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Carolina Queiroga de Miranda Tutoria - Problema 2 - UC 23 Medicina Unit P8 FARMACODERMIAS 1. Reações Adversas a Medicamentos • Reações adversas a fármacos (RAF) é um termo abrangente que se refere aos efeitos indesejáveis, desconfortáveis ou perigosos que um fármaco pode ter. • Reações adversas farmacológicas ocorrem em 10 a 20% das hospitalizações. • Cerca de 10 a 20% dessas reações são graves. • A incidência é maior com a idade avançada e polifarmácia. Em idosos, a incidência é provavelmente mais alta e as RAFs são mais graves • Evento Adverso: - evento desfavorável que ocorre durante ou após o uso de medicamentos ou outra intervenção. - É i m p o r t a n t e re s s a l t a r q u e p a r a s e r c o n s i d e r a d o u m e v e n t o a d v e r s o , o medicamento ou a in te rvenção não necessariamente tem relação causal com o evento1. - Exemplos: infecções relacionadas à assistência saúde; flebite; obstrução de sonda para a l i m e n t a ç ã o ; r e a ç õ e s a d v e r s a s a medicamentos; eventos adversos por desvios da qualidade de medicamentos; eventos adversos decorrentes do uso não aprovado de medicamentos (uso off label); interações medicamentosas; inefetividade terapêutica total ou parcial; erros de medicação potenciais e reais, queda do paciente. OBS// Toda RAF é um evento adverso, mas nem todo evento adverso é uma RAF - RAM x Intoxicação Medicamentosa: Dose Usual x Super Dosagem • Efei to Adverso: efei to pre judic ia l ou indesejável que ocorre durante ou após uma intervenção ou o uso de um medicamento, em que há possibilidade razoável de relação causal entre o tratamento e o efeito Etiologia • A maioria das reações adversas a fármacos tem relação com a dose, mas outras são alérgicas ou idioss incrát icas. As ADR relacionadas com a dose são, em geral, previsíveis; em contrapartida, as ADR não relacionadas com a dose costumam ser imprevisíveis. • As ADR relacionadas com a dose são particularmente preocupantes quando os fármacos têm índice terapêutico estreito (p. ex., hemorragia com anticoagulantes orais). As ADR podem ser consequência da diminuição da depuração do fármaco em pacientes com comprometimento da função rena l ou hepát ica ou da in teração medicamentosa. • RAF alérgicas não têm relação com a dose e requerem exposição prévia. As alergias desenvolvem-se quando o fármaco age como antígeno ou alergênio. Após a sensibilização do paciente, a exposição subsequente ao fármaco desencadeia um dos diferentes tipos de reação alérgica. A história clínica e os exames dérmicos apropriados podem, às vezes, ajudar a prever RAFs alérgicas. • RAFs idiossincráticas são RAFs inesperadas que não têm relação com a dose ou não são alérgicas. Incide em pequena porcentagem de pacientes que recebem um fármaco. Idiossincrasia é um termo impreciso que foi d e f i n i d o c o m o r e s p o s t a a n o r m a l geneticamente determinada a um fármaco, mas nem todas as reações idiossincráticas têm causa farmacogenética. O termo pode tornar-se obsoleto à medida que mecanismos específicos das RAFs são desvendados. Fatores de risco • Idade: Criança e idoso • Mulheres • Comorbidades: - hepatopatias, nefropatias - Diabetes, hipertensão • Genética: Polimorfismos (ex: deficiência de CYP450) • Hábitos: tabagismo e alcoolismo • Polifarmácia Sinais e sintomas • Os sinais e sintomas podem se manifestar logo após a primeira dose ou somente após a utilização regular. Eles podem, obviamente, resultar do uso de fármacos ou serem muito sutis para que possam ser identificados como relacionados aos fármacos. • Nos idosos, RAFs sut is podem causar deterioração funcional, alterações do estado mental, incapacidade de melhora, perda de apetite, confusão e depressão. • Classicamente, as ADR alérgicas ocorrem logo após a ingestão do fármaco, mas, em geral, não acontecem após a primeira dose; tipicamente, ocorrem quando o fármaco é !1 https://www.msdmanuals.com/pt-br/profissional/imunologia-dist%C3%BArbios-al%C3%A9rgicos/dist%C3%BArbios-al%C3%A9rgicos,-autoimunes-e-outras-rea%C3%A7%C3%B5es-de-hipersensibilidade/hipersensibilidade-a-f%C3%A1rmacos Carolina Queiroga de Miranda Tutoria - Problema 2 - UC 23 Medicina Unit P8 administrado após exposição inicial. Os s i n t o m a s s ã o p r u r i d o , e x a n t e m a , farmocodermias, edema dasvias respiratórias superiores ou inferiores com dificuldade para respirar e hipotensão. • As RAFs idiossincráticas podem provocar quase qualquer s ina l ou s in toma e, geralmente, não podem ser previstas. " Diagnóstico • Os sintomas que surgem logo após a ingestão do fármaco são, com frequência, facilmente correlacionados com o seu uso. Entretanto, o diagnóstico de sintomas decorrentes do uso crônico de fármacos é mais complicado • Quando a prova da relação entre fármaco e sintomas for significativa, deve-se considerar a reexposição ao fármaco, exceto no caso de reações alérgicas graves. • Os médicos devem relatar a maioria das RAFs suspeitas ao MedWatch (programa de monitoramento de RAF da Food and Drug Administration — FDA), que constitui um sistema de alerta precoce. • Os médicos não devem supor que, porque um fármaco está no mercado, todas as RAFs são conhecidas. Tratamento • Modificação de dose • Interrupção do fármaco se necessário • Trocar para outro fármaco Para as reações adversas a fá r macos relacionadas com a dose, pode ser suficiente a modificação da eliminação ou a redução dos fatores precipitantes. Raramente é necessário o aumento da taxa de eliminação do fármaco. Para as RAFs alérgicas e idiossincráticas, geralmente o uso do fármaco deve ser interrompido e não deve ser retomado 2. Farmacodermias • Farmacodermias são reações cutâneas a medicamentos utilizadas na prática médica • Estima-se uma incidência entre 2 e 3% dos pacientes hospitalizados. • Qualquer fármaco pode causar erupções cutâneas, embora os mais frequentemente implicados sejam: - penicilinas (especialmente as aminopenici- linas) - sulfonamidas - anticonvulsivantes aromáticos (fenitoína, carbamazepina, fenobarbital) - AINES do grupo dos oxicams (piroxicam, tenoxicam etc.) - butazonas (fenilbutazona) - inibidores da ECA, hidralazina e alopurinol. � Fisiopatologia • Podem ser classificados em imunológicas (alérgicas) e não imunológicas (não alérgicas): NÃO ALÉRGICAS - Surperdosagem (ex: necrose por derivados do ergot) - Fatores individuais (ex: idiossincrasias e intolerância) - Efeitos colaterais (ex: alopécia pelo uso de citostáticos) - Alteração do equilíbrio ecológico (ex.: candidíase vaginal após corticoterapia ou antibioticoterapia); - Teratogenicidade (ex. : focomel ia por talidomida); - Fototoxicidade (ex.: tetraciclina, dapsona, psoralenos); !2 Carolina Queiroga de Miranda Tutoria - Problema 2 - UC 23 Medicina Unit P8 - Interações medicamentosas (ex.: inibindo ou estimulando a metabolização pelo citocromo p450). • Neste grupo merecem destaque: a) Urticária não alérgica, provocada ela liberação histamínica induzida por contrastes iodados, morfina, codeína, curare (antracúrio, vecurônio, succinilcolina) e IECAs. � b) Necrose cutânea pelo cumarínio - quadro grave decorrente de fenômeno tromboclusivo dos vasos cutâneos " c) Reação de Jarisch-Herxheimer - observada após uso de penicilina G benzina para tratar a sífilis. - Ocorre após 4 a 12 horas da primeira injeção, manifestando-se por febre moderada, mal- estar, cefa le ia, mia lg ia, rubor facia l , leucoci tose, exacerbação das lesões preexistentes ou um novo rash eritematoso, durando até 24 horas. - Ocorre em 50% dos casos na sífilis primária, em 90% dos casos na sífilis secundária e em 25% na sífilis latente. � ALÉRGICAS (segundo a classificação de Gel-Coombs) • Reação tipo I: imediata (após 30-60 min), mediada por IgE, provocando degranulação de mastócitose basófilos, liberando histamina, prostaglandinas e leucotrienos. Representada por u r t icár ia , ang ioedema e reação anafilática; • Reação tipo II: citotoxidade mediada por anticorpos (IgG e IgM) • Reação tipo III: mediada por imunocomplexos. Ex: vasculite cutânea e doença do soro. • Reação tipo IV: mediada pela imunidade celular (linfócitos T helper) • Devemos ressaltar que muitas formas de farmacodermia não têm mecanismo muito bem estabelecido, como é o caso de eritema multi- forme, SSJ e NET. Síndrome de Stevns-Johson (SSJ) e Necrólise Epidérmica Tóxica (NET) • A SSJ e a NET provavelmente constituem espectros de uma mesma doença, sendo a NET uma forma mais grave do que a SSJ. • A NET também pode ser chamada de síndrome de Lyell • São doenças cutâneas que possuem um potencial de evolução grave, com letalidade de 5% para a SSJ e de 30 a 50% para a NET. A causa mais comum de morte é a septicemia secundária. CLASSIFICAÇÃO E EPIDEMIOLOGIA • Segundo consensos atuais, a diferença entre as duas entidades é apenas quantitativa • Ambas são definidas pelo: 1. Acometimento de duas ou mais áreas de mucosa (oral, ocular, genital) 2. Exantema eritematoso disseminado contendo lesões em alvos típicas 3. Lesões bolhosas que geram desnudamento cutâneo (escaldamento) • O termo SSJ é reservado para os casos com menos de 10% de pele desnudada e termo NET, para os casos mais graves, com mais de 30% de pele desnudada. • Os pacientes intermediários com 10 a 30% de pele desnudada são referidos como overlap SSJ-NET. • Pela estatística americana, a SSJ é duas vezes mais comum que a NET e a proporção de casos entre as três entidades (SSJ, overlap, NET) é de aproximadamente 3:2:1,7. • Todas elas são cerca de duas vezes mais comuns em mulheres. • Predominam nos adultos, embora possam ocorrer em crianças, especialmente a SSJ. • A taxa de ocorrência entre as drogas mais incriminadas é de 10 a 20 casos a cada 100.000 administrações do fármaco. ETIOLOGIA • A relação com medicamentos é encontrada em mais de 50% com a SSJ e em 80 a 95% com a NET. !3 Carolina Queiroga de Miranda Tutoria - Problema 2 - UC 23 Medicina Unit P8 • As drogas mais frequentemente suspeitas são a penicilina, os antibióticos penicilina, os antibióticos contendo sulfa, os barbitúricos, os anticonvulsivantes, os analgésicos, os AINES e o alopurinol. • Em alguns casos, ocorre juntamente com uma out ra doença grave, compl icando o diagnóstico. • As manifestações clínicas ocorrem com uma média de 14 dias após a exposição, porém com ampla variação (1 a 45 dias). • Após a reexposição, o período de latência é mais curto e as manifestações são mais graves. A SSJ pode ser causada por agentes infecciosos, destacando-se o M y c o p l a s m a pneumoniae. • Esta infecção está presente em 15% dos casos de SSJ e costuma ocorrer entre 5 e 20 anos de i d a d e . O u t ro s a g e n t e s p o d e m e s t a r relacionados, embora mais raramente. • Existe um aumento importante da incidência de SSJ/NET em pacientes portadores de HIV, especialmente os casos provocados pelas sulfonamidas. Há também uma relação genética com o HLA A29 e B12. FISIOPATOLOGIA • A fisiopatologia é parcialmente conhecida. Depende do poder citotóxico direto dos linfócitos TCD8 sobre os queratinócitos da epiderme, modulados pelos linfócitos TCD4. Não há part ic ipação importante dos anticorpos • Aparentemente, a droga, ou um metabólito da droga, é incorporado na membrana dos querat inóc i tos , se rv indo de hapteno (moléculas que induzem uma resposta imune) a o l i g a r - s e n o c o m p l e x o d e histocompatibilidade classe I • Um defeito da desoxidação hepática e cutânea de medicamentos pode ser observado em alguns pacientes propensos • Nestes indivíduos, acumulam-se em níveis maiores as h idroxi laminas reat ivas do metabolismo das sulfonamidas e óxido de areno do metabolismo dos anticonvulsivantes aromáticos. Esses metabólitos estão envolvidos na gênese da síndrome • N o c a s o d e a g e n t e s i n f e c c i o s o s , o queratinócito seria sensibilizado por antígenos virais. • O grave dano epidérmico na SSJ e NET decorre da ação dos linfócitos T citotóxicos C D 8 q u e , a o i n t e r a g i r e m c o m o s queratinócitos sensibilizados, induz a sua apoptose. • A liberação local de TNF-alfa é extrema, fruto da interação entre macrófagos ativados e queratinócitos. A imunofluorescência é negativa. • O histopatológico revela um discreto infiltrado inflamatório mononuclear subepidérmico, com degeneração hidrópica da camada basal e extensa necrose eosinofílica da epiderme. Nas á r e a s b o l h o s a s o u d e s n u d a s , h á caracteristicamente necrose de toda a espessura da epiderme e descolamento subepidérmico. QUADRO CLÍNICO Síndrome de stevens-johnson • Um estágio prodrômico de 1 a 14 dias é encontrado em metade dos pacientes, caracterizando-se por febre, mal-estar, cefaleia, coriza, angina (comprometimento orofaríngeo), mialgias, artralgias (síndrome gripal) e eventualmente vômitos e diarreia. • Nesse momento, o paciente pode fazer uso de analgésicos-antitérmicos que podem ser implicados inadvertidamente na causa da erupção. Quadro cutâneo: • Começa com uma erupção eritematosa maculopapular, por vezes morbiliforme, aparecendo no tronco e na face, progredindo centrifugamente para as extremidades. • Algumas lesões individuais são lesões em alvo atípicas, achatadas, com centro violáceo ou pigmentado e halo eritematoso. • As lesões são dolorosas e tendem a confluência, especialmente na face, no pescoço e no tórax anterior, que podem apresentar um eritema difuso e bolhas, ocasionalmente hemorrágicas � � • A pele do paciente exibe o sinal de Nikolsky positivo: descolamento da epiderme após tração manual Este sinal é precoce e aparece antes de surgirem as áreas de desnudamento espontâneo. • Dentro dos primeiros quatro a cinco dias as lesões eritematosas aumentam em número e tamanho. As áreas de eritema confluente p o d e m o r i g i n a r á r e a s d e s n u d a s , desprendendo epiderme necrótica, com !4 Carolina Queiroga de Miranda Tutoria - Problema 2 - UC 23 Medicina Unit P8 aspecto de escaldadura. Por definição, na SSJ estas áreas somam no máximo 10% da pele total. � Lesões mucosas • São universais e são fundamentais para a definição clínica da síndrome • Costumam ser extensas e muito sintomáticas • 2 ou mais membranas mucosas estão envolvidas, entre oral, ocular e genital. • Em 40% dos casos, as 3 estão comprometidas • Na mucosa oral (estomatite), os lábios, cavidade bucal, palato e língua podem apresentar lesões. • O quadro começa com queimação labial e oral, evoluindo com edema, eritema e bolhas que logo se rompem, deixando erosões vermelho hemorrágicas, cobertas por pseudomembranas branco acinzentadas e úlceras rasas aftosas. • Os lábios são recobertos por crostas hemorrágicas características da síndrome � � • As lesões orais são bastante dolorosas. Pode ocorrer acometimento de gengiva, faringe, lar inge e até esôfago e t raqueia. O envolvimento genital quase sempre inclui lesões erosivas (após rotura de bolhas hemorrágicas) ou purulentas, ocupando a vulva, a vagina ou a glande e a fossa navicular, podendo levar a retenção urinária e parafimose � • As lesões oculares são potencialmente graves e podem deixar sequelas. Há conjuntivite (olho vermelho) e queimação ocular, evoluindo para vesiculação, erosões dolorosas e lacrimejamento bilateral. • Em casos mais graves, surgem conjuntivite purulenta, pseudo- membranas, úlceras da córnea, uveíte anterior e panoftalmite. • As sequelas oculares podem levar à cegueira e podem ser: simbléfaro (aderência da conjuntiva palpebral à córnea), sinéquia, entrópio (inversão palpebral), ectrópio (eversão palpebral), triquíase (inversão ciliar),opacidades corneanas e cicatr izes. A intervenção de um oftalmologista na fase precoce é fundamental para o tratamento dessas lesões… Necrólise epidérmica tóxica • Também é comum fase prodrômica, assim como na SSJ • S u r g e u m r a s h c u t â n e o e r i t e m a t o s o morbiliforme, com ou sem lesões-alvo típicas, predominando na face e no tronco e evoluindo para a confluência • A pele nessa figura já apresenta sinal de Nikolski positivo: " • Ao longo de 4-5 dias, as lesões cutâneas transformam-se em grandes bolhas flácidas que deixam grandes áreas cutâneas desnudas, que aparecem como erosões gotejantes serosas intensamente eritematosas • O desnudamento atinge 30-90% da superfície corporal e assemelha-se a um grande queimado por escaldadura. " • O acometimento das mucosas é extenso e grave, tal como na SSJ. !5 Carolina Queiroga de Miranda Tutoria - Problema 2 - UC 23 Medicina Unit P8 ALTERAÇÕES ORGÂNICAS E LABORATORIAIS • A A SSJ e a NET, frequentemente, são acompanhadas de alterações laboratoriais inflamatórias e distúrbios hidroeletrolíticos. Estes são mais comuns e mais graves na NET. • Exemplos: leucocitose neutrofílica leve a moderada, anemia leve, hipoalbuminemia, microalbuminúria, elevação de transaminases, aumento do VHS e proteína C-reativa. • Na desidratação grave, pode haver azotemia pré-renal. • O acometimento orgânico é raro na SSJ e comum na NET. Predominam lesões no aparelho respiratório, no trato gastrointestinal e no fígado. • São descritos: dispneia, tosse, obstrução traqueal, desprendimento da mucosa traqueobrônquica, expectoração de cálculos b r o n q u i a i s , i n f i l t r a d o p u l m o n a r , broncopneumonia e raramente SDRA. • A sepse pode contribuir para alguns desses achados. • No trato gastrointest inal: diarreia, dor abdominal, hemorragia digestiva; no fígado, podemos ter hepatite com icterícia e elevação proeminente das enzimas hepáticas. TRATAMENTO • Embora alguns autores tenham sugerido a t rans ferênc ia rot ine i ra dos pacientes (especialmente aqueles com NET) para o centro de queimados, esta conduta não é necessária para a maioria dos casos. • As fórmulas de reposição volêmica para o grande queimado também não se aplicam à SSJ/NET, pois as lesões são diferentes: na queimadura, há lesão dérmica importante e a lesão vascular com extravasamento de fluidos para o interstício, é o principal mecanismo da perda fluida; na SSJ/NET, a lesão dérmica é discreta e a perda hidroeletrolítica ocorre b a s i c a m e n t e p e l o m e c a n i s m o transepidérmico (evaporação). • Os pacientes com SSJ/NET devem ser internados no hospital e tratados numa enfermaria com cuidados especializados • O principal tratamento é o de suporte, incluindo: 1. Reposição hidroeletrolítica, guiada pelos sinais vitais, hematócrito e eletrólitos séricos 2. Nutrição enteral (a maioria dos pacientes não tolera ingestão oral) 3. Asseio traqueobrônquico 4. Med idas o f ta lmo lóg icas p revent ivas (lubrificantes oculares, limpeza e remoção de adesões) 5. Debridamento da pele necrótica apenas quando terminar a progressão da doença (fase estável), recobrindo-se as lesões com gaze embebida em soro fisiológico ou curativos hidrocolóides. Deve ser evitada a su l fadiaz ina de prata, pelo r i sco de agravamento do mecanismo de destruição imunológica. • O uso de corticoides em dose alta (1 mg/kg/ dia de prednisolona) é bastante controverso!! Alguns autores preconizam o seu uso quando o paciente está na fase precoce da doença, enquanto ainda há progressão das lesões. • O tratamento é por período curto: uma a duas semanas e desmame rápido. • Outros autores contraindicam os corticoides por alegarem a piora do prognóstico, por agravarem as infecções. • O uso de antibioticoterapia sistêmica pro lática não é preconizado. Entretanto, qualquer sinal focal ou sistêmico de infecção deve imediatamente in- dicar coleta de material para cultura e início de antibióticos. Na fase inicial, predominam os Gram-posit ivos, especialmente o S.aureus; na fase tardia, devemos cobrir também P. aeruginosa. • Tratamentos inovadores têm sido testados, como a imunog lobu l ina in t ravenosa, plasmaferese, ciclosporina, ciclofosfamida, N- acetil- cisteína e fatores derivados de colônia (GCSF). • Um estudo com a talidomida não mostrou benefício. • A resposta com a imunoglobulina é excelente PROGNÓSTICO • Embora sejam doenças com potencial de graves complicações e até de fatalidade tanto a SSJ quanto a NET possuem curso autolimitado, com as lesões começando a regredir após três a seis semanas. • As lesões cicatriciais costumam afetar as mucosas, com especial importância para a ocular. • Ao contrário do grande queimado, não há necessidade de cirurgia plástica com enxerto cutâneo, pois a resolução das lesões de pele costuma ocorrer sem sequelas. • Os fatores de mau prognóstico são: idade avançada, HIV positivo, ingestão de múltiplos fármacos, lesão orgânica (especialmente renal), desnudamento extenso. A causa mais comum de morte é a septicemia. !6 Carolina Queiroga de Miranda Tutoria - Problema 2 - UC 23 Medicina Unit P8 Síndrome de DRESS • DRESS = Reação a Drogas com Eosinofilia e Sintomas Sistêmicos • Síndrome potencialmente fatal ocorrida após a exposição a medicamentos, caracterizada por: - Exantema - Febre - Alterações em exames laboratoriais (eosinofilia e/ou linfocitose atípica) - Envolvimento de órgãos internos • Consegue-se estabelecer uma relação causal com drogas em cerca de 80% dos casos, sendo que 10–20% a causa permanece desconhecida. • O que a diferencia das outras farmacodermias é o longo intervalo entre a exposição às drogas e o início do aparecimento do exantema e demais sintomas. • Este intervalo costuma ser de cerca de 2–6 semanas, em contraste com 4–9 dias para as erupções morbiliformes e 4–28 dias para síndrome de Stevens-Johnson/necról ise epidérmica tóxica • Sendo assim, ao lidarmos com um caso de exantema suspeito de farmacodermia, é importante que se conste no interrogatório não apenas o passado recente do uso de medicamentos, mas também também aqueles que o paciente recebeu até 1 mês e meio a 2 meses antes do aparecimento da erupção cutânea. DROGAS RELACIONADAS À DRESS " FISIOPATOLOGIA • Ainda não é totalmente compreendida • S a b e - s e q u e h á u m a f o r t e re s p o s t a imunológica específica à droga responsável pelo quadro, com ativação de linfócitos T. • Na fase aguda, há proliferação de linfócitos T ativados, incluindo CD4 e CD8, além do aumento na população de linfócitos Treg. • Acredita-se que essa proliferação de linfócitos Treg seja responsável por outra característica muito comum nos casos de DRESS: reativação de diversos vírus do grupo herpes (herpes vírus humano [HHV]-6, HHV-7, Epstein-Barr vírus [EBV] e citomegalovírus [CMV]). Desses, o mais comum é o HHV-6, que pode ser detectado em até 80% dos casos. • Em alguns pacientes, as manifestações clínicas dessa síndrome persistem apesar da suspensão da droga envolvida, coincidindo com a reativação do herpesvírus • Os sintomas clínicos do DRESS não parecem ser mediados apenas pela expansão oligoclonal de células T específicas do fármaco, mas também por células T antivirais que reação cruzada com drogas. • Portanto, tudo o que é necessário para a ocorrência de DRESS / DIHS são: i) os medicamentos; ii) o vírus e iii) sua interação com o sistema imunológico • Por esse motivo, alguns autores japoneses defendem a detecção da atividade desse vírus como critério diagnóstico para a síndrome DRESS, ainda que os critérios sugeridos não contenham esse item. Suspeita- se também que a recidiva desses vírus possa ter implicações na patogênese da DRESS, contr ibuindo para seu fenótipo e sua gravidade. • Vários estudos têm demonstrado uma relação de certoshaplótipos HLA em determinadas populações e o risco de desenvolvimento de DRESS. O risco pode ser de até 25% para indivíduos que tiveram parentes de primeiro grau que desenvolveram essa síndrome • Um certo grupo de drogas associadas a DRESS / DIHS, incluindo os anticonvulsivantes aromáticos, é metabolizado em intermediários reativos de oxigênio que parecem ser desintoxicados de forma ineficiente em pacientes com variações adquiridas ou farmacogenéticas do metabolismo dessas drogas. • Ant i conv u l s i v antes a romát i cos como carbamazepina, fenitoína e fenobarbital são metabolizados pelas enzimas do citocromo P450 hepático (CYP) e sofrem oxidação por hidroxilação aromática, com subsequente formação de óxidos de areno. - Os óxidos de areno tóxicos e são normalmente convertidos em metabólitos não tóxicos pela epoxi hidroxilase ou glutationa transferase. Em casos de defeito ou deficiência de epóxi hidroxilase, os óxidos de areno podem se !7 Carolina Queiroga de Miranda Tutoria - Problema 2 - UC 23 Medicina Unit P8 acumular e causar toxicidade celular direta ou resposta imune • O uso concomitante de lamotrigina e ácido valpróico aumenta a ocorrência desta s índrome, pois o ácido valproico e a lamotrigina competem pelo metabolismo hepático por glucuronidação, que duplica a meia-vida da lamotrigina e, possivelmente aumentaria a taxa de eventos adversos QUADRO CLÍNICO • Como dito, geralmente a erupção cutânea se inicia após 2–6 (até 2–8) semanas do contato com a droga indutora, ainda que não se possa excluir DRESS se os sintomas se iniciarem antes desse período. • O exantema começa como morbiliforme, que rapidamente progride para um eritema inf i l t rat ivo, di fuso e conf luente, com acentuação folicular. A face e a parte superior do tronco são os locais inicialmente acometidos. • Sugere-se DRESS quando a erupção atinge mais de 50% da área de superfície corporal e / o u i n c l u i d u a s o u m a i s d e s s a s características: - edema facial, - lesões infiltrativas - descamação - púrpura • Pode haver, numa pequena porção dos casos, aparecimento de bolhas, vesículas, pústulas ou até mesmo dermatite esfoliativa. " • O edema facial surge em metade dos casos e caracteristicamente é simétrico, persistente e associado ao eritema. Pode ocorrer acometimento de membranas mucosas em metade dos casos, mais frequentemente na boca ou na faringe (e raramente em mais de um sítio), caracterizado por inflamação e dor locais, com ou sem ulceração. Sendo assim, cuidado deve ser tomado para não se confundir esses quadros com escarlatina. " • O envolvimento de órgãos internos acontece em cerca de 90% dos pacientes, sendo o mais comum o fígado (60–80% dos casos, com elevação das transaminases e da fosfatase alcalina [FA], sinais de disfunção hepát ica [aumento de bi l i r rubinas e alteração do coagulograma] e até mesmo com sinais de encefalopatia pela hepatite aguda, com a l te ração do n íve l de consciência). Hepatites graves são as principais causas das mortes relacionadas à síndrome DRESS. • Outros órgãos frequentemente acometidos são os rins (10–30% dos casos, com nefrite intersticial aguda, aumento dos níveis de ureia e creatinina e proteinúria discreta, além de eosinofilia em análise de sedimento urinário) e os pulmões (5–25% dos casos, com s intomas inespecíf icos como tosse e taquidispneia). • Virtualmente, todos os órgãos do corpo podem ser acometidos. • Geralmente, a erupção cutânea se resolve gradualmente após a retirada da droga responsável, ao longo de 6–9 semanas, até a remissão completa. • Em até 20% dos casos, a doença pode se estender por meses em uma sucessão de remissões e recidivas. Esses casos geralmente se associam a envolvimento mais grave do fígado, à presença de linfocitose atípica e à reativação do HHV-6 • Assim, devemos suspeitar de síndrome DRESS sempre que o paciente se apresentar com e x a n t e m a r a p i d a m e n t e p r o g r e s s i v o associado a queda do estado geral e febre, especialmente naqueles que fizeram uso de medicamentos (particularmente aqueles listados na tabela 1 acima) nas últimas 2–6 semanas. EXAMES LABORATORIAIS • Leucocitose com eosinofilia (>700/mcL — 50– 90% dos casos) !8 Carolina Queiroga de Miranda Tutoria - Problema 2 - UC 23 Medicina Unit P8 • linfocitose atípica mono-like (30–70% dos casos) • Aumento de ALT/TGP - 80% dos casos, aumentada duas vezes o limite superior de normalidade • Aumento da FAL (1,5 vezes o limite superior de normalidade) • reativação do HHV-6 e outros vírus (40–60% dos casos). ESCORE DIAGNÓSTICO • RediSCAR - European Registry of Severe Cutaneous Adverse Reactions - excluído (<2 pontos) - possível (2–3 pontos) - provável (4–5 pontos) - definido (≥6 pontos). " TRATAMENTO E PROGNÓSTICO • A base do tratamento da síndrome DRESS é a identificação e suspensão imediata da droga responsável pela injúria. Caso a medicação seja um anticonvulsivante, o ácido valproico pode ser considerado como substituição para aqueles pacientes que não podem permanecer sem a droga antiepiléptica. • Os casos mais graves podem necessitar de hospitalização. Existe uma controvérsia em relação ao uso de corticoides no tratamento. • Para alívio do prurido e da inflamação da pele, recomendam o uso de corticoides tópicos de potência alta ou super alta. • Nos pacientes com acometimento grave de órgãos, o UpToDate recomenda uso de corticoides sistêmicos apenas no caso de envolvimento dos pulmões e dos r ins (prednisona/prednisolona na dose de 0,5 a 2 mg/kg/dia) até a melhora clínica, com retirada gradual ao longo de 8–12 semanas. Para o fígado, refere não haver consenso sobre sua utilização • Menos relatos ainda há em relação ao uso de outros imunossupressores, como a ciclosporina, cuja indicação se daria apenas para aqueles casos graves em que não se pode utilizar o corticoide. • Imunoglobulinas endovenosas tiveram relatos de benefícios para alguns pacientes e prejuízos para outros, não sendo amplamente indicadas até que haja novas evidências sobre elas. • Medicações antivirais para HHV-6 ou CMV, como ganciclovir, foscarnet ou cidofovir, só têm indicação para aqueles pacientes em que a reativação viral for comprovada e que suspeita-se estar contribuindo para a gravidade do quadro. • Nos casos em que a erupção cutânea com descamação for importante, os pacientes deverão ser conduzidos como se fossem grandes queimados, com atenção à fluidoterapia endovenosa. • O potencial ameaçador da vida da síndrome DRESS é elevado e a mortalidade da doença, a despeito de todo o suporte, gira em torno de 10% !9
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