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Trabalho sobre o livro "A integração do negro na sociedade de classes"

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3
SUMÁRIO
	
	
	1 CONTEXTUALIZAÇÃO............................................................................
	04
	1.1 SOBRE O AUTOR..............................................................................
1.2 SOBRE A OBRA.................................................................................
1.3 METODO SOCIOLÓGICO UTILIZADO..............................................
	04
05
05
	
2 RESUMO DA OBRA.................................................................................
2.1 O NEGRO NA EMERGENCIA DA SOCIEDADE DE CLASSES.....
2.2 PAUPERIZAÇÃO E ANOMIA SOCIAL.............................................
2.3 HETERONOMIA RACIAL NA SOCIEDADE DE CLASSES.............
	
05
05
12
34
	
	
	3 CRÍTICAS..................................................................................................
	45
	
	
	4 RELAÇÃO COM O DIREITO BRASILEIRO.............................................
	46
	
	
	REFERÊNCIAS ...........................................................................................
	48
	
	
	
	
	
	
1 CONTEXTUALIZAÇÃO
1.1 SOBRE O AUTOR
Nascido em 1920 no estado de São Paulo, Florestan Fernandes foi um dos mais importantes sociólogos brasileiros. Desde criança, o renomado autor teve muito interesse nos estudos, e começou o curso de ciências sociais no ano de 1940 na Universidade de São Paulo (USP). Despois de cursar o mestrado na Escola Livre de Sociologia e Política, Florestan voltou a USP para fazer o doutorado.
Lecionou na USP, até o período da ditadura militar, quando foi aposentado compulsoriamente pela ditadura militar em 1969, foi Visiting Scholar na Universidade de Columbia, professor titular na Universidade de Toronto e Visiting Professor na Universidade de Yale e, a partir de 1978, professor na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Em 1986 foi eleito deputado constituinte pelo Partido dos Trabalhadores, tendo atuação destacada em discussões nos debates sobre a educação pública e gratuita. Em 1990, foi reeleito para a Câmara.
Florestan começou a escrever no final dos anos 40, e ao longo de sua vida, publicou mais de 50 livros e centenas de artigos. Algumas de suas principais obras foram: Organização social dos Tupinambás (1949), Mudanças sociais no Brasil (1960), A integração do negro na sociedade de classes (1964) e Poder e Contrapoder na América Latina (1981). Em suas análises, apropriou-se de variadas perspectivas do marxismo clássico e moderno.
Em seu legado como sociólogo e professor universitário, com mais de cinquenta obras publicadas, ele transformou o pensamento social no país e estabeleceu um novo estilo de investigação sociológica, marcado pelo rigor analítico e crítico, e um novo padrão de atuação intelectual.
Florestan morreu em 1995, devido à problemas no fígado.
2.2 SOBRE A OBRA
Em sua obra, A integração do negro na sociedade de classes, Florestan tem como principal objetivo desconstruir o mito da democracia racial no Brasil. Apresentando vários depoimentos de pessoas que conviveram na época, além de dados coletados e analisados pelo sociólogo, ele revela as condições de vida do negro, e as ideologias da raça dominante que levaram à posição desfavorecida na sociedade de classes.
2.3 MODELO TEÓRICO METODOLÓGICO
O modelo teórico metodológico adotado por Florestan Fernandes é sociológico, sendo explicação multicausal, isso porque, o autor, em sua analise, foca em inúmeras causas para explicar o “problema negro” na cidade de São Paulo. Além disso, o autor utiliza de bases metodológicas Marxistas, ou seja, ele considera a economia como um fator primordial como causa de fenômenos sociais. 
2 RESUMO DA OBRA
2.1 O NEGRO NA EMERGÊNCIA DA SOCIEDADE DE CLASSES
2.1.1 Trabalho livre e europeização
A análise do contexto paulista, no século XIX, se dá devido a expansão urbana ocorrida na grande metrópole, que foi introduzida com a ajuda da lavoura cafeeira. Dessa forma, a escolha da cidade não se deu de forma aleatória, ou por apenas ser um grande centro de crescimento demográfico acelerado, no entanto por ter sido o lugar da que se passou a revolução burguesa.
Assim, os dados demográficos pertinentes ao começo do século XIX revelam que o elemento negro e mulato, escravo ou livre, constituía aproximadamente 54%da população local[footnoteRef:1]. Assim, esses dados foram diminuindo no decorrer das décadas, e enquanto a população de estrangeiros foi aumentando relativamente de forma exponencial. A situação demográfica dos estrangeiros passou de 922 indivíduos (ou 3%), em 1854[footnoteRef:2], para 12.085 indivíduos (ou 25%), em 1886[footnoteRef:3]. [1: Bastide, R. e Fernandes, F.] [2: Ibid., p.41.] [3: Ibid., p.41.] 
É possível, afirmar que os pretos e pardos, produziram duas tendências fundamentais: sendo a primeira, que foi a expansão agrícola concorreu para o deslocamento para área mais próxima do interior. A Segunda foi um movimento resultante de negros e mulatos libertos, vindo do interior em busca de trabalho livre. E a terceira se deu pelo o acréscimo rápido da população branca, principalmente devido à vinda de imigrantes para cidade.
Nesse contexto, é notório que após a abolição da escravidão em 1888, a população branca vou crescendo, e ainda mais pela a entrada do imigrante que em termos de organização de trabalho, passou a ser agente de excelência do trabalho livre. Desse modo, os nacionais que se declaravam brancos perfaziam 44.258 indivíduos, existiam até mais imigrantes italianos na cidade que brasileiros natos, como se depreende da seguinte relação. [footnoteRef:4]Em relação aos negro e mulatos comparados com os estrangeiros, era inversamente proporcional, de forma que onde tinha maior concentração do elemento negros, era mínima a presença de estrangeiros. [4: Ibid. pp. 71 e 72] 
Com isso, o negro foi sendo eliminadas as posições que ocupavam no artesanato, no comércio de miudezas e de serviços, sendo realocados a atividades brutas e mal retribuídos, pois “não serviam para outra coisa” ao contrário do competidor mais preparado e eficiente o “estrangeiro”. Igualmente, o estrangeiro era visto como a grande esperança nacional, era o que poderia fazer o progresso econômico.
Diferentemente do negro, o imigrante repelia as condições de vida que não fossem decentes, ou seja, não se sujeitando aos patrões deformados pelo regime servil, mas cumpria as obrigações decorrentes do contrato de trabalho, e ainda mais tinha um diferencial que era converter sua força de trabalho em poupança a fim de conseguir a ascensão econômica no mercado. Desse modo, o negro e mulato não administravam de forma adequada sua liberdade assim fazendo com que eles tomassem certas decisões por serem livres, como a recusa de certas tarefas e serviços, a inconstância na frequência de trabalho, a tendência de alternar períodos de trabalho regular com fases longas, a agressividade contra a supervisão organizada do serviço, e a ausência de incentivos para fazer do trabalho assalariado uma fonte de independência. Essas e outras atitudes fizeram com que a população do elemento negro diminuísse dentro da sociedade.
Dessa forma, essa resistência e dificuldade para lidar com a nova situação, acabavam achando dificuldades para lidar no mercado, além da pouca oportunidade, e isso fazia com que eles voltassem à situação de regresso da época da escravidão como Escreve Evaristo de Morais: “O escravo, em regra, não ia para longe [...] Retirava-se, ás vezes, somente, da fazenda em que sofrera coação e os rigores do cativeiro; fugia, apenas, á senzala, que tão dolorosas recordações lhe traziam. Dirigia-se a outra fazenda próxima e procurava contratar seus serviços”[footnoteRef:5]. E tal situação se repetia no período de pós-abolição, como em algumas regiões em decadência econômica ou com falta de braços, os antigos escravos se conservaram trabalhando nas fazendas, como assalariados, com exceção em alguns casos como os artesãos que se deslocavam para cidades próximas com a ajuda econômica dos antigos senhores; onde havia mão de obra abundanteraramente os libertos que [5: MORAES, E. De. A Campanha abolicionista (1879-1888), p.30] 
abandonaram as fazendas foram readmitidos, porque muitas vezes os fazendeiros os mandaram embora e colocavam no lugar um estrangeiro; E os comportamentos dos antigos libertos e negros foi encarado com ingratidão pelos fazendeiros, assim gerava um ressentimento inesquecível.
O Correio Paulistano da época se pronunciava sobre o significado do escravo e do imigrante, como sendo o escravo imprestável e devendo ser substituído pelo imigrante que seria mais eficiente e iria cooperar melhor a produção.
Logo, a abolição foi revolucionária para o período porque proporcionou uma seríe de direitos e deveres fundamentais aos libertos, mesmo positivada, foi letra morta por muito tempo. E para os trabalhadores brancos, estrangeiros ou nacionais a dependência do poder relativo das partes, assim com a eficácia do contrato. Por outro lado, os negros sem as garantias de reparação materiais e morais, a abolição significava uma eliminação do mercado competitivo.
2.1.2 O Negro e a revolução burguesa
A revolução burguesa se aspergiu nas zonas de crescimento econômico, demográfico e social acelerado. Ela surge e se organiza em uma época que já se podiam comercializar internamente várias fases e proventos do processo de exportação. Dessa forma, se projeta diretamente na revitalização dos núcleos urbanos com funções econômicas específicas no processo, impelindo os fazendeiros a intervir nos negócios políticos, comerciais e do café. Assim, não é a burguesia que sustentava a base econômica e política da sociedade, mas os fazendeiros que eram agentes da comercialização e exportação do café. Era necessário, um novo sistema de produção que fosse equiparado ao campo ou as tornassem independentes dele, tal condição só ocorre depois de meio século depois da abolição, assim se instalou o coronelismo como equivalente e substituto da nobreza agrária. Desse modo, o regime se configura para uma sociedade de classes com estratos dominantes e só era aberta para aqueles que tinha poder ou participassem das concentrações regional da renda.
A desintegração da sociedade estamental e de castas não favoreceu socialmente, os negros, pois converte em elementos residuais do sistema social.
O escravo e o liberto interferem na desagregação do sistema de castas, é o índice de participação revolucionária. Em consequência, a colaboração era vista como um combustível indispensável para a aceleração do sistema escravista.
Assim, o colono por sua vez, intervém em três níveis distintos do processo de consolidação e de renovação do capitalismo. Primeiro como agente do trabalho livre que se comportava como o assalariado típico e repelia relação patrimonialista. Já o segundo, como agente transplantador de novas ideias e técnicas da atividade econômica. E o terceiro, como propulsor da acumulação capitalista com base na poupança do criador direto que poderia ser tanto no campo quanto na cidade.
Nesse aspecto, o que se deve saber para análise da posição do negro e do mulato na ordem econômica e social emergente, é que eles foram marginalizados, excluídos, como categoria social, das tendências modernas de expansão do capitalismo em São Paulo. Os outros polos desse processo socioeconômico se encontravam, ou em círculos sociais das camadas dominantes, ou no seio das grandes levas imigratórias vindas da Europa.
Logo, o negro e o mulato iriam passar da condição de escravos para a estratégia para a conquista das posições que deveriam ocupar na sociedade, e que se deu pelo fortalecimento progressivo da ordem social competitiva. Desse modo, a pulverização por que passaram a população negra em São Paulo teve efeitos produtivos. Porque, constituía de forma assumida ecológica, econômica e socialmente pela incorporação dessas populações à plebe rural e urbana. Por outro lado, se erigia em condição prévia para a emergência e a gradual consolidação dos mecanismos psicossociais que promoveram mais tarde a socialização do negro no meio negro.
2.1.3 Expansão urbana e desajustamento estrutural do negro
Com a concentração de negros na cidade de São Paulo foi o fato de ela exercer enorme atração para grupos demográficos ou étnicos migrantes. Dessa forma, se transformou em um dos centros urbanos que iriam polarizar as descontroladas migrações de massas negras após o fim do regime escravo.
De acordo com as análises de três grupos demográficos da população paulista da época, a população negra é a que mais apresenta um índice de crescimento mais baixo. O grupo de imigrantes brancos foi aquele que demostrou crescimento mais expressivo, eles foram o grupo que influíram em massa para a cidade de São Paulo para tentar mudar de rumo. O negro e o mulato também acompanharam essa tendência, porém aventuraram-se várias hipóteses para explicar essa diferença de progressão. A explicação para a diferença na mobilidade horizontal da massa negra é que ao se deparar com o grande número de imigrantes, a população negra mais entrosada às ocupações artesanais e aos serviços urbanos se deslocou para outras cidades paulistas ou brasileiras, para que pudesse encontrar melhores oportunidades.
A mulher adentrou ao mercado de trabalho com mais facilidade devido a adaptação ao ajustamento ao trabalho livre, isso se deu pelo fato de, nas zonas urbanas, os serviços domésticos não envolviam a mesma degradação do que aqueles que trabalhavam no campo. E existiam várias condições que favoreciam a estabilidade da “mulher negra” como e enquanto serviçal doméstica. Desse modo, a mulher vai contar com agente de trabalho privilegiado, por sua ocupação ser meio de vida. Dessa forma, a insegurança e a insatisfação do negro e do mulato não provinham apenas das condições materiais e da crise provocada pela quebra de sua integração ao mundo social dos brancos. Com a dificuldade de arrumar emprego dos homens a dependência econômica da mulher foi aceita. Com isso, muitos homens se entregaram a ociosidade e descobriram o convívio com outros homens a mesma situação, e um fizeram um ótimo passatempo. Como em reuniões em pequenos grupos d esquina, concentração em botequins. E muitos de seus maridos percebendo que a mulher conseguia tirar a sua subsistência passam não querer trabalhar e ficar sustentado por seus cônjuges. Assim, por não buscarem trabalho surgiram alguns termos pejorativos como “vagabundo” “cacheiro” que foram atribuídos de maneira à perpetuar nos dias atuais.
O fascínio das “levas negras” a cidade é necessário para entender a sua importância para o processo de desagregação do regime escravocrata. Não sendo apenas, pelo fato de naquele ambiente, existirem atividades menos degradadas pelo trabalho escravo, ou que possibilitavam maior renda ou dignidade. Desse modo, a cidade se afirmava como um símbolo de progresso e liberdade. Os migrantes tinham a ideia de que, simplesmente por viver nela, parecia que se livrariam de forma mais rápida da ideia do estado escravo ou do liberto. Contudo, a realidade era outra o negro não encontrou em São Paulo as vantagens típicas das grandes cidades, mas um isolamento cultural, tolerância e emprego em massa. Como não contavam com as vantagens das cidades pequenas, propriamente rurais para a estabilidade social, as concepções tradicionalistas e as compensações da economia de subsistência.
É possível ainda reduzir a três os imaginários que imperavam, no período escravocrata, aos ajustamentos dos libertos ao trabalho livre. Sendo o primeiro, é a noção de que a liberdade significada plena disposição da pessoa sobre ela própria, que na prática dava a cada pessoa a escolha de trabalhar aonde, como e quanto quiser. A segunda é a representação de que a dignidade do homem livre é incompatível com a realização de trabalhos degradantes. E a terceira é a questão do princípio pré-capitalista que diz que a dedicação ao trabalho deve ser regulada conforme as necessidades de consumo ao indivíduo com seus dependentes.
O apego ao tradicionalismo tanto dos brancos e dos negros era visível, poispara os brancos os libertos não possuíam qualidades intelectuais para conduzir a própria vida, e enquanto não recebessem a orientação dos seus antigos senhores iriam ter que pagar um preço pela a liberdade. Muitos brancos pensavam que os negros eram mias felizes na época da escravidão porque tinha comida, roupa, casa e não trabalhavam tanto assim, e agora eles não sabem dirigir suas próprias vidas. Porque faltavam técnicas sociais e culturais doa ambiente. Por outro lado, os abolicionistas, defendiam a ideia deviam dar liberdade aos negros para andarem com seus próprios pés. E outra forma, foi a cruzada democrática que se empenhou Antônio Bento e alguns raros colaboradores depois da abolição, de caráter irracional e tradicionalista dividido em dois pontos: Primeiro, que afirmava que o salto para diante do negro seria pela a organização de cursos ou a fundação de escolas destinadas aos libertos e a seus filhos, assim bastava alfabetizar o negro e prepara-lo intelectualmente, assim o ideal seria educar o negro. Já o segundo, seria um estado de espirito reacionário, a fim de promover campanha contra as instituições republicanas que e as autoridades que em nada auxiliava a integração do negro no regime de classes.
Muitos aspectos dificultaram a introdução do negro na sociedade como a repulsão que a cidade fez contra o escravo e o liberto, por não possuírem as condições psicossociais requeridas para a organização do horizonte cultural e da forma de se comportar em sociedade próprias do homem livre. Como a incapacidade relativa de sentir, pensar e agir socialmente, apesar da exclusão, aos pouco foi aprendendo a “ter cabeça” e a lidar com a liberdade de maneira menos destrutiva.
Logo, o desajustamento estrutural que conduz pela vitória paulatina do homem negro sobre si mesmo e sobre as adversidades do ambiente, assim é o período que o negro descobre que tudo era ilusão, e que o homem só conquista aquilo que ele for capaz de construir, socialmente, como agente da própria história
2.2 CAPÍTULO 2: PAUPERIZAÇÃO E ANOMIA SOCIAL 
2.2.1 Nota introdutória:
Segundo Florestan Fernandes o grande erro de outros estudiosos da temática do “meio negro”, assim como é chamado por ele, foi dar um enfoque muito grande aos campo factual dos problemas enfrentados pelos negros e mulatos e assim negligenciando o que o autor vê como mais fundamental que são as causas sociológicas para os distúrbios psicossociais e socioculturais, tratando tanto os aspectos qualitativos como os quantitativos, para o colapso da população negra na cidade. 
2.2.2: “O Déficit Negro”
Os negros e mulatos ficaram excluídos da sociedade, dos proveitos políticos por não tem condição de sustentar as regras, e partilhavam de um ideal em comum muitas vezes deletério que fez com o que, agravasse o estado de anomia social.
O crescimento econômico reduziu a população negra, primeiro o negro abandonava São Paulo, porque não estava se adaptando ao mercado de trabalho devido a grande concorrência eficiente, muito não sabiam lidar com a liberdade, por fatores como a falta de educação e desenvolvimento social. Dessa forma, o elemento negro possui caráter catastrófico, como o chamado “déficit negro” que uma expressão que se estabeleceu entre a situação social do negro ou do mulato e a pauperização. As condições de anomia social não só preservaram o nível de pobreza inicial da população negra, e converteu o pauperismo em um constante estilo de vida do negro.
Desse modo, considerando as diferenças entre as taxas de natalidade, natimortalidade e mortalidade de 1924 a 1927,bem como os coeficientes de
óbitos por tuberculose, lepra e sífilis em 1929, conflui pela inferioridade psicologia do negro e do mulato e que o desaparecimento de ambos do planalto é fatal “Tendo em conta a população total de cada zona sanitária, em relação a capital penso que os melânicos estão tendo um déficit anual de 4 a 5.000 indivíduos em todo o Estado, de onde o prognóstico de sua extinção daqui a 40 ou 50 anos .6 Nesse aspecto, as taxas de natalidade, natimortalidade e mortalidade são discrepantes devido a negligencia do registro das crianças que era mais intensa nas camadas populares, ao qual abrange mais negros e mulatos. E além disso, parece que os médicos sucumbiam , de maneira inversa aos efeitos do preconceito de cor, tendendo a identificar como “negros” pessoas que poderiam ser classificadas como “mulatas” no consenso geral.
No século XX, a tendência do branqueamento se acentuou, e cada vez mais a republica trazia imigrantes a fim de branquear a população pela a substituição do negro. Mesmo que seja impossível determinar o número de imigrantes que se estabeleceram na cidade, até o final do primeiro “quartel” do século XX foram pequenas as alterações das tendências demográficas. A população da cidade mantinha o forte crescimento demográfico causado pelo grande fluxo imigratório europeu. As correntes migratórias internas, que são aquelas que vêm das populações paulistas do interior do estado ou de outros estados, assumiram maior vulto. Porém, as correntes migratórias que poderiam exercer maior influência na modificação no padrão de composição demográfica com relação à cor só se intensificaram na cidade de São Paulo, a partir de 1925.
Logo, o imigrante ocupou o lugar do negro, se mostra que não foi possível para o negro uma competição com o imigrante, uma vez que a presença desse imigrante cooperou para um fator indireto de desalojamento do negro ou do mulato do sistema de produção, portanto também cooperou no desenvolvimento e perpetuação do estado de anomia social. Com isso, os grupos que não obtinham técnicas a favor de um bom posicionamento dentro da estrutura urbana, acabaram sofrendo de forma mais intensa os efeitos desfavoráveis da substituição populacional.
Florestan apresenta um quadro que dispõe de dados sobre a fecundidade feminina nos diversos grupos de cor. Após a analise do quadro, autor conclui que eles demonstram “que a intensidade da reprodução nos vários grupos de cor não se subordinam, aparentemente, a fatores fisiológicos raciais”. Ele salienta que a menor fecundidade das mulheres negras se explica porque na maioria das vezes elas ficam excluídas da reprodução, pela “desvantagem que sofre esse grupo na escolha conjugal”. E, além disso, a tendência de mortalidade infantil aumenta fortemente de um grupo para outro. Principalmente quando se trata das mulheres negras.
Quanto a mortalidade dos filhos segundo a cor, a pesquisa observou que “ela é máxima no grupo amarelo, menos no grupo branco e ainda menor no pardo e preto, em consequência dos níveis médios econômicos e sociais e da diferente distribuição territorial dos diversos grupos de cor”.
As descobertas de Mortara, de acordo com Florestan renovam os pontos de vista em que são analisados os problemas demográficos no Brasil, segundo a cor. E para o autor, o que mais interessa é a descoberta de que a “predominância numérica progressiva” dos brancos, não acontece porque há um decaimento nos números dos “não-brancos”. Mas, em razão da rapidez do “incremento natural” do cada grupo de cor. 
Florestan acredita que o olhar em torno do déficit negro na cidade de São Paulo no primeiro quartel do século XX. Ele diz que o fator de alarma ocorria, na ocasião por fatores normais, e que o abandono da cidade por ex-escravos e antigos libertos era natural. E, além disso, não há de se contestar que as condições de vida do negro tem sua parcela de culpa no declínio de nascimento e pelo aumento de óbitos.
Mas, para Florestan, uma coisa é clara: “o déficit negro parece ter encontrado corretivo constante e amplamente compensador na substituição de cotas de população negra e mulata da capital”. Um processo que se iniciou em 1884 e persistiu ao longo do desenvolvimento da cidade foram as migrações do interior para a capital, aumentando com a expansão industrial e a transformação de São Paulo em metrópole.
Mas, tratava-se de um movimento migratório modesto, que o total de 109.222 era inferior ao numero de italianos que entraramentre 1900-1904 e representava somente cerca de 5% dos imigrantes que foram para São Paulo. Somente entre 1925-1929 a corrente migratória iria atingir maiores níveis. Mas Florestan acredita que há uma razão para explicar o porquê o principal arsenal de renovação da população de cor se encontrava no interior do Estado e não em outras regiões do país: os serviços urbanos necessitavam de certa qualificação do trabalhador, e isso funcionava como um peneiramento que restringia a intensidade do fluxo de trabalhadores.
Para o autor, o que importa na presente analise é que o população de cor se renova, também, “pela incorporação de novos quadros humanos”. Esse fato merece atenção por duas razões: pelo seu significado demográfico e pelas suas implicações sociológicas. Quanto à primeira razão, as novas cotas foram suficientes para balancear três tendências: a mobilidade horizontal que desloca inúmeros indivíduos para o interior do Estado ou outras regiões; a perda do crescimento vegetativo, resultante das altas taxas de mortalidade e baixas de natalidade; os efeitos da mestiçagem. Quanto à segunda razão, o autor afirma que: “é inegável que a correção trazida pelas migrações internas tem sido de ordem meramente demográfica.” A composição qualitativa da população de cor não sofreu mudança significativa, continuam a ter uma grande quantidade de trabalhadores rústicos que se distanciam culturalmente do “munda da cidade”. Florestam conclui, então, que as condições morais e matérias da vida do negro perpetuam o déficit da população de cor, pois ele resulta da integração do negro como forças econômicas e sociais.
No Estado de São Paulo, a presença do imigrante mudou substancialmente o padrão demográfico vigente, e o negro e o mulato foram os que mais sofreram os resultados disso. A participação do imigrante de ambos os sexos na reprodução foi intensa na segunda década do século XX, e essa participação tinha de se refletir seja no aumento da população imigrante, seja no declínio da natalidade do nativo.
Mesmo que o crescimento da população imigrante, em cada parcela da população não tenha sido uniforme, os dados que demonstram a diferença da proporção de imigrantes em cada classe social podem evidenciar a rapidez do processo de substituição populacional com a imigração. Tinha-se em todos os níveis sociais uma elevadíssima proporção de descendentes de estrangeiros, como confirma os censos feitos na época.
Florestan, com as analisas feitas, chega a duas importantes considerações: 1- a migração rural-urbana do interior para a capital tem sido suplementada com migrações de outras localidades do Brasil para São Paulo. O autor diz a consequência disso: “a predominância dos elementos vindos do interior faz com que a homogeneização da população da cidade tome como ponto de referencia muito mais o padrão interno da população do estado de São Paulo, que a do Brasil como um todo”. Contudo, haverá um declínio na influencia dos imigrantes, embora ainda seja considerável nas próximas gerações. 2- as diferenças ligadas a padrões étnicos e nacionais de vida transplantados e às distribuições por idade ou por sexo inerentes ao processo imigratório tendem a se tornar menos efetivas.
Florestan afirma que essa discussão sobre a importância da imigração se relaciona de duas maneiras com essa parte do trabalho. Primeiramente porque as proporções e os efeitos da substituição populacional não afetaram da mesma forma as diversas camadas da população. Quando falamos do branco da plebe e do negro, nesse processo ocorreu de fato uma substituição strictu sensu, no caráter competitivo. O negro não conseguiu competir com o imigrante, no que se refere as condições de competição criadas pela expansão da economia capitalista. Portanto a presença do imigrante contribuiu para o “desalojamento” do negro no sistema de produção. Em segundo lugar, de acordo com as observações de Lowrie, evidencia-se que o grupo nativo sofreu um impacto que nem sempre foi neutralizado e absorvido satisfatoriamente. Eles não disponham dos meios favoráveis de ascensão dentro da estrutura urbana e acabaram sofrendo mais intensamente os efeitos da substituição populacional. Os negros faziam parte desse grupo, que estavam “menos preparados” para a expansão populacional
O Autor afirma que o essencial de tudo isso “não está nas proporções nem no teor aparentemente catastrófico do ‘déficit negro’, mas no que ele representa como índice demográfico de um ajustamento de caráter estrutural e persistente”. Desse modo, as situações econômicas, sociais e culturais do negro aparecem como regulador do crescimento vegetativo da população de cor.
2.2.3 OS diferentes níveis de desorganização social:
Florestan está preocupado em encontrar os fatores racionais, de cunho sociológico que levaram a pauperização, isto é, ao empobrecimento psíquico, cultural, político e social da população negra na cidade de São Paulo, no período do fim do século XIX até a terceira década do século XX.
Vale ressaltar aqui que a análise é feita com base na cidade de São Paulo, mas como afirma o próprio autor isso não significa que tal processo, em outros locais tenha ocorrido de modo diferente.
2.2.3.1 Urbanização, industrialização e imigração, chaves para a pauperização
Florestan parte da premissa que mesmo após o processo de urbanização e de industrialização massivos ocorridos nessa época, impulsionados pelos negócios do café, que expandiram a economia interna, a posição do negro e do mulato no sistema de relações econômicas e sociais não foi alterada de forma notória.
Isso por que, os mesmos estavam em plena transição da posição de escravo para a de liberto, com a assinatura da Lei Áurea em 1888, abolindo a escravidão no Brasil, dessa forma os negros e mulatos se encontravam completamente desfavorecidos pelos novos crivos socioeconômicos de peneiramento profissional e, por consequência, totalmente incapazes de assimilar os novos padrões de vida, se convertendo rapidamente em uma população em desorganização social crônica.
Florestan aponta que não só o negro e o mulato se encontravam em um momento de transição, mas na verdade toda a sociedade, visto que os fenômenos da urbanização, da industrialização e com destaque para imigração, fomentados pela alta do café, encabeçaram mudanças drásticas na sociedade da época. 
Dentre tais mudanças, como dito anteriormente a cidade vai ganhando notável autonomia sobre o campo e o protagonista das relações econômicas deixa de ser o fazendeiro e passa a ser o capitalista típico, ou seja, o detentor dos meios de produção, caracterizando dessa forma a transição da grande lavoura para uma economia capitalista diferenciada. 
Tal transição é muito benéfica para alguns e extremamente prejudicial para outros. Com esse processo de industrialização os detentores dos meios de produção, isto é, os donos das empresas se beneficiaram muito e junto deles os operários que tiveram diversas oportunidades de empregos. 
Porém um dos problemas apontados por Florestan é que os negros e mulatos não faziam parte desse grupo de operários, ou se faziam eram de formas ínfimas, isso por que se temia sua falta de preparo técnico, se valorizava preferencialmente o trabalhador estrangeiro, ou seja, os imigrantes também por que muitas vezes os negros e mulatos se retraíam, procurando oportunidades de trabalho mais acessíveis, nos setores menos favorecidos do conglomerado nacional, como por exemplo, nos “serviços de negros”, que eram os serviços pesados e arriscados para a saúde. 
Assim a “população de cor”, vivia de forma rústica, pré-capitalista e antiurbana, em total desacordo com o estilo de vida de um branco/imigrante no mesmo período. Isso contribuía para que o negro e o mulato não conseguissem absorver o “estilo urbano de vida” e entender suas nuanças, para poderem participar da ordem competitiva de mercado, sendo fadados ao que o autor chama de “isolamento disfarçado” do restante da civilização e de seus traços econômicos sociais e culturais, assim se ajustando de forma deficienteao mundo urbano, através da herança sociocultural transplantada do antigo passado rústico do “escravo” e do “liberto”. 
Todos esses fatores levavam a um ponto: a desorganização imperante no meio social, somada aos bloqueios presentes nos caminhos de autoafirmação, levavam o negro e o mulato de forma trágica, porém natural a aprendizagem na área do crime e do vício, visto que nas palavras do próprio autor: “os “serviços de negro”, consumiam o físico e o moral do agente de trabalho dando em troca parca compensação materiais e uma existência tão penosa quanto incerta”. Dessa forma o vagabundo, o ladrão ou a prostituta enfrentavam riscos bem menores e construíam um destino comparativamente melhor, sendo vistos até mesmo como “gente de sucesso”, comparados aos demais companheiros de sua raça. 
2.2.3.2 Os cortiços e a desorganização sexual 
Outro fator crucial para o fenômeno da pauperização do “meio negro” foi a condição de habitação e “moradia”, se assim podiam ser chamados os cortiços em que a maior parte da população negra vivia no inicio do século XX. 
Tais locais abrigavam os negros em condições anti-higiênicas e eram mal ventilados, mal iluminados e com pequeno espaço útil, abrigando dezenas de pessoas, da mesma família (ou não), em pequenos quartos que eram separados por fracas paredes de madeirite. Essas condições de habitação foram cruciais para o surgimento de uma outra anomia social no “meio negro”, que foi a desorganização da vida sexual, fator esse que causou consequências muito prejudiciais aos negros, como a prática constante de atos de pedofilia, do incentivo e da prática do incesto, do estupro, de promiscuidades homossexuais e coletivas, levando contaminação de grande parte da população negra e mulata com doenças venéreas e o pior dos males que é a iniciação precoce das crianças e dos menores na vida sexual, dessa forma abrindo terreno fértil para prostituição da jovem negra em casos de necessidade por exemplo.
A explicação sociológica dada pelo autor para esse libido tão aguçado entre os negros é que o “sexo” se tornou a única área livre de exercício das aptidões humanas e numa esfera lúcida da cultura, assim este e as “atividades eróticas”, assumem dentro do contexto emocional, técnico e moral a função de proteção de algumas das associações mais profundas das tradições africanas. Em síntese: o “negro” foi despojado e excluído de tudo, menos do seu corpo e das potencialidades que ele abria à condição humana. 
O autor aponta a escravidão como a grande culpada pelos problemas descritos anteriormente, como a pedofilia, o incentivo e da prática do incesto, do estupro, de promiscuidades homossexuais e coletivas, visto que nesse período os negros eram impedidos de escolherem seus parceiros, as mulheres eram obrigas a praticas sexo com vários homens para fins reprodutivos apenas, dentre outros motivos elencados. Assim, quando a escravidão é abolida ocorre uma verdadeira explosão, o sexo se liberta, se extravasa com uma força incontrolável, impetuosa, avassaladora e destrutiva. 
Florestan não vê essa explosão da libido sexual com bons olhos, pois segundo ele, este foi um fator que precipitou e revitalizou os fatores de anomia da vida social dos negros e dos mulatos, pois ele retrai, e deturpa a absorção de novos padrões de comportamento, impedindo ou retardando o que vem a ser o ponto mais crucial para a desorganização social do “meio negro”, que é a não configuração da família equilibrada e integrada. 
2.2.3.3 A família como instituição central para a organização social
Segundo o próprio autor: 
A inexistência da família como instituição social integrada ou, então o seu funcionamento inconsistente, por estar se formando em condições sumamente adversas, é que vêm a ser, do ponto de vista sociológico, os elementos centrais.
 Isso não significa que se deva ignorar ou subestimar o desemprego, o alcoolismo, o abandono do menor, do velho e dos dependentes, a mendicância, a vagabundagem, a prostituição, as doenças e a criminalidade. Apenas que esses problemas sociais não devem ser encarados como “ as causas” da desorganização social imperante no “ meio negro “ e que se tampouco devem ser compreendidos como fenômenos isolados. [footnoteRef:6] [6: FERNANDES, Florestan. A integração do negro na sociedade de classes. São Paulo: Biblioteca Azul, 2008. p.182] 
Dessa forma Florestan argumenta que se os negros e mulatos tivessem encontrado meios mais rápidos de participação da herança sociocultural da comunidade inclusiva e, particularmente, se tivessem absorvido mais depressa seus modelos de organização da família, é muito provável que aqueles problemas sociais (o desemprego, o alcoolismo, o abandono do menor, do velho e dos dependentes, a mendicância, a vagabundagem, a prostituição, as doenças e a criminalidade) não se propagariam nem se perpetuariam nas mesmas proporções. 
Fernandes ainda ressalva que a influencia negativa dos problemas supracitados não caminhava na direção de desintegrar a família, mas no sentido inverso, de impedir sua rápida constituição e consolidação. 
2.2.3.4 Síntese dos problemas sociais que acarretavam na desintegração da família
2.2.3.4.1 O Desemprego
O problema do desemprego apresenta feições peculiares. A população negra não tinha garantia de emprego fixo como os brancos, por isso suas oportunidades de ganho eram em pequenos “serviços” de remuneração ocasional. Na verdade, o grosso das oportunidades de ganho da “mão de obra negra” se encaixava nessa rede de serviços, principalmente braçais e perigosos a saúde, com consequências funestas para os trabalhadores negros e mulatos.
De outro lado, mantinha-se acentuada resistência à aceitação do negro e do mulato em serviços que dependiam de tirocínio complexo e impunham um mínimo de iniciativa, de disciplina e de responsabilidade. Dizia-se que “o negro não nasceu pra isso”, “não foi feito para essas coisas”, por ser “volúvel”, “instável”, “indisciplinado” e também “por não possuir ambição como o italiano”. [footnoteRef:7] [7: FERNANDES, Florestan. A integração do negro na sociedade de classes. São Paulo: Biblioteca Azul, 2008. p.185] 
Florestan elenca três razões para a dificuldade do negro conseguir emprego, sendo elas: a falta de educação e preparo técnico dos negros em “como ser um trabalhador”, suas péssimas condições de moradia nos cortiços, que causavam doenças e sua má alimentação que causava fraqueza, além do caso do consumo ostensivo de bebidas alcoólicas e roupas, com o objetivo de “manter certas aparências”. 
Com a falta de ofertas e postos laborais, e a remuneração pífia dos “serviços de negros”, a dependência, a vagabundagem e a corrupção surgiam como alternativas preferíveis (até mesmo aceitáveis de ponto de visa moral) ao que assumia a aparência de uma escravidão não declarada, sem compensações atraentes e decisivas.
Assim, o desemprego constituía um fator radical de destruição do equilíbrio nas relações humanas, restringindo ou anulando os esforços voluntários dos negros e dos mulatos de se liberarem socialmente, através de uma fonte regular e permanente de trabalho e de ganho. 
2.2.3.4.2 O alcoolismo 
Por sua vez, o alcoolismo foi outro problema social do “meio negro”, mas que as análises de sua ocorrência têm sido exageradas e mal compreendidas. No cerne do problema não se encontram a massa de “bêbados inveterados” (como são chamados pelo autor, os negros que estão quase que totalmente mergulhados no alcoolismo) e sim as deficiências institucionais do “meio negro” (com destaque central para a família desestruturada) que não dispunha de mecanismos apropriados ao controle societário dos efeitos perniciosos do alcoolismo. Dessa forma gerando inúmeros problemas para os negros, que são marcados por três grandes pontos: o trabalho, as relações familiares e na diminuição de seu amor próprio.
Nas palavras do próprio Florestan:
Se a bebida, o jogo e as maquinações criminosas ganharam certo relevo, aqui e ali, isso não deve ser atribuído a uma predisposição incoercível, criada pela “naturezado negro” em situações grupal. Porém, às circunstâncias econômicas sociais e culturais, que barravam o caminho para outras modalidades de ocupação construtiva do ócio ou de utilização das aptidões para o trabalho. [footnoteRef:8] [8: FERNANDES, Florestan. A integração do negro na sociedade de classes. São Paulo: Biblioteca Azul, 2008. p.198] 
Infelizmente, muitos negros e mulatos acreditavam que a cor de sua pele se encontrava no centro de seus problemas como o alcoolismo, isso era causado pelos estereótipos espalhados pelos brancos, que ocasionavam comportamentos autopunitivos e atitudes voltadas contra o equilíbrio psicológico dos negros e mulatos, sendo que a degradação progressiva e a aniquilação são aceitas pelo individuo como uma “fatalidade” natural e, até certo ponto, justa e inevitável. 
Fernandes não via a bebida totalmente como algo ruim, pois ela foi uma espécie de canalizador para um fator socializador positivo no “meio negro”, que eram as reuniões dos negros nas esquinas, nos terrenos baldios, nos bares e botequins, algo que se converteu em um padrão cultural e que apesar de parecer simples, foi algo muito importante para os negros, visto que realizar tais reuniões adquiria o caráter de desafio e de uma autoafirmação grupal, gerando bons frutos como os movimentos sociais do “meio negro” e o desenvolvimento do samba por exemplo. 
Elas ofereciam, primordialmente, um mecanismo de autoproteção, que servia de base para manifestação e a realização repetida de ajustamentos ansiosamente desejados, independentemente e acima do álcool. Aos poucos, esses motivos foram passando para o plano secundário e outros centros de interesse ganharam o domínio do palco – como os jogos de azar ou maquinações criminosas do “negro malandro”[footnoteRef:9] [9: FERNANDES, Florestan. A integração do negro na sociedade de classes. São Paulo: Biblioteca Azul, 2008. p.196] 
2.2.3.4.2 O abandono do menor, do velho e dos dependentes
Em seguida, o autor apresenta outro grave problema causado pelo estado de anomia e de bloqueamento constante da entrada do negro na “sociedade inclusiva”, que era o abandono do menor, do velho e dos dependentes, sendo causado pela união de três fatores chaves, sendo eles: a desorganização da “família negra”, invariavelmente intensificada e agravada pelo intercâmbio sexual espúrio de negros, brancos e mulatos; a debilidade econômica e institucional do “meio negro” e a indiferença da sociedade inclusiva, que se manteve mais ou menos “cega” à gravidade dos problemas sociais do “negro” nessa área, reagindo diante deles através de mecanismos de controle de repressão ou de assistência ineficazes, corruptíveis ou desmoralizadores. 
Mais uma vez, a desorganização da instituição familiar é tratada como ponto fulcral para o estado de abandono das crianças e dos menores. Dessa forma a inconsistência dos laços de solidariedade social interferia claramente no clima das relações humanas. 
Nesse nível é patente que a debilidade institucional do “meio negro” deixava os menores à mercê de todos os perigos, quer eles surgissem do próprio ambiente, quer eles resultassem da pressões desorganizadas das relações com os “brancos”. Essa debilidade também se refletia na incapacidade para estabelecer uma rede assistencial autônoma. Fundavam-se clubes e associações, nos bairros ou no centro, que se propunham a atingir fins beneficentes, junto com fins recreativos e culturais. Mas o suporte financeiro das contribuições dos sócios convertiam tais objetivos em simples miragens. Nunca puderam ser postos em prática de maneira regular e na escala em que isso se impunha.[footnoteRef:10] [10: FERNANDES, Florestan. A integração do negro na sociedade de classes. São Paulo: Biblioteca Azul, 2008. p. 211] 
Assim, a criança e o menor, bem como o velho e o doente ou o inválido rompiam com facilidade o rudimentar equilíbrio que separava precariamente, a “pobreza” da “miséria” e da “indigência”. 
As dificuldades de classificação profissional e de obtenção de uma fonte estável de renda, combinadas aos efeitos da desorganização imperante no “meio negro” e à inexistência de mecanismos assistenciais institucionalizados bastante eficientes, concorriam para fazer com que a mendicância, as doenças e a prostituição se erigissem em ameaças que pairavam sobre a cabeça de todos. 
Vale ressaltar que a proporção da população negra e mulata afligida pelos males da pauperização nunca foi proporcional com índices de mendicância da mesma população no período analisado, isso por que a “esmola” era vista como uma forma de degradação para o “negro”, assim uma mãe de filhos eu passasse por uma situação de extrema miséria preferia apelar a prostituição em detrimento da mendicância.
2.2.3.4.3 A prostituição
Assim como a mendicância, a prostituição nunca acompanhou as proporções assumidas pela desorganização de seu comportamento sexual. Em regra, a prostituição ocasional constituía um expediente para enfrentar privações ou necessidades de outra forma. A mãe solteira recorria a ele nos momentos de aflição. A mulher que resolvia se dedicar profissionalmente à prostituição preferia a chamada “prostituição disfarçada”. 
Todavia, até mesmo dentro da prostituição ocorria um apartheid, no sentido de que a coloração da pele constituía um elemento importante no desenrolar do processo. Muitos bordéis reusavam a “prostituta negra”, só aceitando, quando abriam exceções para mulatas claras e bonitas. A negra e mulata escura tinha que se contentar com os bordéis menos exigentes ou com a prostituição sistemática mas clandestina, feita pelas ruas e pelos botequins. 
Perante o “meio negro”, a prostituição era algo tolerado, mas não admirado, isso é reforçado pela ideia de que enquanto as prostitutas permanecessem no ofício, elas “morriam” para a família, se os pais fossem “negros ordeiros” muito rígidos. Todavia, elas podiam retornar facilmente à “vida normal”, empregando-se como doméstica ou fazendo outros arranjos, além disso, o casamento surgia como uma tábua de salvação, ele “limpava o nome” e “passava uma esponja no passado”, uma clara forma de manifestação do machismo e do patriarcado presente no “meio negro”. 
2.2.3.4.4 A vagabundagem e a malandragem
Por sua vez, a vagabundagem e a malandragem estariam intimamente ligadas entre si e com a criminalidade. Vale ressaltar que as mesmas nunca tiverem qualquer conotação positiva entre os negros, sendo as pessoas que praticavam tais atos caracterizadas como possuidores de “vontade fraca” e “falta de caráter”. 
Fernandes observa que existe uma evolução nos estágios da marginalidade, dessa forma o jovem negro que teve as portas do trabalho e das oportunidades fechadas para si e as condições psicossociais e socioeconômicas incapazes de mantê-lo na “legalidade”, fomentando a eclosão de desajustamentos progressivos, sem correção possível, aos quais o “sedutor profissional” (tipo de malandro que se aproveitava de sua amásia ou mulher, a seduzindo para depois viver as suas custas) aparecia como a primeira resposta. 
Do sedutor profissional, o jovem negro passava para malandragem inveterada, cometendo pequenos furtos aqui e ali, até chegar ao fundo do poço para uns e o topo para outros, o crime organizado. 
Conforme aponta Florestan:
Todos reconhecem que a vida nos cortiços e a frequência fortuita ou contínua de rodas de desocupados incentivavam nos jovens o “ideal de malandro”. Porém esse ideal se esboroava sob a premência das necessidades. Entre os 10 e 15 anos, o menor precisava descobrir algum meio de “ganhar a vida” e de “ajudar em casa”. Portanto, o normal não seria começar a carreira como “malandro”, mas como “biscateiro” e “pau de toda obra” dos setores de marginais da rede de serviços urbanos. [footnoteRef:11] [11: FERNANDES, Florestan. A integração do negro na sociedade de classes. São Paulo: Biblioteca Azul, 2008. p. 224] 
Assim, o autor deixa claro que o meio exterior forjaria o indivíduo em seus ethos e seu pathos, pois tudo se encaixava, isto é, a desorganização do meio negro,a inexistência de oportunidades compensadoras de trabalho e a ausência concomitante de mecanismos adequados de socialização ou de repressão concorriam para promover, diretamente a transição gradativa da “vadiagem” para “malandragem” e desta para o crime organizado. 
Em síntese a vadiagem, a malandragem e o crime profissional no “meio negro” são desajustamentos fomentados pelas condições sociais anômicas de existência. De outro lado, eles contribuíam para manter e aumentar a desorganização que reinava no comportamento dos indivíduos e no funcionamento das instituições.
2.2.3.4.5 O suicídio
Florestan comprova, através de dados empíricos que o negro e o mulato teriam as maiores propensões ao suicídio e que são fatores sociais que permitem explicar tais tendências. Teríamos de procurar nas decepções e na maior desilusão do negro as razões de sua propensão ao suicídio: o desejo incoercível do negro e do mulato de “ser gente”, de compartilhar do estilo de vida, das garantias sociais e dos privilégios dos “brancos”. 
Assim, é notório que o suicídio também faz parte da interpretação sociológica da situação do negro e do mulato em São Paulo, nessa fase decisiva da consolidação do regime competitivo e da primeira revolução industrial. Portanto é fácil apontar relação entre tais desajustamentos e um Estado de espírito que poderia converter a vida em um fardo muito pesado. Acontece, porém, que o próprio suicídio fazia parte dessa linhagem sem fim de desajustamentos, exprimindo a que extremos eles podiam conduzir os indivíduos, quando estes ultrapassavam, consciente ou inconscientemente, os limites dos pontos de tensão.
Florestan aponta que para explicar o suicídio seria necessário fazer uso de um artifício chamado de fator sociodinâmico tópico ou crucial, que aparece, em grau variável, em todas as manifestações de desajustamento social. Esse fator era de natureza social e nascia da interação que se estabelecia entre as impulsões psicossociais, que orientavam o comportamento dos “homens de cor”, e a seleção negativa dessas impulsões pela sociedade. 
O modo pelo qual o “meio negro” se incluía na ordem social estabelecida impedia a livre manifestação, o desenvolvimento normal e a satisfação construtiva de tais impulsões, dando lugar a decepções e as frustrações incontroláveis. Assim qualquer que seja a o desajustamento que se considere, o polo dinâmico e por assim dizer o “multiplicador” do processo vinha a ser, invariavelmente, o anseio de se classificar econômica e socialmente, de “contar como gente”, fazendo com que os negros e mulatos desejassem desesperadamente os modelos de comportamento, os valores sociais e o estilo de vida dos brancos. 
2.2.3.5 As inconsistências da instituição familiar 
Como já dito, na perspectiva de Florestan, a família constituía a única instituição que operava universalmente no “meio negro”, com condições para organizar e orientar a manifestação das influencias socializadoras que modelavam a personalidade do negro e do mulato. 
Todavia, a transplantação, ou seja, a passagem do negro da condição de escravo para a de liberto, afetou severamente o curso do desenvolvimento da “família negra”, sendo agravados pela instabilidade econômica e social da “população de cor”, presos a um antigo clima de rusticidade que era marca do período escravocrata. 
Assim, a família negra das três primeiras décadas do século XX é conceituada como uma “família incompleta”, podendo tender para elevados graus de integração e de estabilidade, como podia ser desintegrada e instável. Sendo classificadas em três tipos: a família conjugal moderna (famílias que abrangiam o casal e seus filhos); família composta (marcadas pelas promiscuidades nas habitações coletivas) e família desorganizada (em que os casais eram amasiados e o homem era malandro costumaz). 
Tais deficiências nas famílias precisam ser entendidas como fruto do processo de escravidão e não como um desvio sociopático de um padrão, e sim como uma debilidade institucional típica. Dessa forma, a “irresponsabilidade” não nascia de uma propensão natural e irreprimível para a prática sexual desenfreada. Advinha claramente, da inexistência de padrões de comportamento e de mecanismos sociais de controle que assegurassem a difusão e a observância, no “meio negro”, de certos valores universais da sociedade inclusiva. 
Além disso, o próprio “meio negro”, não fornecia suporte institucional algum para as famílias de forma ajuda-las a preencher suas funções normais, desencadeando assim interferências de teor sociopático. 
Outro grande problema considerado por Florestan Fernandes é o acumulo excessivo de obrigações no papel social da mulher, quando seu marido deixa de atuar, gerando graves consequências sociopáticas, como a sobrecarga de suas funções não conseguindo administrar o lar, seu emprego e cuidar de seus filhos. 
O autor argumenta que haviam de fato famílias negras integradas, compostas principalmente pelos chamados “negros ordeiros” e que tais famílias teriam sido influenciadas pelas famílias de imigrantes, (principalmente italianos) fazendo assim com que os negros “descobrissem” a importância da família, ou até mesmo já teriam sido “transplantadas” com seus membros unidos. Todavia tais famílias integradas pagavam altos preços para manterem tal condição de integração, como por exemplo a necessidade de um isolamento anormal, para evitar possíveis “infelicidades” (perda da virgindade) precoce de suas filhas. Assim, perpetuando e refinando hábitos convencionais que os brancos já haviam abandonado definitivamente ou estavam abandonando e que faziam pouco sentido manter naquele momento histórico. 
A importância de se falar da família integrada reside no fato de mostrar que o negro e o mulato podiam de fato desenvolver padrões de vida conjugal muito respeitáveis e muito diferentes do que se via nos cortiços. Demonstrando também que a real diferença entre a família negra integrada e a desintegrada residia apenas no grau de proteção da “normalidade” da vida familiar. 
Já um ponto comum dos tipos familiares pode ser considerado que ambas mantinham seus filhos privados de poder se ajustar ao modelo competitivo de sociedade, quando por exemplo impediam os filhos de irem a escola, de um lado as famílias desintegradas por que precisavam da complementação da renda do filho para sobreviver e do outro a família integrada principalmente por que tinham medo que o filho se frustrasse no ambiente escolar. 
Os pais ignoravam a existência e a utilidade das escolas e por consequência negligenciavam um fator importante, que poderia acelerar a transformação do horizonte cultural transplantado do mundo rústico para o mundo “moderno”. 
Assim o autor alerta que
Ao comprometer a situação da criança e do jovem, vedando-lhes a absorção regular de um requisito normal da competição com os brancos e da integração ao meio social urbano, ela exercia (a família) uma influência negativa perturbadora, que iria prejudicar, irremediavelmente, o futuro do negro e do mulato na cidade. [footnoteRef:12] [12: FERNANDES, Florestan. A integração do negro na sociedade de classes. São Paulo: Biblioteca Azul, 2008. p. 269] 
2.2.4 Efeitos sociopáticos da desorganização social 
Nesse ponto Florestan vai se voltar para um problema teórico, considerado por ele como central que é a apatia da “população de cor” paulistana, ou seja, seu estado de insensibilidade emocional perante todos os efeitos sociopáticos da desorganização social. A extrema impotência a que se viu reduzido o “homem de cor”, como e enquanto agente histórico. 
O autor argumenta que o conformismo e a inércia foram as únicas alternativas viáveis de ajustamento do negro e do mulato à cidade de São Paulo no período considerado, frente ao processo de pauperização ao qual foram submetidos, ou seja, o processo de empobrecimento, de degradação econômico, social e cultural. 
Sendo o principal ônus da pauperização atribuído ao período rústico em que se perpetuou a escravidão, pois foi nesse período em que houve a perpetuaçãocrônica da anomia social no convívio dos escravos entre si, de forma que após a abolição da escravatura os efeitos não foram corrigidos os efeitos de tal anomia social de forma eficaz. Por isso o negro e o mulato emergem na cena histórica paulistana como portadores de uma herança cultural tipicamente adaptada à sua situação de “raça subjugada”. 
Assim, a pauperização do negro e do mulato na cidade de São Paulo possui traços específicos, e para análises sociológicas aparece como fator sociodinâmico essencial. 
Foi graças ao modo pelo qual a pauperização se desenrolou econômica e socialmente que a anomia e a miséria acabaram se combinando, se interinfluenciando e se fortalecendo de maneira incessante, arruinando pela base todos os anseios de “vida condigna”, confusa ou claramente alimentados pela “população de cor”.[footnoteRef:13] [13: FERNANDES, Florestan. A integração do negro na sociedade de classes. São Paulo: Biblioteca Azul, 2008. p. 271] 
Como os próprios negros e mulatos falavam, eles estavam fadados a “vegetar socialmente”. Pois não podiam romper com a miséria e com a dependência e não tinham como superar as condições existência social anômica, herdadas diretamente das senzalas. 
Sintetizando, os dois fatores que podem explicar em conjunto sociologicamente a extrema apatia revelada pela “população de cor” diante dos fatores de pauperização do “meio negro” seriam: 
Primeiro, a forma histórica assumida pela pauperização do negro e do mulato, como herdeiros da situação social e da condição humana do “escravo” e do “liberto”, combinou a anomia social e a miséria segundo esquemas que tendiam a liberar e a fortalecer, unilateralmente, os ingredientes tóxicos ou destrutivos que elas próprias continham.
Segundo, semelhante interação entre a anomia e a miséria se converteu em fator dinâmico crônico da neutralização ou do solapamento das “tensões criadoras” (ou “socialmente construtivas”) da desorganização social.[footnoteRef:14] [14: FERNANDES, Florestan. A integração do negro na sociedade de classes. São Paulo: Biblioteca Azul, 2008. p. 274] 
Além disso, a “neutralidade” dos brancos também foi um problema, pois se a sociedade inclusiva tivesse desenvolvido mecanismos reativos consistentes, que impusessem alterações, poderiam haver mudanças socioculturais e assim os negros e mulatos poderiam ter sido “incluídos ao novo regime”. Porém a miséria prolongou-se e converteu-se em fator de persistência e agravamento da anomia social. Sob essa condição, em que a persistência se somou ao agravamento, os resultados tinham que de assumir amplitude catastrófica. 
Florestan faz uma observação que se assemelha com o conceito de anomia de Émile Durkheim, que é que a predominância secular de condições anômicas de existência introduz elementos sociopáticos permanentes nas dimensões “normais” e “constantes” da vida humana. 
Portanto, faltaram ao negro e ao mulato os suportes perceptivos e cognitivos, que a herança sociocultural deve fornecer para alicerçar uma “boa” organização do comportamento humano. 
Em suma, o “meio negro” era lavrado, psicológica, cultural e socialmente por forças que liberavam e estruturavam influências improdutivas, que mantinham ou ampliavam a desorganização social. 
Caracterizando a apatia da população de cor como um elemento que ultrapassa o sentido factual de fatalidade histórica. Contendo o caráter de uma forma de ajustamento ao estilo urbano de vida, que através da inércia e da passividade, caracterizaram um único elemento positivo e construtivo decorrente da desorganização social crônica, servindo para reduzir, pelo menos o desgaste físico, mental e moral aos quais o negro e o mulato eram impiedosamente submetidos. 
Para que os negros tivessem êxito em suas vidas, os mesmos precisariam assumir, na estrutura da sociedade inclusiva, posições sociais que lhes facultassem a assimilação e o domínio prático das instituições cuja posse eram automaticamente privados, de modo parcial ou total, como isso não ocorreu, imperou uma espécie de carência institucional, que por ser dessa ordem se reflete em todos os níveis da sociedade. 
As instituições coordenam as condições externas e organizam as compulsões interiores que regulam, estimulando ou inibindo, os motivos das ações humanas. 
Por fim, Florestan faz uma severa crítica sociedade como um todo da época, em espacial ao poder público, pois o autor argumenta que o isolamento psicossocial e sociocultural que ocorreu com o negro nesse período histórico, não condiz com os fundamentos econômicos e jurídico-políticos que são pregados pela “sociedade inclusiva”, como a democracia, a competição livre e aberta. 
2.3 CAPITULO 3: A HETERONOMIA RACIAL NA SOCIEDADE DE CLASSES
2.3.1 O mito da democracia racial
Florestan afirma que é muito difícil “interpretar com objetividade as disposições que orientaram os ajustamentos sociais dos ‘brancos’, durante a fase de consolidação da ordem social competitiva”. Mas uma coisa é certa: o homem negro nunca ameaçou o branco em sua respeitabilidade e posição social e por isso não se formaram barreiras que tinham por objetivo prejudicar a ascensão do homem de cor. Em nenhum momento os negros, brancos e mulatos foram colocados em posição de luta. Para Florestan, “por paradoxal de pareça, foi a omissão do branco, e não a ação”, que perpetuou o status do mesmo.
Ao mesmo tempo em que o branco não via necessidade de competir com o homem de cor, este se via aceitando passivamente esta subordinação e a continuação de antigos padrões de acomodação social.
Como os membros das elites brancas estavam acostumados a viver em um ambiente de forte repressão aos movimentos sociais, devida a seu potencial explosivo, eles tendiam a tratar as manifestações sociais dos negros da mesma maneira, de forma rígida e autoritária. Esses problemas não eram bem vistos pelos brancos. Além disso, não concordavam com manifestações de apoio ao negro, com o objetivo de resguardar a superioridade branca.
Com isso, se perpetuava uma situação um tanto quanto perturbadora. O negro não era combatido abertamente, mas também não era aceito de forma íntegra, abraçando sua nova condição jurídico-politica.
Isso não acontecia de forma a se declarar o objetivo concreto de prejudicar o negro. E onde isso era feito, do mesmo círculo social surgia a desaprovação. Com medo de provocar tensões sociais, e e assegurar uma via eficaz para inserção do negro na sociedade, fecharam-se as portas, que poderiam inserir o negro e o mulato como beneficiado direto dos direitos trazidos pela democracia. “Em nome de uma igualdade perfeita no futuro, acorrentava-se o homem de cor aos grilhões invisíveis de seu passado, a uma condição sub-humana de existência e a uma disfarçada servidão eterna”.
Essa orientação gerou um sentimento de que a relação entre brancos e negros de baseava em padrões ético-jurídicos do regime republicano. Formando-se assim, um dos maiores mitos de nossos tempos: o mito da democracia racial.
Esse mito teve utilidade pratica em três planos distintos. Primeiro, foi atribuída a “incapacidade” e a “preguiça” do próprio negro, a causa de seus problemas sociais. Segundo, afastou obrigações aos brancos ou solidariedade quanto aos efeitos da escravidão. Terceiro, revitalizou a técnica de entender as relações entre brancos e negros através de aparências, produzindo uma consciência falsa acerca da realidade social. Essa consciência gerou um arsenal de convicções etnocêntricas: 1o- a ideia de que o negro não tem problemas no Brasil; 2o- a ideia que não existe distinção racial entre nós; 3o- a ideia de que as oportunidades foram igualmente distribuídas; 4o- a ideia de que o preto esta satisfeito com sua posição; 5o- não existe nenhum problema social do negro que não tenha sido resolvido com a abolição da escravatura e a universalização da cidadania.
Nenhum interesse de ordem moral, econômica, social, politico ou religioso, induziram as elites a inovar o sistema de relações sociais na nova ordem societária emergente. Operavam ainda velhas racionalizaçõesque operavam em favor do interessa da raça dominante. Esse interesse se dividia em duas categorias: de um lado pretendiam afastar aquelas elites de culpas objetivas pelo desfecho melancólico do processo abolicionista. De outro lado, o objetivo de fomentar a integração democrática da população de cor “colidia com os objetivos diretos e conscientes da politica de expansão econômica com base nos interesses das grandes lavouras e de suas vinculações com o crescimento econômico”. Qualquer tentativa de favorecer a ascensão do negro se chocaria com interesses arraigados, formando tensões na própria elite, sem que isso acarretasse vantagem para qualquer um dos subgrupos em que ela se dividia.
Depois da Abolição, a aristocracia paulistana não tinha experiência em manipular democraticamente os problemas sociais. Além disso, ninguém sabia ao certo o que poderia ocorrer se eclodisse um problema em torna de “questões sociais”. Por isso, as elites desejavam que o negro nunca saísse de sua passividade e apatia, evitando assim debates acerca de problemas entrono dessa temática em publico, estes deviam ser velados.
E evidente que só depois da Abolição e no contexto jurídico-politico do Estado Republicano, poderia se considerar como democracia racial o contato entre negros e brancos. Mas as coisas não caminharam para essa direção e, enquanto a ordem jurídico-politica passou por uma grande transformação, a ordem social permaneceu quase intacta. O negro nunca achou no branco o apoio que precisava para atingir uma posição boa na sociedade republicana. Com isso, a convicção de que a relação entre negros e brancos nesse contexto histórico seria democracia racial não passa de um mito. Isso porque ela se vincula a interesses da elite, não se importando com interesses da população de cor. Por isso, “não operava como uma força social construtiva, de democratização dos direitos e garantias sociais na ‘população de cor’”. E diferente disso ela atuava como um mecanismo de perpetuação da dominação. Desse ângulo, o mito da democracia se encaixa como “fator de retenção do desenvolvimento da ordem social, competitiva e democrática”. Destruindo tendências de caráter inovador.
Observando a relação do negro e elite, deixamos de lado o papel das camadas baixas da raça dominante. Esta é composta por imigrantes ou por elementos nacionais que competem com eles. Esta camada da sociedade brasileira, também se mantia indiferente a todo o cenário da população de cor. Isso se explica porque a capacidade de atuação politica dessas classes fora neutralizada, pois os círculos dirigentes tomaram pra si a condução do processo revolucionário. Desse modo os imigrantes e os elementos nacionais foram manipulados pela elite a fazer o que elas bem entendiam, não emergiam como iguais e não tinham orientação politica própria. Só no fim do período considerado, de 1924 a 1930, que surgiram as primeiras tentativas de quebrar essas acomodações e suas consequências.
Portanto, as camadas baixas se envolviam muito mal e superficialmente nos assuntos que não tinham significação econômica imediata para elas. A elite dominante monopolizou funções sociais que entram em conflito com as tendências normais de integração da ordem societária, e quando isso acontece, o curso da evolução social é entravado e corrompido. Desse jeito uma democracia não funciona, sem um mínimo de equilíbrio e autonomia nas relações sociais.
Com isso Florestan conclui esse tópico dizendo: “as condições de perpetuação parcial das antigas formas de dominação patrimonialista estão na própria raiz do desequilíbrio que se criou entre a ordem social e racial da sociedade de classes”. A dinamização no sentido igualitário do sistema social tem que partir da própria iniciativa da população de cor e da mesma forma deve ser acolhida e respeitada pelos brancos. O próprio mito da democracia racial foi construído para impedir essa dinamização, ou seja, o advento da verdadeira democracia racial.
2.3.2 Os padrões tradicionalistas de relações raciais
Pode-se dizer que com o passar do tempo, permaneceram vários aspectos da estrutura de relações sociais, e isso quer dizer que toda a “velha etiqueta de tratamento racial recíproco” permaneceu. Devido a presença latente desses padrões ainda nos dias atuais, Florestan afirma que é perfeitamente possível estudar o passado por meio do presente.
Florestan restringe a analise desse tópico em três pontos. Primeiro, as expectativas que alimentavam o teor das relações sociais; segundo, o padrão de relação racial tradicionalista; terceiro, as principais características ideológicas dos brancos da raça dominante. 
O autor, para discutir sobre as expectativas que cercavam ambas as raças em suas relações sociais, apresenta uma serie de casos reais, fornecidos pelos informantes. Estes casos, de acordo com Florestan ilustram tipicamente as “predisposições psicossociais” que orientavam os agentes.
Esses casos tinham como propósito expor o sentido das ações dos agentes em se comportarem como brancos, negros ou mulatos, suas ações tinham expectativas pré-estabelecidas de como deviam se ordenar em cada situação e de acordo com quem estava sendo feita a interação. Os casos evidenciam que a supremacia do branco permanecia e que o negro ou mulato permanecia inferior mesma na nova ordem jurídico-politica. Eles não se libertaram da condição de “liberto”, de “cria da casa”. O preto aparecia como o equivalente ao escravo, devendo, portanto, ser tratado como tal. O negro podia não gostar da posição servilista em que estava reduzido, mas tinha que acatar de acordo com as expectativas do branco.
Florestan atenta ao fato de que se deve dar especial atenção a forma assumida pela acomodação racial igualitária. Ela não nasceu abruptamente e sim foi assimilada pelos padrões tradicionalistas de relações sociais e adquiriu aparência de ordem democrática. Mas, preservou a substancia do antigo regime. Onde parecia prevalecer igualdade, preservava-se a velha relação heteronômica, que separava os brancos dos negros, como senhores e escravos.
Essa forma de acomodação que se perpetuou praticamente até nossos dias, provem de um passado tradicionalista e patrimonialista, como se os brancos pretendessem preservar o paternalismo nas relações com o homem de cor. Mas, essa relação passara a ser um “ônus severo” para o branco “protetor” e algo insatisfatório para o negro “protegido”.
Mas com o tempo, esta relação tradicionalista no comercio inter-racial, entrava aos poucos em colapso. A supressão legal do antigo regime fazia com que se desaparecesse os aparatos morais e legais para sustentar tal padrão. Então a realidade histórica não favorecendo a continuidade de curso tomado pelos contatos raciais, os requisitos psicossociais que estavam por traz das formas arcaicas de acomodação social estavam condenados a ruir. No entanto os vários fatores que operavam em favor da inercia social, já analisados, “engendravam” um grande período de transição, o qual “confirma ser realmente difícil ao homem sair da própria pele”. O negro, mesmo na no novo regime continuou se comportando como escravo, enquanto o branco ignorou as mudanças e assumiu uma postura de indiferença a discrepância que havia entre regime jurídico e posição social do negro.
Na medida em que o negro aceitava seu papel na sociedade e o branco se recusava a partilhar com o negro seu estilo de vida, hábitos e posições, pouco mutável era a realidade de cada setor racial na vida paulistana. Em consequência disso, estabeleceu-se uma certa consciência de que cabia ao branco decidir como tratar ao negro e a este só a possibilidade de acatar ao que é prescrito. Esse conformismo seria inconcebível se o pensamento do negro não tivesse sido moldado pela “escola da escravidão”, e se apesar da condição de escravo, ele mesmo tivesse sido agente histórico de mudança de tal cenário.
Para Florestan, “foi mais fácil lutar contra o aparato material da condição servil que combater seu sustentáculo moral invisível, a concepção tradicionalista do mundo”. Seria necessárioum longo processo de educação ao negro para que se alcançasse a “segunda abolição”, aquela que realmente traria igualdade às raças. Em suma, todos consentiam, de forma espontânea, em perpetuar as velhas formas de dominação. “brancos e negros se viam a partir de um prisma deformado”. O elemento típico da acomodação racial é a subordinação passiva do negro, e a supremacia ilimitada do branco em base normais da interação racial.
O negro livre então se encontrava em um dilema. Se integrar a vida social significava aceitar a condição imposta pela elite dominante de ser inferior, “gentinha”, acatando as regras que esta impunha. A outra saída seria se isolar da rede social, e quebrar o maior numero possível de relações com o branco.
Florestan, em dado momento de sua analise, salienta que, ao observar certos padrões tidos como “aristocráticos”, o próprio negro tendia a absorvê-los, fazendo uso deles para se distinguir dos ”negros pobres”. Por isso, os clubes negros mais conceituados ficavam famosos por sua formalidade e decoro de suas festas. Mas quando se trata do branco, tais recebiam a informação com hostilidade, afirmando que o negro “quer virar gente” ou “virar branco”.
Em regra, se o negro não seguisse as expectativas do branco, de comportamento submisso, e tentasse se “igualar” a ele, o branco não aceitava e recebia com indignação.
Na medida em que o negro se rebelava contra o sistema tradicional e se insubordinava, surgiam conflitos, principalmente em ambiente de trabalho. Florestan apresenta casos onde negros se irritam com a presente posição, na qual era tratado com inferioridade e preconceito que partia dos brancos. Mas estes, como apresentado nos casos, se queixavam abertamente do negro em seu comportamento, alegando não entender o porquê. Chocavam-se com a atitude de independência e a classificava com ingratidão.
Em suma, o bom negro era definido como aquele que era submisso e leal, que seguia as expectativas impostas pela raça dominante. Quanto mais o negro se associava com ideais democráticos, mais repreendido e depreciados eram. E quanto mais se apegavam ao antigo regime e sua antiga ordem social, mais eram “aceitos” e acolhidos pelos brancos.
Por isso, as manifestações organizadas pela população de cor sempre foram vistas com maus olhos e reprimidas. Florestan reúne depoimentos de informantes brancos que acreditam veementemente que as verdadeiras pessoas de cor “são aquelas que agem dócil e passivamente, conforme as expectativas do branco”. Negros que protestavam não são verdadeiros negros. Isso demonstra que a imagem do negro era tão clara para a ideologia dominante, que este não podia fugir dela.
O apego ao padrão tradicionalista de relação racial esta ligado a dois componentes entre os brancos. O primeiro é que o “negro só serve para trabalhos braçais” e então, não deve assumir cargos importantes. O segundo é que essa técnica de convivência exclui o negro da condição de igual, mesmo de fosse aceito, seria visto como alguém que deve favores. Isso porque a mobilidade vertical de ascensão social dependia da “vontade” do branco. Sem que o branco reconhecesse o valor do homem de cor, este ficaria estagnado em seu lugar.
É notório também, que a posição de um negro não se alterava nem mesmo quando se elevava socialmente, eram como “exceções que confirmavam a regra”. Os lideres negros da Frente Negra sublinhavam: “quando um negro se impõe pelo real valor, os brancos o respeitam mais pela admiração – é como se fosse um fenômeno”. Em consequência, as alterações de status não mudavam as posições da raça na estrutura de poder.
Em relação aos negros que subiam, era notória a acuidade dos brancos com eles. Qualquer ato que não fosse de acordo com as expectativas comportamentais esperadas, servia de pressuposto para atestar a “incapacidade” da pessoa de cor em exercer “funções de branco”. Esses deslizes atestavam as limitações do negro, como também seus defeitos ou taras.
Isso atestava que o branco, quanto ao negro “não o aceitava como igual e o repelia como superior”, reforçando a crença de que seria impossível substituir um pelo outro, já que “um nascera para e se acostumara ao exercício do mando; e outro nascera para e se acostumara à obediência e à subordinação”. 
O passado, representado pelo antigo regime, ainda se mostrava tão opressivo, que até mesmo a democratização de comportamentos não era aceita. “parecia não só improprio que o negro falasse ou agisse como branco. Pensava-se ser falta de educação admitir familiaridades com o negro, especialmente em público”.
Quanto ao preconceito do negro contra o branco, Florestan afirma que ele existe. Mas diz que ele não prejudica o branco, além de ser bom para o negro. “o preconceito que o negro tem para com o branco é ainda humilhante para si e lisonjeiro para o branco porque é um conceito que ele tem também de que o branco é superior”. Para superar os efeitos do preconceito, o negro tendeu a reproduzir palavras, ações e modelos de organização do branco, tentando a anulação da distância social existente entre as duas raças.
No entanto, mesmo com a organização de movimentos sociais, as coisas não são rapidamente alteradas. “Além de, de acordo com os próprios negros, a população de cor ser “tímida” e medrosa”, persistiu na sociedade uma ideia de que o negro “precisa de freio”, mesmo entre a população de cor.
No decorrer da leitura, Florestan atesta outra faceta da relação social tradicionalista: “ela pressupunha a manifestação regular de certos processos de identificação diferenciadora associados a cor e a condição social das ‘raças’ em contato”. E por isso existir, era necessário dar suporte moral e fundamento convencional às práticas resultantes dessa participação desigual na cultura. Deste modo, certos atributos da população de cor foram escolhidos como marcas de quem eram e o que podia se esperar deles. Foram estabelecidos clichês com objetivo de perpetuar uma condição passada do negro e exagerar no que havia de negativo nessas representações. As elites dominantes apelaram para “despersonalização impiedosa” do negro para manter a relação entre cor e estrutura social. 
No contexto do regime senhorial e escravocrata, a cor eliminava, por si mesma, grande numero de situações ambíguas, e a simples condição mecânica fazia o resto, impedindo ou contendo a democratização de padrões de comportamento, níveis de vida, aspirações de carreira, formas de liderança e de exercício de poder etc. Na situação histórico-social criada pela formação e expansão da ordem social competitiva, porem, os mecanismos que produziam tais resultados ou deixaram de existir ou operavam com eficácia reduzida. A preservação da distancia social entre o negro e o branco passou a depender da revitalização de procedimentos aplicados antes no ‘congelamento’ do liberto e da cristalização de novas técnicas sociais de manipulação dos comportamentos das ‘pessoas de cor’”.
Essas tendências de redefinição, produziram uma imagem muito negativa do negro, que a cor voltou, facilmente, a ser elemento de exclusão social. Com maior frequência se ressaltava que o negro era desleal, invejoso, inseguro, falso e pouco inteligente. Também se procurava ridicularizar os traços negroides.
Essas representações atrapalhavam na aceitação do negro como igual. Além disso “os traços raciais degradavam, inevitavelmente, o individuo na condição de ‘negro’, conferindo ao branco a faculdade de trata-lo como tal”. E trata-lo da maneira que bem entendesse.
Essa deformação da personalidade do negro respondia à necessidade de “mantê-los em seu lugar”, e preservar a distancia que havia entre as raças tanto social quanto culturalmente.
Mais um pouco à frente na leitura, Florestan diz que as múltiplas conexões estruturais e funcionais do padrão tradicionalista e assimétrico de relação social, em primeiro lugar, deixam claro que a acomodação racial igualitária é uma simples verbalização. E que o convívio entre brancos e negros explana de forma claro, uma rígida e insuperável desigualdade racial. Em segundo

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