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Pesquisa e Prática em Psicologia no Sertão Angelo A. S. Sampaio Daniel H. P. Espíndula Organizadores Pesquisa e Prática em Psicologia no Sertão Angelo A. S. Sampaio e Daniel H. P. Espíndula (Orgs.) www.walden4.com.br 2016 Instituto Walden4 Ficha catalográfica elaborada pelo Sistema Integrado de Bi- bliotecas da UNIVASF Bibliotecário: Fabio Oliveira Lima - CRB-4/2092 Foto de capa (c): Euriclésio Barreto Sodré Pesquisa e prática em psicologia no sertão [Recurso eletrônico]./ P474 Organizado por Angelo A. S. Sampaio e Daniel Henrique Pe- reira Espíndula; Colaboração de Silvoney O. Matos Jr...[et al]. -- Brasília: Instituto Walden 4, 2016. 685 p.: il. ISBN: 978-85-65721-09-7 1.Psicologia - Pesquisa e prática. 2. Serviços de saúde mental. 3.Seleção de trabalhos de conclusão do curso de Psicologia da UNI- VASF. I. Sampaio, Angelo A. S.,org. II. Espíndula, Daniel Henrique Pereira.,org. III. Título. CDD 150.72 Edição Especial A editora do Instituto Walden4 tem como objetivo principal a divulgação de conhecimento científico produzido no âmbito da Análise do Comportamento. No entanto, nossa política editorial prevê edições especiais que incluem conhecimento científico advindo de outras áreas da Psicologia ou de áreas afins. Pesquisa e Prática em Psicologia no Sertão é uma obra que contempla trabalhos oriundos de diversas abordagens psico- lógicas, incluindo Análise do Comportamento. A relevância social dos temas abordados, o fato de ser constituída por Tra- balhos de Conclusão de Curso, seu caráter regionalista e a multiplicidade de perspectivas sobre diferentes temas certa- mente tornam esta obra uma edição especial. Gostaríamos de parabenizar a todos envolvidos na produção deste livro. Parabenizar pelo esforço de empreender uma obra desta extensão; parabenizar pela disseminação do conheci- mento científico; pelo incentivo à produção de conhecimento científico publicando trabalhos produzidos pelos alunos do curso de Psicologia da Univasf; parabenizar pela qualidade técnica dos trabalhos e pela escolha dos temas apresentados. Márcio Borges Moreira Editor, Instituto Walden4 SUMÁRIO Apresentação Angelo A. S. Sampaio e Daniel H. P. Espíndula i 1. Avaliando o CAPS AD de Petrolina-PE entre 2006 e 2008 Silvoney O. Matos Jr. e Angelo A. S. Sampaio 1 2. Avaliando o Programa Saúde e Prevenção nas Escolas de Juazeiro-BA entre 2008 e 2010 Bruno Klécius A. Teles e Angelo A. S. Sampaio 26 3. A compreensão de usuários sobre a oferta cotidiana de cuidado no Centros de Atenção Psicossocial II de Juazeiro-BA e Petrolina-PE Laís D. F. da Rocha e Barbara E. B. Cabral 48 4. Concepções de cura de usuários do CAPS II de Petrolina-PE: De que cura se fala? Leilane Gabriela de S. Bonfim e Aléssia S. Fon- tenelle 77 5. Operacionalização da Política Nacional de Educação Permanente em Saúde em uma ci- dade do submédio São Francisco: Concepções e desafios Suelen C. da Silva e Ana Lúcia B. da Fonseca 97 6. Ideologias masculinas e dependência ao exer- cício físico: um estudo com homens pratican- tes de musculação Anna Cléa F. Dias e Marina P. Gonçalves 121 7. A influência da satisfação com o relaciona- mento amoroso na depressão em casais hete- rossexuais Aline F. Sampaio e Marina P. Gonçalves 149 8. Estratégias de Redução de Danos a partir dos sentidos/percepções de usuários de álcool e outras drogas inseridos em um CAPS AD Daniela C. dos Santos, Gabriela da C. Ferreira e Alice Gomes 171 9. O delírio: Uma via de subjetivação na psicose Débora Sueli de S. Guedes e Aléssia S. Fonte- nelle 189 10. O exercício do cuidado por Agentes Comuni- tários de Saúde: tecendo compreensões a partir do cotidiano de trabalho em uma Uni- dade de Saúde da Família de Juazeiro-BA Gabriela M. Borges e Barbara E. B. Cabral 211 11. Avaliação psicológica para motorista: Um estudo a partir de parâmetros de qualidade Edna R. dos Santos e Marina P. Gonçalves 243 12. O uso de técnicas e da análise de contingên- cias no tratamento do transtorno de ansieda- de Edjan da S. Santos e Angelo A. S. Sampaio 268 13. O clown como recurso de humanização em saúde: um novo olhar na formação profissio- nal Hortencia O. Lima, Alexandre F. Barreto e Rafa- el Barreiros 283 14. O papel do psicólogo na compreensão de funcionários de um hospital de Juazeiro-BA Laise M. Gonsalves e Sílvia R. S. de Morais 308 15. A homossexualidade sob a perspectiva do adolescente Lara B. dos S. Teixeira e Ana Lúcia B. da Fon- seca 328 16. Concepções de oficinas terapêuticas no âmbi- to do CAPS II: Uma visão dos profissionais Monica L. Nahú e Aléssia S. Fontenelle 349 17. Avaliando o serviço de psicoterapia em uma clínica-escola de Pernambuco Samara Gabriele B. S. de Oliveira e Angelo A. S. Sampaio 373 18. Evasão estudantil no ensino superior: uma revisão de propostas interventivas na litera- tura de 2006 a 2012 Edinéia P. Sobrinho e Christian Vichi 392 19. Compreensões de Apoio Matricial por profis- sionais da Estratégia de Saúde da Família de Juazeiro-BA a partir do trabalho articulado ao NASF Josicleia O. de Souza e Barbara E. B. Cabral 412 20. Compreensões de Cuidado para Profissionais de Saúde de uma UTI Hospitalar no Interior da Bahia Ramessa F. P. da Silva Tenório e Sílvia R. S. de Morais 438 21. Experienciando a escuta clínica no estágio em psicologia: um estudo fenomenológico Aíla M. Dourado, Shirley de Melo e Darlindo Lima 471 22. Representações sociais de universitários so- bre preconceito nas amizades com homosse- xuais Larissa dos S. Alves e Daniel H. P. Espíndula 496 23. Narrativas de itinerários terapêuticos a par- tir de uma experiência com abordagens inte- grativas na atenção primária à saúde Luis Osete R. Carvalho, Afonso Henrique N. Menezes, Barbara E. B. Cabral, Luciana C. de S. Cajado e Dacyane Tárcia F. da Cruz 517 24. Trabalhando as DST na escola: um estudo com professores da rede pública M. Izabel P. de Souza e Susanne P. C. e Silva 541 25. O tratamento oncopediátrico na visão de familiares de uma instituição especializada Priscila de L. Souza, Paula Taise B. Caldas e Sílvia R. S. de Morais 557 26. Transferência de função entre mandos e tatos sem treino direto em crianças autista Lívia Francielle de A. Menezes e Christian Vichi 578 27. Compreensões de cuidados paliativos segun- do pacientes oncológicos de um hospital pú- blico de Juazeiro-BA Saionara Thaise C. do Amarante e Sílvia R. S. de Morais 597 28. Itinerários terapêuticos de pessoas em crise na Rede de Atenção Psicossocial de Petroli- na-PE: desafios à integralidade da atenção Sarah Raphaella F. Silva e Barbara E. B. Cabral 627 Sobre os Autores 656 APRESENTAÇÃO Angelo A. S. Sampaio Daniel Henrique Pereira Espíndula O ensino, a pesquisa e a prática em Psicologia têm se expandido pelo Brasil em anos recentes, em especial na direção de sua interiorização. A abertura de novos cursos de graduação e pós-graduação, o aumento no núme- ro de estudantes egressos que realizam o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE), bem como a abertura de novos campos de atuação atestam esse fato. A abertura da Universidade Federal do Vale do São Fran- cisco (Univasf) em 2004 – contando com um Curso de Psicologia – foi parte desse movimento, levando o ensino, a prática e a pesquisa psicológicas a se inserirem e se adaptarem a novos contextos sociais. A Univasf e seu Curso de Psicologia surgem comprometidos especificamente com a região semiárida nordestina. Sua sede na cidade de Petrolina-PE, no Submédio Rio São Fran- cisco é estratégica. A Região de Desenvolvimento Integrado (RIDE) centrada nas cidades de Petrolina-PE e Juazeiro-BAfoi historicamente marcada por secas prolongadas e pela produção de população retirante, mas há algumas décadas tem passado por mudanças fundamentais que a constituem hoje como uma das mais dinâmicas demográfica e economicamente do país. Essa região também é central no fornecimento de postos de trabalho e na prestação de serviços de saúde e assistência social para todo o sertão nordestino. É esse o contexto que unifica os relatos de pesquisa e as experiênci- as profissionais apresentados aqui, ademais bastante diversificados teórica e metodologicamente. Os capítulos são fruto de uma seleção de Trabalhos de Conclusão do Curso (TCCs) de Psicologia da Univasf, defendidos entre 2009 – quando se formou a primeira turma do curso – e, 2013 – quando o curso completava dez anos de atividade. Reunir essa amostra de trabalhos em um livro objetiva fundamentalmente registrar e divulgar algumas das atividades realizadas na Univasf quando dos seus primeiros anos, além da história de criação e os primeiros passos de diversas outras instituições que estavam !i sendo fundadas no sertão nordestino – haja vista que muitos trabalhos foram realizados no âmbito da rede pública de atenção à saúde, atenção psicossocial ou de assistência social, que estavam sendo implementadas no momento. Mais do que apenas o retrato de um local e um momento específico, os capítulos participam de movimentos mais amplos na construção do conhe- cimento psicológico e na sua aplicação na prestação de serviços. Temas transversais à formação e pesquisa psicológicas, como sexualidade, depen- dência de drogas, psicose e ensino são analisados a partir de perspectivas teóricas amplamente disseminadas como Psicologia Fenomenológico-Exis- tencial, Análise do Comportamento, Teoria das Representações Sociais, Psi- canálise etc. A formação e a atuação do psicólogo são também discutidas em áreas tão diversas como clínica, saúde, hospitalar, trânsito e educação. Qual- quer que seja o interesse do leitor no âmbito da Psicologia, ele estará con- templado nas páginas a seguir. A obra aqui apresentada buscou apresentar uma seleção daquilo que foi produzido pelo curso ao longo de uma década pelos seus professores, en- focando a diversidade teórico-metodológica da psicologia, em seu viés da pesquisa e intervenção. Alguns dos TCCs produzidos pelos estudantes não puderam ser incluídos pois – felizmente – já foram publicados em periódicos científicos ou compuseram capítulos de outras obras científicas. A apresenta- ção dos capítulos seguiu a ordem de construção dos trabalhos. Tal escolha, visa apresentar ao leitor o entrelaçamento entre a variedade de temas, com- preensões teóricas, tipos e delineamentos metodológicos e, uma análise do desenvolvimento histórico das linhas de pesquisa e atuação psicológica de- senvolvidas pelo curso e também das instituições nas quais foram realizadas. Os TCCs da Univasf são obrigatoriamente orientados por um profes- sor. Desse modo, consideramos desnecessário informar sobre isso em todos os capítulos. Nos capítulos com apenas dois autores, o primeiro foi sempre o estudante que realizou o TCC sob orientação do segundo; nos capítulos com três autores, os dois primeiros são os estudantes que realizaram o TCC sob orientação do terceiro. As exceções são apresentadas nos textos via nota de rodapé. Salientamos ainda o caráter interdisciplinar da psicologia, abarcado aqui: alguns dos trabalhos foram orientados por docentes de outros cursos, !ii como Ciências Sociais e Enfermagem, por exemplo. Por fim, agrademos ao professor do Colegiado de Artes Visuais da Univasf, Euriclésio Sodré, pela cessão da fotografia empregada na capa do livro, a Mariana Bezerra pela pre- paração da capa do livro e a Márcio Moreira, do Instituto Walden4, pela auxí- lio na editoração do livro. Boa leitura! !iii Pesquisa e prática em psicologia no sertão CAPÍTULO – 1 Avaliando o CAPS AD de Petrolina-PE entre 2006 e 2008 Silvoney Oliveira Matos Júnior Angelo A. S. Sampaio Resumo A Política Nacional de Atenção Integral a Usuários de Álcool e Outras Dro- gas tem como objetivo planejar intervenções terapêuticas, preventivas, reabi- litadoras e promotoras de saúde para as pessoas que fazem uso de álcool e drogas. A partir dessa proposta, os Centros de Atenção Psicossocial – Álcool e outras Drogas (CAPS AD) desenvolvem suas ações destinadas a essa popu- lação. Na tentativa de contribuir para as políticas em saúde, esta pesquisa buscou avaliar quase-experimentalmente como o CAPS AD da cidade de Petrolina (PE) realizou suas ações, no período de junho de 2006 a dezembro de 2008. As fontes de informação foram encontradas nos arquivos da institui- ção: livros de registro, controle de altas e prontuários. Os dados coletados indicaram alto índice de abandono, apontando falta de adesão ao tratamento, possivelmente devido a um conjunto de fatores: o difícil acesso à instituição, a alta exigência do tratamento baseado no modelo da abstinência, a pouca articulação da rede social, o número insuficiente de profissionais na institui- ção, a alta rotatividade de funcionários e a pequena variabilidade nas ativida- des propostas. Avaliações como essa fornecem subsídios para a implementa- ção das propostas em saúde mental para usuários de álcool e drogas, o seu planejamento, a formulação das intervenções, suas reformulações e ajustes, assim como as decisões sobre a manutenção ou interrupção das ações. Palavras-Chave: Avaliação de Programa, Política Pública, Quase-Experi- mentação, Droga (Abuso). !1 Pesquisa e prática em psicologia no sertão Segundo o Ministério da Saúde (Brasil, 2004a), 10% da população brasileira de centros urbanos, de todas as idades, sexos, níveis de instrução e renda, consome abusivamente substâncias psicoativas (SPAs) – principalmente ál- cool e tabaco. As consequências à saúde pública são preocupantes. O álcool, por exemplo, seria o responsável direto e indireto pela morte de aproxima- damente 1,5% da população brasileira (Brasil, 2001a). O consumo abusivo de álcool e outras drogas provoca também danos secundários aos sujeitos e à sociedade, comprometendo relacionamentos familiares, afetivos e no traba- lho, além da conduta no trânsito e, inclusive, agravando a disseminação das doenças sexualmente transmissíveis (Brasil, 2004a). De acordo com os estudos realizados pelo Centro Brasileiro de In- formações sobre Drogas (Brasil, 2001b), o Nordeste possui 1.537.000 pesso- as consumidoras abusivas de álcool, cerca de 16,9% da população regional – o maior índice do Brasil. No Nordeste, 29% da população também já utilizou qualquer droga exceto tabaco e álcool. Destes, 0,4% fazem uso prejudicial de crack (o mesmo índice das regiões Sul e Sudeste), 1,2% de maconha, 1,4% de cocaína, 9,7% de solvente (maior índice do país) e 11,2% de medicamen- tos para estimular o apetite (maior índice do país). Diante de dados como esses, foi proposta em 2004 a Política Nacio- nal para a Atenção Integral a Usuários de Álcool e Outras Drogas, objetivan- do realizar ações integradas e diversificadas quanto às intervenções terapêuti- cas, preventivas, reabilitadoras, educativas e promotoras de saúde para as pessoas que fazem uso abusivo de SPAs (Brasil, 2004a). Através da definição destas diretrizes, começou-se a construir uma rede de atendimento às pessoas que consomem SPAs, de forma a viabilizar a atenção integrada dos diversos serviços de saúde. A partir de então, o Ministério da Saúde, junto aos Centros de Atenção Psicossocial álcool e outras drogas (CAPS AD), desenvolve ações em saúde mental, em um determinado território , voltadas a pessoas com 1 O Sistema Único de Saúde (SUS) utiliza uma série de divisões territoriais para operacionalizar 1 suas ações: distritos sanitários, micro-áreas, áreas de abrangência de unidades de saúde, dentre outros. São áreas de atuação de caráter administrativo, gerencial, econômico ou político. “Daí sua importância estratégica para as políticassociais públicas na consolidação de ações para o enfrentamento de problemas e necessidades da população que o habita” (Gondim et al., 2008, p. 3). !2 Pesquisa e prática em psicologia no sertão dificuldades decorrentes do uso prejudicial e/ou dependência de qualquer SPA (Brasil, 2004a). O CAPS AD tem como missão coordenar e articular as políticas públicas de atenção a usuários de drogas em um território, garantindo a reabi- litação e a reinserção social. Para a execução destas atividades, os CAPS AD devem fazer parte de uma rede integrada de atenção à saúde que garanta a estruturação e fortalecimento das intervenções na comunidade. Este disposi- tivo de saúde ainda deve possibilitar a intervenção precoce alicerçada na pre- venção, promoção à saúde mental e na redução de danos (Brasil, 2004b). A política de redução de danos não prevê a abstinência como princi- pal objetivo a ser alcançado, mas a possibilidade do cuidado e a defesa da vida dos usuários abusivos de álcool e drogas. Apresenta-se como um novo caminho de tratamento destes sujeitos, podendo ocorrer em qualquer espaço, sem julgamento de valor, trabalhando com o que lhe é demandado e ofertado naquele contexto, considerando a situação de cada usuário (Moraes, 2008). A proposta da redução de danos, segundo Campos (2003), visa construir ambi- entes sociais favoráveis à promoção de saúde e desenvolver a autonomia dos indivíduos e da comunidade. Por estimular a corresponsabilidade dos usuári- os no tratamento, a redução de danos também facilitaria a adesão ao trata- mento, implicando ainda a criação de vínculo com os profissionais, que pas- sam assim a serem corresponsáveis pela construção dos novos caminhos de vida daqueles usuários (Moraes, 2008). Em outros termos, as ações do CAPS AD e de outras políticas públi- cas relacionadas visam prover consequências que diminuam comportamentos socialmente indesejados e aumentem comportamento socialmente desejáveis. Para Todorov (2005), em alguns casos, a legislação estabelece consequências aversivas e visa suprimir determinados comportamentos. Em outros casos, ela visa “incentivar comportamentos desejáveis, geralmente disponibilizando consequências positivas para tais comportamentos” (p. 29). Mas que con- sequências têm sido efetivamente proporcionadas na atenção aos usuários de álcool e outras drogas? As intervenções baseadas em tais políticas garantem benefícios aos usuários dos serviços de saúde pública para dependentes de SPAs? Avaliar os programas de saúde para usuários de SPA seria um caminho !3 Pesquisa e prática em psicologia no sertão para responder essas questões e determinar se (e como) as políticas públicas aos usuários de drogas estão atingindo o público-alvo. Avaliando políticas públicas A avaliação de políticas públicas visa determinar, de maneira siste- mática e objetiva, a complexidade e a operacionalização de programas espe- cíficos, assim como investigar o quão relevantes e efetivas são estas políticas. Também permite identificar se seus efeitos influenciaram o comportamento das pessoas ou mesmo se produziram mudanças nas relações sociais, assim como os impactos sobre indicadores sociais (Bortoloti & D’Agostino, 2007). Segundo Mourão e Laros (2008): As avaliações de programas permitem desenvolver e fortalecer a ação pública, com dois objetivos principais: oferecer subsídios para melhoria da eficiência e eficácia da administração desses programas, e oferecer respostas à sociedade sobre a efetividade social das políti- cas implantadas, em um processo de prestação de contas. (p. 545) Para Campbell (1969), um processo avaliativo deve ser contínuo, pois assim permitirá aprimorar os programas em seus diversos níveis. De acordo com o autor, a possibilidade da avaliação contínua permite uma reava- liação sistemática das intervenções, assim como a revisão e apoio ao plane- jamento e administração das ações. Segundo Drumond Jr. (2006), a avaliação das políticas públicas na saúde não se resume a um método de produção de conhecimento, mas é um procedimento de orientação de práticas de planeja- mento, gestão e intervenção. Avaliar é um instrumento de conhecer e trans- formar as condições de produção em saúde que envolve um coletivo, contri- buindo para a atuação de profissionais e equipes no processo de construção e condução das políticas, ações e serviço de saúde. Quanto à avaliação das políticas sobre SPAs, alguns pontos são fun- damentais (Brasil, 2004a). Um deles é a necessidade de criar instrumentos efetivos para a avaliação do tratamento aos usuários. Outro ponto é a exigên- cia de maiores estudos epidemiológicos para o aprofundamento do conheci- !4 Pesquisa e prática em psicologia no sertão mento de cada região, dando subsídios para o planejamento do serviço de saúde. Ainda outro ponto envolveria dar mais importância às pesquisas, apro- veitando as informações já existentes na instituição, assim como aperfeiçoar as fichas, documentos e livros de registro para a utilização de uma avaliação mais rigorosa. Nas palavras de Campbell (1969), a avaliação possibilita um novo olhar frente aos documentos produzidos e registrados na instituição. Diante destas afirmações, observa-se a necessidade de se investigar e avaliar as políticas públicas, a partir de dados empíricos consistentes e de procedimentos técnicos que permitam analisar os efeitos de tais políticas. Para realizar uma investigação sistemática destas políticas, com critérios cla- ros, se faz necessário um referencial metodológico que permita a análise das variáveis no ambiente natural. Neste tipo de pesquisa avaliam-se situações em que não é possível atingir o mesmo grau de controle das variáveis como nos experimentos de laboratório. Quase-experimentos ou experimentos natu- rais podem ser especialmente úteis nesses casos (Sampaio, Andery & Baia, 2013). Quase-experimentos ou experimentos naturais Muitos trabalhos científicos utilizam os delineamentos experimen- tais clássicos como método de análise de dados, caracterizando-se pelo con- trole máximo das variáveis relevantes. As variáveis permanecem sob controle constante, para que seja possível comparar se as intervenções realizadas (va- riáveis independentes - VI) tiveram algum efeito no objeto de estudo (variá- veis dependentes - VD). No entanto, frequentemente os pesquisadores se de- frontam com limites em relação aos delineamentos experimentais clássicos, principalmente ao lidar com situações em que não é possível atingir um grau de controle das variáveis como, por exemplo, as pesquisas que envolvam um grande número de pessoas em ambientes naturais. Segundo Sampaio et al. (2013), os quase-experimentos ou experi- mentos naturais empregam a mesma lógica da experimentação e são alterna- tivas viáveis e necessárias quando a experimentação não é possível. Realizar um quase-experimento envolve tentar estabelecer relações funcionais entre !5 Pesquisa e prática em psicologia no sertão VIs e VDs, quando condições com e sem as VIs estão presentes no ambiente estudado. Em algumas situações pode ser impossível realizar experimentos propriamente ditos e, nestes casos, a busca por relações funcionais sem muito controle sob variáveis relevantes pode ser a única alternativa. Em um quase- experimento, existem limites ao controle das VIs, das VDs e das variáveis estranhas (VEs), com alguma dificuldade na afirmação de que uma VI exerça de fato controle sobre uma VD. Sendo assim, seria fundamental em um qua- se-experimento uma avaliação criteriosa das limitações impostas ao pesqui- sador em termos das conclusões que podem ser derivadas dos dados produzi- dos (Sampaio et al., 2013; Schnelle & Lee, 1974). Além da possibilidade de sugerir relações funcionais entre as variá- veis, os experimentos naturais podem fornecer informações descritivas im- portantes sobre uma população estudada, já que o procedimento de coleta de dados facilita a inclusão de muitos sujeitos nas pesquisas (Cozby, 2003; Sampaioet al., 2013). Alguns quase-experimentos, por exemplo, foram con- duzidos com toda a população de interesse do pesquisador (Campbell, 1969; Schenelle & Lee, 1974). Os quase-experimentos são muito utilizados para a avaliação de pro- gramas, assim como em estudos sobre grupos, sociedades e culturas (Camp- bell, 1969; Mourão & Laros, 2008; Sampaio et al., 2013; Schnelle & Lee, 1974). Para Campbell (1969), a avaliação de intervenções através de um qua- se-experimento tem a característica de analisar as VEs conhecidas para vali- dação da interpretação dos resultados. Estas VEs são, então, avaliadas em termos da situação em análise e, segundo o autor, se pretende excluir ou acei- tar como plausíveis os efeitos da VI sobre a VD. O resultado deste processo geralmente é apenas uma conclusão tentativa ou aproximada dos efeitos da intervenção, mas, pelo menos, uma conclusão com base nos dados disponí- veis. Campbell (1969) relatou um estudo que utilizou o delineamento quase-experimental de série temporal interrompida para avaliar o impacto de uma mudança na legislação em um estado dos EUA (VI) sobre o número de !6 Pesquisa e prática em psicologia no sertão acidentes de trânsito com vítimas fatais (VD). A nova legislação entrou em vigor em 1955 e o autor analisou dados de 1951 a 1959. Entre 1955 e 1956 houve uma queda acentuada no número de acidentes fatais – o que poderia sugerir uma sucesso estrondoso da nova lei. Contudo, a análise de toda a sé- rie de dados sugeriu a pertinência de outras explicações possíveis (VEs) para essa queda acentuada: a divulgação das altas taxas de mortalidade, a instabi- lidade inerente a medidas desse tipo ou o fenômeno da regressão à média poderiam ter contribuído para o resultado em 1956. Como os indíces continu- aram caindo – de modo menos acentuado, porém – nos anos posteriores a 1956, o autor concluiu que o programa foi sim um sucesso, apenas não um sucesso tão grande quanto poderia parecer a partir da análise apenas dos anos imediatamente próximos à aprovação da legislação. Assim, este método de análise permitiu uma interpretação dos dados com maior precisão em compa- ração a uma análise que se restringisse apenas os anos de 1955 e 1956. De acordo com Cozby (2003), alguns aspectos importantes dos qua- se-experimentos seriam: permitir a avaliação de programas e a investigação de eventos que estariam fora do alcance temporal das observações diretas feitas pelo pesquisador; o baixo custo da coleta de dados; e a possibilidade de se utilizar uma amostra que envolva um grande número de pessoas. Tais van- tagens são significativas quando se pretende estudar programas sociais e/ou políticas públicas. Schnelle e Lee (1974) exemplificam essa abordagem ao utilizar um delineamento quase-experimental de série temporal interrompida para avaliar a eficácia de uma política disciplinar em uma prisão com aproximadamente 2.000 reclusos nos EUA, entre os anos de 1969 a 1971. Os autores investiga- ram se, e como, a política de intervenção empregada diminuía as infrações dentro do presídio. Os pesquisadores avaliaram o comportamento dos deten- tos antes da implementação da política e o período após a realização do pro- grama. A intervenção (VI) foi a transferência dos presos que cometessem mais de três delitos para um presídio de segurança máxima. Para avaliar os resultados, foram investigadas VDs registradas nos diários e livros de ocor- rência, tais como: a frequência dos delitos, o tipo de infração, o número de transferências para a outra prisão e as punições dadas aos delitos. !7 Pesquisa e prática em psicologia no sertão Schnelle e Lee (1974) começaram sua análise excluindo os dados dos presos transferidos do presídio devido a comportamentos inadequados na prisão, para permitir uma comparação adequada entre os comportamentos dos que não foram transferidos antes e após a intervenção. A seguir, Schnelle e Lee calcularam o número de infrações cometidas por preso por dia, obtendo um número médio a cada mês. Os tipos de delitos foram classificados em 11 classes de comportamentos e a frequência de ocorrência de cada um deles foi registrada. Por fim, foi realizada uma avaliação gráfica para verificar o número total de delitos de todos os presos durante os anos de 1969 à 1971. Após a implementação do programa houve uma diminuição do terceiro delito pelos presos, no entanto as primeiras e segundas infrações aumentaram significativamente. Isso teria se dado devido aos detalhes de como as transferências para o presídio de segurança máxima (e outras punições) eram efetuadas. O estudo ilustra o processo pelo qual se pode tirar conclusões qualificadas a partir de dados coletados em arquivos de instituições. O quase-experimento ou experimento natural, desta forma, seria um instrumento de investigação científica indicado para analisar as práticas de instituições públicas, já que as mesmas ocorrem em um ambiente natural, expostas a uma grande variedade de situações sem possibilidade de controle de todas as variáveis. Ele é um instrumento eficiente para a avaliação das políticas públicas, inclusive na área da saúde (Antunes, 2001), e, portanto, foi aqui empregado para investigar as ações em saúde oferecida pelo CAPS AD aos seus usuários na cidade de Petrolina-PE. Na tentativa de contribuir para a implementação dos programas pú- blicos em saúde para usuários de SPAs, a presente pesquisa buscou caracteri- zar a implantação do CAPS AD de Petrolina-PE e responder: (1) Entre 2006 e 2008, o CAPS AD foi efetivo no tratamento dos seus usuários? (2) Quais variáveis interferiram na adesão ao tratamento dos usuários? (3) Quais estra- tégias foram utilizadas para intervenção com essa população? !8 Pesquisa e prática em psicologia no sertão Método Instituição avaliada O CAPS AD da cidade de Petrolina-PE foi criado em meados de 2006 como modelo substitutivo ao hospital psiquiátrico estabelecido na re- gião do Vale do São Francisco, visando garantir o direito ao atendimento em serviços de saúde das pessoas que consomem abusivamente álcool e outras drogas neste território (Petrolina, 2006). A equipe completa da instituição é composta por: coordenador, agente administrativo, artesão, artista plástico, assistente social, enfermeiro, farmacêutico, médico generalista, psiquiatra, psicólogo, terapeuta ocupacional, dois técnicos de enfermagem, além de equipe de apoio (auxiliares de serviços gerais, merendeiras, secretária e vigi- lantes). No entanto, no período analisado nessa pesquisa, houve equipe com- pleta de profissionais na instituição apenas em seus cinco primeiros meses de funcionamento. O público-alvo do serviço inclui pessoas de ambos os sexos, a partir dos 18 anos. O CAPS AD Petrolina-PE possuía o número máximo de 190 usuários ativos no mês. Destes, 40 na modalidade de tratamento intensivo (comparecimento diário ao serviço), 60 na modalidade semi-intensiva (com- parecimento três vezes por semana) e 90 na categoria não-intensiva (pacien- tes que se apresentam ao serviço a cada 15 dias). Os usuários, que permaneciam durante as manhãs no CAPS AD, participavam de atividades como: atendimento individual (médico, psicoterá- pico e de orientação), atendimento grupal (psicoterapia, grupo operativo e atividades de suporte social), oficinas terapêuticas, atendimento de desintoxi- cação, visitas domiciliares e atividades comunitárias enfocando a integração social do usuário na família e na comunidade. Os atendimentos no CAPS AD eram realizados predominantemente em grupos, na articulação entre profissi- onais e usuários, possibilitando o desenvolvimento de treino de habilidades sociais, comportamentos assertivos e autocontrole por parte dos usuários, de modo a adquirirem novos repertórios comportamentais. Outra atividade reali- zada pelos profissionais era o “Grupo de Familiares” do qual participavam, de forma voluntária, uma pessoa da família próxima do usuário, sendo coor- !9 Pesquisa e prática em psicologia no sertãodenado por um profissional da instituição, com o objetivo de identificar as relações a que estão submetidas as pessoas que usam abusivamente álcool e outras drogas. De acordo com o regimento interno do CAPS AD, os usuários podi- am ser desligados da instituição por: (1) alta clínica, (2) alta por abandono, (3) alta a pedido do usuário e (4) alta administrativa. A ocorrência de um dos seguintes comportamentos indicava alta administrativa: (a) usar ou portar SPAs dentro da Unidade, excetuando as prescritas pelo médico; (b) agressões físicas, verbais e ameaças; (c) roubos e furtos de objetos; (d) descumprimento das normas de funcionamento da instituição; (e) não participar das atividades terapêuticas do programa de tratamento no horário programado; (f) ausentar- se da instituição sem permissão; (g) entrar na instituição com objetos perfu- rocortantes, armas de fogo, armas brancas ou objetos que denotem ameaça a si ou a outros. Antes do início da pesquisa, a equipe da instituição foi esclarecida que a pesquisa não oferecia nenhum risco, perigo, constrangimento ou prejuí- zo aos participantes. Foi acordado com a instituição que ela poderia desistir da pesquisa caso julgasse necessário e que as informações fornecidas não seriam utilizadas para outros fins que não os acadêmicos. O sigilo no que diz respeito à identificação dos profissionais e usuá- rios envolvidos foi mantido. Partindo disso, foi elaborado uma Carta de Anuência, a qual foi assinada pelo coordenador do CAPS AD, permitindo a análise de documentos da instituição, especialmente documentos referentes à participação dos usuários nas atividades desenvolvidas pela instituição, tendo como objetivo avaliar a atenção à saúde oferecida pelo CAPS AD de Petroli- na-PE aos seus usuários. Fontes de informação A investigação analisou primordialmente os registros documentados na instituição referentes ao período de junho de 2006 a dezembro de 2008. As fontes de informação principais foram: (1) 833 prontuários de usuários que !10 Pesquisa e prática em psicologia no sertão saíram da instituição, contendo os registros da história de vida dos usuários, sua história no serviço e sua participação nos grupos terapêuticos; (2) os li- vros de acompanhamento diário das atividades desenvolvidas no CAPS AD, que expressavam a posição dos usuários frente ao contrato de tratamento no serviço; (3) o “livro de admissão e alta”, que permitiu investigar o número de usuários registrados no serviço, o período de entrada e saída dos usuários no CAPS AD, a frequência de altas e os seus respectivos motivos e o número de transferências para outros serviços de saúde; e (4) os livros de reunião, atra- vés dos quais se investigou os períodos de cada coordenação e as modifica- ções/alterações realizadas por cada uma delas durante a sua passagem no CAPS AD. Outras fontes de informações como o controle de produtividade, onde se encontram as atividades realizadas pelos profissionais da equipe, e as folhas de registro que compõem os procedimentos de alta complexidade rea- lizados na instituição (APACs), também foram consultadas. Algumas infor- mações foram coletadas a partir de observação direta dos eventos no cotidia- no da instituição, visto que o primeiro autor esteve presente na instituição entre agosto de 2007 e outubro de 2009. Procedimento A análise de dados iniciou-se pela leitura dos prontuários, livro de admissão e alta, registro das frequências e controle de altas que se encontravam nos arquivos da instituição. Foram avaliados em média 20 prontuários por dia, nos quatro meses de coleta. Inicialmente, foram separados os prontuários de acordo com os tipos de saída – alta clínica, abandono do serviço, saída a pedido e alta administrativa. A seguir, os prontuários foram separados por ano de saída e por mês. No último momento de coleta, contou-se o número de usuários que saíram por mês da instituição, assim como o tempo de permanência de cada usuário no serviço. A instituição já havia compilado os dados referentes ao período de permanência e ao tipo de saída dos usuários no serviço para o ano de 2006. Esses dados, registrados no livro de admissão e altas, foram aproveitados na !11 Pesquisa e prática em psicologia no sertão análise. Para os anos de 2007 e 2008, recontamos as saídas, pois observamos uma concentração dos registros de alta feitos pelos profissionais no mês de setembro de 2007, ou seja, os registros das saídas ocorridas em meses anteriores haviam sido registrados somente nesse mês. Fazendo uma análise retrospectiva dos dados, consideramos como data de saída o último dia de comparecimento do usuário na instituição – e não mais a data registrada pelo profissional. Fichas de readmissão dos usuários, que registravam usuários que deixaram a instituição e retornaram, foram excluídas da análise por fugirem do foco da pesquisa (que foi em usuários que deixaram o serviço e não em usuários ativos). Por fim, analisou-se através do livro de admissão e alta, o tempo de permanência de cada usuário no CAPS AD, bem como os encaminhamentos dos pacientes para outros serviços de saúde. O tempo de permanência do usuário foi caracterizado como o período de entrada na instituição até a data de saída. Resultados A Figura 1 apresenta os motivos das saídas dos usuários do serviço (abandono, alta a pedido, alta clínica, alta administrativa ou encaminhamen- to) assim como o número de profissionais que saíram do serviço em cada mês do período analisado. O abandono foi o motivo mais frequente de saída dos usuários, totalizando 81,4% em todo o período estudado. Os meses de janei- ro, fevereiro e junho, são os que apresentam os mais altos índices de abando- no – com exceção de junho de 2006, quando o CAPS AD ainda estava inici- ando suas atividades. O aumento nos abandonos coincide com períodos festi- vos como Natal, Réveillon, Carnaval e São João. O mês de setembro de 2006 apresenta um alto número de saídas por abandono, possivelmente devido ao CAPS AD ainda estar iniciando suas atividades. !12 Pesquisa e prática em psicologia no sertão Figura 1. Número de usuários que saíram do CAPS AD de Petrolina-PE por abandono, alta a pedido, alta clínica ou alta administrativa e número de pro- fissionais que se afastaram do serviço entre junho de 2006 e dezembro de 2008. !13 Pesquisa e prática em psicologia no sertão Os demais motivos de saída dos usuários tiveram frequência muito baixa. Os encaminhamentos responderam por 8,8% das saídas no período, com um máximo de seis saídas em maio de 2007. As altas a pedido mantive- ram uma frequência de até cinco por mês, correspondendo a 7,5% do total no período. As altas administrativas foram responsáveis por 1,8% do total de saídas. Só foram registradas duas altas clínicas – 0,4% do total de saídas no período analisado. Pelas observações realizadas, a equipe do CAPS AD pare- ce não ter clareza da definição de alta clínica. Em janeiro e fevereiro de 2007 houve dois dos três maiores picos de abandonos do CAPS AD e, no mesmo período, saíram o terapeuta ocupacio- nal, o nutricionista e o assistente social da instituição devido a mudança na conjuntura política do município. O maior índice de abandono do serviço se dá no mês de junho de 2008, justamente no mês da saída do psicólogo, que estava há 23 meses na instituição, e de mais três profissionais, além de ocor- rer após três trocas sucessivas de coordenadores do serviço. Em 2008, ocorreu o maior número de demissões e transferências de profissionais do CAPS AD. Alguns profissionais foram substituídos, enquan- to a saída de outros profissionais deixou o serviço desfalcado (médico gene- ralista, engenheiro agrônomo e nutricionista). A partir de então, os profissio- nais que permaneceram no serviço, passaram a ficar sobrecarregados, exer- cendo as funções dos profissionais ausentes. De fato, desde março de 2008 a instituição não possuía o número de profissionais recomendados pelo Minis- tério da Saúdepara funcionar como um serviço de saúde mental em álcool e outras drogas (Brasil, 2004a). No mês de junho, só havia um único profissio- nal trabalhando no CAPS AD, o qual assumiu a função de coordenador. Neste mesmo período, o CAPS AD apresentou o número de abandonos mais eleva- do do ano. Além das mudanças constantes de profissionais, houve também uma rotatividade no quadro de coordenadores. De acordo com o livro de ocorrên- cia do serviço, no ano de 2007 foi efetivado no cargo um novo coordenador, e já no primeiro semestre de 2008 foram realizadas outras três trocas de coor- denadores do CAPS AD. !14 Pesquisa e prática em psicologia no sertão As trocas frequentes de coordenadores e profissionais, assim como o número reduzido destes últimos na instituição, também pareceram dificultar a articulação do CAPS AD com outras instituições sociais que poderiam con- tribuir na atenção a saúde dos usuários de SPAs (Moraes, 2008). Esta afirma- ção pode ser avaliada a partir dos encaminhamentos realizados pela institui- ção. Segundo os dados dos prontuários dos usuários e dos procedimentos de encaminhamento, a instituição articulou-se apenas com os serviços que pres- tam assistência a saúde, não sendo identificada nenhuma articulação com outros dispositivos da sociedade civil organizada (e.g., ONGs, associações de moradores, sindicatos, grupos comunitários ou centros de convivência). So- mente dois encaminhamentos referenciados foram realizados para a Estraté- gia Saúde da Família (ESF) entre 2006 e 2008. As ações integradas do CAPS AD estão articuladas, principalmente, com os serviços especializados em saúde mental. Os encaminhamentos à policlínica foram os mais frequentes, totalizando 54 durante o período de análise da pesquisa. As outras articula- ções do CAPS AD se resumiram ao CAPS II de Petrolina-PE e de Juazeiro- BA (19 encaminhamentos), ao Hospital Geral (dois encaminhamentos) e ao sanatório (dois encaminhamentos). Esses dados indicam a discrepância entre as ações do CAPS AD e a proposta do Ministério da Saúde, que deveria ser pautada em uma rede integrada e universal que funcionasse como modelo substitutivo ao sistema psiquiátrico tradicional. A Figura 2 apresenta o número de usuários que abandonaram o CAPS AD pelo seu tempo de permanência em meses. Muitos usuários aban- donaram o serviço antes de completar o primeiro mês na instituição. Isto é possivelmente explicado, em parte, pelo difícil acesso a instituição, assim como a localidade onde se encontra o serviço. Cerca de 20% dos usuários são moradores da zona rural do município e apenas 29% residem em bairros que fazem parte do distrito sanitário no qual o CAPS AD está inserido. A variação dos abandonos nos três primeiros meses – com uma queda no segundo mês e, logo em seguida, um aumento – é possivelmente explicada pelo horário (co- mercial) de funcionamento do serviço, o que dificulta a permanência dos usuários que possuem algum vínculo empregatício, assim como alguns usuá- rios que estão em abstinência há um mês e acham que já estão recuperados e abandonam o serviço elevando o número de saídas no primeiro mês. Já no terceiro mês podem abandonar aqueles usuários que não se adaptam à políti- !15 Pesquisa e prática em psicologia no sertão ca de abstinência da instituição, ou que, após estar a dois meses no serviço, necessitam de emprego. ! Figura 2. Número de usuários que abandonaram o CAPS AD de Petrolina-PE por tempo de permanência na instituição (número de meses). As altas frequências de abandono (Figura 1) também podem estar condicionadas às atividades realizadas no CAPS AD, cujas frequências são apresentadas na Tabela 1. Algumas atividades foram propostas no projeto de fundação do serviço e nunca foram realizadas: o grupo de prevenção à recaí- da e atividades sócio-educativas. A atividade mais frequente, o artesanato, apresentou de 2006 a 2007 frequências bastante elevadas, porém, no ano de 2008, estas atividades pararam de ser registradas nos livros de atividades da instituição. Em julho de 2007, o CAPS AD perdeu seu artesão e quem passou a executar as atividades relacionadas foi o terapeuta ocupacional. Contudo, em 2008, esse profissional se afastou da instituição e o artesanato passou a ocorrer esporadicamente, coordenado por voluntários. Assim, das 12 ativida- des propostas pela instituição, 9 ocorreram até dezembro do ano de 2008. !16 Pesquisa e prática em psicologia no sertão Tabela 1. Frequências das atividades realizadas no CAPS AD de Petrolina-PE entre julho de 2006 e dezembro de 2008. Em alguns grupos identifica-se os profissionais responsáveis por sua coordenação (coord.) As atividades externas, uma das mais frequentes, envolveram encon- tros para jogar futebol ou voleibol e apresentaram um número muito baixo de Atividades Frequência 2006 2007 2008 Total Artesanato 64 98 0 162 Assembléia 29 54 52 135 Atividades Externas 35 49 50 134 Grupo de Terapia Ocupacional 23 51 48 122 Grupo Terapêutico 1 (coord. psicólogo e assist. social) 20 50 52 122 Grupo Educação e Saúde (coord. enfermei- ro) 26 45 48 119 Grupo Terapêutico 2 (coord. psicólogo) 25 48 40 113 Grupo Terapêutico Familiar 14 37 45 96 Reuniões dos Alcoólicos Anônimos 0 35 51 86 Visitas Domiciliares 13 11 9 33 Grupo Terapêutico 3 (coord. médico) 13 4 5 22 Oficina de Agronomia 8 10 0 18 Total 270 492 400 1162 !17 Pesquisa e prática em psicologia no sertão usuários (entre 8 e 12 participantes por encontro). Não havia um planejamen- to prévio das intervenções que poderiam ocorrer nessas atividades, assim como não havia o acompanhamento de educadores físicos. O tempo de duração das atividades realizadas no CAPS AD, ao lon- go dos anos, está relacionada com a permanência ou não de determinadas categorias profissionais no serviço. As visitas domiciliares foram paralisadas ora pela saída dos assistentes sociais ora pela falta de transporte disponibili- zado pela Secretaria de Saúde; a oficina de Agronomia só foi realizada até setembro de 2007; o Grupo Terapêutico 3, coordenado pelo médico, até mar- ço de 2008, quando o mesmo deixou a instituição. Já as Reuniões dos Alcoó- licos Anônimos, que têm como referencial de intervenção o modelo abstêmio, só vieram a ser executadas a partir do ano de 2007, apresentando altas frequências nos anos seguintes. Discussão As informações coletadas foram analisadas enquanto um quase-ex- perimento (Cozby, 2003), observando quais atividades foram executadas pela equipe de saúde e a sua frequência, assim como o tempo de permanência dos usuários no serviço e os motivos para a saída deles da instituição. O CAPS AD apresentou um alto número de usuários que abandonaram o tratamento antes de completar o primeiro mês no serviço, sugerindo uma dificuldade em aderir ao tratamento, possivelmente devido a um conjunto de fatores: horário de funcionamento do serviço, o difícil acesso à instituição, a alta exigência ao tratamento sobre os usuários – através do modelo de abstinência –, pouca articulação da rede social, o número insuficiente de profissionais na institui- ção, a alta rotatividade de funcionários e a pequena variabilidade nas ativida- des propostas e/ou falta de planejamento das atividades realizadas. Os três primeiros meses dos usuários no serviço são os mais críticos para a permanência destes no CAPS AD. Isso pode ser explicado pelos horá- rios de funcionamento da instituição, principalmente para aqueles que possu- em vínculo empregatício no mesmo período em que a instituição disponibili- !18 Pesquisa e prática em psicologia no sertão za seu tratamento. Segundo dados do Ministério da Saúde (Brasil, 2004b), os horários dos CAPS AD podem ser expandidos para o turno noturno, funcio- nando até as 21 horas, flexibilizando os horários de tratamentos para as pes- soas que trabalham. A dificuldade de acesso ao serviço foi outro empecilho para a permanência dos usuários, pois apenas 29% destes residem próximo ao CAPS AD. Grande partedos usuários que moravam distante do serviço não possuiam condições financeiras para custear o transporte diário para a insti- tuição e o serviço não disponibilizava auxílio-transporte ou passe livre, o que dificulta ainda mais o deslocamento destas pessoas para o local. A alta exigência do tratamento disponibilizado aos usuários também pode explicar as frequências de abandono, saída a pedido e alta administrati- va. Os métodos de intervenção medicamentosos, utilizados em 100% dos usuários (sugerindo uma uniformização da intervenção), a constante vigilân- cia em relação a regularidade dos horários da sua administração, como tam- bém as atividades pautadas na abstinência ao uso de drogas podem promover uma baixa adesão ao tratamento dos usuários no serviço (Marlatt, 1999). Houve ainda uma relação entre a saída constante dos profissionais do serviço e os maiores índices de abandono. A ausência e rotatividade dos profissionais inviabiliza a consolidação de convênios interinstitucionais, a continuidade de atividades no próprio CAPS AD e a realização de visitas domiciliares, que na maioria dos casos possibilita uma melhor relação tera- pêutica (Rehem & Trad, 2005). Essa situação foi causada, ao menos em parte, pelas mudanças do quadro político do município, durante as quais, por exem- plo, a equipe de um novo prefeito indicou alterações a serem realizadas no quadro profissional da instituição. Segundo Campos (2003), a articulação das estratégias intersetoriais, que vão além dos serviços de saúde, podem contribuir na formulação de polí- ticas públicas mais amplas, que possam lidar de forma adequada com a com- plexidade envolvida no uso de SPAs, viabilizando um maior vínculo dos usuários na instituição. Diante disso, como afirmaram Campos (2003) e Feu- erwerker (2001), mesmo a ampliação da rede de serviços não seria suficiente para se ter uma atenção integral à saúde dos usuários. Talvez seja necessário o envolvimento político dos gestores de saúde mental na formação de profis- !19 Pesquisa e prática em psicologia no sertão sionais habilitados ao trabalho com pessoas que fazem uso de SPA dispostos a romper com o princípio da abstinência, profundamente enraizados na nossa sociedade, como também para a construção de uma política que possa incen- tivar a manutenção destes profissionais na rede pública de saúde mental. Os poucos encaminhamentos registrados para os serviços que for- mam a rede social dos usuários sugerem que o CAPS AD não se apresentou, ao menos no período analisado, como coordenador do entrelaçamento da rede de atenção em saúde mental para usuários de drogas no seu território. Os dispositivos de cuidado em saúde que estão inseridos na comunidade não fizeram parte da rede de cuidados disponibilizados pelo serviço e houve um excesso de encaminhamentos para a policlínica (serviço especializado), o que pode inflar os serviços de média complexidade. Alguns desses casos prova- velmente poderiam ser encaminhados (referenciados) para a atenção básica. Além destes tipos de encaminhamentos, foi observado nas fichas de controle de alta que dois usuários foram direcionados para sanatórios (obser- vou-se, também alguns outros encaminhamentos para o sanatório que não foram registrados nos prontuários) – uma contradição em relação à Política de Saúde Mental para usuários de SPAs, já que o CAPS AD é uma proposta de modelo substitutivo às instituições manicomiais (Brasil, 2004a; Moraes, 2008; Pitta, 2001). A instituição também não se articulou com os dispositivos de cuidado em saúde inseridos na comunidade que fazem parte da rede de assistência disponibilizada no município. Segundo Pitta, há necessidade do estabelecimento de parcerias com outros setores da sociedade civil para con- tribuir nas atividades dentro e fora dos CAPSs, principalmente no que se re- fere às atividades de geração de renda, inserção no mercado de trabalho, as- sim como no resgate a cidadania destas pessoas, como preconizado pela polí- tica de atenção aos usuários de álcool e outras drogas. O grande número de abandonos também pode estar relacionado à falta de uma política municipal de atenção a saúde mental no município. A inexistência de uma coordenação de saúde mental no município entre 2006 e 2008 pode ter interferido na articulação do serviço com os outros dispositivos da rede de assistência a saúde dos usuários, o que de certa forma, inviabiliza !20 Pesquisa e prática em psicologia no sertão acordos interinstitucionais, assim como uma política que viabilize ações intra CAPSs (Moreira, Silva, & Martins, 2009). De modo geral, boa parte do modelo de atenção à saúde descrito na Política de Atenção Integral pareceu não fazer parte do cotidiano das ativida- des do CAPS AD de Petrolina-PE entre 2006 e 2008. As maiores dificuldades estiveram na tentativa de intervir sobre a (re)inserção social dos usuários através de ações intersetoriais que envolvessem educação, trabalho e cultura, montando estratégias conjuntas para o enfrentamento dos problemas destas pessoas. Apesar da questão do uso de SPAs exigir maiores reflexões, essa pesquisa indica uma importante contribuição aos profissionais que atuam junto aos consumidores de SPAs, assim como profissionais da saúde mental que atuam no CAPS AD, por refletir sobre a experiência em um serviço pú- blico que evidencia a necessidade do conhecimento sobre as variáveis que interferem no comportamento dos usuários, bem como em relação aos objeti- vos da instituição, que não devem se restringir única e exclusivamente à bus- ca da abstinência das drogas e sim, como afirma Moraes (2008), à melhoria da assistência prestada no enfrentamento dos problemas associados ao uso de SPAs, pautada nas necessidades e interesses de cada usuário. Nesse sentido, é necessário elaborar instrumentos que contribuam para um melhor aproveitamento das informações contidas nos registros da instituição para facilitar intervenções frente às variáveis que interferem na adesão ao tratamento dos usuários e, principalmente, na eficácia da atenção à saúde dos usuários de SPAs do município. Essa pesquisa visou contribuir com o planejamento, monitoramento e avaliação das ações e serviços de saú- de mental. Como afirma Campbell (1969), um processo avaliativo deve se dar de forma contínua, permitindo aprimorar as ações em seus diversos ní- veis. A possibilidade da avaliação contínua permite uma reavaliação sistemá- tica das intervenções. Tais esforços podem contribuir para importantes avan- ços no SUS e na saúde mental. É importante reconhecer, contudo, que os desafios atuais exigem um novo posicionamento do planejamento no âmbito das ações em saúde realizadas pela instituição para que possam aplicá-la de !21 Pesquisa e prática em psicologia no sertão forma plena e efetiva na consolidação da Política Nacional de Atenção Inte- gral ao usuário de álcool e outras drogas. Entre os desafios apresentados, vale destacar a dificuldade na coleta dos dados, principalmente no que concerne aos registros realizados no banco de dados da instituição, em especial os registros das rotinas de monitoramen- to e avaliação. Como afirma Cunha (2006), a avaliação é um instrumento importan- te para a melhoria da qualidade da gestão e no controle sobre a efetividade das ações, possibilitando, sempre que possível, uma reavaliação dos proce- dimentos realizados, assim como o replanejamento das metas a serem alcan- çadas, bem como para a divulgação de resultados. Dessa forma, avaliações como a que realizamos no CAPS AD fornecem subsídios para a implementa- ção das propostas em saúde mental para usuários de SPAs, o seu planejamen- to, a formulação das intervenções, suas reformulações e ajustes, assim como as decisões sobre a manutenção ou interrupção das ações. A quase-experi- mentação foi fundamental para atingirmos os nossos objetivos por nos permi- tir inferir quais variáveis interferiram na adesão ao tratamento e como a falta de uma política de saúde mental nomunicípio pode interferir no cuidado prestados aos usuários de SPA. Referências Antunes, C. M. F. (2001). Métodos epidemiológicos para planejamento e avaliação de impacto dos programas de controle vetorial da doença de Chagas. Grupo de Trabajo OPS en Enfermedad de Chagas, Montevi- deo, Uruguay, 29-33. Retirado de http://www.amro.who.int/spanish/ ad/dpc/cd/consulta-6.pdf. Bortoloti, R., & D’Agostino R. G. (2007). 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Identificou-se que o SPE não criou dados suficientes nem condições ideais para avaliar sua eficácia, mas os dados disponíveis dão indícios que um de seus objetivos principais, a redução de gestantes adoles- centes, não foi atingido no período analisado. Palavras-Chave: Adolescência, Avaliação de Programas, Quase-Experimen- to, Saúde e Prevenção nas Escolas (SPE). A adolescência, mesmo sendo um tema tratado nos meios acadêmicos desde o início do século XX, nunca suscitou tantas pesquisas como nas últimas dé- cadas, sendo objeto de estudo das ciências da saúde e da educação, na busca de compreender as várias nuances dessa fase do desenvolvimento (Fonseca & Araújo, 2004). O Brasil conta com mais de 54 milhões de cidadãos na faixa de 10 a 24 anos de idade (faixa que abarca diferentes definições quanto ao início e término da adolescência), o que representa 30,3% da população (Bra- sil, 2006). Segundo Berquó (2004), a taxa de fecundidade na faixa etária dos 15 a 19 anos teve um crescimento de 25% entre 1991 e 2000 no Brasil. !26 Pesquisa e prática em psicologia no sertão As questões relacionadas aos jovens, principalmente quanto à gesta- ção não planejada, permanecem como uma problemática crescente e parecem não serem impactadas pelas intervenções dos programas governamentais (Fonseca & Bastos, 2001). Neste sentido, programas como o dos Agentes Comunitários de Saúde, da Saúde da Família e de Planejamento Familiar, além de ações de prevenção de ONGs e instituições de educação e cultura parecem não estarem tendo eficácia. Ainda neste sentido, Alencar, Silva, Sil- va e Diniz (2008) enfatizaram que o crescente aumento dos casos de infecção pelo HIV entre os adolescentes, a ineficiência dos registros de casos de doen- ças sexualmente transmissíveis (DSTs), o pouco conhecimento dos jovens em relação à sexualidade e os programas educacionais inadequados são questões preocupantes e que devem ser levadas em consideração em relação à preven- ção das DSTs e AIDS. Em cumprimento à Constituição de 1988, que garantiu o direito à saúde dos adolescentes, o Ministério da Saúde oficializou o Programa Saúde do Adolescente (PROSAD), que tem a finalidade de “promover, integrar, apoiar e incentivar práticas no sentido da promoção da saúde, da identifica- ção dos grupos de risco, detecção precoce dos agravos, tratamento adequado e reabilitação dos indivíduos dessa faixa etária, sempre de forma integral, multisetorial e interdisciplinar” (Brasil, 1996, p. 6). O acesso ao PROSAD deveria ocorrer através da atenção básica, direcionada para a promoção e prevenção da saúde do jovem, devendo abranger, portanto, os diferentes con- textos de vida do adolescente, comofamília, trabalho, comunidade e escola (Brasil, 1996). Seguindo essa proposta, em agosto de 2003, no município de Curiti- ba, aconteceu o lançamento oficial do projeto Saúde e Prevenção nas Escolas (SPE). O SPE é um projeto dos Ministérios da Saúde e da Educação que con- ta com o apoio da UNESCO e da UNICEF. O SPE representa uma estratégia inovadora na integração saúde-educação, destacando a escola como espaço para a articulação das políticas voltadas para adolescentes e jovens, princi- palmente por poder contar com estudantes, famílias, profissionais da saúde e da educação. O objetivo central do SPE é promover saúde reprodutiva e se- xual, no intuito de diminuir a vulnerabilidade de adolescentes em relação às DSTs, à infecção pelo HIV, à AIDS e à gravidez não planejada, por meio de !27 Pesquisa e prática em psicologia no sertão ações nas escolas e nas unidades básicas de saúde e através da formação con- tinuada de profissionais da área de educação e saúde. Esse projeto foi implan- tado nos 26 estados do Brasil, no Distrito Federal e em aproximadamente 600 municípios (Brasil, 2006). Diante das estratégias do governo para lidar com as questões dos jovens, faz-se necessário avaliar qual o impacto no público-alvo dos progra- mas ofertados. Avaliar as mudanças promovidas através da intervenção é fundamental para um planejamento futuro de novas estratégias. Cunha (2006) argumentou que a avaliação pode subsidiar: o planejamento e formulação das intervenções governamentais, o acompanhamento de sua implementação, suas reformulações e ajustes, assim como as decisões sobre a manutenção ou interrupção das ações. Assim, a avaliação é um instrumento importante para visualizar a eficiência do gasto público, da qualidade da gestão e do controle sobre a efetividade da ação do Estado, bem como para a divulgação de resul- tados de governo. As culturas mudam por meio de um processo evolutivo, e devería- mos ser capazes de agir para melhorar essa evolução (Baum, 2006). Quando práticas culturais são avaliadas e ponderadas quanto a seu impacto na sua própria sobrevivência, deve-se intervir planejando uma variação, transmissão e seleção mais adequadas. Programas governamentais são planejamentos de especialistas que visam mudanças em contextos e práticas culturais, e tam- bém devem ser avaliados quanto à sua eficácia, sendo modificados quando necessário. Argumentando na mesma direção, a UNICEF (1990, citada por Cunha, 2006) definiu uma avaliação do seguinte modo: Trata-se do exame sistemático e objetivo de um projeto ou progra- ma, finalizado ou em curso, que contemple o seu desempenho, im- plementação e resultados, com vistas à determinação de sua eficiên- cia, efetividade, impacto, sustentabilidade e a relevância de seus objetivos. (p. 6) Para realizar uma avaliação sistemática de um projeto ou programa, com critérios rígidos, se faz necessário um referencial metodológico que permita a análise das variáveis no ambiente natural, onde não é possível atin- !28 Pesquisa e prática em psicologia no sertão gir o mesmo grau de controle das variáveis como nos experimentos de labo- ratório. Nessas situações, quase-experimentos ou experimentos naturais po- dem ser especialmente úteis (Sampaio, Andery & Baia, 2013). Em uma pesquisa experimental tradicional, há uma distribuição alea- tória dos participantes nas condições com e sem a intervenção realizada (a variável independente, VI) a fim de medir seus possíveis efeitos sob o objeto de estudo (a variável dependente, VD), buscando o máximo controle dessas variáveis. Comparam-se então as mudanças na VD para identificar se a VI teve efeito (Cozby, 2003). Em estudos com culturas ou grupos, a manipula- ção dessas VIs muitas vezes é impossibilitada, principalmente por questões éticas. Nessas ocasiões em que a causalidade não pode ser testada em labora- tório ou em campo através da experimentação clássica os quase-experimentos ou experimentos naturais se tornam úteis (Schnelle & Lee, 1974). A expressão experimento natural sugere que um contraste ocorre naturalmente entre uma condição de tratamento (com a presença da VI) e uma condição de comparação (sem a presença da VI). A diferença principal entre um experimento e um experimento natural é a impossibilidade de ma- nipular ou controlar VIs. Quando realiza quase-experimentos ou experimen- tos naturais, o pesquisador cumpre os mesmos procedimentos que utilizaria em um experimento, mas ele deve se manter vigilante em relação aos limites do controle experimental que enfrenta e procurar diferentes instrumentos e formas para superá-los: “Nos quase-experimentos, o controle sobre a situação estudada é mais restrito do que nos experimentos e o estabelecimento de rela- ções funcionais (que também é seu objetivo) é alcançado com mais dificul- dade” (Sampaio et al., 2013, p. 6). Apesar dos limites quanto ao controle de variáveis, o modelo quase- experimental evita que sejam tomadas conclusões infundadas sobre os dados, pois define limites para a sua interpretação, sugerindo também de que forma podem-se atingir conclusões definitivas (Schnelle & Lee, 1974). Além de sugerir relações funcionais, também podem fornecer dados descritivos úteis, já que o baixo custo da coleta de dados de arquivo, por exemplo, facilita a inclusão de muitos sujeitos nas pesquisas. Apesar de a utilização de fontes documentais e arqueológicas não ser tão comum na Psicologia, muitas vezes !29 Pesquisa e prática em psicologia no sertão estas se tornam as únicas fontes disponíveis para acesso e desenvolvimento de pesquisas com grupos e sociedades extintas, por exemplo. Sampaio et al. (2013) sugeriram que, apesar de suas dificuldades, dados de arquivos podem ser utilizados de forma legítima como parte de um quase-experimento, mes- mo que estes dados tenham sido coletados com objetivos outros. Além disso, informações coletadas a partir de fontes antropológicas também podem ser utilizadas em pesquisas comportamentais, contanto que se ajustem às exigên- cias da metodologia experimental (Kunkel, 1986). Analisando livros de registros de uma penitenciária norte-americana, Schnelle e Lee (1974) empregaram e discutiram o uso do método quase-ex- perimental, utilizando um delineamento de série temporal interrompida. Ava- liaram entre 1969 e 1971 se uma estratégia disciplinar diminuía as infrações dentro do presídio e como isso acontecia. Kunkel (1985) utilizou a teoria de aprendizagem social de Bandura para entender a atividade musical da cidade de Veneza na Itália durante o período de 1650 a 1800, analisando dados da biografia de alguns compositores da época estudada. O mesmo autor avaliou também uma intervenção desenvolvida por antropólogos que implantou um novo modelo social e de desenvolvimento em uma comunidade de 1.700 ha- bitantes no Peru (Kunkel, 1986). Matos Júnior (2009), por sua vez, avaliou quase-experimentalmente como o Centro de Apoio Psicossocial para Álcool e Drogas (CAPS AD) da cidade de Petrolina-PE realizava suas ações, utilizan- do arquivos da instituição tais como livros de registro, controle de altas e prontuários. Deste modo, os quase-experimentos ou experimentos naturais podem ser considerados instrumentos eficientes para avaliação de práticas e mudanças culturais, assim como para a avaliação de programas e políticas públicas, sendo considerado por alguns autores como o ideal para avaliação de programas de saúde e em várias situações a única alternativa para demons- trar eficácia e/ou efetividade do programa avaliado (Antunes, 2001). Portan- to, nesta pesquisa, visou-se avaliar quase-experimentalmente as estratégias do Programa Saúde e Prevenção nas Escolas (SPE) na cidade de Juazeiro-BA e seus impactos no público alvo (adolescentes) entre 2008 e 2010. No intuito de contribuir com a implantação de programas públicos, assim como servir de base para discussões sobre as políticas de saúde para o público adolescente, a presente pesquisa buscou responder: (1)Como o pro- !30 Pesquisa e prática em psicologia no sertão grama foi implementado em Juazeiro? (2) Quais estratégias foram utilizadas pelo programa para intervir nesta população? (3) As estratégias do SPE atin- giram seus objetivos no período entre 2008 e 2010? Método Caracterização do Estudo A presente investigação visou avaliar quase-experimentalmente um programa social. As intervenções do programa analisado visavam afetar a vida de muitas pessoas e foram examinadas a fim de identificar se seus obje- tivos estavam sendo alcançados. Assim, esta também é uma pesquisa aplica- da, realizada com o objetivo de examinar questões relativas a problemas prá- ticos e suas potenciais soluções (Cozby, 2003). Mais especificamente, o pre- sente trabalho pode ser enquadro como uma tentativa de realizar uma avalia- ção de programa (Cozby, 2003). Dentre os tipos de avaliação de programas propostos por Rossi, Freeman e Lipsey (1999, citados por Cozby, 2003), esta pesquisa se aproximou de uma avaliação dos resultados do programa, ou ava- liação do impacto, que visa determinar se os resultados esperados estão sendo atingidos, elaborando uma forma de mensurá-los e então analisar o impacto do programa em relação a essas medidas. Procedimento e Fontes de Informação Inicialmente, membros do Grupo Gestor Municipal do SPE foram contatados para ter acesso às primeiras informações sobre as especificidades do programa no município e acordar a presença do pesquisador nas suas reu- niões quinzenais. Os registros públicos, tais como dados do IBGE, estatísti- cas de saúde pública, entre outros, também podem ser usados como fonte de dados (Cozby, 2003), e assim, foram analisados documentos arquivados na Secretaria de Educação de Juazeiro-BA sobre o planejamento e a fundação do programa. Nestes documentos incluíam-se planejamentos das oficinas, cro- nogramas, listas de presenças, ofícios, convites etc. Tentou-se alcançar todo o plano de intervenção do SPE, que é desenvolvido levando-se em considera- !31 Pesquisa e prática em psicologia no sertão ção a realidade das escolas do município e que contém as principais estraté- gias pensadas para o público que foi escolhido (Brasil, 2006). Foi analisado também um questionário de mapeamento desenvolvi- do pelo Grupo Gestor Municipal para escolher os temas a serem incluídos no projeto, respondido por alunos de alguns colégios participantes antes da exe- cução do SPE. Foram coletados todos os arquivos e registros disponíveis, inclusive os elaborados antes da implantação do programa, para identificar os objetivos, os dados do público participante, a temática, os colégios e as ativi- dades que foram desenvolvidas durante a intervenção, assim como dados referentes ao impacto das intervenções. O grupo controle desse quase-expe- rimento consistiu em bairros com escolas nas quais o programa não foi de- senvolvido. Cozby (2003) definiu a pesquisa em arquivo como aquela que en- volve o uso de informações previamente compiladas para responder às ques- tões da pesquisa, analisando os dados existentes ao invés de coletar dados originais, o que não avilta a legitimidade de tal fonte de informações. Assim, entre fevereiro e outubro de 2010 foram analisadas algumas bases de dados em saúde. Através do Sistema de Informação de Nascidos Vivos (SISNASC), analisou-se a quantidade de gestantes e adolescentes gestantes, por bairro e distritos, em Juazeiro-BA. Por meio do Sistema de Informação de Atenção Básica (SIAB), pôde-se acessar o número de gestantes e gestantes adolescen- tes, por bairros e distritos, cadastradas nas unidades de saúde do município. Os dados do SISNASC e do SIAB permitiram uma tentativa de avaliação daquele que é um dos principais objetivos municipais e nacionais do SPE: reduzir a gravidez na adolescência (Brasil, 2006). Por meio do Sistema de Informação de Agravos e Notificações (SINAN), foi coletado o número de notificações de DSTs/AIDS em adolescentes juazeirenses. E através do Ban- co de Dados do Sistema Único de Saúde (DATASUS), foram recolhidos da- dos complementares para a análise e discussão desse texto. Os dados coleta- dos foram analisados a partir de um delineamento pré-teste/pós-teste com grupo controle não equivalente, que consiste em examinar as alterações nos escores dos grupos antes (pré-teste) e após a intervenção (pós-teste), anali- sando se o programa teve, de fato, algum efeito (Cozby, 2003). !32 Pesquisa e prática em psicologia no sertão Aspectos Éticos A Resolução 196/96 do CNS/MS, que à época tratava das questões éticas para pesquisas envolvendo seres humanos, foi respeitada em todas as fases da pesquisa. Como garantia do respaldo da Secretaria Municipal de Saúde de Juazeiro-BA, assegurando que a instituição tem conhecimento da pesquisa, foi preenchida Carta de Anuência, autorizando o pesquisador a ter livre acesso à instituição e aos seus dados e arquivos. Resultados A Criação do SPE em Juazeiro-BA O SPE em Juazeiro-BA foi idealizado no segundo semestre de 2008. Profissionais das Secretarias de Educação e Saúde do município, cientes da existência do programa em âmbito nacional, e alguns já participantes do Pro- grama Sexualidade nas Escolas, realizaram reuniões em julho de 2008 para a elaboração da proposta e posterior encaminhamento para as Secretarias Mu- nicipais de Saúde, Educação e Desenvolvimento Social. O projeto inicial foi baseado nas diretrizes nacionais do SPE e adaptado para a realidade do muni- cípio (diretiva também da proposta nacional). Assim, definiu-se o Grupo Ges- tor Municipal (GGM), composto pelos secretários de educação e de saúde, membros e coordenadores de programas da Secretaria Municipal de Saúde (NASF, DST), membros da Pastoral da Mulher, da Diretoria Regional de Educação (DIREC), da Diretoria Regional de Saúde (DIRES) e da Secretaria de Educação. No primeiro semestre de 2009, futuros membros do GGM oriundos da Secretaria de Saúde realizaram os primeiros contatos com colégios. A Se- cretaria de Saúde escolheu as escolas participantes da primeira etapa do pro- jeto com base em queixas das diretorias em relação à alta incidência de gra- videz na adolescência e consequente abandono escolar. Foram escolhidas dez escolas de bairros urbanos e de distritos para participar do programa. Para realizar um diagnóstico da realidade local, identificar as ações e temas priori- !33 Pesquisa e prática em psicologia no sertão tários e realizar uma análise situacional foi aplicado um questionário de ma- peamento a alunos de cinco das escolas escolhidas. Questionário de Mapeamento O questionário elaborado pela Secretaria de Saúde continha 29 questões aber- tas e fechadas sobre: dados sociodemográficos; parceiros e práticas sexuais; utilização e negociação de métodos contraceptivos; fontes de informações e conteúdos de conversas com pais e amigos sobre sexo; percepções de gênero; e conhecimento do corpo. 687 questionários foram respondidos por alunos com idades entre 12 e 17 anos; 332 (48,3%) do sexo masculino e 343 (49,9%) do feminino (12 não responderam). Quanto a sua primeira experiên- cia sexual, 113 alunos (16,5%) relataram que ela aconteceu com o namorado(a); 103 (15%), com um amigo(a); 25 (3,6%), com prostituta ou garota(o) de programa; e 23 (3,3%), com “outras pessoas”. 411 (59,8%) rela- taram ainda não ter tido experiência sexual e 12 (1,75%) não responderam. Quando questionados sobre como é a conversa em casa sobre sexo, 264 alu- nos (38,4%) responderam que é difícil; 222 (32,3%) disseram ser normal; 195 (28,3%) responderam que esse tipo de conversa é proibido; e 6 (0,87%) não responderam. Sobre a definição de sexualidade, 276 alunos respondentes do ques- tionário (40%) assumiram não saber; 212 (31%) a definiram como o funcio- namento do pênis e da vagina; 154 (22%) disseram ser afetos, carícias, entro- samento, comunicação; 11 (1,5%) responderam “outros”; e 14 (2%) não res- ponderam a questão. Quando questionados sobre o que achavam
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