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DOAÇÃO E REVOGAÇÃO DA DOAÇÃO

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DA DOAÇÃO
Herdeiros necessários: descendentes, ascendentes, cônjuge ou companheiro. A eles, necessariamente, será reservada uma porção do patrimônio do indivíduo.
Ninguém, tendo herdeiros necessários, poderá doar tudo a terceiros. 
Doador: quem doa.
Donatário: quem recebe.
Quanto a classificação dos contratos como gratuitos ou onerosos, a doação será sempre gratuita. 
Na doação, não existe onerosidade, por isso é classificado como contrato gratuito, o qual não se exige nada de uma das partes (doação pura e simples).
Existe também a doação com encargo. Ex.: eu te faço a doação de um carro caso você doe uma bicicleta a um orfanato.
Art. 538. Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra.
Não importa se é pessoa física ou jurídica.
Doação é um contrato unilateral, gratuito, formal e ato causal. Não importa se existir a imposição de encargo, será sempre unilateral e gratuito (o núcleo obrigacional fica sempre no polo do doador).
Formal pois normalmente exige-se a forma escrita, entretanto, a forma verbal também é possível (como exceção).
Ato causal porque gera a obrigação de transferir, funcionando como causa da translação do bem ou vantagem, mas, como todo contrato, não transfere por si só o domínio. Isso somente acontece através da tradição (móveis) ou da transcrição (imóveis).
Art. 539. O doador pode fixar prazo ao donatário, para declarar se aceita ou não a liberalidade. Desde que o donatário, ciente do prazo, não faça, dentro dele, a declaração, entender-se-á que aceitou, se a doação não for sujeita a encargo. 
O silencio do destinatário da proposta poderá significar aceitação (presumida). Nos contrários onerosos o silencio não significa aceitação. 
Para que isso aconteça será preciso que se esteja diante de uma doação pura e simples, ou seja, aquela que não se impõe um dever ao donatário. 
Art. 540. A doação feita em contemplação do merecimento do donatário não perde o caráter de liberalidade, como não o perde a doação remuneratória, ou a gravada, no excedente ao valor dos serviços remunerados ou ao encargo imposto.
Doação feita em contemplação significa feita em consideração ao mérito do donatário. Ex.: alguém é salvo de um incêndio por um terceiro e resolve fazer uma doação de uma casa a esse terceiro. Embora seja uma doação pura e simples, é uma subespécie, porque se chama doação por mérito. O mérito é pessoal e não econômico. É totalmente uma liberalidade.
Doação remuneratória é aquela que o doador faz para reconhecer serviços prestados, de conteúdo econômico, que não podem ser cobrados pelo donatário ou que o donatário não quis cobrar. O que motiva a doação não é o apreço (embora ele possa existir), o que predomina é a ideia de recompensar o sujeito.
Se o que motiva a doação é o apreço, trata-se de doação pura e simples. Se o que motiva é o mérito, doação feita em contemplação (meritória). Se feita para recompensar, remuneratória.
Art. 541. A doação far-se-á por escritura pública ou instrumento particular. 
Parágrafo único. A doação verbal será válida, se, versando sobre bens móveis e de pequeno valor, se lhe seguir incontinenti a tradição.
Predomina a ideia de forma (é a regra). O parágrafo único traz a opção de doação verbal (exceção), mas limita aos casos de bens móveis de pequeno valor e de tradição imediata.
Incontinenti: imediatamente.
No caso do pequeno valor, o parâmetro é o senso comum, e não o patrimônio do doador. 
Art. 542. A doação feita ao nascituro valerá, sendo aceita pelo seu representante legal.
Nascituro: ser humano em desenvolvimento no útero materno. 
É possível fazer doação ao nascituro. 
OBS: não será possível impor encargo aos pais do nascituro, visto que o donatário é o próprio nascituro. Também não é possível impor encargo a qualquer terceiro senão o donatário, independente de ser nascituro ou não.
Pode ser questionada a recusa imotivada, já que se presume que o nascituro aceitaria, se pessoa fosse, e se pessoa jurídica tivesse.
Ex.: Se o pai disser não, a recusa poderá ser questionada pelo outro representante legal.
Art. 543. Se o donatário for absolutamente incapaz, dispensa-se a aceitação, desde que se trate de doação pura.
Via de regra, o absolutamente incapaz é representado pelo seu representante legal. 
A saída é considerar que há uma presunção de aceitação por parte do donatário absolutamente incapaz. Essa presunção só poderá ser derrubada mediante ação proposta por se representante ou MP, comprovando desvantagem do conteúdo econômico da doação formulada.
Nas doações com encargo, não se presume a aceitação, valendo a regra geral de que a aceitação ocorre por meio do seu representante legal.
OBS: para que um absolutamente incapaz seja doador é necessário determinação judicial e parecer do MP.
Art. 544. A doação de ascendentes a descendentes, ou de um cônjuge a outro, importa adiantamento do que lhes cabe por herança.
Ascendentes a descendentes: de cima para baixo (mãe para filha). 
Adiantamento é chamado de legítima, pois é a porção hereditária que cabe àquela pessoa.
É considerada antecipação de herança. Ou seja, quando morrer a mãe que doou a um dos filhos sem doar aos outros, o bem que ela doou voltará ao seu patrimônio para ser redistribuído a todos os outros.
Art. 545. A doação em forma de subvenção periódica ao beneficiado extingue-se morrendo o doador, salvo se este outra coisa dispuser, mas não poderá ultrapassar a vida do donatário.
Subvenção periódica: doação de 1.000 reais por mês durante 10 anos. É uma doação que vai sendo cumprida periodicamente. Qualquer doação que implique na prestação periódica, em frações que se projetam no tempo.
Morto o donatário, acaba a subvenção periódica. Os herdeiros não possuem direito às prestações vincendas. 
Art. 546. A doação feita em contemplação de casamento futuro com certa e determinada pessoa, quer pelos nubentes entre si, quer por terceiro a um deles, a ambos, ou aos filhos que, de futuro, houverem um do outro, não pode ser impugnada por falta de aceitação, e só ficará sem efeito se o casamento não se realizar
A aceitação se dá de forma tácita, pois consolidando-se o casamento, aceita-se a doação
O donatário não diz sim, mas age como quem diz sim. Ex.: Maria recebe uma doação porque casará com João. Casando, ela aceitou. 
Não se pode depois questionar essa doação por falta de aceitação. Só não produzirá efeitos se a condição suspensiva não acontecer (no exemplo, se o casamento não acontecer).
Art. 547. O doador pode estipular que os bens doados voltem ao seu patrimônio, se sobreviver ao donatário. Parágrafo único. Não prevalece cláusula de reversão em favor de terceiro.
Cláusula de reversão. Reverter significa voltar ao originalmente traçado.
A reversão traz a ideia que o bem voltará ao doador.
Ex.: João doa uma casa para Maria. Na escritura fazem constar cláusula de reversão. Se João gosta da Maria, mas não gosta dos filhos dela, essa cláusula facilita, incentiva a doação. Em razão disso, essa cláusula permite que João leve adiante seu intento de beneficiar Maria, sem correr o risco de que seus inimigos sejam proprietário do bem, por serem herdeiros da Maria. 
Entretanto, não se aplica a cláusula nas hipóteses de que o bem irá para terceiros se o donatário morrer antes do doador. Nesse caso, seria uma cláusula de destinação do bem doado, e não de reversão. 
Art. 548. É nula a doação de todos os bens sem reserva de parte, ou renda suficiente para a subsistência do doador.
Balizadores, cláusulas de barreira para a doação e para o testamento.
Esse artigo trata da doação universal. Aqui, o legislador imagina que a pessoa para chegar a esse ponto, ou está fora da razão, ou ignora por completo e extensão da sua conduta, ou está compelido por alguém que se aproveita da sua situação (idade avançada, por ex.)
O legislador taxa de nula a doação de todos os bens do doador sem reserva de porção, ou que não tenha renda para subsistir. Ex.: juiz aposentado com renda de 30 mil/mês doa todos seus bens (10 casas). Nesse caso, não é nula,visto que ele possui renda suficiente para subsistir. Outro seria o raciocínio se sua renda viesse das casas.
O mais lógico é que a nulidade alcance apenas o tanto necessário para que o doador ainda tenha renda, mantendo-se as doações que podem ser mantidas, até que se garanta ao doador o suficiente para que viva de maneira digna.
O que importa é que a doação universal é nula. Inclusive, quem tem herdeiros necessários não poderá doar mais que 50% do que tiver na doação. Ou, qualquer pessoa não poderá testar mais do que 50% do que tiver no dia da sua morte. 
Esse artigo só tem preocupação com o doador.
Art. 549. Nula é também a doação quanto à parte que exceder à de que o doador, no momento da liberalidade, poderia dispor em testamento. 
O art. 549 trata da doação inoficiosa. Esse artigo tem preocupação com os herdeiros.
Art. 550. A doação do cônjuge adúltero ao seu cúmplice pode ser anulada pelo outro cônjuge, ou por seus herdeiros necessários, até dois anos depois de dissolvida a sociedade conjugal.
Preocupação jurídica associada a uma preocupação ética. Mas primordialmente de natureza econômica.
Art. 551. Salvo declaração em contrário, a doação em comum a mais de uma pessoa entende-se distribuída entre elas por igual. 
Parágrafo único. Se os donatários, em tal caso, forem marido e mulher, subsistirá na totalidade a doação para o cônjuge sobrevivo.
No silêncio do instrumento constitutivo, a fração ideal de cada donatário em comum é de porção igual. Para que sejam desiguais, é necessário que aconteça a discriminação de cada porção no contrato.
No caso de doação para casados, o primeiro que morrer deixará para o sobrevivente a fração que era titular. Ex.: eu doo para um casal, e após, um deles morre. A parcela pertencente ao falecido irá para o cônjuge sobrevivente.
OBS: não se trata de herança, mas sim direito de acrescer. Direito de incorporação de uma fração patrimonial ao sobrevivente por força de lei. Obviamente que no contrário pode ser colocada outra solução, dizendo, por exemplo, que com a morte de um deles não há direito de acrescer ou retorna para o doador. 
Art. 552. O doador não é obrigado a pagar juros moratórios, nem é sujeito às consequências da evicção ou do vício redibitório. Nas doações para casamento com certa e determinada pessoa, o doador ficará sujeito à evicção, salvo convenção em contrário. 
“Cavalo dado não se olha os dentes”. Tendo em vista que a doação é uma liberalidade, um benefício, não há o que reclamar. 
Apenas a doação em contemplação de casamento futuro estará sujeita à evicção. Ex.: doo para Maria uma casa porque ela vai casar com o João. Ela casou e recebeu o bem. Após, vem um terceiro e através da usucapião toma a casa da Maria. Nesse caso, Maria, que perdeu o bem por evicção, pode voltar-se contra o doador. 
Os contratos benéficos são interpretados de forma restritiva, ou seja, com o menor ônus ao doador.
Art. 553. O donatário é obrigado a cumprir os encargos da doação, caso forem a benefício do doador, de terceiro, ou do interesse geral. 
Parágrafo único. Se desta última espécie for o encargo, o Ministério Público poderá exigir sua execução, depois da morte do doador, se este não tiver feito.
É pressuposto para o recebimento da coisa doada o cumprimento do encargo. Encargo aproxima-se de condição, seja ela resolutiva ou suspensiva. 
Interesse geral: ex.: faço a doação de uma casa ao município desde que ali funcione uma creche.
No caso do interesse geral, o MP pode exigir a execução do encargo, enquanto representante dos interesses da coletividade, caso não tenha sido feita pelo donatário.
Art. 554. A doação a entidade futura caducará se, em dois anos, esta não estiver constituída regularmente. 
Ex.: doo uma casa para a fundação destinada à proteção de crianças carentes, cuja constituição está prevista pelo ato tal. 
Entretanto, a PJ tem que ser constituída em até dois anos, caso contrário a doação caducará, ou seja, perderá a validade.
DA REVOGAÇÃO DA DOAÇÃO
Ao contrário do que acontece com os contratos em geral, a vontade unilateral na doação pode romper a contratação feita.
Art. 555. A doação pode ser revogada por ingratidão do donatário, ou por inexecução do encargo.
a. Inexecução do encargo: descumprimento do contrato. Seria o mesmo que não pagar o preço na compra e venda, entretanto lá não é revogado o contrato, mas sim desfeito. 
A ideia do legislador é agilizar o desfazimento da doação.
b. Ingratidão do donatário: o donatário tem uma obrigação perpétua de gratidão em relação ao doador. Evidentemente que o donatário não precisa rastejar perante o doador. A ingratidão é caracterizada naquelas situações que o legislador prevê taxativamente (numerus clausus). 
Art. 556. Não se pode renunciar antecipadamente o direito de revogar a liberalidade por ingratidão do donatário. 
Ex.: não pode o donatário renunciar antecipadamente o direito de receber o automóvel doado, porque é da natureza da doação a entrega do bem. 
É da natureza do contrato de doação que o sujeito possa revogar por ingratidão.
Art. 557. Podem ser revogadas por ingratidão as doações:
I — se o donatário atentou contra a vida do doador ou cometeu crime de homicídio doloso contra ele; 
II — se cometeu contra ele ofensa física; 
III — se o injuriou gravemente ou o caluniou; 
IV — se, podendo ministrá-los, recusou ao doador os alimentos de que este necessitava.
Inciso I: somente homicídio doloso, não cabendo o homicídio culposo.
Inciso II: ofensa física pode ser lesão corporal, seja leve ou grave, inclusive vias de fato. 
Inciso III: quanto a calúnia, não há dúvida, dependendo apenas de uma condenação criminal do donatário por calúnia. Entretanto, a injúria precisa ser grave. Assim, havendo agravantes penais no tipo penal da injúria, ela será considerada grave. 
Inciso IV: trata dos alimentos naturais, não de pensão alimentícia.
Art. 558. Pode ocorrer também a revogação quando o ofendido, nos casos do artigo anterior, for o cônjuge, ascendente, descendente, ainda que adotivo, ou irmão do doador. 
Amplia o leque das vítimas do artigo anterior, abarcando também essas pessoas como fonte de ingratidão.
 Art. 559. A revogação por qualquer desses motivos deverá ser pleiteada dentro de um ano, a contar de quando chegue ao conhecimento do doador o fato que a autorizar, e de ter sido o donatário o seu autor. 
O ano de decadência parte do momento em que o doador souber do fato e souber quem é o autor.
OBS: Não esperem pela sentença criminal para o ajuizamento de qualquer ação cível. Enquanto a ação cível depender desse pronunciamento, não flui o processo de decadência ou prescrição. 
Art. 560. O direito de revogar a doação não se transmite aos herdeiros do doador, nem prejudica os do donatário. Mas aqueles podem prosseguir na ação iniciada pelo doador, continuando-a contra os herdeiros do donatário, se este falecer depois de ajuizada a lide.
Não podem ajuizar, exceto na hipótese do homicídio doloso. Podem apenas prosseguir na ação já iniciada.
Art. 561. No caso de homicídio doloso do doador, a ação caberá aos seus herdeiros, exceto se aquele houver perdoado. 
Art. 562. A doação onerosa pode ser revogada por inexecução do encargo, se o donatário incorrer em mora. Não havendo prazo para o cumprimento, o doador poderá notificar judicialmente o donatário, assinando-lhe prazo razoável para que cumpra a obrigação assumida.
Onerosa: com encargo.
Não é necessário que o donatário se recuse a cumprir o encargo, bastando que se configure a mora.
Art. 563. A revogação por ingratidão não prejudica os direitos adquiridos por terceiros, nem obriga o donatário a restituir os frutos percebidos antes da citação válida; mas sujeita-o a pagar os posteriores, e, quando não possa restituir em espécie as coisas doadas, a indenizá-la pelo meio termo do seu valor
Revogação de ingratidão, na qual a disputa foi instalada entre doador e donatário, o terceiro não tem a ver com a situação, não é ingrato. Entretanto, caso se comprove que o terceiro estava em conluio com o donatário, estará configurada a má-fé.
Ex.: Maria aluga a casa doada.Até o dia da citação, os alugueis recebidos pelo donatário não precisam ser restituídos. Após a citação, terão que ser entregues ao doador caso a demanda seja perdida. 
Meio termo do seu valor: pela avaliação média que a casa tiver no dia da restituição. Buscam-se cotações e faz-se uma média, sendo esse o valor da indenização.
Art. 564. Não se revogam por ingratidão: I — as doações puramente remuneratórias; II — as oneradas com encargo já cumprido; III — as que se fizerem em cumprimento de obrigação natural; IV — as feitas para determinado casamento. 
Inciso I: porque nessas o donatário fez jus ao recebimento do benefício. 
Inciso II: se o encargo estiver pendente de cumprimento, a doação pode ser revogada por ingratidão. Inclusive, não pode o donatário cumprir o encargo nesse momento posterior ao fato que ocasionou a revogação por ingratidão.
Inciso III: decorrem da própria natureza do acontecimento. Sendo natural, não é possível pedir o dinheiro de volta. Ex.: dívida de jogo que não foi paga, mas “compensada” com a doação de um bem. Ela não é revogável por ingratidão, uma vez que havia uma causa jurídica sustentando a causa da doação.
Inciso IV: a pessoa para receber basta que case, ou seja, casando, recebe a doação. Se não casou ainda, e houve a ingratidão, é possível a revogação.

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