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O Outro no Eu: Perspectiva Interaccional


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HELENA MARIA AMARAL DO ESPÍRITO SANTO
O OUTRO NO EU 
Uma Perspectiva Interaccional do Distúrbio de 
Personalidade 
FACULDADE DE PSICOLOGIA E DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO
UNIVERSIDADE DE COIMBRA
1996
O OUTRO NO EU 
Uma Perspectiva Interaccional do Distúrbio de Personalidade 
HELENA MARIA AMARAL DO ESPIRITO SANTO
O OUTRO NO EU 
Uma Perspectiva Interaccional do Distúrbio de 
Personalidade 
FACULDADE DE PSICOLOGIA E DE CIENCIAS DA EDUCAÇÃO
UNIVERSIDADE DE COIMBRA
1996
Dissertação de tese de Mestrado em Psicologia 
Clínica do Desenvolvimento apresentada à 
Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da 
Universidade de Coimbra
Realizada sob a orientação do Sr. Prof. Doutor José 
Luís Pio de Abreu
Capa: Figura-fundo reversível. O ser humano em interacção pode ser visto de 
pontos de vista diferentes. Ver de diferentes pontos de vista dá origem a 
descrições diferentes; as descrições dão origem a teorias diferentes e as teorias 
dão origem a acções diferentes (Laing, 1969)
AOS MEUS PAIS
AO MEU MARIDO
AO PROF. DOUTOR JOSÉ LUÍS PIO DE ABREU
Introdução
A viagem ao domínio da patologia da Personalidade tem, 
necessariamente, de fazer o desvio pela Psicologia da Personalidade. 
Este desvio à área científica da Personalidade está, por seu turno, ligado 
à História das Ideias, à confluência eterna da epistemologia (como 
conhecemos), ontologia (o que tentamos conhecer), intersubjectividade 
individual (o conhecedor e o processo de conhecer) e à fenomenologia (o que 
vivenciamos) (Mahoney, 1991). 
O problema é que cada personalidade é um processo epistémico e 
experiencial único e, nesse sentido, este desvio passará sempre pela 
incorporação humana, pela experiência emocional. Quer com isto dizer-se, 
quando fazemos a pergunta: "O que é a personalidade?", não será melhor 
perguntarmos: "Quais as nossas ideias de Personalidade?". Ao dar resposta a 
esta pergunta não se encontra uma ideia, mas várias. As ideias sobre a 
Personalidade envolvem, de forma problemática, crenças sobre o que somos. 
Para além destas, as nossas ideias sobre nós próprios envolvem ideias sobre o 
que gostaríamos de ser e sobre o que deveríamos ser. Com isto pretende 
precaver-se que aos diversos autores e a nós mesmos não deixarão de estar 
implicitamente envolvidas as nossas auto-imagens e os nossos auto-ideais. 
Como diz Pirandello:
" (...) nascemos com um privilégio miserável, o de nos sentirmos 
vivos, com a grande ilusão resultante: que é a de tomar como 
realidade externa o que é de facto um sentimento interno de vida, e 
é mutável e variável, de acordo com os tempos, a nossa situação e 
a nossa sorte".
Corre-se conscientemente este risco, mantendo em vista a solução que 
será a abertura à intersubjectividade. Mas não creio que a perspectiva 
subjectiva/introspectiva apresente somente aspectos negativos. Segundo Harter 
(1983) a maior parte da investigação sobre a personalidade tem sido focada na 
personalidade como objecto, em vez do self como sujeito. A via da 
introspecção pode ser, de facto, uma via heurística. Na realidade, foi da 
reflexão sobre a minha prática clínica, das relações com os meus pacientes, da 
análise da minha contra-transferência que se levantaram algumas das minhas 
2
questões. Em conjunção com a revisão bibliográfica elas corporizaram-se em 
hipóteses. 
1.1. Situação problema
Os pontos de debate actuais relativamente ao domínio do distúrbio de 
personalidade são vários, provindo de diversos quadros teóricos. 
Este domínio foi durante muito tempo campo privilegiado da 
psicopatologia. Reconhecido, entretanto, que o conceito de personalidade pode 
ser evidenciado pelos aspectos mais estáveis e mais previsíveis da pessoa 
(Burger, 1993; Millon, 1981, 1994; Safran et al., 1992; Mahoney, 1991; Nuttin, 
1952; Beck, 1990) ampliaram-se largamente os limites da psicopatologia. 
Deste modo, disciplinas como a Psicologia têm igualmente procurado na 
descrição da personalidade o seu sentido de identidade e continuidade.
Se os modelos teóricos são vários, para diversos autores o conceito de 
Distúrbio de Personalidade permanece uma designação com pouca 
credibilidade, pouco fidedigno, com pouco suporte validativo e pouco 
investigado (Frances, 1980). No nosso entender estes aspectos foram já 
parcialmente ultrapassados. Ultimamente tem-se vindo a descobrir que estes 
distúrbios são uma componente major dos distúrbios mentais (Millon, 1994). 
Nos últimos tempos, trabalhos das mais diversas áreas vieram abrir caminho 
para uma nova concertação na conceptualização dos Distúrbios de 
Personalidade. Em grande parte, a flexibilidade do conceito de Distúrbio de 
Personalidade deve-se ao casamento bem sucedido de perspectivas 
aparentemente opostas. A chave do sucesso do casamento foi o distúrbio 
"borderline". De facto, o distúrbio borderline permeia toda a literatura sobre 
distúrbio de personalidade.
1.2. Objectivo/interesse do estudo
Na prática clínica deparamo-nos com o distúrbio de personalidade 
como diagnóstico de último recurso. O problema do doente que foi avaliado, 
médica ou psicologicamente e tratado sem uma resposta favorável, é 
frequentemente reformulado com o diagnóstico primário de Distúrbio de 
O outro no Eu Problema 2
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Personalidade (D.P.). E quando este diagnóstico é feito, é o começo de novos 
problemas. Com ele são arrastados julgamentos de valor, o comportamento é 
percebido como deliberadamente difícil, malicioso ou manipulativo. Em última 
instância, as pessoas com este problema continuam a mostrar aos profissionais 
de saúde mental os seus limites e a envolver o seu senso de competência 
profissional. Adicionalmente, uma literatura crescente indica que a presença de 
D.P. tende a afectar a apresentação, curso e tratamento de distúrbios do Eixo I 
(Hills, 1995). O interesse por esta temática partiu daqui. No entanto, o seu 
objectivo não se prende tanto com questões de natureza empírica, mas com a 
procura de uma formulação teórica fundamentada na revisão monográfica e em 
investigação de campo.
O objectivo deste estudo consiste em tentar descobrir se determinado 
tipo de factores (relacionais) poderão estar envolvidos no desenvolvimento e 
manutenção de um distúrbio de personalidade. O interesse desta procura 
prende-se com a preocupação em contribuir com novas pistas que alterem o 
estado de coisas entre os profissionais de saúde.
1. 3. Questões a investigar
Em Portugal não existe um instrumento que complemente o diagnóstico 
clínico do Distúrbio de Personalidade. Por esse motivo, a primeira parte da 
nossa investigação consistiu em traduzir e aplicar um inventário que nos 
permitisse atingir esse objectivo (MCMI-III, Millon Clinical Multiaxial 
Inventory -III). Em segundo lugar procurámos investigar os desvios entre a 
imagem que o sujeito tem de si, a imagem dos outros sobre o sujeito e a ideia 
do sujeito da imagem que os outros fazem de si. Com esta investigação 
procura-se determinar a diferença entre as pessoas com patologia da 
Personalidade e sem patologia da personalidade.
1. 4. Delimitação
O trabalho de aplicação do inventário para a população portuguesa foi 
bastante limitado, pois não era nossa pretensão fazer um trabalho de aferição, 
mas tão somente complementar o diagnóstico clínico com um instrumento 
O outro no Eu Problema 3
Helena Espirito Santo! ! 1996
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externo. Adicionalmente, com este inventário, e a par com o diagnóstico 
clínico, pretendíamos simplesmente determinar a presença de distúrbio de 
Personalidade e não o tipo de patologia — aspecto específico do MCMI-III.
Outro limite da nossa investigação prende-se com o número de 
elementos das nossas amostras da segunda parte da investigação.Este aspecto 
resultou da nossa preocupação em dar representatividade semelhante a todos os 
distúrbios de personalidade na nossa amostra experimental. Pretendíamos 
evitar com esta semelhança que houvesse vieses nos resultados. 
1. 5. Organização do estudo
No nosso trabalho iremos procurar tentar salientar a passagem de uma 
centralização na personalidade isolada para uma personalidade 
contextualizada. Seguimos de perto as abordagens mais recentes da perspectiva 
cognitivo-comportamental que procuram sintetizar outros modelos: o da 
vinculação, psicanalítico e interpessoal. Procuramos nestes as contribuições 
que convergem na integração dos factores cognitivos, afectivos, 
comportamentais e interpessoais numa perspectiva de desenvolvimento.
 Assim, no 2º capítulo iremos fazer este percurso ao longo do tema da 
Personalidade. Primeiro, ao longo das abordagens teóricas: desde as 
abordagens empíricas (personalidade isolada) às relacionais (personalidade 
contextualizada). Depois através da distrinça de conceitos aparentemente 
análogos aos da personalidade. Continuamos através da referência ao 
desenvolvimento do Eu. Enfatizamos a passagem na relação entre o "Eu e o 
Outro". E concluímos no "O Outro no Eu".
No capítulo III, referente à Personalidade Patológica, a transição resulta 
mais indirecta. Iremos debruçarmo-nos sobre as abordagens teóricas e sua 
evolução, sobre questões conceptuais e abordagens explicativas actuais, que, a 
finalizar, reuniremos numa integração teórica.
Na segunda parte do nosso trabalho tentaremos mostrar a transição a que 
temos vindo a fazer referência através da investigação prática. Procuraremos 
demonstrar as nossas hipóteses de que:
O outro no Eu Problema 4
Helena Espirito Santo! ! 1996
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— no distúrbio de personalidade (D.P.) a maneira como se vêem é 
diferente da maneira como os outros os vêem.
— no D.P. o modo como pensam que os outros o vêem tem semelhanças 
com a maneira como os vêem realmente.
— nas pessoas sem D.P. a maneira como se vêem é semelhante à maneira 
como os outros os vêem.
— nas pessoas sem D.P. o modo como pensam que os outros o vêem é 
diferente da maneira como os vêem realmente.
Com estas hipóteses em vista, esta 2ª parte divide-se no capítulo IV, onde 
referimos as nossas hipóteses e metodologia empregue. No capítulo V 
apresentam-se os resultados e sua discussão. Finalmente, no capítulo VI 
apresentaremos as nossas conclusões. 
O outro no Eu Problema 5
Helena Espirito Santo! ! 1996
Para se compreender a si próprio, o homem precisa de ser 
compreendido pelo seu semelhante. Para ser compreendido 
pelo 
seu semelhante, precisa de o compreender
(Hora, 1959)
Introdução
A palavra "Personalidade" deriva do termo grego persona 
(προσϖπον) que originalmente significava a Máscara usada pelos 
actores dramáticos. Com este significado é sugerida uma aparência 
determinada, i.e., um conjunto determinado de traços que não tem 
nada a ver com o indivíduo que está por detrás da máscara.
Ao longo do tempo o termo persona foi perdendo o seu 
significado de aparência e adquirindo um novo significado. Deixou de 
representar a máscara, para passar a significar a pessoa real com as 
suas características manifestas e explícitas. Finalmente assiste-se à 
passagem deste significado, aliado à impressão superficial, para as 
qualidades internas e menos explícitas do indivíduo. 
Quando se estuda a Personalidade em Psicologia, existe 
implicitamente a aceitação da noção de individualidade. 
O constructo científico de Personalidade não designa um 
indivíduo concreto, mas pressupõe, pela sua própria definição, que 
cada indivíduo é único e distinto dos outros. Indivíduo (do lat. 
individuu- "indivisível, inseparável", não dividido) é o exemplar 
concreto de qualquer espécie de ser vivo. Não se aplica a objectos 
inertes. O que significa que a noção de indivíduo já implica certo grau 
de unidade e organização. É um todo, não divisível, distinto dos 
outros (Nuttin, 1965).
O outro no Eu! Personalidade 6
Helena Espirito Santo! 1996
Esta consciencialização e afirmação de individualidade não 
apresentou sempre as mesmas significações. 
Nesse sentido, a História das Ideias pode dar a ajuda 
indispensável para determinar a evolução do conceito. Para além desta 
determinação, o aspecto heurístico da abordagem histórica é sempre 
de valorizar, no sentido de fundamentar depois uma escolha 
conceptual.
A emergência da noção do indivíduo como fenómeno único e, 
decorrente daí, da noção de privacidade, foi um fenómeno gradual, 
remontando as suas origens aos tempos pagãos. As ideias originais 
sobre individualidade e experiência pessoal assentam nas tradições 
espirituais de, praticamente, todas as culturas e de algumas épocas. A 
"alma" de cada pessoa foi sempre a expressão sagrada de uma 
existência unificada. 
De acordo com a investigação histórica de Ariès e Duby (1990), 
do século X ao século XIII não existia a noção de privacidade como a 
entendemos hoje: era comum nas residências feudais a inexistência de 
divisões na casa para os cuidados individuais.
Nos finais do século XII emergem crescentemente sinais de 
desejo de liberdade e de autonomia. Se, por um lado, o Cristianismo 
enfatiza o serviço activo e a transformação da pessoa através de 
expressões ritualizadas, por outro, há uma nova emergência do 
Humanismo e sinais diversos de individualidade corporizada em 
responsabilidade legal. 
Só com o Renascimento se assiste ao florescer da ideia, ainda 
hoje actual, da pessoa como um processo único de vida.
No século XVIII considera-se o individualismo como um 
obstáculo ao progresso e um sintoma de egoísmo (semelhante ao 
preconizado pelos Epicuristas e Estóicos) que impediria a liberdade e 
ordem social. Como expressão crítica particular desta ideia, 
presenciamos a advertência dos pensadores franceses para o 
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Helena Espirito Santo! 1996
individualismo como um inimigo da liberdade, que traria como 
resultado a retirada dos cidadãos da vida pública e a vida pública dos 
cidadãos, culminando na destruição da ordem social.
No século XIX ganham finalmente terreno, com o ideal 
romântico Alemão, as ideias de unicidade pessoal, de originalidade e 
desenvolvimento pessoal.
Podemos, assim, distinguir entre uma concepção pré-moderna 
do indivíduo, enquanto definido pelos seus papéis no interior da 
comunidade e pelas relações entre esses papéis (pessoa heterónoma). 
E podemos também falar de uma concepção moderna do indivíduo, 
enquanto independente e antecedente à comunidade (pessoa 
autónoma). Esta concepção moderna, de raiz iluminista e liberal, 
atribui ao homem liberdade de escolha e faz dele um ser autónomo, 
responsável e independente dos constrangimentos que o cercam 
(Sampson, 1989).
A Individualidade passa a assumir, simultaneamente, vários 
significados: egoísmo oposto à vida colectiva; a natureza biológica e 
genética dos sistemas vivos; aspectos recursivos fundamentais e auto-
descritivos da reflexão pessoal e, ainda, a apreciação das diferenças 
individuais e suas expressões diversas (Mahoney, 1991).
Finalmente, só actualmente se presencia à inclusão, 
aparentemente inconciliável, do indivíduo no seu sistema social e do 
sistema social no indivíduo.
1. Abordagens teóricas
Um dos problemas mais perenes que se tem colocado ao ser 
humano é o carácter enigmático da natureza humana. Uma das 
dificuldadesem obter uma resposta clara prende-se, provavelmente, 
com a enorme variedade de diferenças entre nós. Desta variedade é 
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Helena Espirito Santo! 1996
particularmente difícil identificar os aspectos partilhados comuns nos 
membros da raça humana. Simultaneamente, todos nós temos 
tendência para caracterizar os outros com qualidades e traços de 
carácter particulares. Uma hipótese explicativa é a de estarmos a dizer 
a nós próprios como nos comportarmos de acordo com as descrições 
que fazemos. Parece ser próprio do raciocínio humano tentar 
encontrar explicações causais que vão só numa direcção, i.e., tentar 
fazer previsões (Kelly, 1963). A Astrologia, Teologia, Filosofia, 
Literatura e Ciências Humanas representam algumas das direcções no 
caminho da compreensão da natureza humana. Na Psicologia os 
caminhos têm também sido vários. Iremos tentar descrevê-los, 
agrupando-os no que designamos por perspectivas empíricas e por 
perspectivas relacionais. Esta forma de agrupar as diversas teorias 
explicativas prende-se com o nosso próprio fio condutor: caminhar da 
focalização de um Self isolado e totalizante, para um Self 
descentralizado. Dito por outras palavras, para a contextualização do 
Self.
1.1. Perspectivas Empíricas 
Nestas perspectivas a Personalidade é compreendida como a 
soma, associação, síntese integradora de elementos diferentes que 
podem ser avaliados isoladamente. A verificação da frequência, 
regularidade ou constância de certas características permite o 
estabelecimento de classes ou tipos. 
Nesta formulação incluem-se as tipologias, as concepções 
baseadas no conceito de traço e as teorias factoriais. É uma 
perspectivação da Personalidade como objecto.
Tipos Categoriais versus Traços dimensionais. O conceito de 
tipo de Personalidade (tal como é usado por Kretschmer e Jung) 
costuma ser contrastado com o conceito de traço de Personalidade 
O outro no Eu! Personalidade 9
Helena Espirito Santo! 1996
(Eysenck, 1970). Tem sido sugerido que perspectivar a Personalidade 
como tipo implica uma forma bimodal de distribuição e a perspectiva 
do traço relaciona-se com uma forma unimodal. Talvez possamos, no 
entanto, considerar esta dicotomia falaciosa (Eysenck, 1970) como 
decorre das noções de traço e de tipo.
Para Nuttin (1965) traço de Personalidade é uma inferência a 
partir da constância, estabilidade ou consistência das formas de 
comportamento de um indivíduo. Pode definir-se como disposição, 
quer adquirida, quer hereditária, da Personalidade, conhecida a partir 
das formas de comportamento relativamente estáveis. Sob a 
multiplicidade de comportamentos e características que distinguem os 
indivíduos, existem dimensões mais fundamentais que subjazem a 
essas diferenças e que as remetem para uma certa unidade estrutural. 
Essas dimensões essenciais não se manifestam em traços isolados, 
mas sim em conjuntos de maneiras de ser e de agir. O tipo refere-se a 
esses aspectos diferenciais da Personalidade. Resultam da correlação 
de traços (Nuttin, 1965). Por outras palavras, um tipo de 
Personalidade abarca um grupo de componentes (“traços”). Daqui se 
depreende que as duas noções são interdependentes.
Passemos agora a cada uma das abordagens. A primeira 
tentativa de classificação de comportamentos e consequentemente 
procura de previsão foi desenvolvida pelos sistemas tipológicos. A 
tipologia parte de uma apreensão global e intuitiva do núcleo central 
da estrutura da Personalidade, enriquecida depois por dados 
quantitativos, colocando sempre a ênfase na dependência de cada 
elemento em relação à totalidade da estrutura. Numa primeira 
integração intuitiva, identificam-se os grupos de comportamentos 
habituais ou traços. Pondera-se quantitativamente a força do vínculo 
que os une (coeficiente de correlação). Essa coesão de certos traços, 
que se opõe a outros conjuntos de traços, é reveladora da organização 
interna. Estas relações são concebidas num quadro gestaltista de 
O outro no Eu! Personalidade 10
Helena Espirito Santo! 1996
dependência de cada traço em relação à totalidade da Personalidade, 
ou a uma das dimensões fundamentais. Assim, seleccionam-se 
características centrais que exemplificam e categorizam tipos de 
personalidade. De facto, pretende-se reduzir as características 
diferenciais da personalidade às suas dimensões essenciais 
(habitualmente bipolares). A tipologia permite situar o indivíduo em 
relação a um ponto de referência. Mas não admite classificá-lo numa 
categoria bem definida. Ao invés, autoriza evocar um contexto 
provável para cada um dos traços de Personalidade. 
A análise dimensional presta atenção especial aos aspectos 
estruturais e estáveis, i.e., pesquisa determinado número de traços de 
forma a descrever a personalidade e explicar o comportamento e sua 
consistência. É o estudo quantitativo da Personalidade em termos de 
correlações e de factores. Não recusa completamente a noção de tipo. 
O tipo é um ponto limítrofe que se determina partindo do estudo das 
constâncias nos comportamentos individuais, o que fornece os 
conjuntos de comportamentos habituais. Certos comportamentos 
habituais agrupam-se em traços, através do cálculo das correlações e 
análise factorial. Diversos traços organizam-se, por seu lado, em tipos, 
que de uma análise mais extensa, permite obter factores de ordem 
mais geral (é o exemplo dos trabalhos de Eysenck e de Jung). Apesar 
de diferentes perspectivas terem proposto diferentes números e classes 
de traços, parece ter sido atingido algum consenso nos últimos anos 
com o modelo das 5 dimensões ("Big Five").
É explícito neste modelo que a pessoa revela consistência no 
seu comportamento. Vozes dissonantes, no entanto, têm-se ouvido. 
Para Mischel (1968) não é possível prever só através do conhecimento 
dos traços de Personalidade de um indivíduo, o modo como esse 
indivíduo reagirá exactamente numa dada situação específica. Essa 
impossibilidade decorre da variação do comportamento através das 
situações. De facto, o autor descobriu que as correlações para o 
O outro no Eu! Personalidade 11
Helena Espirito Santo! 1996
mesmo traço em situações diferentes eram bastante baixas. Esta 
impossibilidade levou a considerar que a descrição de uma pessoa 
através de traços é relativamente inútil, porque se correlaciona pouco 
com o modo como esse indivíduo se comporta ao longo de uma vasta 
gama de situações e também porque a descrição por traços sugere que 
não existem variáveis independentes que possam ser manipuladas de 
forma a permitir controlar o comportamento. Para este autor, o 
comportamento de alguém numa dada situação só poderá ser 
compreendido em termos do complexo de estímulos que essas 
situações apresentam nesse momento e pela história prévia da 
aprendizagem realizada por esse indivíduo em situações semelhantes 
(Mischel, 1968).1 A bem conhecida publicação de Mischel de 1968 
foi a responsável pela crise profunda numa psicologia da 
personalidade que até à década de sessenta foi de grande esplendor 
(Palenzuela, Barros, 1993). Daqui desencadeou-se um debate 
profundo entre os defensores dos traços e os que enfatizavam os 
factores situacionais na determinação do comportamento. Este debate 
entre personalistas e situacionistas deu origem à perspectivade 
solução que foi a interaccional. Um destes trabalhos foi o do próprio 
Mischel em 1973.
Outro dos limites apontados ao modelo dos traços refere-se ao 
pequeno acordo relativamente ao número de dimensões (desde uma a 
O outro no Eu! Personalidade 12
Helena Espirito Santo! 1996
1 A investigação parece assim revelar que não há consistência do comportamento. No entanto, a nossa 
intuição diz-nos que sim. Quem tem razão? Investigações em Psicologa social vêm lançar alguma luz 
sobre este paradoxo (Atkinson, et al., 1993). Estas investigações debruçam-se sobre os processos de 
inferência social, tendo revelado um grande número de distorções nas nossas capacidades para fazer 
juízos válidos a partir dos dados quotidianos da nossa experiência. Apesar destas investigações, alguns 
autores mantêm a ideia de que as nossa intuições captam a realidade da personalidade de modo mais fiel 
que a investigação (Vide Atkinson, et al., 1993). A primeira solução vem da perspectiva de Allport (1963) 
— a solução centrada-na-pessoa. Allport acreditava que nos devíamos preocupar mais com o padrão 
único de traços individuais do que com a comparação de traços comuns (abordagem idiográfica vs. 
nomotética). As nossas intuições pessoais parecem seguir a estratégia centrada-na-pessoa. Outra solução 
vem da crítica aos estudos que encontram uma consistência pequena do comportamento entre situações 
diferentes. Estes estudos baseiam-se só em uma ou duas medidas do comportamento.Seria mais correcto 
se se combinassem várias medidas comportamentais do mesmo traço (Atkinson, et al., 1993). 
trinta e três ou mais), não esquecendo que um grande número de 
traços se torna de difícil compreensão, dado o seu grau de 
complexidade (Millon, 1981). Esta posição é considerada demasiado 
radical pelas teorias da personalidade que argumentam ser possível 
prever com alguma segurança o modo como a maioria das pessoas 
com determinados traços de personalidade reagirão na maioria das 
situações. Para Nuttin (1965), por exemplo, não se procura classificar 
a personalidade segundo duas ou três classes, conforme se possua ou 
não um grau médio de determinada característica. E considera que 
essa concepção simplista é desmentida pelos estudos quantitativos e 
estatísticos das diferenças interindividuais, que mostram a distribuição 
contínua das diferenças quanto aos traços físicos e psíquicos. Não se 
trata do estabelecimento de algumas classes em função da ausência ou 
presença de um traço preciso, mas antes da integração de uma 
variedade de maneiras de ser e de agir numa forma dominante que 
serve de ponto de referência para cada indivíduo, conforme ele se 
distancie ou se aproxime dele. Já Millon (1981) lista algumas 
vantagens. Referimos as mais importantes: é possível obter a 
combinação das várias características num perfil único; é dada atenção 
a todos os traços (ao inverso da tipologia que só se dedica a traços 
únicos); o perfil dos traços permite a inclusão de casos invulgares ou 
atípicos (enquanto na tipologia é posto de lado o que não se encaixa 
nas categorias); permite a representação da individualidade e 
singularidade e permite uma conceptualização da normalidade e 
patologia numa relação de continuidade.
Em conclusão, as perspectivas apresentadas permitem o estudo 
das diferenças individuais. Todavia, não permitem a descrição da 
individualidade da pessoa ou das particularidades da sua história. A 
sua inclusão no nosso trabalho justifica-se pela distinção que 
procuraremos fazer entre pessoas sem distúrbio de personalidade e 
com distúrbio de personalidade.
O outro no Eu! Personalidade 13
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1.2. Perspectivas Relacionais
A Personalidade, nesta visão, é entendida como o sistema de 
relações organismo-mundo. Aqui podemos situar a Psicanálise a teoria 
da Gestalt, as teorias da Aprendizagem social, entre outras. Estas 
teorias constituem o modelo que guia o nosso estudo.
Na viragem do século alguns cientistas sociais fizeram notar a 
importância da interacção social na adaptação e sobrevivência — daí 
desenvolver-se mais tarde a perspectiva do interaccionismo simbólico. 
1.2.1. Personalidade como espelho
Os principais autores que desenvolveram uma noção de 
Personalidade como um espelho foram James, Baldwin, George H. 
Mead, Charles H. Cooley. Para estes a Personalidade é o produto da 
imitação, internalização e inferências sugeridas por aquilo que 
acreditamos serem as percepções e avaliações de nós feitas pelos 
outros. Por outras palavras, as avaliações que o indivíduo faz de si 
próprio, as auto-avaliações, são construídas a partir de avaliações 
reflectidas, i.e., das avaliações que os outros formulam ao seu próprio 
comportamento específico. O conceito que a pessoa faz de si (auto-
conceito) seria uma espécie de fenómeno em espelho em que o 
indivíduo, ao ver-se a si próprio, tende a observar-se como os outros o 
olham. Cooley e Mead estão mais ligados a um interaccionismo 
simbólico e à noção de que um espelho social cria a Personalidade. 
Cooley (1902), mais especificamente, propôs o "looking glass Self" 
como metáfora de como o conceito de si mesmo é determinado pelas 
perspectivas dos outros.2 Baldwin põe a tónica nos processos 
interpessoais e vicariantes na aprendizagem social, promovendo a 
fundação da teoria da Aprendizagem social (ref. por Mahoney, 1991). 
O outro no Eu! Personalidade 14
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2 Como diz Pio de Abreu (1993, p. 87): "É este ver-se através dos olhos dos outros que lhe dá o modelo 
de si próprio, do seu auto-conceito ou do seu ego."
Estes autores afirmam que as pessoas parecem sentir que a sua 
identidade requer validação dos outros para que lhes seja dada 
realidade social. Vários teóricos e investigadores confirmaram 
posteriormente que as percepções dos outros constituem uma parte 
importante do Eu e que exercem uma influência forte sobre as 
concepções que o indivíduo tem de si (Tice, 1992).
No entanto, Shraver e Schoeneman (1979) consideram como 
parcialmente verdadeira a afirmação de que as nossas avaliações 
pessoais reflectem as respostas e avaliações dos outros. Os autores 
revêem 50 estudos nesta área e comprovam que as auto-percepções 
dos indivíduos concordam com a forma como pensam que os outros 
os percebem. No entanto, há uma concordância fraca entre a forma 
como uma pessoa se percebe e é percebida pelos outros. Também é 
preciso ter em conta que as avaliações dos outros não terão valor 
igual. Nem todos serão pessoas significativas para determinado 
indivíduo (Gecas, 1982). Acrescente-se ainda que as avaliações 
pessoais podem não ser apenas avaliações reflectidas. Algumas vezes 
são fruto de comparações sociais. O indivíduo pode comparar-se a um 
grupo que é para si fonte de normas e valores — grupo normativo— 
ou a um grupo que lhe dá os padrões de auto-avaliação — grupo 
comparativo. Outras vezes as percepções do indivíduo a seu respeito 
são influenciadas pela atribuição feita ao próprio comportamento 
observável (Vaz Serra, 1986).
Para Broughton (1986) e outros críticos esta perspectiva da 
Personalidade como espelho poderia correr o risco de perder de vista 
o Eu individual, confundir percepções com a existência global e 
alhear-se do contexto e história pessoal. A unicidade activa e 
construtiva da Personalidade seria perdida, em detrimento de um 
convencionalismo internalizado.
Gostaria, apesar destas críticas, de reafirmar a importância desta 
ideia para a fundamentaçãodas hipóteses deste trabalho. 
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Ainda que as hipóteses não se confirmem, não gostaria de deixar 
de referir com Harré (1984) que esta ideia tem o valor de, 
implicitamente, referir a importância do relacionamento social na 
forma e existência da Personalidade.
1.2.2. Personalidade como pessoa social
Num sentido um pouco diferente, encontra-se ainda a ideia de 
que o ambiente social seria o contexto primário para o 
desenvolvimento da identidade. 
Neste sentido a Personalidade seria uma pessoa social. Sendo o 
auto-conhecimento central para a identidade, este requereria uma 
interacção com outros da mesma "família sistémica". A fundamentar 
esta ideia estariam os estudos demonstrativos de uma relação entre 
problemas de socialização primária e uma auto-consciência tardia e 
enfraquecida. 
Exemplo disto, vindo da experimentação animal, é o de 
macacos criados em isolamento completo e que não se reconhecem ao 
espelho. Poder-se-á concluir que o desenvolvimento do auto-
conhecimento requer a interacção com outros elementos da mesma 
família sistémica (Mahoney, 1991). Conclusão semelhante tem sido 
referida para a possibilidade de dar consciência aos computadores: 
colocar dois sistemas em interacção, de forma a que um dê 
informação retroactiva sobre o que se passa no interior do outro. Um 
dos sistemas (Cérebro-A) actua no mundo exterior, enquanto o outro 
sistema (Cérebro-B) vê e influencia o que se passa no interior de A 
(Ver Figura 1) (Minsky, 1986).
O outro no Eu! Personalidade 16
Helena Espirito Santo! 1996
MUNDO CÉREBRO-A CÉREBRO-B
Figura. 1. Representação do modo de dar consciência a uma "mente" sem que esta 
perca o contacto com a realidade (Minsky, 1986).
Dentro desta perspectiva há visões mais radicais, em que a 
Personalidade é vista como um repertório de máscaras que vão sendo 
mudadas para se adaptar a diferentes contextos sociais. A ênfase é 
colocada na influência dos contextos sociais nas representações do Eu. 
A percepção de si pela pessoa é mediada pela consciência e 
sensibilidade do indivíduo ao reconhecimento pelo outro (Mahoney, 
1991).
Na teoria Psicanalítica a Personalidade assume também uma 
perspectiva relacional. Encontramos em Freud o reconhecimento de 
que a percepção e vivenciação de interacções significativas com os 
outros afectam a estrutura intrapsíquica. Já em 1895 refere a 
importância das experiência de gratificação ou frustração face ao 
objecto na duração de lembranças. O autor explica, à luz dos seus 
modelos do trauma-afecto e topográfico, que o objecto é o veículo 
através do qual é procurada e obtida a gratificação do impulso. O 
objecto é vivenciado no início da vida em relação à satisfação 
libidinal; à medida que ocorrem as lembranças das interacções os 
impulsos instintivos passam rapidamente da procura de prazer para a 
busca do objecto. Em 1914 Freud refere que as quantidades da energia 
psíquica (líbido) são limitadas, podendo ser primariamente investidas 
em nós ("catexia do Ego") ou nos outros ("Objecto de amor"). É de 
salientar que para Freud o interesse por si próprio e o cuidado pelos 
O outro no Eu! Personalidade 17
Helena Espirito Santo! 1996
outros são inversamente proporcionais. O autor acreditava que as 
pessoas que se preocupavam demasiado consigo próprias, teriam 
pouca energia psíquica para investir em relacionamentos importantes.
Ao propôr o seu modelo estrutural, Freud altera o sentido do 
conceito de objecto: este deixa de ter um papel secundário (mero 
gratificador de impulsos), para passar a ter um papel central. As 
identificações ao objecto tornam-se centrais na formação do Ego e do 
Superego (Freud, 1923). O próprio conceito Freudiano de "Complexo 
de Édipo" é uma ilustração inequívoca da importância que Freud 
atribui às relações interpessoais na estruturação e no desenvolvimento 
da Personalidade. O autor psicanalítico ao rever a sua teoria da 
ansiedade em 1926 apresenta-nos um acréscimo a estas ideias. 
Observa que no início "quando a criança descobre pela experiência 
que um objecto externo e perceptível pode terminar com a situação 
perigosa (…) o conteúdo do perigo que ele teme é deslocado da 
situação (…) para a condição que determinou esta situação, a perda do 
objecto" (p. 137-138). O objecto tem a função de regular a ansiedade. 
Finalmente ele acrescenta que o abandono e dependência da primeira 
infância estabelecem estas "situações precoces de perigo e criam a 
necessidade de ser amado, que irá acompanhar a criança para o resto 
da sua vida" (p. 155). Esta afirmação revela que o autor vê as 
experiências relacionadas com o objecto e as experiências de 
gratificação libidinal como sendo igualmente relevantes para a 
formação da estrutura psíquica e o desenvolvimento óptimo e sugere 
que as duas estão ligadas através de experiências de amor ou de medo 
e ansiedade. Nas teorizações pós-freudianas, com a teoria das 
Relações Objectais3 a dimensão relacional parece ainda mais evidente. 
O outro no Eu! Personalidade 18
Helena Espirito Santo! 1996
3 Será útil manter aqui a distinção entre as relações interpessoais e as relações de objecto. A primeira diz 
respeito às interacções reais com as pessoas. A segunda tem a ver com as dimensões intrapsíquicas da 
experiência com os outros, i.e., refere-se à representação mental do Self e dos outros e da função de cada 
um destes com as suas interacções ( Tyson, Tyson, 1993).
Melanie Klein foi a sua precursora. A partir das análises que fez 
de crianças concluiu pela importância das relações de objecto pré-
edípicas precoces. Para esta autora o primeiro objecto que existe na 
mente do bebé é o seio da mãe, tendo este uma existência separada do 
Self desde o início. O bebé seria dominado por instintos (instintos de 
vida e de morte), e estes ligar-se-iam ao seio. O seio da mãe 
assumiria, deste modo, dois sentidos: o seio bom e o seio mau. A 
referência a Klein justifica-se aqui pelo facto de ter sido pioneira nesta 
afirmação da internalização de objectos significativos como base do 
relacionamento interpessoal. Contudo, não nos deteremos mais, pois 
existe pouca coisa na sua teoria que esclareça os efeitos da acção do 
objecto no desenvolvimento (Tyson, Tyson, 1993). 
Com Mahler a individuação, i.e., o processo do indivíduo se 
tornar único e distinto, é teórica e experiencialmente indissociável do 
processo de separação, que consiste na distinção e distanciação que 
advém dos limites que as regras, papéis e relações colocam à sua 
identidade independente. O processo de separação-individuação é 
fundamental para a constância do objecto e para que uma 
Personalidade coerente seja desenvolvida. A maior parte do processo é 
estimulado pelas separações e interacções com a mãe, ocorrendo ao 
longo de diferentes fases. Entre as críticas que se levantam a esta 
teoria, contam-se: o foco exclusivo no papel da mãe, esquecendo o 
papel da figura masculina e dos próprios contributos interactivos em 
que a criança também se vê envolvida (Tyson, Tyson, 1993). Apesar 
destas críticas, a teoria mantém a sua validade ao referir a importância 
do papel das relações com os outros e da capacidade para nos 
separarmos o suficiente dessas relações para que consigamos formar 
uma identidade coerente. 
John Bowlby, psicanalista,foi o precursor da maior parte dos 
trabalhos sobre a vinculação em crianças. A sua teoria é uma 
integração de conceitos da psicanálise, etologia e psicologia cognitiva. 
O outro no Eu! Personalidade 19
Helena Espirito Santo! 1996
O autor propõe a tendência para a ligação como um sistema de 
resposta instintivo inato. São pelo menos cinco esses sistemas de 
resposta: choro, sucção, sorriso, agarrar e o seguir. Estes sistemas 
activam respostas por parte da mãe. A mãe, por seu turno, oferece 
feedback para os sistemas do bebé, activando comportamentos que 
medeiam a ligação. Quando os sistemas de resposta instintivas do 
bebé são activados sem que a mãe esteja disponível, ocorre ansiedade 
de separação com comportamentos de protesto (Bowlby, 1993a). 
Inicialmente, como se vê, o comportamento de vinculação é mediado 
por respostas organizadas segundo linhas bastante simples. " A partir 
do final do primeiro ano, passa a ser moderado por sistemas 
comportamentais cada vez mais refinados, os quais são organizados 
ciberneticamente e incorporam modelos representacionais do meio 
ambiente e do Eu." (Bowlby, 1990, p. 123). A criança forma assim 
modelos de trabalho internos das figuras de vinculação e de si mesmo, 
que tendem a persistir relativamente inalterados ao longo da vida. De 
acordo com a sua teoria, o insucesso em formar uma vinculação 
segura na infância está relacionado com uma incapacidade em 
desenvolver relacionamentos interpessoais na vida adulta (Bowlby, 
1990). Ao longo da vida, em todo o vínculo afectivo uma pessoa nova 
tende a ser assimilada a um modelo existente. De forma semelhante, o 
indivíduo espera ser percebido e tratado por essas pessoas de um 
modo que seja apropriado ao seu modelo do Eu. E continuará com tais 
expectativas, apesar de provas em contrário. Tais expectativas levam a 
diversas crenças erróneas sobre as outras pessoas, a falsas 
expectativas acerca do modo como se comportarão e a acções 
inadequadas, com a intenção de frustrar o comportamento esperado 
delas. Pelo seu interesse, as ideias deste autor serão retomadas mais à 
frente.
Se na teoria Psicanalítica foi sempre central o interesse pela 
Personalidade, os autores comportamentalistas tradicionalmente 
O outro no Eu! Personalidade 20
Helena Espirito Santo! 1996
evitaram tal teorização. Estes autores vêem a pessoa como 
influenciada pelos mecanismos de aprendizagem. Estamos ainda na 
linha da pessoa social. 
Apesar deste evitamento ao conceito de personalidade, a 
revolução cognitiva nos anos 60 re-direccionou a Psicologia 
experimental de volta para o "interior" do organismo. O que estes 
autores descobriram ao olharem para o interior foi, no entanto, muito 
mais do que o que antecipavam. Exemplos são as descobertas recentes 
sobre emocionalidade, processos inconscientes e significados pessoais 
(Mahoney, 1991). 
Nesta linha, a descoberta, talvez principal, foi a da 
Personalidade que se tornou (outra vez) um conceito cardinal, depois 
de ter sido banido durante quase meio século. Este ressurgimento 
deve-se, em grande parte, às ciências sociais e comportamentais, mas 
muito do seu ímpeto veio também da prática clínica. Se no início a 
teoria comportamental punha objecções ao conceito de Personalidade, 
por volta dos anos 60 notou-se a sua re-conceptualização, no sentido 
de a compreender pelo seu aspecto cognitivo. 
Iniciada, principalmente, com os trabalhos de Bandura (1977) 
esta re-conceptualização da Personalidade nunca mais parou. 
1.2.3. Personalidade como agente
As abordagens cognitivistas não deixaram de apresentar 
limitações. Da procura em as ultrapassar surgiu uma nova abordagem, 
designada por perspectiva constructivista ou estrutural (Gonçalves, 
1989). O modelo constructivista começou por incorporar teorias 
baseadas no desenvolvimento (como por exemplo, a teoria da 
vinculação de Bowlby e a Epistemologia genética de Piaget), a dar 
ênfase aos processos cognitivos inconscientes ou tácitos e importância 
aos processos afectivos. Foi amplamente reconhecido por este 
movimento que as cognições e comportamentos explícitos são 
O outro no Eu! Personalidade 21
Helena Espirito Santo! 1996
regulados por processos tácitos e inconscientes (Lockwood, Young, 
1992). Sob a superfície existe um núcleo constituído por assumpções 
centrais sobre si mesmo e sobre a realidade. Estas assumpções, 
construídas no curso do desenvolvimento, orientam a formulação de 
hipóteses que se traduzem nas acções. Guidano e Liotti (1983) 
defendem que elas se desenvolvem muito precocemente através de 
processos de vinculação e separação. 
As perspectivas constructivistas baseiam-se em três formulações 
centrais. Primeiro, as disfunções são vistas como o resultado de um 
desequilíbrio importante entre as estruturas cognitivas a mudança 
ambiental. Em segundo, o mundo da realidade é visto como um 
mundo construído activamente. Em terceiro, a construção da realidade 
é vista como seguindo um processo de desenvolvimento sequencial 
(Gonçalves, 1989). Assim, temos no modelo Construtivista uma 
perspectivação da Personalidade como agente, teoria, processo ou 
projecto. A Personalidade constitui uma teoria que o indivíduo tem 
sobre si próprio (Mahoney, 1991). O modo como uma pessoa se torna 
um indivíduo determinado é expressão de padrões comportamentais, 
predominantemente interaccionais, profundamente enraizados, que 
são principalmente emocionais e não explícitos (tácitos). Estes 
padrões constituem um conjunto aberto de princípios organizadores. 
Desta forma a Personalidade é uma metáfora do próprio processo de 
auto-organização que cada pessoa é em cada momento (Gonçalves, 
1989, 1993; Guidano, 1985, 1987b; Mahoney, 1985, 1991). 
1.2.4. Personalidade como agente em interacção
No decurso dos últimos anos, a perspectiva cognitiva foi 
enriquecida com uma nova família de teorias que defendem a ideia da 
importância do desenvolvimento num contexto interpessoal. Com este 
novo ramo a psicanálise e a abordagem comportamental, há muito de 
costas voltadas, parecem começar a virar-se uma para a outra. O 
O outro no Eu! Personalidade 22
Helena Espirito Santo! 1996
indivíduo passa a ser considerado como um agente no seu 
desenvolvimento, onde os outros têm um papel de relevo. Estamos a 
referirmo-nos às abordagens interpessoais, em que é compartilhada a 
ideia de que os indivíduos desenvolvem precocemente esquemas de 
interacção eu-outro, que modelam interacções subsequentes ao longo 
da vida. Nesse sentido, os comportamentos de uma pessoa num 
contexto de interacção tendem a desencadear comportamentos 
previsíveis nos outros (Andrews, 1991; Kiesler, 1972; Safran, 
McMain, 1992; Safran, Segal, 1990).
1. 3. Integração teórica
Como podemos constatar, a Personalidade tornou-se terreno 
comum de diálogo para diversas teorias. Mas o mais importante é que 
possamos entrever a importância das diferentes perspectivas através 
de uma meta-perspectiva.
O comportamento é a evidência externa da Personalidade de 
uma pessoa. Refere-se às qualidades da pessoa, tal como são 
observadas pelos outros. Desta forma, as estruturas subjacentes terão 
de ser forçosamente inferidas, pelo que a descrição da Personalidade 
será, então, uma tarefa teórica. Se a noção de Personalidade se baseia 
numa inferência a partir de constatações,ela é então um mero 
constructo teórico. As constatações são que os comportamentos se 
situam no interior de um esquema bastante estável e consistente que 
lhe confere uma certa unidade e continuidade de significações (Joyce-
Moniz, 1993). Os comportamentos não constituem, desse modo, uma 
série de elementos justapostos e variáveis ao acaso. A noção de 
Personalidade corresponde, então, à noção de uma organização mais 
ou menos estável e relativamente idêntica a si mesma no 
funcionamento psíquico do indivíduo. 
Nas palavras de Mahoney (1991, p. 213):
O outro no Eu! Personalidade 23
Helena Espirito Santo! 1996
"Cada Personalidade é um processo epistémico e experiencial único, 
exibido de forma mais saliente nos padrões individuais do afecto, da 
construção de significado e na acção." 
A definição de Millon (1981) surge neste âmbito integradora. 
Para o autor da teoria bio-social da aprendizagem a Personalidade é o 
"complexo padrão de características psicológicas profundamente 
enraizadas, dificilmente erradicáveis, que se exprimem de forma 
automática em cada faceta do funcionamento individual". Enquanto 
organização da forma particular de um indivíduo perceber, pensar, 
sentir e se relacionar com o seu meio ambiente, deve ser entendida 
como "resultante nunca acabada de um processo dinâmico de 
desenvolvimento determinado por uma permanente e intrincada 
transacção entre factores biológicos e situacionais" (Millon, 1981, p.
103). A Personalidade é, assim, constituída por traços intrínsecos e 
abrangentes que emergem de uma matriz complexa de disposições 
biológicas e de aprendizagem. A Personalidade compreende, enquanto 
expressão, um padrão distinto individual de percepção, sentimento, 
pensamento e de coping. O fundamento da teoria de Millon encontra-
se nesta interacção entre factores de diversa ordem que determina o 
desenvolvimento em espiral da Personalidade.
Em acréscimo, talvez para se entender a Personalidade seja 
também importante perguntarmo-nos: "para que serve a 
Personalidade?" Fazer esta pergunta deu já resultado noutros 
contextos. Na história da Medicina verificamos que a compreensão de 
alguns orgãos do nosso corpo resultou da resposta à pergunta "Para 
que serve?" (Minsky, 1986). A resposta talvez a possamos encontrar 
através da sua significação original —máscara . Na sua etimologia, 
como máscara, ela representava o objecto que punha em interacção o 
actor com o seu público. Não será então verdade que a personalidade 
é aquilo que nos permite relacionar com os outros e até connosco 
mesmos? 
O outro no Eu! Personalidade 24
Helena Espirito Santo! 1996
De facto, os estudos do desenvolvimento humano colocam em 
foco o desenvolvimento da personalidade como um processo 
complexamente interpessoal e intrapessoal (Bowlby, 1990, 1993a, 
1993b, 1993c; Stern, 1985, Tyson, Tyson, 1993). 
2. O Estatuto do Conceito
Na Psicologia a generalização do reconhecimento e do uso do 
conceito de Personalidade fazem dele uma noção nuclear. Apesar de 
sempre ter havido teóricos que negaram ou ignoraram a sua 
importância, a concepção de Personalidade nunca deixou de estar 
presente. De facto, os vários sistemas, escolas ou quadros teóricos 
explicativos do comportamento humano utilizaram e utilizam ainda 
largamente esta concepção. 
Para além deste uso, começou a surgir uma quase "meta-
perspectiva", no sentido do conceito se ter tornado terreno comum de 
diálogo para vários teóricos de diferentes domínios (Mahoney, 1991).
As dificuldades conceptuais levantam-se por via do estatuto 
complexo, senão ambíguo, da noção de Personalidade.
O conceito de Personalidade remete-se a uma realidade 
psicológica que é considerada, uma vezes, como variável 
independente, outras como variável dependente e outras 
simultaneamente como dependente e independente (Staats, 1975; 
Wylie, 1974). Como variável independente, ou até mesmo 
intermediária, a Personalidade é encarada como causa ou factor 
determinante do comportamento.
Como variável dependente, é perspectivada como resultado de 
agentes ou processos vários. Neste lado da realidade levanta-se a 
questão: qual será o agente que melhor dá conta da sua origem? Será 
o Inconsciente, segundo a visão freudiana, ou os estádios da 
O outro no Eu! Personalidade 25
Helena Espirito Santo! 1996
sexualidade infantil? Serão os factores genéticos que esclarecem ou as 
predisposições biológicas fundamentais? Será o produto da 
experiência? Tal como idealizavam David Hume, John Locke e 
Thomas Hobbes no século XVII, de que não haveria mais do que uma 
associação e acumulação de experiências? Será o produto do 
condicionamento, segundo Pavlov e seus herdeiros? Ou ainda a 
alienação sócio-cultural — resposta universal do momento? Em 
Millon (1981, p.103) encontramos a resposta: "(…) a edificação e a 
revelação de uma Personalidade [supõem], para nós, o intrincar de 
vários factores (saídos da sociedade e da genética) (…) "
Desde a antiguidade que se tem procurado delimitar o conceito 
de Personalidade nas mais diversas áreas do conhecimento. 
Deparamo-nos, no entanto, desde definições múltiplas a métodos 
prolixos de investigação, passando por concepções explicativas 
diversas. Ilustrativo desta situação foi o esforço de Allport em 1937 
em inventariar mais de 50 definições diferentes e, daí para cá, muitas 
outras têm sido produzidas. 
Aprisionar um conceito tão complexo parece, de facto, tarefa 
árdua. Ainda que assim seja, nem a posição céptica, nem a eclética se 
revelarão eficazes no progresso científico (Abreu, 1980). Mais 
vantajoso será analisar as ideias subjacentes à multiplicidade de 
definições de Personalidade. Fazê-lo, poderá permitir uma via para 
uma opção fundamentada.
2.1. Separação de conceitos
Nesta procura pela delimitação do conceito para o melhor 
definir, iremos aqui tentar separá-lo de outras noções. Separar, porque 
são usados alternadamente com o conceito de Personalidade, ou 
porque muitas vezes se sobrepõem ou ainda porque são usados como 
sinónimos ou como componentes. 
O outro no Eu! Personalidade 26
Helena Espirito Santo! 1996
Os conceitos que mais frequentemente têm sido empregues em 
alternância com o de Personalidade, são os de Temperamento e 
Carácter, os de Ego, Eu e Self.
A ideia dos Temperamentos é talvez a mais antiga de que há 
registo em Psicologia, a que teve mais influência ao longo dos tempos 
e que ainda se encontra nos modernos estudos científicos. O termo 
Temperamento, que deriva do latim - temperamentum - significa no 
seu étimo "combinação, proporção, medida". Esta designação mantém 
na actualidade o seu conteúdo original, a correspondência com as 
disposições biológicas que subjazem ao humor do indivíduo; quer 
dizer, diz respeito à componente fisiológica e, em grande parte, 
estável e hereditária dos traços afectivos (Nuttin, 1982; Perry e 
Vaillant, 1980, 1988). A ligação evidente entre Personalidade, 
mecanismos fisiológicos vegetativos e endócrinos revela a 
importância e alcance destas noções. 
O termo Carácter, do grego ξηαραξτερ (gravar; sinal gravado, 
marca) ou do latim charǎctēr (marca feita com ferro) servia 
originalmente para designar o conjunto de características individuais 
que serviam de "marca" à pessoa. Em Psicologia a noção de carácter 
está longe de uma terminologia uniforme.Dois significados distintos 
desenvolveram-se ao longo do tempo. Para Wallon (cf. Thines e 
Lempereur, 1984) o carácter é a maneira de reagir habitual e constante 
própria de cada indivíduo. Ou, na definição do Dicionário Geral das 
Ciências Humanas (Thines e Lempereur, 1984, p. 137), é a 
"fisionomia original da individualidade psíquica, que agrupa um 
conjunto de traços que definem uma maneira habitual de se 
comportar: é o estilo de relação estabelecido pelo sujeito com os 
objectos do seu interesse." Esta concepção não andará longe da ideia 
original. O segundo sentido do termo carácter assumiu na linguagem 
contemporânea um aspecto mais controverso. Quando se fala do 
carácter de uma pessoa, associa-se a determinado julgamento moral 
O outro no Eu! Personalidade 27
Helena Espirito Santo! 1996
do comportamento. Neste sentido, o termo carácter foi limitado às 
dimensões de avaliação moral e social da Personalidade (Millon, 
1981). O que é o mesmo que dizer que o carácter se refere às 
características que representam a aderência à sociedade. Daqui tem-se 
descrito o conceito como o reflexo da aprendizagem social, educação 
e internalização das relações e tradições sociais.
Avancemos para outros conceitos e para os seus contextos de 
origem. A Psicologia durante muito tempo centrou-se no estudo do 
espírito, mas um espírito separado do corpo e separado dos outros. 
Este estado de coisas foi resultado do legado de Descartes e ainda 
hoje o dualismo cartesiano se faz sentir nas ciências humanas (Pio 
Abreu, 1996). Para que possamos compreender e explicar os restantes 
conceitos, é essencial dissecar a linha de pensamento cartesiano.
De Descartes ficou-nos uma oposição essencial: mente (res 
cogitans) e extensão (res extensa), sendo o corpo parte da extensão. 
Porém, este dualismo encontra um obstáculo insuperável quando se 
tem em conta a experiência específica do corpo. O nosso corpo não é 
simplesmente um objecto entre os outros objectos do mundo extenso. 
É peculiarmente "meu"; é o meu corpo e não outro qualquer, o centro 
em redor do qual os outros objectos do mundo são colocados e 
organizados. O corpo é o centro da acção, um centro actuante 
(Hermans, Kempen, 1993). Relacionada estreitamente com o 
dualismo corpo-mente, encontramos ainda a separação eu-outro. O 
Cogito de Descartes implica um dualismo entre mente e corpo e 
também entre o eu e os outros (Abbagnano, 1992). Dificilmente o 
nosso pensamento se desliga deste dualismo. Quando nos referimos 
ao "mundo exterior", estamos a usar a terminologia cartesiana. Em 
termos cartesianos, significa que o mundo está fora da consciência e 
esta fora do mundo. Desta forma encontramos, não só a separação da 
mente do corpo, mas também uma pessoa de outra pessoa, o "Mim do 
Tu" (Hermans, Kempen, 1993, p. 3). 
O outro no Eu! Personalidade 28
Helena Espirito Santo! 1996
Para Hermans e Kempen (1993) o Eu cartesiano, assim descrito, 
não apresenta comunicação directa com Outros Eus. Nesta 
perspectiva a auto-consciência precede a consciência do mundo. 
Temos consciência de nós mesmos, sem termos necessariamente de 
estarmos conscientes de mais nada. Quando Descartes diz "Penso, 
logo existo", isso implica que o Eu seja uma entidade fixa, 
essencialmente isolada e incorpórea — um Eu lógico. Contudo, o 
conceito resultante de uma mente racional e individualista está em 
desacordo aparente com a experiência quotidiana. Desta experiência 
eu sinto o corpo como "Meu" e não simplesmente como um objecto 
no mundo. A outra pessoa resulta da presença imediata "para Mim", 
não é a mera consequência de um processo de raciocínio. 
A este propósito leia-se o trecho de Straus (1958, p.148):
"Na experiência sensorial vivencio-me a mim próprio e o mundo ao 
mesmo tempo, não [me vivencio] a mim próprio directamente e o 
outro por inferência, não [me vivencio] a mim próprio antes do 
outro, não [me vivencio] a mim próprio sem o outro, nem o outro sem 
mim próprio."
No rumo cartesiano o pensamento filosófico ocidental definiu 
sujeito e objecto como duas entidades mutuamente exclusivas. Fê-lo 
de uma forma tão antitética, que dificilmente sujeito e objecto podem 
manter transacção entre si.
John Dewey surge neste contexto como figura essencial na 
restauração do carácter transaccional entre estes dois elementos 
(Hermans, Kempen, 1993). O autor define objecto, por um lado, como 
"aquilo a que se deve a frustração" e, por outro lado, como "o 
objectivo, a consumação final eventual, um estado de coisas 
independente e integrado de forma segura". Ao definir o termo sujeito, 
Dewey recorre à sua origem etimológica : "O sujeito é aquele que 
sofre, que é submetido e que sofre pressão e frustração, é também 
aquele que tenta a sujeição sob condições adversas, aquele que toma 
O outro no Eu! Personalidade 29
Helena Espirito Santo! 1996
iniciativa imediata" (citado por Hermans, Kempen, 1993). Dewey 
concebe, assim, um sujeito em termos de "submetido a " e não "acima 
da situação" e o objecto como uma força activa capaz de "objectar 
contra" mim. Desta forma o autor abre espaço a um quadro conceptual 
em que a relação transaccional é restaurada: o sujeito actua no mundo 
e o mundo sobre ele.
William James (1890) é talvez pioneiro ao considerar o Self 
como composto pelo Eu e pelo Mim. O Eu é o Self como "sujeito" 
ou "conhecedor" e o Mim o Self como "objecto" ou conhecido". O Eu 
organiza constantemente e interpreta a experiência de uma forma 
subjectiva. Ele caracteriza-se por três aspectos: a continuidade, 
distinção e volição. A continuidade do Self como sujeito manifesta-se 
numa noção de identidade pessoal e na noção de igualdade4 através do 
tempo. O sentimento de distinção consiste em ter uma identidade 
própria, uma existência separada dos outros. A noção de volição 
pessoal expressa-se pela apropriação e rejeição contínua de 
pensamentos através dos quais o Self como sujeito se manifesta como 
um processador activo da experiência. Ao definir o Mim, James 
descreve uma transição gradual entre Mim e Meu. Ele identifica o 
Mim como o Self empírico; no seu sentido mais lato é descrito como 
tudo a que a pessoa pode chamar seu, "não só o seu corpo, as suas 
capacidades físicas, mas também as suas roupas e a sua casa, a sua 
mulher e os seus filhos, os seus antepassados e amigos, a sua 
reputação e trabalho" (citado por Hermans e Kempen, 1993, p. 45). 
James designa estes elementos primários por constituintes; estes 
constituintes revelam a característica básica do Self — a sua 
extensão.5 O autor distingue três constituintes do Self como objecto: o 
O outro no Eu! Personalidade 30
Helena Espirito Santo! 1996
4 Sameness no original.
5Segundo Rosemberg (1979) o self deixa assim de ser uma entidade separada do mundo, com uma 
existência por si mesmo. Ao invés, o self estende-se para aspectos específicos do ambiente. 
Self material ( inclui o corpo, família e propriedades pessoais) o Self 
espiritual (compreende as faculdades psíquicas, disposições e noção 
interna do ser) e o Self social (diz respeito às relações sociais e 
papéis). James propõe uma multiplicidade de Self s sociais, ao indicar 
a possibilidade de haver entre eles rivalidade e conflito. Esta extensão 
do Self em termos dos seus constituintes é de grande importância, 
pois evita que seconsidere a relação entre o Eu e o Mim como um 
processo que ocorre somente no interior da pessoa individual e 
separada das outras pessoas. A inclusão do Self social permite incluir 
a ideia de que o outro pode ser incorporado no Self, tornando-se parte 
integral dele. Desta forma James ultrapassa o solipsismo inerente à 
linha de pensamento de Descartes que assume uma consciência 
separada da existência dos outros. Outro aspecto que distingue o Self 
deste autor do Cogito de Descartes é a inclusão do corpo como parte 
do Self (material). O Eu não se separa do Mim e, consequentemente, 
não se separa do corpo. A relação intrínseca entre o Eu e o Mim faz 
com que o Eu esteja sempre ligado à existência do meu corpo 
(Hermans e Kempen, 1993).
Para Mead (1934) a personalidade é um fenómeno social, por 
isso deve ser estudado em estreita relação com a sociedade. O modo 
como o Self funciona socialmente depende grandemente das 
instituições que jogam um papel central na sociedade. O conceito 
principal de Mead é o de "Outro generalizado", uma elaboração do 
"Mim social" de William James, que se refere ao grupo social que dá 
ao indivíduo a "unidade do self". Para o autor o Self emerge da 
interacção entre um elemento-sujeito (Eu), criador da ordem 
fisiológica, e um elemento-objecto (Mim), que constitui a 
internalização das atitudes dos outros e se traduz nas interacções 
sociais pela capacidade de assumir a posição do outro. A discussão de 
Mead sobre as alternância entre o "Eu" e o "Mim" fornece a base para 
a visão das acções organizadas como partes de um monodrama 
O outro no Eu! Personalidade 31
Helena Espirito Santo! 1996
executado num nível interno. Goffman complementou a ideia de 
monodrama de Mead ao colocar os actores num nível público. Ele 
percebe estas acções organizadas como papéis desempenhados com o 
intuito de resolver problemas de identidade (ref. por Hermans, 
Kempen, 1993). Para Hermans e Kempen (1993) os papéis 
representados na vida pública face a outros actores são incorporados 
no Self ("Self dialógico"). Os referentes para esses papéis são as 
relações constantemente emergentes entre o "Eu" e o "Mim".
Se estes autores se nos revelam importantes, foi a partir de 
Freud que surgiram os modelos mais heurísticos no que toca à 
Personalidade. Mas também é com ele que a maior parte da confusão 
de conceitos se origina. O das Ich, que foi traduzido para Ego, 
apresentava dois significados no original alemão. Um referia-se a um 
Self vivencial , i.e., referia-se à pessoa total no sentido subjectivo de 
vivência de si própria. No outro significado o Ego era visto como uma 
estrutura psíquica. Os seus tradutores nem sempre concordaram sobre 
o que significava o termo nas diferentes obras de Freud. O motivo 
desta discordância prende-se com o facto de ter renovado 
sucessivamente a noção de "Ego" desde que escreveu "The Ego and 
the Id" em 1923, onde elabora o seu modelo da estrutura tripartida da 
mente. Mas já antes fala em "Ego", embora de uma forma pouco 
específica. De 1895 a 1900 o termo é usado com diferentes 
significados consoante os contextos. Na perspectiva de tratamento, o 
Ego é mais lato que a ideia de consciente; no modelo do conflito, 
designa um conjunto de representações e na primeira metapsicologia 
do aparelho psíquico é uma representação de representações, parte do 
aparelho psíquico. Mais tarde, entre 1900 e 1915, a sua noção 
caracteriza-se por um conjunto de hesitações. De 1914 a 1915 o Ego 
surge como resultado de identificações, como objecto de amor 
investido pelo Id. A data de 1920 foi a viragem para a segunda tópica 
que faz do Ego uma instância, um agente de defesa, onde o Id é o polo 
O outro no Eu! Personalidade 32
Helena Espirito Santo! 1996
pulsional e o Superego o sistema de interdições. A própria ideia de 
génese do Ego é cheia de ambiguidades, mantida em toda a obra de 
Freud (Laplanche, Pontalis, 1985). Em 1923 descreve o Ego como o 
sistema percepção-consciência: o que põe a pessoa em relação com o 
mundo exterior. É a parte do Id que se relaciona com a realidade. O 
Ego retira todas as suas forças do Id e é um aparelho de comando (o 
Ego seria o cavaleiro e o Id - a sua montada). O Superego é a 
componente testemunha e avaliadora, incluída na consciência e "Ideal 
do Ego". O Superego constitui-se por um primeiro esboço: o ideal do 
Ego, maneira de compensarmos o que somos e de nos representarmos 
no que gostaríamos de ser por referência a um ideal. O Ideal do Ego é 
a matéria da nossa relação com o outro. Se a relação com o outro 
fracassa, o Eu ao querer "embelezar-se", introduz em si o outro, 
fazendo parte do Eu. A personalidade forma-se em parte destas 
introjecções. 
Tal como Loevinger (1987) faz notar, os desacordos entre os 
Freudianos modernos sobre os termos Ego e Self são substanciais. 
Esta situação ficará de certo a dever-se à diversidade de contributos 
que se seguiram a Freud. O mais importante, talvez tenha sido 
Hartman (1958). E também o que deu origem a mais controvérsia. 
Para Hartman devem ser feitas distinções essenciais e que são de 
alguma utilidade:
• O Ego é uma estrutura de personalidade, no sentido freudiano,
• o Self é a "própria pessoa" — a pessoa total;
• o Self é representado como parte do sistema do Ego, onde 
existe como a contrapartida da representação do Objecto.
Esta exposição, já extensa, revela-nos um grande número de 
autores que se debruça sobre a distinção dos conceitos referidos. 
Muitos ficaram para trás. Esta diversidade representa, não só o 
interesse pelo tema, exprime igualmente uma variedade de modos de 
O outro no Eu! Personalidade 33
Helena Espirito Santo! 1996
a encarar, sendo extremamente difícil encontrar uma linha única de 
pensamento (Laplanche e Pontalis, 1985).
2.2. Um conceito importante
O auto-conceito é um elemento integrador que dá ao indivíduo a 
sua unidade, identidade e coerência, apesar das variações (Vaz Serra, 
1986). Nesse sentido é importante referi-lo na questão da 
Personalidade.
Entendido como o conceito que o indivíduo faz de si próprio 
como ser físico, social e espiritual, ele será distintivo em relação aos 
outros, será, portanto, um processo simbólico de designação segundo 
classes de comportamentos (Gecas, 1982). 
É um constructo hipotético inferido a partir de acontecimentos 
pessoais (Vaz Serra, 1986). 
Os conteúdos do auto-conceito são constituídos pelos aspectos 
ou princípios valorizados pela sociedade ("papéis sociais 
internalizados", Mead, 1934). Estes conteúdos irão dar ao Eu um 
significado como objecto de observação ligando-o aos sistemas 
sociais. Como diz Nuttin (1982) o auto-conceito está muito ligado à 
imagem que, segundo a nossa percepção, os outros fazem de nós. O 
auto-conceito é um conjunto de generalizações cognitivas — 
esquemas — que organizam o processamento da informação relevante 
para o indivíduo. Estes esquemas vão-se tornando cada vez mais 
resistentes à informação que os contradiz. Esta protecção cognitiva é 
de uma importância considerável pois, não só organiza percepções, 
memórias e esquemas pessoais, como também organiza as próprias 
identidades com que o indivíduo se sente comprometido (Markus, 
1977). Desta forma, o auto-conceito é estável e relativamente fixo. Ele 
é o ponto de referência para o indivíduo actuar com o Mundo, ainda 
que ele mude (Fitts, 1972; Wylie, 1974).
O outro no Eu! Personalidade34
Helena Espirito Santo! 1996
Ele é tão importante, que há tendência para distorcer a realidade 
com o objectivo de se conseguir manter um auto-conceito positivo 
(Gecas, 1982; Rogers, 1951). Essa distorção pode ser conseguida 
escolhendo selectivamente as pessoas significativas, as comparações 
sociais e os aspectos centrais do auto-conceito; reconstruindo a 
história pessoal e a forma como a pessoa lida com os acontecimentos 
que a lesam. Isto prende-se com uma motivação universal, a da 
manutenção e de realce dos aspectos positivos de si próprio, i.e., da 
auto-estima (Rogers, 1951). Esta motivação pode apresentar dois 
aspectos distintos: a auto-saliência que procura o crescimento e o 
aumento da auto-estima e a auto-manutenção que tem como finalidade 
não perder o que a pessoa possui.
Há um conjunto de designações que se interpenetram com a 
noção de auto-conceito. É de toda a utilidade separá-las. 
Uma delas é a noção de auto-imagem. Esta diz respeito ao 
conjunto de percepções sobre si mesmo — o indivíduo é o próprio 
objecto percebido. Da constituição do auto-conceito fazem também 
parte auto-imagens organizadas de uma forma hierárquica e 
significativa (Vaz Serra, 1986). 
Outra noção é a da auto-estima. Esta relaciona-se com o 
processo de avaliação sobre as qualidades ou desempenhos do 
indivíduo. É a componente afectiva do auto-conceito, em que o 
indivíduo faz juízos de valor sobre aspectos da sua identidade (Vaz 
Serra, 1986). Mas, como já referimos anteriormente, de acordo com 
Cooley (1902) e Mead (1934) as avaliações pessoais são um reflexo 
das respostas e avaliações dos outros. Podem também ser resultado de 
comparações sociais (um grupo é fonte de normas e valores) ou 
influenciadas pela atribuição do próprio ao seu comportamento 
observável (Vaz Serra, 1986).
Esta breve passagem pela noção de auto-conceito revela-se 
essencial pelo carácter integrador que nos leva a reconhecer que o 
O outro no Eu! Personalidade 35
Helena Espirito Santo! 1996
indivíduo, apesar de revelar variações, apresenta uma coerência do 
comportamento e identidade pessoal. Adicionalmente, é salientada 
novamente a importância da dimensão interpessoal.
2.3. Integração de conceitos
Numa tentativa de reunir contributos diversos das mais variadas 
áreas iremos tentar fazer a distrinça e simultaneamente a síntese 
desses conceitos, que acreditamos ser integrantes para a noção de 
personalidade.
A Personalidade é o constructo científico que designa a 
maneira de ser e funcionar que caracteriza a pessoa. Sendo assim, não 
designa o indivíduo concreto (Nuttin, 1982). Tanto se refere à imagem 
que os outros fazem de uma pessoa, como se refere à imagem que a 
pessoa faz de si mesma. Advém da constatação da identidade que se 
estrutura através da continuidade dos processos de comportamento. 
I.e., podemos falar de um constructo designado por personalidade 
pelo reconhecimento da tendência para a pessoa se manter igual a si 
própria. 
O Self; (Si mesmo no português, Soi em francês) tem sido 
usado em Psicologia com sentidos diferentes. Podemos defini-lo como 
a noção que o indivíduo tem de si mesmo. É o aspecto auto-referente 
da Personalidade, próximo da noção de auto-conceito. Do que vimos 
anteriormente, o seu uso pode ser dicotomizado da seguinte forma: o 
Self como agente ou processo (Eu) e o Self como objecto do 
conhecimento e avaliação da própria pessoa (Mim) (James, 1890; 
Wylie, 1974)6. Sartre (1934) di-lo de outro modo: o Self é a unidade 
O outro no Eu! Personalidade 36
Helena Espirito Santo! 1996
6 Esta dicotomização está pouco próxima da realidade. Há teóricos que, aparentemente, se referem ao 
Self como objecto e, no entanto, não se interessam pelo conceito de Self (Auto-conceito). Em vez disso, 
atribuem ao conceito de Self características de determinação do comportamento, o que indica uma 
perspectiva mais activa do Self. Na perspectiva do Self como agente, alguns autores parecem também 
confundir esses dois aspectos na descrição dos processos.
da fusão concreta do Eu — unidade transcendente dos actos— e do 
Mim — unidade transcendente dos estados7. Em Psicologia Geral o 
conceito de Self quase não se distingue da noção de Eu no sentido 
reflexo (Mim), i.e., como objecto do conhecimento ou da consciência. 
A distinção dos termos Eu e Mim parece-nos, apesar de tudo, 
especialmente útil para compreender as características subjectivas e 
objectivas da auto-referência (Self). 
O Eu (Je francês; I inglês; Ich alemão, Yo espanhol), como já 
referimos, designa a pessoa concreta enquanto sujeito ou agente da 
actividade psíquica - Self como conhecedor (James, 1890). É a 
identidade da pessoa. Designando a identidade o conjunto de traços 
atribuídos a uma pessoa que permitem descrevê-la (Self como 
sujeito). I.e., "identificá-la". A identidade resulta da noção de que nos 
mantemos os mesmos ao longo do tempo. Como diz Pio de Abreu 
(1994, p. 83) a identidade resulta:
"(…) da constatação de que todas as formas, comportamentos e 
vivências, por diversas que tenham sido ao longo do tempo, têm algo 
em comum que as distingue singularmente: era eu próprio que existia 
através delas, noção esta que permanece mesmo que a personalidade 
se tenha desenvolvido e mudado."
Podemos ainda dizer com Sartre (1934), que o Eu é a expressão 
da identidade entre a consciência irreflectida, inicial, e a reflectida, 
posterior e em que a vida interna é o seu objecto. Através do fluxo 
continuado de vivências, subsiste uma igualdade consigo mesmo — 
identidade. Desta forma a consciência obtém uma ligação contínua 
com todas as fases do seu desenvolvimento temporal. O Eu é esta 
forma como a consciência se afirma a si mesma em totalidade como 
um ser que se distingue radicalmente de todo e qualquer objecto. A 
consciência, ao unificar-se pelo fluxo subjectivo de vivências, permite 
O outro no Eu! Personalidade 37
Helena Espirito Santo! 1996
7 Um estado refere-se aos sentimentos que não se limitam a uma experiência. O estado ocorre em e por 
cada movimento em que o sentimento ocorre.
a constituição do objecto na sua identidade8. O Eu conglomera-se 
numa unidade de indistinção que faz com que a história pessoal esteja 
sempre em cada momento presente. O Eu é elemento preponderante 
na construção do seu próprio mundo e autor da sua própria 
personagem. Ele integra o comportamento e interpreta a experiência 
de forma subjectiva, de tal modo que podemos dizer que todo o 
comportamento é personalizado. É a parte da personalidade que 
pensa, deseja, decide, aprecia e sofre. É factor de identidade, pois a 
pessoa mantém-se a mesma através das experiências. Todos nós 
vivenciamos a sensação de imutabilidade, apesar da mudança, em 
relação ao passado, mas também em relação ao futuro. Somos as 
mesmas pessoas desde os tempos em que não temos memórias de nós 
mesmos (Guidano 1987; Guidano, Liotti, 1983; Markus, 1977; Sartre, 
1934; Popper, Eccles, 1977). É também factor de unidade, pois 
sintetiza os aspectos próprios, os aspectos biológicos (potenciais) — 
temperamento — e sociais — carácter. A unidade resulta da vivência 
em simultaneidade. Se a identidade se relaciona com a dimensão 
temporal; a unidade diz respeito à dimensão espaço: " (…) em cada 
momento existe um só eu" (Pio Abreu, 1994, p. 83).
Debrucemo-nos sobre o outro polo do Self, o Mim. Integrando o 
que já dissemos anteriormente,