O capítulo discutido mostra que o biopoder, tal como formulado por Foucault, não dá conta de explicar certas formas de violência que atravessam a história moderna. Mbembe observa que, em muitos contextos, o Estado não apenas administra a vida; ele administra a morte. A necropolítica surge daí, como essa engrenagem sombria que escolhe quem pode viver e quem pode ser descartado. Não é uma simples continuidade da biopolítica; é um salto que expõe a face mais crua da soberania. O racismo aparece como o motor silencioso desse processo. Ele organiza a vida social como uma espécie de fronteira invisível que separa corpos protegidos de corpos sacrificáveis. É o racismo que permite ao Estado agir como se certas mortes fossem naturais, esperadas ou até necessárias. Ele produz uma lógica que, aos poucos, transforma populações inteiras em alvo legítimo. Esse mecanismo não nasce do nada. Ele amadurece no solo do colonialismo, onde o poder europeu moldou territórios inteiros como laboratórios de violência, lugares onde a lei perdia força e a morte se tornava rotina. A plantation funciona, para Mbembe, como um símbolo dessa estrutura. Ali, o escravizado vivia num estado de exceção permanente, reduzido a uma existência esvaziada de direitos e pertencimento. Sua humanidade era mantida apenas como sombra, como vestígio de um passado arrancado à força. O cotidiano na plantation quase não admitia reciprocidade social; o que restava ao escravizado eram gestos mínimos de resistência, como o silêncio tenso, a fuga, o lamento contido. Esse ambiente condensava a ideia de que a vida pode ser administrada como coisa, sem qualquer obrigação moral de proteção. As colônias, desse modo, revelam o núcleo duro da necropolítica. O soberano colonial atua num território onde a lei é maleável, quando não inexistente. Ele pode matar livremente, sem prestar contas, como se a morte fosse extensão natural de seu poder. Guerra e paz se misturam nesses espaços, dissolvendo limites entre conflito e administração cotidiana. A própria política é reconfigurad