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Maria Seiane - Medicina DEFINIÇÃO Broncoaspiração: A aspiração refere-se à inalação de material estranho (secreção orofaríngea, gástrica, sangue, líquidos, alimentos) para o interior das vias respiratórias, abaixo das pregas vocais. Podendo desencadear pneumonia infecciosa, pneumonite química e síndrome da angústia respiratória; Microaspiração: Aspiração de pequena quantidade de alimento e/ou secreção e/ou saliva. FATORES DE RISCO Doença Neurológica: Distrofia muscular, tumor de sistema nervoso central, polineuropatia, acidente vascular encefálico, traumatismos cranianos, doença de Parkinson. Alteração do nível de consciência: escala de RASS (Escala de Agitação e Sedação de Richmond) com pontuação diferente de zero. Intubação Orotraqueal: Permaneceu em IOT (intubação orotraqueal) mais de 48 horas e foi extubado. Uso de dispositivos: traqueostomia, sonda nasoenteral e gastrostomia. Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica descompensada: em uso de antibioticoterapia, corticoterapia sistêmica e inalatória, broncodilatador e imunomodulados. Disfagia mecânica: por doença de cabeça e pescoço, buco maxilo facial e traumas de face. Disfagia – estudos mostram maior risco em mulheres – e refluxo gastroesofágico; Uso de dietas enterais, medicações psiquiátricas e depressoras do sistema nervoso central, cirurgias de cabeça e pescoço, neoplasias, doenças pulmonares e o processo de envelhecimento; MEDIDAS PREVENTIVAS Manter decúbito elevado a 30° permanentemente (não reduzir durante o banho no leito); Monitorar o nível de consciência e estado pulmonar; Avaliar o reflexo de tosse, a habilidade de deglutição, o controle do vômito; Manter cabeça elevada 30 a 40 minutos após a alimentação, inspecionar alimentos ou medicamentos retidos em cavidade oral, prestar cuidados bucais e verificar sondas gástricas/ enterais/ gastrostomia; Posicionar o paciente no mínimo a 60º durante a oferta de alimentos por via oral (VO); Realizar Higiene Oral no mínimo 3x/dia de acordo com protocolo institucional; Introduzir dieta cremosa homogênea com líquidos espessados na consistência mel (de acordo com orientação do fabricante); Orientar paciente e familiar/acompanhante quanto ao modo de oferta da alimentação por VO; Ofertar o alimento somente se o paciente estiver alerta; Observar sinais de aspiração laringotraqueal; Manter pressão do cuff de 20-30 cm de água em pacientes traqueostomizados. FISIOPATOLOGIA As vias aéreas superiores apresentam como mecanismo de defesa, o movimento coordenado entre respiração e a deglutição; A coordenação entre o fechamento laríngeo, a deglutição e o espasmo da laringe ou tosse responde à estimulação da faringe ou laringe. FISIOLOGIA DE ALIMENTAÇÃO E DEGOLUÇÃO: A deglutição normal é o resultado da integração efetiva da função sensorial e motora e da coordenação de ações voluntárias e involuntárias por meio da anatomia aerodigestiva intacta; A deglutição é dividida em quatro etapas: oral preparatória, oral, faríngea e esofágica: oral preparatória (voluntária/mastigação), oral (engolir/voluntária), faríngea (involuntária/ cessação sequencial da respiração, adução das pregas vocais, elevação da laringe com aproximação das aritenóides e retroflexão da epiglote) e esofágica (involuntária/ começa com o relaxamento do cricofaríngeo, seguido pelo trânsito para o estômago por uma combinação de peristaltismo e gravidade); Maria Seiane - Medicina Nas vias inferiores a tosse e o clearence mucociliar desempenham este papel de defesa. Os mecanismos responsáveis pelo desenvolvimento da doença pulmonar nos processos aspirativos são: a aspiração direta e o refluxo gastroesófagico (RGE) com aspiração pulmonar; o Na aspiração direta, durante o ato de deglutição, o conteúdo do orofaringe atinge as vias aéreas inferiores, promovendo obstrução laríngea ou brônquica e sufocação ou atelectasia maciça; A resposta inflamatória local é alterada pela aspiração de partículas alimentares, havendo influxo de leucócitos polimorfonucleares e formação de granulomas. o Nas situações de RGE com aspiração pulmonar, ocorre aspiração do conteúdo gástrico refluído; quanto mais baixo for o pH do material, maior serão as alterações estruturais; O aumento da resistência pulmonar total, devido à acidificação esofágica por meio de reflexos vagais é outro mecanismo responsável pelo desenvolvimento da doença no RGE; nesta situação as manifestações respiratórias ocorrem sem que haja aspiração pulmonar do conteúdo gástrico. A presença de ácido no esôfago terminal determina aumento da resistência pulmonar total, observada em pacientes com doenças pulmonares crônicas como asma grave ASPIRAÇÃO DE CORPO ESTRANHO Ocupa um dos primeiros lugares na patologia acidental e deve ser lembrada pelo pediatra, toda vez que estiver diante de uma síndrome broncopulmonar de causa incerta; A criança pequena tem tendência a colocar objetos na boca e acidentalmente, aspira estes objetos, podendo ocorrer desde um episódio de engasgo até uma obstrução aguda e fatal das vias aéreas; Quanto à localização: o Se ele fica alojado em laringe ou faringe, os sintomas aparecem em tempo variável após o acidente, muitas vezes demorando a se manifestar causando dissociação entre causa e efeito, o chamado “período de silencio”. o Quando o objeto ingerido tem calibre superior ao dos brônquios, pode ficar livre na traquéia, havendo o risco do mesmo encravar-se na sub- glote. Os sinais de localização não aparecem, ocorrendo tosse, estridor, sibilos e retração simulando um quadro de laringite. o Nos casos em que o objeto tem menor calibre a tendência é que ele se fixe no brônquio. De acordo com o calibre do corpo estranho, este pode progredir até o brônquio de menor calibre e ai se encravar ou mobilizar-se posteriormente; o A presença de corpos estranhos no esôfago pode causar sintomas respiratórios, pelo fato de que a laringe, traquéia e esôfago constituem uma unidade embriológica e funcional. Quando o corpo estranho ultrapassa o esfíncter esofágico superior, pode ficar retido por estenose esofágica ou por características do próprio corpo estranho, tais como tamanho e forma; Quanto ao estado físico dos corpos estranhos: o Os mais comumente aspirados são sólidos, como brinquedos de materiais plásticos e metálicos, assim como alimentos, especialmente vegetais oleosos como amendoim e não oleosos como feijão e milho. o Como material liquido são citados leite, material gástrico, mecônio e água doce ou salgada em casos de afogamento; o Como material gasoso, observa-se principalmente a inalação de fumaça. o Outro deve ser considerado, como a aspiração do talco usado em lactentes que desenvolve um quadro respiratório agudo e febril que pode evoluir para o óbito, assim como o afogamento; Na aspiração de partículas sólidas: É uma macroaspiração de partículas alimentares sólidas, resultando em obstrução aguda das vias aéreas de menor calibre e possivelmente até das maiores. Tem como consequências hipoxemia arterial súbita, desenvolvimento de atelectasia distal ao corpo estranho e infecção pulmonar secundária; o Estudos em animais mostram que a instilação pulmonar de partículas não ácidas leva à resposta inflamatória neutrofílica aguda, que pode ser detectada em 4-6h, mas não há edema, como ocorre na inalação ácida. Em 48h após a aspiração surge um pico o Na resposta monocítica e o tecido pulmonar já exibe sinais de formação de granuloma. Maria Seiane - Medicina Mediadores de resposta inflamatória aguda também estão presentes. Inalação silenciosa: com consequente infecção bacteriana secundária. A pneumonia aspirativa é um processo infeccioso, que é a consequência dainalação de secreção da orofaringe ou do conteúdo gástrico contaminado com bactérias patogênicas. Corresponde a um ou vários episódios de microaspirações. Pneumonite aspirativa ácida pode estar associada e favorecer o desenvolvimento secundário da pneumonia pela superinfecção de bactérias, devido à destruição do epitélio respiratório. REFLUXO GASTRO-ESOFÁGICO É o retorno involuntário do conteúdo do estômago para o esôfago. Pode ser fisiológico e patológico, constituindo a Doença do refluxo gastresofágico (DRGE); O refluxo é comum na alergia à proteína do leite de vaca e em crianças com paralisia cerebral e retardo mental; É uma macroaspiração por inalação do conteúdo gástrico, com pH inferior a 2,5 e um volume superior a 0,4 mL.kg-1 do peso corporal, que ocasiona dano químico ao tecido pulmonar, cuja extensão vai depender do valor do pH e da quantidade de líquido aspirado. O mais comum é o conteúdo gástrico estéril, embora outros, como a bile ou agentes diversos instilados no estômago, possam também resultar nessa síndrome; A lesão no parênquima pulmonar após a aspiração do conteúdo ácido tipicamente ocorre em duas fases. o A primeira é marcada por um processo físico- químico pelo efeito tóxico direto do ácido no epitélio respiratório. Há lesão da barreira alveolocapilar, com destruição das células tipo I do epitélio alveolar, resultando em uma lesão grave do endotélio pulmonar. Isso promove aumento da permeabilidade alveolar e infiltração difusa, com o desenvolvimento de edema pulmonar intersticial e consequente redução da complacência pulmonar e diminui o prejuízo na relação ventilação-perfusão. o A segunda fase, em 4-6h, é caracterizada por uma resposta inflamatória neutrofílica aguda. Esse mecanismo patogênico leva à perda da integridade da microvasculatura pulmonar e extravasamento de fluidos e proteínas para as vias aéreas e alvéolos. Os neutrófilos também desempenham papel-chave no desenvolvimento da lesão pulmonar, pela liberação de radicais livres e proteases. Adicionalmente à resposta inflamatória celular, associam-se mediadores da resposta inflamatória locais e sistêmicos, como citocinas pró-inflamatórias, fator de necrose tumoral (TNF)- α e citocinas quimiotáticas. Os eucasanoides também exercem papel na lesão pulmonar ácido- induzida e age em conjunto com as citocinas para promover infiltração e ativação neutrofílica. A ativação do complemento é conhecida como um fator importante na resposta inflamatória que se segue à aspiração. o Clinicamente, a pneumonite aspirativa pode evoluir de forma assintomática ou com tosse não produtiva, quadro de taquipneia, broncoespasmo, escarros hemoptoicos, até o desenvolvimento de insuficiência respiratória em 2-5h após a aspiração A aspiração ácida, que leva à pneumonite química, devido à aspiração de suco gástrico ácido, com o desenvolvimento imediato de hipoxemia, febre, taquicardia e alterações patológicas nos Raios-X de tórax; A presença de sintomas respiratórios se deve a ação irritativa do material do refluxo no ouvido médio, faringe, seios da face e laringe. A criança pode apresentar, tosse, rouquidão e quadros de otite, faringite, sinusite e laringite de repetição. O refluxo para a parte alta do trato respiratório pode ocasionar, principalmente broncopneumonias além da Síndrome de Sandifer, na qual criança promove uma inclinação lateral do pescoço para proteger a árvore respiratória do material refluído; CLASSIFICAÇÃO A aspiração pulmonar pode ser dividida em três diferentes entidades, dependendo da condição e da composição do material aspirado, embora não haja clinicamente uma demarcação estrita entre elas: aspiração ácida, de partículas sólidas e inalação silenciosa; A aspiração pulmonar pode ser aguda (acidental) ou crônica (habitual). o A aspiração aguda pode ocorrer desde o período neonatal até a adolescência. A granulação e a composição do material aspirado são elementos importantes em função das reações orgânicas que ocasionam. Maria Seiane - Medicina o A aspiração crônica pode ocorrer devido a RGE com aspiração do conteúdo gástrico e alimentos, em função de distúrbios da deglutição com predomínio de alimentos, saliva e secreções brônquicas. Doenças neurológicas - coma e epilepsia - onde são aspirados saliva e conteúdo gástrico podem ocasionar casos de aspiração crônica. Outra causa é a síndrome adeno-tonsilo- sinusal, com aspiração de secreções infectadas. Causas de distúrbios da deglutição: fístula traqueoesofágica, fenda laringotraqueoesofágica, causas neurológicas – doença neuromuscular; Também pode ser classificada de acordo com o tipo de material aspirado em: irritativa, infecciosa e obstrutiva. o Como síndrome irritativa encontramos as pneumonites químicas por ácido, hidrocarbonetos, óleo vegetal, mecônio, álcool e gordura animal. o Na síndrome de aspiração infecciosa ocorre aspiração de saliva e secreções contaminadas; o Síndromes aspirativas obstrutivas são causadas por afogamento e aspiração de corpo estranho; MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS As manifestações clínicas da aspiração de objetos pelas vias aéreas seguem, geralmente, três estágios de sintomas: o evento inicial agudo, o intervalo assintomático e as complicações. o O evento inicial caracteriza-se pela aspiração acidental de um corpo estranho e a manifestação clínica clássica é a presença de tosse intensa, sibilância, vômito, palidez, cianose; o Após os sintomas iniciais, há um intervalo assintomático ou oligossintomático, que varia de poucas horas a dias ou mesmo semanas, até o reaparecimento dos sintomas. Após a aspiração do corpo estranho, ocorre tosse paroxística e apneia em grau variável, com asfixia, levando à morte, dependendo das características do material aspirado tais como: volume, capacidade de lesar os tecidos e tamanhos das partículas. Sinais de aspiração laringotraqueal: Tossem engasgo, pigarro, voz molhada, desconforto respiratório durante ou após a alimentação; Presença de resto alimentar orotraqueal; Cianose durante ou após alimentação; Taquipnéia em repouso, sibilos bilaterais na ausculta pulmonar e redução da oxigenação arterial; Nos pacientes em que acorre a aspiração pulmonar, quatro tipos básicos de sintomas podem ocorrer: apnéia, pneumonia aspirativa aguda, doença pulmonar crônica e distúrbios da deglutição. Consideram-se como sinais sugestivos de aspiração, dificuldade no ato da alimentação, presença de leite na boca ou narinas nos intervalos das mamadas, engasgo, vômitos, regurgitações habituais, tosse noturna, cianose e apneia. A presença de tosse e chiados é relatada em 80% a 100% dos casos. Infecções respiratórias recorrentes; Os corpos estranhos aspirados podem alojar-se na laringe, traqueia e brônquios: o Laringe: hemoptise e dispneia com sibilância e cianose. A obstrução resultante da ACE laríngeo pode ser fatal caso não seja feito um diagnóstico precoce e instituído tratamento apropriado. O tratamento de escolha nesses casos é a laringoscopia direta com um endoscópio rígido de tubo aberto; quando há uma dispneia grave, pode ser necessária a realização de traqueostomia antes da laringoscopia. o Traqueia: Os sinais típicos da presença de corpo estranho traqueal são os sibilos e o golpe audível e palpável produzido pela impactação expiratória a nível subglótico. o Brônquios: O paciente apresenta tosse e sibilos, que geralmente são unilaterais, diminuição dos ruídos respiratórios localizados e dispneia de intensidade variável a cianose também pode estar associada. Um corpo estranho não obstrutivo e não irritante pode produzir poucos sintomas, mesmo após um período de tempo prolongado; enquanto um corpo estranho obstrutivo produz sinais e sintomasrapidamente. Observa-se no quadro clínico de ACE em árvore brônquica desde sibilos, hiperinsuflação até atelectasias; COMPLICAÇÕES Podendo desencadear pneumonia infecciosa, pneumonite química e síndrome da angústia respiratória; traumatismo das vias aéreas; Maria Seiane - Medicina Broncopneumonia, atelectasia, bronquiectasia, insuficiência respiratória e morte. DIAGNÓSTICO Corpos estranhos: Com relação ao diagnóstico, a anamnese é de extrema importância de vez que em 95% dos casos, a tríade engasgo, sufocação e tosse, está presente. A história de aspiração de corpo estranho se faz presente em até 85% dos casos; entretanto, em algumas situações o episódio de aspiração não é a queixa principal, sendo necessário uma história dirigida; Como recurso auxiliar de diagnóstico, a radiografia simples do tórax está alterada em 80% dos casos de crianças com corpo estranho radiopaco nas vias aéreas. São observadas imagens de condensação por atelectasia e/ou pneumonia secundaria, além de obstrução parcial que pode originar enfisema; o Os achados comuns em uma criança com aspiração crônica incluem hiperinsuflação, infiltrados segmentares ou subsegmentares, atelectasia e / ou espessamento peribrônquico. Esses achados podem ser difíceis de distinguir entre outras condições, como asma, infecções virais, discinesia ciliar primária ou fibrose cística. A bronquiectasia pode se desenvolver com o tempo, mas pode não ser detectada na radiografia simples de tórax até que esteja bastante avançada. A confirmação do diagnóstico de aspiração pela via aérea é feita através da endoscopia; Refluxo gastro-esofágico: Entre os exames complementares para o diagnóstico, a radiografia seriada do esôfago, estômago e duodeno é importante para o estudo do mecanismo da deglutição; TRATAMENTO Protocolo OVACE; Corpo Estranho (CE): o O tratamento de emergência tem como objetivo, melhorar a oxigenação do paciente e evitar a disseminação do material aspirado; o A retirada endoscópica com equipamento rígido ou flexível, constitui-se no tratamento nos casos de aspiração de CE; A traqueotomia está indicada naqueles pacientes que aspiraram CE demasiadamente largo, que não podem passar na região sub-glote; REFERÊNCIAS: - NEVES, Olga Maria Domingues; BRASIL, Laélia Maria Barra Feio; AMORIM, Cláudio Sérgio Carvalho de. Processos aspirativos pulmonares em crianças. Rev. para. med, 2009. -PARAIZO et al. Protocolo de prevenção de microbroncoaspiração. Diretriz clínica QPS, v. 2, p. 1-7, 2018. -DOS SANTOS CARMO, Layanne Ferreira et al. Gerenciamento do risco de broncoaspiração em pacientes com disfagia orofaríngea. Rev. CEFAC. v. 20, n.4, p. 532-540, 2018. -DAS, Shailendra et al. Aspiration due to swallowing dysfunction in children. UpToDate, 2020.
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