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É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. rodada 2 dire itos humanos, D ire ito penal, informática, e D ire ito admin istrativo É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. Siga nosso instagram @cursomege Informações e atendimento (99) 98262-2200 Curata nossa fanpage /cursomege Informações e atendimento atendimento@mege.com.br MegeTVmege.com.br Material: Direits humanos, Direito Penal, Informática e Direito administrativo. DELEGADO DE POLÍCIA pcpr2020 RODADA 2 É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. OLÁ, AMIGO(A) DELEGADO(A), a caminhada para o desafi o aos que vencerão no Paraná continua. Essa é a rodada 02, onde selecionamos quatro disciplinas importantíssimas: Direitos Humanos, Direito Penal, Informática e Direito Administrativo. Seguimos orientando no sentido de que a leitura completa da rodada é o mínimo (além da lei seca) que você deve realizar semanalmente. Acompanhe a evolução do curso no mural de recados e fi que ligado na nossa seção de materiais. Além disso, é muito importante para nossa equipe que não deixe de avaliar os materiais e as videoaaulas, esse feedback é essencial para nosso trabalho. Não deixe de verifi car o material de súmulas por assunto que fi zemos especifi cadamente para esse concurso. Faça a sua parte e estude com dedicação! O melhor resultado vem logo mais. “Quando não se pode fazer tudo o que se deve, deve-se fazer tudo o que se pode.” (Terêncio) Atenciosamente, Equipe Mege. OBSERVAÇÕES INICIAIS É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 04 mege.com.br SUMÁRIO PARTE I - DIREITOS HUMANOS ........................................................................................5 PARTE II - DIREITO PENAL ..............................................................................................74 PARTE III - INFORMÁTICA .............................................................................................131 PARTE IV - DIREITO ADMINISTRATIVO ........................................................................147 É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 05 mege.com.br PARTE I - DIREITOS HUMANOS CONTEÚDO PROGRAMÁTICO DO EDITAL DPCPR – DIREITOS HUMANOS 1. Constituição Federal Brasileira (1988). 2. Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU - 1948). 3. Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanas ou Degradantes (1984). 4. Teoria Geral dos Direitos Humanos: conceito, terminologia, estrutura normati- va, fundamentação. 5. Afirmação histórica dos direitos humanos. 6. Garantias processuais dos Direitos Humanos, Interpretação e Aplicação dos Tratados Internacionais de Proteção aos Direitos Humanos. 7. A Natureza Jurídica da incorporação de normas internacionais sobre Direitos Humanos ao direito interno brasileiro. É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 06 mege.com.br 1.1 DOUTRINA INTRODUÇÃO Nesta primeira rodada serão analisados os seguintes tópicos do Edital DPCPR/2020. Os outros tópicos serão analisados em outra oportunidade. 1. Constituição Federal Brasileira (1988). ( ...) 7. A Natureza Jurídica da incorporação de normas internacionais sobre Direitos Humanos ao direito interno brasileiro. O foco desta rodada é a proteção interna e constitucional dos direitos humanos. Vamos abordar especialmente, com objetivo de detalhar o tópico do edital, os seguintes assuntos: a incorporação dos tratados internacionais de proteção de direitos humanos ao direito brasileiro; a posição hierárquica dos tratados internacionais de Direitos Humanos em face do artigo 5º, e seus parágrafos, da Constituição Federal brasileira; o controle de convencionalidade; os mecanismos de proteção aos direitos humanos na Constituição Federal brasileira de 1988 e a federalização de crimes graves contra os Direitos Humanos. A obra central desta rodada é: RAMOS, André de Carvalho. Curso de direitos humanos. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2018. Outros livros e autores foram citados para complementar o material. Outras questões de concursos diversos de Delegado foram inseridas para ajudar na memorização e também por serem igualmente passíveis de cobrança em prova de carreira policial. Esta rodada (e as seguintes) levou em consideração todas as questões pertinentes das últimas provas de Delegado do ano de 2018 e 2019 (DPCES; DPCRS; DPCMG; DPCGO, DPCSP). Vale registrar que a última prova para Delegado do Estado do Paraná não constou a disciplina Direitos Humanos de forma autônoma e com questões específicas como ocorre atualmente com o edital de 2020. Este material encontra-se atualizado até 16/04/2020. Para dicas na rede social, siga-me no Instagram: @odefensorpublico. Bons estudos! E não deixe de fazer a leitura da lei seca. É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 07 mege.com.br • Direitos humanos na Constituição Federal de 1988. o A Constituição de 1988 representa um marco histórico na consagração dos Direitos Humanos em território brasileiro. Assim, a redemocratização do país permitiu a edição de uma Carta mais afinada ao Direito Internacional, especialmente no tocante aos direitos humanos, na medida em que nela consta um rol de direitos fundamentais mais extenso e pormenorizado que nos documentos anteriores, havendo ainda mais dispositivos acerca das relações internacionais brasileiras. o Destaca a autora ainda que os textos constitucionais abertos a princípios, dotados de elevada carga axiológica e com destaque para o valor da dignidade da pessoa humana – como é o caso da CF/88, que possui alta densidade axiológica e atribui à dignidade da pessoa humana o status de Fundamento da República – devem ser compreendidos sob o prisma da reconstrução dos direitos humanos do pós-guerra. o Assim, em consonância ao espírito humanista do direito internacional pós guerra, a Constituição de 1988, além de consagrar a dignidade da pessoa humana enquanto valor fundamental, tornou explícito em seu texto a existência de direitos sociais, coletivos e difusos, além dos direitos individuais, acolhendo a tese da indivisibilidade e interdependência dos direitos humanos, segundo a qual o “valor da liberdade se conjuga com o valor da igualdade, não havendo como divorciar os direitos de liberdade dos direitos de igualdade” (Piovesan, fl. 60). o Dessa forma, a expansão dos direitos humanos, enquanto fenômeno global, pode ser vista como uma reação às atrocidades cometidas na Segunda Guerra Mundial, em especial aos praticados pelas autoridades nazistas, que revelaram descaso aos direitos fundamentais e as normas internacionais sobre sua proteção. O período seguinte aos combates é, então, delineado pela expansão dos direitos humanos em âmbito internacional, fundamentados pelo valor da dignidade da pessoa humana e protegidos através da criação de sistemas e organismos internacionais (Sistemas Globais e Regionais). o A dignidade da pessoa humana é prevista no artigo inaugural da constituição como fundamento da República Federativa do Brasil. o Sobre a importância da Constituição de 1988 aos direitos humanos no Brasil, Flávia Piovesan escreve que: “A Carta de 1988 institucionaliza a instauração de um regime político democrático no Brasil. Introduz também indiscutível avanço na É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 08 mege.com.br consolidaçãolegislativa das garantias e direitos fundamentais e na proteção de setores vulneráveis da sociedade brasileira. A partir dela, os direitos humanos ganham relevo extraordinário, situando-se a Carta de 1988 como o documento mais abrangente e pormenorizado sobre os direitos humanos jamais adotado no Brasil”1. o Flávia Piovesan destaca a forma como eram concebidos os direitos humanos no histórico normativo-constitucional brasileiro a partir de uma análise comparativa entre a CR/88 e as constituições anteriores “Note-se que as Constituições anteriores primeiramente tratavam do Estado, para, somente então, disciplinarem os direitos. Ademais, eram petrificados temas afetos ao Estado e não a direitos, destacando-se, por exemplo, a Constituição de 1967, ao consagrar como cláusulas pétreas a Federação e a República. A nova topografia constitucional inaugurada pela Carta de 1988 reflete a mudança paradigmática da lente ex parte principe para a lente ex parte populi. Isto é, de um Direito inspirado pela ótica do Estado, radicado nos deveres dos súditos, transita-se a um Direito inspirado pela ótica da cidadania, radicado nos direitos dos cidadãos. A Constituição de 1988 assume como ponto de partida a gramática dos direitos, que condiciona o constitucionalismo por ela invocado. Assim, é sob a perspectiva dos direitos que se afirma o Estado e não sob a perspectiva do Estado que se afirmam os direitos. Há, assim, um Direito brasileiro pré e pós-88 no campo dos direitos humanos. O Texto Constitucional propicia a reinvenção do marco jurídico dos direitos humanos, fomentando”2. 1 PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 14. ed., rev. e atual. – São Paulo : Saraiva, 2013. p. 84. 2 PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 14. ed., rev. e atual. – São Paulo : Saraiva, 2013. p. 90. É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 09 mege.com.br o Como se estrutura a os direitos fundamentais na CR/88? CAPÍTULO I DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS Art. 5º CAPÍTULO II DOS DIREITOS SOCIAIS (Art. 6º ao 11) CAPÍTULO III DA NACIONALIDADE ( Art. 12 e 13) CAPÍTULO IV DOS DIREITOS POLÍTICOS ( Art. 14 ao 16) CAPÍTULO V DOS PARTIDOS POLÍTICOS ( Art. 17) o Crítica: Apesar desta divisão, não se deve esquecer que há outros direitos fundamentais que estão fora dos artigos constitucionais acima indicados, como acontece, por exemplo, com: Direito à educação (art. 195) Direito à assistência social (art. 201) Direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (art. 225). o Pode-se afirmar que a CR/88 observou a divisão clássica dos direitos: Direito Civis e Políticos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais Direitos de Solidariedade o Direito Civis e Políticos: Exemplos: igualdade, direito à vida, legalidade, liberdade de manifestação de pensamento e de expressão, liberdade de crença, direito à vida privada, liberdade de locomoção no território nacional, direito de reunião pacífica, liberdade de profissão, liberdade de associação, direito de propriedade, entre outros. É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 10 mege.com.br o Direitos Econômicos, Sociais e Culturais: Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. o Direitos de Solidariedade: A CR/88 menciona o a autodeterminação dos povos (Art. 4º, II), a defesa da paz (Art. 4º, VI) e também o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (art. 225). O reconhecimento pelo STF do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito de terceira geração (ou de novíssima dimensão) não deve ser esquecido. Vide: (ADI 3540 MC, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 01/09/2005, DJ 03-02-2006 PP-00014 EMENT VOL- 02219-03 PP-00528) o Abertura para novos direitos: Art. 5º (...) § 2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. o Nacionalidade: consiste no vínculo jurídico-político entre determinada pessoa, denominada nacional, e um Estado, pelo qual são estabelecidos direitos e deveres recíprocos. Além da CR/88, deve-se observas as normas internacionais. A Declaração Universal de Direitos Humanos (1948), que prevê que todos têm direito a uma nacionalidade e ninguém será arbitrariamente privado de sua nacionalidade, nem do direito de mudar de nacionalidade (art. XV). A Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto San José da Costa Rica) dispõe que toda pessoa tem direito a uma nacionalidade e a ninguém se deve privar arbitrariamente de sua nacionalidade, nem do direito de mudá-la (art. 20). o Dos direitos políticos. Para José Luiz Quadros de Magalhães: “Os direitos políticos são o quarto e o último grupo de direitos que compõem os Direitos Humanos. São direitos à participação popular no Poder do Estado, que resguardam a vontade manifestada individualmente pelo eleitor, sendo que a a diferença essencial em relação aos direitos É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 11 mege.com.br individuais é que nestes não se exige nenhum tipo de qualificação em razão da idade e nacionalidade para o seu exercício, enquanto para os direitos políticos determina a Constituição requisitos que o indivíduo deve preencher. Estes direitos, no texto brasileiro, são os direitos de votar e ser votado, do referendo, do plebiscito e da iniciativa popular das leis”3. o Direitos econômicos: Para José Luiz Quadros de Magalhães: “Os direitos econômicos são aqueles contidos em normas de conteúdo econômico que viabilizarão uma política econômica. Classificamos entre os Direitos Econômicos, pelas suas características marcantes, o direito ao pleno emprego, o direito ao transporte integrado à produção, o direito ambiental e os direitos do consumidor. Os direitos econômicos contêm normas que estão protegendo interesses individuais, coletivos e difusos, (...)”4. • Remédios constitucionais: compreendem garantias instrumentais que visam proteger o indivíduo do desrespeito a algum direito considerado fundamental, cabendo ao Poder Judiciário seu processamento e julgamento. Entre elas estão: Habeas Corpus, Habeas Data, Mandado de Segurança, Direito de Petição, Mandado de Injunção, Ação Popular e Ação Civil Pública. o A CR/88 reproduz garantias tradicionais (habeas corpus já previsto Constituição de 1891; o mandado de segurança e a ação popular já previstos pela Constituição de 1934) e inova com a previsão de garantias no texto constitucional: o mandado de injunção, o habeas data e o mandado de segurança coletivo. A ação civil pública, com previsão na lei n. 7.347/85, teve seu objeto alargado pela CR/88, assim como ocorreu em relação à ação popular. o Flávia Piovesan constata que “o texto de 1988 conjuga garantias típicas do modelo liberal, voltadas à proteção das liberdades (como o habeas corpus e o mandado de segurança), com garantias típicas do modelo social, voltadas à proteção da igualdade material e justiça social (como o mandado de injunção e a ação civil pública)”5. 3 http://joseluizquadrosdemagalhaes.blogspot.com.br/2011/04/direitos-humanos-1.html 4 http://joseluizquadrosdemagalhaes.blogspot.com.br/2011/04/direitos-humanos-1.html 5 http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/revistaspge/revista5/5rev4.htm É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cívele penal. 12 mege.com.br • Federalização de Crimes envolvendo os Direitos Humanos. Tratados Internacionais de Direitos Humanos e as Obrigações assumidas pelo Brasil: o Também conhecida como Incidente de Deslocamento de Competência (IDC), a federalização de crimes envolvendo os direitos humanos passou a ser prevista com a Emenda Constitucional n. 45/2004, possibilitando o deslocamento de processos sob a competência da Justiça comum para a Justiça Federal, quando se verificar a grave violação de direitos humanos. o Previsão na Constituição: Art. 109 Aos juízes federais compete processar e julgar: V-A as causas relativas a direitos humanos a que se refere o § 5º deste artigo; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) (...) § 5º Nas hipóteses de grave violação de direitos humanos, o Procurador- Geral da República, com a finalidade de assegurar o cumprimento de obrigações decorrentes de tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte, poderá suscitar, perante o Superior Tribunal de Justiça, em qualquer fase do inquérito ou processo, incidente de deslocamento de competência para a Justiça Federal. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) o Da leitura da previsão constitucional do IDC, deve-se atentar para as seguintes informações: Quem pode suscitar? Procurador-Geral da República6. O que se suscita? O deslocamento da competência, de inquérito ou processo, independentemente da fase em que se encontram, da Justiça comum para Justiça Federal Quando? Nas hipóteses de grave violação de direitos humanos e com a finalidade de assegurar o cumprimento de obrigações decorrentes de tratados de direitos humanos nos quais Brasil seja parte. Onde se processa e quem decide? STJ. Pressupostos para procedência do IDC na jurisprudência do STJ: I) a existência de grave violação a direitos humanos; II) o risco de responsabilização internacional decorrente do descumprimento de obrigações jurídicas assumidas em tratados internacionais; e III) a incapacidade das instâncias e autoridades locais em oferecer respostas efetivas. 6 O STJ inclusive já julgou extinto incidente de deslocamento de competência (nº 4 – PE – 2013/0278698-1), em razão de não ter sido suscitado pelo PGR. É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 13 mege.com.br o Para Flávia Piovesan, “A federalização poderá ainda reforçar a responsabilidade em relação aos direitos humanos nos diversos entes federativos, particularmente nos Estados, sob o risco do incidente de deslocamento de competências. Além disso, resultará ampliada a responsabilidade da União em matéria de direitos humanos no âmbito interno, em consonância com sua crescente responsabilidade internacional, na medida em que é a União que tem a responsabilidade internacional na hipótese de violação de obrigação internacional em matéria de direitos humanos ¿ que se comprometeu juridicamente a cumprir”7. o Casos exemplificativos de deslocamento de competência: No caso Dorothy Stang (IDC 1), o STJ indeferiu o pedido em razão de as autoridades estaduais se encontrarem empenhadas na apuração de tais fatos, visando punir os eventuais responsáveis No caso Manoel Mattos (IDC 2), o STJ deferiu, sendo o primeiro deferimento da história, o pedido de deslocamento em razão da incapacidade das instâncias e autoridades locais em oferecer respostas efetivas, reconhecida a limitação e precariedade dos meios por elas próprias. No caso Thiago de Faria Soares (IDC 5), o STJ deferiu o pedido deferiu o pedido de transferência do inquérito da Policia Civil para a Polícia Federal, alcançando também inquéritos. • Incorporação de Normas Internacionais Gerais e de Direitos Humanos ao Direito Interno Brasileiro: o A incorporação das normas internacional aos Direito interno de um país não é apenas um procedimento externo, internacional. É necessário que haja o trâmite interno. o O Executivo sempre exerceu ao longo da história dos Estados papel central nesse processo, sendo atualmente, porém, afastada sua atuação exclusiva, democratizando-se com a conjugação de vontade do legislativo. Neste sentido, Valério de Oliveira Mazzuoli escreve que: 7 http://www.cartamaior.com.br/colunaImprimir.cfm?cm_conteudo_idioma_id=21928 É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 14 mege.com.br “Historicamente, dentro da doutrina absolutista, o Poder Executivo (então chamado de Soberano) sempre foi considerado o órgão supremo das relações internacionais. O Monarca, que encarnava em si a figura do Estado, possuía o chamado jus representationis omnimodae, ou seja, a personificação do poder estatal absoluto”8. o A Constituição de 1988 e a celebração dos tratados internacionais. Previsão do texto constitucional: Art. 84 Compete privativamente ao Presidente da República: (...) VIII celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional; Art. 49 É da competência exclusiva do Congresso Nacional: I - resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional; o Nota-se, da previsão acima, que a participação do Poder Legislativo, numa espécie de competência ad referendum, também é contemplada. Mazzuoli escreve que “Enquanto cabe ao Executivo presidir a política externa, ao Legislativo cumpre exercer o controle dos atos executivos, uma vez que àquele incumbe a defesa da nação no cenário internacional”9. o Síntese das Etapas internas para incorporação dos tratados internacionais em geral: 8 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Público. Mazzuoli. -- 9. ed. rev., atual. e ampl. -- São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2015. p. 368. 9 https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/677/r150-03.pdf?sequence=4 ETAPAS Primeira etapa: Negociações iniciais ou preliminares Segunda etapa: Assinatura pelo Executivo Terceira etapa: Aprovação do Congresso Nacional (Art. 49, I) por meio de Decreto Legislativo. Quarta etapa: Promulgação por meio de Decreto do Presidente da República, publicado no Diário Oficial da União É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 15 mege.com.br o Sobre os efeitos da aprovação pelo Legislativo, Mazzuoli destaca que “O Congresso Nacional não ratifica tratado; na verdade, por meio de decreto legislativo, o nosso parlamento federal autoriza a ratificação, que é ato próprio do Poder Executivo, a quem compete, nos termos da Constituição brasileira, celebrar tratados, convenções e atos internacionais. O Congresso apenas aprova ou não o texto convencional, de forma que a aprovação dada pelo Poder Legislativo, em relação ao tratado, não tem o condão de torná-lo obrigatório, pois o Presidente da República, após isso, pode ou não, segundo o que for mais conveniente aos interesses da Nação, ratificá-lo. Depois de ratificado o tratado pelo Presidente da República, ainda é necessário seja o mesmo promulgado por Decreto presidencial e publicado. Depois de publicado, o tratado tem intrinsecamente força normativa e revoga as disposições ordinárias em contrário. Vige, de resto, o princípio da publicidade”. o Os tratados internacionais de direitos humanos podem seguir o rito acima indicado, com maioria simples ou com o rito das emendas constitucionais, quando terá status equivalente, como a seguir se explicará. ETAPAS Primeira etapa: Negociações iniciais ou preliminares Segunda etapa: Assinatura pelo Executivo Terceira etapa: Aprovação do Congresso Nacional (Art. 49, I) por meio de Decreto Legislativo. Quarta etapa: Promulgação por meio de Decreto do Presidente da República, publicado no Diário Oficial da UniãoÉ proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 16 mege.com.br o Atos aprovados pelo rito do § 3º do art. 5º da Constituição: ATOS EMENTA Decreto Legislativo nº 261, de 25.11.2015 Publicado no DOU de 26.11.2015 Aprova o texto do Tratado de Marraqueche para Facilitar o Acesso a Obras Publicadas às Pessoas Cegas, com Deficiência Visual ou com outras Di- ficuldades para Ter Acesso ao Texto Impresso, concluído no âmbito da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI), celebrado em Marraqueche, em 28 de junho de 2013. Decreto nº 9.522, de 8.10.2018 Publicado no DOU de 9.10.2018 Promulga o Tratado de Marraqueche para Fa- cilitar o Acesso a Obras Publicadas às Pessoas Cegas, com Deficiência Visual ou com Outras Di- ficuldades para Ter Acesso ao Texto Impresso, firmado em Marraqueche, em 27 de junho de 2013. Decreto Legislativo nº 186, de 9.7.2008 Publicado no DOU de 10.7.2008 Aprova o texto da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova Iorque, em 30 de março de 2007. Decreto nº 6.949, de 25.8.2009 Publicado no DOU de 25.8.2009 Promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Pro- tocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007. É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 17 mege.com.br Não confundir a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Defi ciência com a a Convenção Interamericana (status equivalente ao de emenda constitucional)para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Defi ciência (supralegal). • Posição Hierárquica das Normas Internacionais em Geral e dos Tratados de Direitos Humanos no Ordenamento Jurídico Interno Posições Doutrinárias. Jurisprudência do STF: o “Com efeito, não é razoável dar aos tratados de proteção de direitos do ser humano (a começar pelo direito fundamental à vida) o mesmo tratamento dispensado, por exemplo, a um acordo comercial de exportação de laranjas ou sapatos, ou a um acordo de isenção de vistos para turistas estrangeiros. À hierarquia de valores, deve corresponder uma hierarquia de normas, nos planos tanto nacional quanto internacional, a serem interpretadas e aplicadas mediante critérios apropriados”10. 10 CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. Memorial em prol de uma nova mentalidade quanto à proteção dos direitos humanos nos planos internacional e nacional, In, Os Direitos Hu- manos e o Direito Internacional, org. Carlos Eduardo de Abreu Boucalt e Nadia de Araújo, Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 53. Tr at ad os q ue o bs er va ra m o § 3 º do a rt . 5 º da C on st itu iç ão : Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência Protocolo Facultativa à Convenção acima indicada Tratado de Marraqueche para Facilitar o Acesso a Obras Publicadas às Pessoas Cegas, com Deficiência Visual ou com Outras Dificuldades para Ter Acesso ao Texto Impresso É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 18 mege.com.br o Para análise da posição hierárquica das normas internacionais no ordenamento jurídico brasileiro faz-se necessário o estudo da redação original da Constituição e a inovação trazida com a Emenda Constitucional n.45/2004. o Até 2004, a previsão inicial constitucional destacava que os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte (Art. 5º, § 2º). o A redação do parágrafo terceiro foi introduzida em 2004, com a EC n. 45, passando a prever que: Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. (Art. 5º, § 3º) o Antes de 2004, vários autores destacavam o parágrafo segundo para afirmar o status constitucional (normas materialmente constitucionais) dos direitos humanos previstos em tratados internacionais, como cláusula aberta a admitir a entrada tratados internacionais de proteção dos direitos humanos em grau hierárquico idêntico aos das normas constitucionais. Neste sentido, Valério de Oliveira Mazzuoli: “Com base nesse dispositivo, que segue a tendência do constitucionalismo contemporâneo, sempre defendemos que os tratados internacionais de direitos humano ratificados pelo Brasil têm índole e nível constitucionais, além de aplicação imediata, não podendo ser revogados por lei ordinária posterior. E a nossa interpretação sempre foi a seguinte: se a Constituição estabelece que os direitos e garantias nela elencados ‘não excluem’ outros provenientes dos tratados internacionais ‘em que a República Federativa do Brasil seja parte’, é porque ela própria está a autorizar que esses direitos e garantias internacionais constantes dos tratados de direitos humanos ratificados pelo Brasil ‘se incluem’ no nosso ordenamento jurídico interno, passando a ser considerados como se escritos na Constituição estivessem. É dizer, se os direitos e garantias expressos no texto constitucional ‘não excluem’ outros provenientes dos tratados internacionais em que o Brasil seja parte, é porque, pela lógica, na medida em que tais instrumentos passam a assegurar outros direitos e garantias, a Constituição ‘os É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 19 mege.com.br inclui’ no seu catálogo de direitos protegidos, ampliando o seu ‘bloco de constitucionalidade’”. o Após 2004, com a Emenda Constitucional n. 45/2004 e, consequentemente, com a inserção § 3º ao art. 5º, pode-se descortinar as seguintes correntes sobre o status dos tratados internacionais sobre direitos humanos aprovados anteriormente (ou posteriormente) pelo rito de aprovação de uma lei ordinária, ou seja, maioria simples: Reconhece a natureza supraconstitucional dos tratados e convenções sobre direitos humanos Reconhece o caráter constitucional dos tratados e convenções sobre direitos humanos Reconhece o status de legislação ordinária dos tratados e convenções sobre direitos humanos Reconhece o status de supralegalidade dos tratados e convenções sobre direitos humanos – POSICIONAMENTO DO STF. o Flávia Piovesan, no entanto, diverge da decisão do STF, dividindo os tratados de direitos humanos em duas categorias: “Vale dizer, com o advento do § 3º do art. 5º surgem duas categorias de tratados internacionais de proteção de direitos humanos: a) os materialmente constitucionais; e b) os material e formalmente constitucionais. Frise-se: todos os tratados internacionais de direitos humanos são materialmente constitucionais, por força do § 2º do art. 5º. Para além de serem materialmente constitucionais, poderão, a partir do § 3º do mesmo dispositivo, acrescer a qualidade de formalmente constitucionais, equiparando-se às emendas à Constituição, no âmbito formal”11 ( grifos nosso). o O STF já reconheceu a supralegalidade da Convenção Americana de Direitos Humanos (ou Pacto São José da Costa Rica). Desde a adesão do Brasil, sem qualquer reserva, ao Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (art. 11) e à Convenção Americana sobre Direitos Humanos - Pacto de San José da Costa Rica (art. 7º, 7), ambos no ano de 1992, não há mais base legal para prisão civil do depositário infiel, pois o caráter especial desses 11 PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 14. ed., rev. e atual. – São Paulo : Saraiva, 2013. p. 138/139. É proibida a reproduçãodeste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 20 mege.com.br diplomas internacionais sobre direitos humanos lhes reserva lugar específico no ordenamento jurídico, estando abaixo da Constituição, porém acima da legislação interna. O status normativo supralegal dos tratados internacionais de direitos humanos subscritos pelo Brasil torna inaplicável a legislação infraconstitucional com ele conflitante, seja ela anterior ou posterior ao ato de adesão. Assim ocorreu com o art. 1.287 do Código Civil de 1916 e com o Decreto- Lei n° 911/69, assim como em relação ao art. 652 do Novo Código Civil (Lei n° 10.406/2002) (RE 349703, Relator(a): Min. CARLOS BRITTO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 03/12/2008, DJe-104 DIVULG 04-06-2009 PUBLIC 05-06-2009 EMENT VOL-02363-04 PP-00675) • Controle de reservas. Denúncia dos tratados de Direitos Humanos. o Conceito de reserva: O art. 2º, § 1º, alínea d, da Convenção de Viena de 1969, conceitua reserva como: “uma declaração unilateral, qualquer que seja a sua redação ou denominação, feita por um Estado ao assinar, ratificar, aceitar ou aprovar um tratado, ou a ele aderir, com o objetivo de excluir ou modificar o efeito jurídico de certas disposições do tratado em sua aplicação a esse Estado”. A reserva é mecanismo que permite o ingresso de Estados que possuem uma divergência pequena ou mínima em relação ao tratado. o Situações que não se permite a reserva, segundo a Convenção de Viena: Artigo 19 Um Estado pode, ao assinar, ratificar, aceitar ou aprovar um tratado, ou a ele aderir, formular uma reserva, a não ser que: a) a reserva seja proibida pelo tratado; b) o tratado disponha que só possam ser formuladas determinadas reservas, entre as quais não figure a reserva em questão; ou c) nos casos não previstos nas alíneas a e b, a reserva seja incompatível com o objeto e a finalidade do tratado. Exemplo: O Estatuto de Roma, por exemplo, veda reservas, nos termos do art. 120 (Não são admitidas reservas a este Estatuto). o Denúncia dos tratados: Ato unilateral de uma das partes onde se desobriga de cumprir o tratado assumido internacionalmente. Em um tratado bilateral, a consequência lógica da denúncia é a extinção do tratado. Por outro lado, em se tratando de tratado multilateral, os efeitos do tratado ficam restritos àqueles que não denunciaram. V. art. 56 da Convenção de Viena. É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 21 mege.com.br o É possível a denúncia em tratados de direitos humanos? André de Carvalho Ramos: SIM, mas com ressalvas quanto ao procedimento e também garantidos a inexistência de retrocessos. “Assim, não se nega a possibilidade de denúncia, até porque existente nesses tratados, mas se impõe uma aprovação congressual qualificada e ainda respeito à proteção geral de direitos humanos. Já os tratados aprovados pelo rito simples passariam pelo mesmo duplo crivo, mas o quórum de aprovação congressual da denúncia seria o da maioria simples e também seria indispensável a análise da vedação do retrocesso”12. o Flávia Piovesan: Permite a denúncia para tratados materialmente constitucionais, mas inadmite para tratados materialmente e formalmente constitucionais. “Ainda que todos os tratados de direitos humanos sejam recepcionados em grau constitucional, por veicularem matéria e conteúdo essencialmente constitucional, importa realçar a diversidade de regimes jurídicos que se aplica aos tratados apenas materialmente constitucionais e aos tratados que, além de materialmente constitucionais, também são formalmente constitucionais. E a diversidade de regimes jurídicos atém-se à denúncia, que é o ato unilateral pelo qual um Estado se retira de um tratado. Enquanto os tratados materialmente constitucionais podem ser suscetíveis de denúncia, os tratados material e formalmente constitucionais, por sua vez, não podem ser denunciados”. “Ao se admitir a natureza constitucional de todos os tratados de direitos humanos, há que ressaltar que os direitos constantes nos tratados internacionais, como os demais direitos e garantias individuais consagrados pela Constituição, constituem cláusula pétrea e não podem ser abolidos por meio de emenda à Constituição, nos termos do art. 60, § 4º”. “Atente-se que as cláusulas pétreas resguardam o núcleo material da Constituição, que compõe os valores fundamentais da ordem constitucional. Nesse sentido, os valores da separação dos Poderes e da federação — valores que asseguram a descentralização orgânica e espacial do poder político —, o valor do voto direto, universal e periódico e dos direitos e garantias individuais — valores 12 RAMOS, André de Carvalho. Teoria geral dos direitos humanos na ordem internacional. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p.200. É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 22 mege.com.br que asseguram o princípio democrático —, compõem a tônica do constitucionalismo inaugurado com a transição democrática. Os direitos enunciados em tratados internacionais em que o Brasil seja parte ficam resguardados pela cláusula pétrea “direitos e garantias individuais”, prevista no art. 60, § 4º, IV, da Carta”13. • O Executivo pode denunciar tratados sem a participação do Congresso Nacional? Há no STF a ADI n. 1625 em que Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura (Contag) questionou o Decreto 2.100/1996. Por meio deste decreto, o presidente da República deu publicidade a denúncia à Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que trata do término da relação de trabalho por iniciativa do empregador e veda a dispensa injustificada. O julgamento encontra-se atualmente suspenso, em razão de pedido de vista. Valério de Oliveira Mazzuoli, manifesta-se contrariamente: “Assim, é de se perguntar: será que o povo brasileiro quer ver o país desengajado de tratados internacionais importantes para a proteção de direitos no plano interno e, também, para o desenvolvimento nacional? Será que o povo aceita a denúncia de tratados por meio da vontade discricionária do Presidente da República? Para nós, enfim, deixar ao presidente da República a faculdade de denunciar tratados internacionais, principalmente os de proteção dos direitos humanos, como é o caso das convenções da OIT, é fazer tábula rasa da vontade popular e dos princípios democráticos do texto constitucional de 1988”14. • Responsabilidade internacional dos Estados; o As sentenças proferidas pelos tribunais internacionais não são estrangeiras, dispensável, portanto, sua homologação pelo Judiciário brasileiro. Não são decisões de tribunais de outros Estados. 13 PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 14. ed., rev. e atual. – São Paulo : Saraiva, 2013. p. 138/139. 14 http://www.conjur.com.br/2015-fev-23/valerio-mazzuoli-executivo-nao-denunciar-trata- dos-congresso É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 23 mege.com.br o Mazzuoli destaca então que: “As sentenças proferidas pela Corte Interamericana – assim como as de quaisquer tribunais internacionais – são sentenças internacionais, não estrangeiras. Tal significa que não necessitam passar pelo procedimento homologatório das sentenças estrangeiras previsto pela legislação nacional (CF, art. 105, I, i; CPC, arts. 483 e 484; LINDB, arts. 15 e 17) para que tenham exequibilidade doméstica. Em outros termos, as sentenças proferidas por tribunais internacionais dispensam, no Brasil, homologação do Superior Tribunal Justiça”15. o Mazzuoli alerta ainda que a grande dificuldade no cumprimento da decisão da Corte Internacional não se refere à obrigação que tenha por objetivoindenizar/reparar economicamente (que é e responsabilidade da União – passível de execução da Fazenda Pública), mas sim na execução interna da obrigação de investigar e punir. • Controle de Convencionalidade: o Pelo controle de convencionalidade analisa-se a compatibilidade da legislação de uma país com os instrumentos jurídicos normativos internacionais (tratados e convenções), com os quais o Estado firmou compromisso. É um controle de validade das normas internas dos países diante das normas internacionais, que se tornam norma-parâmetro. o Isso reforça o valor hierárquicos das normas internacionais de direitos humanos diante da legislação dos Estados signatários, ensejando o controle para aferir a compatibilidade. o O controle de convencionalidade das normas nacionais em face dos ratados de direitos humanos pode redundar em controle de legalidade (ou supralegalidade), caso o tratado não seja aprovado pelo rito das emendas constitucionais (§ 3º do artigo 5º, CR/88) ou em controle de constitucionalidade, caso o tratado tem sido incorporado com observância do rito das emendas constitucionais. o O controle de convencionalidade deve ser realizado pelo legislativo, executivo e judiciário nas suas respectivas funções. Assim, o controle de convencionalidade não é apenas jurisdicional, devendo ser realizado também quando da aprovação e sanção de projetos de lei. 15 MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de direitos humanos. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014. p. 141. É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 24 mege.com.br o Vale ressaltar que os tratados equivalentes às emendas constitucionais (com observância do procedimento do artigo 5º, parágrafo 3º, CR/88) integram o bloco de constitucionalidade, funcionando como parâmetro para o controle de constitucionalidade e de convencionalidade, diferentemente dos tratados de direitos humanos aprovados sem observância do procedimento do artigo 5º, parágrafo 3º, CR/88. o Sobre o Controle de Convencionalidade, Valério Mazzuoli explica: “Nesse sentido, entende-se que o controle de convencionalidade (ou o de supralegalidade) deve ser exercido pelos órgãos da justiça nacional relativamente aos tratados aos quais o país se encontra vinculado. Trata-se de adaptar ou conformar os atos ou leis internas aos compromissos internacionais assumidos pelo Estado, que criam para estes deveres no plano internacional com reflexos práticos no plano do seu direito interno. Doravante, não somente os tribunais internacionais (ou supranacionais) devem realizar esse tipo de controle, mas também os tribunais internos. O fato de serem os tratados internacionais (notadamente os de direitos humanos) imediatamente aplicáveis no âmbito do direito doméstico, garante a legitimidade dos controles de convencionalidade e de supralegalidade das leis no Brasil”16 o Controle de convencionalidade e Crime de Desacato. (IN) COMPATIBILIDADE Convenção Americana de Direitos Humanos ou Pacto San José da Costa Código Penal Artigo 13. Liberdade de pensamento e de expressão 1. Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito compreende a liberdade de buscar, receber e difundir informações e idéias de toda natureza, sem consideração de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro processo de sua escolha. Art. 331 - Desacatar funcioná- rio público no exercício da fun- ção ou em razão dela: Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa. 16 MAZZUOLI, Valério. O controle jurisdicional da convencionalidade das leis. 2ª ed. v. 4. São Pau- lo: Editora Revista dos Tribunais, 2011, pp. 133-134. É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 25 mege.com.br 2. O exercício do direito previsto no inciso precedente não pode estar sujeito a censura prévia, mas a responsabilidades ulteriores, que devem ser expressamente fixadas pela lei e ser necessárias para assegurar: a. o respeito aos direitos ou à reputação das demais pessoas; ou b. a proteção da segurança nacional, da or- dem pública, ou da saúde ou da moral públicas. 3. Não se pode restringir o direito de expressão por vias ou meios indiretos, tais como o abuso de controles oficiais ou particulares de papel de imprensa, de freqüências radioelétricas ou de equipamentos e aparelhos usados na difusão de informação, nem por quaisquer outros meios destinados a obstar a comunicação e a circulação de idéias e opiniões. 4. A lei pode submeter os espetáculos públicos a censura prévia, com o objetivo exclusivo de regular o acesso a eles, para proteção moral da infância e da adolescência, sem prejuízo do disposto no inciso 2. 5. A lei deve proibir toda propaganda a favor da guerra, bem como toda apologia ao ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitação à discriminação, à hostilidade, ao crime ou à violência. o No final de 2016, o STJ17 decidiu que o crime de desacato não era compatível com o ordenamento jurídico em razão do controle de convencionalidade (compatibilidade) entre a lei penal e a Convenção Americana de Diretos Humanos. o No entendimento “antigo” (2016), o STJ, por sua Quinta Turma, destacou que: A Comissão Interamericana de Direitos Humanos - CIDH já se manifestou no sentido de que as leis de desacato se prestam ao abuso, como meio para silenciar ideias e opiniões consideradas incômodas pelo establishment, bem assim proporcionam maior 17 REsp 1640084/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 15/12/2016, DJe 01/02/2017. É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 26 mege.com.br nível de proteção aos agentes do Estado do que aos particulares, em contravenção aos princípios democrático e igualitário. A adesão ao Pacto de San José significa a transposição, para a ordem jurídica interna, de critérios recíprocos de interpretação, sob pena de negação da universalidade dos valores insertos nos direitos fundamentais internacionalmente reconhecidos. Assim, o método hermenêutico mais adequado à concretização da liberdade de expressão reside no postulado pro homine, composto de dois princípios de proteção de direitos: a dignidade da pessoa humana e a prevalência dos direitos humanos. A criminalização do desacato está na contramão do humanismo, porque ressalta a preponderância do Estado - personificado em seus agentes - sobre o indivíduo. A existência de tal normativo em nosso ordenamento jurídico é anacrônica, pois traduz desigualdade entre funcionários e particulares, o que é inaceitável no Estado Democrático de Direito. Punir o uso de linguagem e atitudes ofensivas contra agentes estatais é medida capaz de fazer com que as pessoas se abstenham de usufruir do direito à liberdade de expressão, por temor de sanções penais, sendo esta uma das razões pelas quais a CIDH estabeleceu a recomendação de que os países aderentes ao Pacto de São Paulo abolissem suas respectivas leis de desacato. afastamento da tipificação criminal do desacato não impede a responsabilidade ulterior, civil ou até mesmo de outra figura típica penal (calúnia, injúria, difamação etc.), pela ocorrência de abuso na expressão verbal ou gestual utilizada perante o funcionário público. o No entanto, o entendimento mais recente (Maio de 2017), e também prevalecente, em razão de ter sido proferido pela Terceira Seção18 do STJ, é que o crime de desacato permanece legalmente tipificado como crime no ordenamento brasileiro. o As principais razões que fundamentaram a decisão seguem elencadas: Segundo o ministro Antônio Saldanha Palheiro, autor do voto 18 A Terceira Seçãoé a reunião das quinta e sexta turma, responsáveis pelo julgamento dos Crimes em geral e também pela federalização de crimes contra direitos humanos. Cada Seção no STJ reúne ministros de duas Turmas, também especializadas. As Seções são compostas por dez ministros e as Turmas por cinco ministros cada. É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 27 mege.com.br vencedor, a tipificação do desacato como crime é uma proteção adicional ao agente público contra possíveis “ofensas sem limites”. A figura penal do desacato não prejudica a liberdade de expressão, pois não impede o cidadão de se manifestar, “desde que o faça com civilidade e educação”. A responsabilização penal por desacato existe para inibir excessos e constitui uma salvaguarda para os agentes públicos, expostos a todo tipo de ofensa no exercício de suas funções. A exclusão do desacato como tipo penal não traria benefício con- creto para o julgamento dos casos de ofensas dirigidas a agentes públicos. Com o fim do crime de desacato, as ofensas a agentes públicos passariam a ser tratadas pelos tribunais como injúria, crime para o qual a lei já prevê um acréscimo de pena quando a vítima é servidor público. Apesar da posição da Comissão Interamericana de Direitos Humanos ser contrária à criminalização do desacato, a Corte Interamericana de Direitos Humanos, órgão que efetivamente julga os casos envolvendo indivíduos e estados, já deixou claro em mais de um julgamento que o direito penal pode responder a eventuais excessos na liberdade de expressão o A teoria da dupla compatibilidade vertical material alerta, desta forma, para que o controle de compatibilidade seja realizado tanto diante das normas constitucionais como das normas internacionais de direitos humanos. o Conflito entre a jurisprudência da Corte IDH e o STF: Vamos apresentar abaixo o conflito entre a decisão do STF sobre a compatibilidade da lei da anistia com o ordenamento jurídico brasileiro e a decisão da Corte IDH sobre a incompatibilidade da lei da anistia com a Convenção Americana de Direitos Humanos. o Primeiro Caso Concreto – ADPF: n. 153, sendo analisada a compatibilidade da Lei da anistia, lei n. 6683 de 28 de agosto de 1979. o Artigo da lei central da discussão: É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 28 mege.com.br Art. 1º É concedida anistia a todos quantos, no período com- preendido entre 02 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979, cometeram crimes políticos ou conexo com estes, crimes eleitorais, aos que tiveram seus direitos políticos suspensos e aos servidores da Administração Direta e Indireta, de funda- ções vinculadas ao poder público, aos Servidores dos Poderes Legislativo e Judiciário, aos Militares e aos dirigentes e represen- tantes sindicais, punidos com fundamento em Atos Institucionais e Complementares (vetado).§ 1º - Consideram-se conexos, para efeito deste artigo, os crimes de qualquer natureza relacionados com crimes políticos ou praticados por motivação política.§ 2º - Excetuam-se dos benefícios da anistia os que foram condenados pela prática de crimes de terrorismo, assalto, seqüestro e atentado pessoal.§ 3º - Terá direito à reversão ao Serviço Público a esposa do militar demitido por Ato Institucional, que foi obrigada a pedir exoneração do respectivo cargo, para poder habilitar-se ao montepio militar, obedecidas as exigências do art. 3º. Síntese: A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), parte autora da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 153), questionou a anistia aos representantes do Estado (policiais e militares) que, durante o regime militar, praticaram atos de tortura. A ADPF contestou a validade do primeiro artigo da Lei da Anistia (6.683/79), que considera como conexos e igualmente perdoados os crimes “de qualquer natureza” relacionados aos crimes políticos ou praticados por motivação política no período de 2 de setembro de 1961 a 15 de agosto de 1979.A OAB pediu ao Supremo uma interpretação mais clara desse trecho da lei de forma que a anistia concedida aos autores de crimes políticos e seus conexos (de qualquer natureza) não se estenda aos crimes comuns praticados por agentes públicos acusados de homicídio, desaparecimento forçado, abuso de autoridade, lesões corporais, estupro e atentado violento ao pudor contra opositores. Para a OAB, seria irregular estender a anistia de natureza política aos agentes do Estado pois, conforme a entidade, os agentes policiais e militares da repressão política não teriam cometido crimes políticos, mas comuns. Isso porque os crimes políticos seriam apenas aqueles contrários à segurança nacional e à ordem política e social (cometidos apenas pelos opositores ao regime)19. 19 Adaptado de: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=98024 É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 29 mege.com.br Decisão: O STF julgou improcedentes os pedidos da OAB, reconhecendo a validade e constitucionalidade da lei da anistia. o Segundo caso concreto: Gomes Lund e outros (Guerrilha do Araguaia) vs. Brasil Síntese: Comissão Interamericana de Direitos Humanos submeteu à Corte IDH o esse caso, acusando o Estado brasileiro de “responsabilidade [do Estado] pela detenção arbitrária, tortura e desaparecimento forçado de 70 pessoas, entre membros do Partido Comunista do Brasil […] e camponeses da região, […] resultado de operações do Exército brasileiro empreendidas entre 1972 e 1975 com o objetivo de erradicar a Guerrilha do Araguaia, no contexto da ditadura militar do Brasil (1964–1985) ”. Para A CIDH: “em virtude da Lei nº 6.683/79 […], o Estado não realizou uma investigação penal com a finalidade de julgar e punir as pessoas responsáveis pelo desaparecimento forçado de 70 vítimas e a execução extrajudicial de Maria Lúcia Petit da Silva […]; porque os recursos judiciais de natureza civil, com vistas a obter informações sobre os fatos, não foram efetivos para assegurar aos familiares dos desaparecidos e da pessoa executada o acesso a informação sobre a Guerrilha do Araguaia; porque as medidas legislativas e administrativas adotadas pelo Estado restringiram indevidamente o direito de acesso à informação pelos familiares; e porque o desaparecimento das vítimas, a execução de Maria Lúcia Petit da Silva, a impunidade dos responsáveis e a falta de acesso à justiça, à verdade e à informação afetaram negativamente a integridade pessoal dos familiares dos desaparecidos e da pessoa executada”. A Comissão solicitou ao Tribunal que declare que o Estado é responsável pela violação dos direitos estabelecidos nos artigos 3 (direito ao reconhecimento da personalidade jurídica), 4 (direito à vida), 5 (direito à integridade pessoal), 7 (direito à liberdade pessoal), 8 (garantias judiciais), 13 (liberdade de pensamento e expressão) e 25 (proteção judicial), da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, em conexão com as obrigações previstas nos artigos 1.1 (obrigação geral de respeito e garantia dos direitos humanos) e 2 (dever de adotar disposições de direito interno) da mesma Convenção. Finalmente, solicitou à Corte que ordene ao Estado a adoção de determinadas medidas de reparação”20. 20 http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 30 mege.com.br Decisão: Em 24/11/2010, a CORTE IDH condenou o Estado brasileiro, considerando, dentre outros aspectos, a incompatibilidade da lei de anistia com a Convenção Americana de Direitos Humanos. A Corte IDH há havia se pronunciado anteriormente ao caso brasileiro sobre a incompatibilidade das anistias coma Convenção Americana em casos de graves violações dos direitos humanos (Barrios Altos e La Cantuta – Peru; Almonacid Arellano e outros - Chile). A C “Dada sua manifesta incompatibilidade com a Convenção Americana, as disposições da Lei de Anistia brasileira que impedem a investigação e sanção de graves violações de direitos humanos carecem de efeitos jurídicos. Em consequência, não podem continuar a representar um obstáculo para a investigação dos fatos do presente caso, nem para a identificação e punição dos responsáveis, nem podem ter igual ou similar impacto sobre outros casos de graves violações de direitos humanos consagrados na Convenção Americana ocorridos no Brasil Justiça de transição e suas dimensões: A justiça de transição possui conceito formulado pela ONU, qual seja: “A justiça de transição é conceituada como o conjunto de abordagens, mecanismos (judiciais e não judiciais) e estratégias para enfrentar o legado de violência em massa do passado, para atribuir responsabilidades, para exigir a efetividade do direito à memória e à verdade, para fortalecer as instituições com valores democráticos e garantir a não repetição das atrocidades” ( Conforme documento produzido pelo Conselho de Segurança da ONU – UN Security Council- The rule of law and transitional justice in conflict and post-conflict societies. Report Secretary-General, S/2004/616). As dimensões consistem em: justiça, verdade, reparação e reformulação das instituições. André de Carvalho Ramos sintetiza o conceito e as dimensões: “A justiça de transição consiste em um conjunto de dispositivos que regula a restauração do Estado de Direito após regimes ditatoriais ou conflitos armados internos, englobando quatro dimensões (oufacetas): (i) direito à verdade e à memória; (ii) o direito à reparação das vítimas; (iii) o dever deresponsabilização dos perpetradores das violações aos direitos humanos e, finalmente; (iv) a formatação democrática das instituições protagonistas da ditadura (por exemplo, as Forças Armadas)”21. 21 RAMOS, André de Carvalho. Curso de direitos humanos. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. p.836. É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 31 mege.com.br A palavra chave para esse conceito é a transição de um regime político a outro, onde há expectativa que se consolide valores democráticos. No caso brasileiro, é a passagem do regime ditatorial para o regime democrático. A sentença do caso “Gomes Lund” condena o Brasil em razão da ausência de punição/responsabilização daqueles que violaram gravemente os direitos humanos. Não se deve olvidar, no entanto, que ações positivistas sob a perspectiva da justiça de transição foram adotadas pelo Brasil: a atuação da Comissão Especial de Mortos Desaparecidos (Lei no 9.140/95); o trabalho da Comissão de Anistia, no âmbito do Ministério da Justiça (Lei no 10.559/02); a criação do Centro de Referência das Lutas Políticas no Brasil, denominado Memórias Reveladas, institucionalizado pela Casa Civil da Presidência da República e implantado no Arquivo Nacional; a instituição do 3o Programa Nacional de Direito Humanos – PNDH (Instituído pelo Decreto Presidencial no 7.037/09) tratando da Justiça de Transição, além da Comissão Nacional da Verdade (Lei no 2.528/11) e a Comissão Estadual da Verdade – Teresa Urban, do Paraná (Lei no 17.362/12). Por outro lado, há severas críticas à forma como se procedeu a justiça de transição no Brasil. Para a historiadora Maria Paula Araújo: “A justiça de transição no Brasil deu ênfase à questão da reparação, em detrimento de outros aspectos, como a verdade e a justiça; e uma reparação com um forte cunho indenizatório. Mas, apesar do esforço da Comissão de Anistia, este processo de reparação não foi suficiente para revelar a verdade (ou as verdades), promover justiça e permitir uma reconciliação nacional”22 STF CORTE IDH ADPF n. 153 Gomes Lund e outros (Guerrilha do Ara- guaia) vs. Brasil Decisão: Contra a revi- são da Lei da Anistia Decisão: incompatibilidade da Lei da Anis- tia com a CADH o Soluções apresentadas diante da divergência entre o STF e a Corte IDH 22 http://www1.folha.uol.com.br/poder/2013/07/1304812-justica-de-transicao-priorizou-inde- nizacoes-mas-nao-a-reconciliacao-diz-historiadora.shtml É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 32 mege.com.br André de Carvalho Ramos adota como premissa, nestes casos de divergência, o fato de que “não há conflito insolúvel entre as decisões do STF e da Corte de San José, uma vez que ambos os tribunais têm grave incumbência de proteger os direitos humanos. Eventuais conflitos são apenas conflitos aparentes, fruto do pluralismo normativo que assola o mundo de hoje, aptos a serem solucionados pela via hermenêutica”23. Ramos aposta em dois instrumentos: o Diálogo das Cortes, que atua de forma preventiva, em que o STF utilizaria o entendimento de diversos órgãos internacionais sobre tratados de direitos humanos em que o Brasil se comprometeu. Contudo, destaca que os juízes brasileiros não estariam obrigados ao Diálogo das Cortes, em razão da independência funcional e do Estado Democrático de Direito. Caso o diálogo não aconteça, Ramos aponta o segundo instrumento, qual seja: a teoria do duplo controle ou crivo de direitos humanos, reconhecendo-se “a atuação em separado do controle de constitucionalidade (STF e juízos nacionais) e do controle de convencionalidade (Corte de San José e outros órgãos de direitos humanos do plano internacional). Os direitos humanos, então, possuem no Brasil uma dupla garantia: o controle de constitucionalidade nacional e o controle de convencionalidade internacional. Qualquer ato ou norma deve ser aprovado pelos dois controles, para que sejam respeitados os direitos no Brasil”24. o Por fim, neste tópico de controle de convencionalidade, é válido ainda Sobre a Teoria do Trapézio: Flávia Piovesan apresenta, em corrente minoritária, a teoria do trapézio em com contraposição à pirâmide de Kelsen. Para a autora, a cultura jurídica latino-americana fundou-se por mais de um século na: “ pirâmide com a Constituição no ápice da ordem jurídica, tendo como maior referencial teórico Hans Kelsen, na afirmação de um sistema jurídico endógeno e autorreferencial (observa-se que, em geral, Hans Kelsen tem sido equivocadamente interpretado, já que sua doutrina defende o monismo com a primazia do Direito Internacional – o que tem sido tradicionalmente desconsiderado na América Latina)”25; 23 RAMOS, Andre de Carvalho. Processo Internacional de Direitos Huamnos. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p.374. 24 RAMOS, André de Carvalho. Processo Internacional de Direitos Humanos. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p.374. 25 PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 14. ed., rev. e atual. – São Paulo : Saraiva, 2013. p. 19. É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 33 mege.com.br o No entanto, diante desse paradigma tradicional e a emergência de um novo paradigma, a figura emblemática e parâmetro deixa de ser a pirâmide, para destacar evidenciar “ o trapézio com a Constituição e os tratados internacionais de direitos humanos no ápice da ordem jurídica (com repúdio a um sistema jurídico endógeno e autorreferencial, destacando-se que as Constituições latino-americanas estabelecem cláusulas constitucionais abertas, que permitem a integração entre a ordem constitucional e a ordem internacional, especialmente no campo dos direitos humanos, ampliando e expandindo o bloco de constitucionalidade)26”; 26 PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 14. ed., rev. e atual. – São Paulo : Saraiva, 2013. p. 19. É proibida a reprodução destematerial sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 34 mege.com.br 1.2 LEGISLAÇÃO Tratados e convenções sobre direitos humanos e a equivalência com emenda constitucional: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) § 1º As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata. § 2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. § 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) (Atos aprovados na forma deste parágrafo) § 4º O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) Direitos humanos no rol de competência da Justiça Federal Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: (...) V-A as causas relativas a direitos humanos a que se refere o § 5º deste artigo; (Incluí- do pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) (...) § 5º Nas hipóteses de grave violação de direitos humanos, o Procurador-Geral da República, com a finalidade de assegurar o cumprimento de obrigações decorrentes de tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte, poderá suscitar, perante o Superior Tribunal de Justiça, em qualquer fase do inquérito ou processo, incidente de deslocamento de competência para a Justiça Federal. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 35 mege.com.br Tratados e competência interna para celebração Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional: I - resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional; (...) Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: (...) VIII - celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional; (...) Tratados e competência judicial: Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: (...) III - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida: (...) b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; (...) Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça: (...) III - julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territó- rios, quando a decisão recorrida: a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência; (..._ Art. 108. Compete aos Tribunais Regionais Federais: (...) III - as causas fundadas em tratado ou contrato da União com Estado estrangeiro ou or- ganismo internacional; É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 36 mege.com.br (...) V - os crimes previstos em tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a execu- ção no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente; A previsão literal da expressão direitos humanos na CR/88: A menção a expressão “direitos humanos” é realizada 7(sete) vezes na Constituição de 1988 e no Ato das Dispo- sições Constitucionais Transitórias. Vejamos: Como princípio regente das relações internacionais do Estado brasileiro. Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: II - prevalência dos direitos humanos; Tratados e convenções sobre direitos humanos e a equivalência com emenda cons- titucional: Art. 5º § 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucio nais. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) Direitos humanos no rol de competência da Justiça Federal Art. 109. Aos juízes fe- derais compete processar e julgar: V-A as causas relativas a direitos humanos a que se refere o § 5º deste artigo; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) § 5º Nas hipóteses de grave violação de direitos humanos, o Procurador-Geral da República, com a finalidade de assegurar o cumprimento de obrigações decorrentes de tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte, poderá suscitar, perante o Superior Tribunal de Justiça, em qualquer fase do inquérito ou processo, incidente de deslocamento de competência para a Justiça Federal. (Incluído pela Emenda Consti- tucional nº 45, de 2004) A Defensoria Pública como instituição responsável pelos direitos humanos. Art. 134. A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamental- mente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, na forma do inciso LXXIV do art. 5º desta Constituição Fede- ral. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 80, de 2014) O engajamento do Brasil na formação de um tribunal internacional dos direitos hu- manos. ADCT: Art. 7º. O Brasil propugnará pela formação de um tribunal internacional dos direitos humanos. É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 37 mege.com.br 1.3 JURISPRUDÊNCIA STF E O CRIME DE DESACATO: Habeas corpus. 2. Crime de desacato a militar (art. 299 do Código Penal Militar). 3. Controle de constitucionalidade (arts. 1º; 5º, incisos IV, V e IX, e 220 da Consti- tuição Federal) e de convencionalidade (art. 13 da Convenção Americana de Direi- tos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica). 4. Alegada ofensa à liberdade de ex- pressão e do pensamento que se rejeita. 5. Criminalização do desacato que se mostra compatível com o Estado Democrático de Direito. 6. Ordem denegada. (HC 141949, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 13/03/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-077 DIVULG 20-04-2018 PUBLIC 23-04-2018) AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS. PENAL. CÓDIGO PENAL MILITAR. DESACATO. CRIMINALIZAÇÃO. IMPROCEDÊNCIA DA ALEGADA INCOMPATIBILIDADE DA TIPIFICAÇÃO DO CRIME DE DESACATO COM OS DIREITOS PREVISTOS NA DECLARAÇÃO INTERAMERICA- NA DE DIREITOS HUMANOS – PACTO DE SÃO JOSÉ DA COSTA RICA. PREVALÊNCIA DO ES- TADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO E DA SOBERANIA NACIONAL. HIERARQUIA E DISCIPLINA COMO PILARES CONSTITUCIONAIS DA ORGANIZAÇÃO DAS FORÇAS ARMADAS (ART. 142 DA CF/1988). RAZÕES RECURSAIS QUE NÃO COMBATEM OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.(HC 143968 AgR, Rela- tor(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 29/06/2018, PROCES- SO ELETRÔNICO DJe-157 DIVULG 03-08-2018 PUBLIC 06-08-2018) STF E A PRISÃO DO DEPOSITÁRIO INFIEL: A subscrição pelo Brasil do Pacto de São José da Costa Rica, limitando a prisão civil por dívida ao descumprimento inescusável de prestação alimentícia, implicou a derrogação das normas estritamentelegais referentes à prisão do depositário infiel. [HC 87.585, rel. min. Marco Aurélio, j. 3-12-2008, P, DJE de 26-6-2009.] A CR/88 E OS TRATADOS INTERNACIONAIS: Supremacia da Constituição da República sobre todos os tratados internacionais. O exer- cício do treaty-making power, pelo Estado brasileiro, está sujeito à observância das limi- É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 38 mege.com.br tações jurídicas emergentes do texto constitucional. Os tratados celebrados pelo Brasil estão subordinados à autoridade normativa da Constituição da República. Nenhum valor jurídico terá o tratado internacional, que, incorporado ao sistema de direito positivo inter- no, transgredir, formal ou materialmente, o texto da Carta Política. [MI 772 AgR, rel. min. Celso de Mello, j. 24-10-2007, P, DJE de 20-3-2009.] STJ E PRISÃO DO DEPOSITÁRIO INFIEL: PROCESSO CIVIL. TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. DEPOSITÁRIO INFIEL. PACTO DE SÃO JOSÉ DA COSTA RICA. EMENDA CONSTITUCIONAL N.º 45/2004. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. NOVEL POSICIONA- MENTO ADOTADO PELA SUPREMA CORTE. 1. A Convenção Americana sobre Direitos Humanos, em seu art. 7º, § 7º, vedou a prisão civil do depositário infiel, ressalvada a hipótese do devedor de alimentos. Contudo, a ju- risprudência pátria sempre direcionou-se no sentido da constitucionalidade do art. 5º, LX- VII, da Carta de 1.988, o qual prevê expressamente a prisão do depositário infiel. Isto em razão de o referido tratado internacional ter ingressado em nosso ordenamento jurídico na qualidade de norma infraconstitucional, porquanto, com a promulgação da constitui- ção de 1.988, inadmissível o seu recebimento com força de emenda constitucional. Nesse sentido confiram-se os seguintes julgados da Suprema Corte: RE 253071 - GO, Relator Ministro MOREIRA ALVES, Primeira Turma, DJ de 29 de junho de 2.006 e RE 206.482 - SP, Relator Ministro MAURICIO CORRÊA, Tribunal Pleno, DJ de 05 de setembro de 2.003. 2. A edição da EC 45/2.004 acresceu ao art. 5º da CF/1.988 o § 3º, dispondo que “Os trata- dos e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados , em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais”, inaugurando novo panorama nos acordos internacionais relativos a direitos humanos em território nacional. 3. Deveras, “a ratificação, pelo Brasil, sem qualquer reserva do pacto Internacional dos Di- reitos Civis e Políticos (art. 11) e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos - Pacto de San José da Costa Rica, (art, 7º, 7), ambos do ano de 1992, não há mais base legal para prisão civil do depositário infiel, pois o caráter especial desses diplomas internacionais sobre direitos humanos lhes reserva lugar específico no ordenamento jurídico, estando abaixo da constituição, porém acima da legislação infraconstitucional com ele conflitante, seja ela anterior ou posterior ao ato de ratificação. Assim ocorreu com o art. 1.287 do Código civil de 1916 e com o Decreto-Lei 911/1969, as- sim como em relação ao art. 652 do novo Código Civil (Lei 10.406/2002).” (voto proferido pelo Ministro GILMAR MENDES, na sessão de julgamento do Plenário da Suprema Corte em 22 de novembro de 2.006, relativo ao Recurso Extraordinário n.º 466.343 - SP, da rela- toria do Ministro CEZAR PELUSO). É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 39 mege.com.br 4. A Constituição da República Federativa do Brasil, de índole pós-positivista, e funda- mento de todo o ordenamento jurídico, expressa, como vontade popular, que a Repú- blica Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados, Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como um dos seus fundamentos a dignidade da pessoa humana como instrumento realizador de seu ideário de construção de uma sociedade justa e solidária. 5. O Pretório Excelso, realizando interpretação sistemática dos direitos humanos fun- damentais, promoveu considerável mudança acerca do tema em foco, assegurando os valores supremos do texto magno. O Órgão Pleno da Excelsa Corte, por ocasião do his- tórico julgamento do Recurso Extraordinário n.º 466.343 - SP, Relator MIn. Cezar Peluso, reconheceu que os tratados de direitos humanos têm hierarquia superior à lei ordinária, ostentando status normativo supralegal, o que significa dizer que toda lei antagônica às normas emanadas de tratados internacionais sobre direitos humanos é destituída de validade, máxime em face do efeito paralisante dos referidos tratados em relação às nor- mas infra-legais autorizadoras da custódia do depositário infiel. Isso significa dizer que, no plano material, as regras provindas da Convenção Americana de Direitos Humanos, em relação às normas internas, são ampliativas do exercício do direito fundamental à liberdade, razão pela qual paralisam a eficácia normativa da regra interna em sentido contrário, haja vista que não se trata aqui de revogação, mas de invalidade. 6. No mesmo sentido, recentíssimo precedente do Supremo Tribunal Federal, verbis: “HABEAS CORPUS” - PRISÃO CIVIL - DEPOSITÁRIO JUDICIAL - REVOGAÇÃO DA SÚMULA 619/STF - A QUESTÃO DA INFIDELIDADE DEPOSITÁRIA - CONVENÇÃO AMERICANA DE DI- REITOS HUMANOS (ARTIGO 7º, n. 7) - NATUREZA CONSTITUCIONAL OU CARÁTER DE SU- PRALEGALIDADE DOS TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS? - PEDIDO DEFERIDO. ILEGITIMIDADE JURÍDICA DA DECRETAÇÃO DA PRISÃO CIVIL DO DEPOSITÁRIO INFIEL, AINDA QUE SE CUIDE DE DEPOSITÁRIO JUDICIAL. - Não mais subsiste, no sistema normativo brasileiro, a prisão civil por infidelidade depositária, independentemente da modalidade de depósito, trate-se de depósito voluntário (convencional) ou cuide-se de depósito necessário, como o é o depósito judicial. Precedentes. Revogação da Súmula 619/STF. TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS: AS SUAS RELAÇÕES COM O DIREITO INTERNO BRASILEIRO E A QUESTÃO DE SUA POSIÇÃO HIERÁRQUICA. - A Con- venção Americana sobre Direitos Humanos (Art. 7º, n. 7). Caráter subordinante dos tratados internacionais em matéria de direitos huma- nos e o sistema de proteção dos direitos básicos da pessoa humana. - Relações entre o direito interno brasileiro e as convenções internacionais de direitos humanos (CF, art. 5º e §§ 2º e 3º). Precedentes. - Posição hierárquica dos tratados internacionais de direitos humanos no ordenamento positivo interno do Brasil: natureza constitucional ou caráter de supralegalidade? - Entendimento do Relator, Min. CELSO DE MELLO, que atribui hie- rarquia constitucional às convenções internacionais em matéria de direitos humanos. A INTERPRETAÇÃO JUDICIAL COMO INSTRUMENTO DE MUTAÇÃO INFORMAL DA CONS- TITUIÇÃO. - A questão dos processos informais de mutação constitucional e o papel do Poder Judiciário: a interpretação judicial como instrumento juridicamente idôneo de mu- É proibida a reprodução deste material sem a devida autorização, sob pena da adoção das medidas cabíveis na esfera cível e penal. 40 mege.com.br dança informal da Constituição. A legitimidade da adequação, mediante interpretação do Poder Judiciário, da própria Constituição da República, se e quando imperioso compati- bilizá-la, mediante exegese atualizadora, com as novas exigências, necessidades e trans- formações resultantes dos processos sociais, econômicos e políticos que caracterizam, em seus múltiplos e complexos aspectos, a sociedade contemporânea. HERMENÊUTICA E DIREITOS HUMANOS: A NORMA MAIS FAVORÁVEL COMO CRITÉRIO QUE DEVE REGER A INTERPRETAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO. - Os magistrados e Tribunais, no exercício de sua atividade interpretativa, especialmente no âmbito dos tratados internacionais de direitos humanos, devem observar um princípio hermenêutico básico (tal como aquele
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