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CURSO INTENSIVO PARA RESIDÊNCIAS P S I C O LO G I A PSICANÁLISE PROFESSORAS Andrea Dórea Roberta Ferreira Takei Mestre em Psicologia Clínica pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Pau- lo. Especialista em Psicologia Hospitalar pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Pau- lo. Psicanalista. Atualmente é docente em cursos de Graduação e Pós-Graduação e atua na clínica, com crianças, adolescentes e adultos. Possui graduação em psicologia pela Uni- versidade Federal da Bahia (UFBA). Mes- tre e Doutora em Psicologia do Desenvol- vimento pelo Programa de Pós-graduação em Psicologia (POSPSI/UFBA). Possui for- mação em Psicanálise, atendendo princi- palmente crianças e adolescentes em con- texto clínico. Professora de Psicologia em algumas instituições de ensino privado da cidade de Salvador. Também ministra cur- sos e seminários livres sobre atendimento infantil e temas em Psicanálise. Autora do blog Freudisplica. ORGANIZADORA Ana Vanessa de Medeiros Neves Graduada em Psicologia pela Escola Bahia- na de Medicina e Saúde Pública. Possui Mestrado em Psicologia pela Universidade Federal da Bahia, com ênfase em Desenvol- vimento Humano. Especialista em Terapia de Base Analítica pela Associação Paulista de Psicologia Analítica. Possui formação em Terapia Comunitária Integrativa pela Uni- versidade Federal do Ceará. Concursada do Ministério da Saúde, atuando desde 2010 na área de saúde do servidor. Mentora, profes- sora e autora para concursos e residências em diversas disciplinas nas áreas da Psico- logia e Saúde Pública. Fundadora da Editora Concursos PSI e Coordenadora do Núcleo de Psicologia da Editora Sanar. 2020 © Todos os direitos autorais desta obra são reservados e protegidos à Editora Sanar Ltda. pela Lei nº 9.610, de 19 de Fevereiro de 1998. É proibida a duplicação ou reprodução deste volume ou qualquer parte deste livro, no todo ou em parte, sob quaisquer formas ou por quaisquer meios (eletrônico, gravação, fotocópia ou outros), essas proibições aplicam-se também à editoração da obra, bem como às suas características gráficas, sem permissão expressa da Editora. Intensivo para residências em Psicologia: Psicanálise Fernanda Fernandes Fabrício Sawczen Fabrício Sawczen Karen Duarte Caio Vinicius Menezes Nunes Paulo Costa Lima Sandra de Quadros Uzêda Silvio José Albergaria da Silva Título | Editor | Projeto gráfico e diagramação| Capa | Revisor Ortográfico | Conselho Editorial | Editora Sanar S.A R. Alceu Amoroso Lima, 172 - Salvador Office & Pool, 3ro Andar - Caminho das Árvores CEP 41820-770, Salvador - BA Tel.: 0800 337 6262 atendimento@sanar.com www.sanarsaude.com Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Tuxped Serviços Editoriais (São Paulo-SP) Ficha catalográfica elaborada pelo bibliotecário Pedro Anizio Gomes CRB-8 8846 T136ip Takei, Roberta. Intensivo para residências em Psicologia: Psicanálise / Roberta Takei. - 1. ed. - Salvador, BA : Editora Sanar, 2020. 69 p.; il.. E-Book: PDF. Inclui bibliografia. ISBN 978-65-86246-88-9 1. Hospital. 2. Medicina. 3. Psicanálise. 4. Psicologia. 5. Residência. I. Título. II. Assunto. III. Takei, Roberta. CDD 150 CDU 159.9 ÍNDICE PARA CATÁLOGO SISTEMÁTICO 1. Psicologia. 2. Psicologia. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA TAKEI, Roberta. Intensivo para residências em Psicologia: Psicanálise. 1. ed. Salvador, BA: Editora Sanar, 2020. EBook (PDF). ISBN 978-65-86246-88-9 LISTA DE FIGURAS Figura 1. Modos de funcionamento Sistemas Psíquicos - Autoria Própria. Figura 2. Classes das neuroses - Autoria Própria. Figura 3. Características da pulsão - Autoria Própria. Figura 4. Resumo das fases do desenvolvimento para Freud - Autoria própria. Figura 5. Visão geral do Édipo (NASIO, 2005). Figura 6. Esquema da passagem do Édipo em meninos (autoria propria). Figura 7. Esquema da passagem do Édipo em meninas (autoria propria). Figura 8. O processo da metáfora paterna – Autoria propria. Figura 9. Linha do Amadurecimento de Winnicott - Autoria Própria. Figura 10. Esquema do arco reflexo aplicado ao funcionamento psíquico (NASIO, 1999). Figura 11. Representação dos processos de transferência e contratransferência. Figura 12. Diferença entre Luto e Melancolia - Autoria Própria. Figura 13. Fatores para a eclosão da Melancolia - Autoria Própria. Figura 14. Diferenças de posição entre Medicina e Psicanálise - Autoria Própria. SUMÁRIO Apresentação .................................................................................... 6 1. Fundamentos teóricos ................................................................. 7 1.1. Freud ............................................................................................ 7 1.2. Lacan ........................................................................................... 29 1.3. Pós-Freudianos .......................................................................... 35 2. Fundamentos técnicos ................................................................ 46 2.1. A técnica analítica e a resistência ........................................... 46 2.2. Transferência e contratransferência...................................... 47 2.3. Direção do tratamento psicanalítico ...................................... 49 2.4. Luto e melancolia ..................................................................... 55 2.5. Papel do psicanalista no hospital ........................................... 62 Gabarito ............................................................................................. 66 Referências ....................................................................................... 67 APRESENTAÇÃO Olá, futuro (a) residente! Seja bem vindo à nossa aula sobre Psicanálise. Este é um assunto bastan- te cobrado nas residências, e muitas vezes aparece de forma transdis- ciplinar, seja nas questões de Psicologia Hospitalar ou Psicopatologia, passando pelas de Desenvolvimento Humano, até aquelas que abordam especificamente os conceitos e técnicas psicanalíticas. Nossas aulas estão divididas em dois grandes pólos: Fundamentos teó- ricos, onde traremos os principais conceitos de Freud, Lacan e dos princi- pais autores pós-freudianos; e Fundamentos técnicos, onde as principais técnicas da Psicanálise serão apresentadas, além do campo específico de suas aplicações na área hospitalar. Aqui você poderá reforçar seu conhecimento sobre os pontos mais impor- tantes dessa teoria tão cobrada nas provas, a partir de uma leitura fácil e com dicas pra você ter sucesso nas provas. No decorrer do texto, também é possível testar seu aprendizado fazendo as questões de provas anterio- res e assisitindo a pocket vídeos, com os conteúdos que não podem sair da sua cabeça. Ah, no final do curso ainda tem uma super revisão de todos os conteúdos em uma video aula, além de questões comentadas de provas anteorio- res, e simulados pra você treinar e gabaritar sua prova de residência. Vamos lá? Clique no ícone para assistir a apresentação gravada. https://sanar.link/aula_psi_6368 7Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise 1. FUNDAMENTOS TEÓRICOS 1.1. FREUD 1.1.1. ASPECTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA PSICANÁLISE. Podemos dizer que a Psicanálise é uma teoria, uma técnica e um méto- do de investigação que nasce no final do século XIX a partir da prática de um grande gênio: o médico vienense Sigmund Freud. A Psicanálise possui uma particularidade com relação a outras teorias, pois ela começa com a prática clínica para depois formular suas hipóteses e conceitos teóricos. E a prática da Psicanálise Freudiana começa com os estudos sobre a his- teria. A histeria era um fenômeno que acometia principalmente mulheres e que se configurava num problema sério na Europa no final do século XIX. Ca- racterizava-se basicamente por uma série de sintomas sensoriais, moto- res e de dissociação, que acometiam o corpo, mas não tinham nenhuma espécie de causa orgânica. Este processoera estudado por alguns médicos, já que muitos conside- ravam bruxaria ou fingimento. Na França, o médico Jean Martin Charcot considerava a origem do sintoma histérico como algo que estava posto em um outro lugar que não a consciência, mas sim uma segunda consciên- cia (second conscience), acessível apenas a partir da hipnose. Freud começou a tratar a histeria a partir da hipnose, inspirado no traba- lho de outro médico, o vienense Joseph Breuer. Breuer, a partir do méto- do catártico, tratou uma jovem paciente que se tornou o caso marco zero da Psicanálise: Anna O. A partir da hipnose o paciente voltava ao fato que tinha originado o sintoma e era capaz de torná-lo vivo na ideia do que 8Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise aconteceu e, especialmente, no afeto (a emoção) que foi vivenciada. Esse processo era chamado de ab-reação. Depois de algum tempo, Freud aban- donou o uso da hipnose (ele particularmente tinha dificuldades com esse método). Após várias tentativas, Freud chegou, pela ajuda de seus pacientes, ao método que se tornou primordial da Psicanálise, do qual falaremos quan- do entrarmos na sessão de fundamentos técnicos: a livre associação. Foi fazendo seus pacientes falarem livremente tudo que lhes viesse à mente que Freud chegou ao conceito primordial da Psicanálise: o inconsciente. 1.1.2. O INCONSCIENTE (PRIMEIRA TÓPICA E NEUROSES) 1.1.2.1. Primeira tópica: concepção do aparelho psíquico. O conceito de inconsciente, o mais importante da Psicanálise, sofre trans- formações ao longo do tempo, desde seu aparecimento no capítulo VII da Interpretação dos Sonhos até os textos finais da segunda tópica. O pai da Psicanálise descreve os processos psíquicos sob três pontos de vista: • Tópico: localização das instâncias psíquicas. • Econômico: distribuição dos investimentos pulsionais. • Dinâmico: conflito das forças pulsionais. No início, Freud está preocupado em descrever o sentido tópico do in- consciente, já nos textos após 1915 centra-se mais na relação entre o inconsciente e as pulsões. É importante destacar que a segunda tópica não substitui a primeira, ou seja, os conceitos de Id, Ego e Superego não substituem os conceitos de Inconsciente, Consciente e Pré-consciente. 9Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise Freud, em A interpretação dos Sonhos, postula a primeira tópica freu- diana, isto é, a concepção do aparelho psíquico formado por instâncias ou sistemas: o sistema inconsciente (Ics), o pré-consciente (Pcs) e o consciente (Cs). Esses sistemas são concebidos como lugares psíquicos e são marcados por uma relação de conflito, o que torna a concepção tópica inseparável da concepção dinâmica. Importante frisar que, quando Freud fala em lu- gares, os lugares aos quais ele se refere são lugares metafóricos e não lugares anatômicos. • Pré-consciente: localizado em uma das extremidades do aparelho psí- quico, seu conteúdo é acessível à consciência. • Consciente: O Cs é localizado numa das extremidades do aparelho psí- quico e é muito mais um dispositivo de atenção ligado à percepção do que propriamente um sistema. • Inconsciente: inacessível à consciência, a não ser que passe por modi- ficações, ou melhor, distorções para que se submeta às exigências do sistema Cs. Esse foi o momento, fundamental na Psicanálise, em que a palavra In- consciente deixou de ser entendida como adjetivo, qualificando aquilo que está fora da consciência, para ser usada como substantivo, designan- do um sistema do aparelho psíquico, com um modo de funcionamento diferente do sistema pré-consciente/consciente. É aqui que entra também o conceito de recalque ou recalcamento. O re- calque é o operador desta distinção entre os sistemas. É um processo psíquico defensivo que consiste em afastar da consciência os conteúdos potencialmente desagradáveis, ameaçadores. Isto é, um sistema funciona como instância crítica (Pcs/CS) e o outro como instância criticada (Ics). 10Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise ACERTE O ALVO! Recalque é um conceito-chave da Psicanálise! A grande divisão, portanto, não é a que separa o que é inconsciente do que é consciente, mas a que separa o que pertence ao sistema Ics do que per- tence ao sistema Pcs/Cs. Freud faz uma alegoria bastante ilustrativa a respeito dos sistemas psí- quicos: “Comparemos, portanto, o sistema do inconsciente a um gran- de salão de entrada, no qual os impulsos mentais se empurram uns aos outros, como indivíduos separados. Junto a este salão de entrada existe uma segunda sala, menor - uma espécie de sala de recepção - na qual, ademais, a consciência reside. Mas, no limiar entre as duas salas, um guarda desempenha sua fun- ção; examina os diversos impulsos mentais, age como censor, e não os admitirá na sala de recepção se eles lhe desagradarem. De pronto, os senhores verão que não faz muita diferença se o guarda impede a entrada de determinado impulso no próprio limiar ou se ele o faz recuar através do limiar, após o impulso ter entrado na sala de recepção. Isto é apenas uma questão de grau de sua vigilância e de quão prontamente efetua sua ação de reconhecimento. Se mantivermos esta imagem, poderemos ampliar ainda mais nossa terminologia. Os impulsos do incons- ciente, no salão de entrada do inconsciente, estão fora das vistas do consciente, que está na outra sala; em princípio, de- vem permanecer inconscientes. Se já se infiltraram até o limiar 11Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise e foram afastados pelo guarda, então eles são inadmissíveis para a consciência; dizemos que eles são reprimidos. Entretan- to, os próprios impulsos que o guarda permitiu que cruzassem o limiar, não são, também, só por causa disso, necessariamen- te conscientes; podem vir a sê-lo somente se conseguissem chamar a atenção da consciência. Portanto, justifica-se que chamemos a esta segunda sala, de sistema do pré-consciente. Nesse caso, tornar-se consciente mantém seu sentido mera- mente descritivo. Para qualquer impulso, porém, a vicissitude da repressão consiste em o guarda não lhe permitir passar do sistema do inconsciente para o do pré-consciente. Trata-se do mesmo guarda que vimos a conhecer como resistência, quando tentamos suprimir a repressão por meio do tratamento analíti- co” (FREUD, 1917, p. 302). O que define o inconsciente não são seus conteúdos, mas o modo como ele opera. Figura 1. Modos de funcionamento Sistemas Psíquicos. ICS Processo psíquico primário Energia livre Princípio de prazer Cs Processo psíquico secundário Energia ligada Princípio de realidade Fonte: Autoria Própria. 12Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise 1.1.2.2. Características do Inconsciente. • Princípio da não-contradição: os representantes pulsionais não se contradizem, não são incompatíveis entre si. • Atemporalidade: o tempo do inconsciente não é o tempo cronológico. Seus processos são atemporais → importância dos aspectos infantis. • Formações do inconsciente: só temos acesso aos processos incons- cientes através de seus efeitos na consciência: sonhos, sintomas, chistes e atos falhos. 1.1.2.3. Formações do Inconsciente. Em A interpretação do sonho, Freud afirma que nada há de arbitrário nos acontecimentos psíquicos, sejam eles conscientes ou inconscientes. To- dos os atos, vontades, ditos, tendências dos sujeitos são determinados inconscientemente: a isso chamamos de determinismo psíquico. As formações do inconsciente são fruto da ação do recalcamento do de- sejo inconsciente, inaceitável de algum modo pela consciência, que retor- na, ainda que deformado sob a ação da censura. Lacan também os chama de retorno do recalcado. 1.1.2.4. Sonhos. O que Freud descobre é que o sonho tem um sentido e através do método psicanalítico é possível a decifração desse sentido, através da interpre- tação. A maneira como interpretamos o sonho é o modelo pelo qual ire- mos compreender os sintomas, oschistes, os atos falhos. É por isso que Freud afirma que o sonho é o pórtico real da psicanálise. O sonho é sempre uma forma disfarçada de realização de desejos. A cen- sura deforma o conteúdo dos sonhos para nos proteger do caráter amea- çador de nossos desejos. 13Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise A função da interpretação é, portanto, conhecer o sentido oculto do sonho. São sentidos a serem interpretados: psicanálise e linguagem se articu- lam. As formações do inconsciente se manifestam através da linguagem. O inconsciente é estruturado como uma linguagem (Lacan). 1.1.2.5. Sintomas. Assim como o sonho, o sintoma neurótico é a satisfação disfarçada de um desejo inconsciente. Determinado simbolicamente, o sintoma é o resul- tado que expressa um conflito psíquico através da formação de compro- misso entre o desejo e o recalque. 1.1.2.6. Chistes. É um gracejo, algo que é dito para produzir o riso. Segundo Freud, são usa- dos para que possamos expressar aquilo que, de outra forma, não ganha- ria expressão conscientemente. É o famoso: brincando pode se dizer tudo. 1.1.2.7. Atos falhos. Podem ser atos falhos de esquecimentos (nomes, palavras), de linguagem (lapsos, equívocos na fala, leitura e escrita) ou atos falhos de comporta- mento. Também são formações de compromisso, ou seja, “foi sem querer, querendo”: um ato falho foi sem querer (conscientemente falando), mas também foi querendo (inconscientemente). 1.1.2.8. Neuroses. Freud ao longo de sua obra vai falar de duas classes de neuroses: as Neu- roses atuais e as Psiconeuroses (ou Neuroses de Defesa). A principal 14Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise diferença seria a etiologia (causa): enquanto as neuroses atuais eram re- lacionadas à vida sexual atual do paciente, as psiconeuroses eram relacio- nadas à sexualidade infantil. Figura 2. Classes das neuroses. Psiconeuroses Histeria Neurose obsessiva Neurose fóbica Neuroses atuais Neurastenias Neuroses de angústia Hipocondria Fonte: Autoria Própria. Freud centra seus estudos nas Psiconeuroses e o faz através da generali- zação dos achados sobre a histeria. Histeria, Neurose Obsessiva e Fobia têm em comum o recalcamento como operação formadora de sintomas. Elas se diferenciam pelos dife- rentes destinos para o afeto que foi separado da representação (que foi recalcada): • ideia, na neurose obsessiva; • objeto fóbico, na fobia; • corpo, na conversão histérica. 1.1.2.9. Histeria. Na histeria, há a transformação do afeto em um sintoma somático: a con- versão. 15Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise 1.1.2.10. Neurose obsessiva e fóbica. O afeto não convertido fica no aparato psíquico. A representação é recal- cada e o afeto, através do deslocamento, se liga a outras representações que, por essa falsa ligação, se transformam em representações obsessi- vas ou fóbicas, transformando o afeto em angústia. *A angústia é pura expressão da intensidade pulsional. Não há represen- tação e, por isso, ela se expressa corporalmente, sem que qualquer signi- ficação possa lhe ser atribuída. 01. Com base no texto de Freud, “O inconsciente” (1915), considere as seguintes afirmativas: 1. Os processos inconscientes possuem uma topografia rela- cionada diretamente à anatomia, ou seja, a localidades ana- tômicas. 2. A concepção de inconsciente surgiu como uma necessidade para dar conta de fenômenos que não estavam abrangidos pela equivalência entre psíquico e consciente. 3. A antítese entre consciente e inconsciente não se aplica aos instintos, dado que estes nunca podem tornar-se diretamen- te objeto da consciência. 4. A repressão, apesar de não incidir sobre o afeto, tem como finalidade sua supressão. Assinale a alternativa correta. 🅐 Somente a afirmativa 1 é verdadeira. 🅑 Somente as afirmativas 1 e 4 são verdadeiras. 🅒 Somente as afirmativas 2 e 3 são verdadeiras. 🅓 Somente as afirmativas 2, 3 e 4 são verdadeiras. 🅔 As afirmativas 1, 2, 3 e 4 são verdadeiras. Clique aqui para ver o gabarito da questão. 16Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise 1.1.3. PULSÃO Agora, vamos para outro conceito fundamental da psicanálise freudiana: a pulsão. Ela faz sua entrada conceitual na obra Três Ensaios da Sexua- lidade (1905) quando Freud aborda a sexualidade infantil. É importante frisar que nessa obra Freud vai abordar a pulsão sexual. Mas é no artigo Pulsão e suas vicissitudes (1915) que Freud aprofunda sua compreensão a respeito do conceito de pulsão (trieb). Esse artigo, junto com outros cin- co, faz parte da metapsicologia* freudiana. Devemos ficar atentos na diferença entre pulsão (trieb) e instinto (ins- tinkt): • Instinto nos remete a algo fixo, a um comportamento pré-estabeleci- do visando um fim específco (necessidades biológicas). Corresponde a comportamentos inatos e adaptativos e apresenta certa rigidez na relação finalidade – objeto. • A pulsão não está relacionada a comportamentos pré-formados ou inatos e não tem um objeto específico para sua satisfação. Isto é, os meios e os fins são extremamente variáveis na pulsão, ao contrário do instinto. Um exemplo para demarcar essa distinção é o próprio comportamento sexual de nós humanos e de um animal. O animal, de um modo geral, tem o instinto sexual de procurar um parceiro, que é de sua mesma espécie e do sexto oposto, com objetivo de reprodução, e seu ritual de corte e acasa- lamento é fixo. Já o ser humano, não precisamos dizer, quase sempre não tem como objetivo final a reprodução, nem sempre procurará parceiros do sexo oposto (quiçá nem da própria espécie!) e seu ritual de sedução é o mais variado possível! Metapsicologia: como Freud vai chamar uma coleção de artigos cujo objetivo é fazer, ao mesmo tempo uma revisão e aprofunda- mento teórico de seus principais conceitos. 17Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise Ou seja, para Freud, nós somos seres pulsionais e não mais instintuais, ainda que a pulsão possa ter, em sua origem, se apoiado no instinto (con- ceito de apoio*). Nos tornamos pulsionais quando o prazer se torna autô- nomo em relação à satisfação da necessidade biológica. Ou seja, quando o recém-nascido busca não mais repetir o bem-estar da nutrição, mas o prazer autoerótico oriundo da mucosa bucal (fase oral) e o acalento da mãe. A pulsão é um conceito-limite, situado na fronteira entre o somático e o psíquico. Isto é, a pulsão se origina a partir de estímulos do corpo que, por sua vez, fazem uma exigência de trabalho para o aparelho psíquico. O trabalho do aparelho psíquico é exatamente (tentar) satisfazer a pulsão. A energia de trabalho da pulsão (sexual) é a libido. Vamos apresentar agora 4 características da pulsão que ajudam na com- preensão do conceito: • Pressão: A pulsão, ao contrário do instinto, exerce uma pressão cons- tante, ou seja, nunca cessa sua exigência de que o aparelho psíquico trabalhe. Assim, ela é impossível de ser completamente satisfeita, ou melhor dizendo, ela pode ser satisfeita apenas parcialmente. Como bem ilustra a música de Chico Buarque e Milton Nascimento, O que será – à flor da pele “o que não tem descanso nem nunca terá, o que não tem cansaço nem nunca terá, o que não tem limite”. • Fonte: por fonte da pulsão entendemos o órgão ou parte do corpo de onde provém a pulsão sexual, que Freud chamou de zona erógena. Ele ainda diz que qualquer área da pele ou mucosa pode se transformar em uma zona erógena, ainda que existam zonas predestinadas, que são as zonas das quais partem as pulsões parciais descritas por Freud no de- Conceito de apoio: hipótese apresentada por Freud em Os três ensaios da sexualidade, em que ele afirma que a pulsão, em sua origem, se apoia em uma função biológica. 18Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise senvolvimento psicossexual. Pelo fato de a pulsão ser externa à mente, só pode ser conhecida por nós quando capturada pelo aparelho psíqui-co a partir de seus representantes psíquicos: representação (ou re- presentante ideativo) e afeto. • Alvo ou Finalidade: A finalidade da pulsão é sempre a satisfação. Essa satisfação nunca pode ser completa uma vez que, pelo fato de a pressão ser constante, não é possível cancelar totalmente o estímulo, que con- tinua demandando. Isto é, quando falamos de satisfação da pulsão, es- tamos falando de uma satisfação parcial. Há diferentes caminhos para cada um de nós em busca da satisfação da pulsão. Quando a pulsão é desviada em sua finalidade (sexual), chamamos de sublimação. De um modo geral, todos nós temos alta capacidade em sublimar, desde que a atividade para a qual a pulsão foi desviada seja socialmente valorizada. Assim, quando trabalhamos, estudamos, produzimos cultura, estamos em grande parte sublimando pulsões e, obtendo assim, satisfações par- ciais. Mas não nos enganemos, se estivéssemos investindo essa pulsão em sua finalidade original, ainda assim seria uma satisfação parcial, já que isso é inerente à própria natureza da pulsão. ACERTE O ALVO! O conceito de sublimação da pulsão costuma ser figuri- nha carimbada em provas de concurso! • Objeto: é através do objeto que a pulsão pode atingir sua finalidade, a satisfação. O objeto é o que há de mais variável na pulsão, podendo ser uma pessoa do sexo oposto, do mesmo sexo, uma coisa, ou até parte de si. O objeto não é inato ou pré-determinado e sim construído através de nossa trajetória libidinal e pode sofrer variações ao longo da vida. 19Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise Como já aprendemos, nenhum objeto satisfará completamente a pul- são. É a partir dessa ideia que Lacan postula o “objeto a”: objeto causa do desejo. Esse “objeto a” marca a falta, mola propulsora para o desejo. É aqui que Lacan também faz uma distinção importante entre desejo e gozo. O desejo faz referência ao trabalho, fruto da insatisfação, em busca do “objeto a”. Já o gozo seria um tipo particular de satisfação, que se articula com a pulsão de morte a partir da repetição de sintomas ou comportamentos. Figura 3. Características da pulsão. Pressão Exigência de trabalho Constante Fonte Órgão ou parte do corpo Zonas erógenas Alvo Satisfação Parcial Objeto Através do que a pulsão se satisfaz Variável Fonte: Autoria Própria. Na primeira formulação da teoria das pulsões, Freud vai fazer uma distin- ção entre as pulsões sexuais e as pulsões do ego, ou autoconservadoras, que estariam a serviço da sobrevivência do indivíduo. É quando Freud in- troduz o conceito de narcisimo que o conceito de pulsões do ego sofre um abalo, uma vez que, com o narcisismo, o que se descobre é que há um investimento pulsional também dirigido ao ego, isto é, as pulsões egóicas seriam, ao mesmo tempo, sexuais. Ou seja, perde-se o sentido da distin- ção entre pulsões sexuais e pulsões egoicas. Ainda assim, Freud continua reafirmando tal dualismo pulsional até 1920 quando formula o conceito de pulsão de morte em seu texto Além do princípio do Prazer (1920) e a partir daí se inaugura um novo dualismo pulsional: pulsões de vida (englo- bando aqui as pulsões sexuais e as pulsões egoicas) e a pulsão de morte. É a partir da observação do fenômeno de compulsão a repetição que Freud postula a existência da pulsão de morte. O que Freud nota é que seus pacientes repetem de forma impositiva situações, comportamentos 20Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise que, longe de trazer prazer, trazem ao contrário dor, sofrimento e despra- zer. Isto reforça a ideia de que há algo para além do princípio do prazer. A pulsão de morte “é uma tentativa inerente à vida orgânica de restaurar um estado anterior de coisas; ela é a expressão da inércia inerente à vida orgânica (Freud, 1920, p. 37). Há, portanto, em todo ser vivo uma tendência para a morte. Ao falar em pulsão de morte, Freud prefere falar no plural destacando a diversidade de expressões dessa pulsão. É importante destacar que as pulsões de vida e as pulsões de morte podem se misturar, se associar e se desassociar em proporções variáveis. A esses processos, Freud dá o nome de fusão e desfusão pulsional. A pulsão de morte de Freud é um de seus conceitos mais controversos e polêmicos. Muitos psicanalistas pós-freudianos discordam do Pai da Psicanálise. Lacan, ao contrário, radicaliza a noção de pulsão de morte ao afirmar que todas as pulsões são manifestações dela. Segundo Lacan, a pulsão presentifica a falta, falta esta que é inerente ao humano. 02. Sobre o conceito de pulsão, considere as seguintes afirmativas: 1. A força, a fonte, o objeto e a transformação no contrário são elementos da pulsão. 2. A pulsão é um estímulo de força constante proveniente de fora do organismo. 3. A sublimação, o recalque, a reversão a seu oposto e o retorno em direção ao próprio “eu” do indivíduo são considerados de- fesas contra a pulsão. 4. O amor é uma forma de pulsão parcial. 21Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise Assinale a alternativa correta. 🅐 Somente a afirmativa 3 é verdadeira. 🅑 Somente as afirmativas 1 e 3 são verdadeiras. 🅒 Somente as afirmativas 2 e 4 são verdadeiras. 🅓 Somente as afirmativas 1, 2 e 4 são verdadeiras. 🅔 As afirmativas 1, 2, 3 e 4 são verdadeiras. Clique aqui para ver o gabarito da questão. Assista agora a Pocket Aula sobre o conceito de pulsão clicando no ícone ao lado 1.1.4. SEGUNDA TÓPICA A explicação topográfica trazida por Freud quando ele postulou a existên- cia do inconsciente parecia, a princípio, bastante eficiente para explicar fenômenos como os sonhos ou os sintomas histéricos. No entanto, a me- dida em que Freud ia desenvolvendo sua clínica, ela começou a apresentar algumas limitações. A Primeira tópica não foi eficiente para explicar: • O caráter inconsciente do recalcamento. • O fato do inconsciente ser simultaneamente recalcamento e recalcado. https://sanar.link/aula_psi_6373 22Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise • O eu (ego) enquanto uma instância mista, na qual coexistem partes e funções ao mesmo tempo conscientes, pré-conscientes e inconscien- tes. Desta forma, começando com Além do Princípio do Prazer (1920) e es- pecialmente em O Ego e o Id (1923), Freud propôs uma nova topografia da personalidade e aparelho mental, a chamada 2ª Tópica, ou Teoria Di- nâmica, onde ele propõe a existência de três estruturas dinâmicas, que transitam entre partes conscientes e inconscientes: Id (Isso), Ego (Eu) e Superego (Supereu). • Id: Seria o equivalente ao que na 1ª tópica era chamado de inconsciente. Conjunto de conteúdos de natureza pulsional e de ordem inconscien- te – abrigo das pulsões. Funciona pelo princípio do prazer, buscando sempre uma saída para a satisfação da necessidade e o alívio das ten- sões. • Ego: Do ponto de vista tópico, possui partes conscientes e partes in- conscientes (o que se constitui em uma grande diferença com relação à 1ª tópica, que considerava o ego totalmente consciente). Representa a organização coerente de processos mentais, controlando a descarga de excitações para o mundo externo e mediando a relação entre Id e Superego. Se desenvolve a partir do Id para permitir a relação com o mundo exterior. • Superego: É a parte moral da mente humana – Censor do Ego – e busca impedir a passagem dos conteúdos do Id. Surge a partir da interioriza- ção das exigências e das interdições parentais. É o Herdeiro do Com- plexo de Édipo, do qual falaremos a seguir. 23Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise ACERTE O ALVO! Nas provas tanto pode aparecer os nomes ID, EGO e SUPEREGO, como ISSO, EU e SUPEREU. Essa é uma di- ferença com relação à tradução dos textos de Freud. Na dúvida, saiba ambas as terminologias. 1.1.5. AS FASES DO DESENVOLVIMENTO E O COMPLEXO DE ÉDIPO O conceito de sexualidade tem um caráter central na teoria Freudiana e fez com que ele criasse uma das teorias do desenvolvimentoinfantil mais conhecidas. Apesar de o próprio Freud não atender crianças, (com exce- ção do pequeno Hans – A fobia de uma criança de cinco anos, onde na ver- dade Freud atendia o pai do garoto) ele acreditava que a personalidade do sujeito já começava a se formar a partir do momento em que ele nascia, e estruturalmente estaria completa na adolescência. Um dos pressupostos mais controversos da teoria freudiana foi admitir a existência da sexualidade infantil. Imaginem o que é alguém dizer no início do século XX que o corpo de uma criança é erotizado e este busca a satisfação de prazer! Um escândalo! Por isso, para compreender porque a teoria do desenvolvimento infantil de Freud é importante, primeiramen- te, é preciso levar em conta que o conceito de sexualidade apresentado por ele ultrapassa o nível genital. Complicado? Vamos esclarecer! Em sua obra “Os três ensaios sobre a teoria da sexualidade”, Freud (1905) diz que nascemos com um corpo erotizado, e que naturalmente buscamos prazer a partir da estimulação desse corpo, e mais ainda, que durante os primeiros anos de vida essa satisfação é autoerótica. Este corpo é com- posto por zonas erógenas, ou seja, partes do corpo que quando estimu- 24Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise ladas provocam prazer (boca, pele, região genital, ânus). Este conceito será central para delimitar as fases do desenvolvimento psicossexual de Freud. Podemos, de forma esquemática, resumir estas cinco fases da se- guinte forma: Figura 4. Resumo das fases do desenvolvimento para Freud. Fase Idade Zona erógena predominante Alvo da pulsão ORAL De 0 a 2 anos Boca Autoerótica ANAL De 2 a 3 anos Ânus Autoerótica FÁLICA De 4 a 6 anos Órgãos genitais Autoerótica LATÊNCIA De 7 a 12 anos Não existe Autoerótica GENITAL Dos 13 em diante Órgãos genitais Outro Fonte: Autoria Própria. A fase oral vai dos zero aos dois anos de idade, e tem como zona erógena predominante a boca. A princípio, poderia se pensar que esta relação se da- ria exclusivamente por ser a zona de nutrição, mas o próprio Freud vai obser- var que o prazer de sugar (ou chuchar, como ele mesmo chama) vai além da satisfação da fome. A criança neste período explora o mundo e seu próprio corpo a partir da boca. E esta zona erógena é tão importante, que apesar de não ser predominante nas outras fases, guarda alguns resquícios de prazer, como a satisfação no comer, beber, beijar, entre outras coisas. Entre os dois aos quatro anos, a zona erógena predominante transfere- -se da região oral para a mucosa anal, e acontece a chamada fase anal. A criança passa a ter um particular interesse no ato de defecar e nas pró- prias fezes (o que coincide com a fase do desfralde), sentindo prazer no ato de contração e relaxamento dos esfíncteres, o que as levam a reter as fezes até o limite (o que causa as constantes prisões de ventre típicas dessa fase). 25Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise Dos quatro aos seis anos a criança passa pela fase fálica. Essa talvez seja uma das fases mais críticas do desenvolvimento infantil segundo Freud, com o predomínio da zona erógena nas regiões genitais do menino e da menina. Nesta fase é comum o comportamento masturbatório, sendo que a satisfação pela estimulação da região genital ainda é autoerótica. Esta também é a fase onde a criança começará a notar as diferenças entre os sexos, desenvolverá a curiosidade sobre o nascimento dos bebês e passa- rá pelo Complexo de Édipo. ACERTE O ALVO! A fase fálica e o Complexo de Édipo são os assuntos mais cobrados nas provas com relação ao desenvolvi- mento psicossexual da criança. Após um período de intensas vivências de conflitos inconscientes na fase fálica, a criança entra em um período de desinteresse sexual (compreen- dendo mais ou menos dos sete aos doze anos), onde não existe a predomi- nância de nenhuma zona erógena específica. É a chamada fase de latên- cia, onde a pulsão se desloca para o desenvolvimento social e educacional. Quando a criança adentra o período da adolescência, ela chega na fase genital. A zona erógena predominante volta a ser os órgãos genitais, mas a busca do prazer é dirigida para o outro, tendo como fim último o ato se- xual propriamente dito e a reprodução. Ao fim dessa fase, Freud coloca como completo o desenvolvimento psicossexual do sujeito. Entre todas essas fases apresentadas, a mais importante para Freud é a fase fálica, pois nela a criança passará por um processo crucial em seu 26Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise desenvolvimento: O Complexo de Édipo. Freud utiliza-se dessa metáfora para explicar o amor primordial que a criança estabelece com o genitor do sexo oposto durante a fase fálica do desenvolvimento. Esse conceito é universal para a Psicanálise (acontece com todas as pessoas, indepen- dente de contexto social ou cultural), determinante para a formação da identidade do sujeito, para suas escolhas objetais e para a introjeção da lei (a formação do superego). Esquematicamente, poderíamos resumir a passagem pelo Édipo da se- guinte forma: Figura 5. Visão geral do Édipo. SE NS AÇ ÕE S DESEJOS INCESTUOSOS FANTASIAS Falo Prazer Angústia (menino) Ou Sofrimento (meninas) RENÚNCIA aos pais enquanto objetos sexuais E INCORPORAÇÃO dos pais como objetos de identificação IDENTIADE SEXUAL SUPEREU REATIVAÇÃO DO ÉDIPO NA PUBERDADE: Pudor excessivo, intransigência, revolta. NA IDADE ADULTA: Neurose comum e mórbida. NO TRATAMENTO ANALÍTICO: Neurose de transferência. SEXUALIZAÇÃO DOS PAIS DESSEXUALIZAÇÃO DOS PAIS FRUTOS DO ÉDIPO Fonte: NASIO, 2005. As curiosidades sexuais típicas da fase fálica levam as crianças a desco- brir as diferenças entre os sexos. As teorias infantis partem de uma ideia de que estas diferenças ocorrem a partir da dicotomia presença/ausên- cia do falo, ou seja, o órgão sexual masculino carregado de significado. Os homens são detentores do falo, as mulheres não. A noção inconscien- te estabelecida com essa descoberta é de que na verdade as mulheres a princípio possuíam um pênis e, por alguma razão, esse foi retirado delas – foram castradas. Essa castração vai reverberar de forma diferente nos meninos e nas meninas. 27Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise Nos meninos, a falta deste falo no sexo oposto desperta um sentimento de angústia inconsciente, um medo de perder também o próprio órgão, ao que Freud denomina de angústia de castração. Já as meninas comparti- lham plenamente a opinião que seus irmãos têm do pênis, desenvolven- do um vivo interesse por essa parte do corpo masculino, interesse que é logo seguido pela inveja (os meninos têm algo que elas não têm). A esse sentimento inconsciente, Freud dá o nome de inveja do pênis. Estes dois sentimentos geram diferenças significativas em como será a passagem do Édipo em meninos e meninas. Nos meninos podemos resumir da seguinte forma: Figura 6. Esquema da passagem do Édipo em meninos. Fase pré-edípica O objeto de amor é a mãe Édipo O objeto de amor continua sendo a mãe Rivaliza com o pai - Angústia de castração Saída do Édipo Abandona o amor pela mãe Identificação com o pai. Busca de um objeto de amor semelhante ao dele (uma mulher) Fonte: Autoria própria. Na fase pré-edípica o objeto de amor do menino é a mãe. Com a entrada no Édipo, esse amor se mantém intacto, o que leva naturalmente a uma rela- ção de rivalidade com o pai. Tomado pela angústia de castração (o medo inconsciente que o pai lhe tire o próprio falo) o menino se vê no impasse de escolher entre este e sua mãe. Então, resolve o Édipo abandonando o amor pela mãe e passando a se identificar com o pai (o masculino), buscando fu- turamente um objeto de amor semelhante ao que ele tem (uma mulher). Já nas meninas esse processo ocorre de forma um pouco diferente: 28Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise Figura 7. Esquema da passagem do Édipo em meninas.Fase pré-edípica O objeto de amor é a mãe Édipo O objeto de amor passa a ser o pai Rivaliza com a mãe - Inveja do pênis Saída do Édipo Abandona o amor pelo pai Identificação com a mãe. Busca de um objeto de amor semelhante ao dela (um homem) Fonte: Autoria própria. Na fase pré-edípica, assim como o menino, a menina tem seu amor volta- do para a mãe. Ao adentrar no Édipo e se perceber castrada como a mãe, inverte seu objeto de amor para o pai (detentor do falo) e passa a rivali- zar com a mãe. Diante da impossibilidade da concretude deste amor, abre mão do pai e passa a se identificar com a mãe (o feminino), buscando futu- ramente um objeto de amor semelhante ao dela (um homem). 03. Para Freud (1905), na sua obra Três ensaios sobre a teoria da sexua- lidade, as fases de desenvolvimento psicossexual caracterizam-se pela concentração da libido em zonas erógenas. Considerando essa obra, qual afirmativa corresponde a uma premissa que Freud quis transmitir sobre a sexualidade infantil? 🅐 A fase genital sucede a fase anal e inicia-se por volta do quinto ano de vida. 🅑 Na formação reativa ocorre o desvio da pulsão dos objetivos sexuais e sua orientação para objetivos relacionados às realizações culturais. 🅒 A suposição de que todos os seres humanos têm a mesma forma (masculina) de órgão genital é a primeira das muitas teorias sexuais das crianças. 🅓 A sexualidade infantil surge ligada às necessidades sociais e acaba se apresentando auto-erótica, procurando a satisfação de seus desejos em seu próprio corpo. Clique aqui para ver o gabarito da questão. 29Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise Assista agora a Pocket Aula sobre as fases do desenvolvimento psicossexual clicando no ícone ao lado 1.2. LACAN 1.2.1. OS QUATRO CONCEITOS FUNDAMENTAIS DA PSICANÁLISE Depois de Freud, o francês Jacques Lacan é considerado o maior nome da psicanálise, ao estabelecer uma teoria que retoma o conceito de incons- ciente freudiano a partir da apropriação da linguística, trazendo a máxima de que o inconsciente é estruturado como uma linguagem. Para tal feito, Lacan se apropria dos estudos da linguística, principalmente os de Saus- sure. Este considerava o signo enquanto articulação de duas instâncias – significante e significado. O signo linguístico une não uma coisa a uma palavra, mas um conceito e uma imagem acústica. Lacan inverte a lógica Saussuriana, que colocava o significado como do- minante sobre o significante. Desta forma, o algoritmo lacaniano é: S/s – significante sobre significado, apontando a primazia do significante, e com isso um refinamento da técnica de acesso ao inconsciente a partir da investigação da cadeia de significantes trazidas pelo paciente. Para Lacan, o significante é puro, não significa nada ou pode significar qualquer coisa. Desta forma, aparecem em cadeias, e só possuem sentido quando inseridos nessas. Por fim, o significante só possui significado para um su- jeito. https://sanar.link/aula_psi_6369 30Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise Lacan inova em diversos aspectos a Psicanálise, mas considera-se sem- pre um Freudiano. Em seu Seminário 11 – Os quatro conceitos fundamen- tais da Psicanálise – Lacan busca reforçar a partir de uma leitura crítica, os seguintes conceitos da teoria de Freud: inconsciente, repetição, trans- ferência e pulsão. • Inconsciente: tanto Lacan quanto Freud (em sua 2ª tópica) trazem o inconsciente como um sistema dinâmico, um lugar, que não tem exa- tamente um correlato anatômico, mas sim, funções e manifestações específicas. Para Lacan, mais do que um lugar psíquico, o inconsciente é um lugar de uma linguagem. Para explicar melhor isso, ele traz o con- ceito de Outro (o grande outro, em letra maiúscula). O Outro é o lugar da alteridade, o inconsciente formado a partir do discurso significativo, da cadeia de significantes de uma série de “outros” que ocuparam ou ocupam um lugar de destaque na vida psíquica do sujeito. • Repetição: em sua obra Recordar, repetir e elaborar, Freud traz a re- petição como um mecanismo que acompanha o paciente no ato de recordar. A repetição, para Lacan, abre caminho para o “acting out”, a atuação, e de alguma forma traz à tona o elemento reprimido. Lacan também associa a repetição a um gozo, que não necessariamente está ligado à ótica do prazer, e inclusive pode trabalhar na via oposta, a do desprazer, que já havia sido postulado por Freud a partir do conceito de Pulsão de morte. • Transferência: Lacan explica a transferência no processo analítico através do conceito de Sujeito suposto saber. Esta posição em que o analisando coloca a figura do analista (aquele que sabe sobre mim o que não sei) é da ordem inconsciente, e possibilita o transcorrer da análise. É importante destacar que esta posição não é ocupada pela pessoa do analista, mas sim pelo efeito da cadeia de significantes que ele des- perta, o lugar de um Outro. 31Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise • Pulsão: Lacan reitera a diferenciação entre pulsão e instinto colocada por Freud e já apresentada aqui anteriormente. Ele traz o conceito de objeto a para reforçar essa diferença, ou seja, aquele objeto que move e causa o desejo (objeto faltoso, uma metáfora). 04. Jaques Lacan, em seu 11º Seminário, indica na relação de su- jeito com o analista, pelo ideal do eu, uma experiência de análise. Considerando o exposto, assinale o item que corresponde ao que Lacan nomeou de os quatro conceitos fundamentais da Psicanálise. 🅐 A histeria, a neurose, a perversão e a foraclusão. 🅑 O inconsciente, a transferência, a pulsão e a repetição. 🅒 O inconsciente, a associação livre, a pulsão e o sujeito suposto saber. 🅓 A associação livre, as entrevistas preliminares, o diagnóstico diferencial e a transferência. Clique aqui para ver o gabarito da questão. 1.2.2. ESTRUTURAÇÃO DA PERSONALIDADE 1.2.2.1. O estádio do espelho Com relação ao desenvolvimento infantil propriamente dito, Lacan tam- bém destaca a importância da passagem do Édipo para a criança, trazen- do a retomada do objeto fálico como ponto nodal de sua teoria. A referên- cia ao falo, para Lacan, não é a castração via pênis, mas a referência ao pai, ou seja, a referência a uma função que mediatiza a relação mãe-criança. Ele também traz outra novidade com relação à teoria freudiana, que é o chamado estádio do espelho. 32Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise O estádio do espelho acontece a partir de uma experiência de identifi- cação fundamental, durante a qual a criança faz a conquista da imagem de seu próprio corpo. Promove a estruturação do EU, terminando com a vivência específica singular de fantasma do corpo esfacelado. A experi- ência da criança na fase de espelho organiza-se em torno de três tempos: • Primeiro tempo: a criança percebe a imagem de seu corpo como a de um ser real de quem ela procura se aproximar ou apreender – confusão entre si e o outro. • Segundo tempo: a criança percebe que o outro do espelho não é um outro real, mas uma imagem – distinção entre a imagem do outro da realidade do outro. • Terceiro tempo: a criança reconhece que a imagem no espelho na ver- dade é dela. A imagem do corpo é então estruturante para a identidade do sujeito, que através dela realiza sua identificação primordial (DOR, 2003). A passagem pelo estádio do espelho é considerada um momento pré-edí- pico da criança. Quando sai do estádio do espelho, apesar da criança já se reconhecer, ela mantém uma relação quase fusional com a mãe, buscando identificar-se com o que supõe ser o objeto do seu desejo. 05. Sobre o “Estádio do espelho” (1949), considere as seguintes afirmativas: 1. Trata-se de uma identificação, ou seja, uma transformação produzida no sujeito quando ele assume uma imagem. 2. Ocorre entre os 6 e 18 meses de idade. 3. A função do estádio do espelho está fundamentada na noção de prematuração como característica específicado nasci- mento no homem. 4. Fabrica para o sujeito a fantasia de imagem despedaçada do corpo até uma forma de totalidade ortopédica alienante. 33Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise Assinale a alternativa correta. 🅐 Somente a afirmativa 1 é verdadeira. 🅑 Somente as afirmativas 1 e 3 são verdadeiras. 🅒 Somente as afirmativas 2 e 4 são verdadeiras. 🅓 Somente as afirmativas 2, 3 e 4 são verdadeiras. 🅔 As afirmativas 1, 2, 3 e 4 são verdadeiras. Clique aqui para ver o gabarito da questão. Acesse aqui o comentário das cinco questões anteriores 1.2.2.2. A metáfora paterna. Lacan retoma a importância do Complexo de Édipo de Freud, mas agora trazendo a leitura da linguística, que coloca o inconsciente estruturado como linguagem. Por isso, para Lacan, a passagem pelo Édipo marca a in- trojeção da metáfora do Nome-do-pai, ou seja, a lei, ou como o próprio Freud tinha destacado, o desenvolvimento do superego. O menino, que renuncia a ser o falo materno, engaja-se na dialética do ter, identifican- do-se com o pai, que supostamente tem o falo. A menina depara-se com a dialética do ter sob a forma do não ter. Ela encontra assim uma identifi- cação possível na mãe, pois como ela, “ela sabe onde está, ela sabe onde deve ir buscá-lo, do lado do pai” (DOR, 2003). https://sanar.link/aula_psi_6291 34Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise Figura 8. O processo da metáfora paterna. Retomada do objeto fálico Mãe e criança - relação fusional Dialética entre ser ou não ser o falo. Introdução do registro de castração: dimensão paterna. Encontro com a lei - Pai simbólico: Nome-do-pai Fonte: Autoria própria. O pai representa enquanto metáfora a lei, o corte que impede que o su- jeito viva sob o princípio do prazer, numa relação simbiótica com a figura materna. Este corte também apresenta a criança ao campo do simbólico, fazendo com que ela não fique presa ao real, e possa se relacionar com o mundo a sua volta a partir de signos. A passagem pelo Édipo também é um divisor de águas, segundo Lacan, para a estruturação da personalidade. Lacan organiza a personalidade a partir de três possibilidades de estru- tura: neurose, psicose e perversão. ACERTE O ALVO! As estruturas de personalidade em Lacan costumam cair bastante nas questões de Psicopatologia. 1.2.2.3. Estruturas clínicas: neurose, psicose e perversão. Para Lacan, o neurótico é aquele que consegue aceitar a metáfora pa- terna, ou seja, introjeta a lei e recalca a pulsão, apresentando a culpa e a 35Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise angústia. Com isso adentra ao campo do simbólico, o que representa a normalidade da estruturação da personalidade. Já o psicótico foraclui a metáfora paterna, ele não consegue estabelecer contato com ela, ficando então preso à relação simbiótica primitiva. Com isso, ele não adentra o simbólico, sua relação com o mundo é sempre pela instância do real, o que o conduz aos sintomas típicos de alucinações e delírios. O perverso, por sua vez, entra em contato com a metáfora paterna, mas a ignora, denega. Para ele, a lei é ele, sua satisfação é o que importa. Nor- malmente, elege um objeto de substituição à falta materna e apresenta comportamento transgressor, marcado pela ausência da empatia. 1.3. PÓS-FREUDIANOS Muitos foram os autores que se dedicaram à psicanálise, seguindo os passos de Freud, fazendo modificações no arcabouço teórico e técnico da psicanálise. Aqui serão apresentados três autores que contribuíram fortemente tanto com o avanço da Psicanálise como para a Psicologia do Desenvolvimento. 1.3.1. MELANIE KLEIN (1882-1960) Melanie Klein foi uma das primeiras mulheres psicanalistas e se une a Freud ao romper com a ilusão da “inocência das crianças” (crença na as- sexualidade infantil) e o “paraíso da infância”. Para Klein, as crianças apre- sentam, desde muito novas, impulsos sexuais e ansiedade, assim como frustrações. Exatamente por isso é que, mais que possível, é necessária a análise infantil. 36Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise Klein se dedica a descrever os estágios primitivos do desenvolvimento e assim inaugura uma nova psicologia do desenvolvimento. Para Klein, o conflito edípico se instala já na segunda metade do primei- ro ano de vida e, portanto, já a partir daí que a criança começa a cons- truir o seu superego. Assim, a ansiedade e os sentimentos de culpa que a criança sente desde muito cedo têm sua origem nas tendências agres- sivas derivadas desse conflito edípico. Segundo a autora, só mais tarde (no segundo momento do complexo de édipo, aquele descrito por Freud) é que os impulsos libidinais aparecem. Nesse início, é contra os impulsos destrutivos que a criança precisa se defender. Na década de 1920, três psicanalistas se dedicam ao tratamento de crian- ças: Anna Freud, Melanie Klein e Hermine Hug-Hellmuth. Esta, foi a pri- meira psicanalista a usar o brinquedo no tratamento de crianças, mas é Klein quem vai tornar possível a aplicação do método psicanalítico ao tratamento de crianças, através da sistematização da teoria e técnica do brincar, a ludoterapia. Para Klein, a criança, desde muito cedo, se expressa através de brincadei- ras, jogos e também desenhos. É através destes recursos que a criança demonstra, de maneira simbólica, suas fantasias, conflitos e desejos. A criança, ao se expressar através da brincadeira, emprega o mesmo modo de expressão, a mesma linguagem, presente nos sonhos. Concluindo, Klein desenvolveu os fundamentos da técnica para trabalhar com crianças, que consistem: • Na equivalência do brincar com as associações livres do paciente adulto; • no uso de interpretações do material inconsciente, como Freud ensina em Interpretação dos sonhos; • na convicção de que a criança estabelece relação transferencial. 37Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise 1.3.2. DONALD W. WINNICOTT (1896-1971) Como pediatra, Winnicott observava em sua clínica diversos bebês e crianças que apresentavam sintomatologias sem apresentar uma lesão ou disfunção orgânica. Por esse motivo, ele se aproxima da psicanálise. Ele acredita que a maioria dos problemas de seus pacientes eram relati- vos ao início da vida e a um mal-estar da relação mãe-bebê, ou seja, em estágios muito iniciais do desenvolvimento e, portanto, antes do com- plexo de édipo, conceito fundamental e fundante, tanto para Freud como para Klein. É a partir daí que Winnicott começa a elaborar a Teoria do ama- durecimento. A Teoria do Amadurecimento é o elemento central de seu trabalho teórico e clínico. Ela consiste na descrição e conceituação das necessidades hu- manas fundamentais e as condições ambientais que favorecem a consti- tuição psíquica, incluindo aí a capacidade de estabelecer relacionamentos. Para Winnicott, o amadurecimento começa em algum momento após a concepção e, quando há saúde, não cessa até a morte. A ênfase da teo- ria recai sobre os estágios iniciais, pois é nesse período que estão sendo constituídos as bases da personalidade e da saúde psíquica. Todo indiví- duo possui uma tendência inata ao amadurecimento. Para que esta tendência se concretize, o bebê depende de um ambiente facilitador que forneça cuidados suficientemente bons. Se liguem: para Winnicott, o sujeito só pode ser constituído se o ambiente lhe der condi- ções para que esse processo possa ocorrer! No início, esse ambiente é quase exclusivamente relacionado à mãe, ou a figura que exercerá a função materna. É aqui que entra o conceito mais famoso de Winnicott: a mãe suficientemente boa. A expressão suficien- temente boa refere-se à capacidade da mãe de reconhecer a dependên- 38Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise cia do bebê, através de sua identificação com ele, e assim ser capaz de se adaptar e atender as necessidades do filho. Ela é suficientemente boa porque atende ao bebê, na medida das necessidadesdele, e não de suas próprias, como a de ser muito boa, por exemplo! Portanto, cuidado, não tem nada a ver com boa, muito boa ou má! ACERTE O ALVO! O conceito de mãe suficientemente boa, junto com o de objeto transicional, é o mais importante e conhecido de Winnicott. Winnicott descreve os estágios do amadurecimento humano sempre com referência à dependência humana, ou seja, ao fato de que sempre depen- demos do outro. Os estágios são: dependência absoluta, dependência relativa, rumo a dependência e independência relativa. No início, a dependência do bebê para com a mãe é absoluta. A mãe neste início precisa exercer uma adaptação ativa e absoluta às necessidades do filho. Para tanto, a mãe suficientemente boa exerce três funções: holding (sustentação), handling (manejo) e apresentação dos objetos. O hol- ding traduz-se na forma como a mãe sustenta o bebê no colo. Claro está que Winnicott usa o termo também no sentido de uma sustentação não somente física, mas simbólica. O bebê seguro pela mãe, sente-se ampa- rado, protegido e amado. Já o handling diz respeito aos cuidados básicos para que o bebê sobreviva, isto é, como ele é manipulado, trocado, cuida- do. Tais funções permitem a integração psicossomática do bebê, dão a no- ção de externo e interno, de “eu” e “não-eu”. Na apresentação de objetos, a mãe vai apresentar o mundo para seu bebê, através de outros objetos. 39Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise Está aí o início das relações objetais. Na dependência relativa, a mãe vai realizando uma desadaptação grada- tiva na medida em que vai apresentando ao bebê o princípio de realidade. Tanto a mãe como o bebê têm outros interesses e se inicia um processo de separação. Aqui aparece o fenômeno da transicionalidade. O objeto transicional, que pode ser um brinquedo, paninho ou bicho de pelúcia, é então usado como substituto da mãe e, assim, permite o bebê suportar o progressivo afastamento da mesma. Por ser um símbolo da mãe, o objeto transicional, introduz o universo simbólico no bebê. A próxima fase, rumo a independência, a dependência do bebê em rela- ção à mãe é relativa. Aqui o bebê se dá conta da sua ambivalência de sen- timentos (amor/ódio) por seus pais e cabe a ele integrar tais sentimentos. O sentimento de culpa tem sua origem nesse estágio, que Winnicott tam- bém denomina de fase do concernimento. O último estágio é a independência relativa. A base da personalidade está sedimentada. O ambiente já não tem a mesma importância que tinha nas etapas anteriores, mas ainda é fundamental para que o indivíduo pos- sa continuar seu amadurecimento. 40Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise Figura 9. Linha do Amadurecimento de Winnicott. NASCIMENTO tendência inata ao amadureci- mento DEPENDÊNCIA ABSOLUTA adaptação ativa holding, handling, apresentação de objetos DEPENDÊNCIA RELATIVA desadaptação gradativa transicionaldade relações objetais RUMO A INDEPENDÊNCIA fase do concer- nimento, inte- gração, posição depressiva INDEPENDÊNCIA RELATIVA Édipo, latência, adoles- cência, idade adulta, velhi- ce, morte base da perso- nalidade sedimentada Fonte: Autoria Própria. 1.3.3. JOHN BOWLBY (1907-1990) Bowlby se dedica a estudar a formação de vínculos emocionais e sua principal contribuição nessa área foi a construção da Teoria do Apego. Por vínculo emocional ou afetivo, entendemos o laço entre duas pessoas em que o parceiro é visto como único e insubstituível. Já o apego trata-se de uma variedade de vínculo afetivo no qual o sen- so de segurança de uma pessoa está ligado ao relacionamento. Tanto o vínculo afetivo como o apego são estados internos, isto é, não podem ser observados diretamente. Assim, o objeto de estudo centra-se nos com- portamentos de apego. Os comportamentos de apego são todos aqueles comportamentos que permitem que uma criança ou adulto alcance e mantenha proximidade física com outra pessoa a quem ela está apegada. São exemplos de com- portamentos de apego: sorrir, fazer contato visual, chamar a pessoa, to- car, segurar, chorar. São comportamentos manifestados quando o indiví- duo necessita de cuidado, apoio ou conforto. Quando há o apego, a criança pode usá-lo como base segura para explorar o mundo. 41Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise Bowlby vê o comportamento de apego como uma estratégia de sobrevi- vência, porque garante que o bebê receba os cuidados necessários. Para ele, há um potencial inato para desenvolver o apego, mas que só é possível de acontecer na interação com um cuidador. Assim como o vínculo dos pais com o bebê, o apego surge gradualmente. O autor refere três fases no desenvolvimento do apego: • Fase 1 – Orientação e sinalização não focada ou pré-apego (0 a 3 me- ses): Nesta fase, há pouca evidencia de que o bebê esteja apegado aos pais. O bebê apresenta comportamento inatos como o chorar, fazer contato visual, que sinalizam suas necessidades e o orientam na di- reção dos outros. • Fase 2 – Foco em uma ou mais figuras (3 a 6 meses): Início da forma- ção do apego. O bebê começa a usar seus comportamentos de apego de forma mais específica: tende a sorrir mais para as pessoas que cui- dam dele e pode não sorrir facilmente para um estranho. Ainda não há o estabelecimento da base segura e, portanto, a criança não apresenta medo de estranhos nem ansiedade ao ser separada de seus pais. • Fase 3 – Comportamento de base segura (a partir dos 6 meses): For- mação do apego bem definido. É nesta época em que também adquire a noção de permanência de objeto, isto é, a compreensão de que objetos e pessoas continuam a existir mesmo fora de vista. O bebê usa sua base segura (cuidador) como uma base a partir da qual explora o mundo à sua volta. É também aqui que surgem o medo de estranhos e a ansiedade de separação, chamada também de angústia ou ansiedade do 8º mês. 42Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise 1.3.4. VARIAÇÕES NA QUALIDADE DOS APEGOS Mary Ainsworth (1978), aluna e discípula de Bowlby, descreve padrões de apego entre bebê e cuidador, através de um método experimental deno- minado Situação Estranha, que consiste na observação das reações da criança (de 12 a 18 meses) na interação com seu cuidador em uma situação de separação. Foram identificados três padrões principais de apego: • Padrão seguro: a criança usa a mãe (ou cuidador) como base segura e é facilmente consolada pela mesma. A criança consegue explorar o ambiente de forma tranquila e, quando estressada, mostra confiança em receber cuidado e proteção da figura de apego. O elemento funda- mental para o apego seguro é a disponibilidade emocional do cuidador. A crianças segura se incomoda quando separada de sua mãe, mas é fa- cilmente consolada. • Padrão resistente ou ambivalente: a criança resiste à separação e tem dificuldade de ser tranquilizada pelo cuidador. Alterna seu comporta- mento entre a busca por consolo e a raiva. Apresenta falta de confiança nos cuidadores, que mostram pouca responsividade e disponibilidade emocional. • Padrão evitativo: a criança se mostra pouco inibida com estranhos e, quando reunida com os cuidadores, mantêm distância. São crianças menos propensas a procurar o cuidado e a proteção das figuras de ape- go. São crianças que podem ter sofrido alguma rejeição. 43Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise 06. Gabbard ao falar sobre a teoria do vínculo de Bowlby, escla- rece que ele compreende o vínculo da criança com sua mãe como necessário para a sobrevivência. Quando o vínculo é rompido pela perda de um dos pais ou quando o vínculo é instável com um dos pais, o que pode ocorrer com a criança segundo a teoria do vínculo de Bowlby? 🅐 Dependendo da idade da criança, o vínculo ausente ou instável não interfere na psique infantil. A criança na vida adulta, pode vir a se tornar independente e criativa com potencial a assumir riscos. 🅑 A criança passa a registraras figuras parentais como ameaça- doras e ter sentimento de insegurança que irão acompanhá-la ao longo de toda sua vida adulta. Podendo vir a desenvolver sintomas ansiosos e sentimento de persecutoriedade. 🅒 A criança passa a considerar que não pode depender de suas figuras parentais, o que a impulsiona a desenvolver defesas manía- cas. E na vida adulta, pode vir a sentir-se independente e segura para cuidar de si mesmo. 🅓 A criança passa a se considerar não merecedora de amor e vê sua cuidadora como pessoa da qual não pode depender e que abandona. E na vida adulta, pode vir a deprimir sempre que vivenciar uma perda, por essa reativar os sentimentos de ser um fracasso e de abandono. 🅔 A criança passa a considerar sua cuidadora como pessoa da qual não pode depender e que abandona. E na vida adulta, pode desen- volver defesas maníacas com a finalidade de salvar e restaurar os objetos amados perdidos e negar os objetos internos maus. Clique aqui para ver o gabarito da questão. 44Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise Assista agora a Pocket Aula sobre pós freudianos clican- do no ícone ao lado ANOTAÇÕES https://sanar.link/aula_psi_6565 45Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise 2. FUNDAMENTOS TÉCNICOS 2.1. A TÉCNICA ANALÍTICA E A RESISTÊNCIA Se toda a prática analítica se dá em busca de compreender e manejar me- lhor as questões do inconsciente, há de se convir que é necessário formas específicas de acesso a seus conteúdos, procurando ao máximo minimi- zar os efeitos da resistência. Freud começou a perceber o poder da re- sistência ainda no início de sua clínica, quando passou a observar alguns comportamentos de seus pacientes em análise, que diziam que não con- seguiam recordar alguns eventos. As recordações esquecidas não haviam se perdido, mas mantinham-se detidas por uma força, a qual ele denomi- nou de resistência. E esta resistência trabalhava em prol da barreira do recalcamento. Figura 10. Esquema do arco reflexo aplicado ao funcionamento psíquico. Representante da pulsão Con des açã o De slocame nto TENSÃ O X D ESPRA ZER I N C O N S C I E N T E DENTRO PRÉ-CONSCIENTE/ CONSCIENTE FORA Representante da ação Atividade intelectual Formações do inconsciente Descarga com pleta ideal RECALCAMENTO Prazer parcial e substitutivo Prazer absoluto e impossível Prazer moderado Fonte: NASIO, 1999. 46Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise Para tentar manejar a resistência, Freud precisou aperfeiçoar sua técnica. Aquilo que começou com a hipnose, foi aos poucos (e com a participação direta de seus próprios pacientes) evoluindo até chegar à técnica primor- dial da Psicanálise: a livre associação. Freud percebeu que os pacientes eram capazes de contar fatos importantes mesmo sem estarem em esta- do alterado de consciência (como na hipnose). Bastava arrumar formas de diminuir suas resistências. Então ele saiu de um modelo mais estrutura- do de trabalho para uma forma mais livre, baseada em um único comando dado ao paciente: “fale livremente sobre o que lhe vier à mente”. 2.2. TRANSFERÊNCIA E CONTRATRANSFERÊNCIA Todo esse trabalho técnico só era possível, no entanto, a partir do estabe- lecimento daquilo que Freud denominou de transferência. Freud foi des- cobrindo a transferência ao longo de sua clínica, principalmente quando algumas pacientes começaram a se apaixonar por ele. Este sentimento despertado, na verdade não era direcionado ao homem Freud, mas sim ao psicanalista e tinham a ver com outras figuras de destaque na vida dessas mulheres. Freud percebeu que algum tipo de sentimento seria desperta- do no processo analítico, fosse ele positivo ou negativo. E ao invés de evi- tá-lo, era importante utilizá-lo como instrumento de trabalho em prol da análise. Ou seja, parte do processo analítico consiste no manejo da trans- ferência. A transferência no setting analítico consiste basicamente nos sentimen- tos (positivos ou negativos) do paciente que são deslocados para a figura do analista. Como já foi dito anteriormente, é a base da relação terapêuti- ca, mas não se limita a ela. Possuímos relações transferenciais com pes- soas nos mais diversos contextos, simpatizamos, antipatizamos, criamos aproximações e distanciamentos muitas vezes baseados em sentimentos que “aparentemente aquelas pessoas nos despertam”, mas que na verda- de encobrem questões do nosso próprio inconsciente. 47Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise Na análise, a transferência não ocorre apenas por parte do paciente. O analista também é tomado por sentimentos despertados por seus anali- sandos. Este movimento inverso, o qual também deve ser cuidadosamen- te manejado (para que não interfira no processo analítico) é chamado de contratransferência. Transferência e contratransferência são partes in- tegrantes tanto da análise com adultos, quanto com crianças. Figura 11. Representação dos processos de transferência e contratransferência. 07. A partir do texto “A dinâmica da transferência” e da nomeação feita por Freud de médico àquele que exerce a psicanálise, consi- dere as seguintes afirmativas: 1. A transferência para o médico é apropriada para a resistência ao tratamento apenas na medida em que se tratar de trans- ferência negativa ou de transferência positiva de impulsos eróticos reprimidos. 2. Para remover a transferência, o médico a torna consciente comunicando-a ao paciente. 3. A transferência só aparece na psicanálise e não em outras formas de tratamento. 4. Devido à ambivalência dos neuróticos, a transferência nega- tiva é amiúde encontrada ao lado da transferência afetuosa, e pode ser dirigida simultaneamente para a figura do médico. 48Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise Assinale a alternativa correta. 🅐 Somente a afirmativa 2 é verdadeira. 🅑 Somente as afirmativas 1 e 4 são verdadeiras. 🅒 Somente as afirmativas 2 e 3 são verdadeiras. 🅓 Somente as afirmativas 1, 3 e 4 são verdadeiras. 🅔 As afirmativas 1, 2, 3 e 4 são verdadeiras. Clique aqui para ver o gabarito da questão. 2.3. DIREÇÃO DO TRATAMENTO PSICANALÍTICO Freud tinha relutância em escrever sobre a técnica psicanalítica. Em Estu- dos Sobre Histeria (1895) apresentou um relato completo do procedimen- to psicanalítico, mas só volta a escrever sobre a técnica depois de 15 anos. O material sobre o procedimento clínico da psicanálise está descrito em 6 artigos: O manejo da interpretação de sonhos na psicanálise (1911), Dinâ- mica da transferência (1912), Recomendações aos médicos que exercem a psicanálise (1912), Sobre o início do tratamento (1913), Recordar, repetir e elaborar (1914) e Observações sobre o amor transferencial (1915). Sua hesitação em publicar esse tipo de material se dava primeiro por seu ceticismo com relação a qualquer tipo de manual e, em segundo lugar, por acreditar que os fatores psicológicos envolvidos são complexos e variá- veis demais para tornar possíveis regras rígidas e firmes. 49Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise Freud não cansou de enfatizar que o domínio técnico só pode ser adqui- rido pela experiência clínica e não através dos livros. Experiência clínica como analista, mas principalmente através de sua própria análise. 2.3.1. INÍCIO DO TRATAMENTO Antes de o paciente entrar na análise propriamente dita deve haver um tratamento de ensaio, ou entrevistas preliminares, como Lacan deno- minou. Este período prévio é necessário para conhecer o caso e decidir se ele é apropriado ou não para a psicanálise. Devemos deixar o paciente livre para escolher por qual tema começará, se com sua a história de vida ou de sua doença. Importante destacar que Freud afirma existir apenas uma regra fundamental da psicanálise, a as- sociação livre. As demais são apenas recomendações que ele faz a partir de sua experiência. O paciente procura um psicanalista com uma queixa, isto é, com algo que conscientementeo incomoda. É um pedido de ajuda e, nas entrevistas preliminares, se faz a apuração deste pedido. Nem sempre é análise o que o paciente demanda, uma vez que demanda de análise tem a ver com a implicação do sujeito em seu sofrimento, questionando seu sintoma, sua posição diante de si e do outro. A entrada do paciente em análise, marca- da simbolicamente pelo uso do divã, é realizada quando há a retificação subjetiva. Retificação subjetiva, conceito descrito por Lacan, é a res- ponsabilização do sujeito por sua doença. ACERTE O ALVO! Questões técnicas são recorrentes. Fiquem atentos! 50Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise • Associação livre: exigência feita ao paciente para que comunique tudo que lhe passe a cabeça, sem crítica ou seleção do assunto. • Atenção flutuante: contrapartida da associação livre, a atenção flutu- ante é a técnica do analista de não dirigir sua atenção para algo especí- fico, ou seja, manter a mesma “atenção uniformemente suspensa” para tudo que escuta. Segundo Freud, assim que alguém deliberadamente foca a atenção, começa a selecionar o material que lhe é apresentado e negligencia outros e, ao fazer essa seleção, segue suas expectativas ou inclinações, ou seja, a escuta fica enviesada. O analista, portanto, deve escutar sem se preocupar se irá se lembrar. Freud acredita que atuando dessa forma, a tarefa de lembrar-se de todos os dados do paciente e não confundir com os demais fica facilitada, pois o que parece que está esquecido vem rapidamente à lembrança assim que o paciente traz algo que se relaciona. • Não anotar durante o atendimento: ao anotar corremos o risco de fazer uma seleção do material, prejudicando nossa compreensão do caso. Além disso, é bastante desconfortável para o paciente que pode se sentir intimidado. • Neutralidade e Abstinência: Freud faz uma analogia entre o analista e o cirurgião, que devem pôr de lado seus sentimentos, para que não haja o risco de um viés na compreensão e manejo do caso. • Análise pessoal: o analista deve estar em condições de poder escutar e trabalhar com tudo que é dito pelo paciente, não censurando qualquer tema. Para tanto, é fundamental que o analista faça sua análise pessoal para conhecer e manejar seus possíveis “pontos cegos”. • Não apresentar sua individualidade: para Freud, o analista “deve ser opaco aos seus pacientes e, como um espelho, não lhes mostrar nada, exceto o que lhe é mostrado” (Freud, 1913, p. 157). Falando de si, o analis- ta pode acabar por induzir o paciente. 51Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise • Atividade pedagógica e cooperação intelectual: não devemos teori- zar com e para o paciente. Ele não quer ou precisa de uma aula sobre a psicanálise. Além de não solucionar, essas teorizações podem fortale- cer as resistências do paciente. • Questão do tempo: » Frequência e duração da sessão: são propostas pelo analista que segue seus próprios critérios. O tempo do inconsciente não corresponde o tempo cronológico e, portanto, tais regras são arbitrárias. Mas é importante uma hora determinada para que o paciente seja responsável por ela, mesmo que não faça uso da mesma. As faltas ocasionais tendem a diminuir desta maneira. La- can traz um conceito muito interessante a respeito do tempo, que é o tempo lógico. A proposta é de pensar a duração das sessões conforme o que está sendo verdadeiramente dito. A interrupção da sessão seria uma maneira do analista fazer o paciente continuar tra- balhando e elaborando o que foi dito em sessão. Não se prende à ho- rários pré-determinados, portanto, mas ao tempo do inconsciente. » Duração do tratamento: devido a própria atemporalidade do in- consciente e a consequente demora nas mudanças de nossos pro- cessos mentais, a análise é quase sempre demorada. Freud acredi- ta por isso que é nosso dever alertar o paciente para que ele possa se decidir quanto a iniciar ou não o tratamento. • Questão do dinheiro: » Meio de autopreservação do analista. » Relação com fatores sexuais: segundo Freud, as questões relacio- nadas a dinheiro são tratadas da mesma maneira que as questões sexuais, ou seja, como um tabu. O analista, portanto, deve tratar deste tema, como trata de todos os outros, com franqueza. » Tratamento gratuito: para Freud, a ausência do efeito regulador oferecido pelo pagamento compromete a análise, uma vez que o 52Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise paciente é privado de um forte motivo para esforçar-se para termi- nar o tratamento. No entanto, sabemos que os esforços do pacien- te podem se dar por outros caminhos. » Análise como investimento: fazer análise aumenta a eficiência e capacidade do paciente. “Nada na vida é tão caro quanto a doença - e a estupidez” (Freud, 1913, p. 148). • Uso do divã: por ser um dispositivo da época do método hipnótico, tem um caráter histórico. Freud também o usa por motivos pessoais: não queria ser encarado por tanto tempo por tantos pacientes, até para que suas expressões não influenciassem e induzissem os pacientes. Além disso, o divã favorece a regressão do paciente, bem como o estabele- cimento da transferência, dispositivos fundamentais para a análise. A ida para o divã tem também um caráter simbólico, pois marca a entrada em análise. No entanto, é importante destacar que o divã é apenas um móvel, ou seja, ele não determina o sucesso ou fracasso da análise e vai depender de como o analista o maneja. • Interpretações: devem ser feitas somente após a transferência ter sido estabelecida. Devemos ter cuidado em não ter pressa em inter- pretar, pois corremos o risco de aumentar as resistências do paciente. 53Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise 08. Em um dos seus “Artigos sobre a técnica”, Freud faz uma série de recomendações aos praticantes da psicanálise. A respeito do assunto, assinale a alternativa correta. 🅐 O psicanalista deve, a bem do rigor e da fidelidade, tomar notas integrais do que dizem os pacientes em sessão. 🅑 A atenção flutuante é a técnica empregada pelo psicanalista em consonância com a associação livre proposta ao paciente. 🅒 O tratamento psicanalítico deve ser conduzido respeitando-se a regra da abstinência por parte do paciente. 🅓 O tratamento psicanalítico será beneficiado com a postura de incentivo do analista à recuperação do paciente. 🅔 O tratamento será tão mais efetivo quanto mais houver uma troca sincera de confissões entre analista e paciente, o que con- duzirá a uma sintonia terapêutica benéfica à cura. Clique aqui para ver o gabarito da questão. Assista agora a Pocket Aula sobre a direção do tratamento psicanalítico clicando no ícone ao lado https://sanar.link/aula_psi_6563 54Curso Intensivo para Residências | Psicologia | Psicanálise 2.4. LUTO E MELANCOLIA No texto Luto e Melancolia (1915), último texto dos artigos que compõem a metapsicologia freudiana, Freud busca esclarecer a essência da melan- colia comparando com o processo normal do luto. A relação entre ambos se dá na perda do objeto. 2.4.1. LUTO O processo de luto é uma reação normal, natural e esperada após uma perda importante ou rompimento de vínculo (perda do objeto), que pode ser por morte, afastamento, perda de capacidades físicas ou psico- lógicas, do ambiente conhecido ou ainda por experiências que envolvem mudanças (PARKES, 1998). Importante lembrar que no luto não se trata somente da perda do objeto, mas também da perda do lugar que ocupávamos junto a ele. Ainda que cada perda seja única e singular, o processo de luto apresenta características comuns: • Sentimentos de tristeza. • Isolamento. • Humor depressivo. • Desinteresse pelo mundo externo. • Afastamento. • Desânimo pelas atividades relacionadas ao trabalho, ao lazer e da vida diária. É possível também que algumas pessoas, ao contrário do esperado, se envolvam mais em suas atividades, podendo mostrar um aumento no nível de atividade costumeiro. Tais
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