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MATERIAL DIDÁTICO ELEMENTOS DO SANGUE E HEMATOPOESE CREDENCIADA JUNTO AO MEC PELA PORTARIA Nº 2.861 DO DIA 13/09/2004 0800 283 8380 www.portalprominas .com.br SUMÁRIO UNIDADE 1 – INTRODUÇÃO ............................ ..................................................... 03 UNIDADE 2 – ELEMENTOS DO SANGUE ................... ......................................... 05 2.1 Estrutura e composição celular – a base........................................................... 05 2.2 Tecnologia da Biologia Celular e Molecular – notas introdutórias ..................... 11 2.3 Elementos do sangue ........................................................................................ 21 2.4 Hemostasia e Homeostasia ............................................................................... 29 UNIDADE 3 – HEMATOPOESE ........................... .................................................. 37 3.1 Hematopoese .................................................................................................... 37 3.2 Eritropoese ........................................................................................................ 40 3.3 Plaquetogênese ................................................................................................ 40 3.4 Granulopoiese ................................................................................................... 41 3.5 Linfocitogênese ................................................................................................. 42 UNIDADE 4 – TRANSPLANTE DE CÉLULAS-TRONCO ......... ............................. 43 UNIDADE 5 – TRANSFUSÃO DE SANGUE .................. ........................................ 50 5.1 Transfusão de sangue em pacientes com Anemia Falciforme .......................... 51 UNIDADE 6 – LEGISLAÇÃO APLICADA ................... ........................................... 53 CASE – HAMATOPOESE EXTRAMEDULAR ................... .................................... 55 REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 60 3 UNIDADE 1 – INTRODUÇÃO Uma média de cinco litros de sangue circula pelo corpo de um ser humano adulto, elemento este que ajuda a eliminar substâncias tóxicas, auxilia na nossa defesa imunológica, transporta nutrientes, hormônios, oxigênio. Essas atribuições por si só nos mostram a sua importância para uma vida saudável e justificam os temas a serem abordados neste primeiro módulo. Conhecer em maiores detalhes os elementos que compõem o sangue; a sua formação ou hematopoese; alguns mecanismos reguladores como a hemostasia e homeostasia são alguns dos conteúdos básicos deste módulo. O transplante de células-tronco, tema tão atual e ainda um tanto controverso e misterioso; a transfusão sanguínea; legislação para a área de hematologia e um estudo de caso enriquecedor completam os conteúdos a seres apresentados. Falando em células, começamos nossos estudos por elas, tomando por base as sínteses de Junqueira e Carneiro (2005) no clássico livro “Biologia Celular e Molecular”: a unidade constituinte dos seres vivos – a célula – é base para todos os demais estudos que envolvem as ciências da saúde. A verdade é que os conhecimentos geralmente progridem na medida em que as técnicas se aperfeiçoam e com as células não aconteceu de outra maneira. Tudo começou com o microscópio óptico, por volta de 1896, e, hoje, somando-se diferentes técnicas que vão desde a microtomia, técnicas mais avançadas como a radioautografia, a cultura de células em meios nutritivos definidos, o emprego do microscópio de fluorescência, do microscópio confocal, dos microscópios eletrônicos, das técnicas de criofratura e das técnicas bioquímicas, é perceptível o avanço e a amplitude do estudo das células, que se tornou usual designar essa nova abordagem sob a rubrica de Biologia Celular e Molecular. Ressaltamos em primeiro lugar que embora a escrita acadêmica tenha como premissa ser científica, baseada em normas e padrões da academia, fugiremos um pouco às regras para nos aproximarmos de vocês e para que os temas abordados cheguem de maneira clara e objetiva, mas não menos científicos. Em segundo lugar, deixamos claro que este módulo é uma compilação das ideias de vários autores, 4 incluindo aqueles que consideramos clássicos, não se tratando, portanto, de uma redação original e tendo em vista o caráter didático da obra, não serão expressas opiniões pessoais. Ao final do módulo, além da lista de referências básicas, encontram-se outras que foram ora utilizadas, ora somente consultadas, mas que, de todo modo, podem servir para sanar lacunas que por ventura venham a surgir ao longo dos estudos. 5 UNIDADE 2 – ELEMENTOS DO SANGUE A lógica nos diria para começarmos os estudos dos elementos do sangue pela formação do mesmo, mas por uma questão didática, optamos por começar relembrando a estrutura e composição celular, afinal de contas, é a base que constitui os seres humanos, podendo ocorrer de maneira isolada como nos seres unicelulares, ou formar arranjos ordenados, os tecidos que constituem o corpo dos seres pluricelulares. Dando sequência, teremos os elementos do sangue e depois, aí sim, os processos evolutivos e de formação desses elementos. 2.1 Estrutura e composição celular Citologia, ou biologia celular, é a ciência que estuda os vários sistemas celulares, a maneira como as células são reguladas e a compreensão do funcionamento de suas estruturas. A construção dos microscópios ópticos foi um passo decisivo para a descoberta das células, e acredita-se que o primeiro tenha sido inventado em 1592, por Jeiniere da Cruz e seu pai, Zacharias Jansen, dois holandeses fabricantes de óculos. Tudo indica, porém, que o primeiro a fazer observações microscópicas de materiais biológicos foi o holandês Antonie Van Leeuwenhoek (1632-1723). O microscópio simples com apenas uma lente, construído por Leeuwenhoek, foi aprimorado por Robert Hooke em 1665, ganhando mais uma lente (BARBOSA; CORTE-REAL, 2010). A partir dos estudos de Hooke em biologia, publicados em um livro intitulado Micrographia (1665), que analisou cortes finos de cortiça obtidos da casca do sobreiro, verificou que estes eram constituídos por pequenas cavidades poliédricas (no latim, cella), as quais foram denominadas células. Estes compartimentos representavam as paredes das células vegetais mortas. Em 1838, o botânico alemão Matthias Schleiden descreveu que a célula era a unidade básica de todas as plantas e, mais tarde, em 1839, o zoólogo alemão Theodor Schwann chegou à mesma conclusão para os animais. Com base nestes conhecimentos, elaborou-se a teoria celular que foi proposta por Schleiden e Schwann. Posteriormente, a associação de técnicas de coloração e de citoquímica foi capaz de revelar as estruturas e a fisiologia das células. 6 O grande avanço no conhecimento da biologia celular, sem dúvida, foi a invenção dos microscópios eletrônicos em 1931, por dois engenheiros alemães, Ernst Ruska e Max Knoll, o que possibilitou a visualização das organelas celulares em grande detalhe. A célula é uma unidade funcional que estabelece interação entre seus componentes, sob o aspecto fisiológico, biossintético e reprodutivo. A dinâmica celular para a manutenção da vida é regida por um processo de automanutenção, que compreende a modificação de estruturas, a substituição de componentes, de tal forma articulada que garanta a sua organização estrutural e funcional. Com o advento da microscopia eletrônica, chegou-se a existência de duas classes fundamentais de células: as procariontes (pro, primeiro, e cario, núcleo), cujos cromossomos não estão separados do citoplasma por membrana, e as eucariontes (eu, verdadeiro, e cario, núcleo), comum núcleo bem individualizado e delimitado pelo envoltório nuclear, mas ressalte-se que fora essa complexidade nuclear que distingue os dois tipos, existem muitas outras diferenças importantes entre os procariontes e eurocariontes, como também existem organelas comuns a todas as células eucarióticas, sendo talvez o núcleo a mais importante delas. a) Células procariontes e eucariontes As células procariontes ou procarióticas, também chamadas de protocélulas, são muito diferentes das células eucariontes. A sua principal característica é a ausência de carioteca individualizando o núcleo celular, pela ausência de algumas organelas e pelo pequeno tamanho que se acredita que se deve ao fato de não possuírem compartimentos membranosos originados por evaginação ou invaginação. Também possuem DNA na forma de um anel não associado a proteínas (como acontece nas células eucarióticas, nas quais o DNA se dispõe em filamentos espiralados e associados à histonas). Estas células são desprovidas de mitocôndrias, plastídeos, complexo de Golgi, retículo endoplasmático e, sobretudo, cariomembrana o que faz com que o DNA fique disperso no citoplasma. As células eucariontes ou eucarióticas, também chamadas de eucélulas, são mais complexas que as células procariontes. Possuem membrana nuclear 7 individualizada e vários tipos de organelas. A maioria dos animais e plantas a que estamos habituados são dotados deste tipo de células. É altamente provável que estas células tenham surgido por um processo de aperfeiçoamento contínuo das células procariontes. Não é possível avaliar com precisão quanto tempo a célula “primitiva” levou para sofrer aperfeiçoamentos na sua estrutura até originar o modelo que hoje se repete na imensa maioria das células, mas é provável que tenha demorado muitos milhões de anos. Acredita-se que a célula “primitiva” tivesse sido bem pequena e para que sua fisiologia estivesse melhor adequada à relação tamanho versus funcionamento era necessário que crescesse. Acredita-se que a membrana da célula “primitiva” tenha emitido internamente prolongamentos ou invaginações da sua superfície, os quais se multiplicaram, adquiriram complexidade crescente, conglomeraram-se ao redor do bloco inicial até o ponto de formarem a intrincada malha do retículo endoplasmático. Dali ela teria sofrido outros processos de dobramentos e originou outras estruturas intracelulares como o complexo de Golgi, vacúolos, lisossomos e outras. Quadro comparativo entre células procariontes e eucariontes Procarióticas Eucarióticas Material genético Não está delimitado por nenhuma membrana - nucleóide Está delimitado pelo invólucro nuclear (carioteca ) formando o NÚCLEO que contém um ou mais Nucléolos Organelas Apenas não membranosas Organelas com membranas Tamanho das células 1 a 10µm 5 - 100 µm b) Componentes celulares Como componentes do núcleo, temos o envoltório nuclear, a cromatina, o nucleoplasma e os nucléolos, onde os RNAs são sintetizados a partir de um molde de DNA e, posteriormente, exportados para o citoplasma através da membrana 8 nuclear. A mitocôndria, outra importante organela, possui enzimas especializadas em processos oxidativos que produzem energia pura à célula. Além disso, o DNA e os ribossomos também são encontrados no interior da mitocôndria (ANDRADE; JORDÃO, 2005). O retículo endoplasmático (RE) é uma estrutura formada por membranas distribuídas por todo o citoplasma e ligadas tanto à membrana celular como à membrana nuclear. O RE rugoso possui ribossomos ligados as suas membranas, que constituem a maquinaria molecular para a síntese proteica. Já o complexo de Golgi, é uma estrutura formada por membranas e vesículas, envolvido na modificação e na secreção de proteínas das células. O citoplasma das células eucariontes possui um sistema de membranas muito desenvolvido e que, por razões didáticas, só esta parcialmente representado na ilustração a seguir. Observe acima do núcleo, um dos dois centríolos da célula, de onde irradiam microtúbulos. Atrás dos centríolos está o aparelho de Giolgi. No centro do núcleo aparece o nucléolo. Estrutura tridimensional de uma célula eucarionte animal Fonte: Marcondes (1984 apud JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2005, p. 4). 9 Ribossomos, lissosomos, peroxissomos, inclusões lipídicas, glicogênio e outros estão distribuídos ao longo da célula, cada um com sua função bem especializada. c) O citoesqueleto Creditamos ao citoesqueleto a função de conferir às células eucarióticas a manutenção da diversidade de formas, a realização de movimentos coordenados e direcionados e sua estruturação interna. Esse citoesqueleto depende de uma complexa rede de filamentos de proteínas que se estende por todo o citoplasma, sendo constituído por três principais tipos de estruturas: os microtúbulos, os filamentos intermediários e os filamentos de actina. Os movimentos que acarretam modificações na forma das células (movimento amebáide, contração muscular, citocinese, contração das células miáides) resultam da interação de filamentos de actina com filamentos de miosina. Há, todavia, movimentos que são devidos aos microtúbulos, como os movimentos ciliares e flagelares. A energia para os movimentos é obtida dos nutrientes, sendo daí transferida para ligações químicas na molécula de ATp, que é a fonte imediata de energia para os movimentos celulares. Muitas células têm forma irregular, existindo algumas, como os neurônios ou células nervosas, com prolongamentos muito longos. Por outro lado, o núcleo, organelas, vesículas de secreção e outros componentes celulares têm localização definida, quase sempre constante, conforme o tipo celular. Essas observações levaram os citologistas a admitirem a existência de um citoesqueleto que desempenharia apenas um papel mecânico, de suporte, mantendo a forma celular e a posição de seus componentes. Estudos posteriores, além de confirmarem a existência do citoesqueleto, mostraram que seu papel funcional é muito mais amplo. Ele estabelece, modifica e mantém a forma das células. É responsável também pelos movimentos celulares como contração e deslocamentos intracelulares de ribossomos, organelas, cromossomos, vesículas e grânulos diversos (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2005). Os microtúbulos são formados por subunidades: β-tubulina e α-tubulina, as quais se associam uma às outras, conferindo-lhe assim uma forma cilíndrica, com o diâmetro de 25 mm. Os microtúbulos direcionam o deslocamento de vesículas, 10 participam da divisão celular com a formação do fuso mitótico para o deslocamento dos cromossomos e estão presentes na manutenção da estrutura celular e na morfologia dos cílios e flagelos. Os filamentos intermediários recebem esta denominação por apresentarem um diâmetro intermediário entre filamentos de actina e microtúbulos (10 mm de diâmetro). Sua composição é proteica, formando uma rede estrutural por toda a célula. Os filamentos de actina estão distribuídos por todo o citoplasma das células eucarióticas e apresentam diâmetro de 5 mm. Eles são formados por uma proteína globular, a actina, que apresenta as isoformas: alfa, beta e gama. Estes filamentos, nas células epiteliais, estão concentrados nos prolongamentos citoplasmáticos, participando, juntamente com os desmossomos, do contato com outras células e com a membrana basal, mantendo, assim, a integridade organizacional do epitélio. Nos miofibroblastos, importantes células do tecido muscular, os filamentos de actina estão organizados paralelamente à membrana plasmática, mantendo estas células tensionadas ao substrato e são, então, denominados fibras de estresse (BARBOSA; CORTE-REAL, 2010). d) A estrutura macromolecular É característica da matéria viva a presença de moléculas de alto peso, ou macromoléculas, que são polímeros constituídospela repetição de unidades menores, chamadas monômeros. Os polímeros formados por monômeros semelhantes são chamados de homopolímeros. É o caso do glicogênio, que é constituído exclusivamente por moléculas de glicose. Os heteropolímeros são constituídos por monômeros diferentes. Os ácidos nucléicos, por exemplo, são heteropolímeros. As macromoléculas existem nas células com grande diversidade não só quanto ao seu tamanho, mas, principalmente, quanto à variedade dos seus monômeros constituintes. Os biopolímeros de maior importância são as proteínas, constituídas por aminoácidos; os polissacarídeos, que são polímeros de monossacarídeos; e os ácidos nucléicos (DNA e RNA), formados por nucleotídeos. 11 Além dos polímeros, moléculas menores como lipídios, água, sais minerais e vitaminas têm relevante papel na constituição e funcionamento das células. A diversidade estrutural e funcional de um polímero depende da variedade de seus monômeros. Na constituição das proteínas participam 20 aminoácidos diferentes, enquanto os ácidos nucléicos são formados por apenas cinco tipos de nucleotídeos (monômeros). Por isso, as proteínas têm maior polimorfismo e, consequentemente, maior diversidade funcional do que os ácidos nucléicos. Frequentemente, macromoléculas de diferentes tipos se associam para formar complexos como as lipoproteínas, glicoproteínas e proteoglicanas (proteínas combinadas com polissacarídeos) e as nucleoproteínas (ácidos nucléicos mais proteínas) (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2005). 2.2 Tecnologia da Biologia Celular e Molecular – no tas introdutórias Como citamos na introdução, os conhecimentos sobre as células progridem paralelamente ao aperfeiçoamento dos métodos de investigação. Inicialmente, o microscópio óptico, também chamado microscópio de luz, possibilitou o descobrimento das células e a elaboração da teoria de que todos os seres vivos são constituídos por células. Posteriormente, foram descobertas técnicas citoquímicas para a identificação e localização de diversas moléculas constituintes das células. Com o advento dos microscópios eletrônicos, que têm grande poder de resolução, foram observados pormenores da estrutura celular que não poderiam sequer ser imaginados pelos estudos feitos com os microscópios ópticos. Mais ou menos simultaneamente com o uso dos microscópios eletrônicos, foram aperfeiçoados métodos para a separação de organelas celulares e para o estudo in vitro de suas moléculas e respectivas funções. A análise de organelas isoladas em grande quantidade, a cultura de células, a possibilidade de manipular o genoma através da adição ou supressão de genes e o aparecimento de numerosas técnicas de uso comum aos diversos ramos da pesquisa biológica levaram ao surgimento do que se costuma chamar de biologia celular e molecular, que é o estudo integrado das células, através de todo o arsenal técnico disponível. 12 Como dizem Carneiro e Junqueira (2005), é impossível descrever, mesmo sumariamente, todas as técnicas utilizadas nos variados estudos sobre as células. Cada pesquisador tem usado sua imaginação para criar abordagens as mais variadas, de acordo com o problema a ser resolvido. Nossa intenção, portanto, é apenas introduzir o tema e exemplificar como as técnicas têm contribuído para o progresso dessas áreas de estudo. a) Coleta, fixação e clivagem Coleta consiste em remover amostras de tecido de um determinado organismo. Essa coleta pode ser feita quando o organismo ainda está vivo, por meio de biópsia ou durante uma cirurgia, ou mesmo post mortem, durante a realização de necropsia de animais ou seres humanos. Quando a coleta é realizada para diagnóstico de determinada enfermidade, o material originado de necropsia ou biópsia deve ser previamente analisado por um patologista, o qual fornecerá o laudo macroscópico, ressaltando aspectos macroscópicos da peça anatômica, como cor, tamanho e aparência do órgão analisado. Durante a coleta, também devemos respeitar algumas regras que são fundamentais para a boa qualidade final da amostra, uma vez que o material biológico coletado é potencialmente infectante, deve-se ter muito cuidado ao manipulá-lo utilizando equipamentos de proteção individual (EPI). Após a coleta, o material deve ser registrado em um livro próprio de protocolo, para registro. Por meio desse registro, o material será identificado por um número, que o acompanhará durante todos os procedimentos da técnica histológica. Em instituições credenciadas para realizar procedimentos histopatológicos, o material obtido cirurgicamente deve ser acompanhado de uma ficha com o pedido da análise histopatológica, contendo a identificação do órgão e as datas da fixação e de entrada do material no laboratório. Essa ficha técnica deverá conter a identificação do paciente (nome, sexo, cor, idade, estado civil, nacionalidade, naturalidade e profissão) e, no caso de paciente de rede hospitalar, deverão ser informados sua qualificação (registro ou número do leito), registro ambulatorial, ou consultório particular, identificação do médico responsável, data da intervenção 13 cirúrgica, descrição da biópsia, morte ou necropsia, e outros dados que o médico julgar importantes, que auxiliarão o histopatologista no diagnóstico. Após colher o material, é chegado momento de sua fixação, etapa na qual se obtém um preparado permanente, que tem as seguintes finalidades: • evitar a autólise, que é a destruição da célula por suas próprias enzimas; • impedir a atividade e a proliferação de bactérias; • endurecer as células para que elas resistam melhor às etapas seguintes da técnica; • aumentar a afinidade das estruturas celulares pelos corantes usados na microscopia óptica e aumentar o contraste na microscopia eletrônica (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2009). Diversos protocolos de fixação e tipos de fixadores são citados na literatura técnica; porém, nenhum desses procedimentos de fixação é reconhecido como perfeito. Alguns fixadores se revelam excelentes para determinadas estruturas tissulares, enquanto outros são preferenciais para as células ou mesmo excelentes para análise da bioquímica tecidual. Além disso, há, também, fixadores indicados para a preservação da antigenicidade dos elementos teciduais que serão analisados pela imuno-histoquímica, em contraste com aqueles que não preservam as moléculas antigênicas. Porém, não existe um fixador ideal que alcance todos os objetivos da fixação, mas deve-se investigar qual o fixador mais apropriado para o tipo de material a ser analisado. Por essa razão, deve-se consultar a literatura científica antes de se realizar qualquer tipo de experimento ou intervenção cirúrgica (CAPUTO; GITIRANA; MANSO, 2010). Basicamente, existem dois tipos de fixação: a física e a química. De fato, sempre se utiliza uma associação dos dois tipos de fixação, pois mesmo a fixação química sempre pode sofrer a influência de um fator físico ambiental, como a temperatura. Outros fatores físicos podem influenciar na fixação, como as ondas eletromagnéticas (micro-ondas) e a agitação molecular (ultrassom). A fixação química é obtida quando se utilizam substâncias químicas capazes de formar reações com os sítios das biomoléculas, estabilizando-as e impedindo a alteração tecidual, tanto química quanto física. 14 Atualmente, com frequência, se utiliza a classificação de fixadores descrita por Leong (1996), que teve como base a classificação desenvolvida por Hopwood (1977), sem muitas alterações. Leong classificou as substâncias fixadoras da seguinte maneira: � fixadores aldeídos – formaldeído, glutaraldeído e paraformaldeído comercial; � agentes oxidantes – tetróxido de ósmio, dicromato de potássio, permanganato de potássio e ácido crômico; � agentes desnaturantes ou coagulantes de proteínas – metanol, etanol, acetona e ácido acético;� mecanismo desconhecido – cloreto de mercúrio, ácido pícrico e sais de zinco; � combinação de reagentes – tetróxido de ósmio e glutaraldeído, tetróxido de ósmio e iodeto de zinco, glutaraldeído e carbodiamida e formaldeído com glutaraldeído; � fixação a seco – carbowax 6000 (20% de polivinil; álcool ou 20% de polietileno glicol) ou fixação no vapor; � Micro-ondas – fixação pelas ondas eletromagnéticas com ou sem a utilização de agentes fixadores (CAPUTO; GITIRANA; MANSO, 2010). A química da fixação é complexa e pouco conhecida. O formol e o aldeído glutárico (glutaraldeído) fixam as células por se combinarem com os grupamentos amínicos das proteínas (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2009). O aldeído glutárico possui um grupamento aldeídico em cada extremidade de sua molécula, sendo capaz de estabelecer pontes entre as unidades protéicas, estabilizando a estrutura quaternária da proteína. O tetróxido de ósmio e o glutaraldeído são os fixadores mais usados em microscopia eletrônica porque coagulam as proteínas, causando modificações mínimas na estrutura celular. Cada um dos fixadores simples apresenta certos inconvenientes, ao lado de algumas qualidades desejáveis. Por isso foram elaboradas as misturas fixadoras, que contêm proporções variáveis dos fixadores simples com a finalidade de compensar-lhes as deficiências. 15 Vários são os fatores que influenciam no processo da fixação, interferindo diretamente na preservação tecidual e, em última instância, no tecido que se deseja observar. Assim, deve-se analisar criteriosamente o protocolo de fixação para identificar os fatores que podem influenciar diretamente na fixação do tecido a ser analisado e, consequentemente, interferir na preservação tecidual. Esses fatores são: � temperatura; � espessura do tecido; � penetração; � tempo de fixação; � escolha do fixador; � relação volume do fixador tamanho do espécime; � estocagem apropriada; � pH do fixador; � osmolaridade da solução fixadora; � adição de sais na mistura; � concentração dos fixadores. A clivagem consiste em reduzir as dimensões dos fragmentos dos tecidos coletados. Dependendo do tipo de fixador empregado, a clivagem poderá ocorrer em até algumas horas após a fixação. Na clivagem ideal, os fragmentos devem atingir cerca de 3 mm de espessura; porém, dependendo do tipo de órgão, esse fragmento pode chegar a mais do que 5 mm (CAPUTO; GITIRANA; MANSO, 2010). b) Descalcificação Em muitos tecidos, verifica-se a deposição de sais minerais, como cálcio e fosfato. Por exemplo, o tecido ósseo é uma especialização do tecido conjuntivo, sendo rígido e inflexível devido à presença de cristais de hidroxiapatita em sua matriz extracelular. 16 Em microscopia de luz, existem dois procedimentos técnicos que auxiliam o estudo do tecido ósseo: (1) a descalcificação, que remove a porção mineral e analisa somente os constituintes orgânicos do tecido ósseo; e, (2) o desgaste, que permite analisar os componentes inorgânicos do tecido. A escolha do método de descalcificação depende da urgência, do grau de mineralização, do interesse da investigação, das técnicas de coloração que se pretende empregar e do tipo de fixador utilizado. Quanto mais rápida for a ação de um descalcificador, pior será a preservação morfológica do tecido. Até o momento coletamos o material, fixamos, lavamos para retirar o excesso de fixador e procedemos então à descalcificação que pode ser realizada por métodos químicos e físicos. Os métodos químicos utilizam soluções descalcificadoras em pH ácido, soluções quelantes e meios de troca iônica. Os métodos físicos estão sempre associados a descalcificação química, englobando a dissociação eletrolítica e submissão do material contido em soluções descalcificadoras, ao ultrassom e às micro-ondas, que aceleram o processo de descalcificação (CAPUTO; GITIRANA; MANSO, 2010). c) Microtomia Para permitir a análise dos tecidos ao microscópio de luz, eles devem ser seccionados em fatias bem finas e uniformes. A espessura ideal varia de acordo com o objetivo de estudo; recomenda-se a espessura de 4 a 6 mm na rotina dos laboratórios. O instrumento capaz de confeccionar cortes com tal precisão é o micrótomo, sendo constituído por três partes: corpo, porta-bloco e porta-objeto. Considera-se, ainda, que em alguns modelos possua duas manivelas, uma manivela de ajuste e outra de corte. Existem dois tipos de micrótomos: do tipo rotatório, também conhecido como do tipo Minot, em que o material, no porta-objeto, vai de encontro à navalha que está imóvel no porta-navalha; e o do tipo corrediça, que avança o porta-navalha e vai de 17 encontro ao porta-objeto onde se encontra a amostra (CAPUTO; GITIRANO; MANSO, 2010). Vários problemas podem ocorrer durante a microtomia, geralmente a maioria dos artefatos apresentam problemas no corte causados pela navalha durante o processamento. Abaixo tem-se listado alguns deles: Fonte: CAPUTO; GITIRANO; MANSO (2010, p. 137). 18 d) Coloração Segundo Caputo, Gitirana e Manso (2010), após a microtomia, as células e o material extracelular são habitualmente transparentes e os corantes melhoram a visualização das estruturas teciduais. Junqueira e Carneiro (2005) também justificam que, embora seja possível o estudo microscópico de células vivas, muitas vezes há vantagem em obter um preparado permanente (lâmina) no qual as células ficam preservadas, isto é, fixadas e coradas, para melhor demonstração dos seus componentes. Um preparado permanente ideal deveria mostrar as células com a mesma estrutura microscópica e composição química que possuíam quando vivas. Isso, entretanto, não é possível, e todos os preparados apresentam artefatos, que são alterações produzidas nas células pelas técnicas utilizadas. Os corantes aplicados para corar tecidos que foram previamente fixados são chamados corantes não vitais, como a hematoxilina, eosina, fucsina, entre outros. Podemos também corar células em cultura ou células de organismos ainda vivos; nesse caso, é necessária a utilização de corantes chamados vitais, que não causam danos às células e também não interferem no metabolismo celular. Dentre eles, temos: o azul de tripan, verde janus B, vermelho tripan, azul de metileno, vermelho neutro, entre outros. Revendo: após a microtomia, o preparado histológico está pronto para ser corado. Deve-se, inicialmente, utilizar uma coloração que proporcione uma visão geral de todo o tecido de modo a permitir a identificação dos elementos teciduais, propiciando o diagnóstico histológico. A coloração pela hematoxilina (H) e pela eosina (E) cumpre muito bem esse papel. Nessa coloração, os núcleos são corados pela hematoxina, sendo evidenciados em roxo, enquanto o citoplasma e os espaços intercelulares são corados pela eosina, sendo visualizados em rosa. Havendo a necessidade de se identificar certos elementos teciduais específicos, empregam-se técnicas histoquímicas especiais. Há diversos métodos especiais de coloração que propiciam uma melhor identificação de determinados componentes teciduais. Por exemplo, a coloração 19 pelo método tricomático de Masson, que utiliza corantes especiais, permite evidenciar tecido muscular e fibras colágenas; a coloração pela resorcina fucsina de Weigert demonstra fibras do sistema elástico; o azul de toluidina em pH ácido é uma coloração específica para mastócitos. Outros métodos utilizados para identificação de elementos teciduais podem utilizar sais pesados a base de prata metálica e não corantes. Nessa categoria, podem-se citar o método da reticulina de Gomori, que identifica especificamente as fibras reticulares do tecido conjuntivo, sendo o método de Grocott específico para fungos, e o método de PAMS, específico para membrana basal. Em determinadas colorações histoquímicas,certas substâncias, ao se combinarem com o tecido, formam uma nova substância, e essa ligação pode ser irreversível. Essa é a base da coloração com o azul da Prússia (ou Perls) e do método que utiliza o ácido periódico associado ao reativo de Schiff (PAS). Na coloração com o azul da Prússia, devido à ação do ácido clorídrico, o ferro conjugado às proteínas é ionizado e evidenciado após reação com o ferrocianeto de potássio. O resultado dessa reação produz um precipitado azul e insolúvel de ferrocianeto férrico. Na reação do método do PAS, o ácido periódico oxida os grupos hidroxila vicinal dos hidratos de carbono do glicogênio, mucoproteínas e glicoproteínas, os quais são convertidos a grupamentos aldeídicos, de modo que a cadeia polissacarídica se transforma numa cadeia polialdeídica. Os compostos aldeídos se combinam com o reagente de Schiff, que é incolor, e esse complexo formado revela- se como um composto colorido. As colorações histológicas de rotina e especiais, quando surgiram na patologia clássica, constituíram uma grande revolução e avanço na metodologia de estudo da célula, fornecendo subsídios importantes para a análise dos tecidos, e representam o ponto de partida para o uso de técnicas mais modernas incorporadas à rotina de investigação (CAPUTO; GITIRANA; MANSO, 2010). 20 Abaixo, encontram-se algumas sugestões de técnicas histoquímicas. 21 O procedimento para coloração passa pelas seguintes etapas: Desparafinização � hidratação � coloração � desidratação � clarificação � selagem ou montagem da lâmina propriamente dita. 2.3 Elementos do sangue O sangue é um tecido conjuntivo especializado que circula em um sistema fechado de canais, representado pelo coração, artérias, vasos capilares e veias. São características e/ou qualidades funcionais do sangue: • transportar nutrientes a todas as células e retirar os produtos tóxicos resultantes do metabolismo; • conduzir de um órgão para o outro, hormônios e outras substâncias reguladoras da atividade celular; • atuar nos processos de defesa, carregando anticorpos e células que destroem agentes invasores, e ajudar na cicatrização e recuperação de tecidos lesionados; • distribuir calor, mantendo constante a temperatura do corpo; • auxiliar na manutenção do equilíbrio ácido/básico e osmótico dos fluidos corporais. 22 No homem, o sangue consiste de um fluido viscoso, de cor vermelha e tonalidade variável. Possui um pH levemente alcalino (7,4) e é responsável por aproximadamente 7% do peso corporal (+/- 5,5 L num indivíduo adulto). Os componentes do sangue podem ser separados por centrifugação, desde que seja coletado com uso de anticoagulantes. Dessa forma, podem-se obter todos que estão no quadro abaixo e explicados a seguir: Elementos do sangue Glóbulos vermelhos Hematócritos Glóbulos brancos Granulócitos Neutrófilos Eosinófilos Basófilos Agranulócitos Monócitos Linfócitos B Linfócitos T Linfócito T ‘helper’ ou auxiliar Linfócito T supressor Linfócito T citotóxico Linfócitos NK Plaquetas Plasma sanguíneo Albumina Globulina Fibrinogênio A) glóbulos vermelhos (hemácias): representam de 42% a 47% do volume total de sangue (hematócrito). São as células mais abundantes do sangue. Nos vertebrados não humanos, os glóbulos vermelhos são também chamados de eritrócitos (do grego erythros = vermelho). Porém, em humanos, esses elementos, por não possuírem núcleo, são chamados hemácias. As hemácias são estruturas altamente diferenciadas, encarregadas de manter em estado funcional o pigmento respiratório, a hemoglobina. 23 Hemácias anucleadas hemácias nucleadas Fonte: http://www.mundoeducacao.com/biologia/sangue.htm As hemácias possuem a forma de um disco bicôncavo de 6,5 a 8,5 mm de diâmetro e 2 mm de espessura na região mais larga, sendo flexíveis, sem organelas e anucleadas somente em mamíferos. Aves, peixes e répteis, por exemplo, possuem hemácias nucleadas. A concentração normal de hemácias é de +/- 4,5 e 5,5 milhões por mm3 de sangue, na mulher e no homem, respectivamente. B) glóbulos brancos (leucócitos) e plaquetas: vão formar a ‘papa leucocitária’, designação conferida à camada delgada e translúcida, que representa apenas 1% do volume total de sangue. São estas células que defendem o organismo de microrganismos ou substâncias estranhas. Células brancas em um esfregaço sanguíneo (leucócitos e especialmente o linfócito) 24 Os glóbulos brancos, células também chamadas de leucócitos, são incolores e esféricas quando no sangue. São originadas na medula óssea e só permanecem na circulação sanguínea enquanto são transportadas até os locais onde atuam. Ao chegar nesses locais, orientadas pela liberação de substâncias quimiotáticas, os leucócitos atravessam a parede dos vasos, por um processo chamado diapedese, e, só então, ao atingirem os tecidos, é que vão desempenhar suas funções específicas. Em um indivíduo adulto normal há entre 6.500 e 10 mil leucócitos por mm3. Quando esse número está alterado, pode ser classificado como leucocitose (número aumentado) e leucopenia (número reduzido) (detalhes em tópico mais adiante). De acordo com a presença de grânulos citoplasmáticos, os leucócitos são classificados em dois grupos, os granulócitos e os agranulócitos: 1) Granulócitos, que possuem grânulos primários (lisossomos) e grânulos específicos como os neutrófilos, eosinófilos e basófilos. 1.1 - Neutrófilos Os neutrófilos são células esféricas também chamadas de leucócitos polimorfonucleares, sendo os mais numerosos, equivalendo a aproximadamente 65% da população total dos leucócitos circulantes, e possuem grânulos azurofílicos. Os neutrófilos não fagocitam quando transitam no sangue circulante, mas tornam-se ameboides e fagocitários ao atingir os tecidos, onde são muito móveis, com a função primordial de ingerir e destruir microrganismos encontrados neles. Exerce papel principal nos estágios iniciais da resposta bacteriana aguda, em lesões teciduais, e é o principal constituinte do pus. Neutrófilos eosinófilos 25 1.2 - Eosinófilos Os eosinófilos representam de 2% a 4% do total de leucócitos e têm o mesmo tamanho dos neutrófilos. Seu núcleo é bilobado e os grânulos citoplasmáticos, altamente eosinofílicos, são ovoides e maiores do que os grânulos dos neutrófilos. Representam a primeira linha de defesa contra parasitas, pois são especializados na digestão de complexos antígeno-anticorpo, característicos dos processos alérgicos. 1.3 - Basófilos São os leucócitos menos frequentes no sangue, representando menos de 1% do seu total. Seu núcleo é volumoso, em forma de S retorcido e irregular. Possuem grânulos citoplasmáticos grandes, basófilos e metacromáticos, que frequentemente recobrem o núcleo. Ao deixar a circulação e penetrar no tecido conjuntivo, adquirem aparência semelhante ao mastócito. basófilo Ao entrar em contato com algum alérgeno, os basófilos exocitam seus grânulos e provocam uma reação de hipersensibilidade imediata (anafilaxia), que é, de fato, uma reação exagerada do organismo no combate ao alérgeno. 2) Agranulócitos: possuem apenas grânulos primários e são os monócitos e os linfócitos. 2.1 - Monócitos 26 Os monócitos são as maiores células do sangue circulante e representam de 3% a 8% da população leucocitária. Os monócitos são constituintes da unidade funcional denominada sistema mononuclear fagocitário. Esse sistema se origina da célula mononuclear fagocitária, presente na medula óssea. A célula precursora atinge o sangue circulante, onde permanece alguns dias completando sua maturação e se torna um monócito. Enquanto circulante, essa célula continua um monócito; porém, quando realiza a diapedesee penetra no tecido conjuntivo, transforma-se num macrófago. Dependendo do órgão no qual se encontre, esse macrófago recebe diferentes designações: células de Kupffer, no fígado; macrófagos alveolares, nos pulmões; células de Langerhans, na pele; microglia, no sistema nervoso central; dentre outros. Monócito linfócito 2.2 - Linfócitos De uma forma geral, os linfócitos são células pequenas (de 9 a 12 mm) com núcleos centrais, ovoides ou reniformes, e cromatina condensada; o citoplasma é levemente basófilo e se apresenta normalmente como um anel delgado ao redor do núcleo. De 20% a 25% dos leucócitos circulantes são células desprovidas de capacidade fagocitária e podem ser divididos em dois grupos, os linfócitos B e T: 2.2.1 - Linfócitos B Os linfócitos B se originam e amadurecem na medula óssea. Durante seu amadurecimento, essas células produzem milhares de imunoglobulinas (anticorpos) que são inseridas na sua membrana plasmática, permanecendo com seus sítios de ligação expostos na superfície externa da célula. Quando esses anticorpos membranares entram em contato com os seus antígenos, o linfócito B é ‘ativado’, 27 sofrendo mitoses e dando origem a dois tipos celulares: os plasmócitos e as células de memória (linfócito B de memória). 2.2.2 - Linfócitos T Os linfócitos T são produzidos na medula óssea, mas terminam seu processo de amadurecimento no timo, daí a origem de seu nome: linfócitos T. Quando essas células concluem seu amadurecimento no timo, elas se diferenciam em três tipos celulares: 2.2.2.1 - linfócito T ‘helper’ (auxiliar) – essas células secretam fatores que estimulam a ação de outros linfócitos T e B; 2.2.2.2 - linfócito T ‘supressor’ – libera substâncias que reduzem a ação de linfócitos T e B. Desempenha papel fundamental na supressão da resposta aos antígenos do próprio indivíduo (doenças autoimunológicas); 2.2.2.3 linfócito T ‘citotóxico’ – essa célula age diretamente sobre células estranhas, como, por exemplo, células transplantadas, e sobre células infectadas por vírus. Atuam de duas formas: secretando proteínas chamadas perforinas, que formam orifícios na membrana das células atacadas, provocando sua lise; ou liberando substâncias que induzem as células-alvo à apoptose1. Alguns autores relatam ainda a existência de um terceiro grupo de linfócitos, os linfócitos NK (natural killers) ou “assassinos naturais”. Esses linfócitos representam aproximadamente 10% dos linfócitos circulantes, e recebem o nome de NK porque atacam células cancerígenas e infectadas por vírus sem a necessidade de um estímulo prévio. Em uma distensão sanguínea, não é possível distinguir essas células. 2.3 - Plaquetas São fragmentos citoplasmáticos pequenos (2 a 4 mm) e anucleados, derivados dos megacariócitos residentes da medula óssea e desempenham um 1 A apoptose é um tipo de morte celular que possui importante papel durante o processo de diferenciação, crescimento e desenvolvimento dos tecidos adultos normais e patológicos. Fisiologicamente, a apoptose é um dos participantes ativos da homeostase, controlando o equilíbrio entre a proliferação e a degeneração celular, ajudando na manutenção do tamanho dos tecidos e órgãos. É erroneamente conhecida como ‘morte celular programada’, de vez que a definição correta é ‘morte celular não seguida de autólise’. 28 importante papel na hemostasia2, promovendo a coagulação do sangue e ajudando na reparação de danos na parede dos vasos, evitando processos hemorrágicos. C) plasma sanguíneo: componente líquido do sangue, no qual os outros componentes estão diluídos e que representa aproximadamente 55% do volume do sangue. O plasma sanguíneo é a parte líquida do sangue, que transporta substâncias solúveis em água. É constituído por água, proteínas, glicose, sais minerais e outros nutrientes, materiais de excreção, hormônios e anticorpos. Dentre as proteínas presentes no plasma, destacam-se: c.1) as albuminas – encarregadas de regular a pressão osmótica do sangue; c.2) as globulinas – representam os anticorpos que atuam na defesa do organismo; c.3) o fibrinogênio – atua nos processos de coagulação sanguínea. Na ausência de anticoagulantes, o fibrinogênio, juntamente com os outros elementos celulares do sangue, forma um coágulo. Esse processo de coagulação permite a obtenção do soro sanguíneo, que é, essencialmente, o plasma sanguíneo sem o fibrinogênio (SOUZA; MEDRADO; GITIRANA, 2010). D) Tecido Hematopoiético O tecido hematopoiético é uma variedade do tecido conjuntivo relacionado à produção dos elementos figurados (hemácias, leucócitos e plaquetas), tecido delicado e gelatinoso, rico em vasos sanguíneos e composto por uma delicada rede de fibras reticulares, que proporciona um microambiente tissular propício a esse processo, o qual está alojado na medula óssea. As células mais importantes do tecido hematopoiético são as células-tronco pluripotentes, capazes de originar todas as células sanguíneas. 2 Hemostasia é um conjunto de mecanismos que o organismo emprega para coibir hemorragias, dizendo respeito às rotinas de coagulação sanguínea e reparação de vasos. 29 As células-tronco pluripotentes têm a importante característica de se autorrenovar. Ao se dividirem, essas células dão origem a duas células-filhas, sendo que somente uma delas vai continuar se desenvolvendo, permanecendo a outra célula-filha como uma célula-tronco de reserva, tornando seu estoque praticamente inesgotável. Ao contrário do que se acreditava inicialmente, as células-tronco da medula óssea têm uma capacidade de diferenciação celular que não se restringe às células sanguíneas. Inicialmente, as pesquisas se restringiam à utilização de células-tronco embrionárias, mas os estudos revelam a obtenção de células-tronco de um indivíduo adulto. Depois de retiradas da medula óssea, as células-tronco são mantidas em um meio de cultura no qual têm sua diferenciação direcionada, havendo a produção de células especializadas de um tecido específico que se deseje transplantar. Essas células são, então, utilizadas para substituir células afetadas por processos patológicos. Embora o tema ainda seja controverso e impregnado de problemas de caráter ético, já há experiências bem-sucedidas na reparação de tecidos nervosos e cardíacos, dentre outros (SOUZA; MEDRADO; GITIRANA, 2010). 2.4 Hemostasia e Homeostasia São várias as situações em que se necessita, popularmente falando, estancar uma hemorragia e, atualmente, é significativo o número de pacientes que apresentam transtornos de coagulação, seja por patologias que alterem os fatores de coagulação, por uso de anticoagulantes ou por iatrogenias que provoquem sangramento trans e pós-operatório abundante. Em alguns casos, a simples compressão da área hemorrágica será suficiente para obter hemostasia; em outros casos, procedimentos que consomem maior tempo e manobras cirúrgicas podem ser necessários (PETERSEN et al., 1984; ALEXANDER; RABINOWITS, 1978; ALPASLAN et al., 1997 apud GABRIELLI, 2009). O uso de agentes hemostáticos é popular, especialmente aqueles absorvíveis, os quais podem ser acomodados e deixados para posterior absorção dentro de alvéolos cirúrgicos, defeitos ósseos ou tecidos moles (PETERSEN et al., 1984 apud GABRIELLI, 2009). As características que fazem com que um agente 30 hemostático seja considerado melhor dependem de várias considerações: da fácil aplicação e remoção, do potencial de reabsorção, da antigenicidade, da área em que estará sendo empregado e do efeito da reação tecidual. A função primária dos agentes hemostáticos é iniciar a agregação de plaquetas, permitindo a coagulação sanguínea. Diferentes materiais têm sido utilizados para essafinalidade e a maioria dos achados literários mostra algum grau de reação inflamatória durante as primeiras quatro semanas, porém com total reabsorção ou degradação destes na área implantada (CARVALHO; OKAMOTO, 1987). Vieira, Oliveira e Sá (2007) também explicam que o adequado funcionamento do sistema circulatório depende de uma série de mecanismos que regulam a manutenção do sangue no estado fluido dentro do compartimento vascular, permitindo a perfusão adequada a todos os territórios do organismo. Os componentes do sistema hemostático incluem as plaquetas, os vasos sanguíneos, o fator de von Willebrand, os fatores da coagulação, os anticoagulantes naturais e o sistema fibrinolítico. Na vigência de qualquer lesão vascular, esses componentes são ativados, visando à manutenção da integridade do endotélio e evitando a perda excessiva de sangue. A ativação dos fatores da coagulação, de acordo com um modelo didaticamente apresentado como “cascata”, culmina com a formação de um tampão hemostático, constituído de plaquetas e fibrina, no local da lesão vascular. A formação do tampão de plaqueta e fibrina deve-se manter restrita ao sítio de lesão endotelial, de forma a prevenir a coagulação disseminada e a doença tromboembólica. Os anticoagulantes naturais, cujos principais representantes são a antitrombina e as proteínas C e S, atuam principalmente por meio da degradação de fatores da coagulação. Já o sistema fibrinolítico atua sobre a fibrina formada no local da lesão vascular, degradando-a e estabilizando o coágulo. Desta forma, em condições normais, os mecanismos anticoagulantes prevalecem sobre os pró- coagulantes, conforme ilustração a seguir: 31 (A) hemostasia normal (B) hemostasia alterada: mecanismo da trombose. Carvalho et al. (2013) ressaltam que mecanismo de ação dos agentes hemostáticos pode ser mecânico ou causar o aumento da cascata de coagulação. O adesivo tecidual age por juntar e fechar as bordas da ferida, vedando-a e impedindo o sangramento. Os agentes hemostáticos e os adesivos teciduais têm entrado na prática clínica porque agem no sentido de diminuir a perda sanguínea, o tempo do ato cirúrgico, reduzir ou evitar transfusão de sangue, diminuir drenagem pós-operatória e diminuir tempo de internação. Os tipos de agentes tópicos estão dispostos na tabela abaixo: Hemostáticos tópicos Adesivos teciduais e vedantes Novos produtos Colágeno Celulose Gelatina Trombina Combinação de produtos Hidrogel de etileno glicol Gelatina com resorcinol e formaldeído Albumina com glutaraldeído Trombina com matriz de gelatina Fibrina cianoacrilato Polissacarídeos Mineral zeolita Mineral esmectita Fonte: Carvalho et al. (2013, p. 67) 32 Vamos expor um pouco da revisão realizada por Carvalho et al. (2013): a) O colágeno é um biomaterial derivado de tecidos orgânicos e tem como características a considerável força de tensão, alta afinidade com a água, baixa antigenicidade, é absorvido pelo corpo e promove a ativação plaquetária. Os hemostáticos derivados do colágeno promovem a hemostasia através da ativação por contato e da agregação plaquetária, que ocorre como resultado direto do contato entre o sangue e o colágeno. Os hemostáticos de colágeno podem ser aplicados no local do sangramento, como exemplo, pó, pasta ou esponja. Como qualquer produto de origem animal, o colágeno bovino tem o potencial de induzir reações alérgicas ou reações imunes, mas na prática essa incidência é baixa. b) Os produtos à base de celulose contêm celulose oxidada regenerada. Eles iniciam a coagulação via ativação por contato, embora o mecanismo não esteja ainda muito bem compreendido. Os produtos de celulose podem ser cortados em diferentes tamanhos para se adaptarem ao tamanho da ferida e o produto é fácil de ser manuseado pelo cirurgião e não adere ao instrumental. Tem sido sugerido que a celulose oxidada não é tão bem absorvida como os outros produtos, resíduos de celulose oxidada foram encontrados em re-operações. A diferença na biodegradabilidade vai depender da quantidade usada e do local da implantação. Assim, é recomendado usar a quantidade mínima necessária para se conseguir a hemostasia. c) A gelatina tem a propriedade de se ajustar perfeitamente aos contornos da geometria irregular da ferida. Quando colocada no local do sangramento, a gelatina irá se adaptar aos contornos da ferida e ‘inchar’ pelo fato de ser hidrófila, provocando um efeito de tamponamento em espaços confinados. As partículas inchadas de gelatina restringem o fluxo sanguíneo e promovem uma matriz ao redor da qual o coágulo pode se formar. Os produtos baseados em gelatina também podem ter seus inconvenientes, por exemplo, gelatina embebida por sangue tem tendência a aderir aos instrumentos 33 cirúrgicos, dificultando o manuseio. Além disso, as esponjas de gelatina têm tendência a se deslocar porque elas não formam uma aderência firme com a fonte de sangramento. d) A trombina tem sido usada por mais de cinquenta anos para diminuir o sangramento em vários tipos de operações e é estimado que a trombina seja usada como hemostático adjuvante em mais de meio milhão de operações por ano nos Estados Unidos. A trombina é uma protease sérica que transforma o fibrinogênio em fibrina, ativa o fator XIII e promove a estabilização do coágulo formado por fibrina e outras proteínas. A presença do fibrinogênio circulante é necessária para uma ação hemostática eficiente porque a trombina exerce a sua ação hemostática primária via interação com o fibrinogênio do sangue do paciente para formar o coágulo de fibrina. O fato de a trombina ser ativada no último estágio da cascata da coagulação é importante porque a ação da trombina fica menos susceptível às coagulopatias causadas por deficiência de fatores da coagulação ou por deficiência ou má função plaquetária. Assim, a trombina pode ser um agente muito útil nos pacientes que estão recebendo anticoagulantes ou antiplaquetários. A trombina é comumente usada em combinação com outros agentes hemostáticos, como a esponja de gelatina, com o objetivo de aumentar a efetividade e a utilidade deles. A trombina é também componente de alguns adesivos de fibrina (combinação de produtos). Vale a pena conferir a íntegra da pesquisa realizada pelos autores acima, com o objetivo de identificar os trabalhos mais relevantes sobre agentes hemostáticos e adesivos teciduais e discutir as características de cada um desses agentes para facilitar a decisão do cirurgião na escolha do produto mais adequado para cada tipo de sangramento e natureza da hemorragia. Para a proposta do módulo, pontuamos um excerto das discussões que foram as seguintes: 34 � Há uma variedade de diferentes agentes hemostáticos e de adesivos cirúrgicos, mas é necessário conhecer a característica de cada um deles para escolher o mais adequado para cada caso. � A natureza da hemorragia é a chave determinante na escolha do agente hemostático. Hemorragias traumáticas, particularmente no atendimento pré- hospitalar, são mais apropriadamente tratadas com polissacarídeos. � Os vedantes de fibrina seriam pouco adequados a esse tipo de aplicação porque necessitam de campo seco (SEYEDNEJAD, 2008 apud CARVALHO et al., 2013). � Para hemostasia de modo geral, a escolha vai depender da gravidade, localização e tipo de sangramento. Sangramento arterial traz o desafio do fluxo de alta pressão. O estado de coagulação do paciente também é importante e os agentes de colágeno, celulose ou gelatina sem associação com outros produtos devem ser reservados para pacientes com mecanismo de coagulação intacto, pois eles são muito pouco efetivos em pacientes com coagulopatia (SEYEDNEJAD, 2008; ACHNECK et al., 2010 apud CARVALHO et al., 2013). Entretanto, a adição de trombina a alguns desses agentesmelhora a eficácia deles. � Outros agentes hemostáticos como os vedantes de fibrina são independentes dos mecanismos de coagulação (SEYEDNEJAD, 2008 apud CARVALHO et al., 2013). Hemostáticos de gelatina não devem ser usados próximos a nervos ou em espaços confinados. Nestas situações pode-se usar celulose oxidada em associação com trombina (ACHNECK et al., 2010; PERALTA et al., 2012 apud CARVALHO et al., 2013). � O colágeno microfibrilar é recomendado para controle de sangramento de grande área parenquimatosa devido à sua característica superior de ativar plaquetas (ACHNECK et al., 2010 apud CARVALHO et al., 2013). � Hidrogel de etileno glicol é indicado em cirurgia vascular nas quais edema e expansão não são preocupantes (ACHNECK et al., 2010; PERALTA et al., 2012 apud CARVALHO et al., 2013). 35 A homeostase é um conceito abrangente que descreve os maravilhosos processos fisiológicos do corpo humano, responsáveis por manter estável o ambiente interno, ou seja, por definição seria o equilíbrio que os elementos encontram para o estado de harmonia intrínseco, ou seja, “acomodar” (GUYTON, 2006). Acontece um equilíbrio homeostásico quando o ponto de equilíbrio dinâmico dos corpos, na Física, torna-se estável, instável e indiferente. Em termos de fisiologia, é equilíbrio aplicado ao conjunto de processos que previnem flutuações na fisiologia de um organismo, e denomina também a regulação de variações nos diversos ecossistemas, ou do universo como um todo. Nos organismos vivos, a homeostase significa o consumo de energia necessário para manter uma posição num equilíbrio dinâmico. Isto significa que, embora as condições externas possam estar sujeitas continuamente a variações, os mecanismos homeostáticos asseguram que os efeitos destas mudanças sobre os organismos sejam mínimos. No homem e em outros mamíferos superiores, a homeostase acontece tanto nas células isoladas como nas integradas, nos fluidos corporais, tecidos e órgãos. Existe um intercâmbio constante de moléculas entre o sangue e o líquido extracelular que banha cada célula (GUYTON, 2006) Alguns devem estar se perguntando qual a relação da homeostasia tendo nosso curso foco na Hematologia... Pois bem, é a composição estável do sangue que torna possível a manutenção da invariabilidade do líquido extracelular. Já a composição constante deste líquido protege cada célula das mudanças que acontecem no meio externo. Nesse sentido, o aparelho circulatório é vital para a conservação da homeostase. Ele proporciona metabólitos aos tecidos e elimina os produtos não- utilizados e também participa na regulação da temperatura e no sistema imunológico. Mesmo assim, os níveis de substâncias no sangue estão sob o controle de outros órgãos: � o aparelho respiratório (pulmões) e o sistema nervoso regulam o nível de dióxido de carbono; � o fígado e o pâncreas controlam a produção, o consumo e as reservas de glicose; 36 � os rins são responsáveis pela concentração de hidrogênio, sódio, potássio e íons fosfato; � as glândulas endócrinas, por sua vez, controlam os níveis de hormônios no sangue; � o hipotálamo recebe informações do cérebro, dos sistemas nervoso e endócrino e a integração de todos estes sinais torna possível o controle da termorregulação, o equilíbrio de energia e a regulação dos fluidos corporais, influindo no comportamento (por exemplo, o hipotálamo é responsável pela sensação de fome), exteriorizando as sensações através dos sistemas endócrino e nervoso (GUYTON, 2006). 37 UNIDADE 3 – HEMATOPOESE São vários os pesquisadores e estudiosos das ciências da saúde e mais precisamente da área hematológica que discorrem com propriedade sobre a formação do sangue. Aqui fazemos um aporte sobre a questão das referências bibliográficas. Embora grande parte delas seja em língua estrangeira, temos no Brasil uma literatura, se não de pesquisa, mas de revisão de literatura bem extensa. Várias estão disponibilizadas ao final do módulo, e lançamos mão de autores didáticos para melhor compreensão dos conteúdos relacionados. Pois bem, vamos à formação do sangue, fenômeno também chamado de hematopoese e outras variantes que tem origem na célula primitiva do sistema retículo-endotelial também conhecido como stem cell que, sob estímulos especiais, sofre um processo evolutivo de maturação ganhando caracteres e funções definidas quando então é lançada no sangue periférico. 3.1 Hematopoese A célula reticular primitiva dá origem a uma célula totipotente, o hemocitoblasto, capaz de dar origem a todas as linhagens sanguíneas passando ou não por uma célula intermediária denominada hemoistioblasto, capaz de originar as células de estroma medular como fibroblastos, células endoteliais e osteoblastos, a hemocitoblasto segue sua evolução, dando origem a elementos diferenciados, capazes de evoluir para uma única linhagem: eritroblástica, granulocítica, megacariocítica, linfoblástica, monoblástica (MOURA et al., 2008). Definição: formação e desenvolvimento das células sanguíneas. Ocorre a partir de um precursor comum pluripotente (UFC – unidade formadora de colônia; stem-cell ou célula-tronco). 38 Diagrama mostrando a célula-tronco multipotente da medula óssea e as linhagens celulares que dela se originam Fonte: Hoffbrand e Moss (2011, p. 3). Locais: a hematopoese começa por volta da 3ª semana de gestação e altera os seus sítios de produção de acordo com a idade humana. Os principais períodos são classificados em: - mesoblástico – ocorre no saco vitelínico desde o 19º dia até o 6º mês de gestação; - hepático – inicia precocemente, por volta do 1º mês, e torna-se predominante na hematopoese entre o 3º e o 6º mês gestacional; - medular – a partir do 6º ao 8º mês de gestação. Até os cinco anos de idade a medula de todos os ossos do corpo participam do processo. À medida que os anos avançam, ocorre uma substituição gordurosa na medula dos ossos longos. Na vida adulta, somente os ossos da pelve, esterno, ossos do crânio, úmero, fêmur e costelas serão capazes de gerar células sanguíneas. Obs.: Há uma pequena produção esplênica (início - 3º mês) e linfática (início – 5º mês) durante a gestação, que perdura pouco tempo após o nascimento. 39 Medula óssea: a medula óssea com atividade hematopoiética é conhecida como medula vermelha, enquanto o restante dos ossos possui medula óssea amarela, preenchida com tecido gorduroso. Essa substituição da medula por gordura é um processo reversível. É interessante notar a potencial repopulação de cavidades medulares onde a hematopoese havia cessado. Isso ocorre na talassemia e outras doenças hemolíticas crônicas. Pode haver aumento da circunferência craniana em consequência da eritropoiese aumentada. Hepatoesplenomegalia pode significar hematopoiese extramedular nesses pacientes. A medula óssea é o principal órgão de armazenamento de neutrófilos maduros e contém cerca de 2,5 a 5 vezes o pool intravascular dessas células. Essa reserva é responsável pelo aumento rápido da contagem de neutrófilos, durante infecções. Esta é a teoria monofilética de Maximow, ilustrada abaixo: Hematopoese Célula reticular primitiva Hemoistioblasto Hemocitoblasto Pro-eritrobasto Mieloblasto Megacarioblasto Linfoblasto Monoblasto Eritrócito Granulócitos Plaquetas Linfócitos Monócitos N E Plasmoblastos B Plasmócitos 40 3.2 Eritropoese O período de tempo calculado para se formar uma célula vermelha madura a partir da primeira célula já diferenciada, o pró-eritroblasto, é de 72 horas. Durante esse tempo ocorrem 4 mitoses sucessivas de modo que um pró-eritroblasto dá origem a 16 células maduras, passando por 4 fases distintas: eritroblasto basófilo, eritroblasto policromatófilo, eritroblasto ortocromáticoe reticulócito. ERITROPOIESE Pró-eritroblasto Eritroblasto basófilo Eritroblasto policromatófilo Eritroblasto ortocromático reticulócito Eritrócito 3.3 Plaquetogênese As plaquetas se originam dos megacariócitos da medula óssea que por sua vez são células oriundas dos megacarioblastos. PLAQUETOGÊNESE Megacarioblasto Pró-megariócito Megacariócito Plaqueta 41 3.4 Granulopoiese O mieloblasto originado do hemocitoblasto é a célula que se diferenciará nas demais células granulocíticas da linhagem neutrófila, eosinófila e basófila, passando pelas fases de maturação denominadas de: pró-mielócito, mielócito, metamielócito, bastonete e segmentado ou polimorfonuclear. Em relação à linhagem basófila é importante notar que as formas intermediárias de metamielócito e bastonete não são evidenciadas. Caracteres morfológicos das células da linhagem eritroblástica GRANULOPOIESE 42 3.5 Linfocitogênese Os linfócitos são formados na medula óssea, baço, gânglios linfáticos, no timo, nos agrupamentos linfóides do trato digestivo e trato respiratório dos mamíferos. Do ponto de vista morfológico, bioquímico e funcional, as células linfoides não são todas iguais. A célula linfoide jovem (linfoblasto) pode ter origem em dois compartimentos diferentes: 1) órgãos linfoides centrais ou primários que são o timo e o equivalente da bursa (bursa de Fabricius das aves); e, 2) órgãos linfoides periféricos como o baço e gânglios linfáticos. LINFOCITOGÊNESE Linfoblastos Pró-linfócito Linfócito Plasmoblasto plasmócito 43 UNIDADE 4 – TRANSPLANTE DE CÉLULAS-TRONCO Vamos começar a falar de células-tronco com algumas observações importantes oferecidas por Barth (2006) no livro “Células-tronco e bioética: o progresso biomédico e os desafios éticos”: 1º. O ser humano não é somente células e não se define somente pela sua composição genética, portanto, é preciso fundamentar qualquer trabalho ou pesquisa no respeito à individualidade genética de cada ser humano. 2º. Cada embrião humano, independentemente da forma como foi criado, sempre é um ser humano, uma pessoa humana em potência e, por isto mesmo, merecedora de respeito e proteção para que possa se desenvolver e atingir a maturidade humana. 3º. Embora o tema seja recente, já encontramos uma ampla bibliografia para seleção e análise. Existem publicações, centros e empresas que trabalham exclusivamente com células-tronco e o material produzido é enorme, o que impossibilita abordar alguns aspectos. Além disso, notícias e reportagens fazem com que o assunto provoque discussões e desperte o interesse do público. A) Definição para células-tronco As células-tronco são células indiferenciadas, ou seja, células não especializadas, que podem ser definidas por duas propriedades peculiares: autorrenovação e potencial de diferenciação, conforme ilustração a seguir: 44 A autorrenovação é a capacidade que as células-tronco têm de proliferar, gerando células idênticas à original (outras células-tronco). O potencial de diferenciação é a capacidade que as células-tronco têm de, quando em condições favoráveis, gerar células especializadas e de diferentes tecidos. As propriedades definidas para uma célula-tronco são as seguintes: � ela não é terminalmente diferenciada (isto é, não é o fim de uma via de diferenciação); � ela pode dividir-se sem limite (ou pelo menos pela vida toda do animal); � quando se divide, cada célula ‘filha’ pode parecer como célula-tronco ou pode tomar o caminho que leva à diferenciação terminal (BRUCE et al., 1997 apud BARTH, 2006, p. 19). De acordo com seu potencial de diferenciação, as células-tronco são classificadas em três níveis diferentes: células totipotentes, pluripotentes e multipotentes: a) Células-tronco totipotentes são o único tipo capaz de originar um organismo completo, uma vez que têm a capacidade de gerar todos os tipos de células e tecidos do corpo, incluindo tecidos embrionários e extra embrionários (como a placenta, por exemplo). Os únicos exemplos de células-tronco totipotentes são o óvulo fecundado (zigoto) e as primeiras células provenientes do zigoto, até a fase de 16 células da mórula inicial (um estágio bem precoce do desenvolvimento embrionário, antes do estágio de blastocisto). b) As células-tronco pluripotentes têm a capacidade de gerar células dos três folhetos embrionários (tecidos primordiais do estágio inicial do desenvolvimento embrionário, que darão origem a todos os outros tecidos do organismo. São chamados de ectoderma, mesoderma e endoderma). Em oposição às células-tronco totipotentes, as células pluripotentes não podem originar um indivíduo como um todo, porque não conseguem gerar tecidos extraembrionários. O maior exemplo de células-tronco pluripotentes são as células da massa celular interna do blastocisto, as chamadas células-tronco embrionárias. Recentemente, cientistas desenvolveram uma técnica para reprogramar geneticamente células adultas – diferenciadas – para um estado pluripotente. As 45 células geradas por essa técnica são chamadas de células-tronco de pluripotência induzida (iPS, da sigla em inglês induced pluripotent stem cells) e apresentam características muito parecidas com as células-tronco pluripotentes extraídas de embriões. c) As células-tronco multipotentes têm a capacidade de gerar um número limitado de células especializadas. Elas são encontradas em quase todo o corpo, sendo capazes de gerar células dos tecidos de que são provenientes. São responsáveis também pela constante renovação celular que ocorre em nossos órgãos. As células da medula óssea, as células-tronco neurais do cérebro, as células do sangue do cordão umbilical e as células mesenquimais são exemplos de células-tronco multipotentes (LANCE-UFRJ, 2008). B) Transplante de Células-Tronco Hematopoiéticas (T CTH) Pesquisa realizada por Vigorito e Souza sobre a regeneração da hematopoese no processo de transplante de célula-tronco trouxe algumas conclusões interessantes, dentre elas que: � a velocidade da recuperação da hematopoese é influenciada caso o TCTH seja realizado com células-tronco provenientes da Medula Óssea (MO), do sangue periférico ou cordão umbilical; � a biópsia de MO pode ser mais uma ferramenta para a avaliação da hematopoese pós-transplante e o quimerismo é fundamental para a investigação da origem genotípica da hematopoese pós-transplante, além de poder ser um indicador da recidiva de doenças malignas e não malignas. Abaixo temos um excerto do trabalho do autores acima. As células-tronco hematopoéticas são células com a capacidade única de produzir progenitores celulares mais diferenciados, assim como células filhas, que mantêm a capacidade de autorrenovação. Embora o TCTH humano seja referido frequentemente como um “transplante de células-tronco”, na verdade o enxerto utilizado no TCTH contém uma mistura de células progenitoras hematopoéticas imaturas e mais maduras, incluindo as células-tronco com capacidade de autorrenovação (VIGORITO; SOUZA, 2009). 46 É sabido, por mais de duas décadas, que as células do estroma da Medula Óssea (MO) são necessárias para dar suporte ao crescimento e desenvolvimento das células iniciadoras de cultura de longa duração, que são essenciais para manter e regular a atividade das células-tronco hematopoéticas. As células mesenquimais do estroma, multipotentes, foram isoladas da MO e mostraram-se capazes de diferenciar-se in vitro em tecido adiposo, cartilagem e osso. Essas células são consideradas importantes reguladoras da atividade hematopoética, mas também são precursoras de tecidos não hematopoéticos. Até recentemente, apenas a MO era utilizada como fornecedora de células- tronco hematopoéticas, mas outras fontes como, por exemplo, o sangue decordão umbilical possuem também células transplantáveis, porém, em número limitado. A constatação de que células-tronco hematopoéticas são encontradas em pequena quantidade no sangue periférico (CTP), levou à investigação do uso do sangue periférico como mais uma alternativa para o fornecimento destas células. A habilidade de mobilizar tais células do compartimento medular para a periferia, utilizando a quimioterapia e/ou fatores de crescimento hematopoético, possibilitou a coleta de um número suficiente de CTP para a realização dos transplantes. O sangue periférico mobilizado substituiu amplamente a MO como fonte de células-tronco hematopoéticas no transplante autólogo e o seu uso está aumentando no TCTH alogênico. Uma grande quantidade de células CD34+ pode ser mobilizada a partir de doadores normais com a utilização do G-CSF. Esta estratégia aumenta o número de células-tronco hematopoéticas circulantes em 100 vezes ou mais. Essas células promovem uma recuperação hematopoética duradoura, além de terem vantagens sobre a MO porque permitem uma enxertia mais rápida de neutrófilos e plaquetas, provavelmente devido a uma maior conteúdo de células-tronco hematopoéticas comprometidas. Teoricamente, as CTP alogênicas podem ter outras vantagens por apresentarem muitos linfócitos T e células natural killer, os quais poderão ter função no efeito enxerto contra leucemia, diminuindo assim o risco de recidiva após o transplante. Uma desvantagem, entretanto, é o aumento da frequência da DECH-c. 47 O antígeno CD 34+ é o identificador das células-tronco hematopoéticas. Ele está presente em 1% a 4% das células da MO responsáveis pela formação das colônias hematopoéticas e que são capazes de reconstituir a hematopoese, indicando que as células progenitoras pluripotenciais estão presentes dentro deste compartimento. No entanto, as células CD 34+, na periferia, correspondem a 1/10 da concentração da MO, em condições normais. As características fenotípicas das CTP coletadas, após a utilização de fatores de crescimento, são uma mistura de precursores hematopoéticos primitivos e comprometidos, não apresentando diferenças marcantes com as da MO. A análise antigênica das células periféricas CD 34+ revela que elas coexpressam uma variedade de antígenos de diferenciação. As subpopulações com antígenos mieloides, como o CD33, parecem ser progenitores comprometidos e provavelmente responsáveis pela primeira fase da recuperação hematopoética. Em contraste, as que não apresentam antígenos associados tanto à linhagem (por exemplo CD33) ou à ativação (HLA-DR, CD38), são consideradas mais primitivas e contribuem para a sustentação da hematopoese (células que reconstituem a hematopoese a longo termo prazo). Assim, podem ser encontradas as seguintes subpopulações: CD34+/CD33+, CD34+/ CD 38-, CD34+/HLA-DR. Dados recentes indicam que as CTP apresentam uma capacidade intrínseca para reconstituir os neutrófilos mais rapidamente, o que não está somente relacionado ao número de células formadoras de colônias de granulócitos e monócitos (CFU-GM) infundidas. Foi demonstrado que as CTP apresentam uma baixa atividade do ciclo celular, in vivo, mas são capazes, no entanto, de uma rápida ativação, in vitro. Além do mais, em contraste com os progenitores derivados da MO, os do sangue não apresentam atraso na proliferação, atraso esse causado pelas células estromais da MO. Estas reduzem a probabilidade de as células entrarem em um ciclo celular. Outra característica é que os progenitores periféricos produzem, preferencialmente, mais células formadoras de colônias de granulócitos e monócitos (CFU-GM), em detrimento das unidades formadoras de colônia de eritrócitos (BFU- E). Tanto a resposta reduzida de mediação das células estromais da MO quanto a 48 produção seletiva de progenitores granulocíticos poderiam contribuir para uma rápida recuperação dos neutrófilos, nos transplantes com CTP. O sangue de cordão umbilical, recentemente, surgiu como outra fonte rica de células-tronco hematopoéticas para utilização no transplante. O risco mínimo para o doador e a rápida disponibilidade do sangue de cordão umbilical são uma das grandes vantagens desta fonte de células-tronco (VIGORITO; SOUZA, 2009). Além do mais, a incidência da doença do enxerto contra o hospedeiro, tanto aguda como crônica, após o transplante com sangue de cordão com doadores irmãos idênticos, é menor quando comparada com o transplante de MO, também utilizando doadores idênticos. Uma desvantagem do TCTH com o sangue de cordão é a recuperação lenta da contagem de neutrófilos e plaquetas. A dose de células e o grau de incompatibilidade do HLA são importantes fatores prognósticos. Os melhores resultados são vistos em receptores que receberam unidades de sangue de cordão com uma dose alta de células mononucleares e não mais do que uma diferença no HLA. O número limitado de células no sangue de cordão tem sido um importante fator limitante para a sua utilização em adultos. Embora o número de células CD 34+ transplantadas parece ser um dos maiores fatores para a recuperação hematopoética, pouco é sabido, porque a velocidade da enxertia é menor no sangue de cordão umbilical. As células-tronco hematopoéticas transplantadas precisam migrar para o microambiente da MO para a sua proliferação e diferenciação. Neste processo de homing estão envolvidas várias moléculas de adesão presentes nas células-tronco hematopoéticas e nas células endoteliais. Alguns dados sugerem que o potencial de adesão das células CD 34+ do sangue de cordão umbilical seria menor do que as da medula óssea. Isto poderia explicar porque a enxertia é atrasada no sangue de cordão umbilical. Um estudo avaliou a histopatologia da reconstituição da MO após a realização de transplantes com sangue de cordão umbilical e medula óssea. Nas biópsias obtidas até 29 dias após o transplante de MO, a celularidade estava aumentada com a presença de megacariócitos. Neste mesmo período, após o transplante de sangue de cordão umbilical, as biópsias mostraram uma diminuição acentuada da celularidade e megacariócitos quase ausentes. Além do mais, poucas 49 células CD 34+ foram observadas após o transplante de sangue de cordão umbilical comparado com os transplantes com MO. Houve um aumento gradual da recuperação hematopoética da MO após o dia 30 do transplante de sangue de cordão umbilical, e após o dia 100 nenhuma diferença significativa foi observada comparando-se os transplantes com sangue de cordão umbilical e MO (VIGORITO SOUZA, 2009). C) Doenças para as quais há indicação de transplant e de células- tronco: Embora coloquemos essa lista abaixo, Hoffbrand e Moss (2011) afirmam que é preciso ficar claro que o papel exato do TCT no tratamento de cada doença é complexo e depende de fatores como gravidade e subtipo da doença, estado de remissão, idade e, no transplante alogênico, disponibilidade de doador compatível. Indicações de transplante de células-tronco Alogênicos ou singênicos Autólogo Leucemia aguda linfoblástica ou mieloide e outros distúrbios malignos da medula óssea (ex. leucemia mieloide crônica; mielodisplasia; mieloma múltiplo; linfomas; anemia aplástica severa incluindo anomia do Fanconi). Linfomas de Hodgkin e não Hodgkin. Mieloma múltiplo. Leucemia mieloide aguda. Amiloidose primária. Distúrbios hereditários. Talassemia maior. Anemia de células falciformes. Imunodeficiências. Erros inatos do metabolismo no sistema hematopoiético e mesenquimal (ex. osteopetrose). Outras doenças graves adquiridas da medula óssea (ex. hemoglobinúria; paroxística noturna; aplasia eritoide pura; mielofibrose). Fonte Hoffbrand e Moss (2011, p. 298). 50 UNIDADE 5 – TRANSFUSÃO DE SANGUE A transfusão de sangue consiste na transferência segura de componentes sanguíneos
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