Text Material Preview
CEREBELO
1. CONCEITO E LOCALIZAÇÃO
O cerebelo é um órgão suprassegmentar do
sistema nervoso central, localizado na fossa
craniana posterior, atrás do tronco encefálico
(ponte e bulbo) e do IV ventrículo, separado do
cérebro pela tenda do cerebelo (tentório).
É chamado de “pequeno cérebro” devido à sua
morfologia semelhante ao encéfalo, com dois
hemisférios e vermis central.
O r i g e m e m b r i o l ó g i c a : m e t e n c é f a l o
(rombencéfalo).
2. FUNÇÕES GERAIS
• Controle e ajuste da postura e do equilíbrio.
• Regulação do tônus muscular.
• Coordenação motora e ajuste fino dos
movimentos voluntários.
• Aprendizagem motora: transformação de
movimentos voluntários em automáticos.
• Planejamento, correção e automatização
do movimento (compara o plano motor
com a execução).
• Funções cognitivas superiores (participa de
tarefas do córtex pré-frontal, como memória
de trabalho, resolução de problemas,
linguagem).
3. DIVISÕES DO CEREBELO
3.1 Divisão Anatômica
• Vermis: porção central, coordenação axial
(tronco, cabeça).
• Zona paravermiana/intermédia: músculos
proximais dos membros.
• Hemisférios laterais: movimentos distais e
funções motoras finas.
3.2 Divisão Ontogenética
• L o b o f l ó c u l o - n o d u l a r : mais ant igo ,
vinculado ao equilíbrio.
• Lobo anterior: postura e tônus.
• Lobo posterior: planejamento motor fino e
cognição.
• Lóbulos do vermis: língua, lóbulo central,
cúmulo, declive, folha, túber, pirâmide, úvula,
nódulo ("CDF nas terras de Tupi").
3.3 Divisão Filogenética
• Arquicerebelo (vestibulocerebelo): animais
aquáticos, controle do equilíbrio (lobo
flóculo-nodular).
• Paleocerebelo (espinocerebelo): peixes,
anfíbios, postura e tônus muscular (lobo
anterior).
• Neocerebelo (cerebrocerebelo): mamíferos,
primatas, movimentos finos e cognição
(lobo posterior).
3.4 Divisão Funcional
• Vestibulocerebelo: equilíbrio, controle dos
olhos (lobo flóculo-nodular, parte do
vermis).
• Espinocerebelo: postura, ajuste axial e
proximal, correção do movimento (vermis,
zona paravermiana).
• C e r e b r o c e r e b e l o : p l a n e j a m e n t o ,
automatização e ajuste fino, cognição
(hemisférios laterais).
4. MORFOLOGIA EXTERNA E SUPERFÍCIE
• Folias cerebelares: elevações finas e
alongadas (parecem folhas de um livro).
• Sulcos: depressões entre as folias.
• Fissura primária: separa lobo anterior e
posterior.
• Fissura posterolateral: separa lobo posterior
do lobo flóculo-nodular.
• Tonsilas cerebelares: laterais à úvula,
clínica relevante (hérnia tonsilar).
5. ESTRUTURA INTERNA – HISTOLOGIA
5.1 Córtex cerebelar (três camadas)
• Camada molecular (mais externa): fibras
paralelas (axônios das células granulares),
células estreladas e em cesto (ambas
inibitórias – GABA).
• Camada de Purkinje (intermediária):
células de Purkinje (únicas eferentes do
c ó r t e x , a l t a m e n t e r a m i f i c a d a s ,
GABAérgicas).
• Camada granular (mais interna): células
granulares (as menores do SNC, excitadoras
– glutamato), células de Golgi (inibitórias).
5.2 Núcleos cerebelares profundos
(de medial para lateral: Fastigial, Globoso,
Emboliforme, Denteado)
Máyra Dias T38
• Fastigial: axial e equilíbrio, recebe do vermis.
• Globoso/Emboliforme: músculos proximais,
recebe da zona paravermiana.
• Denteado: movimentos finos, planejamento
motor, recebe dos hemisférios laterais.
5.3 Substância branca (corpo medular)
• Fibras aferentes: chegam ao córtex via
pedúnculos.
• Fibras eferentes: axônios das células de
Purk in je (para núcleos profundos e
vestibulares).
• Fibras intrínsecas: comunicação interna no
cerebelo (escassas).
6. PEDÚNCULOS CEREBELARES
• S u p e r i o r : l igação com mesencéfalo
(principalmente eferente).
• Médio: ligação com ponte (principalmente
aferente; via ponto-cerebelar).
• Inferior: ligação com bulbo e medula
(aferente/eferente; via olivocerebelar,
espinocerebelar, vestibulocerebelar).
7. VIAS CEREBELARES – AFERENTES E EFERENTES
7.1 Fibras Aferentes
• Fibras musgosas: origem diversa (núcleo
pontino, medula, etc.), terminam na camada
granular, excitadoras (glutamato).
• Fibras trepadeiras: da oliva inferior, excitam
f o r t e m e n t e a s c é l u l a s d e P u r k i n j e ,
participam da plasticidade e aprendizagem
motora.
• Fibras noradrenérgicas/serotoninérgicas:
modulação extra do córtex cerebelar.
Principais Vias
• Córtico-ponto-cerebelar: planejamento
motor (córtex → ponte → cerebelo via
pedúnculo médio).
• E s p i n o c e r e b e l a r a n t e r i o r / p o s t e r i o r :
propriocepção inconsciente (membros e
tronco, via pedúnculos superior e inferior).
• Cuneocerebelar: propriocepção membros
superiores.
• Vestibulocerebelar: equilíbrio, informações
dos canais semicirculares (VIII par, núcleo
vestibular → cerebelo).
• Olivocerebelar: aprendizagem motora.
• Reticulocerebelar: modulação de tônus/
postura.
7.2 Fibras Eferentes
• Axônios das células de Purkinje: únicas
eferentes do córtex, inibem núcleos
cerebelares profundos (GABA).
• Núcleos profundos cerebelares: saída final,
vão para tálamo, núcleo rubro, formação
reticular, núcleos vestibulares.
Principais Vias
• F a s t í g i o - v e s t i b u l a r : p a r a n ú c l e o s
v e s t i b u l a r e s ( e q u i l í b r i o , t r a t o s
vestibuloespinhais).
• Fastígio-reticular: para formação reticular
(postura, tratos reticuloespinhais).
• G l o b o s o / e m b o l i f o r m e - r u b r o e s p i n a l :
músculos proximais.
• Denteado-talâmica-cortical: hemisférios
cerebelares → tálamo → córtex motor
(movimentos finos e planejamento).
8. CIRCUITOS E MODULAÇÃO
8.1 Circuito fundamental
• Aferências (musgosas ou trepadeiras)
ativam células granulares → fibras paralelas
ativam células de Purkinje → inibem núcleos
cerebelares → modulam saída para centros
motores.
• Células de Golgi: feedback inibitório sobre
células granulares.
• Células em cesto/estreladas: inibição
lateral no córtex.
• C i r c u i t o s m e d i a d o s p o r
neurotransmissores:
◦ G l u t a m a t o : e x c i t a ç ã o ( c é l u l a s
g r a n u l a r e s , f i b r a s m u s g o s a s ,
trepadeiras).
◦ GABA: inibição (Purkinje, Golgi, cesto,
estrelada).
8.2 Aprendizagem motora
• Fibras trepadeiras: detectam erro, ajustam
resposta das células de Purkinje via
p l a s t i c i d a d e s i n á p t i c a ( b a s e d a
automatização do movimento e do
aprendizado motor, ex: tocar instrumento,
dirigir).
9. FUNÇÕES CLÍNICAS E APLICAÇÕES
9.1 Controle do equilíbrio/postura
• Integra informações vestibulares (labirinto),
proprioceptivas e visuais.
Máyra Dias T38
• Vestibulocerebelo ajusta tônus axial e
postura durante marcha e movimento.
9.2 Ajuste do tônus muscular
• Atividade basal dos núcleos denteado/
interpósito mantém tônus mesmo em
repouso.
• Lesão cerebelar: hipotonia sem paresia.
9.3 Coordenação e ajuste fino dos movimentos
• C e r e b r o c e r e b e l o : p l a n e j a m e n t o d o
movimento, integração córtico-ponto-
cerebelar.
• E s p i n o c e r e b e l o : feedback sensor ia l
contínuo, ajusta execução em tempo real.
• Exemplo clínico: acertar o nariz sem olhar,
realizar movimentos rápidos alternados.
9.4 Funções cognitivas
• Conexão com córtex pré-frontal: participa
de planejamento, memória de trabalho,
resolução de problemas, linguagem.
• Síndrome do cérebro posterior: lesão →
disfunção executiva, problemas visuo-
espaciais, apraxia.
10. SÍNDROMES, SINAIS CLÍNICOS E EXEMPLOS
PRÁTICOS
10.1 Síndrome vestibulocerebelar
• Lesão do nódulo, flóculo, vermis inferior.
Clínica : nistagmo, ataxia de tronco,
desequilíbrio, queda fácil, dificuldade de
manter-se em pé.
10.2 Síndrome espinocerebelar
• Lesão do vermis/zona paravermiana.
Clínica: ataxia axial, marcha em base
alargada, fala escandida, dismetria, tremor
terminal, oscilação dos membros, hipotonia.
10.3 Síndromecerebrocerebelar
• Lesão dos hemisférios laterais.
Clínica: decomposição de movimento
m u l t i a r t i c u l a r , a t r a s o p a r a i n i c i a r ,
d isd iadococ ines ia , rechaço , t remor
intencional, dismetria.
10.4 Outros sinais clínicos clássicos
• M a r c h a a t á x i c a : paciente caminha
balançando, aumenta base de sustentação.
• Teste dedo-nariz: dismetria, não acerta o
alvo.
• T e s t e p a l m a - d o r s o : d i f iculdade em
movimentos alternados.
• Astasia-abasia: não consegue manter-se
e m p é , n e m c a m i n h a r d e f o r m a
coordenada.
• Hérnia tonsilar: tonsila desce pelo forame
magno, comprime bulbo → parada
respiratória e morte encefálica.
• Hemibalismo: movimentos involuntários
amplos, por lesão no circuito Guillain-
Mollaret.
11. CIRCUITO DE GUILLAIN-MOLLARET
• Núcleo dentado (cerebelo) – núcleo rubro
(mesencéfalo) – núcleo olivar inferior
(bulbo).
• C l í n i c a : aprax ia , d isdiadococines ia ,
dismetr ia , movimentos involuntár ios
(hemibalismo).
12. PONTOS DIDÁTICOS E COMENTÁRIOS DO
PROFESSOR
• Lesão cerebelar é ipsilateral aos sintomas
(diferente do trato piramidal).
• Não há perda de força, apenas perda de
coordenação (paciente balança, mas
levanta peso normalmente).
• Sintomas globais (ex: álcool crônico) vs
sintomas localizados (tumor, AVC).
• Recuperação melhor em lesão cortical,
ruim em núcleos profundos.
• Importância de integrar a clínica com a
anatomia para exames, provas práticas e
diagnóstico diferencial.
1 3 . T E S T E S D E L E I T O ( E X A M E S F Í S I C O S
CLÁSSICOS)
• M a r c h a s e n s i b i l i z a d a : ev idência de
instabilidade cerebelar.
• Romberg modificado: diferença entre lesão
vestibular e cerebelar.
• Teste do rechaço: incapacidade de parar o
movimento abruptamente.
14. RESUMO FINAL – PRINCIPAIS DIFERENCIAIS
• Cerebelo ajusta e coordena, mas não
executa nem gera força.
• Lesão cerebelar → incoordenação, não
paresia.
• Clínica cerebelar: ataxia, hipotonia,
dismetria, disdiadococinesia, tremor
Máyra Dias T38
terminal/intencional, marcha instável, fala
escandida, nistagmo, apraxia.
• Marcha e coordenação são os principais
focos da clínica neurológica para o
cerebelo.
• D i a g n ó s t i c o d i f e r e n c i a l c o m l e s ã o
vestibular, sensitiva e motora.
• Avaliação anatômica (lóbulos, núcleos,
divisões) orienta raciocínio clínico e
semiológico.
•
Máyra Dias T38