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REINO DO CONGO O Reino do Congo foi constituído no século XIV, em uma região localizada ao sul da Linha do Equador, habitada por povos e tribos que falavam línguas conhecidas como banto – tronco linguístico que deu origem a mais de 400 outras línguas africanas. Módulos 29 E 30 169 Segundo a tradição, as origens do Reino do Congo datam do período entre 1350 e 1375, quando o líder tribal Nimi a Nzima expandiu seus territórios em direção ao sul do Rio Zaire, por meio de conquistas e alianças. O filho e sucessor do líder Nimi a Nzima, conhecido como Lukeni Lua Nimi, adotou uma política semelhante de pactos e guerras: atravessou o Rio Zaire, conquistou os povos agricultores que ali habitavam e fundou uma nova cidade, chamada Mbanza Kongo, capital do futuro Reino do Congo. A cidade estava localizada no alto de uma colina e chegou a abrigar cerca de 100 mil habitantes. Lukeni Lua Nimi também conquistou mais poderes ao estabelecer alianças com um sacerdote local, conhecido como Nsaku Vunda, o que lhe possibilitou dominar outros clãs, muitas vezes, violentamente. De acordo com as tradições, Lukeni Lua Nimi passou a ser conhecido como “o gavião que controla o fogo da mata” e recebeu o título de manicongo (que significa “senhor do Congo”). Seus herdeiros, também conhecidos como manicongos, ampliaram as extensões do reino por meio de conquistas militares e casamentos com princesas de aldeias aliadas Os manicongos possuíam muitos súditos e governavam, geralmente, com o apoio de doze conselheiros (secretários, militares, juízes etc.). Costumavam resolver disputas judiciárias em praça pública, ouvindo reclamações, acusações e defesas proferidas pela população. O reino teve extensões variadas (de 300 000 km² a 500 000 km²) e uma população pouco densa, formada, em geral, por vários povos e etnias bantos – especialmente os povos bakongo –, distribuídos em ao menos seis províncias e várias outras regiões ligadas, direta ou indiretamente, ao controle do manicongo, a quem juravam pagar tributos. Por estar localizado na savana africana, o Reino do Congo possibilitava boa mobilidade aos habitantes que transitavam entre vilas e aldeias. No século XV, o Reino do Congo já havia se consolidado como um dos maiores estados situados a oeste da África Central, com um governo centralizado, um poderoso exército e uma burocracia desenvolvida, com funcionários responsáveis pela administração e pela cobrança de impostos. Os impostos eram pagos ao reino, geralmente em forma de produtos, como marfim, cabeças de gado, peles, cereal conhecido como sorgo, metais etc., ou de zimbo, um tipo de concha coletada na Ilha de Luanda, que funcionava como uma espécie de “dinheiro” para os congoleses e cuja produção era controlada pelo poder real. No Reino do Congo, havia tanto atividades econômicas de base pastoril, como criação de cabras, porcos e bovinos, quanto atividades de base agrícola, como o cultivo de legumes, frutas e verduras. Geralmente, os homens derrubavam as matas, ajudavam nas colheitas ou participavam das campanhas militares. Já as mulheres cuidavam da semeadura, da irrigação e da colheita nos campos. As atividades comerciais desenvolvidas no Reino do Congo eram intensas e envolviam a compra e a venda de metais, marfim, tecidos e sal (considerados mercadorias raras e controlados pelo poder real). Para a capital Mbanza Kongo, eram enviados peixes, sal, cobre, ráfia, cerâmicas etc., sendo as trocas de mercadorias realizadas por intermédio do zimbo ou do escambo. A estrutura social do reino era composta pela nobreza, pelos aldeãos e comerciantes e, por fim, pelos escravizados. Os nobres, muitos deles parentes do manicongo, viviam nas cidades ou em províncias mais afastadas, quando assumiam cargos de comando. Os aldeãos compunham a maioria da população do reino e produziam nas aldeias por meio do trabalho familiar; os excedentes eram transferidos para os senhores locais ou seus aliados. Os escravos estavam ligados à exploração das minas, à produção agrícola nas terras dos nobres e ao trabalho nas cidades. REINO DO CONGO A escravidão no Reino do Congo – ou em outros reinos africanos – possuía características próprias que a diferenciavam da escravidão em outras regiões do mundo. Escravizar era um costume bastante antigo nos reinos africanos, sendo os escravizados, geralmente, estrangeiros aprisionados em campanhas militares, ladrões ou devedores que não conseguiam pagar suas obrigações. Módulos 30 171 Além disso, não eram considerados meras “propriedades”, mas sim pessoas que estavam sujeitas à vontade de senhores que, em algum momento, poderiam lhes conceder alguns direitos (propriedades, direito à herança, possibilidade de ir e vir e, em alguns casos, a própria liberdade). Mesmo assim, não formavam o motor principal da produção nas sociedades africanas, ou seja, sociedades como o Reino do Congo não eram essencialmente escravocratas, pois a escravidão não compunha a maioria da mão de obra Canoa com escravizados na bacia do Rio Zaire (ou Rio Congo), em representação de 1890 No cotidiano, os habitantes do reino costumavam utilizar panos feitos com folhas de ráfia, manipulavam o ferro para fabricação de armas e utensílios e realizavam trabalhos em madeira e cobre. A alimentação, em especial a dos mais pobres, era bastante rica em termos nutricionais. No entanto, as técnicas agrícolas, por serem rudimentares, não impediam crises de subsistência ocasionadas por pragas de gafanhotos ou secas. A religião também possuía um papel muito importante no Reino do Congo. A legitimidade e o poder do manicongo eram baseados na força dos espíritos e no respeito aos chefes antigos, invocados e consultados para garantir o bem do reino. Entre 1482 e 1483, os portugueses, liderados pelo capitão Diogo Cão, alcançaram a foz do Rio Zaire. O manicongo, a princípio, recebeu cordialmente os visitantes europeus. Impressionado com os portugueses, enviou uma comitiva para o rei de Portugal, em 1489, presenteando-o com objetos de marfim e tecidos de palmeiras. O manicongo solicitou o envio de clérigos ao Reino do Congo e formalizou seu desejo de se converter ao cristianismo. Nos anos posteriores, as relações diplomáticas e comerciais entre os reinos de Portugal e do Congo intensificaram-se. No início, os portugueses ofereciam ao manicongo algumas mercadorias, como cavalos, fumo, armas e pólvora, em troca de escravizados (em geral, capturados de tribos e povos rivais). Alguns nobres do Reino do Congo também foram enviados a Portugal para estudar. No final do século XV, houve as conversões do manicongo Nzinga Knuwu, batizado como Dom João I, e de nobres congoleses ao cristianismo, embora o manicongo tenha abandonado o cristianismo pouco tempo depois, pressionado por setores da nobreza que não aceitavam a nova religião. Após sua morte, ocorreu uma séria disputa sucessória, na qual muitos nobres tentaram remover o cristianismo do reino africano. O sucessor chamava-se Nzinga Mbemba, o qual se converteu ao cristianismo, adotando o nome português Affonso I. Affonso I reinou de 1506 a 1543, período em que consolidou as bases do cristianismo no Reino do Congo. Manicongo concede uma audiência aos estrangeiros europeus, por volta de 1650. A gravura, porém, foi produzida no século XIX. Além de ter se mostrado profundamente dedicado ao catolicismo e à divulgação dos valores portugueses em seus domínios, adquiriu conhecimentos e armas trazidos da Europa, solicitou ao rei de Portugal o envio de professores, médicos e missionários católicos ao Reino do Congo, assim como enviou jovens para estudar em Portugal. Os interesses do manicongo não estavam restritos às questões religiosas, pois esperava contar com o apoio dos portugueses para fortalecer o reino e combater seus rivais, como os povos ambundos, do Ndongo, e os jagas, do Reino Matamba Aos poucos,no entanto, os europeus, em especial os traficantes de escravos, passaram a interferir nos assuntos políticos do Reino do Congo. Os comerciantes e traficantes portugueses penetravam cada vez mais nos territórios africanos em busca de escravizados e marfim, desprezando as fiscalizações e os controles exercidos pelo manicongo. Os impulsos às atividades comerciais no interior do território africano favoreceram o surgimento de um novo setor mercantil, que desafiava o monopólio exercido pelo manicongo e pela nobreza. Ao mesmo tempo, a região do Ndongo (futura Angola) despertou o interesse dos comerciantes portugueses, que buscavam fugir dos controles exercidos pelo manicongo. Dom Garcia II (1641-1661), manicongo católico do Reino do Congo, recebe uma delegação de monges capuchinhos, em 1648. Os apelos de Affonso I ao rei de Portugal e ao Papa para que o comércio de escravizados fosse paralisado não surtiram efeitos. Milhares de africanos foram aprisionados e embarcados no porto de Mpinda, direcionados para o outro lado do Atlântico. Ao longo dos séculos, muitos desses escravos foram enviados para trabalhar nas lavouras e minas que existiam no Brasil. A partir do século XVI, as relações entre portugueses e manicongos passaram por uma aguda deterioração. Diversos povos e grupos africanos foram apoiados pelos portugueses e rebelaram-se contra os manicongos, enfraquecendo o antes poderoso e organizado Reino do Congo. Em 1665, já sob domínio dos portugueses, os habitantes do Reino do Congo organizaram uma fracassada revolta, derrotada pelos europeus. No final do século XVIII, o Reino do Congo passou por um lento e longo processo de declínio, acentuado pelo despovoamento causado pelo tráfico de pessoas, pela desorganização socioeconômica e pelos conflitos entre grupos rivais internos. Com a expansão dos países imperialistas, no século XIX, o Reino do Congo foi dividido entre belgas, portugueses e franceses. O antigo reino localizava-se nas atuais regiões de Angola, do Congo, da República Democrática do Congo e de Gabão. Dom Álvaro, manicongo do Reino do Congo, recebendo uma embaixada holandesa, em 1642.
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