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Maria Seiane – Medicina IESVAP INTRODUÇÃO Glândula pituitária: alojada na sela túrcica ou fossa hipofisária do osso esfenoide na base do cérebro. Mede cerca de 1cm/1,5cm. Está localizada abaixo do hipotálamo e posteriormente ao quiasma óptico; Lobo anterior (adenohipófise) e lobo posterior (neurohipófise); Histologia: A adenohipófise é dividida em: o Pars intermédia: zona de transição entre a neuro e adeno; o Pars distalis: possui células cromófilas (acidófilas: prolactina e GH) (basófilas: FSH, LH, TSH, ACTH) e cromófobas (células imaturas); Fisiologia: DEFINIÇÃO O hipopituitarismo é definido como deficiência isolada ou múltipla de hormônios da adenohipófise, resultante de distúrbios hipofisário ou hipotalâmicos adquiridos ou, mais raramente, hereditários. O termo pan-hipopituitarismo é utilizado quando há redução de 2 ou mais hormônios ao mesmo tempo. ETIOLOGIA É um evento primário causado pela destruição da adenohipófise ou pela deficiência de fatores estimulantes hipotalâmicos que normalmente atuam sobre a hipófise. Causas: Genéticas: geralmente se manifestam na infância, podendo causar deficiências isoladas ou combinadas de hormônios hipofisários. Vários genes já foram identificados como responsáveis pelo desenvolvimento da hipófise; o Representam fatores de transcrição expressos no período embrionário e participam da formação da hipófise e de seus subtipos. o Mutações de vários tipos desses fatores de transcrição podem determinar um quadro clínico correspondente, podendo a mutação ser esporádica ou familiar, herdada de forma autossômica dominante, recessiva ou ligada ao cromossomo X. Maria Seiane – Medicina IESVAP o O hormônio mais acometido nas causas genéticas é o GH, causando baixa estatura. Mutação no gene PROP-1 é a causa mais comum de deficiência hormonal combinada familiar, determinando deficiências de GH, prolactina (PRL), hormônio tireoestimulante (TSH), hormônio luteinizante (LH)/hormônio folículo-estimulante (FSH) e raramente também hormônio adrenocorticotrófico (ACTH). É um gene específico da hipófise e não causa malformações em outros tecidos. O gene PIT-1 também é específico da hipófise e atua sequencialmente ao gene PROP-1, sendo responsável pela diferenciação da célula precursora dos somatotrofos (GH), lactotrofos (PRL) e tireotrofos (TSH). O gene TPIT também é específico da hipófise e é necessário para a diferenciação dos corticotrofos. Sua mutação pode causar insuficiência exclusiva do setor corticotrófico. o Outros genes codificam proteínas que atuam mais precocemente no desenvolvimento hipofisário, bem como de outras áreas do sistema nervoso central (SNC), causando comumente deficiências combinadas e outras malformações. São exemplos: HEXS1, pode causar pan- hipopituitarismo associado à displasia septo-óptica e neuro-hipófise ectópica, LHX3, pode causar hipopituitarismo associado à rigidez de coluna cervical, LHX4, pode causar hipopituitarismo associado à neuro-hipófise ectópica e malformações de Chiari, SOX3, que pode causar hipopituitarismo associado à neuro-hipófise ectópica, GLI2, SOX2, e outros. Tumores selares e parasselares: Os microadenomas (< 1 cm) geralmente são detectados devido a sua hipersecreção (ACTH, PRL, GH) e não causam insuficiência hipofisária diretamente. Já os macroadenomas hipofisários e outros tipos de tumores selares podem causar hipopituitarismo pelo efeito compressivo sobre o tecido hipofisário ao redor do tumor. o O craniofaringioma é o tumor mais comum da região hipotálamo-hipofisária em crianças, e frequentemente altera a função hipofisária em decorrência de seus efeitos compressivos. o Tumores malignos metastatizam, como carcinomas de pulmão e mama. Hipofisite: Existem diversos tipos de hipofisite já descritos, como linfocítica, granulomatosa, xantomatosa, hipofisite por imunoglobulina G4 (IgG4) e por anti-CTLA-4. o Deve-se suspeitar do quadro em paciente com hipopituitarismo isolado (deficiência de ACTH) ou combinado e história de outra doença endócrina autoimune (50% dos pacientes apresentam). Ele deve ser considerado também em mulheres com aumento do tamanho da hipófise e hipopituitarismo durante a gestação ou período pós-parto. o É mais provável em pacientes imunocomprometidos, como o vírus da imunodeficiência humana (HIV) e glicocorticóides em altas doses; Síndrome de Sheehan: é uma causa clássica e, na história clínica clássica há um evento hemorrágico intenso durante o período periparto, com alterações hemodinâmicas significantes e, muitas vezes, histórico de transfusão sanguínea. o Após dias a semanas pós-parto, tem-se ausência de lactação (agalactia pela falta de prolactina), amenorreia secundária e queixas vagas, como adinamia, astenia, letargia e anorexia, além de outros sintomas, devido às deficiências de GH/IGF- 1, TSH/T4 e ACTH/cortisol. o Embora muito raro, diabetes insípido também pode ocorrer com quadro de poliúria/polidipsia/noctúria, que pode ser mascarado pelas outras deficiências não corrigidas. Entretanto, o quadro clínico pode ser menos evidente e com queixas menos específicas. Nestes casos, o Maria Seiane – Medicina IESVAP diagnóstico pode ser muito tardio, até mesmo anos após o evento. Comumente, a ressonância magnética (RM) de sela mostra diminuição do parênquima hipofisário e sela vazia, mas esse achado não é obrigatório. Radioterapia - A deficiência de hormônio hipotalâmico frequentemente ocorre quando tumores cerebrais ou carcinomas nasofaríngeos são tratados por radiação em crianças ou adultos. o O dano é geralmente devido a lesão no nível do hipotálamo, o que resulta em deficiências secundárias ou desregulação dos hormônios da hipófise anterior. o O risco de disfunção hipofisária após a radiação craniana depende da dose e do tempo e pode não se tornar aparente até muitos anos após o tratamento. Lesões infiltrativas - como sarcoidose e histiocitose de células de Langerhans, podem causar deficiências dos hormônios da hipófise anterior e diabetes insípido. Lesão cerebral traumática - Trauma cranioencefálico de gravidade suficiente para fraturar a base do crânio pode causar deficiências do hormônio hipotalâmico, resultando em secreção deficiente de hormônios da hipófise anterior e vasopressina; Apoplexia pituitária - a hemorragia súbita na glândula pituitária é chamada de apoplexia pituitária. A hemorragia geralmente ocorre em um adenoma hipofisário. “Nove l’s”: Invasiva (efeito de massa); Infarto; Infiltrativa; Impacto (lesão traumática); Imunológica; Iatrogênica; Infecciosa; Idiopática; Isolada. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS A reserva funcional da hipófise é grande, por isso as manifestações são evidentes apenas quando ocorre o comprometimento de, pelo menos, 75% de seu parênquima; Mais frequentemente, o acometimento, quando a causa é adquirida, geralmente respeita a seguinte ordem: GH→ LH, FSH→ TSH→ ACTH→ PRL; Essa ordem não é respeitada em casos de hipofisite, quando o ACTH costuma ser o primeiro eixo a ser acometido. No caso de lesões tumorais ou com efeito de massa, pode haver sintomas compressivos associados, como alterações visuais e neurológicas. A sintomatologia mais específica dependerá muito da doença de base e dos eixos hormonais acometidos. Sintomas compressivos: perda visual (mais clássico é hemianopsia bitemporal), paralisias de nervos periféricos e cefaleia; Deficiência de GH (DGH): o No período neonatal, podem ocorrer hipoglicemias graves com convulsões, icterícia prolongada por hiperbilirrubinemia conjugada, hipotermia, micropênis, dificuldade para mamar, déficit de crescimento e de ganho de peso.o Em crianças com DGH ocorre redução da velocidade de crescimento (VC), alterações na dentição, fronte proeminente, voz fina e estridente. o Em adultos, ocorre quadro inespecífico, com diminuição da sensação de bem-estar, astenia, ganho de peso, aumento da massa gorda, redução da massa muscular, depressão/labilidade emocional, resistência à insulina, dislipidemia, aumento da pressão arterial diastólica (pela perda da vasodilatação arterial) e redução da fração de ejeção cardíaca; Hipogonadismo: o No período neonatal, pode cursar com criptorquidia e micropênis. o Em crianças, ocorre atraso no desenvolvimento puberal e na idade óssea. o Em mulheres, pode ocorrer amenorreia, redução da libido, infertilidade, redução da massa óssea/osteoporose e sintomas climatéricos. o Em homens, pode ocorrer disfunção erétil, hipotrofia testicular e redução da libido, queda de pelos corporais, infertilidade, redução da massa muscular e óssea e osteoporose; Maria Seiane – Medicina IESVAP Hipotireoidismo: pode cursar com redução da VC e de aprendizado em crianças, depressão, déficit cognitivo, intolerância ao frio, pele seca, bradicardia, rouquidão, ganho de peso, edema, sonolência, fase de relaxamento retardado dos reflexos tendinosos profundos e anemia e constipação intestinal; Insuficiência adrenal (IA): pode cursar com perda de peso, anorexia, fraqueza, náuseas, vômitos, dor abdominal e febre. Em situações de estresse, ocorre piora ou surgimento desses sintomas, além de hipotensão e choque (crise adrenal), devido à ausência de glicocorticoides necessários para a reatividade vascular. IA pode ainda aumentar o risco de hipoglicemia de jejum, que pode ser agravada pela deficiência de GH. Pode haver redução da pilificação corporal pela falta de estímulo do ACTH na secreção dos andrógenos adrenais, que pode ser agravado pela deficiência de gonadotrofinas. Despigmentação e redução do bronzeado pela redução do ACTH. Diferente da IA primária, a zona glomerular e o sistema renina angiotensina aldosterona estão íntegros nos casos de IA por hipopituitarismo, por isso não se observa desidratação, depleção de sódio ou hiperpotassemia; Prolactina: perda da lactação; Ocitocina: perda da lactação; ADH: diabetes insipidus central DIAGNÓSTICO A avaliação diagnóstica do paciente com suspeita de hipopituitarismo deve determinar: 1. A presença, o tipo e o grau de deficiência hormonal; 2. A etiologia; 3. A presença de alterações visuais; Um rastreamento inicial da função hipofisária pode ser realizado a partir das dosagens basais dos hormônios hipofisário e/ou das glândulas-alvo; Geralmente, para diagnóstico de deficiência de GH e ACTH, faz-se teste de estímulo, como o de tolerância à insulina; Investigação: Características clínicas; Exame físico: o Geralmente, os pacientes encontram-se um pouco acima do peso normal. o A pele é fina, pálida e lisa, com finas rugas em face. o A pilificação corporal e púbica pode ser deficiente ou ausente, e ocorrer hipotensão postural, bradicardia, redução da força muscular e reflexos tendíneos profundos retardados. o Na presença de lesão expansiva selar, pode-se encontrar anormalidades neuro- oftalmológicas. Exames complementares: o Laboratoriais: Anemia pela deficiência androgênica, de TSH ou doença crônica Hiponatremia pela deficiência de TSH e ACTH, retenção inapropriada de água Hipoglicemia pela deficiência de ACTH e GH Hipercolesterolemia com aumento de lipoproteína de baixa densidade- colesterol (LDL-c) e triglicerídios pelo hipotireoidismo Elevação de creatininofosfoquinase (CPK) devido ao hipotireoidismo. o No eletrocardiograma (ECG), pode-se encontrar bradicardia com baixa voltagem pelo hipotireoidismo. o Na densitometria óssea, pode-se encontrar baixa massa óssea para idade. o A TC de hipófise pode mostrar algum tumor; TRATAMENTO É a soma dos tratamentos de cada uma das deficiências hormonais hipofisárias individuais detectadas em um paciente com doença hipofisária ou hipotalâmica. Deficiência de ACTH: A principal consequência da falta de corticotropina (ACTH) é a deficiência de cortisol. O tratamento consiste na administração de hidrocortisona em quantidade e tempo que imitam o padrão normal de secreção de cortisol. TSH: resulta em deficiência de tiroxina (T4) e é tratada com T4; Deficiência de LH e FSH: no sexo masculino é feito com terapia de reposição hormonal com testosterona, indicada para induzir a puberdade e os caracteres sexuais secundários nos meninos e para melhorar https://www.uptodate.com/contents/hydrocortisone-drug-information?search=hipopituitarismo&topicRef=6640&source=see_link Maria Seiane – Medicina IESVAP função sexual, disposição, massa óssea, força e massa muscular na vida adulta. O tratamento do hipogonadismo no sexo feminino é feito com terapia de reposição hormonal estrógeno- progestogênica, com o objetivo de obter os caracteres sexuais secundários nas meninas, ciclicidade menstrual, manutenção da massa óssea, além dos benefícios do estrógeno na melhora da sintomatologia de climatério. GH: é aprovado no Brasil o tratamento com GH recombinante humano (rhGH); Hipoprolactinemia: não possui tratamento específico.