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A mulher durante o processo de velhice pensa o que teria sido a sua vida em oportunidades diferentes. Deixa de ser um objeto erótico ao homem, deix...

A mulher durante o processo de velhice pensa o que teria sido a sua vida em oportunidades diferentes. Deixa de ser um objeto erótico ao homem, deixa de ser vista como uma rainha. Motiva-se a atividades que sempre quis experimentar, mas antes não pôde pelas responsabilidades de casa: como tocar piano, por exemplo. Sua vida analisada desde o início parece não ter tido sentido algum, apenas uma contagem até este momento anterior à morte. Não pôde construir seu próprio legado, viver como desejava, ou amar como pensou que poderia. Então feita essa genealogia da mulher, veremos como Beauvoir tentará solucionar este problema: Opõe-se por vezes o “mundo feminino” ao universo masculino, mas é preciso sublinhar mais uma vez que as mulheres nunca constituíram uma sociedade autônoma e fechada; estão integradas na coletividade governada pelos homens e na qual ocupam um lugar de subordinadas; (...) E daí vem o paradoxo de sua situação: elas pertencem ao mesmo tempo ao mundo masculino e a uma esfera em que esse mundo é contestado; encerradas nessa esfera, investidas por aquele mundo, não podem instalar-se em nenhum lugar com tranquilidade. Sua docilidade comporta sempre uma recusa, a recusa de uma aceitação; nisto sua atitude aproxima-se da atitude da moça; mas é mais difícil de sustentar porque não se trata somente para a mulher adulta de sonhar sua vida através dos símbolos, e sim vivê-la (BEAUVOIR, 2009, p. 781 – 782). A filósofa aqui sustenta que as mulheres situadas neste sistema opressivo, culminam por sentir uma solidariedade ou compaixão umas com as outras de forma mecânica. Por isso vivem um paradoxo, elas dividem-se em dois mundos: um real e outro imaginário, ou de certa forma oculto. E apesar das chances serem precárias, é irrefutável que empenhadas em empreendimentos que Beauvoir considera dignos de um ser humano – a saber, um projeto autêntico que as eleve a transcendência – elas quando permitidas desempenham essa função de forma tão eficiente e ascética quanto um homem qualquer. É de se espantar, conforme diz a autora, que limitem a vida da mulher nos cuidados do lar, e depois lhe digam que seu horizonte e capacidade são limitados. Com situações tão diferentes as de mulheres e as de homens, torna-se ineficaz fazermos comparações. As situações dos indivíduos do mundo são muito diferentes e vão muito além de seus órgãos sexuais. Neste sentido, afirmar que existe um modelo de mulher geral ou um modelo assim de homem é para Beauvoir um absurdo. E que pra ambos os sexos possam experienciar um amor autêntico (tendo em vista o fracasso da ideia de amor absoluto que vimos antes), é necessário que exista um reconhecimento recíproco das liberdades um do outro, sem haver a abdicação da transcendência em nenhuma das duas partes. Assim o sendo, poderiam juntos desvendar os valores do mundo e criar projetos juntos. É interessante aqui notar como Beauvoir, com todo seu plano de fundo filosófico, consegue imaginar ainda uma sociedade recíproca entre homens e mulheres, onde a união de dois gêneros seja viável. Mas a princípio, para que se exista uma “mulher independente no mundo”, a autora recorre a um discurso político. Para tal, relembra que no código francês de sua época, a obediência da esposa não era mais considerada um dever. Além disso, tornando-se também eleitora, adquiriu seus direitos de cidadã. Para ela, essas liberdades cívicas infelizmente possuem um caráter abstrato na medida em que uma autonomia econômica também não foi atingida. Simone de Beauvoir sempre sustentou que é pelo trabalho que a mulher deixa de ser vista como um “parasita social”, e se aproxima então da possibilidade de transcendência masculina. Ainda no período em que escreveu O Segundo Sexo e ainda sem considerar-se como uma feminista, recorre à estrutura de um modelo político pronto para que se possa de forma definitiva alcançar socialmente não só os direitos das mulheres, mas também das demais classes oprimidas da sociedade: Somente em um mundo socialista a mulher, atingindo o trabalho, conseguiria a liberdade. Em sua maioria, os trabalhadores hoje são explorados. Por outro lado, a estrutura social não foi profundamente modificada pela evolução da condição feminina; este mundo, que sempre pertenceu aos homens, conserva ainda a forma que eles lhe imprimiram. É preciso não perder de vista esses fatos, dos quais a questão do trabalho feminino tira sua complexidade (BEAUVOIR, 2009, p. 880). Temos aqui uma percepção de mundo cuja qual Beauvoir irá no futuro criticar. Após conviver com homens de esquerda, principalmente durante o período em que Sartre financiou as guerrilhas de Che Guevara. Acreditamos que após ter mantido um contato com homens declaradamente de esquerda, a autora tenha reconhecido neles princípios do patriarcado, percebendo que o que antes parecia ser uma consequência política, estava muito mais enraizada sendo também moral, sendo o patriarcado também moral. Nós veremos ao longo da dissertação o que é a moral para a autora, aqui queremos ressaltar este outro viés do problema trazido por ela. Entretanto, não podemos deixar de concordar com a autora de que uma evolução do sistema capitalista ao socialista, talvez permitisse – quem sabe – um diálogo mais aberto e não tão conservador quando se tratasse da situação feminina no mundo. De qualquer forma, o problema é tão demasiado moral, que para os homens do século XX, haveria uma série de requisitos para que uma mulher ousasse assemelhar-se a ele enquanto ser humano: Os misóginos criticaram muitas vezes as mulheres de ação por “se negligenciarem”; mas também lhes pregaram que se quisessem ser iguais a eles deveriam deixar de se maquiar e de pintar as unhas. Este conselho é absurdo. A ideia de feminilidade impõe-se de fora a toda mulher, precisamente porque se define artificialmente pelos costumes e pelas modas; ela pode evoluir de maneira que os cânones se aproximem dos que adotem os homens; (...) Recusando atributos femininos, não se adquirem atributos viris; mesmo a travestida não consegue fazer-se homem; é uma travestida. Vimos que a homossexualidade constitui, ela também, uma especificação: a neutralidade é impossível (BEAUVOIR, 2009, p. 882). É um paradoxo que seja exigido às mulheres que Beauvoir chama de “mulheres de ação”, um comportamento contrário à educação ou aos costumes pelos quais foram criadas. O absurdo constitui-se que: considerando o homem o polo neutro e positivo dos seres humanos, a mulher deveria também atingir esse patamar para que antes pudesse reivindicar o que fosse. Mas como bem estamos vendo, essa aproximação não só é impossível na medida em que se distingue o binarismo de gêneros durante toda uma vida e por diversas gerações – constituição social elaborada assim por homens – para que o discurso de uma mulher possa vir a ter validade aos olhos masculinos. Beauvoir ressalta, portanto, que nem mulheres e muito menos os homens conseguem atingir esse patamar de neutralidade imposto apenas ao sexo oprimido. Sabemos bem, de acordo com a tradição existencialista, que ninguém pode vir a ser considerado neutro na medida em que cada Ser existe inserido no mundo por um âmbito fenomenológico, e cria-se em uma situação; tal situação pode sim e com certeza irá orientar uma escolha em detrimento de outra e assim por diante. Então como poderemos querer salvar a sociedade, e como Beauvoir busca dar essa resposta?! A princípio, deve-se evidenciar que o ensino das mulheres é muito inferior ao dos homens. Apenas através de uma igualdade de possibilidades é que se pode cobrar do sexo feminino alguma igualdade. Em segundo, deve-se perceber que ser mulher não é um defeito natural: é apenas uma distinção sexual que em uma sociedade moderna não representa impossibilidade alguma. Ser mulher não é possuir um defeito, mas apenas uma singularidade conforme Beauvoir aponta. Na medida em que a mulher ainda está se descobrindo, começando aos poucos a buscar seus direitos de igualdade, deve fugir dos clichês sociais na busca de ações engajadas; por esta razão, a filósofa afirma que “a

Essa pergunta também está no material:

Artigo - SIMONE DE BEAUVOIR E A LIBERTAÇÃO DA MULHER
102 pág.

Psicologia Universidade Estácio de SáUniversidade Estácio de Sá

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