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Discente: Luiz Eduardo de Campos Fiorucci Matrícula: 202036302 FURTADO, Celso. Formação Econômica do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. ___________________________________________________________________________ Celso Furtado (1920 - 2004) foi um importante autor econômico brasileiro. Era formado em direito com doutorado em economia pela Universidade Sorbonne. Sua relevância vai além de suas obras: ele foi também um dos fundadores da Comissão Econômica para a América Latina – CEPAL; além de ter criado e dirigido a Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste – SUDENE até 1964. Furtado também chegou a ser ministro do Planejamento no governo João Goulart, e ao retornar do exílio, ministro da Cultura. Por vinte anos lecionou em universidades da Europa e dos EUA. Foi autor de mais de 30 livros sobre teoria, política e história econômica. 8 - Capitalização e nível de renda na colônia açucareira Visto o rápido desenvolvimento da indústria açucareira, apesar de fatores como dificuldades de meio físico e o custo com transportes, nota-se que esse processo é fruto da concentração de esforços do governo nesse setor. Vários foram as facilidades concedidas àqueles que instalassem engenhos: isenção de tributos, garantia contra a penhora dos instrumentos de produção, honrarias e títulos. Havia também a liberdade de escravizar ilimitadamente os indígenas, a fim de suprir a demanda por mão de obra. Nesse momento, a escravidão demonstra ser uma condição de sobrevivência para o colono europeu na nova terra. Furtado ressalta que aqueles colonos que tiveram maiores dificuldades de instalação devido a fatores geográficos, tiveram de empenhar todas as forças na captura de homens da terra. Dessa forma, a captura e o comércio do indígena configuraram a primeira atividade econômica estável para as populações não dedicadas a indústria de açúcar. Essa mão de obra – considerada de segunda classe – possibilitou a permanência de núcleos em partes do território que não possuíam vínculo algum com o açúcar. O autor observa para a colonização que surge no século XVI, ligada diretamente a atividade açucareira. Reforçando que onde a atividade não obteve êxito, mas conseguiu subsistir – como em São Vicente – foi graças à relativa abundância de mão de obra indígena. Portanto, mesmo aquelas comunidades que aparentemente tiveram um desenvolvimento autônomo nessa etapa da colonização deveram sua existência diretamente ao êxito da economia açucareira. Quando a mão de obra africana entra em cena, ela vem para suprir a necessidade de expansão da empresa já instalada. Nesse período, a rentabilidade do negócio já está assegurada e os negros entram, em escala considerável, para compor a base de um sistema de produção mais eficiente e densamente capitalizado. Quanto a dimensão da produção, Celso aponta que ao final do século XVI, a produção de açúcar já superava os 2 milhões de arrobas (o que significava mais de 20 vezes a cota de produção que o governo português esperava para o século anterior, em suas atividades nas ilhas do Atlântico). No último quarto do século, a produção mais que decuplicou. Com apenas 120 engenhos, no final do século XVI, e um valor médio de 15 mil libras esterlinas por engenho, o total de capital investido resulta próximo de 1,8 milhão de libras. Na mesma época, cerca de 20 mil escravos africanos estavam no continente para apoio. Celso aponta, através de uma análise racional, que o capital empregado na mão de obra escrava era próximo dos 20% do capital fixo da empresa. Suas conclusões acerca do montante de renda gerada pela empresa apontam para vagas conjecturas. Num ano favorável, o valor total de açúcar exportado chegaria próximo de 2,5 milhões de libras. Segundo Furtado, a renda líquida total gerada estaria entorno de 2 milhões. Sobre os custos com depreciação de ativos, ele aponta: 25 mil libras para um escravo, admitindo vida útil de 8 anos, 60 mil para equipamentos importados, admitindo vida útil de 10 anos. Dessa forma, com uma população de origem europeia próxima de 30 mil pessoas, é evidente que a colônia açucareira era excepcionalmente rica. Concentrada na mão dos donos de engenho (estimativas apontam que 95% de toda a riqueza gerada permanecia nas mãos dos proprietários de engenho e de plantação de cana-de-açúcar), a renda gerada na colônia não chegava a outros setores com intensidade. Furtado aponta que nada além de 5% de todo o açúcar que se chegava ao porto, era destinada a pagamentos por serviços prestados fora do engenho com transporte e armazenamento. Mesmo com trabalho escravo, havia a presença de trabalhadores assalariados com certo nível na hierarquia de trabalho. Estes eram responsáveis por disciplinar e controlar a produção dos escravos. Entretanto, os custos com essas pessoas não ultrapassavam os 2% de todo o montante que era produzido nos engenhos. Além desses gastos, eles possuíam significativa interferência com os demais núcleos dos povoados, de onde compravam gado (especialmente para tração) e lenha (para alimentar as fornalhas). Estimativas indicam que haviam proporcionalmente o mesmo número de escravos e bois nos engenhos. Furtado conclui o capítulo sugerindo que a indústria açucareira era suficientemente rentável para autofinanciar uma duplicação de sua capacidade produtiva a cada dois anos. O que, aparentemente, aconteceu nas etapas mais favoráveis. Isso deve a absorção excepcional que a empresa brasileira teve sobre os mercados compradores. Ao contrário do que ocorreu no Atlântico, não houve superprodução, mostrando habilidade na etapa de comercialização. Mesmo não utilizando todo o potencial de investimento que possuíam, as riquezas que permaneciam majoritariamente nas mãos dos donos de engenho e canavieiros não chegava, senão infimamente, a atividade não açucareira. O destino da riqueza também não estava em outros investimentos ou regiões. Boa parte desse montante era destinado aos que se chamou de “renda de não residentes”, que permanecia fora da colônia. 9 – Fluxo de renda e crescimento Furtado inicia uma investigação acerca do processo de formação da renda e de acumulação de capital. A respeito da economia escravista, seu processo de segurança advém com a forma que dentro dela ocorre o movimento da formação de capital. O empresário açucareiro desde o início teve que operar com grande escala. Com máquinas e equipamentos importados, e mão de obra europeia especializada foi instalada, sem chances de ser diferente, grandes engenhos. Nesse momento inicial, Celso aponta que o trabalho indígena deve ter sido utilizado para a instalação das indústrias, executando tarefas que não exigiam especialidade. Teve sua importância fundamental no fortalecimento da base açucareira que o Brasil formou. O trabalhador africano chega num momento que exigia maior produção, vindo substituir a mão de obra de outro escravo menos eficiente e de recrutamento incerto, sem mexer na estrutura organizacional da produção. O processo de expansão seguiu as mesmas premissas da instalação: gastos com a importação de equipamentos, materiais de construção e mão de obra. Nesse momento, a importação de mão de obra especializada já não ocorria com a mesma intensidade. Isso porque os escravos negros considerados com maior aptidão para determinadas ações acabavam sendo treinados internamente. Durante esse processo, havia um processo natural de organização social: parte dos escravos cuidavam da produção alimentar e o restante das obras de ampliação. Celso explica então que: “numa economia industrial a inversão faz crescer diretamente a renda da coletividade em quantidade idêntica a ela mesma”. Nesse caso, a inversão trazida por uma construção está basicamente constituída pelo pagamento do material nela utilizado e pela mão de obra absorvida. A inversão feita numa economiaexportadora-escravista é fenômeno inteiramente diverso. Parte dela se torna pagamentos feitos no exterior: importação de mão de obra, equipamentos e materiais de construção. A parte maior, sem embargo, tem como origem a utilização mesma da força de trabalho escravo. A mão de obra escrava pode ser comparada às instalações de uma fábrica, afirma Furtado: “a inversão consiste na compra do escravo e sua manutenção representa custos fixos. Esteja a fábrica ou o escravo trabalhando ou não os gastos com manutenção terão de ser despendidos”. Não criando fluxo monetário, quando máquinas estragavam e/ou precisavam ser substituídas, o empresário empregava a força de trabalho de seus escravos no melhoramento da infraestrutura local. Essa também é uma inversão que, indiretamente, também beneficiaria a produção, aumentando os ativos. Furtado aponta que parte dos gastos externos dos empresários, estavam também relacionados a aquisição de mão de obra, mas com um detalhe: com a finalidade de prestação de serviços pessoais. O fluxo de funcionamento da produção, no geral, seguia o seguinte ritmo: os fatores de produção pertenciam quase que em totalidade ao empresário, logo, a renda monetária gerada também retornava para si (em sua maioria). A composição da renda dava-se pela: totalidade dos pagamentos a fatores de produção mais o gasto de reposição do equipamento e dos escravos importados. Tudo isso era expressado no valor das exportações. Furtado aponta que “a diferença entre o dispêndio total monetário e o valor das importações, traduziria o movimento de reservas monetárias e a entrada líquida de capitais, além do serviço financeiro daqueles fatores de produção de propriedade de pessoas não residentes na colônia”. O fluxo de renda se resumia a economia açucareira, com simples operações contábeis, reais ou virtuais, sendo uma economia monetária. Cabia, portanto, ao empresário combinar melhor os fatores para reduzir o custo de produção e maximizar sua renda real. Celso aponta que a unidade escravista, pode ser apresentada como um caso extremo de especialização econômica. Que, ao inverso da unidade feudal (como surgiram interpretações na época), ela vive totalmente voltada para o mercado externo. A relativa abundância de terras disponíveis e oferta externa de força de trabalho, admitia que as possibilidades de expansão fossem ilimitadas. Assim como o prevalecimento dos preços em níveis, ao longo do século XVI, muito propícios ao autofinanciamento de uma expansão ainda mais rápida, do que a efetivamente ocorrida. Portanto, o aumento da capacidade produtiva deu-se na tentativa de evitar um colapso nos preços, ao mesmo tempo que tentava-se ampliar a área de consumo do açúcar. O crescimento realmente ocorreu – pincipalmente na colônia. Crescimento que ocorreu sem grandes modificações na estrutura do sistema econômico. Retrocessos ocasionais não refletiam em qualquer modificação estrutural. Destarte, o crescimento da empresa escravista tendia a ser puramente em extensão, sem quaisquer modificações estruturais. O conceito de ‘crescimento’ nessa época, como aponta Furtado, estava atrelado à “ocupação de novas terras e aumento das importações”. Já ‘decadência’ vinha a ser “redução dos gastos em bens importados e na reposição da força de trabalho (também importada), com diminuição progressiva, mas lenta, no ativo da empresa”. Furtado aponta que o crescimento em extensão possibilitava a ocupação de grandes áreas, fazendo surgir uma população densa. Entretanto, o mecanismo da economia não permitia articulação direta entre os sistemas de produção e consumo, e isso anulava as vantagens decorrentes desse crescimento demográfico. As modificações de produtividade só influenciavam os lucros. Se ocorria uma redução no ritmo da atividade produtiva para exportação, reduziam-se os lucros do empresário. Isso gerava uma capacidade excedente de trabalho que era aproveitada numa expansão da capacidade produtiva. Se não houvesse interesse nesse tocante, essa capacidade era direcionada para obras de construção ligadas ao bem-estar da classe proprietária ou demais de caráter não reprodutivo. O autor também aponta que a economia escravista dependia quase que unicamente, da procura externa. Se ocorresse um enfraquecimento na procura, um processo de decadência surgia e atrofiava o setor monetário. Finalizando o período, Furtado aponta que na segunda metade do século XVII, o mercado passou por uma desorganização e teve início a forte concorrência antilhana, fazendo os preços caírem a metade. Mesmo assim, empresários brasileiros mantiveram elevados os ritmos de produção. No século seguinte ainda perdurava a tendência de baixa nos preços. Por outro lado, a economia mineira (que se expandia no centro-sul) atraia a mão de obra especializada e elevava os preços dos escravos, fator que fez a rentabilidade da empresa açucareira despencar ainda mais. Furtado então conclui: “O sistema entrou, em consequência, numa letargia secular. Sua estrutura preservou-se, entretanto, intacta. Com efeito, ao surgirem novas condições favoráveis, no começo do século XIX, voltaria a funcionar com plena vitalidade”.
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