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A BASE BÍBLICA DO MANDATO MISSIONÁRIO MUNDIAL

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A BASE BÍBLICA DO MANDATO MISSIONÁRIO MUNDIAL
Johannes Verkuyl
JOHANNES VERKUY - Foi professor e chefe do Departamento de Missiologia e Evangelismo da Free University of Amsterdam. Em 1940, foi enviado como missionário para a Indonésia e passou três anos num campo de concentração japonês. É autor de mais de 250 livros e artigos. Extraído de Contemporary Missiology: An Introduction (“Missiologia contemporânea: uma introdução”) (Grand Rapids: Eerdmans,1978). Usado com permissão.
O Significado do Antigo Testamento
O século XX e também o século XXI têm produzido um fluxo contínuo de literatura que considera o Antigo Testamento uma base indispensável e insubstituível para a tarefa missionária da Igreja entre as nações e povos deste mundo. Na qualidade de pessoas habituada a consultar tal literatura, desejo examinar quatro temas do Antigo Testamento que constituem a base da chamada neotestamentária à Igreja para se envolver na obra missionária mundial: o tema universal, o tema do resgate e da salvação, o tema missionário e o tema do antagonismo.
O Tema Universal
O Deus que no Antigo Testamento se identifica como o Deus de Abraão, de Isaque e de Jacó e que revela a Moisés seu nome pessoal, Yahweh, é o Deus de todo o mundo. A experiência que alguns poucos patriarcas - e mais tarde a nação de Israel apenas - tiveram com esse Deus amplia-se para incluir o horizonte de todo o mundo. Citaremos apenas umas poucas passagens do Antigo Testamento para aclarar esse tema.
A tábua das nações em Gênesis 10
Gênesis 10, com sua passagem que relaciona a tábua das nações, é importante para a compreensão do tema universal do Antigo Testamento. Gerhard Von Rad descreve essa tábua como a conclusão da história da criação. Todas as nações têm sua origem na mão criadora de Deus e estão sob seu vigilante olhar de paciência e julgamento. As nações não são meras peças decorativas dispostas ao acaso no cenário do drama real entre Deus e a humanidade. As nações, isto é, a raça humana como um todo, são parte do próprio drama. A obra e a atividade de Deus apontam para a humanidade como um todo.
Essa é uma das verdades fundamentais de Gênesis 1-11, que constitui o registro do início da História. Também é encontrada no tocante relato do fim da História, o livro do Apocalipse. O próprio Deus, que se revelou a Israel e habitou entre nós em Jesus Cristo, identifica-se como o Alfa e o Ômega, o Princípio e o Fim. Ele não apresentará seu trabalho ao Pai até que toda "língua, povo e nação", uma "grande multidão que ninguém podia enumerar" tenha se reunido ao redor de seu trono (Ap 5.9,10; 7.9-17). Deus se dirige diretamente às atividades cansativas e penosas dos seres humanos na História a fim de alcançar seus objetivos entre as nações.
A eleição divina de Israel como parte de seu objetivo para com as nações
Depois que a Bíblia encerra o relato do julgamento de Deus sobre as nações, descrito de modo tão ilustrativo no episódio da torre de Babel, em Gênesis, segue-se o registro do chamado de Abraão, quando Deus lhe ordena que deixe Ur dos caldeus. À primeira vista parece que o "Deus de toda a terra" limitou seus interesses à história particular de uma só família e uma única tribo. Na verdade, nada estaria mais longe da verdade que essa ideia. Nas palavras de Groot, "Israel é a primeira palavra dita por Deus na proclamação da salvação, não o Amém". Durante algum tempo, Israel, o "povo de Abraão", encontra-se separado das demais nações (Êx 19.3ss; Dt 7.14ss), mas isso acontece apenas para que por meio de Israel Deus possa preparar o caminho para alcançar seus objetivos universais. Ao escolher Israel, um segmento de toda a humanidade, Deus nunca tirou os olhos das outras nações. Israel era uma minoria chamada para servir a maioria.
A eleição divina de Abraão e Israel diz respeito ao mundo inteiro. Seu relacionamento com Israel é intenso justamente por sua insistência em reivindicar o mundo inteiro para si. Para falar a este mundo na plenitude dos tempos precisava de um povo. Um sem-número de estudos recentes enfatiza exatamente esse ponto. Deus escolheu Israel como preparação para o total desvendamento de seus objetivos universais.
Sempre que Israel se esquecia de que Deus o havia escolhido para que falasse às nações e passava a ignorá-las, numa atitude de orgulho egoísta, profetas como Amós, Jeremias e Isaías atacavam de forma veemente a pretensão etnocêntricados Israelitas, acusando-os de subverter as verdadeiras intenções de Deus (v. esp. Am 7.9,10).
A irrupção do temo universal no exílio
As experiências de Israel durante os séculos VII e VI a.C. despertaram-no para as intenções universais de Deus. Em meio à experiência catastrófica de ser aniquilado pelos babilônios e ser levado cativo para o exílio, os profetas passaram a perceber como a carreira de Israel estava tão intimamente ligada à história das nações. Da punição sofrida por Israel, surgiu a firme esperança de um novo pacto, um novo êxodo, um novo Filho de Davi. Jeremias, Ezequiel e Isaías: todos esses profetas viram o horizonte que se ampliava e deram testemunho de que agora todas as nações eram alvo das promessas de Deus. A visão apocalíptica de Daniel prediz a vinda do Filho do Homem, cujo Reino dará fim aos reinos selvagens deste mundo e cujo domínio abrangerá todos os povos (Dn 7).
O tema do resgate e da salvação Yahweh, o Redentor de Israel
O tema soteriológico da Bíblia, isto é, da obra divina de resgatar e salvar Israel e as demais nações, está intimamente ligado ao tema do universalismo. Yahweh, o Deus de toda a terra, demonstrou seu amor e manteve a palavra dada a Israel, libertando-o das cadeias da escravidão com seu braço forte e estendido (v. Dt 9.26; 13.5; 15.15; 24.18). Esse fato constituía a base do credo de Israel e era crucial à compreensão do primeiro mandamento. Só esse Deus — que salva e liberta — é Deus. "Não terás outros deuses diante de mim" (Êx 20). Esse credo transformou Israel de mera nação entre muitas, em comunidade escolhida, a qual deve sua existência ao ato divino de libertação e retribui a Deus com louvor, por meio de salmos e orações de gratidão.
Yahweh, o Redentor das nações
Os profetas de Israel cada vez mais se conscientizavam de que não seria apenas Israel O beneficiário dos atos divinos de redenção. Deus forçaria o restabelecimento de seu senhorio sobre as nações do mundo inteiro.
Em seus estudos, Sundkler e Blauw destacam que os profetas desenvolvem essa ideia de forma centrípeta, isto é, depois de seu resgate as outras nações rumam para Sião, o monte do Senhor. Os profetas apresentam o quadro em que pessoas de outras nações afluem para Jerusalém, onde o Deus de Israel aparecerá como o Deus de todos os povos (v. Is 2.1-4; 25.6-9; 60; Mq 4.1-4; Jr 3.17; Zc 8.20ss).
Vários salmos também celebram esse tema. O salmo 87 proclama Jerusalém a cidade ecumênica, que um dia terá como cidadãos também os habitantes de várias nações, mesmo daquelas que em alguma época se opuseram mais intensamente ao Deus de Israel. Eles se unirão para celebrar a comunhão que Deus restaurou com os povos.
O método divino de conceder libertação 
A Bíblia revela os meios que Deus usa para trazer libertação a Israel e às nações. Nenhuma passagem do Antigo Testamento se aprofunda tanto nesse assunto quanto os chamados "cânticos do Servo", de Isaías 40-55. Os cânticos do Servo fazem referência inconfundível à difusão da salvação por todo o mundo. O Servo levará a libertação até os confins da terra (Is 49.6) e não cessará sua obra até que a justiça prevaleça no mundo inteiro. As regiões costeiras estão aguardando sua instrução (Is 42.4).
O quarto cântico do Servo, no capítulo 53, desvenda um segredo: o modo em que o Servo do Senhor se desincumbirá de sua missão. Esse texto comovente mostra o Servo na condição de vítima da mais selvagem crueldade humana. Toda espécie de maus-tratos que a mente humana possa conceber serão infligidos a ele. Entretanto, nessa ocasião o Servo também atuará como um substituto, tornando-se alvo do juízo divino, do qual não apenas Israel era merecedor,mas todos os povos e nações. Como substituto de Israel e das nações, o Servo deve trilhar o caminho do sofrimento a fim de trazer-lhes liberdade. Além do mais, o texto apresenta as nações como dádivas de Yahweh ao Servo, como recompensa pela sua obediência voluntária de sofrer a morte. Ele conquistou o direito de trazer salvação e cura a todos os povos.
De passagem devemos observar que Paulo, o apóstolo aos gentios pagãos, baseia sua chamada da parte de Deus para participar da missão mundial nesses mesmos cânticos do Servo extraídos do Antigo Testamento (v. At 13.47).
O tema missionário
Relacionado aos outros dois temas do Antigo Testamento já mencionados, encontramos o tema missionário. Os profetas nunca se cansam de lembrar Israel de que sua eleição não é um privilégio que possa guardar apenas para si. A eleição é um chamado ao serviço. Implica o dever de testemunhar entre as nações. Israel deve ser para as demais nações um sinal de que Yahweh é tanto o Criador quanto o Libertador. Um dos cânticos do Servo (Is 49.6) refere-se à ordem dada a Israel de se tornar uma luz para as nações.
Quase todo autor que tenta explicar o chamado de Israel chega ao conceito da presença. Escolhido por Deus para se tornar receptor especial da misericórdia e da justiça divinas, Israel tem agora o dever de viver como povo de Deus no meio das outras nações a fim de lhes mostrar a graça, a misericórdia, a justiça e o poder libertador de Deus. Vez após outra, os profetas registraram seu profundo desapontamento com a constante sabotagem que Israel praticava contra o chamado divino. Por mais que estivessem irados contra a desobediência de Israel, os profetas continuavam a lembrá-lo do real objetivo da ordem de estar presente entre os povos como nação distinta e como sacerdócio real.
Vale a pena observar que, desde a Segunda Guerra Mundial, inúmeros missiólogos vêm insistindo que a presença cristã é um dos principais métodos de participar da obra missionária hoje. Por diversas razões e de várias maneiras, afirmam que a forma de testemunho mais adequada é simplesmente ser um tipo de pessoa em particular enquanto vive entre outras pessoas. Não é hora de desenvolver essa ideia, mas apenas de destacar que o conceito de que estar presente é testemunhar tem profundas raízes no Antigo Testamento. Os profetas proclamavam que o simples fato de viver de acordo com a ordem divina de servir, tornaria Israel um sinal e uma ponte para as outras nações.
Não creio, todavia, que seja correto entender o tema missionário apenas com base no conceito de presença. Simplesmente não compreendo por que tantos autores decididamente declaram que o Antigo Testamento não faz em absoluto qualquer referência a um mandato missionário.
Em seu livro Mission in the New Testament (Missão no Novo Testamento), Hahn afirma, por exemplo, que o Antigo Testamento apresenta um "caráter totalmente passivo". Em minha opinião, isso é exagero. O livro de Bachli, Israel and die Volker (Israel e as nações) está mais próximo da verdade ao observar que o relato do êxodo e a tradição deuteronômica fazem distinção entre am ("povo") e qahat ("a comunidade religiosa") e expressamente mencionam que já no deserto muitos indivíduos, embora não fossem membros do “am” desde o início, se uniram à “qahat”. Da mesma forma, os povos pagãos que acompanharam Israel e habitaram como estrangeiros entre o povo de Deus também participaram da adoração de Israel. Eles ouviram o testemunho dos atos poderosos de Deus e se uniram a Israel em cânticos de louvor.
Temos, então, um significativo número de pessoas que deixaram suas origens pagãs e, por palavras e obras, foram ganhas para confiar no Deus vivo, o qual lhes havia demonstrado misericórdia, e também para o servir. As histórias de Melquisedeque, Rute, Jó, o povo de Nínive descrito no livro de Jonas e de muitos outros no Antigo Testamento são, por assim dizer, como janelas através das quais podemos avistar a grande multidão fora da nação de Israel e ouvir a suave música, que já se fazia ouvir, de uma chamada missionária para alcançar todos os povos.
A literatura sapiencial do Antigo Testamento é semelhante tanto na forma quanto no conteúdo às culturas egípcia e grega. Sem dúvida essa literatura proporcionou a Israel um meio de, comunicar suas crenças às outras nações.
Além do mais, não existe nenhuma outra explicação para o poderoso impacto missionário do judaísmo durante a Diáspora, a não ser a afirmação de que aqueles judeus dispersos haviam, desde o princípio, ouvido e compreendido sua chamada para testemunhar de forma direta e também por meio de sua presença.
O tema do antagonismo
A lista de temas missionários do Antigo Testamento ainda está incompleta. Intricadamente ligado a cada um dos temas mencionados nas seções anteriores, está o tema do antagonismo, isto é, a poderosa contenda de Yahweh contra os poderes e forças que se opõem à sua autoridade libertadora e plena de graça.
Todo o Antigo Testamento (e também o Novo Testamento) está repleto de descrições de como Yahweh-Adonai, o Deus da aliança com Israel, combate aquelas forças que tentam se opor aos seus planos para a criação e subvertê-los. Luta contra aqueles deuses falsos que os seres humanos confeccionaram usando o mundo criado como modelo, idolatraram e usaram para seus propósitos. Considere, por exemplo, os baalins e Astarote, cujos adoradores consideravam divinos a natureza, a tribo, o governo e a nação. Deus opõe-se à magia e à astrologia, as quais, de acordo com Deuteronômio, alteram a linha limítrofe entre Deus e sua criação. Ele batalha contra toda forma de injustiça social e despe cada disfarce sob o qual a injustiça procura se esconder (v. Amós e Jeremias, por exemplo).
Todo o Antigo Testamento está tomado de um desejo febril de derrotar esses poderes contrários. Há magníficas visões do Reino vindouro, no qual cada relacionamento será adequadamente restabelecido e quando toda a criação (humanos, animais, plantas e as demais criaturas) se enquadrará de maneira perfeita nos propósitos de Deus (v. Is 2 e 65; Mq 4). O Antigo Testamento anseia pela manifestação definitiva desse Reino e afirma categoricamente a promessa de que no fim Yahweh será de fato vencedor. Esse é também um tema bastante significativo para a participação missionária. É impossível participar da missão, a menos que se combatam todas as formas de oposição aos propósitos de Deus, onde quer que se encontrem - nas igrejas, no mundo das nações ou na própria vida.
O Antigo Testamento liga intimamente o tema do antagonismo às questões doxológicas. A glória de Yahweh-Adonai será manifesta entre todos os povos. Cada ser humano, então, virá a conhecê-lo como ele realmente é: "Deus clemente, e misericordioso, e tardio em irar-se, e grande em benignidade, e que [se arrepende] do mal" (Jn 4.1,2).
O livro de Jonas
O livro de Jonas é fundamental para se entender a base bíblica da missão porque trata do mandato de Deus ao seu povo com relação aos povos gentílicos e, dessa forma, serve como passo preparatório para o mandato missionário do Novo Testamento. Jonas também é importante para dar uma ideia da profunda resistência que esse mandato encontra no próprio servo que Yahweh escolheu para realizar essa tarefa de alcance mundial.
Hoje muito se fala e se escreve a respeito de orientar o povo para a missão. Jonas é uma lição de treinamento para quem pretende ser missionário. O livro revela a necessidade de uma conversão radical das tendências naturais e da reestruturação completa da vida pessoal, de modo que o cristão se torne útil para a missão.
Contexto do livro
O título do livro é o nome pessoal de um profeta sem disposição, Jonas, e retoma o assunto da época do rei Jeroboão II (787-746 a.C.), quando viveu um profeta chamado Jonas ben Amitai. É óbvio, todavia, que esse midrash foi escrito por razões outras e não para detalhar os acontecimentos da vida do profeta. O autor usa esse nome pessoal para apresentar aos seus leitores um missionário que não apreciava os gentios e que, à semelhança dos fariseus de épocas posteriores,não podia tolerar um Deus que demonstrasse misericórdia para com os gentios. Nas palavras do autor holandês Miskotte, "o escritor deseja apresentar uma personagem que seja exatamente o oposto de um apóstolo". O autor de Jonas adverte seus leitores contra aquela atitude intolerante e pergunta se desejam ser transformados em servos que atuam de modo a cumprir as ordens de Deus.
O escritor de Jonas entende que Israel ficou tão preocupado consigo mesmo que se esqueceu do mundo das nações. Israel, o receptáculo de toda a revelação de Deus, recusava-se a dar um passo em território estrangeiro e proclamar aos outros povos a mensagem divina de juízo e libertação. Entretanto, a mensagem do livro também é destinada à congregação do Novo Testamento, a qual tenta de diversas maneiras escapar ao mandamento de apresentar a mensagem de Deus ao mundo.
Os hábeis esforços de fuga de Jonas representam a Igreja preguiçosa e infiel, que não dá atenção ao mandamento de seu Senhor. Deus tem de lutar contra o etnocentrismo bitolado de Israel, que restringe sua atividade às fronteiras da nação, e contra a recusa eclesiocêntrica da Igreja em sair pelo mundo a proclamar a mensagem de Deus e realizar sua obra. O escritor está decidido a convencer seus leitores de que o alcance da atividade libertadora de Deus é grande o bastante para atingir tanto Israel quanto os gentios.
É um milagre que Jonas, com sua dura advertência contra o etnocentrismo, tenha conseguido entrar para o cânon das Escrituras. Sem rodeios, ele mostra a tentativa humana de sabotar os planos divinos para o mundo de modo que seus leitores (Israel, a Igreja do Novo Testamento e nós) possam ouvir o que o Espírito Santo está tentando lhes dizer por meio desse pequeno livro.
Resumo das oito cenas do livro
A primeira cena se inicia com Jonas recebendo a ordem de ir a Nínive. Enquanto o Antigo Testamento geralmente conclama as outras nações a virem a Sião, o monte de Deus, Jonas, à semelhança dos discípulos do Novo Testamento (v. Mt 28.18-20), recebe a ordem de ir. Na tradução da Septuaginta, o livro de Jonas usa a palavra “porettomai” em 1.2,3 e de novo em 3.2,3, a mesma usada por Jesus na Grande Comissão, registrada em Mateus 28. Para onde Jonas deverá ir? Dentre todos os lugares, justamente para Nínive — o centro do totalitarismo, da brutalidade e das atitudes belicosas. Nínive, conhecida pela perseguição vergonhosa, tortura selvagem e orgulho imperialista com que tratava os que se opunham à sua política. Deus quer que servo advirta Nínive acerca de um juízo iminente e que a conclame ao arrependimento. Deus quer salvar Nínive!
No entanto, Jonas recusa-se a obedecer. É verdade que ele se prepara para viajar, mas apenas para fugir da face de Deus, que é Senhor sobre todos.
Na “segunda cena”, Deus reage à fuga de Jonas enviando uma fortíssima tempestade (1.4-16). O vento obedece às ordens de Yahweh, mas o desobediente Jonas dorme no porão do navio, esquecido do fato de que é o alvo da tempestade. Às vezes, a Igreja também dorme enquanto a tempestade do juízo de Deus atinge o mundo, imaginando que o vento lá fora não lhe diz respeito. Enquanto a tripulação tenta, sem êxito, descobrir a causa da tempestade, Jonas confessa que adora e teme ao Deus que fez o mar e a terra seca, ao único Deus que está acima de todas as nações. Ele confessa que esse Deus tem uma acusação contra ele e que a única maneira de acalmar as ondas é lançá-lo ao mar. Nessa cena a tripulação representa os gentios, um povo cena, quem Jonas não dá a menor importância, mas que, ainda assim, está interessado em poupar a vida do profeta. Depois de Jonas lhes dar a ordem pela segunda vez, eles o lançam ao mar, e a tempestade cessa. Quase sem conseguir crer no que estão vendo, os marinheiros se derramam em louvor ao Deus de Jonas. A obediência deles ultrapassa à do sabotador Jonas. Estão mais acessíveis a Deus que o próprio profeta.
A “terceira cena” (1.17) mostra um grande peixe que, sob as ordens de Yahweh, abre a boca para engolir Jonas e vomitá-lo na praia, no devido tempo. Jonas simplesmente não consegue evadir-se ao mandato missionário de Deus, Deus que levantou os ventos terríveis e conduziu os marinheiros na realização do propósito missionário agora dirige um peixe como parte de seu plano para salvar Nínive. Yahweh continua sua obra de reformar e preparar seu missionário para que este seja um instrumento adequado aos planos divinos.
Na “quarta cena” (2.1-10), Jonas implora a Deus que o tire do ventre do peixe. Ele, que não tivera o mínimo de misericórdia para com os gentios e se recusara a admitir que as promessas de Deus também diziam respeito a eles, agora suplica pela misericórdia divina e, citando frases de vários salmos, almeja as promessas cobradas pelos adoradores no templo de Deus. Yahweh responde. Fala ao enorme animal, e Jonas vai parar numa praia, são e salvo. Pelo próprio resgate Jonas se tornou, sem qualquer intenção, uma testemunha da misericórdia salvadora de Deus. Embora coberto de algas, ainda assim era um testemunho de que Deus não tem prazer na morte de pecadores e sabotadores, mas se regozija com a conversão deles.
Na “quinta cena” (3.1-4), Deus repete a ordem dada ao homem cuja vida é um testemunho vivo do que confessara no ventre do peixe: "Ao Senhor pertence a salvação!". A Septuaginta emprega a palavra kerygma em 3.1ss. Essa palavra sozinha resume a missão de Jonas: ele deve proclamar que Nínive, por mais ímpia que seja, ainda é objeto da preocupação de Deus e, a menos que se arrependa, será destruída. Sua mensagem tem de ser uma tanto de ameaça quanto de promessa, tanto de juízo quanto de boas novas.
Na “sexta cena” (3.5-10), Nínive atende ao apelo de Jonas para se arrepender. O rei tirano e orgulhoso desce do trono, troca o manto real por pó e cinza e ordena a todos os cidadãos e animais que sigam seu exemplo. O que Israel sempre se recusara a fazer os pagãos gentios fizeram! O cruel rei de Nínive é um antítipo dos reis desobedientes de Judá.
O povo une-se ao rei no ato de arrependimento. Cessa a obra demoníaca, e os mecanismos aterrorizantes e coercivos da injustiça política são reprimidos. Em profunda penitência, abandonam os ídolos para servir ao Deus que é Senhor de cada nação e de toda a criação. Tudo isso é possível porque Yahweh é Deus. O mundo pagão é um campo missionário potencialmente produtivo por uma única razão: só o Senhor é Deus.
As cortinas se fecham nessa cena com estas palavras surpreendentes: "Viu Deus o que fizeram, como se converteram do seu mau caminho; e Deus se arrependeu do mal que tinha dito lhes faria e não o fez". Yahweh é fiel às suas promessas. Ainda hoje sua vontade para com Moscou, Pequim, Londres e Amsterdã não é menos "graciosa e cheia de misericórdia" do que foi para com Nínive. Tomando emprestada a frase de Lutero, o qual muito apreciava pregar sobre o livro de Jonas, a mão esquerda da ira de Deus foi substituída pela mão direita da bênção e da liberdade.
A “sétima cena” (4.1-4) relembra o fato de que o maior obstáculo a ser transposto no cumprimento do mandato missionário não foram os marinheiros, nem o peixe, nem o rei e os cidadãos de Nínive, mas o próprio Jonas — a Igreja recalcitrante e de visão estreita. O capítulo 4 fala de Jonas, o qual, havia algum tempo, deixara a cidade para procurar abrigo a leste de suas fronteiras. O período de 40 dias para arrependimento já passou, mas como Deus mudou de ideia a respeito de destrui-la, a cidade continua a ser alimentada pela graça e pela misericórdia de Yahweh. Jonas está furioso pelo fato de Deus haver estendido sua misericórdia para além dos limites de Israel, alcançando os gentios. Ele queria que Deus se enquadrasse em seu conceito pessoal de Deus: um deus da natureza frio, duro e cruel, com uma atitude inflexível contra os pagãos. Ele não suporta a ideia da participação dos gentios na história da salvação.
Esse é o pecado de Jonas, o pecado de um missionário cujo coração não está na missão. Ele, que uma vez implorara a Deus misericórdia ao ver-se abandonado no ventre do peixe, agoraestá irado porque Deus demonstrou misericórdia para com as nações. Ele dá vazão à sua fúria na forma de oração, que se encontra em 4.2 e é o texto-chave do livro: "Ah! Senhor! Não foi isso o que eu disse, estando ainda na minha terra? Por isso, me adiantei, fugindo para Társis, pois sabia que és Deus clemente, e misericordioso, e tardio em irar-se, e grande em benignidade, e que te arrependes do mal". Parte dessa oração tem sua origem numa antiga liturgia de Israel, que cada israelita conhecia de cor e poderia até repetir durante o culto no templo ou na sinagoga mesmo que estivesse cochilando (v. Êx 34.6; S186.15; 103.8; 145.8; Ne 9.17). Jonas, porém, não consegue imaginar que essa liturgia seja verdadeira não apenas para Jerusalém, onde estava localizado o templo de Deus, mas também para outros lugares — Nínive, São Paulo, Nairóbi, Nova York e Paris.
Por que Jonas está tão irado? Pela única razão de Deus tratar pessoas que estão fora do círculo de sua aliança da mesma maneira em que trata os de dentro. Na verdade, a ira de Jonas o está afastando da aliança, pois ele obstinadamente se recusa a reconhecer o propósito do pacto, que é levar a salvação aos pagãos. Não aprendeu ainda que Israel não pode ter a presunção de desfrutar favores especiais de Deus. Tanto Israel quanto os gentios vivem pela graça que o Criador concede a todas as suas criaturas. Assim, Deus se aproxima de seu profeta não mais como participante da aliança, mas na qualidade de Criador, e pergunta à sua criatura: "É razoável essa tua ira?".
Na “oitava e última cena” (4.5-11) pode-se notar que Deus ainda se esforça em ensinar as lições ao seu missionário cabeça-dura. Ele não entendeu as lições da tempestade, dos marinheiros, do peixe e da conversão de Nínive A base bíblica do mandato missionário mundial porque não quis, e agora Yahweh faz outra tentativa - a árvore miraculosa. Uma trepadeira cresce rapidamente, oferece a Jonas proteção contra o sol forte, mas também logo seca e morre, vitima do ataque de um verme. Jonas fica irritadíssimo.
A essa altura, Deus tenta mais uma vez ensinar seu aluno-missionário, usando a planta como lição objetiva. O próprio Deus, que dirige todo o curso da História, que governa O vento e as ondas do mar e que levou Os milhões de ninivitas ao arrependimento, agora pergunta com ternura: 
É razoável essa tua ira por causa da planta?
Ele respondeu: E razoável a minha ira até à morte. Tornou o Senhor: Tens compaixão da planta que te não custou trabalho, a qual não fizeste crescer, que numa noite nasceu e numa noite pereceu; e não hei de eu ter compaixão da grande cidade de Nínive, em que há mais de cento e vinte mil pessoas, que não sabem discernir entre a mão direita e a mão esquerda, e também muitos animais?
Deus poupa e resgata. O Deus de Jerusalém também é o Deus de Nínive. Ao contrário de
Jonas, Ele não tem qualquer "complexo de gentios" e, embora nunca nos constranja, pede-nos que ponhamos nosso coração e nossa alma no trabalho da missão. Deus ainda tem interesse em transformar os Jonas obstinados, indignados, deprimidos e profundamente irritáveis em arautos das boas novas que libertam.
O livro termina com uma pergunta implícita, que jamais foi respondida: Deus alcançou seu objetivo com Nínive, mas o que dizer de Jonas? Ninguém sabe. A pergunta acerca de Israel e da igreja e de sua obediência ainda está em aberto. É O tipo de pergunta que cada geração de cristãos tem de responder por si mesma. Jacques Ellui encerra O livro que escreveu sobre assunto com as seguintes palavras:
O Livro de Jonas não tem conclusão alguma, e a pergunta última do livro não tem resposta, exceto por parte daquele que percebe a grandeza da misericórdia de Deus e que, de modo factual, e não apenas mítico, trabalha pela salvação do mundo.[footnoteRef:1] [1: The Judgment of Jonah (Grand Rapids: Eerdmans, 1971), p.103.] 
A igreja do Novo Testamento deve dedicar cuidadosa atenção à mensagem do livro de Jonas. Jesus Cristo é aquele que "é maior do que Jonas" (Mt 12.39-41; Lc 11.29-32). Sua morte na cruz, com aquele horrível grito de ter sido abandonado por Deus, e sua ressurreição, com a jubilosa exclamação de vitória, são sinais de Jonas para nós, apontando para o profundo significado da vida de Cristo e confirmando que Deus amou o mundo "de tal maneira".
Se alguém recebe uma transfusão vital de sangue daquele que é maior que Jonas e assim mesmo se recusa a espalhar as boas novas, ele está, na verdade, sabotando os objetivos do próprio Deus. Jonas é o pai de todos os cristãos que desejam os benefícios e as bênçãos da eleição, mas se recusam a aceitar sua responsabilidade.
Thomas Carlisle termina seu poema "Tu, Jonas com os seguintes versos:
“E Jonas se aproximou em silêncio de seu banco ensombreado e esperou de Deus passar a ter seu jeito de pensar. E Deus ainda espera dos incontáveis Jonas em suas casas confortáveis passarem a ter seu jeito de amar”.
O período interbíblico
Uma pesquisa acerca do período da Diáspora judaica revelou evidências de um esforço judaico de fazer prosélitos, o que, de sua parte, marcou definitiva e caracteristicamente o trabalho missionário Posterior realizado por gentios bem como por judeus cristãos. A Septuaginta (Tradução Grega do antigo Testamento) espalhou-se por todo o mundo civilizado e era explicada nas sinagogas. O impacto missionário do judaísmo da época da Diáspora foi bem maior do que muitos pensam. Mais que isso, o judaísmo influenciou o cristianismo primitivo, pois os cristãos judeus mantinham íntimo relacionamento com as comunidades ligadas às sinagogas. A sinagoga desempenhou um papel essencial, pois atraía não apenas os prosélitos (gentios que adotaram o conjunto de crenças e práticas judaicas, até mesmo a circuncisão), mas também um grupo classificado como "os que temem a Deus" (gentios que aceitavam a maior parte da ética e parte da prática religiosa do judaísmo, mas rejeitavam a circuncisão).
Todavia, apesar dos pontos em comum, a mensagem judaica era totalmente diferente do evangelho do Novo Testamento, o qual pregava o Reino de Deus e a crença cristã de que Jesus era o Messias. O judaísmo da Palestina exigia que os pagãos fossem assimilados à comunhão judaica e empreendiam todos os esforços para alcançar essa mudança. Já as comunidades judaicas fora da Palestina enfatizavam o monoteísmo, crença que o mundo pagão, cansado de adorar tantos deuses, achava bem atraente. Eles espiritualizavam a prática religiosa e censuravam o estilo de vida decadente do mundo gentílico. Sua mensagem era em grande parte autossotérica, isto é, a pessoa podia salvar a si mesma. Tanto os oráculos sibilinos quanto o livro de José e Asenate garantem que a pessoa que cumprir de maneira correta as exigências éticas e rituais poderá reconciliar-se com Deus.
Jesus por certo dirigia as incisivas palavras de Mateus 23.15 contra esses elementos específicos da mensagem judaica quando lamentou: "Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque rodeais o mar e a terra para fazer um prosélito; e, uma vez feito, o tomais filho do inferno duas vezes mais do que vós!". Paulo acompanha Jesus ao reprovar, em Romanos 2.17-24, o legalismo judaico e os esforços de autojustificação.
Jesus e Paulo não eram contrários às missões judaicas aos gentios em si. Na verdade, Paulo entende seu trabalho entre os gentios como a continuação do que os judeus da Diáspora haviam começado a fazer. Contudo, ele e Jesus faziam objeções à pregação dos judeus, de modo que quando Jesus começou a proclamar sua mensagem ele não recorreu às tradições judaicas recentes em busca de apoio, mas ao próprio Antigo Testamento.
O Novo Testamento, livro mundial de missões
Do início ao fim, o Novo Testamento é um livro de missões. Deve sua existência ao trabalho missionário das igrejas cristãs primitivas judaicas e gregas. Os evangelhos são, por assim dizer, "gravações ao vivo" da pregação missionária, e as epístolas não são tanto apologética missionária quanto são instrumentos autênticos e reais do trabalho missionário. Não temos condições de analisarcada detalhe que salienta a importância do Novo Testamento para a fundamentação e a prática missionária, entretanto, podemos examinar alguns deles.
Jesus, o Salvador do mundo
Os inúmeros temas do Antigo Testamento convergem para a pessoa e a obra de Jesus de Nazaré. Os cidadãos samaritanos — meio judeus e meio gentios — da cidade de Sicar foram os primeiros a mencionar essa verdade ao afirmar, em João 4.42: "Sabemos que este é verdadeiramente o Salvador do mundo".
A chegada do Reino abrangente de Deus
No início de seu ministério, Jesus dirigiu-se à sua cidade, Nazaré, e foi à sinagoga para adorar, no sábado. Os líderes então concederam-lhe a honra de ler as Escrituras. Ao concluir a leitura da mensagem do profeta Isaías, capítulo 61, depois de devolver o rolo do profeta, acrescentou um comentário que traz uma esperança de valor incalculável para muitas pessoas, mas que também ofende profundamente os que o rejeitam. Ele disse: "Hoje, se cumpriu a Escritura que acabais de ouvir" (Lc 4.21).
A salvação, que estava por vir e da qual os profetas deram testemunho, revela-se verdadeira na pessoa da Jesus Cristo. A salvação já chegou, e, portanto, as boas novas anunciadas por Jesus descrevem um Reino que ao mesmo tempo já chegou e ainda está vindo. Aplicando as palavras de Isaías 61 a si mesmo, Jesus acrescenta que o Espírito do Senhor está sobre ele. Jesus marca o início do Reino de Deus e anuncia o "ano aceitável do Senhor" com toda a sua rica diversidade. A primeira manifestação do Reino foi provisória e ainda aguarda a consumação, mas quando Jesus fez a surpreendente afirmativa —"O Espírito do Senhor [...] me ungiu para evangelizar os pobres; enviou-me para proclamar libertação aos cativos e restauração da vista aos cegos, para pôr em liberdade os oprimidos, e apregoar o ano aceitável do Senhor" — o Reino de fato chegou, e também a hora da decisão. Por intermédio de Jesus Cristo, Deus demonstrou aos homens sua obra graciosa e salvífica como nunca antes, de maneira direta e urgente. O contorno das coisas vindouras, isto é, o Reino, tornou-se excepcionalmente nítido na pessoa, nas palavras e na obra do Messias. Com poder, ele subjugou aquelas forças sinistras que destruíam a alma e o corpo dos homens e renovou os que eram vítimas e escravos de tais forças. Ele chamou o povo ao arrependimento.
Todo o Novo Testamento usa a linguagem da consumação. A obra graciosa e salvadora de Deus já se tornou visível a todo o mundo (v. Tt 2.11; Ef 1.10; G14.4,5; Hb 1.1-4). Contudo, também afirma que a manifestação final desse Reino ainda está por vir. Existe ainda uma atmosfera de expectativa no Novo Testamento.
Nos evangelhos, esses temas são recorrentes. Um pressupõe o outro. De acordo com os evangelhos, vivemos hoje entre o “já” do Reino que veio e o “ainda não” de sua manifestação final; entre a promessa de Lucas 4.21 —"Hoje, se cumpriu a Escritura que acabais de ouvir" — e a previsão de Mateus 24.14 — "Será pregado este evangelho do reino por todo o mundo, para testemunho a todas as nações. Então, virá o fim".
Como o Reino chegou
Os milagres e parábolas de Jesus esclarecem de maneira especial a forma em que o Reino foi revelado neste mundo. No evangelho de João, os milagres são chamados "sinais", que apontam para o Reino vindouro e para o caráter majestoso do Messias. Esses milagres suprem as necessidades humanas: pobreza, doença, fome, pecado, tentação demoníaca e ameaça de morte. Nesses milagres, Jesus antecipa a Páscoa. Cada um deles proclama que em qualquer lugar e a qualquer momento, onde quer que necessidades e problemas humanos sejam enfrentados e vencidos no nome de Deus, ali o Reino de Deus estará reluzindo. De modo semelhante, as parábolas de Jesus — por exemplo, as parábolas do semeador, da rede, do joio, do grão de mostarda e do fermento — ilustram como a mensagem do Reino alcançará as nações e os povos (v. Mt 13; Lc 8; Mc 4).
"Com base na própria pregação de Jesus pode-se afirmar que a obra apostólica da Igreja por todo o mundo é a exata razão do intervalo entre a ascensão de Jesus e seu retorno como Filho do Homem."[footnoteRef:2] [2: Relatório da Netherlands Missionary Council sobre as bases bíblicas para missões, De Heerban, n.4, ago.1951, p.197-221.] 
Jesus e os gentios
Nos encontros de Jesus com os gentios, vejo-o exercendo uma santa impaciência, ansiando pelo dia em que todas as barreiras serão removidas e a mensagem será comunicada aos gentios. Por um breve tempo, ele restringe sua mensagem às ovelhas perdidas da casa de Israel, sabendo que certas condições precisam ser satisfeitas antes que a mensagem seja anunciada aos gentios. Israel deve ouvir primeiro (Mt 10) e o sangue do Cordeiro deve ser derramado para trazer perdão a "muitos" (Mc 10.45; 14.24).
A Cruz e a resurreição – o fundamento da missão mundial
Na cruz, Jesus suportou vicariamente o juízo de Deus que era merecido por Israel e pelos gentios. De modo semelhante, sua ressurreição fez com que uma situação libertadora alcançasse toda a comunidade mundial de nações e povos. A cruz e a ressurreição de Jesus são a base para a missão de alcance mundial. Por essa razão, entremeadas pelos relatos de sua cruz e da ressurreição está a ordem de levar a mensagem a todos os povos. Essa missão só será cumprida quando tiver "entrado a plenitude dos gentios" e o Reino de Deus se tiver manifestado em sua plenitude.
O mandato missionário do Evangelho de Mateus
Os estudiosos do Novo Testamento afirmam que o evangelho de Mateus é composto de material catequético reunido e organizado principalmente para instruir recém-convertidos a respeito da obra, pessoa e Reino vindouro de Jesus, bem como ajudá-los na transmissão da mensagem a outros.
Em grande parte, Mateus utilizou-se do evangelho de Marcos como fonte de seus relatos acerca dos atos de Jesus, mas sua contribuição singular foi reunir uma série de nove discursos de Jesus. É dessa maneira que o evangelho de Mateus se torna um livro-texto de missões.
Os eruditos discordam acerca da data em que o livro foi escrito. Alguns defendem uma data próxima do ano 75. Outros preferem uma data um pouco posterior, entre 80 e 100. Se os últimos estiverem certos, devemos ter em mente que esse evangelho reflete um período da Igreja primitiva em que cristãos judeus e gentios estavam anunciando de igual para igual e de modo poderoso as boas novas. Pode-se então facilmente compreender que esse evangelho represente um chamado enérgico a comunicar a fé em Jesus, o Messias, tanto a Israel quanto às nações e povos não judaicos.
Comunicação do evangelho ao povo de Israel
Mateus 10 registra a ordem de Jesus aos discípulos de proclamar a mensagem a Israel. Observe 
que as surpreendentes palavras dos versículos 5 e 6 "Não tomeis rumo aos gentios, nem entreis em cidade de samaritanos; mas, de preferência, procurai as ovelhas perdidas da casa de Israel" fazem parte do mesmo livro que, no capítulo 28, registra a Grande Comissão, a ordem de ir a todos os povos. Mateus não faz qualquer tentativa de "reconciliar" as duas passagens. Em seu modo de entender, não era necessário, pois as duas se complementam e são igualmente válidas. Quando o evangelho de Mateus foi escrito, havia cristãos judeus vivendo na Palestina, os quais se opunham a qualquer missão aos gentios, pois acreditavam que certos fatos tinham de ocorrer primeiro. O autor-editor do evangelho, provavelmente um membro da comunidade cristã judaica da Síria, escreveu esse livro-texto com a forte convicção de que o chamado a proclamar a mensagem a Israel tinha de ser simultâneo com a missão aos povos não israelitas. O escritor acreditava que tal simultaneidade era uma consequência da ordem do Senhor Jesus. Ele entendia que o destaque dado a Israel no período anterior à ressurreição era questão de importância estratégica.
Um segmento da cristandade judaica defendia a missão aos judeus em oposição à missão aos gentios, crendo que a última só deveria ser assumida depois que outro acontecimento de importância escatológica houvesse ocorrido, a saber, o ajuntamento das "ovelhas"das doze tribos. Só então o caminho estaria aberto aos gentios.
Todavia, o escritor de Mateus 10 discorda. Para ele o acontecimento que abria o caminho aos gentios era a ressurreição de Jesus. Antes disso toda a atenção estava posta sobre Israel, mas a cruz e a ressurreição são a base para a missão mundial, bem como o sinal para a largada. As palavras de Jesus registradas em Mateus 10.23 — "Em verdade vos digo que não acabareis de percorrer as cidades de Israel, até que venha o Filho do Homem" são uma referência velada à sua ressurreição. Ferdinand Hahn faz uma bela exegese da relação entre os capítulos 10 e 28 de Mateus. Os dois textos são círculos concêntricos e sincronizam a missão cristã a judeus e não judeus. Se de um lado o Jesus terreno, ele mesmo, um mensageiro a Israel, conclamou a Igreja a um contato contínuo com o antigo povo de Deus, de outro lado o Senhor de todo o mundo, ressurreto e exaltado, expediu a ordem de ir a todos os povos. O que Mateus deseja afirmar à sua maneira é a prioridade da missão a Israel e a permanente obrigação para com tal missão, pois sem Israel no centro não haveria salvação. Essa missão, entretanto, só será desempenhada a contento se, ao mesmo tempo, a comissão universal for observada pelo trabalho entre as nações.[footnoteRef:3] [3: Mission in the New Testament (London:SCM Press, 1965), p. 127-8.] 
Os capítulos 10 e 28 do evangelho de Mateus não são, portanto, contraditórios. Pelo contrário, esclarecem o contexto histórico de logo após a ressurreição, quando os discípulos foram chamados a participar da missão. Entendidos em conjunto, estes dois textos nos lembram que as portas estão agora abertas a todos.
A Grande Comissão de Mateus 28
Existe uma ideia errada, bem difundida, e que não se consegue mudar, de que só Mateus contém o mandamento para a missão mundial. É certo, todavia, que os versículos finais do evangelho de Mateus expressam essa ordem de maneira a mais direta possível. A conclusão do evangelho de Mateus não apenas é convincente, em comparação com os outros evangelhos e o livro de Atos, como também os versículos finais criam um climax e apresentam um resumo de tudo que foi escrito previamente. São a chave para a compreensão de todo o livro.
Nesses versículos conclusivos, Jesus, o Senhor ressurreto, de pé sobre uma das montanhas da Galileía, talvez a mesma em que pregou o Sermão do Monte (Mt 5.1), apresenta aos discípulos uma mensagem de três pontos:
1) “A autoridade de Jesus”. Ele faz referência à própria autoridade com palavras que lembram Daniel 7.13,14, que ele mesmo havia pronunciado perante o Sinédrio e se encontram registradas em Mateus 26.64. Agora nenhumaregião, povo ou cultura se encontra fora do domínio de seu poder e autoridade. A ordem missionária que se segue está diretamente relacionada a essa afirmação sobre a coroação do Senhor ressucitado. Tendo ressuscitado, ele detém agora suprema autoridade sobre todo o mundo. Dessa forma, o mandamento missionário não é a base de sua entronização. Na verdade, é o oposto. O mandamento é consequência do fato de sua autoridade. Embora os inúmeros mandamentos missionários possam variar, todos proclamam em uníssono esta verdade singular: uma autoridade salvadora e libertadora emana dele, da vítima que se tornou vencedor. Ele é o Senhor crucificado que agora governa. Seu poder não é o de um déspota que só pensa em destruir. Ao contrário, ele usa seu poder para curar e libertar e alcança tais objetivos por meio do amor, da reconciliação e da paciência.
2) “O mandamento permanente de Jesus para realizar a missão”. Depois de sua entronização, o Senhor crucificado e ressurreto dá a ordem para a missão. O tempo transcorrido entre sua ressurreição e a segunda vinda não será um mero intervalo vazio, mas um período durante o qual o desincumbir-se desse mandamento faz parte do processo de entronização. Filipenses 2.5-11 contém um marcante paralelo com a verdade aqui expressa.
O que o Senhor entronizado ordenou aos seus discípulos? Ele disse: "Ide, portanto...". O autor escolheu o verbo grego “poreuthentes”, que significa "partir", "deixar", "cruzar fronteiras" fronteiras sociológicas, raciais, culturais e geográficas. Esse aspecto é mais importante para aquele que tem sobre si a tarefa de comunicar o evangelho. Afeta o trabalho feito na própria região, bem como em lugares longínquos. O missionário deve estar sempre pronto a cruzar fronteiras, estejam elas em seu ambiente ou em lugar distante. O verbo “poreuomai” neste texto lembra a Igreja cristã primitiva o Jesus peripatético que com seus discípulos estava sempre cruzando fronteiras a fim de alcançar alguém. Jesus também determina aos seus seguidores que façam "discípulos de todas as nações". Com base na palavra grega “machetes” o autor cria um verbo. A forma verbal dessa palavra ocorre quatro vezes no Novo Testamento (Mt 13.52; 27.57., At 14.21; e aqui em Mt 28.20). Tornar-se discípulo de Jesus implica partilhar com ele de sua morte e ressurreição e unir-se a ele na marcha rumo à revelação final de seu Reino. Ele nos ordena que façamos discípulos, quer dizer, que levemos pessoas a se submeterem à sua autoridade libertadora e a se apresentarem como voluntárias para a marcha, já em andamento, rumo a uma nova ordem das coisas, a saber, seu Reino.
3) “A promessa de Jesus”. Ao acrescentar as palavras finais da promessa "Eis que estou convosco todos os dias até à consumação do século", Jesus lembra seus discípulos de que estará presente no meio deles de uma maneira diferente. A promessa continua válida para todas as épocas. Observe, de passagem, a frequência com que a palavra “todo” ocorre nesse texto: "toda a autoridade", "todas as nações", "todas as coisas", "todos os dias".
Cristo promete estar com sua Igreja todos os dias em que ela existir. Enquanto se desincumbe de sua chamada missionária, a Igreja deve sempre se perguntar: "Que dia é hoje?", pois não há dois dias iguais na história da Igreja. No entanto, por mais que os dias e épocas possam mudar enquanto a Igreja realiza sua missão nos seis continentes, um fato nunca muda: Jesus Cristo insiste que sua igreja cumpra seu chamado missionário enquanto ele a conduz ao destino final. Esse movimento missionário que emana de Jesus não cessará até o fim do mundo. Dessa forma, embora os métodos de realização da missão devam ser mudados continuamente, a tarefa em si permanece inalterada.
Perguntas para estudo
1. Por que Verkuyl discorda de vários autores que afirmam que o Antigo Testamento não faz absolutamente qualquer referência a um mandamento missionário?
2.Jonas é uma lição sobre a necessidade de uma conversão radical de tendências naturais e de uma reestruturação completa da própria vida para torná-la útil à missão. Quais eram as tendências naturais de Jonas, e qual reestruturação tinha de ocorrer em sua vida? Como essa mesma necessidade era tipificada na nação de Israel?
3. Como Verkuyl concilia a "disparidade" entre Mateus 10 e 28?

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