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Indaial – 2019 Teoria da LiTeraTura ii Prof. Abraão Júnior Cabral e Santos 1a Edição Copyright © UNIASSELVI 2019 Elaboração: Prof. Abraão Júnior Cabral e Santos Revisão, Diagramação e Produção: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. Impresso por: SA237t Santos, Abraão Júnior Cabral e Teoria da literatura II. / Abraão Júnior Cabral e Santos. – Indaial: UNIASSELVI, 2019. 214 p.; il. ISBN 978-85-515-0392-8 1. Literatura. - Brasil. II. Centro Universitário Leonardo Da Vinci. CDD 801 III apresenTação Caro acadêmico, prepare-se para uma viagem através da leitura e do estudo de teorias sobre o texto literário. Ao cursar a disciplina de Teoria da Literatura I, você foi introduzido em alguns conceitos-chave e algumas obras clássicas, que estiveram no início das primeiras teorizações da literatura. Ora, com o passar dos séculos, essas teorias se expandiram, foram aprimora- das, levando-nos a dispor, na atualidade, de um grande leque de modos de compreensão e de interpretação dos textos literários. Entretanto, quanto mais formas de leitura apareceram, mais complexa ficou a tarefa de estudar literatura, pois quanto mais nos beneficiamos das novas teorias, mais nos é exigida atenção detalhada e minuciosa, visto que são muitos autores e muitas abordagens teóricas que, por vezes, contrapõem-se umas às outras. Por esse motivo, vamos apresentar as teorias em etapas, agrupando-as, para efeito didático, em três momentos distintos: um momento clássico (Uni- dade 1), um momento moderno (Unidade 2) e um momento contemporâneo (Unidade 3). O panorama clássico da literatura teve início com as teorizações de Platão e Aristóteles, que estabeleceram modos de análise que iam além das impressões corriqueiras que as obras causavam nos leitores/espectadores, impressões que em geral ficam no achismo: gostei, não gostei, eu acho isso, eu acho aquilo etc. Ora, com as ideias clássicas de “mimese” e “representa- ção” foi possível pensar as obras literárias fora desse “achismo” do senso comum, levando as análises literárias a serem pensadas de duas formas: de dentro para fora (análises intrínsecas); de fora para dentro (análises extrínse- cas); ou ainda através de uma mescla desses dois modos. O panorama moderno da literatura, por sua vez, radicalizou as abor- dagens internas do fenômeno literário ao colocar em relevo os elementos intrínsecos de análise, minimizando os contextos de produção em prol das verdades detectadas dentro das próprias obras. O olhar moderno partia da ideia de que o autor escreve muito mais do que pensa, ou seja, que a verdade de uma obra não estaria presente na pessoa do autor e sim na linguagem que conduz a escrita. Assim, com a fenomenologia, o formalismo e o estru- turalismo literários a verdade a ser analisada estaria presente nas próprias obras, visto que o fenômeno literário seria independente do contexto de pro- dução(autor) e de do contexto de recepção (leitor) das obras. O panorama contemporâneo da literatura, de natureza mais extrínse- ca, priorizou o lugar do leitor nas análises literárias ao invés das obras. Sur- giu no contexto das guerras mundiais, vividas ainda no panorama moderno, e que trouxe a catástrofe existencial pós-guerra para dentro dos textos, de IV Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades em nosso material. Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo. Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão. Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade. Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos! onde se pode observar a queda da aura da literária e a inserção do homem em sociedade nas análises literárias. Surgiram as escolas pós-estruturalistas, que abordariam a tecnologia na literatura e destacariam a importância do leitor na formação dos sentidos. Assim, questões como “quem é o leitor” ou “qual o contexto de recepção das obras” seriam respondidas pelas teorias em torno da “morte do autor”, da desconstrução e dos estudos culturais, que surgiram após o declínio do estruturalismo. Prof. Abraão Júnior Cabral e Santos NOTA V Olá acadêmico! Para melhorar a qualidade dos materiais ofertados a você e dinamizar ainda mais os seus estudos, a Uniasselvi disponibiliza materiais que possuem o código QR Code, que é um código que permite que você acesse um conteúdo interativo relacionado ao tema que você está estudando. Para utilizar essa ferramenta, acesse as lojas de aplicativos e baixe um leitor de QR Code. Depois, é só aproveitar mais essa facilidade para aprimorar seus estudos! UNI VI VII Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma disciplina e com ela um novo conhecimento. Com o objetivo de enriquecer teu conhecimento, construímos, além do livro que está em tuas mãos, uma rica trilha de aprendizagem, por meio dela terás contato com o vídeo da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complementares, entre outros, todos pensados e construídos na intenção de auxiliar teu crescimento. Acesse o QR Code, que te levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para teu estudo. Conte conosco, estaremos juntos nessa caminhada! LEMBRETE VIII IX UNIDADE 1 – PANORAMA CLÁSSICO DA LITERATURA ..........................................................1 TÓPICO 1 – A TEORIA E OS GÊNEROS LITERÁRIOS ...................................................................3 1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................................................3 2 O GÊNERO ENQUANTO COMPETÊNCIA DE LEITURA ..........................................................9 2.1 FUNÇÃO POÉTICA: PRESSUPOSTO COMUNICACIONAL DA ANÁLISE LITERÁRIA .......................................................................................................................................13 3 O GÊNERO COMO PRINCÍPIO DE CLASSIFICAÇÃO DAS OBRAS ....................................17 RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................22 AUTOATIVIDADE .................................................................................................................................24 TÓPICO 2 – ABORDAGENS A PARTIR DA OBRA LITERÁRIA ................................................27 1 INTRODUÇÃO .....................................................................................................................................27 2 O ESTILO, AQUILO QUE NOS É MAIS PRÓPRIO .....................................................................30 2.1 O TEXTO ENQUANTO CAMPO METODOLÓGICO DE ANÁLISE ....................................322.2 CORRENTES DE ANÁLISE INTERNA DOS TEXTOS LITERÁRIOS .....................................35 3 O VALOR DA OBRA: UMA QUESTÃO AXIOLÓGICA? ...........................................................45 RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................50 AUTOATIVIDADE .................................................................................................................................51 TÓPICO 3 – ABORDAGENS EXTERIORES À OBRA LITERÁRIA .............................................55 1 INTRODUÇÃO .....................................................................................................................................55 2 A LITERATURA SEGUNDO UM OLHAR EXTRÍNSECO .........................................................55 3 HISTÓRIA DA LITERATURA E O EIXO DIACRÔNICO ..........................................................58 3.1 CORRENTES DE ANÁLISE EXTERNA DOS TEXTOS LITERÁRIOS .....................................62 4 A OBRA ABERTA E AS FORMAS DE RECEPÇÃO .....................................................................66 LEITURA COMPLEMENTAR ...............................................................................................................70 RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................74 AUTOATIVIDADE .................................................................................................................................76 UNIDADE 2 – PANORAMA MODERNO DA LITERATURA .......................................................79 TÓPICO 1 – TEORIAS LITERÁRIAS DO SÉCULO XX ..................................................................81 1 INTRODUÇÃO .....................................................................................................................................81 2 ABORDAGENS LITERÁRIAS FRENTE À MIMESE ....................................................................86 3 O FORMALISMO RUSSO E A LITERATURA ..............................................................................93 RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................97 AUTOATIVIDADE .................................................................................................................................98 TÓPICO 2 – O ESTRUTURALISMO NA LITERATURA 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................103 2 O SENTIDO E A SIGNIFICAÇÃO LITERÁRIOS ......................................................................107 3 FENOMENOLOGIA, INTENCIONALIDADE E ESTRUTURA ..............................................111 3.1 PERCEPÇÃO FENOMENOLÓGICA DA LITERATURA .......................................................114 sumário X RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................118 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................119 TÓPICO 3 – LITERATURA E SOCIEDADE .....................................................................................121 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................121 2 O FATO HISTÓRICO INVADE O FATO LITERÁRIO ...............................................................122 3 A ESCOLA DE FRANKFURT ..........................................................................................................127 4 A QUERELA ADORNO-BENJAMIN .............................................................................................133 LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................139 RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................142 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................143 UNIDADE 3 – PANORAMA PÓS-MODERNO DA LITERATURA ...........................................147 TÓPICO 1 – PÓS-ESTRUTURALISMOS NA LITERATURA ......................................................149 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................149 2 TEORIAS PÓS-ESTRUTURALISTAS ............................................................................................154 3 QUADRO COMPARATIVO DE ANÁLISE ..................................................................................156 3.1 ENSAIO DE LEITURA CLÁSSICA .............................................................................................156 3.2 ENSAIO DE LEITURA MODERNA ...........................................................................................158 3.3 ENSAIO DE LEITURA CONTEMPORÂNEA ...........................................................................160 4 MORRE O AUTOR, NASCE O TEXTO..........................................................................................161 RESUMO DO TÓPICO 1......................................................................................................................165 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................166 TÓPICO 2 – A QUEDA DA AURA LITERÁRIA .............................................................................169 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................169 2 A DESCONSTRUÇÃO NA LITERATURA ..................................................................................170 2.1 O AUTOR COMO GESTO ............................................................................................................173 3 OS ESTUDOS CULTURAIS .............................................................................................................177 RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................181 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................182 TÓPICO 3 – DISCUSSÕES CONTEMPORÂNEAS: LITERATURA E OUTRAS LINGUAGENS ARTÍSTICAS ......................................................................................185 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................185 2 LITERATURA, INTERSEMIOSE E A AVENTURA TECNOLÓGICA .....................................188 2.1 LITERATURA E HIPERTEXTO ..................................................................................................195 3 PERSPECTIVAS DIDÁTICAS: ABORDAGENS SINCRÔNICA E DIACRÔNICA DA LITERATURA ........................................................................................................................................199 LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................204 RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................206 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................207 REFERÊNCIAS .......................................................................................................................................211 1 UNIDADE 1 PANORAMA CLÁSSICO DA LITERATURA OBJETIVOS DE APRENDIZAGEMPLANO DE ESTUDOS A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de: • compreender a diversidade dos estudos de teoria da literatura, que visam enriquecer as formas de leitura dos textos literários; • perceber a função poética e a teoria dos gêneros literários como formas teóricas que aprofundam os modos de leitura dos textos literários; • distinguir formas de análise em que prevalecem ora os dados internos, ora os dados externos das obras literárias; • verificar a necessidade da literatura e da teoria literária como direitos cul- turais importantes no processo civilizatório e de humanização da socie- dade. Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. TÓPICO 1 – A TEORIA E OS GÊNEROS TÓPICO 2 – ABORDAGENS A PARTIR DA OBRA LITERÁRIA TÓPICO 3 – ABORDAGENS EXTERIORES À OBRA LITERÁRIA Preparado para ampliar teus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverás melhor as informações. CHAMADA 2 3 TÓPICO 1 UNIDADE 1 A TEORIA E OS GÊNEROS LITERÁRIOS 1 INTRODUÇÃO Caro acadêmico, comecemos nossa viagem de estudos pelas abordagens teóricas da literatura clássica. Para fazê-lo, antes é necessário pensarmos acerca da necessidade de se estudar teoria, isto é, perguntar-se de antemão: para que serve a teoria? Para responder a essa questão, sugiro nos colocarmos no lugar do leitor, quando este lê um livro literário que particularmente lhe toca. Nunca lhe aconteceu, ao ler um livro, interromper com frequência a leitura, não por desinteresse, mas, ao contrário, por afluxo de ideias, excitações, associações? [...] Nunca lhe aconteceu ‘ler levantando a cabeça?’ É essa leitura, ao mesmo tempo irrespeitosa, pois que corta o texto, e apaixonada, pois que a ele volta e se nutre, que tentei escrever (BARTHES, 2004a, p. 26). O convívio profundo com as obras literárias fez muitos críticos, historiadores e teóricos da literatura perceberem – o francês Roland Barthes foi um deles – que as teorizações utilizadas na compreensão do fenômeno cultural que conhecemos como “literatura” nunca conseguem exceder o fascínio e o poder exercidos pela própria linguagem literária. Esse fascínio, que em geral sentimos diante de certas obras, também acomete aos escritores, quando eles, na condição de leitores, leem outros escritores, ou seja, quando, por meio de uma leitura apaixonada, mergulham em camadas de sentido que aparecem na obra por meio dessa forma virtuosa de leitura e de cujo banquete poderá vir a se alimentar o próprio escritor-leitor para compor sua próxima obra. Roland Barthes (2007b) veria nessa forma de leitura uma atividade produtiva que não é o ato complementar e passivo de uma escrita que tudo sabe e tudo diz, mas sim um poder que o leitor exerceria ao encontrar novos sentidos na obra, que nela não estão de forma explícita, mas que, entretanto, surgem dela mesma ao ser lida, ou seja: a eclosão de imagens e pensamentos que sequer o autor, quando a escreveu, suspeitaria: “até porque a linguagem, antes de ter uma significação, ela é significação, porque opera descentrando ou privando a linguagem constituída de seu aparente equilíbrio, reordenando-a a ponto de ensinar ao leitor – ou mesmo ao autor – o que ele não sabia pensar nem dizer” (MERLEAU-PONTY, 1991, p. 36). UNIDADE 1 | PANORAMA CLÁSSICO DA LITERATURA 4 Caro acadêmico, apresentamos o teórico da literatura Roland Barthes, um dos autores-chave do presente livro didático, que percorreu várias correntes teóricas e filosóficas sem jamais perder o prazer da literatura: Quem foi, afinal, Roland Barthes? Um teórico da literatura? Um crítico literário, teatral, cultural? Um semiólogo, analista das imagens e da moda? Um teórico da fotografia? Um filósofo? Um conselheiro sentimental? Em que corrente intelectual situá-lo? Foi um marxista? Um estruturalista? Um subjetivista? A que gênero pertencem seus escritos? Jornalístico, ensaístico, romanesco, didático? A que período: clássico, moderno, pós- moderno? Barthes foi tudo isso, sucessiva ou concomitantemente, e acima de tudo um notável escritor que, 26 anos após sua morte, continua a fascinar os mais variados leitores, por sua inteligência e seu poder de sedução. Barthes nasceu na França, em 1915. Sua carreira intelectual foi atípica. Tendo sofrido de tuberculose com várias recaídas, começou sua carreira como professor no estrangeiro e passou parte do tempo da Segunda Guerra em sanatórios. Somente nos anos de 1950 começou a ser notado como ensaísta literário originalíssimo (O grau zero da escrita), crítico de teatro e autor de crônicas ferinas em que analisava os mitos da sociedade francesa contemporânea (Mitologias). Nos anos de 1960, notabilizou-se como um dos representantes mais famosos do estruturalismo (Elementos de semiologia, Crítica e verdade, Sistema da moda). Na década de 1970, com O prazer do texto, Roland Barthes por Roland Barthes e S/Z, abandonou o projeto semiológico e iniciou uma fase de escrita vincadamente pessoal, caracterizada pela aliança da inteligência crítica com a sensualidade verbal. Os Fragmentos de um discurso amoroso, em 1977, surpreendeu como um inesperado best-seller. No mesmo ano, Roland Barthes ingressou no Collège de France, onde ministrou quatro cursos anuais (Como viver junto, O Neutro e A preparação do romance 1 e 2). Sua aula inaugural (Aula), defendendo e ilustrando “o saber com sabor”, fora concebida como um novo projeto de vida, mas foi, na verdade, seu testamento intelectual. No auge da fama, Barthes foi atropelado por uma caminhonete, na frente do Collège de France, e faleceu em março de 1980. Seu último livro, A câmara clara (ensaio sobre a fotografia) foi publicado postumamente, naquele mesmo ano. FONTE: PERRONE-MOISÉS, L. Roland Barthes. In: BARTHES, R. O rumor da língua. São Paulo: Martins Fontes, 2004. IMPORTANT E Que leitor especial é esse? Como age, como funciona sua leitura, qual o seu segredo? E para nós, leitores comuns, haveria uma forma adequada de ler possibilitada pela teoria? A título de exemplo, observe-se a forma de leitura e a consequente emergência do inusitado, que ocorre à escritora Clarice Lispector ao ler Grande Sertão: Veredas, de João Guimarães Rosa, revelada em carta ao amigo, também escritor, Fernando Sabino: TÓPICO 1 | A TEORIA E OS GÊNEROS LITERÁRIOS 5 Washington, 11 dezembro 1956, terça-feira. Fernando, Estou lendo o livro de Guimarães Rosa, e não posso deixar de escrever a você. Nunca vi coisa assim! É a coisa mais linda dos últimos tempos. Não sei até onde vai o poder inventivo dele, ultrapassa o limite imaginável. Estou até tola. A linguagem dele, tão perfeita também de entonação, é diretamente entendida pela linguagem íntima da gente – e nesse sentido ele mais que inventou, ele descobriu, ou melhor, inventou a verdade. Que mais se pode querer? Fico até aflita de tanto gostar. Agora entendo o seu entusiasmo, Fernando. Já entendia por causa de Sagarana, mas este agora vai tão além que explica ainda mais o que ele queria com Sagarana. O livro está me dando uma reconciliação com tudo, me explicando coisas adivinhadas, enriquecendo tudo. Como tudo vale a pena! A menor tentativa vale a pena. Sei que estou meio confusa, mas vai assim mesmo, misturado. Acho a mesma coisa que você: genial. Que outro nome dar? Esse mesmo. Me escreva, diga coisas que você acha dele. Assim eu ainda leio melhor. Um abraço da amiga. FONTE: SABINO, F. Cartas perto do coração: dois jovens escritores unidos ante o mistério da criação. Fernando Sabino e Clarice Lispector. Rio de Janeiro: Record, 2001. p. 72. O livro em questão, Grande Sertão: Veredas, de João Guimarães Rosa, é construído em uma linguagem complexa, portanto, difícil para o leitor comum, já que se distancia daquela forma que praticamos no dia a dia – linguagem que geralmente utilizamos como uma ferramenta para fins práticos, comona comunicação diária – e não para despertar a sensibilidade e o pensamento. Um texto assim complexo requer do leitor uma atitude diferenciada diante de cada página, a saber: que comece decodificando cada frase, cada parágrafo, soletrando as palavras na superfície legível do texto e emprestando seu olhar e sua visão de mundo até que, persistindo assim, em certo momento o texto “pega” e passa a conduzi-lo a lugares que nunca imaginaríamos chegar. Dessa forma, os sentidos e as imagens que emergem de uma boa leitura, embora não sejam diretamente acessíveis a todos os leitores, na medida em que a boa leitura requer um certo grau de complexidade e especialização do leitor, por outro lado são comunicáveis a todo e qualquer leitor através da mediação e das observações de um analista crítico ou de um teórico da literatura: “a razão está em que o sentido de uma obra (ou de um texto) não pode fazer-se sozinho; o autor nunca produz mais do que presunções de sentido, formas, por assim dizer, e é o mundo que as preenche” (BARTHES, 2007b, p. 14). UNIDADE 1 | PANORAMA CLÁSSICO DA LITERATURA 6 FIGURA 1 – EDIÇÕES INICIAIS DE GRANDE SERTÃO: VEREDAS FONTE: <http://2.bp.blogspot.com/_nf3KMZDx4Aw/TEpOZjFvxyI/AAAAAAAABuM/ TpFU8cqUJo0/s1600/Grandes_sertoes_capa.jpg>. Acesso em: 10 jan. 2019. Clarice Lispector e Guimarães Rosa, vale lembrar, são expoentes da literatura brasileira da geração modernista de 1945. São, também, autores consagrados pela crítica especializada e, portanto, são lidos, na atualidade, como autores clássicos, isto é, como participantes do cânone literário brasileiro. Fernando Sabino, amigo de ambos, é escritor de safra menor, embora sua obra seja conhecida do grande público. Sugerimos a você, caro acadêmico, assistir aos vídeos-entrevista: Guimarães Rosa – Entrevista rara em Berlim, 1962, no link: https://www.youtube.com/watch?v=ndsNFE6SP68; e Panorama com Clarice Lispector, no link: https://www.youtube.com/watch?v=ohHP1l2EVnU. Façamos um exercício, para entender melhor a leitura feita pela escritora Clarice Lispector, refletindo sobre alguns trechos específicos de Grande Sertão: Veredas, de João Guimarães Rosa, antes, leia trechos da obra: DICAS TÓPICO 1 | A TEORIA E OS GÊNEROS LITERÁRIOS 7 (O diabo existe e não existe): de primeiro, eu fazia e mexia, e pensar não pensava. Não possuía os prazos. Vivi puxando difícil de difícil, peixe vivo no moquém: quem mói no asp’ro não fantaseia. Mas, agora, feita a folga que me vem, e sem pequenos dessossegos, estou de range rede. E me inventei nesse gosto de especular ideia. O diabo existe e não existe. Dou o dito. Abrenúncio. Essas melancolias. O senhor vê: existe cachoeira; e pois? Mas cachoeira é barranco de chão, e água caindo por ele, retombando; o senhor consome essa água, ou desfaz o barranco, sobra cachoeira alguma? Viver é negócio muito perigoso [...] (p. 25). (O razoável sofrer e a alegria do amor): Que o que gasta, vai gastando o diabo de dentro da gente, aos pouquinhos, é o razoável sofrer. E a alegria do amor – compadre meu Quelemém diz. Família. Deveras? É, e não é. O senhor ache e não ache. Tudo é e não é... quase todo mais grave criminoso refor, sempre é muito bom marido, bom filho, bom pai, e é bom amigo-se-seus-amigos! Sei desses. Só que tem os depois – e Deus, junto. Vi muitas nuvens (p. 27). FONTE: ROSA, J. G. Grande Sertão: Veredas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001. Caro acadêmico, leia e registre suas impressões a propósito dos dois excertos do Grande Sertão: Veredas: O diabo existe e não existe e O razoável sofrer e a alegria do amor, de Guimarães Rosa. Em seguida, anote o que mais lhe chamou a atenção: as significações, o trabalho com a linguagem, o modo como o texto ressoa em você. Você deve ter sentido um certo estranhamento ao ler os dois textos, não é mesmo? Esse estranhamento diante da linguagem de Guimarães Rosa é, entretanto, uma das características celebradas como de um bom texto literário para algumas teorias que assentam suas análises no tratamento diferenciado da linguagem, tal como se observará na teoria do formalismo russo, que veremos em tópico mais adiante. Para efeito didático, entretanto, compare as suas impressões, anotadas na autoatividade anterior, com algumas de Clarice Lispector (2001, p. 72), como em: “a linguagem dele, tão perfeita também de entonação, é diretamente entendida pela linguagem íntima da gente – e nesse sentido ele mais que inventou, ele descobriu, ou melhor, inventou a verdade”, ou ainda: “o livro está me dando uma reconciliação com tudo, me explicando coisas adivinhadas, enriquecendo tudo”. Observe que essa leitora-escritora Clarice Lispector (2001) tende a encontrar, na obra que admira, imagens e pensamentos (“linguagem íntima da gente”, “me explicando coisas adivinhadas” etc.) que, embora lá não estejam ditas de forma explícita, surgem a ela, leitora especial, por meio de sua forma diferenciada de leitura. UNIDADE 1 | PANORAMA CLÁSSICO DA LITERATURA 8 Ora, é dessa mesma matéria, ou seja, das intuições que surgem das leituras das obras, seja das leituras profundas dos leitores-escritores, seja das impressões que leitores especializados colhem dos textos, que pode surgir um novo dado revelador, uma lucidez comunicável não apenas ao escritor, mas também a nós, leitores comuns, quando nossa leitura está sendo mediada pelos olhares especializados do crítico, do historiador ou do teórico da literatura. A literatura, portanto, distingue-se da teoria da literatura, pois a escrita e a leitura de fruição são experiências relativamente livres tanto para o escritor quanto para o leitor, enquanto a análise literária, que se apoia na teoria, pressupõe que tal liberdade ceda lugar a uma fundamentação teórica que vai além das opiniões do senso comum. A literatura cria o seu próprio universo, semanticamente autônomo em relação ao mundo em que vive o autor, com seus seres ficcionais, seu ambiente imaginário, seu código ideológico, sua própria verdade: pessoas metamorfoseadas em animais, animais que falam a linguagem humana, tapetes voadores, cidades fantásticas, amores incríveis, situações paradoxais, sentimentos contraditórios etc. (D’ONOFRIO, 2006, p. 19). Em outras palavras, queremos dizer que há uma forma de leitura, comum tanto ao escritor quanto ao leitor especialista de literatura – crítico, historiador ou teórico – que se distingue da leitura superficial ou apressada do cotidiano, na qual os leitores em geral buscam reconhecer seus próprios valores e assim, por não estarem abertos à complexidade que constitui a atividade de leitura, dificilmente modificam seus modos usuais de pensar a realidade: Tratava-se de despertar a vigilância do leitor, de inquietá-lo nas suas certezas, de abalar sua inocência ou seu torpor, de alertá-lo oferecendo- lhe os rudimentos de uma consciência teórica da literatura. A teoria da literatura, como toda epistemologia, é uma escola de relativismo, não de pluralismo, pois não é possível deixar de escolher (COMPAGNON, 2012, p. 256). Contrário a isso, há outro tipo de abordagem realizada por quem pretende ir além da face visível do texto, percorrendo frases, parágrafos e páginas em busca de sentidos novos, insuspeitados, que podem transformar o ato aparentemente simples de ler em uma forma sofisticada de interação na qual a intenção inicial do autor, que predizia uma certa visão de mundo, não é apenas completada pelo ato de leitura, mas ampliada pelo entrecruzamento dos pontos de vista de quem escreve e de quem lê. Quer dizer: se a obra não for demasiado repetitiva, se ela não for fútil, se não se prestar apenas a atender às demandas mercadológicas do fácil e do consumível, então essa obra deixa o leitor livre para ir além de um roteiro previsto, fazendo dele coautor da obra, capaz de ir além dos interesses imediatos ao confrontar seu mundo pessoal ao conjunto de valores do que está escrito, cujo resultado será não apenas a sofisticação da leitura e dopensamento, mas, sobretudo, a formação de um leitor crítico. TÓPICO 1 | A TEORIA E OS GÊNEROS LITERÁRIOS 9 É assim que Eagleton (2006) corrobora a importância da teoria, e não apenas da teoria literária, por sua capacidade de libertar o leitor do achismo (eu acho isso, você acha aquilo etc.) que geralmente sustenta o diálogo monológico e vazio de todo aquele que se acomoda ao discurso habitual, contra o qual a teoria, a ele se opondo, capacita o leitor a identificar os pressupostos teóricos que sustentam toda e qualquer manifestação impressionista do senso comum. O economista J. M. Keynes observou certa vez que os economistas que desprezavam a teoria, ou que diziam sair-se melhor sem ela, estavam simplesmente presos a uma teoria mais antiga. Isso também se aplica aos estudantes e críticos de literatura [...]. A hostilidade para com a teoria geralmente significa uma oposição às teorias de outras pessoas, além de um esquecimento da teoria que se tem (EAGLETON, 2006, p. XI). 2 O GÊNERO ENQUANTO COMPETÊNCIA DE LEITURA Como pode se depreender do subtópico anterior, a formação de um leitor crítico e autônomo pressupõe ações educacionais que confiram uma certa competência de leitura ao educando, de modo a que cada leitor em particular possa extrapolar os juízos fáceis e mercadológicos, que são mais acessíveis ao público em geral, para ir além das impressões e opiniões pessoais de cada um. Isso implica em propiciar minimamente ao leitor condições de apreender a pulsação dupla da teoria literária, a saber: ora entre os juízos críticos que refletem sobre o valor literário de uma obra, ora entre os juízos históricos que situam a obra em determinado contexto de produção e recepção. Assim, ao abdicar da falsa pretensão de construir uma ciência clara e objetiva do signo literário, tanto o crítico e o historiador literário, quanto o teórico da literatura podem se debruçar não mais sobre as tradicionais explicações que buscam definir o que é literatura, para, ao invés disso, traçar roteiros que possam orientar as formas de compreensão e de leitura praticadas em cada contexto de recepção das obras literárias. Mais certo do que limitar o papel da literatura na vida social, é admitir sua plurifuncionalidade. Além da função estética (arte da palavra e expressão do belo), uma obra literária pode possuir, concomitantemente, a função lúdica (provocar um prazer), a função cognitiva (forma de conhecimento de uma realidade objetiva ou psicológica), a função catártica (purificação dos sentimentos) e a função pragmática (pregação de uma ideologia) (D’ONOFRIO, 2006, p. 23, grifo do original). Duas observações decorrem daí. A primeira: não há, tanto em literatura quanto em qualquer outra forma de arte, uma leitura unívoca e explicativa que desse conta da pluralidade de sentidos e imagens que emergem de uma obra. A segunda: embora não haja uma forma única de apreciação de uma obra, entretanto, há estratégias que possibilitam formas mais críticas e aprofundadas UNIDADE 1 | PANORAMA CLÁSSICO DA LITERATURA 10 de leitura, e essas podem ser adotadas ao invés de se demandar ao leitor que tenha o mesmo olhar inquietante de um outro escritor, tal como observamos em Clarice Lispector lendo Grande sertão: veredas. Destarte, se não há como dominar um texto literário a partir de um discurso objetivo, de uma metalinguagem literária, que seria a falsa pretensão de uma ciência da literatura clara e objetiva, já que, como bem pontuou Merleau- Ponty (1991, p. 36), a linguagem tem o poder de “ensinar ao leitor – ou mesmo ao autor – o que ele não sabia pensar nem dizer”, então caberia ao especialista em literatura apontar caminhos mais acessíveis, não menos densos nem menos complexos, mas em certa medida tão fascinantes como são os próprios textos literários. Ora, esse fato não apenas confere relevância aos estudos de teoria da literatura, como também põe em relevo o poder de fascinar que a obra literária exerce sobre o leitor distraído e que pode permanecer em outro tipo de leitor, nessa espécie de arquileitor, capaz de compreender em profundidade as obras literárias em circulação para além da fruição despreocupada do leitor comum, isso na medida em que reporta suas intuições a um instrumental técnico específico, que se vale de diversas disciplinas. “A literatura assume muitos saberes [...]. Se, por não sei que excesso de socialismo ou barbárie, todas as nossas disciplinas devessem ser expulsas do ensino, exceto numa, é a disciplina literária que devia ser salva, pois todas as ciências estão presentes no monumento literário” (BARTHES, 2007b, p. 17). Por outro lado, desde um ponto de vista cronológico, essas formas de teorizar a literatura, embora múltiplas, variaram, tanto quanto variou a própria literatura, através do tempo e das condições de produção, de comercialização e de valoração dos textos de acordo com certas tendências presentes em cada época. Assim, três perspectivas poderiam situar a abordagem das obras, estabelecendo panoramas gerais de compreensão, quais sejam: panorama clássico, panorama moderno e panorama pós-moderno ou contemporâneo. No presente tópico, abordaremos o panorama clássico da literatura, observando as ferramentas e o contexto que propiciaram a apreciação e a compreensão das obras literárias até meados da segunda metade do século XIX. Nesse sentido, o primeiro modo de leitura de uma obra que foi dado ao leitor, conferindo-lhe certo grau de liberdade na medida em que o municiava com uma classificação tipológica das obras, foi a formulação da teoria dos gêneros literários: “O gênero, como código literário, conjunto de normas, de regras do jogo, informa o leitor sobre a maneira pela qual ele deverá abordar o texto, assegurando, dessa forma, a sua compreensão. Nesse sentido, o modelo de toda teoria dos gêneros é a tripartição clássica dos estilos” (COMPAGNON, 2012, p. 155). TÓPICO 1 | A TEORIA E OS GÊNEROS LITERÁRIOS 11 De fato, se as obras literárias são inúmeras e diversificadas, para estudá- las o leitor necessitaria de uma chave de leitura que permitisse entendê-las de uma forma mais geral, com certo grau de universalismo, compreendendo-as em suas características comuns e classificando-as em determinados grupos, segundo a tripartição genérica: lírico, épico-narrativo e dramático. “O gênero, como taxinomia, permite ao profissional classificar as obras, mas sua pertinência teórica não é essa: é o de funcionar como um esquema de recepção, uma competência do leitor, confirmada e/ou contestada por todo texto novo num processo dinâmico” (COMPAGNON, 2012, p. 155). Como se vê, a teoria dos gêneros literários possibilitaria ao leitor apreender o fenômeno textual sem, entretanto, fechá-lo em modelos, funcionando como uma espécie de mapa de orientação aos leitores-navegantes que, em meio ao mar de livros, passariam a percorrer o labirinto de textos guiados por estratégias de classificação e de comunicação possíveis segundo a tipologia lírica, narrativa ou dramática. Ademais, a teoria dos gêneros teria, em sua acepção moderna, a virtude de não apenas orientar a leitura, mas também de apresentar uma interface descritiva sem o demérito de anular as surpresas e a inventividade que pudessem vir a ser apresentadas por novas obras ou obras imprevisíveis: A concretização que toda leitura realiza é, pois, inseparável das imposições de gênero, isto é, as condições históricas próprias ao gênero, ao qual o leitor imagina que o texto pertence, lhe permitem selecionar e limitar, dentre os recursos oferecidos pelo texto, aqueles que sua leitura atualizará (COMPAGNON, 2012, p. 155-156). O vocábulo gênero, quando aqui empregado, restringe-se apenas ao sentido da esfera do literário e não aos “gêneros do discurso”, formulado pelo filósofo, e também teórico da literatura, Mikhail Bakhtin (2003), que pensou o gênero como um dos eixos do pensamento linguístico contemporâneo. O substantivo “gênero” pressupõe, nesse estudo,necessariamente o adjetivo “literário”, portanto, o “gênero literário” se distancia da acepção geral do termo gênero – textual ou do discurso – que se presta à classificação de toda mensagem linguística e não especificamente às mensagens da literatura. Observe-se, a título de exemplo, a classificação diversificada dos gêneros discursivos, vasta e incessante: gêneros da esfera do cotidiano (conversação familiar, conversação social, diário íntimo, carta pessoal, convite etc.); gêneros da esfera jornalística (reportagem, entrevista, notícia, editorial, artigo etc.); gêneros da esfera da publicidade (anúncio, prospecto etc.); gêneros da esfera científica (artigo, tese, conferência, resenha etc.); gêneros da esfera da produção (ordem de serviço, manual de instrução, aviso, informações, pauta etc.); gêneros da esfera religiosa (sermão, encíclica, parábola etc.); gêneros da esfera de negócios (contrato, ofício, memorando, requerimento, carta oficial, ata etc.); gêneros da esfera jurídica (lei, decreto, petição etc.); gêneros da esfera escolar (resumo, dissertação, seminário, livro didático etc.). IMPORTANT E UNIDADE 1 | PANORAMA CLÁSSICO DA LITERATURA 12 Em meio a essa vasta tipologia, a literatura estaria situada nos gêneros da esfera artística (poema, conto, romance, drama, fábula, história em quadrinhos etc.), mas tal não se verifica, pois uma das especificidades do texto literário – a função poética, que veremos ainda nessa unidade – pode valer-se de textos de outras esferas de gênero linguístico. O caso mais exemplar são os Sermões, do Padre Antônio Vieira, que, embora escritos em gênero da esfera religiosa, apresenta efeito literário, dado o tratamento diferenciado que o autor conferiu à linguagem. A título de exemplo vimos, na leitura de alguns excertos Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa – texto pertencente ao gênero literário épico-narrativo – uma das virtudes comuns a todas as grandes obras literárias, a saber, o fato de oferecerem imagens ou dar sentidos que não estão escritos na obra propriamente dita, mas que são produzidos por um determinado ato da leitura, como o que fez Clarice Lispector na missiva endereçada a Fernando Sabino. No caso em questão, a escritora Clarice Lispector registra suas impressões de leitora no gênero discursivo “carta”, cuja característica é a informalidade, portanto, sem a pretensão consciente de teorizar sobre o fenômeno literário que advém da obra Grande Sertão: Veredas. Entretanto, as impressões da escritora modernista, dado o seu talento refinado e o grau intuitivo de sua prosa, estão registrados na referida carta em forma de ideias-chave que abrem novas possibilidades de leitura da própria obra de Guimarães Rosa. Esses sentidos e imagens, que aparecem enquanto ideias-chave, não estão no texto de forma aparente, mas, a depender da postura do leitor e do modo como a obra for lida, passam a ser construídos conjuntamente através do diálogo entre a intencionalidade do autor – já que este, ao compor a obra, tem certa expectativa de como ela será lida e prevê determinado horizonte de leitura – e os modos de sentir e de perceber de cada leitor em particular. Nessa análise, em que se coloca a intencionalidade autoral em diálogo com os modos de percepção do leitor contextualizado, é necessário compreender o fenômeno literário como um tipo de mensagem linguística específica, na qual os signos, embora se reportem a uma realidade externa, ou seja, embora se refiram a algo exterior ao próprio texto, tendem a não desaparecer do horizonte de leitura. A linguagem literária [...] é obrigada a desviar-se da norma linguística. Na linguagem científica e diária faz-se largo uso de estereótipos, seguindo padrões linguísticos e petrificando a palavra. O cientista e o homem comum não pensam no código que utilizam: o uso linguístico cria automatismos psíquicos e intelectuais que levam à perda do sentido do significante. A força de repetição aniquila o significado original da palavra, que perde seu poder de criatividade (D’ONOFRIO, 2006, p. 15). TÓPICO 1 | A TEORIA E OS GÊNEROS LITERÁRIOS 13 Quando enunciamos uma mensagem do tipo “água mole em pedra dura...”, de imediato o leitor familiarizado ao texto completa a frase seguinte sem dificuldade e sem necessariamente compreender o seu significado. Essa frase, pertencente ao gênero lírico, chamar-se-á em literatura de “verso”, pois tem o poder de reter em nossa memória um sentido não lógico inscrito nos signos a despeito da intenção autoral, isso porque fixamos, na maior parte das mensagens no gênero lírico, o jogo de sonoridades, ritmos e rimas que nos fará concluir “... tanto bate até que fura”. Dessa forma, antes de compreender a tripartição das obras segundo a tipologia dos gêneros literários, é necessário compreender quando uma mensagem, um texto, uma obra são literatura, ou seja, a especificidade da mensagem literária em relação às outras mensagens utilizadas na comunicação humana, em razão do que devemos observar no comportamento da língua de acordo com os elementos e funções da comunicação postulados pelo linguista Roman Jakobson. “Sabe- se que a língua é um corpo de prescrições e de hábitos, comum a todos os escritores de uma época. Isso quer dizer que a língua é como uma Natureza que passa inteiramente através da palavra do escritor, sem, no entanto, dar- lhe nenhuma forma” (BARTHES, 2004b, p. 9). 2.1 FUNÇÃO POÉTICA: PRESSUPOSTO COMUNICACIONAL DA ANÁLISE LITERÁRIA É saber corrente que Roman Jakobson lançou um novo olhar sobre o fenômeno literário ao caracterizar a literatura como uma forma de mensagem linguística, mas cuja especificidade é voltar-se mais para si mesma do que para o referente a que visa, caracterizando assim a função poética. A linguagem literária acentua o próprio signo linguístico, estando orientada para a mensagem como tal e não apenas para seu significado. Sua função, mais do que referencial, é essencialmente expressiva, pois confere um novo sentido às palavras. Roman Jakobson, já nas Teses de 1929, que deram início ao movimento chamado de Formalismo Russo, ditava a norma da arte em geral: ‘o princípio organizador da arte, em função do qual ela se distingue das outras estruturas semiológicas, é que a intenção é orientada não para o significado, mas para o próprio signo’ (D’ONOFRIO, 2006, p. 12-13). Assim, ao pensar a linguagem como meio de comunicação, Jakobson associou a língua a um código não apenas individualizado, mas realizado em um contexto comunicativo, no qual comparecem seis fatores da comunicação alinhados a seis elementos e seis funções linguísticas que se combinam segundo determinadas regras para transmitir uma mensagem entre um emissor e um receptor. UNIDADE 1 | PANORAMA CLÁSSICO DA LITERATURA 14 FIGURA 2 – ELEMENTOS E FUNÇÕES DA COMUNICAÇÃO EM ROMAN JAKOBSON FONTE: <http://www.acrobatadasletras.com.br/2014/03/elementos-da-comunicacao.html>. Acesso em: 1° nov. 2019. O que se pode notar no esquema, referenciado na Figura 2, é a presença de seis elementos sempre presentes no ato de comunicação: emissor, código, mensagem, receptor, referente e canal, que se destacam conforme a ênfase da interlocução recaia sobre um dos seis polos, criando funções a eles correspondentes, respectivamente: função emotiva, função metalinguística, função poética, função conativa, função referencial (polo do objeto, da verdade) e função fática. Nessa linha de pensamento, a mensagem literária, como qualquer outro tipo de mensagem, embora vise um sentido a ela exterior, dá-se na relação entre um emissor distinto, no caso em questão, emissor autor literário – transmudado, conforme o gênero literário, em narrador, eu lírico ou ator – e entre um receptor que com ela interage, ou seja, um leitor previsto, idealizado. Essa mensagem, caracterizando a função poética, tem como especificidade não querer desaparecer em proveito do sentido a que ela se refere. De fato, como sublinhou Eagleton (2006), quandoutilizamos as mensagens apenas para fins comunicacionais, essas mensagens tendem a desaparecer logo que o sentido textual ou discursivo é compreendido. Por exemplo, se perguntamos a algum transeunte na rua: “que horas são, por favor?”, o nosso interlocutor não atentará para a especificidade das palavras “que” “horas” “são” “por” “favor”, pois, assim que compreende o sentido a que o texto se refere, ele esquece a mensagem em si e elabora, de imediato, uma resposta plausível: “São ‘x’ horas da tarde”. A mensagem literária, ao contrário, tende a reter o poder sonoro dos signos, como se houvesse um sentido em cada significante para além do que ele quer significar. Assim, no exemplo em questão, se ao encontrarmos o mesmo transeunte, perguntarmos: “tu, noivo imaculado da morte, podes me dizer em que TÓPICO 1 | A TEORIA E OS GÊNEROS LITERÁRIOS 15 hora de nossa alma estamos?”, essa mensagem provavelmente não desaparecerá da memória de quem a escutou, causando no interlocutor não uma resposta imediata, como no caso anterior, mas um visível estranhamento. A linguagem poética insurge-se contra o automatismo e a estereotipação do uso linguístico, reavivando arcaísmos, criando neologismos, inventando novas metáforas, ordenando de um modo diferente conceitos, carregam representações sensoriais, através da metrificação, da rima, da assonância, do ritmo, da sinestesia etc. A novidade do significante linguístico causa no leitor um efeito de estranhamento, que o obriga a refletir na formulação da mensagem (D’ONOFRIO, 2006, p. 15). Embora não seja apenas esse atributo que caracteriza um texto literário, em Jakobson é esse poder da mensagem de manter a atenção sobre ela mesma, a despeito do sentido comunicado, que caracteriza a função poética. As outras formas de mensagem, consequentemente, desaparecem em prol dos elementos comunicativos e de suas respectivas funções: emissor (função emotiva); do receptor (função conativa ou apelativa); do referente (função referencial); do canal de comunicação (função fática); e do código linguístico (função metalinguística). Como exercício de fixação, analise as mensagens a seguir observando quais delas encontram-se na função poética, caracterizando, a seu ver, quais delas seriam possivelmente mensagens literárias: a) “noite escura dá medo”; b) “noite alta, céu tristonho, a quietude é quase um sonho”; c) “você sempre me telefona de casa ao meio-dia”; d) “sempre que ao telefone me falavas, eu diria, que falavas de uma sala, toda de luz invadida”. Caro acadêmico, você deve ter percebido que, nas letras “b” e “d”, as mensagens não buscam apenas passar informações objetivas, mas chamar a atenção para si mesmas através de um trabalho de rebuscamento com a linguagem; estão, portanto, na função poética. Por outro lado, as mensagens expressas nas letras “a” e “c” tendem a ser esquecidas assim que são comunicadas; são mensagens neutras, objetivas, que se encontram na função referencial. Ademais, para além de observar a função poética como um dos atributos das mensagens literárias, o esquema da comunicação de Jakobson se prestaria a, também, acessar modos distintos de abordagem teórica, a depender de sua maior ou menor proximidade aos polos do emissor, do receptor ou da mensagem. Como a função poética, mesmo não sendo uma exclusividade da linguagem literária, é o elemento fundamental para diferenciar um produto linguístico de arte de outro que não o é, assim a predominância do uso da terceira pessoa caracteriza a “narratividade” de um texto, a da segunda pessoa sua “dramaticidade” e a da primeira pessoa sua “liricidade” (D’ONOFRIO, 1990, p. 13-14). UNIDADE 1 | PANORAMA CLÁSSICO DA LITERATURA 16 Dessa forma, as roteirizações do signo literário funcionariam não apenas como mapas abertos de análise, mas também poderiam oscilar, como um pêndulo, de três maneiras distintas: ora para a esquerda, onde predominaria pontos de vista exteriores às obras, suas condições de produção, elementos biográficos e contextuais, ligados ao polo autoral do emissor e, portanto, dando a ver a mensagem literária por um viés histórico. Esse viés histórico permaneceria quando o pêndulo oscilasse também para a direita, centrando-se no polo do receptor, no polo da leitura, do observador, que destacaria, na análise do contexto, as formas de apreensão da leitura, do multiculturalismo, dos elementos etnográficos e de outras formas de observação que questionam as qualidades anacrônicas e universais que se atribui ao cânone literário das obras clássicas. O pêndulo, ao oscilar assim, para os polos do emissor ou do receptor, determinaria pontos de vista voltados para a análise das condições externas, exteriores às obras em si. Quando, entretanto, centra-se no polo da mensagem literária propriamente dita, abriria perspectivas críticas voltadas para a análise das condições internas e dos valores estéticos inerentes às obras literárias, independente dos contextos de produção e de recepção dos textos literários. Concluindo, podemos afirmar que a natureza da linguagem literária faz com que toda obra de arte poética apresente a interseção de dois movimentos opostos e, ao mesmo tempo, complementares: um, que a dobra sobre si mesma, em mero objeto de linguagem [...]; outro que, ao contrário, a abre para o mundo, interrogado em sua realidade e em sua presença essencial (D’ONOFRIO, 2006, p. 13). Além disso, o esquema da comunicação enriquece a análise teórica mediada pela teoria dos gêneros literários, ou seja, em se admitindo que o texto a ser analisado é uma mensagem literária, poder-se-ia ligar suas características aos polos do emissor, do receptor ou do referente, estabelecendo analogias entre esses elementos comunicativos e os gêneros literários a eles correspondentes: lírico, dramático e narrativo, respectivamente: Roman Jakobson, relacionando as funções da linguagem com os fatores da comunicação inter-humana, vê o princípio diferenciador da poesia lírica na predominância da função emotiva, orientada para a expressão do subjetivismo do emissor; o do gênero narrativo na preferência para função referencial; o da poesia dramática na marcação da função conativa, orientada para o destinatário (D’ONOFRIO, 1990, p. 13). TÓPICO 1 | A TEORIA E OS GÊNEROS LITERÁRIOS 17 Caro acadêmico, como forma complementar de estudo, sugerimos que você assista ao vídeo, do canal YouTube, Roman Jakobson: Contribuições para o Estudo da Linguística, realizado pelo Departamento de Teorias Linguísticas e Literárias do Centro de Ciências Humanas da Universidade Estadual de Maringá/PR, disponível no link: https:// www.youtube.com/watch?v=yz43g3P6c_s. DICAS 3 O GÊNERO COMO PRINCÍPIO DE CLASSIFICAÇÃO DAS OBRAS Na obra A República, Platão estabeleceu a primeira referência aos gêneros literários, cujas formas de expressão apresentavam-se, à época, através das formas de canto próximas aos hinos e ditirambos, das epopeias homéricas e das tragédias e comédias do teatro grego clássico. Essa reflexão teórica inicial incorporou ao pensamento estético as tradições literárias que prevaleceram no período arcaico da literatura greco-romana, por volta dos séculos VIII ao V a.C. As primeiras manifestações culturais do povo grego estão relacionadas intimamente com suas atividades existenciais: as lutas pela conquista de novos territórios (poesia heroica ou épica), o ensinamento da cultura e da terra (poesia telúrica ou didática), a expressão de sentimentos fundamentais do indivíduo em relação à divindade ou aos homens (poesia lírica) (D’ONOFRIO, 1990, p. 27). Nos ditirambos, elegias e outras formas abreviadas de canto estavam em germe o gênero lírico, assim como nas epopeias, que narravam os feitos heroicos do povo grego, nitidamente nos poemas épicos Ilíada e Odisseia, de Homero, germinava o gênero épico-narrativo, e, por último, nas consagradas tragédias e comédias gregas de Ésquilo, Sófocles, Eurípedes e Aristófanes deu-se a sedimentação dogênero dramático. Aristóteles, discípulo de Platão, ao escrever a Poética, reformula em profundidade a teoria dos gêneros literários proposta por Platão, concebendo-os como formas de imitação e classificando-os conforme o modo, o meio e o objeto de representação. Essa versão da teoria dos gêneros, válida até os dias atuais, levou-nos para além do senso comum, abrindo ao leitor, e à recepção das obras de um modo geral, parâmetros mais consistentes de compreensão de qualquer obra literária. UNIDADE 1 | PANORAMA CLÁSSICO DA LITERATURA 18 Pode-se dizer que Platão e Aristóteles faziam teoria da literatura quando classificavam os gêneros literários na República e na Poética, e o modelo de teoria da literatura ainda é, hoje, para nós, a Poética de Aristóteles. Platão e Aristóteles faziam teoria porque se interessavam pelas categorias gerais, ou mesmo universais, pelas constantes literárias contidas nas obras particulares, por exemplo, os gêneros, as formas, os modos, as figuras. Se eles se ocupavam de obras individuais (a Ilíada, o Édipo Rei), era como ilustrações de categorias gerais. Fazer teoria da literatura era interessar-se pela literatura em geral, de um ponto de vista que almejava o universal (COMPAGNON, 2012, p. 19, grifo do original). De modo geral, no gênero lírico dá-se a expressão de sentimentos e emoções centrados na interioridade do sujeito emissor da mensagem, expondo suas reflexões pessoais, em sua maioria reveladas no tempo presente da ação. Nesse gênero, a função poética da linguagem, que caracteriza a mensagem literária, explicita-se preponderantemente através de efeitos estéticos ligados à musicalidade e a plasticidade de versos. O termo “lírica” é tardio, da época helenística. Os gregos da época clássica chamavam de “mélica” (de melos, “canto”) a poesia acompanhada de um instrumento musical: lira, cítara, aulos e flauta. O poema-canto podia ser entoado por uma única pessoa, quando se dava o nome de lírica “monódica”, ou por várias pessoas, chamando- se então de lírica “coral” (D’ONOFRIO, 1990, p. 58). No gênero épico-narrativo, por sua vez, aquele que fala expressa, de modo preponderante, não o seu estado emocional subjetivo, mas séries de acontecimentos que se encadeiam em um tempo e um espaço determinados de modo mais neutro e objetivo, que em sua feição antiga prestava-se a cantar os feitos heroicos de um povo ou de uma nação por meio das epopeias. Lendas recentes e antigas, poesia ritual sobre a morte e a descida aos Infernos, lembranças de guerras gloriosas e do exílio dos aqueus na Ásia, mitologia contemporânea e lembranças de antigos deuses transformados em herói e conservados com todo o aparato ritual que seu culto comportava, eis tudo o que encontramos em A ilíada e A odisseia (D’ONOFRIO, 1990, p. 29, grifo do original). A epopeia tornou-se a primeira forma elevada de literatura no ocidente, pois condensava os relatos populares, orais, transmitidos de geração em geração, muitos deles ligados a fatos históricos, que, em geral, eram retomados e reelaborados por um escritor culto, que dominava não só a língua e suas variações linguísticas praticadas pelos povos, mas também o imaginário de um povo. O termo grego épos, que significa palavra ou narração, designava também um tipo de verso, o hexâmetro, composto de seis pés, usado para poemas longos que exaltavam os feitos heroicos das divindades ou de homens ilustres. Tal forma métrica passou a designar um tipo de poesia, a épica, chamada também de epopeia. Aristóteles distinguiu o épos, palavra narrada, da lírica, que era a palavra cantada, e do drama, que era a palavra representada. O gênero épico, mais tarde, tornou-se quase sinônimo do gênero narrativo, em verso ou em prosa (D’ONOFRIO, 2006, p. 112, grifo do original). TÓPICO 1 | A TEORIA E OS GÊNEROS LITERÁRIOS 19 Em sua face moderna, o gênero narrativo, especificamente no “subgênero” romance, destacou-se como a forma literária que apresentou maior evolução estrutural dada a sua riqueza e capacidade representativa em face a ter assimilado outros gêneros, como a crônica de viagens, o diário, o ensaio, dentre outros, tornando-se a forma literária de maior expressividade no século XIX. Quer a narrativa sentimental, quer a narrativa realista, embora sem o nome de romance, têm origens muito remotas. Ocorre que esse tipo de ficção em prosa viveu por logo tempo ofuscado pelos gêneros literários clássicos e não recebeu a devida apreciação crítica: todas as teorias poéticas da época do classicismo se preocuparam apenas com os textos versificados. Somente com o declínio da poesia épica do início do século XVIII, a ficção em prosa, assumindo o papel da epopeia de expressar a totalidade da vida, passou a adquirir o estatuto de gênero literário (D’ONOFRIO, 2006, p. 116-117). Assim, o romance tornou-se uma forma apta a captar os meandros da vida cotidiana em sua complexidade, servindo como meio privilegiado de exploração da interioridade e da exterioridade dos indivíduos por incorporar vários tipos de registros discursivos e literários. Tal foi a capacidade da narrativa romanesca que vimos a emergência do romance psicológico e da apreensão de monólogos interiores dos personagens, captando muito mais que a realidade exterior dos indivíduos nele representados. No gênero dramático, por sua vez, deu-se a representação dos costumes e comportamentos humanos através das falas e ações dos personagens, e, por esse motivo, foi considerado, pelos filósofos gregos, o mais imitativo dos três gêneros. Sua origem remonta ao diálogo que se estabelecia entre o coro de vozes, e a voz do corifeu, responsável por entoar cânticos ao deus do vinho, Baco, também conhecido como Dionísio. As origens do gênero dramático estão relacionadas intimamente com a atividade rural e o sentimento religioso do homem primitivo. No outono, durante o ritual da colheita da uva, um bode, acusado de ter devorado as videiras, era sacrificado ao deus Dionísio. O bode era perseguido, agarrado e esquartejado pelos sátiros. Em seguida, sobre sua pele, os devotos de Baco dançavam e bebiam até caírem desfalecidos. Durante esta festividade, o coro de sátiros e faunos, chefiados por um corifeu, cantava um hino em louvor de Dionísio, chamado “Ditirambo “(D’ONOFRIO, 1990, p. 66). Assim, através do diálogo entre o corifeu e o coro, em que as ações em torno do deus Baco ou Dionísio, ao deixarem de ser cantadas para serem representadas, tomam a forma de encenação em um lugar apropriado, o theatron (o lugar de onde se vê), aí se dá a origem da arte dramática, que aos poucos transcendem os rituais de culto a deuses para passar a refletir os problemas da existência humana, como: UNIDADE 1 | PANORAMA CLÁSSICO DA LITERATURA 20 A luta entre o livre arbítrio e a fatalidade do destino, o sofrimento por uma culpa não cometida voluntariamente, o castigo por faltas cometidas pelos nossos ancestrais, o turbilhão que aflige o homem quando vítima de violentas paixões, tais como o amor, o ódio, o ciúme, a vingança, constituem os principais temas representados nos palcos do teatro grego (D’ONOFRIO, 1990, p. 67). Uma das principais divindades da antiguidade ocidental, que surgiu no mundo grego, foi Dionísio, também conhecido como Baco. Gestado, após a morte da mãe, numa das coxas do deus Júpiter, Dionísio era fruto híbrido de um amor divino-humano, [...] que errou pelo mundo então conhecido e conseguiu o caminho da glória pela descoberta da uva e do vinho. Tocando flautas ou tamborins, acompanhado pelo cortejo de sátiros, bacantes, centauros e pelos deuses Sileno e Pã, Dionísio propiciava aos homens e aos deuses alegria e felicidade. Enquanto durava o estado de embriaguez, seus devotos sentiam a presença do deus do vinho dentro de si e abandonavam-se aos ritos orgíacos, entrando em transe histérico. Dionísio sempre foi considerado pelos gregos como um deus estrangeiro e subversivo, pois ele personificava a desobediência à ordeme à medida, a vida do instinto, a liberdade e o prazer sem limites, a inversão dos valores sociais [...]. O espírito dionisíaco encontrou sua primeira manifestação artística no coro ditirâmbico, que, segundo a maioria dos estudiosos da literatura grega, foi o embrião da tragédia antiga. FONTE: D’ONOFRIO, S. Literatura ocidental: autores e obras fundamentais. São Paulo: Ática, 1990. IMPORTANT E Importante destacar que, embora na formulação original da teoria dos gêneros literários, por Platão e Aristóteles, havia um caráter de descrição dos modos comuns de aparição das obras literárias, houve uma retomada normativa pelos teóricos e autores clássicos pós-renascentistas. Se o teor descritivo, como estava nas obras dos filósofos, aponta modos de ordenar a recepção das obras literárias, o enfoque prescritivo clássico, que prevaleceu desde a Idade Média até o Romantismo, buscou mediar o surgimento de novas obras pelo estabelecimento de parâmetros de composição literária. Contra isso, contra a ideia de gêneros literários normativos, ou seja, a pureza dos gêneros literários conforme pensou o classicismo, para o qual uma obra literária deveria ser composta sem liberdade, de tal ou qual modo, prevaleceu o caráter descritivo dos gêneros, tal como pensaram Platão e Aristóteles, isto é, como um modo livre de municiar o leitor diante de qualquer obra literária, classificando-a e, portanto, podendo argumentar e se comunicar segundo a teoria dos gêneros literários. TÓPICO 1 | A TEORIA E OS GÊNEROS LITERÁRIOS 21 No presente tópico apresentamos, de modo sintético, e para fins de se compreender a origem das diversas formas de teorização da literatura no ocidente, as características gerais dos gêneros literários, que foram abordadas em maior profundidade em Teoria da Literatura I. Assim, sugerimos a você, caro acadêmico, ler, revisar e aprofundar os nuances pertinentes aos gêneros literários presentes naquele livro didático. DICAS 22 Neste tópico, você aprendeu que: • As teorizações da literatura têm origem em modos diferenciados de leitura, os quais se distanciam da leitura apressada do leitor comum, em geral, mais preocupada em confirmar os próprios pontos de vista do que em encontrar novas perspectivas que lhe ampliem a visão de mundo. Esses modos diferenciados dos teóricos em muito se assemelham à intuição de escritores, especialmente quando aqueles leem e comentam as obras de outros escritores. • Há no escritor um modo de abordagem semelhante ao do teórico da literatura, pois ambos buscam revelar aspectos ainda não claros, tanto para si mesmos quanto para o público leitor em geral, que é o mesmo que tornar visível o que é invisível e apresentar algo que, mesmo que inicialmente não possua forma sensível determinada, passa a ter realidade através da escrita e, consequentemente, da leitura que se seguirá. • O discurso teórico como um tipo de leitura especializada significa se dar conta que o teorizador, a partir de suas intuições de leitura, deve, em seguida, apoiar sua leitura em uma fundamentação teórica consistente, que afasta essa mesma leitura do dogmatismo do senso comum, já que o senso comum não se abre ao diálogo com outros pontos de vista. • Existem dois modos de caracterização dos estudos de literatura que se tornaram paradigmas de compreensão do fenômeno literário: os gêneros literários e a função poética. Esta última, proposta por Roman Jakobson, situou o discurso literário como mais um dos discursos linguísticos possíveis na esfera da comunicação humana, retirando, por conseguinte, a ideia de uma “aura” que permeasse o escritor literário. • O trabalho com a linguagem, que caracteriza a função poética, deve ser seguido da classificação em qual gênero literário o texto está vinculado. Por exemplo, ao deparar-se com a mensagem “água mole em pedra dura, tanto bate até que fura”, o leitor observa, primeiro, se ela está ou não na função poética e, segundo a qual gênero literária está filiada. No caso em questão, a mensagem permanece se fixa em nossa memória, portanto está na função poética, e filia-se ao gênero lírico. • Os gêneros literários, ao serem formulados por Platão e Aristóteles, assumiram um caráter descritivo em sua origem, prestando-se a auxiliar o leitor a situar sua leitura sobre qualquer obra que caísse em suas mãos. Esse ponto de vista descritivo foi transformando-se em postulados que orientavam os novos escritores em suas composições, desde a Idade Média até o Romantismo, assumindo até ali, uma feição prescritiva, portanto negativa. RESUMO DO TÓPICO 1 23 • Após o movimento romântico, que quebrou a normatividade dos gêneros imposta pelo classicismo, a teoria dos gêneros retomou, em sua fase moderna, sua face descritiva, conservando o seu valor teórico até os dias de hoje. 24 1 A teoria da literatura ajuda o leitor a identificar as características de um texto literário em relação aos textos de natureza discursiva ou comunicacional. Uma dessas características é a função poética, formulada por Roman Jakobson, que através dela destacou os tipos de mensagem que tendem a permanecer na memória do leitor, mesmo após ele ter compreendido o sentido a que ela se prestava. A partir dessa reflexão, é CORRETO afirmar: a) ( ) Que a mensagem literária é um tipo de mensagens linguística que não se diferencia das mensagens abrangentes dos gêneros discursivos. b) ( ) Que a função poética, por destacar uma forma de mensagem linguística pelo tratamento dado à linguagem, é um dos modos da literariedade, ou seja, modo que ajuda a identificar um texto literário. c) ( ) Que a função poética tem valor semelhante à função emotiva, do polo do emissor-escritor, e da função conativa, do receptor-leitor. d) ( ) Que toda mensagem que permanece na memória do leitor necessariamente é uma mensagem literária. 2 Teorizar literatura significa, de um modo mais didático, aperfeiçoar os instrumentos de leitura dos textos, os modos de chegar e compreender as obras literárias, cujo efeito pedagógico imediato seria facilitar ao educando o acesso ao reconhecimento das obras de valor dialógico, as que vão além do sentido literal, ainda que não se exclua a importância de fruição das obras literárias de valor mercadológico. A partir dessa reflexão, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as sentenças falsas: I- ( ) De certo modo, a teoria visa municiar o leitor com os pressupostos teóricos que sustentam, em última instância, qualquer formulação competente sobre uma obra literária. II- ( ) O senso comum, com seu apelo em favor da facilidade e do convívio social, admite o leitor competente, dialógico, que observa não apenas o seu ponto de vista. III- ( ) Via de regra, o senso comum induz o leitor a buscar obras menos complexas, que confirmem o que eles, leitores desinteressados, antes de ler a obra escolhida, já sabiam. IV- ( ) A teoria ajuda o leitor a ter uma atitude diferenciada, habilitando-o a capturar camadas de sentido, muitas vezes insuspeitadas, nascidas da obra literária no instante de leitura. Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) V – F – V – F. b) ( ) F – F – V – F. c) ( ) V – V – F – V. d) ( ) V – F – V – V. AUTOATIVIDADE 25 3 Para o estudo das obras literárias se estabeleceu a classificação das mesmas em três tipos distintos, conforme a tipologia dos gêneros literários: lírico, narrativo e dramático. Essa forma de leitura, válida até os dias de hoje através da versão aristotélica editada na Poética, ajuda o leitor a confrontar qualquer texto literário que pouse em suas mãos, tendo assim, um modo de compreendê-lo em particular, segundo características universais. Considerando essas informações, associe os itens, utilizando o código a seguir: I- Lírico. II- Épico-Narrativo. III- Dramático. ( ) Para Aristóteles, na forma de comunicação entre o escritor e o público, esse gênero é constituído pelo epos, ou “a palavra narrada” porum rapsodo perante um auditório. ( ) Para Aristóteles, na forma de comunicação entre o escritor e o público, esse gênero é a “palavra cantada” pelo próprio poeta, expressão de sua subjetividade. ( ) Para Aristóteles, na forma de comunicação entre o escritor e o público, esse gênero é a palavra representada” por atores para espectadores. ( ) Para Aristóteles, na forma de comunicação entre o escritor e o público, esse gênero é pertinente a palavra rica em sonoridades, exprimindo o estado emocional do próprio poeta. Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) I – II – I – III. b) ( ) II – I – III – I. c) ( ) I – II – III – I. d) ( ) III – II – I – II. 4 (ENADE, 2008) “Não, não é fácil escrever. É duro como quebrar rochas. Mas voam faíscas e lascas como aços espalhados. Ah que medo de começar e ainda nem sequer sei o nome da moça. Sem falar que a história me desespera por ser simples demais. O que me proponho contar parece fácil e à mão de todos. Mas a sua elaboração é muito difícil. Pois tenho que tornar nítido o que está quase apagado e que mal vejo. Com mãos de dedos duros enlameados apalpar o invisível na própria lama (LISPECTOR, C. A hora da estrela. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984, p. 25). No trecho do romance A hora da Estrela, de Clarice Lispector, apresenta-se uma concepção do fazer literário, segundo à qual a literatura é: 26 a) ( ) Uma forma de resolver os problemas sociais abordados pelo escritor ao escrever suas histórias. b) ( ) Uma forma de, pelo trabalho do escritor, tornar sensível o que não está claramente disponível na realidade. c) ( ) Um dom do escritor, que, de forma espontânea e fácil, alcança o indizível e o mistério graças a sua genialidade. d) ( ) O resultado do trabalho árduo do escritor, que transforma histórias complexas em textos simples e interessantes. e) ( ) Um modo mágico de expressão, por meio do qual se de abandona a realidade histórica em favor da pura beleza estética graças à sensibilidade do escritor. FONTE: <http://www.pucrs.br/edipucrs/enade/letras2008.pdf>. Acesso em: 17 out. 2019. 27 TÓPICO 2 ABORDAGENS A PARTIR DA OBRA LITERÁRIA UNIDADE 1 1 INTRODUÇÃO Caro acadêmico, prosseguindo nossa viagem através das diversas teorias da literatura, vamos agora priorizar as abordagens teóricas que observam o fenômeno literário sem dar relevância às situações vividas fora dos textos. Essas formas de análise são chamadas de “internas”, pois se importam mais com a relação entre os textos e com a linguagem do que com a relação dos textos com a fome, com as guerras, com os preconceitos, ou com quaisquer ocorrências que estejam no plano da realidade existencial. Desde esse ponto de vista, a liberdade de criação de situações fictícias, utilizando dados da realidade, revela que o saber literário, para além da fidelidade lógica das ciências instrumentais aos fatos vividos, é também uma forma de conhecimento da realidade, pois a literatura pode revelar fatos insuspeitados acerca dessa mesma realidade na medida em que liberta o pensamento para flertar com a imaginação. Por isso, Aristóteles falava da literatura como reveladora, não de uma verdade buscada pela especulação filosófica, mas de uma verdade possível, que não precisava necessariamente acontecer, em que as narrativas, independente do gênero literário a que estivessem vinculadas, distorceriam a realidade por seu poder de sugestão, não interessando constatar ou comprovar a fidedignidade dos fatos por elas veiculadas. FIGURA 3 – A ESCOLA DE ARISTÓTELES, AFRESCO DE GUSTAV ADOLPH SPANGENBERG (1883- 1888) FONTE: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/7/75/Spangenberg_-_Schule_des_ Aristoteles.jpg>. Acesso em: 10 jan. 2019. UNIDADE 1 | PANORAMA CLÁSSICO DA LITERATURA 28 Ao revelar uma das especificidades do texto literário, a “verossimilhança” aristotélica conferia valor e autonomia à leitura na medida em que agrupava as características comuns das obras, segundo a teoria dos gêneros literários. A teoria literária, para fins didáticos, agrupa as obras pela semelhança de seus elementos estruturais. A macrodistinção nos três gêneros fundamentais – narrativo, lírico e dramático – e suas subdivisões (poema épico, conto, romance, tragédia etc.) foram feitas tendo em conta as peculiaridades de vários tipos de textos (D’ONOFRIO, 2006, p. 33). De fato, ao pensar as características dos gêneros literários e, com mais propriedade, do gênero dramático, o filósofo acabou por revelar níveis de análise que se prestariam não apenas ao drama, mas ao estudo de quaisquer textos, independentemente do gênero a que eles estivessem vinculados. Os elementos estruturais do drama se reportariam à análise dos personagens, atores, público, cenografia, sonoplastia, direção e temática, historicamente aplicados a modalidades, como: tragédia, comédia, tragicomédia, ópera, farsa, marionetes, e, posteriormente, em utilizações tecnológicas como o cinema, vídeos etc. A essência da arte dramática repousa no conflito, no choque entre vontades opostas, na colisão entre os diferentes objetivos das personagens. Conflito que gera constantemente surpresa e tensão. Tensão expressa formalmente através do diálogo. Aliás, a nosso ver, é a forma dialógica a característica mais marcante da arte dramática (D’ONOFRIO, 2005, p. 127, grifo do original). Em linhas gerias, os elementos estruturais da lírica são analisados através dos estratos gráfico, fônico, lexical, sintático e semântico, aplicados em suas formas históricas, dentre elas: o hino, a ode, a elegia, a canção, a cantiga, o soneto, a balada, o rondó, a redondilha, o madrigal, o epigrama, o haicai; e outras que, porventura, possam surgir. Mesmo mais tarde, quando a poesia lírica deixa de ser composta para ser cantada e passa a ser escrita para ser lida, ainda conserva traços de sonoridade através dos elementos fônicos do poema: metros, acentos, rimas, aliterações, onomatopeias. Sinais evidentes dessa interação podem ser encontrados nas denominações das formas poemáticas (soneto, canção, balada etc.) e em algumas espécies de arte que, ainda hoje, cultivam a simbiose música-palavra: a ópera, o musical, a canção popular (D’ONOFRIO, 2005, p. 56). Quanto aos elementos estruturais da narrativa – planos de enunciação, do enunciado, e a tipologia dos narradores – aplicar-se-iam às formas gerais de narratividade, como: mitos, lendas, contos populares e eruditos, epopeia, romance, novela, crônica, autobiografia, provérbios e outras que também venham a surgir. TÓPICO 2 | ABORDAGENS A PARTIR DA OBRA LITERÁRIA 29 Entendemos por narrativa todo discurso que nos apresenta uma história imaginária como se fosse real, constituída por uma pluralidade de personagens, cujos episódios de vida se entrelaçam num tempo e num espaço determinados. Nesse sentido amplo, o conceito de narrativa não se restringe apenas ao romance, ao conto e à novela, mas abrange o poema épico, alegórico e outras formas menores de literatura (D’ONOFRIO, 2006, p. 53). Interessa-nos observar não apenas o efeito potencial dessas primeiras teorizações, mas também o quanto o desdobramento das reflexões de Aristóteles tornou-se relevante para a análise dos textos literários na medida em que estabeleceu, em número de seis, os níveis de análise de qualquer obra literária. “Em qualquer texto literário podem ser encontrados os seis elementos [...] que, intrincados, compõem sua estrutura. As diferenças genéricas e específicas de um texto para o outro estão relacionadas com a predominância de alguns elementos constitutivos em detrimento de outros” (D’ONOFRIO, 2006, p. 33) A reflexão sobre os seis elementos constitutivos da tragédia grega por Aristóteles (mythos, éthos, dianoia, léxis, ópsis e melopeia, ou seja, mito, caráter, pensamento, discurso, ótica e melodia, respectivamente) revelou seis níveis de análise dos textos literários: • Nível fabular: pelo qual se estuda a estrutura da
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