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OBJETIVOS CASO 11 ● Caso Maria Cândida, 38 anos, está no final de sua 4ª gestação. No terceiro mês, trouxe para a consulta do pré-natal os exames laboratoriais solicitados 1 mês antes. O Papanicolau mostrou na mucosa do colo uterino: Lesões Intra-epiteliais de Baixo Grau/Neoplasia Intra-epitelial grau I (NIC I). A obstetra se deteve no VDRL, que foi positivo. Prescreveu Penicilina Benzatina imediatamente e o mesmo tratamento também para o marido de Cândida – Oscar; ele tem um temperamento difícil e pouco colaborativo e recusou-se a tomar o antibiótico, porque não tinha nenhum sinal de doença: uma lesão peniana ulcerada, indolor, que ele apresentou, logo no início da gravidez de Cândida, já tinha cicatrizado espontaneamente. Dra. Cecília continuou o acompanhamento da gestante, com repetições de VDRL e observou a redução dos títulos. O parto ocorreu um pouco antes do previsto e não deu tempo de Cândida fazer a última consulta de pré-natal, na qual deveria mostrar à obstetra o último resultado de VDRL - que estava elevado mais uma vez. Nessa época, Oscar adoeceu, apresentando febre, mal-estar geral e manchas avermelhadas pelo corpo, inclusive na palma das mãos e nas plantas dos pés. Tiago nasceu bem, porém com 3 semanas de vida começou a apresentar uma rinorreia serossanguinolenta, obstrução nasal e, alguns dias depois, choro intenso ao ser manuseado. Foi internado. Maria Cândida repetiu o tratamento e Oscar teve que procurar assistência médica. ● SÍFILIS A sífilis é uma infecção sexualmente transmissível causada pela bactéria Treponema pallidum, da ordem das espiroquetas. As manifestações clínicas da doença vão depender do estágio em que se encontra, como veremos adiante. 1. Agente etiológico e transmissão O Treponema pallidum, é uma bactéria gram-negativa da ordem das espiroquetas. Possui aproximadamente 10 a 13 mícrons de comprimento, mas apenas 0,15 de largura, o que o torna muito delgado, dificultando sua visualização por microscopia direta. Assim, a visualização desse organismo é feita por microscopia de campo escuro, sendo um organismo delicado, em forma de saca-rolhas, com espirais firmemente enroladas e um movimento rotativo, suficientes no diagnóstico da sífilis. A transmissão ocorre, geralmente, através do contato direto com a lesão infecciosa durante o ato sexual. Para ocorrer infecção, a lesão deve estar aberta e com presença de microrganismos, como ocorre na lesão primária e em algumas manifestações secundárias da sífilis (manchas mucosas e condiloma lata). Já as lesões cutâneas apresentam baixas risco de transmissão por conter poucos treponemas. Pacientes com sífilis latente também são considerados infecciosos. O desenvolvimento da doença é feito por inoculação do agente em qualquer parte do corpo, levando ao desenvolvimento de uma sífilis primária naquele local, podendo se espalhar por todo o corpo. Além disso, gestantes que não foram tratadas ou tratadas inadequadamente, a sífilis pode ser transmitida para o feto (transmissão vertical), mais frequentemente intraútero (com taxa de transmissão de até 80%), embora a transmissão também possa ocorrer na passagem do feto pelo canal do parto. Se liga! Não há vacinas contra a sífilis e a infecção pela bactéria causadora não confere imunidade protetora. Assim, pessoas infectadas pelas sífilis podem ser reinfectadas tantas vezes quantas forem expostas ao Treponema pallidum. 2. Infecção local precoce e tardia A contaminação ocorre a partir do contato com o tecido subcutâneo por meio abrasões microscópicas da pele. A lesão ulcerativa inicial (cancro duro) surge após cerca de 30 horas. Durante esse período pode ocorrer infestação de linfonodos locais, com disseminação subsequente. No infiltrado da lesão foram encontrados, além de linfócitos TCD4 e TCD8, monócitos ativados, macrófagos e células dendríticas com receptores do HIV. A presença desses receptores pode justificar o vínculo entre a infecção por sífilis e a transmissão do HIV. O desenvolvimento da resposta imune humoral também acontece no início da infecção, levando ao desenvolvimento de anticorpos que podem ser detectados na fase inicial. Se liga! O Treponema pallidum facilita significativamente o risco de se contrair a infecção pelo vírus HIV, uma vez que as lesões genitais facilitam a entrada do vírus. Além disso, a presença do T. pallidum no organismo acelera a evolução da infecção pelo HIV para a AIDS. Se por um lado as respostas imunológicas são capazes de controlar a lesão inicial, ocorre ao mesmo tempo uma disseminação generalizada de espiroquetas em um indivíduo não tratado, levando a manifestações clínicas de sífilis secundárias ou terciárias. Na sífilis tardia pode ocorrer, anteriormente, um período prologando de latência que pode ser explicada por: - Diminuição da imunidade com o envelhecimento, facilitando o desenvolvimento de pequenos treponemas que sobreviveram em locais sequestrados - Hospedeiro hipersensível parcialmente imune que pode reagir à presença de treponemas, gerando uma resposta inflamatória crônica. Assim, na infecção tardia pode ter o aparecimento de granulomas em pele, vísceras ou outros tecidos, conhecido como Gummas ou sífilis benigna tardia. Essa manifestação ocorre em indivíduos com resposta imune insuficiente para ser protetora, mas substancial o suficiente para causar danos aos tecidos e levar a formação de granulomas. A vasculite de pequenos vasos, comum nos estágios secundários, ocorre pelo aumento do número de linfócitos e células plasmáticas que se infiltram em vasos e tecidos perivasculares. Como consequência, pode ocorrer envolvimento do arco ascendente da aorta e da válvula aórtica, levando ao que chamamos de sífilis cardiovascular. 3. Manifestações clínicas Pacientes com sífilis podem apresentar inúmeros sintomas ou podem testar positivo no teste sorológico sem presença de sintomas (sífilis latente). A sífilis precoce compreende a sífilis primária e secundária que ocorre, geralmente, semanas a meses após a infecção inicial. Quando não tratada, essa infecção pode progredir para uma doença latente tardia ou desenvolver uma sífilis terciária. A manifestação clínica tardia pode ocorrer de 1 a 30 anos após a infecção inicial e apresenta repercussões sistêmicas. Se liga! As manifestações clínicas em gestantes são as mesmas que a da população em geral, não sendo afetadas pelo estado gravídico. A sífilis pode ser classificada de duas formas: • Segundo o tempo de infecção: Sífilis adquirida recente (menos de um ano de evolução); Sífilis adquirida tardia (mais de um ano de evolução). • Segundo as manifestações clínicas da sífilis adquirida: Sífilis primária Sífilis secundária Sífilis latente Sífilis terciária Conceito! Sífilis adquirida recente compreende sífilis primária, secundária e latente precoce. ● Sífilis primária ou cancro duro: Após um período médio de 21 dias de incubação (variando de 3 dias a 3 meses), pode ocorrer o aparecimento de lesão genital ulcerada, quase sempre única, indolor, de bordos endurecidos, de fundo limpo e rica em treponemas. Essas lesões ulceradas, geralmente não possuem uma base exsudativa e podem ocorrer em outras regiões além de genitália, como região oral, faringe posterior e ânus. A lesão dura cerca de 2 a 6 semanas e desaparece espontaneamente. Além disso, pode ocorrer, associado à lesão, adenopatia satélite inguinal indolor, que se diferencia do linfogranuloma venéreo por se apresentar, em geral, bilateralmente. O cancro representa uma infecção local inicial, mas a sífilis rapidamente se torna sistêmica com ampla disseminação das espiroquetas. Essa disseminação pode ou não estar associada a sintomas sistêmicos concomitantes, mas é a base fisiopatológica da sífilis secundária e/ou tardia subsequente, incluindo a neurossífilis. ● Sífilis secundária: Cerca de 25% dos pacientes com sífilis primária não tratada desenvolvem uma doença sistêmica que representa a sífilis secundária. ● Pacientes com sífilis secundária podem não ter tido apresentação do cancro (assintomáticos) ou essalesão ter passado despercebida. Suas manifestações ocorrem cerca de 4 a 8 semanas após o aparecimento do cancro. Assim como na sífilis primária, as lesões desaparecem espontaneamente, mesmo na ausência de terapia, exceto em casos mais graves como na lues maligna. Os pacientes com sífilis secundária não tratada sofrem episódios de recidiva, que podem ocorrer em até 5 anos após a infecção inicial. Os sintomas associados a sífilis secundária acontecem, principalmente, pela resposta imune rápida resultante da disseminação generalizada do T. pallidum. • Sintomas constitucionais: febre, cefaleia, mal-estar, anorexia, odinofagia, mialgias e perda de peso. • Adenopatia: aumento de linfonodos palpáveis em região cervical posterior, axilar, inguinal e femoral, com consistência minimamente macia, firme e aspecto emborrachado. • Erupção cutânea: É o achado mais característico da sífilis secundária. Se apresenta como erupção macular ou papular difusa, simétrica, envolvendo todo o tronco e as extremidades, incluindo palmas das mãos e sola dos pés. A erupção cutânea também pode acometer superfícies mucosas, se apresentando com lesões grandes elevadas, cinza, esbranquiçada, principalmente em boca e períneo, sendo referidas como condiloma lata. • Alopecia: É vista ocasionalmente e é chamada de alopecia “devorada por traça”, devido ao padrão irregular de queda de cabelo. Pode ocorrer em região de couro cabeludo, sobrancelhas ou barba e é reversível com o tratamento. • Anormalidades gastrointestinais: A hepatite sifilítica é caracterizada por aumento sérico de fosfatase alcalina, geralmente com transaminases normais. Quando leve, desaparece com o tratamento. Pode ocorrer ainda infiltrados ou ulcerações em TGI, o que pode ser diagnosticado erroneamente como linfoma. • Anormalidades renais: Albuminúria transitória leve, síndrome nefrótica ou nefrite aguda com hipertensão e IRA. O tratamento para sífilis é capaz de reverter o quadro. • Achados neurológicos/oculares: Cefaleia, meningite aguda, déficit de nervos cranianos, doença meningovascular ou AVC. Paciente com sífilis pode ainda desenvolver uveíte anterior, posterior e panuveíte, de características granulomatosas, associado a diminuição de acuidade visual. O envolvimento ocular deve ser considerado uma manifestação da neurossífilis. ● Sífilis latente: Representa o período de infecção pelo T. pallidum comprovado por teste sorológico, mas sem apresentação sintomática. A categoria “sífilis de duração desconhecida” foi eliminada pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças e categorizaram novamente a sífilis latente em precoce, quando a infecção ocorreu nos 12 meses anteriores, e tardia quando após 12 meses. Essa distinção, além da conduta terapêutica ser diferente, é importante para entender o risco de transmissão, visto que pacientes com sífilis latente tardia não são considerados infecciosos em seus contatos sexuais recentes, já que não apresentam lesões que possam transmitir a doença. Pacientes com sífilis latente precoce podem ter contaminado seus parceiros sexuais através de lesão recentemente ativa, mas que não está mais presente ou por meio de lesão obscura ou indolor que não foi descoberta no exame físico. ● Sífilis terciária: Cerca de 25 a 40% dos pacientes com sífilis não tratada pode evoluir para sífilis tardia, podendo ser latente tardia ou terciária. Não necessariamente os indivíduos tiveram sífilis primária/ secundária sintomáticas antes de desenvolver a tardia. Na sífilis terciária, os achados são: - Sífilis cardiovascular: aortite com envolvimento do arco ascendente, resultando em aorta dilatada e regurgitação da valva aórtica. Relaciona-se esse distúrbio como consequência da vasculite nos vasa vasorum, levando um enfraquecimento da parede da aorta. Apresenta-se com sopro assintomático ou insuficiência cardíaca esquerda. Aparecem tipicamente 15 a 30 anos após a infecção - Sífilis gomatória: Também chamado de Gummas. É mais raro, sendo um achado mais frequente em paciente infectados por HIV. Pode ocorrer em qualquer lugar, como pele, mucosas, ossos ou órgãos internos. - Sífilis cutânea: as manifestações podem ser em forma de nódulos, tubérculos, placas nódulo-ulceradas ou tuberocircinadas e gomas. Podem ser solitárias ou em pequeno número, assimétricas, com pouca inflamação, endurecidas, com bordas demarcadas, policíclicas ou em formato de círculos, destrutivas, com tendência à cura central com extensão periférica, com formação de cicatrizes e hiperpigmentação periférica. - Neurossífilis tardia: Sífilis terciária do sistema nervoso central (SNC) representado por paresia geral e tabes dorsalis, meningite aguda, goma do cérebro ou da medula, atrofia do nervo óptico, lesão do sétimo par craniano, paralisia geral e demência 4. Neurossífilis Existem muitas formas de sífilis do SNC, como as formas precoces (sífilis precoce) e tardias (sífilis terciária), podendo ocorrer até 25 anos após a infecção inicial. Existem cepas específicas de T. pallidum que podem ter maior probabilidade de causar neurossífilis. Esse acometimento começa com a invasão do líquido cefalorraquidiano (LCR) pelos organismos causadores em 25% dos pacientes com sífilis não tratada. A meningite persistente é resultado da falha de remoção do organismo no LCR, sendo que esses pacientes possuem “neurossífilis assintomática”, podendo evoluir para neurossífilis sintomática posteriormente. A neurossífilis é dividida em precoce, podendo ser assintomática, por meningite sintomática, meningovascular, sífilis ocular e otossífilis ou tardia, podendo levar a paresia geral e tabes dorsalis. A neurossífilis precoce ocorre por acometimento do LCR, meninges e vasculatura. Seus tipos são: - Neurossífilis assintomática: Não apresentam sinais e sintomas do SNC, mas podem apresentar manifestações de sífilis primária ou secundária concomitantemente. Pode surgir de semanas a meses após infecção inicial, raramente ocorre posterior a 2 anos de infecção. O diagnóstico é feito desta forma: Existem duas ressalvas para esse diagnóstico: 1. Pacientes com neurossífilis assintomática e COM infecção pelo HIV, que não é reativo ao LCR-VDRL, mas apresenta-se com pleiocitose leve e/ou proteína elevada no LCR, o diagnóstico torna-se difícil porque a presença desses critérios pode ocorrer devido ao próprio HIV. 2. Pacientes com neurossífilis assintomática, independentemente da reatividade do LCR-VDRL, devem ser tratados com neurossífilis para evitar a progressão para doença sintomática. 5. Sífilis congênita A definição de sífilis congênita requer que: (1) a criança apresente sinais físicos, laboratoriais ou radiográficos de sífilis congênita (confirmada ou provável) OU (2) criança que nasceu de mãe não tratada, inadequadamente tratada ou subtratada. Alguns especialistas também presumem que os bebês têm sífilis congênita se suas mães tiveram contato com uma pessoa com sífilis primária ou secundária dentro de 90 dias antes do parto e não foram tratadas ou inadequadamente tratadas. A sífilis congênita é um importante problema de saúde, complicando cerca de 1 milhão de gestações por ano em todo o mundo, refletindo o aumento de incidência de sífilis em mulheres em idade fértil e o acesso precário ao pré-natal um importante fator de risco para sífilis congênita. A sífilis congênita geralmente é adquirida pela transmissão transplacentária de espiroquetas na corrente sanguínea materna ou, ocasionalmente, pelo contato direto com uma lesão infecciosa durante o parto. Mulheres com sífilis primária ou secundária não tratada são mais propensas a transmitir sífilis para seus fetos (60-90%) do que mulheres com doença latente (40% na latência inicial e <10% na latência tardia). O T. pallidum não é transferido no leite materno, mas a transmissão pode ocorrer se a mãe tiver uma lesão infecciosa na mama. As manifestações clinicas da sífilis congênita precoce (antes dos 2 anos de idade), apesar de 60 a 90% dos recém-nascidos vivos são assintomáticos ao nascimento, são: - Hepatomegalia: pode ounão estar associada à esplenomegalia, mas a esplenomegalia isolada não ocorre. - Icterícia: associado a hepatomegalia e colestase. - Corrimento nasal: geralmente se desenvolve durante a primeira semana de vida e raramente após o terceiro mês. A secreção nasal é branca e pode ser sanguinolenta (secundária à erosão da mucosa) ou purulenta se houver infecção bacteriana secundária. - Erupção cutânea: podem ocorrer em qualquer lugar, principalmente em costas, nádegas, coxas e sola dos pés. A erupção geralmente progride em uma a três semanas, seguida de descamação e crostas. À medida que desaparece, as lesões ficam vermelhas escuras ou cor de cobre, e a pigmentação pode persistir. Se presente ao nascimento, a erupção cutânea pode ser amplamente disseminada e bolhosa (pênfigo sifilítico). Lesões ulcerativas e líquido bolhoso contêm espiroquetas, são contagiosas e podem transmitir infecção por contato direto. - Linfadenopatia generalizada, principalmente epitroclear - Anormalidades esqueléticas. - Acometimento do SNC: O envolvimento sintomático do SNC é raro em bebês com sífilis congênita, mas pode se desenvolver a partir da disseminação contínua em bebês que não são tratados no período neonatal. A sífilis sintomática do SNC em bebês tem duas apresentações sobrepostas: leptomeningite sifilítica aguda e sífilis meningovascular crônica. Já as manifestações da sífilis congênita tardia (após 2 anos de idade) estão relacionadas a cicatrizes ou inflamação persistente de infecção precoce e são caracterizadas pela formação de goma em vários tecidos. Se desenvolve em aproximadamente 40% dos bebês nascidos de mulheres com sífilis não tratada durante a gravidez. São representadas por: - Abaulamento dos ossos frontais, depressão da ponte nasal (nariz em sela”), maxila curta, mandíbula protuberante. - Ceratite intersticial: Inflamação da estrutura do tecido conjuntivo da córnea. Geralmente é bilateral. - Alterações esqueléticas: curvatura anterior das canelas (“canela de sabre”), artrite indolor dos joelhos (“articulações de Clutton”). Esta última é uma condição indolor que, geralmente, ocorre durante os estágios finais da sífilis congênita. Na sífilis congênita, é importante o diagnóstico diferencial com condições semelhantes, como infecção por toxoplasmose, por rubéola, citomegalovírus e vírus herpes simplex. O diagnóstico pode ser feito por visualização direta ou coloração com anticorpo fluorescente de fluidos ou lesões corporais infectadas, placenta ou cordão umbilical; por testes sorológicos típicos da sífilis. Pode ser realizado também a detecção de DNA do T. pallidum por PCR. 6. Diagnóstico A triagem diagnóstica da sífilis deve ser realizada em pacientes: 1. Com sinais e sintomas de infecção: úlcera genital indolor (sífilis primária); uma erupção macular ou papular difusa, simétrica, envolvendo todo o tronco e extremidades (sífilis secundária); paresia geral; ou tabes dorsalis (sífilis terciária); 2. Sem sinais e sintomas, mas com alto risco de adquirir doença ou transmitir a outras pessoas; 3. Mulheres grávidas; 4. HSH (homens que fazem sexo com homens) e sexualmente ativos anualmente; 5. Comportamento sexual de risco; 6. Indivíduos infectados por HIV. Os testes sorológicos são utilizados para a triagem dos pacientes. Existem dois tipos de testes sorológicos para sífilis: teste não treponêmicos e testes específicos do treponema. O diagnóstico é feito com base nesses dois tipos de testes, visto que o teste sorológico, principalmente o não treponêmico, está associado a resultados falso-positivos. Resultados falso-negativos também podem ocorrer, já que necessita de resposta imune humoral para positivar o teste. Assim, estes testes apresentam limitações em pacientes com imunossupressão ou doença precoce. ● Os testes não treponêmicos são os utilizados na triagem e incluem: VDRL: Laboratório de Pesquisa em Doenças Venéreas RPR: Reagin Rápido de Plasma TRUST: Teste de Soro Não aquecido a Toluidina Vermelha. Testes não treponêmicos positivos são relatados como um título de anticorpo, por exemplo 1:32, que representa a detecção de um anticorpo no soro diluído 32 vezes. Esses títulos tendem a ir diminuindo com o tempo, mesmo sem tratamento. ● Os testes treponêmicos são mais complexos e mais caros para serem realizados. São utilizados como confirmatórios quando os testes não treponêmicos são reativos. Os testes treponêmicos incluem: FTA-ABS: Absorção Fluorescente de Anticorpos Treponêmicos MHA-TP: Teste de Micro-Hemaglutinação para Anticorpos contra T. pallidum TPPA: Ensaio de Aglutinação de Partículas de T. pallidum TP-EIA: Imunoensaio com Enzima T. pallidum CIA: Imunoensaio quimioluminescente Os testes sorológicos rápidos são feitos utilizando microscopia de campo escuro para examinar o exsudato de lesões quanto a presença de microrganismos de T. pallidum, porém não é o mais recomendado rotineiramente. A maioria são testes específicos do treponema que não distinguem entre sífilis ativa e previamente tratada. Possuem baixa sensibilidade 74 a 86% e especificidade de 96 a 100%. Os métodos diretos são utilizados para diagnóstico definitivo de sífilis. Como o T. pallidum não pode ser cultivado em laboratório, o organismo deve ser identificado em visualização direta ou detecção de amostras clínicas. Para isso, foi desenvolvido testes de reação em cadeia da polimerase (PCR) para detecção de DNA do T. pallidum de amostras clínicas. A sensibilidade desse teste é de 70 a 95% e parece ser maior do que a observada em microscopia de campo escuro. A especificidade variou de 92 a 98%. Não deve ser realizado em pacientes assintomáticos, já que em amostras de sangue e de líquido cefalorraquidiano a sensibilidade do teste cai para 24 a 32%. 7. Tratamento ● HPV - Papiloma Vírus Humano O HPV (do inglês, “human papilloma virus”, em português, “papilomavírus humano”) é um vírus de DNA de dupla-hélice simples com um capsídeo proteico, pertencente à família Papillomaviridae. O papilomavírus compreende cerca de 300 tipos diferentes de vírus e tem preferência pelas células escamosas e metaplásicas humanas. Cerca de 30 a 40 deles infectam o trato anogenital inferior, principalmente. Os tipos e subtipos são classificados conforme grau de homologia genética entre eles. O HPV é a infecção sexualmente transmissível mais prevalente do mundo (estima-se que até 80% das mulheres sexualmente ativas terão contato com ele até os 50 anos) e é o fator mais fortemente associado ao câncer de colo de útero (sendo associado a 95% deles). Os diversos tipos de HPV infectam diferentes partes do corpo humano – é como se tipos diferentes tivessem partes do corpo “preferidas”. Os tipos 1, 2 3 e 4 causam verrugas na pele – aquelas verrugas comuns, que certamente você já viu. Os tipos 6 e 11 estão mais relacionados às verrugas genitais, com baixo risco de progressão para câncer. Já os tipos 16 e 18 são os mais associados a lesões anogenitais com transformação maligna (70% dos cânceres cervicais são associados a esses dois tipos), juntamente com os tipos 45, 31, 33, 52 e 58. Mas grave os principais: 6 e 11 são associados à verrugas – sendo de baixo risco, 16 e 18 são associados ao câncer – portanto de alto risco. Uma maneira fácil de memorizar esses quatro tipos de vírus pode ser gravar os números 6, 11, 16 e 18 e, a partir daí, lembrar que os dois números mais baixos são de baixo risco (verrugas), e os dois números mais altos são de alto risco (malignidade). 1. QUADRO CLÍNICO O quadro clínico da infecção pelo HPV se caracteriza por infecções assintomáticas ou latentes, infecções subclínicas e infecções com sintomas clínicos. O vírus é transmitido predominantemente pelo contato sexual, sendo que o preservativo – especialmente o masculino, embora confira alguma proteção, ainda permanece relativamente ineficaz para prevenir a infecção pelo HPV – visto que pode haver lesões em regiões não cobertas pela camisinha. Ainda existe a infecção congênitapelo HPV, transmitida de mãe infectada para filho, e sobre a qual falaremosmelhor daqui a pouquinho. O quadro da paciente irá depender da sua resposta imunológica e do tipo de vírus que ela apresenta. Verrugas pequenas e pouco numerosas; verrugas numerosas, grandes e amontoadas, com aspecto de couve-flor; lesões pré-malignas e neoplasias invasivas são possíveis manifestações da infecção pelo HPV. A maioria das infecções proliferativas e neoplásicas é subclínica, sem manifestações e sem verrugas na maior parte dos casos. A infecção pode ainda ser transitória ou persistente, com ou sem desenvolvimento de neoplasia – displasia, ou câncer. Dos possíveis resultados do HPV, o câncer é o menos comum. ● Principais manifestações do vírus HPV: Infecção congênita: a transmissão vertical além da colonização transitória da pele é bastante incomum. A infecção não está relacionada com a presença de verrugas genitais maternas ou com a via de parto, logo, a cesariana no geral não está indicada apenas por essas condições. Consideram-se exceções casos de verrugas extensas e volumosas, que possam obstruir o canal de parto ou sangrar. Verrugas conjuntivais, laríngeas, vulvares ou perianais ao nascimento ou que surjam no período de 1 a 3 anos após nascimento provavelmente se devem à exposição perinatal ao HPV. Verrugas genitais em crianças após a primeira infância, por sua vez, devem levantar a suspeita de abuso sexual, embora a infecção por contato não sexual possa eventualmente ocorrer – por meio de fômites. Infecção latente: nesses casos, as células estão infectadas pelo HPV, mas o vírus está latente. O genoma não é integrado ao genoma da célula do hospedeiro e não ocorre replicação viral. Infecção proliferativa: nessa forma, há o ciclo de vida completo do vírus e o vírus se prolifera. Como já discutimos, a produção viral ocorre em sincronia com o amadurecimento da célula epitelial escamosa, terminando com a apoptose destas e descamação epitelial superficial. Logo, há pouco potencial para malignidade nessas infecções. O genoma viral não é incorporado à célula (dizemos que ele fica na forma epissomal) e os oncogenes têm baixa expressividade. Essas infecções proliferativas causam as verrugas anogenitais, mas muito mais frequentemente ficam na forma subclínica, podendo ser detectadas em exames citológico, colposcópico e histológico. Na citologia, formam as LIEBGs (lesões intraepiteliais de baixo grau); na colposcopia, aparecem como anormalidades e, à histologia, como condilomaplano ou NIC 1 (neoplasia intracervical). As verrugas, por sua vez, são caracterizadas por lesões elevadas, irregulares, rosadas a esbranquiçadas, que frequentemente ocorrem em conjunto – ou seja, várias verrugas agrupadas ou espalhadas. Na maioria das vezes, essas verrugas são assintomáticas, mas podem eventualmente gerar prurido. É importante diferenciar da micropapilomatose fisiológica: nesta, os micropapilomas têm base única (ou seja, um papiloma em uma base individual), sendo uniformes em tamanho e forma e regredin- do dentro de poucos anos; as verrugas ou condilomas, por sua vez, possuem várias lesões brotando de uma base única, com contornos e bordas irregulares e pouco uniformes. Infecção neoplásica por HPV: nas infecções neoplásicas, há integração do genoma viral ao genoma da célula da hospedeira. Nesse caso, há expressão de oncogenes e a célula da hospedeira perde o controle sobre o seu ciclo celular – por meio da inibição de p53 e pRB, como já falamos lá atrás. Assim,a célula fica vulnerável à transformação maligna. Em lesões pré-malignas a diferenciação epitelial normal é abreviada, sendo o grau de maturação anormal resultante utilizado para classificação das lesões: displasia ou NIC leve, moderada ou grave. Há muito presume-se que há um contínuo desde a displasia até NIC 3 ou carcinoma, como se a paciente primeiro tivesse uma displasia, evoluindo para NIC 1, 2, 3 e, finalmente, carcinoma. No entanto, uma teoria alternativa sugere que as lesões atuam como se fossem independentes: pacientes com NIC 1 provavelmente não irão evoluir para graus mais avançados e suas lesões regridirão, enquanto pacientes com NIC 3 já iniciaram o quadro com NIC 3 sem passar anteriormente pela NIC1. O câncer de colo de útero, por sua vez, é muito frequentemente assintomático até fases mais avançadas da doença. Por isso, é necessário o rastreio e a prevenção, evitando que lesões evoluam para a forma cancerosa. 2. DIAGNÓSTICO A infecção, assintomática na maioria das vezes, acaba sendo diagnosticada apenas pelos métodos de rastreio e exames de rotina. No entanto, o aparecimento de lesões clínicas como verrugas deve dar início a uma investigação diagnóstica. Embora haja métodos citológicos, colposcópicos e histológicos de diagnóstico, eles não são suficientemente sensíveis. O diagnóstico confirmatório só ocorre por meio da detecção do DNA do HPV, sendo a captura híbrida o exame mais utilizado para tal. Este exame, no entanto, distingue apenas entre lesões de alto e baixo risco, não identificando o tipo exato de vírus. Para este fim, usa-se como método a reação em cadeia da polimerase (PCR). No entanto, se existem lesões clínicas verrucosas, neoplasia de colo uterino de alto grau ou câncer invasivo por citologia ou histologia, presume-se que seja por HPV e a confirmação não é necessária. Porém, sendo a infecção na maioria das vezes assintomática, ainda que não haja sinal ou sintoma de doença causada por HPV, existe um programa de rastreamento do câncer de colo de útero no Brasil. Esse é um dos principais programas de rastreio estabelecidos, com sólidas bases e evidências científicas de redução da mortalidade por câncer cervical em diversos países. Portanto, vamos entender melhor agora quem deve ser rastreada, e como esse rastreio acontece. ● Quem deve ser rastreada e com qual periodicidade? Mulheres acima de 25 anos e abaixo de 64 anos devem ser rastreadas para o câncer cervical. Inicialmente, realizam-se exames anuais e, após 2 exames normais consecutivos, fazemos rastreamento trienal. Não se evidenciou benefício em rastrear jovens com menos de 25 anos de idade, devido ao fato de as lesões encontradas regredirem em sua esmagadora maioria. Além disso, só se deve rastrear mulheres com vida sexual já iniciada – mesmo que uma jovem já tenha mais de 25 anos, não se deve rastreá-la se não tiver iniciado a vida sexual. Após os 64 anos, os exames podem ser interrompidos quando a mulher tiver pelo menos dois exames negativos consecutivos nos últimos cinco anos. ● Situações especiais: Mulheres que passaram por histerectomia total por causas benignas podem ser excluídas do tratamento; mulheres imunossuprimidas devem iniciar o rastreio com o início da atividade sexual – independentemente da idade – com intervalos semestrais no primeiro ano e, se normais, prosseguir com rastreio anual. 3. CONDUTA Primeiro, vamos ver as condutas para verrugas ou condilomas, em sua maioria causadas por HPV de baixo risco e que sempre requerem tratamento – tanto por motivos estéticos, como para reduzir chance de transmissão. O tratamento das verrugas é feito com métodos destrutivos ou ablativos: O ácido tricloroacético (ATA) a 80% a 90% em solução alcoólica pode ser aplicado em pouca quantidade apenas nas verrugas, deixando secar. Feito isso, a lesão se tornará branca e irá de desprender da pele ao longo dos dias. Pode ser repetido semanalmente, se houver necessidade. No entanto, deve-se tomar alguns cuidados: só pode ser aplicado em gestantes caso as lesões não sejam muito extensas. Se a lesão for extensa, deve-se associar à exérese cirúrgica. O ATA é um análogo do ácido acético que age “queimando” as verrugas e sua aplicação pode ser dolorosa. A podofilotoxina em creme a 0,15% é aplicada nas lesões durante cerca de 3 dias, geralmente 2 vezes ao dia. Pode-se repetir com um intervalo mínimo de 4 dias, por no máximo 4 vezes. Está contraindicado em gestantes e crianças. Trata-se de um antiviral que desestabiliza os microtúbulos por se ligar à tubulina e impedir a divisão celular. Seus derivados podem ainda ligar-se à topoisomerase-2,dificultando a replicação celular. A podofilina 10% a 25% em solução alcoólica ou tintura de Benjoim é aplicada em cada verruga, deixando-se secar. Repete-se semanalmente caso haja necessidade e também é contraindicada em gestantes e crianças. Esse medicamento de uso tópico tem ação citotóxica e também age no ciclo celular viral. Seu uso pode acarretar irritação local e efeitos sistêmicos só ocorrem em aplicações excessivas – náusea, vômito, dor abdominal, diarreia, íleo paralítico, leucopenia transitória, dentre outros. O imiquimode é um imunomodulador tópico que modula a resposta imunológica do hospedeiro, não atuando diretamente no vírus. Induz a produção e ação de interferon e outras citocinas. Inclusive, é utilizado em outras patologias da pele, como carcinoma basocelular. Pode ser utilizado a 5% em creme. Aplica-se de noite, antes de deitar-se, cerca de 3 vezes por semana, em dias alternados, por 16 semanas no máximo. Lavar a área com água e sabão neutro 6h a 10h após a aplicação. Há ainda a eletrocauterização, eletrocoagulação ou eletrofulguração. É um procedimento cirúrgico destrutivo em que se usa um equipamento chamado eletrocautério, carbonizando a lesão por eletricidade e energia térmica ou ainda por coagulação sanguínea da região. A criocauterização ou criocoagulação é útil se há poucas lesões e elas são muito queratinizadas. Esse procedimento já utiliza o frio. A exérese cirúrgica, por sua vez, é mais benéfica quando há muitas lesões ou a área acometida é demasiadamente grande.
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