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UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ CURSO DE LICENCIATURA EM HISTÓRIA LUCIANNE GOIS CARVALHO VIANNA AS CAUSAS E O CONTEXTO DA REFORMA RELIGIOSA RIO DE JANEIRO 2020 LUCIANNE GOIS CARVALHO VIANNA AS CAUSAS E O CONTEXTO DA REFORMA RELIGIOSA Trabalho apresentado ao curso de Licenciatura em História da Universidade Estácio de Sá para orientação da nota de conclusão. Orientador: Professora Adriana de Souza Carvalho RIO DE JANEIRO 2020 Dedico este trabalho aos meus pais Luiz da Silva Carvalho e Luisa Maria Gois Carvalho, que me deram a vida, meus amores, minha razão de ser o que sou hoje. Aos amigos queridos que de forma direta e indireta contribuíram para realização deste trabalho e me ajudaram a vencer as etapas para que o mesmo fosse concluído. AGRADECIMENTOS A Deus, sem Ele este trabalho não seria realizado, pois toda a minha força vem do seu poder na minha vida; Ao meu esposo Alexandre Curcio, companheiro e incentivador, que esteve comigo apoiando durante toda a trajetória do curso; A todos os professores que me servem de inspiração para ser a melhor educadora que eu puder. RESUMO O presente artigo trata da questão das Causas e o Contexto da Reforma Religiosa, que teve origem na Alemanha, através dos ataques de Martinho Lutero a prática da Igreja Católica em vender indulgências no século XVI, que teve como consequência a Contra Reforma e a divisão da Igreja Católica, originando assim o protestantismo. Falaremos do período que compreende a vida de Lutero (1483- 1546), o início da reforma, com as 95 teses (1517), e da reação da igreja com a Contra Reforma (1545), tendo como centro Martinho Lutero, protagonista deste evento, a burguesia, e o crescimento do capitalismo, dentro da problemática com ênfase na guerra civil política-religiosa frente aos interesses econômicos. Palavras-chaves: Reforma, Igreja, Lutero. ABSTRACT This article deals with the question of the Causes and the Context of Religious Reform, which originated in Germany, through the attacks of Martin Luther on the practice of the Catholic Church in selling indulgences in the 16th century, which resulted in the Counter Reformation and the division of Catholic Church, thus originating Protestantism. We will talk about the period that includes the life of Luther (1483-1546), the beginning of the reform, with the 95 theses (1517), and the reaction of the church with the Counter Reformation (1545), with Martinho Lutero, protagonist of this event as center , the bourgeoisie, and the growth of capitalism, within the problematic with emphasis on the political-religious civil war against the economic interests. Keywords: Reformation, Church, Luther. SUMÁRI0 1 INTRODUÇÃO ....................................................................................... 8 2 HUMANISMO E DISVIRTUAMENTO DA IGREJA ................................................. 9 2.1 A crise interna da Igreja Católica Romana...................................................... 10 2.2 O Humanismo Renascentista e a ascensão da burguesia ............................. 10 3 ENTENDENDO MELHOR OS INTERESSES POR TRÁS DA REFORMA RELIGIOSA .............................................................................................................. 12 3.1 Quem eram os burgos? ................................................................................... 12 3.1.1 Os valores da Burguesia ....................................................................... 12 3.1.2 Renascimento Comercial que se expande .......................................... 13 3.1.3 Os reis e a burguesia ............................................................................ 13 3.2 O Mercantilismo ............................................................................................. 13 4. A QUESTÃO POLÍTICA ...................................................................................... 15 4.1 A invenção da imprensa por Gutemberg e o acesso à Bíblia ......................... 15 5 MARTINHO LUTERO ( 1483- 1546) ..................................................................... 17 5.1 O justo viverá pela fé ...................................................................................... 17 6 O INÍCIO DA REFORMA ...................................................................................... 19 6.1 Guerras e Revoltas ......................................................................................... 19 6.2 Carlos V, Centralismo e o surgimento do Protestantismo............................... 20 6.3 Mudanças ....................................................................................................... 20 7 JOÃO CALVINO ................................................................................................... 22 8 A REAÇÃO DA IGREJA CATÓLICA ................................................................... 23 8.1 A Inquisição .................................................................................................... 23 8.2 O Concílio de Trento ....................................................................................... 23 9 CONCLUSÃO ....................................................................................................... 25 10 REFERÊNCIAS ................................................................................................... 27 8 1 INTRODUÇÃO. No início do século XVI, no momento de apogeu do Renascimento, observa- se um fenômeno que é bem representativo do novo clima da Europa Centro- Ocidental. As Reformas Religiosas são indicativas das forças em oposição que demandam novos e velhos interesses. A pergunta é a seguinte: Por que a Reforma Protestante? A primeira coisa que deve ser observada é que as Reformas Religiosas fazem parte do conjunto de eventos que constituem a nova cultura moderna europeia. Isso quer dizer que elas se anunciam como guerras civis europeias e refletem a especificidade das várias unidades territoriais consolidadas no século XVI. O crescimento do pensamento humanista renascentista do século XVI, através das universidades e as atrocidades cometidas pelo poder da igreja, deram o ponta pé inicial a estes eventos. Com as transformações ocorridas no final da Idade Média (séculos XIV e XV), a Igreja Católica, que era o símbolo de poder até então, passou a ser afrontada, as monarquias passaram a questionar o direito do Papa de se intrometer nas questões políticas e a ascensão da burguesia, como novo grupo social que buscava prestígio. A Reforma Religiosa foi uma resposta mais que religiosa para a angústia vivida pelos Europeus no XVI, e envolveu indivíduos de vários níveis culturais e econômicos. Martinho Lutero, um dos protagonistas deste evento, inconformado com as vendas de cargos eclesiásticos e de indulgências, lançou suas 95 teses, criando a partir de então o Protestantismo e a divisão entre católicos e protestantes. Com efeito, o tema das Reformas Religiosas pertinente ao início da Época Moderna possui implicações que ultrapassam as mudanças institucionais eclesiásticas no século XVI, relacionando-se também a aspectos culturais, econômicos e de poder vividos na Europa, são estes aspectos que iremos analisar. A escolha deste tema se deu devido ao atual cenário na qual estamos inseridos, onde observamos que o fator religiosofez grande diferença nas eleições presidenciais. O objetivo deste artigo é analisar o cenário na qual estava inserida a Reforma Religiosa, suas consequências, investigar os interesses políticos e econômicos por trás deste cenário, a reação da Igreja Católica com a Contra Reforma, nos levando a uma reflexão sobre a influência do poder eclesiástico sobre a sociedade moderna e seu enfraquecimento através do pensamento Humanista e a ascensão da burguesia. Utilizei como fontes de pesquisas livros de teologia, história moderna, e artigos acadêmicos, para realizar um paradoxo de visões distintas e históricas. 9 2 HUMANISMO E DISVIRTUAMENTO DA IGREJA. As contestações ao poder e aos dogmas da Igreja não eram um fenômeno desconhecido na Europa do século XV. O próprio crescimento do pensamento humanista, absorvido pela Igreja através das universidades, e uma nova visão teológica, representada pelo tomismo, podem ser vistos como uma abertura da Igreja ao racionalismo e a uma visão de mundo mais humanística, se comparada ao forte teocentrismo que prevalecera até ali. As universidades foram canais por onde pôde penetrar a influência do pensamento racional, ao mesmo tempo em que o tomismo fundia a fé com elementos do racionalismo greco-romano. Ao mesmo tempo, há que se levar em conta o desvirtuamento da Igreja e sua incapacidade de dar resposta aos anseios espirituais dos fiéis. Essa questão tem origem no papel que a Igreja passou a ocupar a partir da Idade Média. O fato de ser ela a principal possuidora de terras na Europa, bem como a instituição mais poderosa politicamente, colocava-a ao lado da nobreza como uma instituição beneficiária da estrutura feudal e, também, responsável por sua manutenção. O fim do século XV foi marcado pelo desespero, e a fé em indulgencias e patuás reduziu a capacidade dos homens enxergar o novo. O século XVI foi um grande século, se oporia aos séculos XIV e XV, que a presença das marcas do feudalismo tornava um período de transição, acumulando contradições e confrontos, ao contrário do século XVI, tudo parece caminhar na direção da harmonia e da proporcionalidade. Ele poderia ser representado por uma linha reta apontando para o futuro. A partir dela era possível enxergar o mundo de nova maneira. Os conceitos de beleza e perspectivas orientavam o olhar dos homens modernos. 2.1 A crise interna da Igreja Católica Romana. A crise interna da Igreja Católica Romana, foi ocasionada pelo comportamento tido como imoral por parte de alguns membros do clero, a prática da simonia, sobretudo pelos senhores feudais que buscavam o poder e a riqueza. A Reforma foi um movimento fruto de uma grave crise espiritual que se abatia sobre a igreja desde então o povo de modo geral não encontrava satisfação e realização em sua práxis religiosa. Reinava um vazio espiritual. Ela teve uma perspectiva essencialmente religiosa, desejada por cristãos católicos piedosos, o que significa um movimento interior nascido dentro da própria Igreja em crise. Podemos ainda afirmar que a Reforma foi uma das maiores revoluções religiosas do mundo moderno, num tempo em que o mundo vivia dominado pela própria religião. Há tempos padres, bispos e papas estavam afastados de ideais tipicamente cristãos como a solidariedade, a simplicidade e a honestidade. Em lugar disto, o esplendor parecia ser a marca da Igreja. E para manter o luxo, as estratégias eram as mais variadas possíveis, desde a venda de cargos eclesiásticos e relíquias, até a comercialização de indulgências. Por meio desta última prática, boa parte ou todos os pecados de um fiel poderia ser absolvida com o pagamento à Igreja. Evidentemente, muitos fiéis e até mesmo muitos clérigos estavam insatisfeitos com estas negociações. A Igreja Católica vinha, portanto, desde o termo da Idade Média, perdendo sua identidade, pois preocupações materiais estavam levando a instituição a se desviar do objetivo espiritual. A instituição havia se afastado muito de suas origens e de seus ensinamentos, como pobreza, simplicidade e sofrimento. O clero, em 10 grande parte, estava desrespeitando as regras religiosas, sobretudo em relação ao celibato. A população estava cada vez mais insatisfeita com clérigos que mal sabiam rezar uma missa e comandar os rituais católicos. Com o declínio das rendas feudais, a Igreja lança mão de outras fontes: intensifica-se a venda de cargos eclesiásticos, a criação de dioceses e paróquias. O comércio e a veneração de artigos religiosos atingiram tal vulto que alguns críticos da Igreja denunciavam o fato de que nada menos de cinco tíbias do jumento montado por Jesus quando entrou em Jerusalém eram exibidas em diferentes lugares, sem contar as doze cabeças de João Batista, inúmeras penas do Espírito Santo e inclusive um ovo exibido pelo arcebispo de Mogúncia, além de espinhos da cruz de Cristo, pedaços do Santo Sudário ou do manto da Virgem Maria, migalhas de pão que Jesus partiu na última ceia... Outra forma de arrecadar dinheiro era a venda de dispensas. Uma dispensa era uma autorização dada pela Igreja que isentava o indivíduo de alguma lei específica estabelecida pela própria Igreja. Dispensas comumente vendidas eram para a isenção de jejuns ou para contornar leis matrimoniais. Por exemplo: primos em primeiro grau poderiam casar-se pagando determinada taxa. Já no caso de parentescos mais próximos, como casamentos entre tio e sobrinha, a taxa se elevava. SEFFENER, Fernando. Da Reforma à Contra-Reforma. O cristianismo em crise. São Paulo: Atual, 1993, p.20-21. Além disso, os preceitos católicos estavam em contradição aos anseios da burguesia, que neste período estava como emergente, e buscava ampliação de seus interesses econômicos. 2.2 O Humanismo Renascentista e a ascensão da burguesia. A mentalidade renascentista, caracterizada pelo individualismo e pelo racionalismo, com sua admiração pelas culturas clássicas grega e latina, e com a volta dos eruditos às fontes da Antiguidade, o que permitiu o desenvolvimento de um senso crítico em face dos comportamentos da época, sobretudo por parte de alguns elementos do clero da Igreja Católica Romana. Em fins do século XV, espalhou-se a crença de que ninguém entraria no paraíso após o Cisma do Ocidente, e esse clima aflitivo foi reforçado por teólogos e pregadores populares, que, preocupados com os graves pecados, enxergavam os últimos anos como o exórdio do Apocalipse. Mais tarde, se deu origem o humanismo, que provocou mudanças na consciência popular e junto com a burguesia (graças à intensificação das atividades marítimas, industriais, agrícolas e comerciais), foram lentas e gradativamente acabando com a estrutura e o espírito medieval, que ainda estava um pouco presente na Europa. Em resumo, o Humanismo pode ser descrito como uma ideia surgida durante o Renascimento, que coloca o homem como centro de interesse, ou seja, é em torno dele que tudo acontece. Os humanistas propunham a revalorização de Homem dentro do próprio processo do conhecimento (antropocentrismo); os cientistas e os artistas renascentistas passaram a buscar na natureza e na razão (e não mais nos dogmas) as respostas para suas questões. 11 Foi nesse ambiente que surgiram novas interpretações sobre o Cristianismo, que resultaram em novas religiões, chamadas de Protestantes. A burguesia por sua vez, via na Igreja Católica uma barreira para ampliação do seu poder comercial, continuamente mais importante diante da lógica das monarquias nacionais, os burgueses não encontravam respaldo às suas atividades no discurso da Igreja Católica que, tendo enriquecido dentro de uma lógica feudal, criticava severamente a usura, a acumulação de dinheiro, os empréstimos a juros, a obtenção de lucro. Assim, ao enquadrar como pecaminosas as operações básicas da Economia burguesia, a Igreja conquistou um importante inimigo.12 3 ENTENDENDO MELHOR OS INTERESSES POR TRÁS DA REFORMA RELIGIOSA. O século XVI teve como uma de suas manifestações mais profundas o processo de reformas religiosas, responsável por quebrar o monopólio exercido pela Igreja Católica na Europa e pelo advento de uma série de novas religiões que, embora cristãs, fugiam aos dogmas e ao poder imposto por Roma, as chamadas religiões protestantes. Mais do que apenas um movimento religioso, as reformas protestantes inseriram-se no contexto mais amplo que marcou a Europa a partir da Baixa Idade Média, expressando a superação da estrutura feudal tanto em termos da fé como também em seus aspectos sociais e políticos. O declínio do mundo feudal, pelo crescimento do comércio e da vida urbana, pela centralização do poder político nas mãos dos reis e pelo advento de uma nova camada social, a burguesia, muito contribuíram para que o monopólio da Igreja Católica Romana, perdesse sua força. 3.1 Quem eram os burgos? No século XV, século de grandes conquistas marítimas, o sistema feudal se encontrava em visível decadência e a Europa se modificava para mais uma transformação econômica. Era necessário recompor as rotas destruídas pelas guerras e desgraças. Ou abrir novas rotas. Nesse exato ponto a aliança entre reis e burgueses se mostraria essencial para a expansão marítima europeia. O termo burguesia deriva de “burgos”, pequenas cidades. Os burgueses surgiram em meados da Idade Média no processo de urbanização de crescimento e urbanização das cidades. Dotados de objetivos que visavam às intensas transações comerciais, precisavam de um governo forte e centralizado que incentivasse tais relações. As primeiras trocas comerciais eram feitas em feiras que impulsionaram pessoas e mais pessoas nestes locais e aos arredores, contribuindo para o crescimento urbano. Eles possuíam uma sistemática bem organizada, tanto que tinham associações que incentivavam o comércio, as chamadas guildas; além de se reunirem quando necessário nas Corporações de ofícios. O maior objetivo da burguesia era a ascensão e mobilidade social, uma vez que o antigo regime não permitia tal procedimento. O fato de grande parte das terras da região Europeia pertencer à Igreja, fez com que a nobreza despertasse o interesse em se apoderar dessas terras. Sedentos de poder e de riqueza, a nobreza e a burguesia mostravam-se insatisfeitos com a Igreja e o Imperador. 3.1.1 Os valores da Burguesia. Busca pela igualdade entre nobres e burgueses; Desenvolvimento de estratégias para modificar os dogmas católicos para o lucro exacerbado, já que era uma condenação cristã imposta pela Igreja. 13 Acabar com o Feudalismo e a centralização do poder feudal; Criação de uma moeda própria para os burgos para uma maior segurança nas transações comerciais; Liberdade e igualdade civil, mesmo não sendo tão bem vistos por muitos que questionavam sua natureza errante, pois os burgueses eram tidos como errantes por sua riqueza não ser de Deus. 3.1.2 Renascimento Comercial que se expande. Somado a estes fatores, é possível ver também a busca por valores coletivos e individuais pautados na busca da liberdade individual, direitos e abertura intensificada do comércio. Este Renascimento muito tem a ver com a expansão marítima ocorrida nos séculos XV e XVI, a época das Cruzadas, e abertura do mar mediterrâneo com o intuito de chegar às Índias, quando navegadores europeus se lançaram ao mar em busca de novas terras e rotas marítimas para as Índias, visando a obtenção e comercialização das famosas especiarias (que possuíam elevado valor comercial). 3.1.3 Os reis e a burguesia Completamente diferentemente dos senhores feudais, a burguesia emergiu e se fortaleceu se aliando aos reis e gerando grande riqueza a partir do comércio, sendo as cidades os grandes centros comerciais. Os reis, por sua vez, passaram a ter grande importância novamente, voltando a receber espetaculares fortunas (impostos), o que no sistema feudal era repartido com a nobreza. Os burgueses, que eram comerciantes, artesãos e afins, desejavam a centralização do poder nas mãos do rei por diversos motivos, como a unificação das leis, criação de moedas comuns e a maior liberdade de comércio sem os entraves de entrepostos (“pedágios” pela passagem entre um e outro feudo). Assim, cada vez mais forte e indivisível, a aliança entre reis e burguesia tomava fôlego para expandir o comércio, pois quanto mais os burgueses ganhavam, mais os cofres da coroa recebiam ouro e prata. Essa situação gerou uma nova prática: o mercantilismo. 3.2 O Mercantilismo No século XV, século de grandes conquistas marítimas, o sistema feudal se encontrava em visível decadência e a Europa se modificava para mais uma transformação econômica. Era necessário recompor as rotas destruídas pelas guerras e desgraças. Ou abrir novas rotas. Nesse exato ponto a aliança entre reis e burgueses se mostraria essencial para a expansão marítima europeia. O sistema feudal sucumbia, dando lugar ao mercantilismo (“embrião” do capitalismo) que visava à acumulação de metais preciosos, como ouro e prata, para se criar uma nação bem estruturada e poderosa. Para isso, era necessário ter produtos valiosos a oferecer e nada melhor que as especiarias do Oriente. De acordo com a doutrina mercantilista, o grande acúmulo de metais preciosos traria prosperidade à nação. Balança comercial favorável (mais 14 exportação e menos importação), pacto colonial e protecionismo são marcas desse sistema que vigorou até o fim do século XVIII. 15 4. A QUESTÃO POLÍTICA O que hoje chamamos de Alemanha era, desde a Idade Média, parte do Sacro Império Romano Germânico. Criado no século 11 como uma extensão temporal do poder do papado houve momentos em que o poder imperial entrou em choque com o papa, como na questão envolvendo as investiduras de bispos, no século 16. A vitória do papado nessa que ficou conhecida como a Querela das Investiduras aprofundou o poder político da Igreja na região. Por outro lado, o poder enorme exercido pela Igreja tornava-a o local ideal para a venda de relíquias e indulgências. Empenhado na construção da Basílica de São Pedro, o papa Leão 10º (1513-1521) encarregou o dominicano John Tetzel de realizar uma maciça venda de indulgências por toda a Alemanha. Há outros elementos decisivos nesse processo. A questão política passa a ganhar um peso significativo a partir do início do processo de centralização do poder. Naturalmente, os reis, ao buscarem se fortalecer politicamente, vão entrar em choque com o poder da Igreja. Em muitos casos, romper com a Igreja Católica e criar uma nova Igreja sob seu comando foi a forma encontrada pelos reis para se libertar do poder político do papado. Além disso, num quadro de crescimento do comércio, os dogmas da Igreja, de condenação à usura e ao lucro excessivo, representavam um forte obstáculo para a burguesia. Assim, também essa nova camada ascendente vai ter interesse em romper com os entraves impostos pelo catolicismo e adotar uma nova religião, para a qual suas práticas não se constituíssem em pecados e fossem consideradas como dignificantes do homem. Foi contra isso que se voltou o duque Frederico da Saxônia, impedindo a entrada de Tetzel em seu território. A alegação para a proibição foi o fato de a Igreja ter feito um acordo com a família de banqueiros alemães, os Függer, no qual os banqueiros emprestavam à Igreja o dinheiro necessário em troca da garantia de metade da renda obtida com a venda de indulgências. Nesse conflito envolveu-se Martinho Lutero (1483-1546), monge agostiniano e professor de teologia na Universidade de Wittenberg, com o apoio de Frederico. Na verdade, as críticas de Lutero à prática da Igreja já eram antigas, encontrando nesse contextoo espaço certo para sua disseminação. 4.1 A invenção da imprensa por Gutemberg e o acesso à Bíblia. As críticas ao clero decorriam da sua falta de preparação; os seminários só foram criados no final do século XVI. Esta crise da Igreja provocou outros descontroles. A radicalização social afetava a autoridade dos 8 príncipes, prejudicando a sua manutenção no poder e gerando lutas civis nas cidades. A única alternativa era reforçar o poder da igreja, colocando-a sobre o controle da política laica. Essa ação desmontava a tensão secular entre o império e o Papado e foi essencial na configuração dos poderes dos príncipes na Europa Centro-Ocidental. Nesse momento crítico a Igreja tinha que negociar essa relação, pois cada vez mais aumentava o poder dos príncipes soberanos, e os cismas avançavam na contra mão da universalidade da Igreja. Em vários territórios, os cleros locais seguiram indicações dos poderes laicos. 16 Esse clima de agitação decorreu ainda das críticas à Igreja e a sua teologia. Para desautorizar a igreja, os críticos deveriam mostrar como ela havia se afastado dos ditames espirituais e a saída mais radical foi demonstrar que a teologia da igreja romana não tinha base na história da Cristandade. A ênfase dos críticos recaiu sobre a Bíblia como instrumento de confronto com a direção temporal da Igreja e com base nessa explicação das relações de poder . A Bíblia foi tomada como a rocha entre as tempestades, o ancoradouro da fé e como a palavra de Deus. Utiliza-la significava observar a distância entre o que era dito pela Igreja Católica e aquilo que estava escrito. Os católicos não liam a Bíblia, apenas a conheciam sob as formas da exposição do clero. De imediato, o mais importante era liberar a sua leitura para todos. Isso requeria traduções nacionais e divulgação. As traduções foram feitas pelos críticos da Igreja que ainda pertenciam à hierarquia romana, e a divulgação da imprensa por Guttemberg. 17 5 MARTINHO LUTERO ( 1483- 1546). Lutero viveu sua infância em um mundo em mudanças. Teve uma educação severa e foi um excelente aluno na Escola de Magdeburgo dos Irmãos da Vida Comum. Posteriormente, ingressou na Escola de Eisenach e finalmente partiu para a Universidade de Erfurt, onde concluiu o bacharelado em 1502 e a licenciatura em filosofia em 1505, ano no qual resolveu estudar direito. Em 02 de julho de 1505, quando se dirigia Erfurt, Lutero foi surpreendido por uma tempestade com muitos raios e fez uma promessa a Santana de que, se sobrevivesse se tornaria um monge. Em 17 de julho ingressou na Ordem dos Eremitas de Santo Agostinho de Erfurt. Nesse período, diz o historiador Lucien Febvre, não havia nada que pudesse envolver Lutero com a reforma da Igreja. O que estava em jogo era uma mudança pessoal. Por conta de sua atuação na ordem, se envolveu em duas disputas que lhe garantiram liderança e reconhecimento e reconhecimento e o fizeram delegado à Roma para responder por questões de disciplina interna da ordem. Ficou em Roma do final do ano de 1510 até o início do ano seguinte. Essas quatro semanas foram decisivas na vida d Lutero. Suas expectativas com relação à cidade eram comuns a qualquer católico da época: ver o papa. Não só Lutero não viu o papa, Como não aprovou aquilo pelo qual havia sido indicado como delegado. Mas sua estada mais: o descaso da igreja com os seus fiéis. Na volta a Erfut, Lutero refez suas ideias e passou a meditar sobre questões tológicas nos evangelhos. Em seguida viajou para Wittemberg para aprofundar seus estudos. Em 1512, doutorou-se em teologia e acumulou as funções de pregador e professor na Universidade superior da comunidade. Rápida carreira para quem inicialmente optou por monge por um acidente. Os anos1511 e 1512 foram decisivos, pois neles se envolveu com novas leituras que o levaram a discutir ideias dogmáticas da teologia católica. Por suas novas funções estava em contato com as questões administrativas e políticas da igreja; e além disso, tinha diante de si fiéis e estudantes. Sua carreira universitária começou em 1513 e todos os seus cursos revelam sua tendência para interpretação crítica das epístolas de São Paulo. Em seus cursos foi se envolvendo com os textos de Santo Agostinho e de Pedro Lombardo e aprofundando os seus estudos da Bíblia. Desses estudos resultaram alternativas teológicas, retiradas da Bíblia, que se opunham ao que Lutero considerava os erros da Igreja Católica. 5.1 O justo viverá pela fé. A consistência de suas ideias também era oriunda da leitura dos míticos alemães do século XV, que lhe revelaram uma historia que diferenciava a Alemanha de Roma. Para Lutero, só Deus era misericordioso. Havia nesse reconhecimento uma aproximação com São Paulo. O homem é justificado pela fé, independente das obras, isto porque, pecado e tentação andam juntos. Feliz o homem a quem Deus não imputa o pecado. A teoria da justificação pela fé vai se tornar a base do protestantismo oficial. Em sentido oposto ao da Igreja Católica, Lutero Insistia sobre o pecado original para acentuar a degradação do homem. A condenação dependia de Deus. 18 Com isso, os sacramentos ligados à obtenção das graças perdiam a importância. O diálogo entre o homem e Deus substitui a liturgia e os sacramentos. Lutero acentuava a ideia de que só a fé salvava e não as obras. Esse é o argumento para atacar as “falsas boas obras”, principalmente aquelas que envolviam dinheiro. A construção teológica iniciada por Martinho Lutero deu origem a um princípio conhecido como Cinco Solas: 1. Sola fide (somente a fé) 2. Sola scriptura (somente a Escritura) 3. Solus Christus (somente Cristo) 4. Sola gratia (somente a graça) 5. Soli Deo gloria (glória somente a Deus) 19 6 O INÍCIO DA REFORMA O marco que é historicamente indicado como o início do processo reformista é a reação de Martinho Lutero, em 1517, ao afixar suas 95 teses em Wittenberg. Elas já haviam sido enviadas as autoridades envolvidas com indulgências. Só depois de não ter recebido resposta foi que Lutero enviou a alguns amigos. Com elas, Lutero reafirmava que o homem era pecador, mostrando a ineficácia das indulgências, e estringia o poder da hierarquia da igreja quando dizia que a autoridade eclesiástica não podia diminuir as penas daqueles que se encontravam no purgatório. Como só Deus era capaz de perdoar os pecados, era necessário que o homem confirmasse essa ação e não a igreja. As teses de Lutero chegaram a Roma, foram estudadas e a partir dos comentários das autoridades da Cúria foi aberto um processo na Câmara Apostólica. Enquanto isso, a polemica avançava na Alemanha por conta da divulgação das teses que foram impressas sem o conhecimento de Lutero. Excomungado como herege em 1520 pelo papa, Lutero recusou-se também a se retratar na Dieta de Worms, convocada pelo imperador Carlos 5º (Carlos de Habsburgo) e composta por todos os nobres laicos e eclesiásticos do Sacro Império. Estes, por sua vez, tinham interesse em apoiar Lutero, interessados em livrar-se da autoridade papal e em limitar o poder do imperador, defensor do catolicismo. Foram os príncipes alemães e a alta nobreza que ocultaram Lutero num castelo da Saxônia, impedindo sua execução. Havia condições favoráveis à propagação das ideias de Lutero, pois coexistia aos problemas religiosos uma série de fatores sociais e econômicos, especialmente na região da atual Alemanha. Entre esses fatores, podemos destacar o fato de grande parte das terras da região pertencerem à Igreja, existindo um grande interesse da nobreza em se apoderar dessas terras. Sedentos de poder e de riqueza, a nobreza e a burguesia mostravam-se insatisfeitos com a Igreja e o Imperador; os camponeses e os artesãosurbanos, por sua vez, também julgavam a Igreja culpada pela situação de miséria em que viviam. A rejeição luterana ao universalismo católico em prol dos direitos do Estado conquistou apoio da nobreza, que com a Reforma poderia se apoderar dos bens da Igreja, e despertou o entusiasmo popular. Os príncipes locais foram apoiados por Lutero, que reconhecia neles uma soberania tanto terrena como espiritual e, sob o pretexto de acatar a nova religião, os nobres confiscaram os bens do clero. Eis algumas das 95 teses: Tese 21 - Estão errados os que pregam as indulgências e afirmam ao próximo que ele será liberto e salvo de todo castigo dos pecados cometidos mediante indulgência do papa. Tese 36 - Todo cristão que se arrepende verdadeiramente dos seus pecados e sente pesar por ter pecado tem total perdão dos pecados e consequentemente de suas dívidas, mesmo sem a carta de indulgência. Tese 43 - Deve-se ensinar aos cristãos que aquele que dá aos pobres ou empresta a quem necessita age melhor do que se comprasse indulgências 6.1 Guerras e Revoltas 20 Durante os três anos em que ficou oculto, Lutero traduziu a Bíblia para o alemão, numa forma de tornar seu conhecimento mais difundido entre a população, de modo a provar o quanto a Igreja havia se afastado dos propósitos cristãos. Em sua maioria, os príncipes alemães declararam-se adeptos da nova religião proposta por Lutero. Vendo nisso uma clara ameaça a seu poder, o imperador Carlos 5º impôs o catolicismo como religião oficial do império. Os príncipes protestaram contra essa imposição (daí advindo o termo "protestante"), dando início a um longo processo de guerras de religião na Alemanha. Por outro lado, além do apoio da nobreza, por razões políticas, as ideias de Lutero despertaram o apoio dos camponeses, vendo nos ataques à Igreja uma oportunidade de reduzirem o grau de profunda desigualdade e exploração a que estavam submetidos. Várias revoltas camponesas eclodiram na Alemanha, entre elas a principal, liderada por Thomas Müntzer. Liderados por Tomas Müntzer, eram contrários ao acúmulo de riquezas pelo clero. Lutero, que defendia a obediência à autoridade secular e necessitava do apoio dos príncipes, condenou esse e outros movimentos. A revolta anabatista foi duramente reprimida. Assim, Lutero defendeu a postura mais agressiva possível contra eles. A repressão aristocrática aos camponeses durou de 1524 a 1536 e produziu mais de cem mil mortos. 6.2 Carlos V, Centralismo e o surgimento do Protestantismo. Vendo na Reforma uma oportunidade para resistir ao imperador do Sacro Império Romano-Germânico, os príncipes se levantaram contra o imperador Carlos V, que tentou controlar os descontentamentos convocando duas dietas em Spira. Na primeira dieta, em 1526, decidiu-se que os governantes de cada território eram livres para escolher sua religião; na segunda, em 1529, o catolicismo foi imposto a todos os luteranos. A reação dos partícipes valeu a eles o título de Protestantes. Enquanto o imperador buscava implantar o centralismo monárquico, os príncipes não abriam mão dos direitos feudais. Na guerra que sobreveio, os príncipes se uniram na chamada Liga de Samalkalde para combater os avanços de Carlos V e seus partidários católicos. Após quase vinte anos de conflito,estabeleceu-se a Paz de Augsburgo, em 1555 (SEFFNER, 1993). No ano seguinte, Carlos V abdicou do trono da Espanha em prol de Felipe II, e do Sacro Império Romano Germânico, em nome de seu irmão Fernando I. Sua dinastia, a dos Habsburgo, continuava reinando em duas importantes nações europeias, e o imperador retirou-se para um convento, onde faleceu. 6.3 Mudanças Já em 1527, Lutero, juntamente com Melanchton, elaborou a Confissão de Augsburgo, que estabelecia os princípios de sua doutrina. Por ela estabelecia-se: que as Escrituras Sagradas eram o único dogma da nova religião; a fé era vista como a única fonte da salvação; a livre interpretação da Bíblia passava a ser permitida; negava-se a transubstanciação (transformação do pão e do vinho no corpo e no sangue de Cristo, presente na fé católica) e a crença de que a presença 21 de Cristo na Eucaristia era espiritual; adotava-se o alemão, e não mais do latim, como idioma nos cultos religiosos; a Igreja passava a ficar submetida ao Estado; e, finalmente, permaneciam apenas dois sacramentos: o batismo e a eucaristia. Em 1555, a Dieta de Augsburgo permitiu que cada príncipe escolhesse a sua religião, que passaria a ser também a de seus súditos ("cujus regio ejus religio" - tal príncipe, sua religião). O luteranismo triunfara na Alemanha. Foi adotado também na Suécia, em 1527, e na Dinamarca e Noruega, em 1536, como forma de afirmação dos poderes reais contra a interferência de Roma. É importante lembrarmos que no momento em que se estruturava o que posteriormente ficou conhecido como Reforma, não existia uma monarca na Alemanha, como havia, há muito, na França ou na Inglaterra, e que poderia reunir, nos momentos de crise, todas as energias do país ao redor de sua pessoa e de sua dinastia. As terras germânicas apresentavam uma contradição, pois apesar da burguesia fragilizada, a Igreja era poderosa e abastada. (FEBVRE, 1976). 22 7 JOÃO CALVINO João Calvino nasceu uma geração depois de Martinho Lutero. Como seu primeiro lar foi a cidade de Noyon, ao norte de Paris, ele começou a vida mais perto de Londres do que de Genebra, cidade à qual sua fama ficou ligada. Sério, impetuoso por natureza e de pensamento bem organizado, Calvino começou a estudar a Bíblia e a escrever sobre suas conclusões no momento em que as ideias de Lutero despertavam simultaneamente hostilidade e curiosidade em Paris. As obras de Lutero, podemos dizer, tiveram continuidade nas ações do teólogo francês João Calvino, para quem nem a fé nem as obras garantiriam a salvação do homem, pois as pessoas estavam predestinadas por Deus a ser salvas ou condenadas e queimadas no inferno. Estas ideias foram defendidas na obra Instituição da religião cristã (1536), nada que os homens fizessem em vida poderia alterar-lhes o destino, já traçado anteriormente. As ideias de Calvino sobre predestinação tornaram-se notórias. Ele afirmava que Deus decide antecipadamente o que acontece à alma de todos os homens e mulheres. Assim, por mais que a pessoa se esforçasse, tinha o destino traçado desde o nascimento. Não havia tribunal de apelação nem luta por oportunidades iguais. Calvino considerava a vida uma corrida com resultado pré-estabelecido. Segundo ele, a criação não é feita em série, mas ‘alguns nascem predestinados à vida eterna, e outros, à condenação eterna’. Em essência, a doutrina enfatizava o poder e a sabedoria de Deus e, em contraste, a fragilidade e a ignorância dos seres humanos (BLAINEY, 2002, p.126). Os valores defendidos pelo calvinismo eram úteis à burguesia nascente, pois admitiam o lucro ou a acumulação, a prática da usura e as atividades comerciais; o trabalho, é bom enfatizar, era muito valorizado e visto como fonte de enriquecimento individual. Calvino acreditava que a acumulação material poderia ser tida como um indício, mas não uma garantia, de que o indivíduo seria um eleito de Deus, ou seja, teria a sua alma salva. As ideias de João Calvino espalharam-se pela França, Inglaterra, Escócia e Holanda no século XVI. No contexto das guerras religiosas e das disputas por territórios coloniais, os calvinistas franceses, chamados de huguenotes, tentaram estabelecer-se na colônia portuguesa, no território dos atuais Rio de Janeiro e Maranhão, nos séculos XVI e XVII. Calvino foi perseguido por suas ideias e procurou refúgio em Genebra, na Suíça, onde encontrou um público receptivo às suas concepções. Ali, Calvino alcançou rapidamente o poder e aplicou suas ideias à administração pública. Depois da morte de Lutero, em 1546,Calvino tornou-se praticamente o líder não oficial do protestantismo e fez de Genebra o reduto de estudantes, teólogos e religiosos dissidente. 23 8 A REAÇÃO DA IGREJA CATÓLICA. A contínua expansão do protestantismo por toda Europa colocou a Igreja Católica em uma situação crítica. Impunha-se uma reforma para moralizar o clero e, ao mesmo tempo, desencadear o combate às novas religiões, classificadas como heresias. O surgimento da Companhia de Jesus, em 1534, por obra de Ignácio de Loyola revelou-se fundamental para a realização da Reforma católica. Os jesuítas, chamados de "soldados de Cristo", devotando uma cega obediência ao papa, encarregaram-se de organizar um concílio. 8.1 A Inquisição. Enquanto aguardava a instalação do concílio, o papa Paulo 3º (1534-1549) tomou medidas para combater o protestantismo. Em 1542, a Inquisição (ou Tribunal do Santo Ofício) foi reativada. Dominada pelos dominicanos, ela conseguiu, utilizando de métodos violentíssimos, deter o avanço protestante na Itália, na Espanha e em Portugal. Nos países ibéricos, o apoio real foi fundamental para a derrota do protestantismo. E em 1543 foi elaborado o Index Librorum Prohibitorum, ou simplesmente Index, um catálogo que arrolava obras de leitura proibida aos católicos. 8.2 O Concílio de Trento. O Concílio de Trento reuniu-se, finalmente, em 1545, durando até 1563. Foi ecumênico, ou seja, reuniu representantes de toda Igreja. Ele produziu uma Igreja reformada, embora os dogmas católicos não sofressem alteração: o princípio da salvação pelas boas obras foi confirmado; o culto à Virgem e aos santos foi reafirmado; a infalibilidade papal, o celibato clerical e a indissolubilidade do casamento foram mantidos. Graças às pressões dos jesuítas, a autoridade papal foi reforçada. A disciplina do clero restabelecida: fixaram-se condições e idades mínimas para o exercício das funções eclesiásticas; o acúmulo de bispados e paróquias foi proibido, bem como a venda de indulgências. Criaram-se seminários para a formação dos eclesiásticos e foram elaborados um Catecismo e um Missal. Com a Igreja revigorada, os católicos dedicaram-se à Contra-Reforma, com o sistemático combate às religiões protestantes. Internamente, a Inquisição encarregou-se de manter o controle sobre as populações católicas, perseguindo os heréticos e contendo a difusão das doutrinas protestantes. Externamente, procurou-se reconquistar, por meio da educação, as áreas perdidas para o protestantismo. Pelo empenho dos jesuítas, vários colégios encarregados do ensino primário foram fundados na Europa. O resultado foi modesto. Após duas gerações, parte da Renânia, o sul dos Países Baixos e a Polônia haviam sido reconquistados. O maior êxito da Contra-Reforma deu-se pela difusão do catolicismo entre os povos pagãos, por meio da catequese. Graças ao controle ibérico sobre a maioria da América, as massas indígenas foram convertidas, e os esforços, especialmente dos jesuítas, alcançaram na Ásia, a China e o Japão, embora com resultados modestos e passageiros. O resultado foi positivo para Igreja Católica, porque recompôs a sua autoridade e renovou o seu caráter universal, dando a impressão de que os católicos 24 eram os únicos que possuíam direito ao uso da noção de humanidade e colocando os protestantes como interessados nos poderes locais, tornando a Reforma Protestante como mais um capítulo do velho problema entre o Papado e o Império. Das determinações desse concílio podemos destacar: – os Sacramentos e a realização de obras continuaram sendo princípios para a salvação; – foi lançado a Lista de Livros Proibidos (Index Librorum Proibitorum), ampliando a censura; – a Santa inquisição foi reformada e confiada a um grupo de cardeais ligados ao papa (Tribunal do Santo Oficio); – foram criadas escolas para a formação de religiosos (os Seminários); – a Companhia de Jesus foi aceita como uma ordem ligada a Roma, com a missão de educar os católicos da Europa e catequizar os povos dos novos mundos que estavam sendo descobertos (Expansão Marítima). 25 9 CONCLUSÃO. As atitudes produzidas pela Reforma Protestante alteraram os valores, rompendo com o que ainda havia de velho nos Tempos Modernos. Isso porque as reformas solicitaram dos homens novas atitudes diante do mundo, atitudes morais e éticas que correspondiam a eliminar os males da devassidão e do pecado que diminuíam a vontade e a fé em Deus e amoleciam o Espírito. Esse valor novo cunhou uma nova atitude do homem diante do mundo, o que produziu uma mentalidade, um modo de vida, que foi responsável pela efetiva institucionalização do capitalismo. As condições materiais do Ocidente deram origem ao espírito do capitalismo. O “espírito” do capitalismo foi muito bem definido na obra de Max Weber, como o sentimento que passou a definir a sociedade moderna pós reforma. Na verdade, houve uma fermentação que culminou com tal evento. Portanto, entendemos que mais que um movimento religioso, a Reforma envolveu interesses políticos, econômicos e culturais, mudando a forma das pessoas de pensar os papéis da tradição e da religião, levando-as questionar princípios éticos e morais capazes de produzir uma noção de cálculo que teria contribuído para formulação das bases do capitalismo. Estabeleceram valores civilizatórios e assim abriram caminhos para a atividades técnicas e ao comércio. Deve-se ainda mencionar para que se tenha noção de um quadro mais rico e complexo no século XVI- não necessariamente polarizado entre protestantismo e catolicismo- o movimento envolveu também os camponeses, a nobreza e, sobretudo, a burguesia. Portanto, a reforma ocorreu não apenas pelo anseio de mudança de comportamento religioso, mas por favorecer as classes que viam na Igreja Católica Romana, um empecilho para expansão de seus negócios e por fim a soberania da igreja que a longos passos enriquecia e sujeitava a população em prol dos seus interesses. Como efeito, o movimento reformista abalou profundamente o poder centralizado da Igreja Católica, apresentando novas opções religiosas. Como destacou Max Weber (2003),o calvinismo instigou o desenvolvimento do capitalismo ao propor uma religião pautada no trabalho e no lucro. Lutero, ao propor a livre interpretação da Bíblia, contribuiu para o aprendizado da leitura. O que fizemos foi destacar alguns dos principais eventos, como pano de fundo deste cenário aparentemente religioso, mas que também envolviam disputa de poder e comércio, como também interesses culturais. Nosso maior interesse foi responder estas questões, com os fatos narrados em ordem cronológica que culminaram nas reformas religiosas. A Reforma não aconteceu de repente, mas foi uma série de eventos, políticos, econômicos, sociais, e essencialmente, religiosos. A Reforma ganhou força mediante a um período de decadência moral, de conspiração financeira e de poder político tremendamente malsucedido, que severamente desafiava a credibilidade da Igreja como guia moral e espiritual. Havia sinais de exaustão e decadência, levando a sociedade uma busca por mudança de costumes para que seus anseios fossem respondidos. Portanto, a Reforma Protestante carregava em si o embrião das grandes transformações, não apenas religiosas, mas culturais, sociais, políticas, econômicas etc. Conflitos religiosos, até mesmo nos dias atuais, envolvem disputa de poder e interesses políticos, sempre favorecendo as classes dominantes e pondo em 26 condições desfavoráveis as recessivas. Devemos ter como exemplo estes eventos, para que haja uma mudança em nosso pensamento analítico e venhamos agir então com racionalidade diante destes acontecimentos. Atualmente no Brasil, existem cerca de 20% dos brasileiros que se identificam como “evangélicos”, que são eles luteranos, calvinistas, batistas, metodistas,presbiterianos, dentre outros, denominações de igrejas oriundas do protestantismo. 27 REFERÊNCIAS HURLBUT, Jesse Lyman. A História da Igreja Cristã. São Paulo: Editora Vida, 2002. WEBER, Max. A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. São Paulo: Editora Companhia das Letras, 2004. KAMITA, João Massao – RODRIGUES, Antônio Edmilson M. História Moderna. Petrópolis: Editora Vozes, 2018. NATEL, Angela. Teologia da Reforma. Curitiba: Editora Intersaberes, 2016. BERTOLOTI, Karen Fernanda da Silva. História Moderna, da Transição do Feudalismo às Reformas Religiosas. Rio de Janeiro, SESES, 2017. https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/10042/10042_3.PDF acesso em 12/05/2020. https://incrivelhistoria.com.br/burguesia-resumo/ acesso em 17/05/2020. https://www.historiadomundo.com.br/idade-moderna/reforma-protestante.htm acesso em 20/05/2020
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