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PEDRO SANTOS – MEDICINA 2021.2 CHIKUNGUNYA E ZIKA CHIKUNGUNYA As arboviroses são doenças causadas por vírus, sendo transmitidas por vetores artrópodes. A chikungunya e a zika são duas arboviroses que têm ganhado cada vez mais importância no cenário nacional, tanto por serem diagnóstico diferencial da dengue quanto por algumas características específicas dessas doenças: a chikungunya pela possibilidade de quadro articular crônico, e a zika pelos casos de microcefalia associados. CONCEITO É uma arbovirose causada pelo vírus chikungunya (CHIKV), da família Togaviridae e do gênero Alphavírus. Essa característica faz com que não haja reação cruzada com os testes diagnósticos de dengue e zika. EPIDEMIOLOGIA O nome Chikungunya vem de uma palavra em Makonde, língua falada por uma população que vive no sudeste da Tanzânia e no norte de Moçambique. Significa ‘’aqueles que se dobram’’, descrevendo a aparência encurvada de pessoas que sofrem com a artralgia. No Brasil, a transmissão autóctone foi confirmada no segundo semestre de 2014, primeiramente nos estados do Amapá e da Bahia. Atualmente, o único estado do país sem registro de casos autóctones é o Rio Grande do Sul. A doença é mais grave em pacientes com comorbidades e nos extremos de idade. QUADRO CLÍNICO Após o contagio com a picada do artrópode, o período e incubação dura, em média, de 3 a 7 dias. O período de viremia no ser humano pode durar até 10 dias, e começar até 2 dias antes do aparecimento de sintomas. A maioria dos indivíduos infectados desenvolve a doença. A doença pode evoluir em três fases: aguda, subaguda e crônica. Após o período de incubação, inicia-se a fase aguda ou febril, que dura até o décimo quarto dia. Fase Aguda ou Febril Caracterizada principalmente por febre de início súbito e surgimento de intensa poliartralgia, geralmente acompanhada de dores nas costas, rash cutâneo (macular ou maculopapular - acomete cerca de metade dos doentes e surge, normalmente, do segundo ao quinto dia após o início da febre. Atinge principalmente o tronco e as extremidades (incluindo palmas e plantas), podendo atingir a face) cefaleia e fadiga, com duração média de sete dias. PEDRO SANTOS – MEDICINA 2021.2 A febre pode ser contínua, intermitente ou bifásica, possui curta duração, porém a queda de temperatura não é associada à piora dos sintomas como na dengue. Ocasionalmente, pode ser associada a uma bradicardia relativa. O paciente também pode apresentar poliartralgia, caracterizada como dor normalmente poliarticular, bilateral e simétrica, mas pode haver assimetria. Acomete grandes e pequenas articulações e abrange com maior frequência as regiões mais distais. Pode haver edema, normalmente associado à tenossinovite. Outros sinais e sintomas descritos na fase aguda são, dor ligamentar, mialgia leve ou moderada, dor retro- ocular, calafrios, conjuntivite sem secreção, faringite, náusea, vômitos, diarreia, dor abdominal e neurite. As manifestações do trato gastrointestinal são mais presentes nas crianças. Pode haver linfoadenomegalias cervical, retroauricular, inguinais associadas. Fase subaguda Durante esta fase a febre normalmente desaparece, podendo haver persistência ou agravamento da artralgia, incluindo poliartrite distal, exacerbação da dor articular nas regiões previamente acometidas na primeira fase e tenossinovite hipertrófica subaguda em mãos, mais frequentemente nas falanges, punhos e tornozelos. Síndrome do túnel do carpo pode ocorrer como consequência da tenossinovite hipertrófica (sendo muito frequente nas fases subaguda e crônica). Podem estar presentes também astenia, prurido generalizado, exantema maculopapular, lesões purpúricas, vesiculares e bolhosas, doença vascular periférica, fadiga e sintomas depressivos. Esses sintomas possuem duração média de até três meses, caso persistam por mais de três meses, após o início da doença, estará instalada a fase crônica. Fase crônica Após a fase subaguda, alguns pacientes poderão ter persistência dos sintomas, principalmente dor articular e musculoesquelética e neuropática. A prevalência da fase crônica é muito variável entre os estudos, podendo atingir mais da metade dos pacientes. Os principais fatores de risco para a cronificação são: idade acima de 45 anos; significativamente maior no sexo feminino; desordem articular preexistente; maior intensidade das lesões articulares na fase aguda. O sintoma mais comum nesta fase crônica é a dor poliarticular persistente ou recidivante, com ou sem edema, limitação de movimento, deformidade e ausência de eritema. Normalmente, o acometimento é poliarticular e simétrico, mas pode ser assimétrico e monoarticular. Dores nas regiões sacroilíaca, lombossacra e cervical. Outras manifestações descritas durante a fase crônica são: fadiga, cefaleia, prurido, alopecia, exantema, bursite, tenossinovite, disestesias, parestesias, dor neuropática, fenômeno de Raynaud, alterações cerebelares, distúrbios do sono, alterações da memória, déficit de atenção, alterações do humor, turvação visual e depressão. Alguns trabalhos descrevem que esta fase pode durar até três anos, outros fazem menção a seis anos de duração. Manifestações Atípicas Caso o paciente com suspeita de chikungunya apresente alguma manifestação a seguir, será classificado como forma atípica da doença. Todo paciente que apresentar sinais clínicos e/ou laboratoriais em que há necessidade de internação em terapia intensiva ou risco de morte deve ser considerado como forma grave da doença. PEDRO SANTOS – MEDICINA 2021.2 MANEJO E SEGUIMENTO Na fase aguda de chikungunya, grande parte dos casos pode ser acompanhada ambulatoriamente. Não há necessidade de acompanhamento na maioria dos enfermos, devendo ser orientados a retornar no médico em caso de persistência da febre por mais de cinco dias e aparecimento de sinais de gravidade dos danos articulares. Pacientes de grupo de risco (gestantes, pacientes com comorbidades, idosos e menores de 2 anos de idade) também devem ser acompanhados das formas graves da doença. Sinais de gravidade podem surgir nas fases aguda e subaguda e devem ser pesquisados em todos os pacientes. Sinais de gravidade: Acometimento neurológico; Dor torácica, palpitações e arritmias (taquicardia, bradicardia ou outras arritmias) Dispneia Redução de diurese ou elevação abrupta de ureia e creatinina; Sinais de choque, instabilidade hemodinâmica; Vômitos persistentes; Sangramento de mucosas e descompensação de doença de base. Os pacientes que apresentam sinais de gravidade ou que apresentam critérios de internação (neonatos) devem ser acompanhados em unidades de leitos de internação. COMPLICAÇÕES A imensa maioria dos casos é benigna, mas alguns casos podem evoluir com complicações neurológicas, como mielorradiculopatias, episódios de miocardite e hepatite causadas pelo vírus. A principal complicação da doença é a complicação articular, com caráter deformador, semelhante à artrite reumatoide. Mães que adquirem chikungunya no período intra- parto podem transmitir o vírus a recém-nascidos por via transplacentária, transmissão perinatal. O vírus não é transmitido pelo aleitamento materno. DIAGNÓSTICO Do período de incubação até o fim da viremia, é possível fazer o diagnóstico laboratorial a partir de PCR-RNA e de cultura de vírus. Entre o 5º e 7º dias, já pode ser feito o diagnóstico sorológico. ELISA: é um teste imunoenzimático que permite a detecção de anticorpos específicos no plasma sanguíneo. No caso da chikungunya é pesquisado anticorpos IgM anti-CHIK. Deve ser feito após o quinto dia da doença. TRATAMENTO Não há tratamento antiviral disponível, então o tratamentoé apenas com sintomáticos, hidratação e suporte clínico. Segue em anexo as condutas para cada situação clínica: Fase Aguda PEDRO SANTOS – MEDICINA 2021.2 Fase Subaguda Fase Crônica ZIKA Conceito É uma arbovirose causada pelo Zika vírus, um vírus de RNA da família Flaviridae, mesma família do vírus da dengue e da Hepatite C. ASPECTOS HISTÓRICOS O primeiro isolamento do vírus da Zika ocorreu no ano de 1947, na floresta de Zika, localizado em Uganda. Logo mais, em 1954, foram identificados 3 casos de infecção em humanos durante uma epidemia na Nigéria. O vírus continuou disseminando para outras regiões, sendo descritos surtos em diferentes países da África, Ásia e em Ilhas do Pacífico. No Brasil, casos de doenças exantemática têm sido descritas desde final de 2014 e, no começo do ano de 2015, em pacientes da cidade de Natal, estado de Rio Grande do Norte, apresentaram sintomas compatíveis com a febre da dengue. Neste mesmo ano, foram identificados os primeiros casos do vírus Zika em amostras de soro de pacientes da cidade de Natal. TRANSMISSÃO A principal forma de transmissão é vetorial, pelos mosquitos do gênero Aedes, de forma idêntica a dengue e chikungunya. O que chama atenção no zika vírus é a transmissão congênita, responsável pelo aumento do número de casos de microcefalia no Brasil desde o aparecimento da doença no país. Foram registradas transmissões sexual e transfusional pelo zika vírus. QUADRO CLÍNICO O período de incubação em mosquitos é cerca de 10 dias, e no homem, de 3 a 6 dias. Os hospedeiros vertebrados do vírus incluem macacos e seres humanos. A febre costuma ser baixa, diferentemente da dengue e chikungunya, e na maioria dos casos é acompanhada de hiperemia conjuntival, além de exantema que pode ser ou não pruriginoso, e intenso. Com menos frequência há dor retro-orbital, anorexia, vômios, diarreia e dor abdominal, aftas. Astenia pós infecção é frequente. Os sintomas desaparecem em até 7 dias. A dor articuar pode estar presente até um mês antes do início da doença. A artralgia não é tão intensa como ocorre na chikungunya e não apresenta a cronicidade característcas de chikungunya. Em alguns pacientes pode ocorrer hematoespermia. PEDRO SANTOS – MEDICINA 2021.2 DIAGNÓSTICO O diagnóstico definitivo da Zika é dado por exames sorológicos. Como o Zika vírus é da mesma família do dengue vírus e da febre amarela, existe a possibilidade de cruzamento sorológico, podendo dificultar o diagnóstico em regiões em que essas doenças existem simultaneamente. Até 7 dias da infecção: PCR Após 7 dias: Sorologia IgM e IgG. COMPLICAÇÕES A infecção pela Zika, embora seja autolimitada e geralmente benigna, pode evoluir com algumas complicações. A Síndrome de Guillain-Barré é uma complicação neurológica que foi relacionada ao Zika Vírus, embora possa ser uma complicação de qualquer quadro infeccioso. Alguns pacientes podem evoluir com uma forma severa da doença, mas isso é exceção. Houveram descrição de casos confirmados de encefalomielite disseminada aguda (Adem), neurite óptica, encefalites, meningite com PCR positivo para vírus zika em LCR nessas situações. A outra complicação importante da infecção do zika vírus é a sua forma congênita, que evolui principalmente com microcefalia e abortamento. A possível associação entre o vírus Zika e os casos de microcefalia deu-se a partir do achado necroscópico de forte concentração de material viral no tecido nervoso de natimorfos acometidos pela microcefalia. Zika tem um neurotropismo maior que outras arboviroses. Além da microcefalia, os exames de imagem mostram algumas características em comum: microcalcificalções periventriculares e corticais, hipoplasia de vernix cerebelar e lisencefalia compatível com padrão de infecções congênitas. TRATAMENTO O tratamento para a infecção do Zika vírus é baseado no uso de acetaminofeno (Paracetamol) ou dipirona para o controle da febre e manejo da dor. No caso de erupções pruriginosas, os anti-histamínicos pode ser aconselhado. No entanto é desaconselhado o uso de ácido acetilsalicílico e outras drogas anti- inflamatórias devido ao risco aumentado de complicações hemorrágicas.
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