor de água é a substância mais indicada e utilizada. A reação de gaseificação
com vapor de água pode ser simplificada por:
sendo que a composição do gás de síntese depende da especificação do teor elementar de hidrogênio (x) e de
oxigênio (y) do combustível.
Quando o combustível a ser gaseificado é sólido, como no caso do carvão e da biomassa, a etapa de pirólise da
matéria-prima antecede a gaseificação. Já no caso de combustíveis líquidos, como o petróleo, essa etapa não se faz
necessária. Por isso, muitas vezes, o processo de gaseificação de combustíveis líquidos é denominado oxidação
parcial do combustível.
Fontes de calor não convencionais
O uso direto de uma fonte de calor para quebrar a molécula de água e produzir hidrogênio possui a vantagem de
evitar o custo energético e econômico de etapas intermediárias, e ainda apresenta potencial de emissão nula, uma
vez que seu único subproduto é o O2. Contudo, as elevadas temperaturas envolvidas e o potencial explosivo da
mistura de H2 e O2 impedem o uso da termólise de forma direta, como discutido na Seção 14.1.3. Entretanto,
segundo a Agência Internacional de Energia (IEA, 2005), uma gama de novas tecnologias está em desenvolvimento
com o objetivo de reduzir a temperatura requerida pela termólise para menos de 1000 ºC. Alguns desses novos
processos propostos são: ciclos termoquímicos; processos híbridos de decomposição termoeletrolítica;
decomposição catalítica direta com o uso de membranas cerâmicas e decomposição química em plasma com ciclo
de CO2. Além de reduzir a temperatura do processo, os pesquisadores tentam aumentar os valores de eficiência para
além de 50 %, visando a uma redução significativa de custos na produção de hidrogênio, e ainda à superação de
algumas dificuldades técnicas. Uma vez que essas barreiras sejam eliminadas, a produção de hidrogênio, por meio
de termólise, tenderá a se tornar uma opção extremamente interessante, já que poderá ser viabilizada pelo uso de
fontes de calor mais baratas, como a energia solar ou nuclear.
https://jigsaw.minhabiblioteca.com.br/books/9788521633785/epub/OEBPS/Text/chapter11.html
14.1.8
14.1.9
Nesta seção são abordadas essas novas linhas de pesquisa, as quais buscam caminhos alternativos para a
produção de H2 a partir de fontes de calor não convencionais, como a energia solar concentrada e a energia nuclear,
capazes de viabilizar economicamente a produção comercial do hidrogênio.
Energia solar concentrada
É sabido que o aproveitamento da energia solar apresenta algumas dificuldades em razão da forma diluída e
intermitente com que a luz do Sol atinge a Terra. Dessa forma, um progresso significativo tem sido feito no
desenvolvimento de aparatos ópticos para coletores de larga escala e concentradores de energia solar capazes de
atingir concentrações da ordem de 5000 sóis ou mais. Esses fluxos intensos de radiação permitem a conversão da
energia solar em reservatórios térmicos de 2000 K, temperatura suficiente para a ativação de muitas reações
endotérmicas relacionadas à produção de hidrogênio.
A produção de gás hidrogênio por meio de energia solar pode ser obtida por pelo menos cinco rotas distintas
(Steinfeld, 2004), as quais estão ilustradas no diagrama esquemático da A produção de gás hidrogênio por meio de
energia solar pode ser obtida por pelo menos cinco rotas distintas (Steinfeld, 2004), as quais estão ilustradas no
diagrama esquemático da Figura 14.3..
Figura 14.3 Rotas de produção de gás hidrogênio solar.
A Figura 14.3 destaca as fontes químicas originárias do hidrogênio: a própria água, no caso da termólise e de
ciclos termoquímicos solares; combustíveis fósseis para o craqueamento solar, e a combinação de combustíveis
fósseis e vapor de água para os processos de reforma e gaseificação solares. Todas essas rotas fazem uso da radiação
solar concentrada como fonte de calor de alta temperatura para as reações endotérmicas envolvidas no processo. A
seguir, essas rotas alternativas para obtenção do hidrogênio são separadas em dois grupos, conforme a fonte química
do H2, e explicadas uma a uma. Cabe ressaltar que, em alguns dos processos indicados na Figura 14.3, pode-se obter
também o gás de síntese, syngas, quando há reações com presença de carbono. Por último, a biomassa também pode
ser uma possível rota de produção de syngas.
H2 a partir de H2O
Com os avanços da tecnologia dos concentradores solares, tem-se alcançado em laboratório de 2000 a 5000 sóis (1
sol = 1 kW/m2) no foco desses equipamentos. Portanto, temperaturas acima da necessária (2300 K) para os ciclos
14.1.10
14.1.11
termoquímicos e metalúrgicos em duas etapas, utilizando reações redox metal-óxido, são alcançadas. Os ciclos de
duas etapas são os descritos pelo par de Equações (14.3) de oxirredução. A primeira etapa endotérmica da Equação
(14.3) é a dissociação térmica solar do óxido metálico MOx em metal puro, M, ou em um óxido metálico de menor
valência, MOx–y, como representado naquela equação. A segunda etapa exotérmica não solar é a hidrólise do metal
para formar H2 e o correspondente óxido metálico, MOx, o que regenera o reagente metálicooriginal, fechando o
ciclo. Os detalhes dessa rota são apresentados na Seção 14.1.4. Note que os gases H2 e O2 são formados em etapas
distintas, o que elimina o risco de acidente e a necessidade de separação da mistura desses gases em alta
temperatura, como ocorre na reação de termólise direta (Seção 14.1.3).
H2 a partir de combustíveis fósseis
De acordo com a classificação de Steinfeld (2004), três processos termoquímicos solares para produção de
hidrogênio por meio de combustíveis fósseis como fonte química são considerados: craqueamento, reforma e
gaseificação.
O craqueamento solar consiste na decomposição térmica do gás natural (GN), petróleo e outros hidrocarbonetos,
e pode ser representado pela reação global simplificada:
O craqueamento produz uma fase condensada, rica em carbono, e uma fase gasosa rica em hidrogênio. O
produto carbonáceo sólido pode ser sequestrado sem a liberação de CO2, podendo ser usado como commodity
material, ou ainda ser aplicado como agente redutor em processos metalúrgicos. A mistura gasosa, rica em
hidrogênio, pode ser processada em hidrogênio de alta pureza e, dessa maneira, ser usada em células combustíveis.
Enquanto os métodos de reforma de vapor/gaseificação requerem etapas adicionais para o deslocamento do CO
e separação do CO2, o craqueamento realiza a remoção do carbono em uma única etapa. Por outro lado, o maior
inconveniente do método de decomposição térmica é a perda de energia associada ao sequestro do carbono. De
acordo com Steinfeld (2004), a energia penalizada para evitar completamente a liberação de CO2 chega a 30 % da
produção elétrica em comparação com o uso direto do gás natural para abastecer um ciclo de Brayton-Rankine com
eficiência de 55 %. Dessa forma, o craqueamento solar deve ser a opção preferida para gás natural e outros
hidrocarbonetos com altas proporções de H/C.
É importante frisar que algumas dessas rotas para a produção de hidrogênio já são atualmente praticadas em
escala industrial, porém sem a adoção da energia solar como fonte térmica para o processo. Em vez disso, porção
significativa da própria matéria-prima sofre processo de combustão para geração do calor necessário. Dois tipos de
configuração são possíveis nesse caso: a combustão pode ocorrer no interior ou no exterior do reator. A combustão
interna ao reator tem como desvantagem a contaminação dos produtos gasosos, enquanto a combustão externa
resulta em menor eficiência térmica devido às irreversibilidades associadas à transferência indireta de calor.
Como alternativa, o uso da energia solar como fonte de calor nesses processos oferece vantagem tripla: a
descarga de poluentes é evitada, os produtos gasosos não são contaminados e o poder colorífico do combustível é
incrementado pela adição da energia solar em quantidade igual à energia da reação.
Energia nuclear
Vários países possuem programas de energia nuclear que são utilizados exclusivamente para gerar energia elétrica,
mas é possível utilizá-la como fonte de calor para outras utilidades, como a produção de gás hidrogênio. Em horário
ou época em que a demanda de energia elétrica é baixa, ou seja, quando sobra energia, a produção e armazenamento
de hidrogênio para uso posterior em células de combustíveis é uma alternativa interessante (Naterer et al., 2013;
Orhan et al., 2009). Alguns métodos passíveis de serem implementados para a produção de hidrogênio por
decomposição química da água são: eletrólise e ciclos termoquímicos.
O processo de eletrólise já foi comentado com mais detalhes anteriormente, e pode ser usado com a energia
elétrica gerada em horas de baixo consumo, pela usina nuclear, para a produção de gás hidrogênio, mas seu
14.1.12
potencial está limitado à ineficiência da conversão da energia térmica em energia elétrica.
Os ciclos termoquímicos são uma alternativa para a eletrólise, pois não utilizam energia elétrica diretamente. A
limitação dos ciclos dessa aplicação é a temperatura, que não pode ultrapassar 850 °C (Abanades et al., 2006),
sendo necessário ciclos de várias etapas, geralmente de três a quatro etapas. Entre os ciclos que se destacam são o
Adiabatic UT-3, desenvolvido por Kaneyama e Yoshida da University of Tokyo; o ciclo Iodine-sulphur (I-S)
proposto pela General Atomics e o ciclo Copper-chlorine (Cu-Cl) em desenvolvimento pelas organizações Atomic
Energy of Canada Limited (AECL), Argonne National Laboratory (ANL) de Illinois, EUA, e o University of
Ontario Institute of Technology (UOIT). Esses ciclos são indicados na Tabela 14.2, com suas respectivas reações e
temperatura de operação.
Ciclos termoquímicos vêm se tornando uma opção promissora para a produção de hidrogênio em larga escala,
por meio de reatores nucleares, em particular com o desenvolvimento de novos reatores HTGR (helium gas cooled
reactor) de alta temperatura. Segundo Abanades (2006), a eficiência estimada do ciclo Adiabatic UT-3 pode variar
entre 35 % e 50 %, dependendo de vários fatores, como a membrana de separação de gases, ainda em
desenvolvimento.
Utilização do hidrogênio como fonte de energia
Nos últimos 20 anos houve grande mudança no mercado de hidrogênio. Até a década de 1980, o fornecimento de H2
pelas refinarias era suficiente para atender à demanda. Com o endurecimento das leis ambientais, no que diz respeito
às descargas automotivas (que exigiu menos aromáticos e compostos de enxofre na gasolina) e emissões de óxidos
de nitrogênio NOx, as refinarias passaram a exercer maior demanda pelo hidrogênio nos processos de
hidrodessulfurização e hidrodesnitrogenação, ao mesmo tempo em que a produção de hidrogênio diminuía em
função da queda na produção de aromáticos. Desse modo, as refinarias, que eram vistas como as maiores produtoras
de H2, tornaram-se as maiores consumidoras, o que gerou um deficit entre oferta e demanda no mercado mundial
(Souza, 2009).
Além do grande uso do hidrogênio em refinarias, essa substância é também matéria-prima essencial nas
indústrias químicas, sobretudo na síntese da amônia e do metanol; na fabricação do aço em siderurgias e na
hidrogenação de óleos e gordura na indústria de alimentos. Porém, o grande potencial da utilização do hidrogênio
como fonte de energia está atualmente atrelado à sua aplicação em células a combustível, tecnologia que tende a se
tornar chave no cenário energético mundial devido às vantagens de alta eficiência e confiabilidade, diversidade de
aplicações e isenção de emissões atmosféricas ou acústicas. Veja na Seção 3.9 o princípio de funcionamento da
célula a combustível.
Tabela 14.2 Ciclos termoquímicos para uso com energia nuclear (adaptado de Abanades, 2006, e Orhan et al. 2009)
Ciclos Reações
Temperatura
(ºC)
Adiabatic UT-3 CaBr2(s) + H2O(g) → CaO(s) + 2HBr(g)
CaO(s) + Br2(g) → CaBr2(s) + 0,5O2(g)
Fe3O4(s) + 8HBr(g) → 3FeBr2(s) + Br2(g) + 4H2O(g)
3FeBr2(s) + 4H2O → Fe3O4(s) + H2(g) + 6HBr(g)
700 – 750
500 – 600
200 – 373
560 – 600
I-S 2H2O + SO2 +I2 → H2SO4 + 2HI
H2SO4 → H2O + 1/2 O2 + SO2
2HI → H2 + I2
120
830 – 900
300 – 450
Cu-Cl 2CuCl2(s) + H2O(g) → Cu2OCl2(s) + 2HCl(g)
Cu2OCl2(s) → 2CuCl(l) + 1/2 O2(g)
4CuCl(s) + H2O → 2CuCl2(aq) + 2Cu(s)
400
500
Ambiente
2CuCl2(aq) → 2CuCl2(s)
2Cu(s) + 2HCl(g) → 2CuCl(l) + H2(g)
> 100
430 – 475
O gás hidrogênio também pode deslocar compostos de hidrocarbonetos no processo de combustão na indústria,
em residências e no comércio, graças ao apelo ambiental relativo ao potencial de emissão nula, pois o subproduto é
basicamente água. Em princípio, o hidrogênio pode também ser usado em todos os tipos de equipamentos que usam
gás natural, podendo, por conseguinte, ser misturado com o próprio gás natural que é distribuído por gasodutos. O
gás natural pode, portanto, ser enriquecido com o gás hidrogênio, reduzindo a dependência do carbono na economia.
De acordo com a Agência Internacional de Energia (IEA, 2005), enquanto pequenas adições podem ser facilmente
acomodadas do ponto de vista técnico, adições mais substanciais podem requerer modificações nos queimadores e
nos controles em diversostipos de equipamentos. Desse modo, o hidrogênio pode ainda ser usado para a geração de
vapor em caldeiras de gás natural, em unidades de geração combinada de energia elétrica e calor (cogeração), ou em
termelétricas.
Finalmente, motores de combustão interna, tanto estacionários como automotivos, também podem ser
alimentados com o gás hidrogênio ou mesmo com o syngas. Por outro lado, grandes indústrias automotivas têm
investido em projetos de veículos a células combustíveis, a grande maioria atualmente em fase de teste de
protótipos. No caso automotivo, há de se resolver ainda o problema do armazenamento desse gás para permitir uma
autonomia viável, já que o gás hidrogênio possui uma temperatura crítica muito baixa (–240 oC) estando, portanto,
sempre na fase gasosa nas condições ambientes. Alternativamente, o gás hidrogênio pode ser produzido no próprio
veículo por meio de um reformador portátil. Esses assuntos são objetos de intensa pesquisa.
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