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CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES Aula 2 – Ciência Política para MPOG Parte I (tópico 4). Modelos de distribuição do poder: pluralismo, elitismo, socialismo. Parte II (tópico 5). Teorias da democracia: poliarquia, democracia consociativa e majoritária. INTRODUÇÃO Nas próximas páginas, tentamos de forma objetiva e simplificada apontar as principais características do pluralismo, elitismo, socialismo e de alguns dos modelos de democracia. É preciso ressaltar, entretanto, a dificuldade em separar completamente modelos de distribuição de poder e modelos de democracia. Os três modelos de democracia apresentados não são os únicos existentes na teoria política contemporânea e sabemos que em alguns modelos pode prevalecer uma perspectiva mais ligada ao elitismo, enquanto em outras ficam mais evidentes aspectos do pluralismo ou alternativas mais ligadas ao socialismo. Dessa forma, ao longo do texto, na medida em que são apresentados os modelos de distribuição do poder, podem aparecer algumas considerações sobre os modelos de democracia subjacentes a eles, por exemplo, dentro do pluralismo estão contidas as noções de democracia concorrencial de Schumpeter e a poliarquia de Dahl, dentro do socialismo temos a idéia da social-democracia, entre outros. É preciso entender que as formas assumidas pela distribuição do poder afetam as formas de pensar a democracia e as possibilidades de ação social subjacentes a ela. www.pontodosconcursos.com.br 1 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES Parte I – Modelos de Distribuição do Poder Como foi visto na primeira aula, a política é a esfera do conflito e da luta por poder. As formas assumidas pelo poder, sua distribuição, sua transformação, as resistências ao poder, as instituições políticas e as formas de dominação advindas do poder são a matéria, por excelência, da ciência política. E nesse sentido, vários autores pensaram formas diferentes de ver a sociedade e suas relações com o poder seja ele político, econômico, ideológico ou cultural. Os principais eixos explicativos das formas com que o poder pode ser distribuído entre os membros da sociedade são o elitismo, pluralismo e o socialismo. Esquematicamente: ¾ Poder distribuído apenas entre uma minoria: elitismo ¾ Poder distribuído entre vários grupos: pluralismo ¾ Poder distribuído entre todos os membros de uma coletividade: socialismo ELITISMO OU TEORIA DAS ELITES O elitismo ou a teoria das elites é uma corrente de pensamento surgida em fins do séc. XIX e início do século XX que tinha como pressuposto básico a idéia de que em toda sociedade existe, sempre e apenas, uma minoria que é detentora do poder, em contraposição a uma maioria que dele está privada. A teoria das elites fez grande sucesso entre os teóricos do século XX por vários motivos, entre eles: pretensão de ser uma teoria científica e enunciar uma lei geral em um período de valorização crescente do cientificismo, empirismo e positivismo. Além de seu teor antidemocrático e anti-socialista, relacionado com o „grande medo‟ sentido pelas classes dirigentes devido ao acirramento www.pontodosconcursos.com.br 2 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES dos conflitos sociais na primeira metade do século XX com o surgimento do movimento operário enquanto ator político relevante. Os teóricos elitistas podem ser definidos em linhas gerais por alguns pressupostos compartilhados que são os pilares da teoria das elites, como: Â Crença de que em toda sociedade organizada, as relações entre indivíduos ou grupos são relações de desigualdade; Â A causa da desigualdade está na distribuição desigual do poder, ou seja, o poder fica concentrado nas mãos de poucos; Â Entre as várias formas de poder, a mais determinante é o poder político; Â Aqueles que detêm o poder são sempre uma minoria; Â Uma das causas para que uma minoria consiga dominar uma maioria, é o fato de que os membros da minoria são poucos e possuem interesses comuns e por isso possuem ligações entre si e são solidários na manutenção do jogo que permite o exercício alternado do poder; Â Um regime se diferencia do outro com base na forma diferente com que as elites surgem, desenvolvem-se e decaem, se organizam e exercem o poder; Â A massa é o elemento oposto à elite, é a não-elite constituída pelo conjunto de pessoas que não tem poder ou seu poder não é politicamente relevante e não são organizadas ou são organizadas pela minoria o que as define como massa de manobra. Além desses pressupostos, a teoria elitista pode ser analisada também sob a influência do darwinismo social a partir da perspectiva defendida por seus autores de que a seleção dos melhores se daria através da luta entre elites em contraposição ao democratismo igualitário que defendia que todas as pessoas possuíam capacidades iguais para participar de decisões políticas. O elitismo pode ser ainda entendido com base na noção específica da história como repetição monótona e previsível de conflitos onde não contam os ideais e sim a força e astúcia e que as revoluções não eram mais do que a substituição de uma elite por outra. A massa apareceria assim apenas como uma „multidão de bárbaros‟ ou como massa de manobra para a nova elite em ascensão. www.pontodosconcursos.com.br 3 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES Nesse sentido, a teoria das elites se baseia em uma concepção desigual da sociedade sob uma perspectiva estática ou cíclica da história, ou seja, é natural que existam elites, logo é também inevitável, o que implica em uma noção pessimista da „natureza‟ humana em que todos os indivíduos, independente do momento histórico e de suas condições de vida, são, essencialmente, egoístas e individualistas. As críticas, normalmente, feitas à teoria elitista podem ser enumeradas dessa forma: Â Crença na impossibilidade de que o poder fosse exercido por uma maioria (democracia radical); Â Crença na impossibilidade de que uma melhor distribuição dos meios de produção implicaria na distribuição do poder para uma maioria (marxismo). Â Defesa da tese de que os regimes políticos se diferenciam uns dos outros apenas pela presença ou não de minorias em disputa entre si. Â Crença na existência de uma natureza humana má, egoísta e individualista que impossibilitaria qualquer tipo de ação coletiva ou qualquer comportamento que não gerasse ganhos individuais explícitos. MOSCA E A TEORIA DA CLASSE DIRIGENTE De acordo com Mosca (1966), em sua maioria, os organismos políticos são formados de duas classes de pessoas: a classe dirigente e a classe dirigida. A classe dirigente possui um menor número de pessoas, mas exerce todas as funções políticas, monopoliza o poder e suas vantagens; enquanto a classe dirigida é bastante numerosa e é controlada pela classe dirigente, que aparentemente a supre materialmente. Dessa forma, a direção dos interesses públicos está nas mãos de uma minoria de pessoas influentes, à qual a maioria se submete voluntária ou involuntariamente. Além disso, para o autor, em todo organismo político há um chefe entre os líderes da classe dirigente e que ocupa a posição de frente do Estado, porém essa pessoa nem sempre exerce o poder supremo. Esse indivíduo não www.pontodosconcursos.com.br 4 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES pode governar também sem o apoio de uma classe que imponharespeito às suas ordens e que faça com essas ordens sejam executadas. Segundo Mosca (1966) em uma sociedade real é inevitável que exista o domínio de uma minoria organizada sobre uma maioria desorganizada. E aqueles que compõem a minoria organizada se destacam da massa de governados por qualidades que lhes imputam certa superioridade material, intelectual e moral. Outras vezes esses membros herdam tais qualidades. Isso significa dizer quer a minoria dirigente sempre possui um atributo, mesmo que não seja real, que é valorizado e é capaz de exercer influência na sociedade. Por exemplo, em algumas sociedades o valor militar é o atributo que mais dá acesso à classe dirigente, já em outras a guerra é uma condição excepcional. No entanto, Mosca (1966) aponta que pode haver uma transformação social a partir do momento que a riqueza, e não mais o valor militar, passa a ser a principal característica da classe dominante, isto é, os ricos passam a controlar a política e não mais os bravos ou os guerreiros. Uma das condições para que isso ocorra é que a organização social atinja uma condição em que a proteção oferecida pela autoridade pública seja mais eficaz que a proteção oferecida por forças particulares. Isto é, a propriedade privada deve estar tão bem protegida pela eficácia da lei a ponto de tornar supérfluo o poder do proprietário. E foi o que ocorreu na transformação do Estado feudal pra o Estado burocrático. É também significativa a influência de uma aristocracia clerical em sociedades com crenças religiosas fortes em termos de riqueza e poder político. Os clérigos também possuem uma tendência a monopolizar o saber científico e jurídico, por isso o conhecimento especializado e a cultura científica livre dos preceitos religiosos só se tornaram instrumento de força política em um estágio posterior da civilização, e somente poderiam entrar na classe dominante quem dominasse tal conhecimento. Mosca (1966) alerta também para o fato de existirem países com castas hereditárias, ou seja, a classe dirigente se restringe a um certo número de famílias, e o nascimento é o único meio de entrada na classe. Além disso, para o autor, todas as classes dirigentes tendem a se tornar hereditárias de fato, se www.pontodosconcursos.com.br 5 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES não por lei. A riqueza e o valor militar são mantidos com facilidade nas famílias por tradição moral ou por herança. Mosca (1966) não acredita na diferenciação em classes sociais por critérios etnológicos. Para ele, ramos da mesma família muitas vezes pertencem a classes sociais radicalmente diferentes. Se a classe dirigente realmente pertencesse a uma raça diferente ou se suas qualidades fossem transmitidas primordialmente por hereditariedade orgânica, seria difícil ver como a classe poderia declinar ou perder o poder. O que vemos é que logo há uma mudança no equilíbrio das forças políticas, isto é, quando se sente necessidade de novas capacidades, diferentes das antigas, então a maneira pela qual a classe dirigente é constituída muda também. PARETO E A TEORIA DA CIRCULAÇÃO DAS ELITES Sob a perspectiva de Pareto (1966) a sociedade humana é heterogênea e se diferencia física, moral e intelectualmente. Contudo, as classes sociais não se distinguem radicalmente e em muitos países é mais rápida a circulação de classes do que em outros. Nesse sentido, o autor aponta que aqueles indivíduos que possuem os mais altos índices em seus ramos de atividade fazem parte da classe de elite, que compreende pessoas com alto grau de inteligência, perícia, capacidade, etc. Tal elite se divide em duas: a elite governante, que é formada por pessoas que direta ou indiretamente participam do governo; e a elite não-governante, que compreende os demais. Dessa forma, a população está divida entre: o estrato inferior que é a não-elite; e o estrato superior que é a elite e que se subdivide em elite governante e elite não-governante. Entretanto, Pareto (1966) ressalta que as maneiras como os vários grupos se relacionam deve ser considerada, dado que ao se locomover de um grupo para o outro, o indivíduo está imbuído de inclinações, sentimentos e atitudes adquiridas em seu grupo anterior. No estrato superior, na elite, está um grupo de pessoas, nem sempre bem definido, que compõe a aristocracia. Nela existem tanto pessoas que possuem as qualidades para pertencerem a esse grupo, assim como aqueles www.pontodosconcursos.com.br 6 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES que não possuem. Essas pessoas podem ocupar lugares mais ou menos importantes na elite governante ou podem ser barrados nela. Na circulação de classes, a classe dominante, de acordo com Pareto (1966), se renova em número e qualidade por famílias saídas de classes inferiores que trazem consigo o vigor e proporção de resíduos necessários para se manterem no poder. Além disso, o que abala o equilíbrio é a concentração de elementos superiores nas classes inferiores e de elementos inferiores nas classes superiores. Em função da circulação nas classes, a elite governante está em constante transformação. Pareto destaca ainda que a força é usada por aqueles que querem preservar algumas uniformidades e também por aqueles que querem passá-las para trás. A classe dominante recorre à fraude, à “diplomacia” e à corrupção para tentar prevenir ou resistir à violência, ou seja, as autoridades governamentais passam dos leões(dotados de força) às raposas (dotados de astúcia), nos termos de Pareto. A classe dominante só se rende aparentemente e no longo prazo esse tipo de atitude consegue exercer influência na seleção da classe dirigente, que passa a ser recrutada entre as raposas, dispensando os leões. Todavia, quando a classe dominada possui um número de pessoas que estão dispostas a utilizar a força e possui líderes capazes de guiá-los, a classe governante corre o risco de ser derrubada e outra classe tomar o seu lugar. Contudo, Pareto (1966) afirma que a classe governante se torna mais difícil de ser deposta quando é capaz de usar bem o artifício da trapaça, da fraude e da corrupção. Nesse sentido, a classe dominante busca cooptar apenas um pequeno número de novas pessoas, com o objetivo de que a classe dominada fique privada de liderança. Como decorrência disso, Pareto distingue entre o instinto de persistência de agregados e instinto de combinação, mais encontrado na classe dirigente, que refere-se ao uso da política, da fraude, da “diplomacia” e da corrupção e não do uso da força da energia das massas. A “LEI DE FERRO DA OLIGARQUIA” DE MICHELS www.pontodosconcursos.com.br 7 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES A grande preocupação da obra de Michels foi entender porque os partidos socialistas tornavam-se elitizados e esqueciam suas antigas bandeiras de mudança social à medida que iam se tornando partidos maiores e com mais força eleitoral. As conclusões de seu trabalho o classificam como um dos autores elitistas, embora ele se diferencie dos demais em diversos aspectos como, por exemplo, em sua noção de história como mais do que uma sucessão de minorias. Michels (1982) inicia sua argumentação constatando a existência de um grupo de teóricos (os teóricos elitistas) que refuta a possibilidade da democracia ser realizável na sociedade. Para ele, aqueles que não acreditam no poder da democracia defendem a teoria de que as lutas entre aristocratas e democratas é a mesma luta entre uma minoria que quer dar continuidade a sua liderança e uma outra minoria ambiciosa quealmeja a conquista do poder, seja ele se aliando à elite já existente, seja substituindo-a. Isso significa dizer que essas lutas não passavam de uma simples sucessão de minorias no poder. Segundo Michels (1982), a democracia é ávida pelo poder e resolve suas questões mais importantes por meios autoritários, retirando a liberdade das pessoas. Para reforçar suas conclusões, ele cita Pareto, que afirmou que o próprio socialismo era uma forma de criação de uma nova elite advinda de dentro da própria classe operária. Pareto via a coragem com que os líderes do socialismo encaravam as perseguições, como o primeiro critério para fazer parte de uma nova classe política. Saint-Simon, citado por Michels (1982), apesar de prever um conceito de classe que fosse livre dos referenciais econômicos, não imaginava uma sociedade sem classes. Os seguidores de Simon postulavam uma sociedade hierarquizada pelos privilégios adquiridos, ou seja, os mais inteligentes, mais fortes e amorosos é que poderiam governar. De acordo com Michels (1982), os próprios socialistas negavam a possibilidade de se ter um governo democrático no presente, muito embora acreditassem nessa possibilidade para o futuro. E a República, que representaria a forma mais elevada de governo burguês, justificava seus atos autoritários sob o pretexto de estar atendendo ao interesse geral. Para ele, a revolução política é apenas o “deslocamento da autoridade”. www.pontodosconcursos.com.br 8 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES Além disso, ele considera que a doutrina marxista é a única doutrina científica que tem uma reposta contundente para a necessidade de uma “classe política”. A doutrina marxista justapõe o Estado e a classe dominante, ou seja, o Estado é formado para defender os interesses dessa classe. Ela acredita ainda na construção de uma nova ordem social, uma vez que crê no poder revolucionário das massas, socialização dos meios de produção e proclama o fim do Estado. Contudo, para Michels (1982), o fim do Estado significaria apenas o fim da classe dominante. Nesse sentido, o autor afirma que mesmo essa nova sociedade coletiva e sem classes, precisará de representantes eleitos e só com uma burocracia ampla é que a riqueza social será administrada de forma convincente. Dessa forma e diante dos argumentos apresentados, Michels (1982) acredita que é impossível pensar um Estado sem classes. Marx reconhece que na transição da sociedade capitalista para a comunista, haveria um período econômico em que o Estado não seria outra coisa senão a “ditadura revolucionária do proletariado”. E para Michels (1982) a ditadura de uma pessoa não difere em essência da ditadura de um grupo de oligarcas. Para o autor, a limitação do socialismo não reside apenas na questão de ser possível ou não realizar uma distribuição eqüitativa da riqueza, implica também em um problema de administração. Dessa forma, o socialismo estaria fadado ao fracasso justamente porque não percebeu a importância da liberdade para qualquer organização social. Em conformidade com Michels (1982), em teoria, um partido está formado sob o seu programa, e as pessoas aderem a ele independentemente de seus interesses particulares coincidirem com os do programa do partido. No entanto, na prática o que se verifica é que apenas a concordância com o programa não impede que o conflito de interesses entre capital e trabalho se evidencie. Essa disputa econômica consegue abafar o programa e o partido socialista se depara, dentro dele próprio, uma luta de classes. Além disso, o autor alerta para o fato de que o partido socialista poder possuir membros que estão em oposição ao programa operário, e ainda, à medida que o partido crescesse, poderia haver uma oposição entre a massa dos partidários e o grupo dos chefes. www.pontodosconcursos.com.br 9 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES A argumentação de Michels (1982) parte da idéia de que a organização e burocratização advindas do crescimento do partido implicam, necessariamente, na oligarquização de sua estrutura e no distanciamento entre a „cúpula‟ do partido e suas bases1. Dessa forma, à medida que os partidos crescem e se organizam segundo os padrões de luta partidária tornam-se mais „moderados‟ em suas reivindicações e na representação de demandas específicas de modo a não se tornarem, eles mesmos, elementos considerados „anti-sistema‟ ou „marginais‟, nos termos empregados por Offe (1984)2. A ampliação dos princípios defendidos pela legenda partidária possibilita que mais membros e, conseqüentemente, mais votos, sejam angariados e incorporados às fileiras do partido, resultando em seu crescimento como força de apoio ou oposição nos pleitos eleitorais. Nesse sentido, Michels conclui que a história ensina que nenhum movimento popular foi suficientemente eficaz e capaz de introduzir mudanças significativas e perenes, pois os próprios protagonistas do movimento acabam se afastando das massas e aos poucos se aproximando da classe dominante. MILLS E O TRIÂNGULO DO PODER Sob a perspectiva de Mills (2000), o poder de influência dos homens comuns se limita às fronteiras do seu dia-a-dia, em que as grandes decisões e transformações não estão sob seu alcance. Por outro lado, os homens que constituem as elites do poder, tanto a sua ação como inação repercute em grandes conseqüências, porém isso não significa dizer que essa elite governe sozinha. Existem conselheiros, consultores, porta-vozes e promotores de opinião que estão junto às elites e influenciam as grandes decisões. De acordo com Mills (2000), trabalham por trás dos indivíduos que tomam decisões a hierarquia do Estado, as empresas e o exército. Além disso, cada vez mais áreas descentralizadas como as instituições religiosas, 1 Essa afirmação é conhecida, na teoria política, como „lei de ferro das oligarquias‟ e é expressa usualmente pela máxima: “Quem diz organização, diz tendência para a oligarquização” (MICHELS, 1982). 2 Essa dinâmica de exclusão de partidos em que prevalece um „teor de classe‟ exacerbado e muito específico pode ser observada nos pleitos eleitorais no Brasil em que partidos como PSTU, PCO e outros são desqualificados enquanto componentes efetivos da disputa eleitoral ou como concorrentes reais. www.pontodosconcursos.com.br 10 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES educacionais e familiares são influenciadas pelo que o autor chama de “três grandes”: os domínios econômicos, político e militar. Dentro de cada um dos três grandes, a unidade institucional tornou-se administrativa, ou seja, a economia é dominada pelas grandes empresas, a ordem política tornou-se centralizada e executiva, e a ordem militar passou a ser a maior representação política. E cada um desses é formado por uma elite, são elas: os senhores de guerra, os chefes de empresas e o diretório político. Todos esses três poderes estavam interligados, caracterizando o que o autor chamou de “triângulo do poder”. As decisões entre eles se encontram coordenadas, muito embora isso não signifique que tenha sido sempre assim. Aqueles que detivessem e dominassem: dinheiro, poder e prestígio, são considerados elite, de acordo com a classificação de Mills (2000). Ser poderoso significava conseguir fazer a sua vontade, mesmo à revelia dos outros, e para tanto era preciso contar com as principais instituições da sociedade. Nesse sentido, Mills (2000) afirma que a elite que ocupa os postos de comando, detém o poder, a riqueza e o prestigio. Para ele, a riqueza, o poder e o prestígio eram recursoscumulativos. Essas pessoas seriam indivíduos selecionados, portadores de caráter e energia superiores, sendo o restante da população uma “massa de seres medíocres”. Além disso, Mills também analisa a contra-elite. Para ele, esta seria formada por pessoas da classe média e inferior, que são, essencialmente, superiores, mas que estariam condenadas a uma situação inferior. Mills (2000) também não acredita que as pessoas nasçam qualificadas para ser elite, seriam as experiências e a formação que possibilitariam o desenvolvimento de um caráter específico nos indivíduos. A existência de hierarquias de poder, não significa, segundo Mills (2000), que as elites estão em consonância e concordam entre si sempre, ou ainda dizer que as elites do poder que tomam as decisões mais importantes, seriam sempre as “senhoras do rumo da história”. Assim como Michels, Mills não acredita na inevitabilidade das elites e de seu mando incontestável por toda história desconsiderando a ação de contra-elites e mesmo da maioria da população em alguns momentos históricos. www.pontodosconcursos.com.br 11 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES PLURALISMO O pluralismo, como vertente teórica, surge no século XX, especialmente como crítica à teoria elitista e à noção de distribuição do poder relegada a apenas um grupo na sociedade em todos os períodos da história. O cerne da teoria pluralista é a distribuição do poder de forma fragmentada entre vários grupos existentes na sociedade, o que implicaria em diferentes noções de organização da vida política, como veremos adiante. Alguns dos pressupostos que norteiam os autores pluralistas estão descritos abaixo: Â Poder compartilhado e disputado por numerosos grupos na sociedade; Â Ampla base de recursos de diferentes tipos dispersos na sociedade (econômico, ideológico, cultural, entre outros) disponíveis aos grupos de interesse; Â Consenso sobre os valores e procedimentos políticos, existência de uma gama de alternativas políticas e legitimidade política; Â A existência de muitos grupos disputando o poder na sociedade garantiria um governo aberto a diferentes demandas da sociedade implicaria em aumento da liberdade política; Â A fragmentação do poder se tornaria um obstáculo ao desenvolvimento de facções excessivamente poderosas e um Estado irresponsável aos interesses da maioria da sociedade; Â Existência necessária de direitos civis, voto individual, liberdade de expressão e de organização; Â Sistema de pesos e contrapesos entre legislativo, executivo, judiciário e burocracia administrativa; Â Sistema eleitoral competitivo com no mínimo dois partidos; Â Ampla gama de grupos de interesse buscando ter influência política; Â Papel do governo como mediador entre as diferentes demandas dos grupos de interesse; Â Regras constitucionais sustentadas por uma cultura política favorável; Â Equilíbrio entre cidadania ativa e passiva para garantir estabilidade política; www.pontodosconcursos.com.br 12 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES Â Cenário internacional favorável ao pluralismo político e livre-mercado. A principal critica feita ao pluralismo tem como base a existência de desigualdades de recursos entre os diferentes grupos da sociedade o que impede ou mesmo dificulta o acesso de alguns grupos sociais às instâncias de poder para que suas demandas sejam consideradas ou atendidas. Nesse sentido, mesmo que mais de um grupo tenha acesso ao poder, o que se observa é a manutenção de alguns desses grupos nas esferas de influência. Nesse sentido, quando consideramos a diferença no ponto de partida dos grupos, a idéia de que eles partiriam de posições semelhantes para influenciar o Estado perde sua sustentação. O PLURALISMO DE DAHL Em sua crítica à teoria das elites, Dahl lança os pressupostos para o que ficou definido na teoria política como pluralismo. Para ele, o elitismo enquanto hipótese tem “(...) uma grande vantagem sobre muitas outras explicações alternativas: pode ser projetada de modo a tornar virtualmente impossível a refutação” (p. 90), entretanto, peca pela falta de verificação empírica e embasamento real sobre os fatos em suas asserções. Em relação à idéia mais geral da teoria das elites como a existência de grupos de pessoas que exercem poder ou influência sobre os demais participantes da sociedade, Dahl questiona a possibilidade efetiva de comparar os graus de influência relativa de dois ou mais participantes sem que se tenha uma noção clara de quais são os objetivos das respostas sobre as quais os participantes têm influência. Dessa forma, para que exista uma elite dirigente é preciso ter um sistema político em que existam variações de preferências, de tempos em tempos, entre os indivíduos do sistema. Nessas condições, uma elite pode ser definida como um grupo de controle, ou seja, um grupo de indivíduos que consegue fazer suas preferências prevalecerem regularmente nos casos de desacordo sem que esse resultado seja próprio de arranjos de regras democráticas. www.pontodosconcursos.com.br 13 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES Com base nisso, a elite dirigente é definida por Dahl como “(...) um grupo de controle menor do que a maioria e que não é um simples arranjo de regras democráticas. É uma minoria de indivíduos cujas preferências regularmente prevalecem em casos de diferenças acerca da escolha de objetivos políticos fundamentais” (p. 93). Para Dahl, as premissas defendidas pelos autores elitistas apresentam fraquezas conceituais e de observação. O conceito de elite usado pelos elitistas se confunde com o que Dahl define como „um grupo com alto potencial de controle‟. Numa sociedade complexa, vários grupos podem ser caracterizados como tendo alto potencial de controle, segundo Dahl. Partindo dessa idéia, as relações políticas na sociedade passam a ser entendidas não mais como produto de dois grupos contrapostos – elites e massas – e sim, como resultado de uma multiplicidade de grupos que detêm diferentes graus de poder e que podem influenciar as decisões políticas. O poder de um grupo estaria ligado, segundo Dahl, ao seu potencial de controle e de unidade. Outra confusão recorrente nas discussões dos elitistas está na idéia de que uma elite seria um grupo de indivíduos que tivesse mais influência que todos os demais. Para Dahl, isso seria possível considerando que alguns grupos deteriam maior poder em detrimento de outros, o que não implicaria, necessariamente, na exclusividade desse grupo como grupo com potencial de controle. Dessa forma, uma elite seria uma elite dependendo da perspectiva adotada para observar o grau de influência exercido por um grupo. Um grupo capaz de influenciar religiosamente uma determinada situação pode ser ineficaz para influenciar economicamente uma outra situação. Grupos de elite diferentes podem ter interesses diferentes e, conseqüentemente, graus de influência diferentes sobre as mesmas questões. SCHUMPETER E O ELITISMO COMPETITIVO Schumpeter é, tradicionalmente, classificado como um dos autores pluralistas, entretanto, podem ser observados vários aspectos do elitismo em sua teoria, em função disso, alguns autores classificam o modelo defendido por ele como elitismo competitivo www.pontodosconcursos.com.br 14 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES A discussão central de Schumpeter em suas obras são as formas que devem ser assumidas pela democracia e suas possibilidades.A democracia para ele não passava de um método para escolher numa competição entre os melhores aqueles mais habilitados a cuidar dos assuntos do Estado e das decisões políticas (noção de democracia concorrencial – baseada na competição entre os melhores). Nesse sentido, a participação dos demais indivíduos se restringiria ao momento eleitoral em que eram escolhidos os representantes, em função, principalmente, da incapacidade das massas de opinarem e se posicionarem em relação às decisões políticas e aos assuntos públicos. Sob a perspectiva de Schumpeter (1961), a filosofia da democracia do século XVIII sempre esteve relacionada ao arranjo institucional para se chegar a certas decisões políticas que realizam o bem-comum, cabendo ao povo decidir por meio de eleições. Dessa forma, acreditava-se na existência do bem- comum como norteador da política. Entretanto, para Schumpeter, alguns assuntos deverão ser administrados por especialistas, que poderão decidir qual a melhor solução e resposta à vontade do povo. O mais conveniente, segundo o autor, seria consultar o cidadão apenas nas decisões importantes e atribuir as outras decisões a um comitê ou um conjunto de delegados que representaria a vontade do eleitorado. A noção de vontade geral dos utilitaristas desaparece na teoria de Schumpeter, pois esse conceito pressupõe um bem buscado por todos. A vontade geral seria inspirada na vontade individual. Entretanto como existe um reduzido senso de realidade nos cidadãos e consequentemente um reduzido senso de responsabilidade, seria impossível se chegar a uma noção certa do que seria a vontade geral. isso explicaria, para Schumpeter, a ignorância do cidadão comum e a falta de bom senso em assuntos de política interna e externa. Além disso, quanto menor a racionalidade dedicada por parte dos eleitores, maior a possibilidade de exploração por parte de grupos mais articulados, situação definida por Schumpeter como apatia funcional. Em conseqüência disso, Schumpeter define o que seria a teoria da vontade manufaturada em que grupos mais articulados poderiam moldar e criar www.pontodosconcursos.com.br 15 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES „vontades‟ no povo, contando com o apoio de métodos manipulação e distorção baseados na publicidade. Dessa forma, para Schumpeter (1961), a base teórica da doutrina clássica da democracia estaria morta. A doutrina clássica estaria fortemente apoiada pela associação com a fé religiosa e no modelo de democracia proposto por ele, não haveria mais necessidade de escrúpulos lógicos sobre o bem comum e os “valores supremos”. O autor sustenta que a função do povo é formar um governo, um corpo intermediário, que por sua vez deverá formar um executivo nacional. Ele acredita no sistema institucional como o método mais democrático para a tomada de decisões políticas. Outra crítica feita pelo autor à teoria clássica é de que esta não deixa espaço para o reconhecimento de lideranças, enquanto sua teoria abriria espaço para esse fato. Outro fator apontado por ele é que existindo vontades coletivas autênticas, sua teoria não as negligencia. Defende que sua teoria esclareceria a relação que subsiste entre a democracia e a liberdade individual ao afirmar que o método democrático não garante maior medida de liberdade individual. Muitos consideram que pelo fato de eleger o governo, o eleitorado também tem o poder de dissolvê-lo. Schumpeter (1961) afirma que não, que o controle por parte dos eleitores deve ser feito na hora da reeleição. Derrubadas de governo existiriam, não seriam excepcionais, mas seriam contrárias ao método democrático. SOCIALISMO A definição do conceito de socialismo como forma de organização social e de distribuição do poder varia bastante quando consideradas diferentes perspectivas teóricas da ciência política e sociologia. Entretanto, é possível observar no mínimo quatro variações do que se considerou na teoria política como socialismo ao longo do século XIX e XX. O socialismo pode então ser definido enquanto: socialismo utópico, socialismo cientifico, socialismo anárquico e a social-democracia como ideologia política assumida pelos alguns dos partidos socialistas europeus e latino-americanos. www.pontodosconcursos.com.br 16 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES Apesar de suas diferenças, os pressupostos descritos abaixo unem todas as variações do socialismo: Â Crença de que a distribuição do poder deve se dar na sociedade de forma igualitária entre todos os seus membros com base na melhor distribuição dos meios de produção; Â Crítica ao modelo econômico do laissez-faire e da competição econômica; Â Crença na ação cooperativa ou coletiva como forma de melhorar a vida em sociedade e as condições dos mais pobres. SOCIALISMO UTÓPICO O socialismo utópico, nome dado ao movimento posteriormente por Marx, teve início em meados do século XIX, após o ano de 1820, como o conjunto de teorias ou sistemas de organização social. As propostas dos socialistas utópicos tinham um forte caráter moralista na medida em que prescreviam uma série de condições necessárias para o estabelecimento de uma “boa sociedade”. Para esses autores, a forma assumida pela sociedade corrompia os indivíduos e favorecia condutas anti-sociais entre eles. Nesse sentido, seria preciso transformar as estruturas da sociedade para possibilitar que os indivíduos se desenvolvessem em uma sociedade diferente e assumissem posturas e comportamentos diferentes em relação aos outros. O socialismo utópico é permeado por um forte otimismo em relação às possibilidades de melhoria através do progresso, do desenvolvimento do conhecimento e das tecnologias. O conhecimento e o aumento da racionalidade dos indivíduos seriam os instrumentos certos para transformar a sociedade e seus males. O termo utópico tem como base exatamente essa crença no poder do conhecimento e da educação como vetores capazes de tornar os indivíduos mais racionais e melhorar as condições da vida em sociedade. Nesse sentido, a reforma social proposta pelos socialistas utópicos atribuía grande relevância ao papel da educação como solução para diminuir o individualismo da sociedade capitalista e tornar os indivíduos mais abertos a ações coletivas. www.pontodosconcursos.com.br 17 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES Os principais problemas observados pelos socialistas utópicos eram os privilégios e a competição. A existência de privilégios que atendiam apenas alguns indivíduos ou setores da sociedade era considerada injusta porque promovia a exclusão dos demais grupos dessa parcela de direitos. Além da existência de privilégios, a valorização da competição econômica entre os indivíduos acabava fomentando a luta entre as pessoas e diminuindo as possibilidades da cooperação e laços de solidariedade entre elas. Nesse sentido, é importante ressaltar que o cerne do socialismo é a cooperação como princípio da organização social ao invés da valorização da competição como motor do desenvolvimento social. SOCIALISMO CIENTÍFICO As análises iniciadas por Marx deram origem a uma segunda fase do socialismo caracterizado como socialismo científico em contraposição ao utopismo presente em sua fase anterior. As principais diferenças entre o socialismo utópico e o cientifico são o foco na questão da classe social e a concepção materialista da históriadesenvolvida no socialismo cientifico. Para Marx, a mudança da sociedade não viria através da educação e da expansão do conhecimento e sim em função da luta de classes ocasionada pela lógica de exploração do sistema capitalista (como foi visto na Aula 2). Nesse sentido, com base na concepção materialista, a conquista do poder pela classe trabalhadora seria inevitável devido às contradições presentes no desenvolvimento do capitalismo. Para Marx, a questão era mais que imoral ou de injustiça, seria inevitável que o capitalismo ruísse devido à exploração crescente das classes dominantes sobre as classes dominadas, o que geraria um momento de crise seguido pela revolução. Dessa forma, enquanto a transformação da sociedade e distribuição do poder para os socialistas utópicos estariam relacionadas à educação e conhecimento, para os socialistas científicos (marxistas) a transformação se daria através do acirramento da luta de classes e da tomada de poder pela classe trabalhadora. www.pontodosconcursos.com.br 18 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES ANARQUISMO Durante o século XX, o socialismo científico prevaleceu sobre o utópico, o que não impediu que outras cisões se efetivassem entre os adeptos do socialismo, como ocorreu com o movimento anarquista que criticava a elaboração de modelos da „comunidade perfeita‟ e da „boa sociedade‟ e focava sua luta na derrubada do Estado burguês e do sistema capitalista acreditando que as formas que seriam assumidas pela sociedade após a revolução não deveriam ser pensadas a priori e sim adviriam da mentalidade criadora que se estabeleceria na revolução. O movimento anarquista teve força especial no sindicalismo da primeira metade do século XX. SOCIAL‐DEMOCRACIA A social-democracia, em seu início, une os preceitos socialistas tradicionais e os princípios da democracia representativa (governo parlamentar) e ampliação do sufrágio universal. Ao invés da revolução, os social-democratas propunham a eleição de seus representantes para que possibilitassem o estabelecimento de um Estado de Bem-estar (welfare state). A social- democracia prevaleceu na maioria dos partidos socialistas europeus após as décadas de 20 e 30 do século XX. Parte II – Teorias da Democracia A DEMOCRACIA POLIÁRQUICA Negando a aplicabilidade da teoria das elites e com base na perspectiva pluralista que adota, Dahl definiu as variações dos regimes políticos de acordo com algumas condições institucionais que seriam ou não desfrutadas pelos grupos sociais. A democracia, entendida como o sistema caracterizado pela responsividade dos governos ás preferências de seus cidadãos, considerados como politicamente iguais, possui três condições necessárias para manter-se www.pontodosconcursos.com.br 19 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES ao longo do tempo. Dessa forma, para que um governo continue sendo responsivo durante um certo tempo, os cidadãos devem ter „oportunidades plenas‟ de: A. Formular suas preferências; B. Expressar suas preferências através da ação individual ou coletiva; C. Ter suas preferências igualmente consideradas na conduta de governo (sem discriminação em função do conteúdo ou fonte de preferência). Dahl ainda enumera oito condições (garantias) institucionais capazes de garantir a existência dessas três condições da democracia: A. Formular preferências: 1. Liberdade de formar e aderir a organizações; 2. Liberdade de expressão; 3. Direito de voto; 4. Direito de lideres políticos disputarem apoio; 5. Fontes alternativas de informação B. Expressar preferências: 6. Elegibilidade para cargos políticos; 7. Eleições livres e idôneas; C. Ter preferências igualmente consideradas: 8. Instituições para fazer com que as políticas governamentais dependam de eleições e de outras manifestações de preferência. As diferenças entre os regimes políticos se dariam na medida em que essas oito condições fossem combinadas e estivessem abertamente disponíveis, publicamente utilizadas e plenamente garantidas para todos. Dessa forma, segundo Dahl, os regimes políticos variam em função da amplitude de oposição existente, da contestação pública, do nível de competição permissível e da proporção da população habilitada a participar do controle e contestação à conduta e posições do governo. A análise da democracia feita por Dahl possui um caráter eminentemente político, em que www.pontodosconcursos.com.br 20 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES as condições de participação e de contestação são medidas com base no exercício do voto, por exemplo. O voto atenderia às duas dimensões da democracia: contestação pública, na medida em que for possível escolher entre as alternativas apresentadas de forma livre; e a inclusão entendida no sentido do número de pessoas que participam3. Um processo de democratização, em Dahl, seria definido pela possibilidade de que haja em um sistema político contestação pública e direitos à participação e, nesse sentido, os tipos de regimes políticos seriam identificados em função da posição que ocupassem em relação a essas duas dimensões. Quanto mais inclusivo ou liberalizante (aberto à contestação), mais democrático seria o regime. Considerando a impossibilidade de verificar a existência de alguma democracia plena, Dahl adota o conceito de poliarquia como regime mais próximo do ideal de democracia partilhado. As poliarquias seriam assim regimes fortemente inclusivos e amplamente abertos à contestação pública. Existe ainda na argumentação de Dahl uma terceira dimensão da democracia: o grau de competitividade e abertura existente nos níveis locais. As poliarquias precisariam democratizar também associações privadas que são oligárquicas ou hegemônicas nos níveis locais e não apenas no âmbito nacional. As noções de inclusão e democratização em Dahl estão ligadas, essencialmente, à dimensão política da participação entendida no sentido liberal e referenciada através das instituições da democracia liberal como as eleições e os partidos. Apesar de formalmente, todos terem direito à expressão de suas opiniões, nem todos possuem igual acesso ou possibilidade de serem ouvidos ou mesmo de vocalizarem suas demandas e preferências. As dimensões sociais e econômicas não são consideradas na análise de Dahl acerca das possibilidades e efetividade da participação e nem as possibilidades de ampliação do sentido de participação política, não mais restrita ao modelo 3 Dahl ressalta que contestação e participação não são totalmente dependentes, é possível que exista uma situação política em que seja dada aos cidadãos a possibilidade de votar sem que existam direitos que garantam o exercício da oposição. Nesse sentido, a participação perde seu significado como dimensão da democratização. www.pontodosconcursos.com.br 21 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES de democracia representativa liberal, e sim mais ligada à idéia defendida pelos teóricos participacionistas. DEMOCRACIA CONSOCIATIVA E MAJORITÁRIA Existem muitas perspectivas que orientadas para a explicação da organização e funcionamento dos sistemas democráticos. Os modelos de democracia consociativa (ou consensual) e majoritária são apenas mais dois tipos, relativamente recentes. O objetivo desses modelos é a analisar a grande variedade de instituiçõesgovernamentais formais que estão relacionadas à organização e ao funcionamento de sistemas democráticos. Essa análise se dá com base em um prisma bem definido: consiste em observar as instituições e aferir até que ponto são majoritárias – enfatizam as decisões tomadas com base em mínimo de acordo, principalmente, por meio de regras de maioria relativamente fáceis de ser alcançadas – ou consensuais – se as instituições privilegiam a divisão do poder e a construção de amplos acordos ou consensos para a tomada de decisões políticas ou coletivas. As bases fundamentais dos dois modelos repousam no tipo de democracia que é vista como mais desejada ou como mais adequada para uma sociedade. Se, por um lado, a concepção profunda de democracia aponta para um sistema em que o governo deve representar o “governo do para o povo”, teremos situações em que haverá desavenças entre os membros do “povo”, nesse caso, a maioria irá decidir, pois seria bastante estranho imaginar um governo democrático dirigido por uma minoria. Estamos falando obviamente do sistema majoritário (também conhecido como modelo de Westminster4). Se, por outro lado, a concepção democrática que embasa o sistema político for uma em que, nas decisões coletivas, deve prevalecer a vontade do maior número de pessoas, estaremos diante de uma proposta consociativa. Esse modelo concorda com anterior de evitar o governo da minoria, mas 4 Nome do palácio em que se reúne o parlamento britânico. O sistema político da Inglaterra poderia se tomado como um bom exemplo de sistema majoritário. www.pontodosconcursos.com.br 22 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES reforça a idéia de que mesmo a maioria deve ter um requisito mínimo para ser legítima. Ao invés de se contentar com uma maioria mínima, a democracia consociativa exige uma ampliação da maioria. A idéia é garantir uma ampla participação no governo e um amplo acordo em torno das políticas que serão implementadas por ele. Sendo assim, percebe-se que o modelo majoritário tende a concentrar o poder, enquanto o consociativo dispersa. O majoritário aceita que o poder seja exercido por uma pequena maioria, que pode ser simples (mera maioria), nem absoluta (50% + 1). O modelo consociativo, por sua vez, pressupõe dispersão do poder, controle e limitação, que é viabilizada de várias maneiras, como veremos adiante. Algumas instituições podem ser analisadas como fundamentais para avaliar o nível de aproximação de um sistema político de um ou de outro modelo. No entanto, é preciso observar que se trata de tendência e o que estamos abordando são dois modelos que podem ser colocados em posições opostas de um contínuo que vai da ponta majoritária ao extremo consociativo. De forma, os sistemas reais, seriam de tendência mais majoritária ou mais consociativa, não sendo, portanto, absolutos, os enquadramentos. Dez características antagônicas podem ser colocadas para explorar cada uma das diferenças fundamentais entre os dois modelos, essas características, podem ser agrupadas em duas dimensões genéricas: a dimensão executivos-partidos e a federal-unitária. Dimensão Executivos-Partidos A primeira questão que deve ser observada é a distribuição do poder no momento de formar o Poder Executivo. Os sistemas majoritários tendem a estruturar seus gabinetes com base em uma maioria singular, representada por um único partido. Essa distribuição (ou não distribuição do poder) resulta na concentração do Poder Executivo em gabinetes monopartidários de maioria. Um partido monta o gabinete e pronto, consegue governar com tranqüilidade. Nos sistemas consociativos, a direção do Poder Executivo tende a ser compartilhada por um grupo de partidos que compõem uma ampla coalizão. Os www.pontodosconcursos.com.br 23 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES regimes políticos seguem uma lógica segundo a qual não é possível governar sem que o partido principal recorra a aliados formais para estabelecer uma coalizão de governo. Basicamente, significa dizer que, sem uma coalizão, é impossível governar. Esse seria o caso do Brasil. O anterior o da Inglaterra (na verdade, como em praticamente todas as variáveis analisada, o exemplo de sistema majoritário será o inglês). Uma observação importante é que, em algumas situações, há vários partidos na coalizão governamental, mas apenas um partido é o que realmente conta, estamos diante de um quadro em que a coalizão é fictícia. O governo é de um partido apenas, logo, majoritário. O segundo ponto relevante da dimensão executivo-partidária diz respeito aos padrões de relacionamento entre o Poder Executivo e o Poder Legislativo. Quando o Poder Legislativo é pautado pela agenda o Executivo, ou quando este tem, de qualquer forma, preponderância sobre o aquele, estamos diante de um tipo de relacionamento institucional do tipo majoritário. O importante, neste ponto, é identificar se o arcabouço institucional que rege as entre os dois poderes confere a possibilidade de o Executivo controlar a agenda e, também em certa medida, controlar o funcionamento do Legislativo. Caso positivo, tem- se um sistema majoritário. Existe significativa bibliografia em ciência política que afirma ser este o caso do Brasil. Se, contudo, o poder é efetivamente dividido entre os dois poderes e suas relações são balizadas pela eqüipotência, com efetivo equilíbrio entre os poderes, há uma situação em que o sistema político é governado por forças compatíveis o poder é dividido. E divisão do poder é a essência do consociativismo. Esse ponto revela a importância de analisar um conjunto de instituições e não apenas uma, pois, às vezes a constituição pode dizer que o sistema política se baseia na divisão de poderes, mas isso não ocorre de fato. É apenas uma formalidade, facilmente desvirtuada por outras instituições que conferem mais recursos de poder ao Executivo que ao Legislativo. O terceiro aspecto relevante aponta para a estrutura do sistema partidário. Se o sistema partidário é bastante fragmentado, há consociativismo, mas, se há apenas dois partidos relevantes, o sistema será majoritário (Se há www.pontodosconcursos.com.br 24 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES apenas um partido, não é regime democrático). Sistemas multipartidários se enquadram no primeiro caso, porque dispersam o poder político por um conjunto de amplo de partidos. Para poder governar, é preciso que haja acordo entre vários desses partidos, formando uma coalizão. No segundo caso, o bipartidarismo, as eleições escolhem um partido e ele é capaz de governar sozinho, não precisa se esforçar por um acordo mais amplo, pois o vencedor leva tudo! É preciso observar que em algumas situações, o sistema partidário admite vários partidos, no entanto, apenas dois partidos são predominantes. Esse tipo de situação, ainda que existam vários partidos, é um caso de sistema majoritário. Isso significa que em sistema multipartidários, pode haver bipartidarismo de fato. É o caso, por exemplo, dos EUA e de Barbados. O quarto aspecto que deve ser observado nesta primeira dimensão é o sistema eleitora. Se o sistema político estrutura seus escrutínios de maneira que as diversas minorias da nação ou país tenha espaço no jogo político, estaremos diante de uma situação em que o sistema eleitoral favorece a fragmentação política. Não faz isso para dificultar a administração do poder, mas para evitar a “tirania da maioria”. A configuração político-eleitoral que permite ou que facilita a inserção das minorias no sistema político formal é o sistema proporcional. Esse é o sistemaeleitoral adotado no Brasil, que garante vaga nas casas legislativas (com exceção do Senado) a todo partido que atingir o mínimo de votos estabelecido pelo coeficiente eleitoral5. Esse mecanismo facilita a representação das minorias, na verdade, existe para isso – como defendia John Stuart Mill. Para governar em um sistema que garante a representação de muitas minorias é preciso mais esforço para compor um grau de consenso satisfatório para a condução das políticas, pois o poder está disperso entre elas. Isso explica o fato de democracia consensuais tenderem a estar ligadas a esse sistema. 5 O coeficiente eleitoral é definido da seguinte forma: primeiro toma-se o conjunto de eleitores e divide pelo número de vagas na casa legislativa. O valor alcançado com essa divisão é o mínimo que um partido deve alcançar para ter direito a uma cadeira na casa legislativa. Todo partido que alcançar esse mínimo terá o seu candidato mais votado ocupando a vaga. Se alcançar múltiplos desse valor ter a quantidade de cadeiras que esse múltiplo representar. www.pontodosconcursos.com.br 25 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES Oposto a esse sistema eleitoral está o sistema distrital, ou majoritário (ou de circunscrições uninominais). Esse tipo de esquema eleitoral é o adotado na Inglaterra e nos Estados Unidos, por exemplo. Caracteriza-se pela divisão do país em áreas eleitorais (os distritos ou circunscrições eleitorais) em quantidade idêntica ao número de vagas a serem preenchidas no Poder Legislativo. Cada uma dessas áreas é responsável por eleger um representante para a Casa legislativa. A questão é que, nesse tipo de sistema, quem obter, no distrito, a maioria simples dos votos é o representante. Esse sistema, segundo Maurice Duverger, tende a criar sistemas bipartidários devido ao fenômeno do voto útil. Segundo esse fenômeno, mesmo que o sistema político admita a existência de vários partidos, como é o EUA (que tem aproximadamente 67 partidos ativos), os eleitores tendem a votar apenas nos partidos que têm chance verdadeira de ser eleito, como toda disputa majoritária tende a se concentrar em dois candidatos, o terceiro partido importante acaba morrendo. Enfim, a idéia é que sistema majoritários de votos tendem a concentrar mais o poder, fazendo com seu nome já denuncie o tipo de modelo democrático ao qual se aplica. O último fator da dimensão executivos-partidos que nos importa aqui é a se refere ao sistema de representação de interesses existente no país. Se o sistema político admite a competição “solta” entre inúmeros grupos de interesses, o governo não está amarado a nenhum tipo de necessidade de acordo com um ou outro grupo. A sociedade administra seus conflitos e o relacionamento dela com o governo é variável e indefinido. Dessa maneira, o Estado tem maior liberdade para formar acordos e mais liberdade de ação. Isso não ocorre em situações em que está vigente um sistema coordenado e “corporativista”, o qual tem por objetivo estabelecer compromissos e a firma concertação social. Nesse tipo circunstância, os grupos inseridos na estrutura de intermediação de interesses oficial do Estado possuem um poder cristalizado que meros grupos de interesses ou de lobby não possuem. Para poder atuar, o Estado não pode simplesmente escolher o conjunto de atores mais alinhado com seus interesses e firmar um acordo. A institucionalização do corporativismo permite que os grupos mais próximos do www.pontodosconcursos.com.br 26 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES Estado compartilhem poder com o governo, que tem a sua margem de manobra reduzida. Dimensão Federal-Unitária Para analisar a segunda dimensão dos modelos majoritário e consensual de democracia, podemos continuar seguindo a lógica de dispersão versus concentração do poder no sistema político. O primeiro fator desta nova dimensão é obviamente a comparação das características fundamentais da dimensão dos modelos: o federalismo em contraposição ao unitarismo. A questão fundamental aqui é que, conforme quadro abaixo, os Estado federativos tendem a gerar a dispersão do poder, enquanto, os unitários concentram. A lógica é muito simples: se, por um lado, o governo é compartilhado com um conjunto de entidades autônomas, mas interdependentes, não pode impor sua políticas a esses entes, pois iria ferir os valores da federação. Por outro lado, se o governo eleito para o Executivo nacional controla a política administrativa nas organizações subnacionais, não precisa de muita coisa, além de uma boa governança, para que o as decisões centrais sejam levadas a efeito em todos os cantos do país, não é necessário, portanto, um processo de negociação. ESTADOS FEDERATIVOS ESTADOS UNITÁRIOS • Uma forma particular de governo dividido verticalmente, de tal modo que diferentes níveis de governo têm autoridade sobre a mesma população e território • O governo central e os governos locais são independentes entre si e soberanos em suas respectivas jurisdições, o princípio da soberania garante autonomia para implementar (pelo menos, algumas de) suas próprias políticas; • A soberania dos governos locais deriva do voto popular direto, da autonomia de suas bases fiscais e, em muitos casos, de uma força • Apenas o governo central tem autoridade política própria, derivada do voto popular direto; • A unidade do Estado nacional está garantida pela concentração de autoridade política, fiscal e militar no governo central; • A autoridade política dos governos locais é derivada de uma delegação; • Em tese, portanto, a autonomia dos governos locais é mais reduzida • Observe-se, portanto, que a concentração da autoridade política e fiscal no governo central é uma forma de distribuição vertical da autoridade política. www.pontodosconcursos.com.br 27 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES militar própria; • Tende a possuir Senado, que é a casa dos representantes dos membros federativos Governar em um sistema federativo (como o brasileiro, americano, alemão...) é muito mais complexo que em sistema unitário porque o número de atores com poder de veto sobre as políticas aumenta. As especificidades regionais são muito mais poderosas do ponto de vista político. O sistema federativo dispersa o poder para permitir a co-existência, em um mesmo país, de várias realidades completamente distintas. Essas considerações não fariam tanto sentido nos Estados unitários (como a França, Portugal, Chile, Uruguai...). Não podemos, contudo, ser determinista, ter governo unitário não significa sega obediência dos entes subnacionais, vide Bolívia e o caso da província de Santa Cruz. Semelhantemente, em alguns regimes federativos persiste o unitarismo de fato, pois o governo central tem todos os recursos de poder para gerir as políticas nacionais sozinho. O segundo fator a ser analisado na dimensão federal-unitária é a estrutura do Poder Legislativo. Cumpre verificar se este Poder é composto por uma ou duas casas. No primeiro caso, tem-se uma situação de democracia majoritária, no segundo, democracia consensual. Observe-se, contudo, que o importante novamente é a situação de fato não a “de direito”, pois, as vezes, as instituições podem dizer uma coisas, mas funcionarem de forma distintas: é caso da Inglaterra, ela tem duas casa no Poder Legislativo (Câmara dos Lordes e Câmara dos Comuns), todavia,uma casa não tem atribuição prática nenhuma, é apenas “decorativa”. Nesse caso, há unicameralismo de fato, e o que poderia ser entendido como um arcabouço institucional que reparte o poder, na verdade, permite a concentração. Logo, para se falar em democracia consensual, é preciso observar não apenas se existe duas casas, mas ela co- existem em uma relação de equipotência, se há equilíbrio de poder entre elas. O terceiro fator que merece a atenção nesse estudo é a rigidez/flexibilidade das constituições. O objeto da análise é saber qual o grau de dificuldade envolvido nos processos de mudança constitucional, conseqüentemente, qual o nível de acordo político é necessário para modificar www.pontodosconcursos.com.br 28 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES o arcabouço constitucional vigente para permitir a ação do governo em uma direção atualmente considerada inconstitucional. Quando a constituição é flexível, significa que o governo tem uma facilidade muito grande de mudar as leis constitucionais que embasam o pacto social e constrange seu comportamento. Situações em que a constituição não é escrita, como na Inglaterra, seria um exemplo clássico disso. Nesses casos, o acordo necessário para passar uma mudança constitucional é o mesmo de passar uma lei ordinária. Ou seja, basta um acordo mínimo para criar uma nova lei constitucional. Por outro lado, se a constituição é rígida, significa que, para mudá-la, é necessário passar um rito especial em que são marcantes as exigências de quoruns deliberativos e decisórios mínimos. Essas exigências, presentes em países como o Brasil e que são ainda maiores em outros países, como o Estados Unidos, exigem um esforço político maior do governo quando quiser mudar o marco constitucional. Isso porque, havendo a distribuição do poder entre muitos atores, os quais adquirem o status de veto players, o nível de consenso para produzir uma mudança constitucional é maior. O quarto fator desta dimensão diz respeito à concentração ou dispersão do poder de controle sobre a constitucionalidade das leis. A tese é que em sistemas em que as legislaturas têm a última palavra sobre a constitucionalidade da legislação, o Poder Legislativo concentra o poder de emitir leis e, ao mesmo tempo, de dizer se essas leis são válidas ou não. Nesse tipo de situação, há dois “tipos” de poder concentrados na mesma entidade política. E como vimos, concentração é sintoma de sistema majoritário. Se, diferentemente, o sistema político divide atribuições entre os poderes de maneira que as leis estão sujeitas à revisão judicial de sua constitucionalidade por uma corte suprema ou constitucional, estamos diante de um sintoma consociativo. Isso ocorre pela seguinte razão: trata-se de dois poderes distintos (legislar e verificar constitucionalidade das leis), se um poder está na mãos de um ente político e outro nas mãos de outro ente, para que haja andamento de determinado ato de governo, é necessária construção do consenso entre os dois detentores dos poderes separados. www.pontodosconcursos.com.br 29 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES Por fim, o quarto fator relevante é a (in)dependência dos bancos centrais. Se o banco central é dependente, o Executivo pode controlar a política econômica/monetária apenas determinando a política deseja ver implementada, pois se os dirigentes do banco desrespeitam a orientação do gabinete, o chefe deste pode simplesmente destituir os diretores do banco e nomear outros que lhe obedeça. É uma situação em que não há dispersão de poder e, portanto, não há necessidade de negociação ou entendimento entre o Executivo e banco central. Situação que muda totalmente de figura quando os bancos são independentes. Nesse caso, a política monetária não é definida pelo gabinete simplesmente. Há necessidade de acordo, negociação, entendimento entre o gabinete e os diretores do banco, pois esses compartilham poder sobre a política econômica. E divisão – que impõe necessidade de construção de consenso – é a essência do consociativismo. Dimensão Modelo Majoritário Modelo Consociativo Concentração do Poder 1 Executivo em gabinetes monopartidários de maioria Relações entre Executivo e 2 Legislativo em que o Executivo é dominante Distribuição do poder executivo em amplas coalizões multipartidárias Relações equilibradas entre os Poderes Executivo e Legislativo. 3 Sistemas bipartidários Sistemas multipartidários EXECUTIVOS- PARTIDOS 4 5 Sistemas eleitorais majoritários e desproporcionais Sistemas pluralistas de grupos de interesse , com livre concorrência entre grupos Representação proporcional Sistemas coordenados e “corporativistas” visando ao compromisso e à concertação. FEDERAL UNITÁRIA 1 Governo unitário e centralizado Concentração do Poder Governo federal e descentralizado Divisão do Poder Legislativo Legislativo numa legislatura 2 unicameral Constituicoes flexíveis, que 3 podem receber emendas por simples maioria Sistemas em que as legislaturas têm a última 4 palavra sobre a entre duas casas igualmente fortes, porém diferentemente constituídas Constituições rígidas, que só podem ser modificas por maiorias extraordinárias Sistemas nos quais as leis estão sujeitas à revisão judicial de sua constitucionalidade por www.pontodosconcursos.com.br 30 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES constitucionalidade da legislação. 5 Bancos centrais dependentes do Executivo uma corte suprema ou constitucional Bancos centrais independentes Bibliografia MOSCA, Gaetano. A classe dirigente. In: Sociologia Política. Org. Amaury de Souza. Ed. Zahar: Rio de Janeiro, 1966. PARETO, Vilfredo. As Elites e o uso da força na sociedade. 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